Artes e Ofício de Curar
Artes e Ofício de Curar
Artes e Ofício de Curar
MONTES CLAROS - MG
2023
Artes e Ofícios de curar no Brasil
Capítulo 3- Medicina Impopular
Ciência Médica e Medicina Popular nas Páginas dos Periódicos Científicos (1830-1840)
Luiz Otávio Ferreira
Em Busca de Popularidade
A popularidade da medicina acadêmica não estava ligada “apenas” com a dificuldade
desses profissionais em competir com as práticas populares da medicina. A falta de
conteúdo de fácil compressão sobre a medicina erudita, afastava a população leiga. Era
proposto então, a produção de conteúdos didáticos direcionados a população acerca da
problemática de uso de medicamentos secretos, o perigo do misticismo, e a intolerância
popular contra a medicina acadêmica.
Em um dos artigos, era apontado que as causas para a impopularidade da classe, era
devido a inexistência de regras pré-estabelecidas, onde todos os profissionais
realizariam as mesmas práticas. O que não acontecia, pois os médicos utilizam da
prática que os convinham. A prática médica ainda era vista como no período colonial,
ou seja, pelo viés empírico.
Em 1842, com a publicação do Dicionário de medicina popular e das ciências
acessórias, do dr. Chernoviz, foi vista como um real esforço para a popularização da
medicina. Até então, os dicionários publicados no Brasil, eram versões de obras
estrangeiras adaptadas. A obra do dr. Chernoviz é apontado como necessária para certa
instrução da população leiga, acerca das emergências médicas do cotidiano, além do
mérito de fazer pensar não somente na tratativa das doenças, mas em maneiras de
precaver, informando sobre as ideias modernas de higiene.
Portanto, nesse momento, foi percebido que a captação de legitimação da sociedade
para com médicos com formação acadêmica seria tratada de maneira acessível, não
mais a partir de jargões excludentes.
O ajuste de contas
Por parte das elites, existia o medo da contaminação por um agente letal. Acreditavam
que o foco da doença estava nos quarteirões pobres e nos mocambos da cidade. Foi
identificado que a maior contaminação estava entre os escravizados domésticos, ou seja,
passaram a serem vistos como transmissores da contaminação para o interior das
habitações das elites. A partir de então, a ideia que passa a ser difundida tanto pelas
pessoas mais ricas e por médicos, é que os pobres seriam a ameaça de contágio devido
suas condições de subsistência.
A população preta e parda, escravizados e livres, e pobres acreditavam fielmente que a
cólera era um plano do governo, juntamente com os médicos, para matar essa
população, a fim de higienizar a cidade, de embranquecer a população. Para eles, não
tinha a ver com a insalubridade ou fragilidade social. Passaram a crer que estavam
sendo envenenados nas comidas e bebidas, tudo planejado por médicos e autoridades
governamentais. A suspeita ganhava sustentação quando pessoas pobres eram
acometidas pela manifestação súbita da doença, onde a pessoa não estava sentindo
nenhum sintoma e de uma hora para outra tinha um ataque fulminante em praça pública.
Os sintomas da doença contribuíam para o achismo que se tratava de intoxicação, os
doentes sentiam vômitos, espasmos, convulsões e morte quase repentina. Além do
pensamento de embranquecimento da higienização da população, havia suspeitas que o
cólera era utilizado para evitar a escassez de alimentos. O argumento mais forte, era de
que as elites dominantes, com o apoio médico, estavam utilizando da epidemia para
substituir os trabalhadores negros por imigrantes europeus.