Os Princípios Da Aprendizagem: A Filosofia Da História Na Didática Da História

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OS PRINCÍPIOS DA APRENDIZAGEM:

A FILOSOFIA DA HISTÓRIA NA DIDÁTICA


DA HISTÓRIA*
JÖRN RÜSEN**

Resumo: No campo da Didática da História apresentam-se três formas de a tematizar. A primeira rela-
ciona-se com a filosofia material sustentada na ideia do desenvolvimento das formas de vida humana
numa conexão interna dos acontecimentos do passado, expressa na unidade da experiência da mente
humana. A segunda, sustentada na filosofia formal, compreende o pensamento histórico assente no
processo mental da constituição de sentido por meio da narrativa. A terceira relaciona-se com a filosofia
funcional e é estruturada na reconstrução do sentido histórico a partir da efetividade do passado em
relação à orientação cultural do presente. Por fim, são discutidas as implicações dessas dimensões da
Filosofia da História no processo de aprendizagem histórica referentes ao impacto da multiperspectivi-
dade na identidade histórica e intercultural dos estudantes, do significado da narrativa histórica e dos
riscos do entrelaçamento entre a política, a estética e a religião e nas formas de representação histórica
da rememoração cultural.
Palavras-chave: Didática da História; Filosofia da História; Aprendizagem histórica.

Abstract: In the field History didactics, three ways of presenting it are proposed. The first is related to
material philosophy based on the idea of ​​the development of human life forms in an internal connection
of past events, expressed in the unity of the human mind experience. The second, based on formal philo-
sophy, comprises historical thinking based on the mental process of constituting meaning through
narrative. The third is related to functional philosophy and is structured in the reconstruction of historical
sense from the effectiveness of the past in relation to the cultural orientation of the present. Finally, the
implications of these dimensions of the philosophy of history in the process of historical learning are
discussed regarding the impact of multiperspectivity on the students‘ historical and intercultural iden-
tity, the meaning of historical narrative and the risks of the intertwining between politics, aesthetics and
religion and in the forms of historical representation of cultural remembrance.
Keywords: History Didactics; Philosophy of History; Historical learning.

1. A NECESSIDADE DE UMA TEORIA NA DIDÁTICA DA


HISTÓRIA
A Didática da História1 é uma disciplina académica cujo objeto central é a aprendiza‑
gem histórica. Como tal, existe uma especial necessidade de uma teoria relativamente
a questões básicas da aprendizagem histórica, tais como as seguintes:
* Tradução de Marcelo Fronza. Revisão de tradução de Marília Gago.
** Universidade de Witten / Herdecke / Universidade de Bochum — Alemanha. Email: [email protected]
1 O texto a seguir é apenas um esboço de uma argumentação. A sua intenção é divulgar o mais amplo campo de

interação entre a Didática da História e a meta-história. Baseio-me numa versão alemã anterior. Foi publicada em:
RÜSEN, 2016: 19-26. Agradeço a Waltraud Schreiber, a Maria Auxiliadora Schmidt e a Estevão Martins pelas suas
permanentes insistências para que eu abordasse as temáticas da Didática da História enquanto assuntos da Teoria da
História (e vice-versa). Sou grato à Inge Rüsen pela sua leitura crítica e comentários a este texto.

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DIÁLOGO(S), EPISTEMOLOGIA(S) E EDUCAÇÃO HISTÓRICA: UM PRIMEIRO OLHAR

• O que é a História? A História existe como algo real, um objeto da experiência,


ou é somente uma construção? A História é a mesma no contexto de diversi‑
dade das culturas (tal como nas salas de aula contemporâneas)?
• Qual é o processo e o âmbito da aprendizagem histórica? Dar uma resposta a
esta pergunta exige uma ideia clara em relação ao que é o pensamento histórico
e qual é a sua lógica específica.
• Porque é que a História deveria estar presente no currículo, no processo de
ensino e aprendizagem? Esta questão leva-nos à questão filosófica sobre assun‑
tos como: a submissão ou a utilidade da História para a vida humana em geral.

Não haverá respostas convincentes a estas perguntas sem uma argumentação


proveniente da Filosofia da História.
Não pode haver dúvida: a primeira questão tem um caráter filosófico. Isto
também é verdadeiro para a segunda questão. A aprendizagem histórica não é um
assunto específico da Filosofia da História, mas com a intenção de a organizar e a
influenciar, devemos conhecer a peculiaridade do pensamento histórico. Já a ques‑
tão sobre a sua relevância conduz ao cerne da cultura histórica, a qual lida com a
utilidade geral da História.
Mas, a Filosofia da História sempre foi um tema da Didática da História2. Isto
é ainda mais evidente quando se colocam em dúvida as premissas do pensamento
histórico, colocando-se a Didática da História e a prática do Ensino de História em
dúvida. Novas questões relacionadas com o facto de a «História» realmente existir
exigem a investigação filosófica. O  construtivismo contemporâneo nega a possibi‑
lidade dessa investigação. Essa negação reforça a impressão de que a confiança no
futuro é uma atitude tímida/ingénua (uma vez que uma fiável perspetiva futura da
vida humana é sempre baseada numa referência empiricamente fundamentada do
passado). Além disso, a tradição do pensamento histórico é desafiada por uma cres‑
cente divergência de formas de vida no seu contexto.
Novas perspetivas, que deem à História autoconfiança, são necessárias. Estas
devem trazer consigo reflexões acerca dos princípios do pensamento histórico —
isto é inevitável.

2 KARLSSON, 2016: 101-126.

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OS PRINCÍPIOS DA APRENDIZAGEM: A FILOSOFIA DA HISTÓRIA NA DIDÁTICA DA HISTÓRIA

2. TRÊS DIMENSÕES DA FILOSOFIA DA HISTÓRIA


Mas o que é, propriamente, a Filosofia da História3? Esta não se apresenta com uma
formação clara, uma vez que é dividida em três manifestações que estão relacionadas
entre si de forma controversa. Assim, manifestam-se de uma maneira:
(a) material;
(b) formal;
(c) funcional de tematizar a História.

Todas essas três manifestações parecem excluírem-se umas às outras, de modo


que todo o campo parece estar repleto de tensões, se não de contradições — não
parece ser um ponto de partida muito agradável para a Didática da História e as suas
questões fundamentais.
(a) A filosofia material da História é uma teoria de desenvolvimento abrangente
acerca das formas de vida humana. Aborda a conexão interna dos eventos do passado,
que aparecem enquanto uma unidade na esfera da experiência na mente humana.
Exemplos podem ser encontrados na filosofia de Kant, Hegel, Marx, Benjamin, Jaspers
ou na sociologia baseada nas teorias da evolução social e cultural4, ou numa forma
menos teórica como as histórias universais5.
Esta unidade de eventos é, naturalmente, estruturada temporalmente. A  sua
direção temporal abre uma perspetiva futura através da inter-relação entre o pas‑
sado e o presente. Esta diretividade implícita do futuro é raramente usada tanto nos
estudos históricos — historiografia6 — quanto na Didática da História. Este limite
em relação à temporalidade deve ser superado.
Outro problema é o da crescente necessidade de orientação intercultural. Os
conceitos abrangentes e inclusivos do curso do tempo, na filosofia material da His‑
tória, estão, frequentemente, interligados com os desenvolvimentos do Ocidente.
Portanto, esses conceitos estão, atualmente, desacreditados por serem considerados
como um instrumento ideológico para a supressão das tradições e das formas de
vida ocidentais.
A instrução histórica na escola abrange um intervalo de tempo que vai da história
arcaica até ao presente. Por isso, ela requer um «fio vermelho» de sentido/significado,
que pode manter unido o mundo da História quando é ensinado ou é compreendido.
O  desenvolvimento da consciência histórica dos estudantes pode servir como um
«fio vermelho». Deve criar um espaço bem definido nos procedimentos mentais de
compreensão do mundo.
3 ROHBECK, 2004; RÜSEN, 2014: 9-26; RÜSEN, 2015a: 106-113.
4 DUX, 2011; GIESEN, 1991; METZ, 2012.
5 CHRISTIAN, 2004.
6 HÖLSCHER, 1999, 2017; ROHBECK, 2013.

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DIÁLOGO(S), EPISTEMOLOGIA(S) E EDUCAÇÃO HISTÓRICA: UM PRIMEIRO OLHAR

Tal ideia faz da História um campo próprio de experiência e de interpretação do


passado. Sintetiza a multitude de acontecimentos numa coerente sequência de tempo.
À luz da teoria de aprendizagem, tal ideia do passado e da sua conexão com o
presente e o futuro poderá oferecer um «mapa mental» extraordinariamente útil. Tal
situação poderia trazer ordem à consciência histórica. Sem tal ordem, não pode ser
conceptualizada uma teoria de aprendizagem nem esta poderá ser influenciada pelo
ensino. E  esta situação, de uma filosofia material da História, ainda não tem nem
está estabelecida como mais um tema na Didática da História.
(b) A filosofia formal da História tematiza a maneira específica de pensar, em que
o passado é abordado como História. Em seu início, no século XIX, foi desenvolvida
epistemologicamente, por exemplo, por Dilthey ou por Rickert, que explicavam a
especificidade lógica das Humanidades através da sua diferença para com as ciências
naturais. Contemporaneamente, apresenta-se como a teoria da narrativa histórica7. Esta
analisa o processo mental de fazer sentido pela narrativa. A compreensão dominante
desse sentido enfatiza a sua qualidade construtiva. Este fazer sentido é atribuído ao
passado e não pode ser adquirido por uma manipulação cognitiva dos seus vestígios.
O passado em si não tem voz nessa representação histórica.
No entanto, nenhuma cultura humana existe, se não for criado o sentido da
experiência de tempo. Portanto, a filosofia formal da História é baseada num fun‑
damento antropológico. Atendendo a este fundamento, o seu alcance/âmbito pode
abranger um horizonte intercultural. Mas uma teoria geral de formas narrativas para
lidar com o passado, que divulgue a multiplicidade das suas realizações culturais e
as ponha ao serviço de uma rede de tipos ideais, ainda é um trabalho em progresso.
Adicionalmente, o  papel dos elementos e dos fatores não-narrativos não está sufi‑
cientemente investigado.
O problema mais importante da filosofia narrativista da História é a sua inabi‑
lidade em elucidar o caráter histórico específico de suas representações mais proe‑
minentes. Aqui a sua delimitação na filosofia material da História revela uma con‑
sequência problemática: a partir do momento em que esta versão da reflexão sobre
os princípios do pensamento histórico tem algo a dizer sobre o conteúdo da forma,
constata-se que a forma em si não é suficiente para se materializar em termos de
uma historicidade da vida humana.
(c) A filosofia funcional da História ainda não foi discutida no âmbito destes
termos/princípios. Mas existe um campo de fenómenos e discursos académicos rela‑
cionados que podem ser caracterizados como um modo ou uma versão da Filosofia
da História. Penso na efetividade do passado em relação à orientação cultural do
presente e às discussões acerca da presença do passado. Não existe nenhuma orienta‑

7 WHITE, 1973, 1987.

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OS PRINCÍPIOS DA APRENDIZAGEM: A FILOSOFIA DA HISTÓRIA NA DIDÁTICA DA HISTÓRIA

ção cultural que não tenha como referência o passado. O modo desta efetividade é a
memória. Sob a forma da memória, o passado já está presente antes de ser abordado
como História. É eficaz como uma fonte ou como um desafio de sentido/significado
histórico. Assim, o  discurso da memória pertence à Filosofia da História quando
se refere aos seus fundamentos e princípios de sentido/significado. Não se fala de
memória como História. Neste discurso, o  passado não está distante do presente,
antes é uma parte «viva» nas práticas de orientação cultural. Numa forma altamente
elaborada, esse «viver o passado» é apresentado enquanto os «lugares de memória»
(lieux de mémoire) de maneira que encontra uma receção especial nas Humanidades8.
Mas, antes da existência desse discurso acerca da efetividade do passado no
presente, este tema foi abordado de outra forma: por meio de uma teoria de Bildung.
Aqui a formação de sentido/significado histórico desempenhava um papel fundamen‑
tal no desenvolvimento da subjetividade humana e do conceito de individualismo9.
Diga-se de passagem, e gostaria de frisar, que a divisão estrita das três dimen‑
sões da Filosofia da História pode ser superada se começarmos por responder à ter‑
ceira questão. No vivenciar da memória, a forma e o conteúdo não estão divididos.
Somente se o passado for pensado na sua distância em relação ao presente, a forma
e o conteúdo podem ser divididos de modo que a sua diferença e a sua indepen‑
dência, filosóficas, podem ser vistas e usadas como um ponto de partida para uma
análise filosófica. Só numa retrospeção reconstrutiva da unidade do seu presente é
que podem ser sistematicamente intermediados.
É evidente a importância dessa terceira dimensão para a Didática da História.
Esta leva-nos ao insight que a aprendizagem histórica é um elemento essencial de
uma prática cultural, a qual é uma condição predefinida e uma determinação em todo
o processo de ensino e aprendizagem. Define a utilidade do pensamento histórico
e sua inerência à vida. Isso, por sua vez, exige e legitima a aprendizagem histórica
enquanto uma atividade cultural organizada e oficialmente institucionalizada.

3. INSPIRAR A APRENDIZAGEM HISTÓRICA POR MEIO


DA FILOSOFIA MATERIAL DA HISTÓRIA: A UNIDADE DA
HISTÓRIA
Existe uma questão inevitável que a filosofia material da História coloca à Didática
da História: que História deve ser aprendida e ensinada? Continua a ser a unidade
da «História» — a totalidade temporal como era conceptualizada no início do pen‑
samento histórico moderno na mudança dos séculos XVIII e XIX10? Os estudos
históricos, enquanto disciplina académica, têm pensado que a Didática da História
8 NORA, 1989: 7-24; ASSMANN, 1995: 125-133; ASSMANN, 1999, 2011.
9 STEENBLOCK, 1999.
10 KOSELLECK, 1985.

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DIÁLOGO(S), EPISTEMOLOGIA(S) E EDUCAÇÃO HISTÓRICA: UM PRIMEIRO OLHAR

se refere a questões sobre o conteúdo e em que se apresenta a unidade de tempo


apenas em fragmentos. No entanto, a maioria dos livros didáticos na escola são his‑
tórias universais, e a sua universalidade não é um assunto debatido/estabelecido pela
disciplina académica da História.
Deverá a ideia de uma unidade simples chamada «História» ser abandonada?
Há um forte argumento a favor desta ideia: o alargamento à interculturalidade no
âmbito ou na extensão do pensamento histórico. A  divergência e a multiplicidade
estão a tomar o lugar da coerência e da unidade.
O princípio da multiperspetividade, que domina a estruturação da aprendizagem
histórica na Didática da História, parece ter aberto brechas na unidade da História.
A unidade da História foi substituída por um pluralismo de histórias.
Esta parece ser uma resposta convincente para o desafio nos contextos multi‑
culturais da aprendizagem histórica contemporânea11. O que é que isto significa para
a identidade histórica dos estudantes? Como um elemento da sua aprendizagem,
esta será formada pelas ideias de diferença e de pluralidade. Mas, e o sentimento de
unidade dos estudantes como membros de uma mesma sociedade onde se insere?
A ideia de nação parece estar desacreditada, embora a maioria dos estados contem‑
porâneos sejam Estados-nação. Ao menos, é necessária a mobilização de um novo
conceito de organização social — que seja bem distante daquele caráter exclusivista
e discriminatório que dominava no passado (ainda que persistam, pelo menos em
algumas partes do mundo contemporâneo, conceitos similares que prevalecem).
Seja como for, em qualquer caso, os estudantes necessitam de uma ideia de
História que os integre num sentimento de unidade pacífico baseado numa com‑
preensão crítica do passado e numa promissora perspetiva de futuro. A divergên‑
cia e a multiplicidade precisam de um princípio de ordenamento fundamentado
no imperativo da aprendizagem histórica. Este princípio pode ser encontrado na
forma de vida de uma sociedade civil moderna, com suas normas humanistas e
seus pressupostos/princípios históricos. Para que este princípio seja plausível para
todos os seus membros, terá de ser refletido e explicado por uma filosofia material
da História.
O que pode sintetizar a diversidade cultural no espaço e no tempo para a uni‑
dade da História? A resposta da Filosofia da História a essa questão não é nova, pois
já foi dada nos seus primórdios: a unidade da humanidade. Johann Gottfried Herder
(1744-1803) apresentou um panorama filosoficamente estruturado da história uni‑
versal, de uma maneira que pode ser avaliado porque está aberto a um paradigma
renovável e refrescante12.

11 RÜSEN, 2011: 13-34; RÜSEN, 2015b: 19-42.


12 HERDER, 2003, 2004; KREUTZER, 2015.

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OS PRINCÍPIOS DA APRENDIZAGEM: A FILOSOFIA DA HISTÓRIA NA DIDÁTICA DA HISTÓRIA

Hoje, tal Filosofia da História só pode ser aceite se cumprir duas condições:
• em primeiro lugar, deve estar fundada sobre os universais antropológicos
enquanto condições necessárias para a possibilidade da História;
• em segundo lugar, deve-se desenvolver uma ideia de curso do tempo (Zeitver-
laufsvorstellung) que, hermeneuticamente, potencia/catalisa (empowerment) a
diversidade cultural e a engloba sob a forma de uma história universal. No âmbito
de tal campo conceptual, o ponto de referência para a identidade surge na forma
da humanidade, de se ser um ser humano. Este «ser-se um ser humano» está
relacionado com a abrangência da experiência histórica (história universal) e
à profundeza de seus elementos normativos (a dignidade dos seres humanos).

O que é que isto significa para o ensino da História? Significa tratar cada tema
histórico singular de acordo com o seu contexto social e cultural atendendo aos
princípios antropológicos universais.
Estes princípios universais são opostos aos princípios fundamentais da vida
humana, que definem a dinâmica da cultura, especialmente com a sua temporalidade
interna13. São exemplos disso o contraste entre interno e externo, acima e abaixo,
jovem e velho, masculino e feminino na ordem social da vida, poder e impotência,
amigo e inimigo, morrer e matar no interior da ordem política, e  pobre e rico no
contexto da economia, entre outros. Estes exemplos são apenas alguns dentro de uma
grande quantidade de princípios universais.
A temporalidade da vida humana, que resulta desses contrastes, é especificamente
histórica, e tem uma direção temporal válida interculturalmente. Relaciona o passado
com o presente e a sua expectativa de futuro. Tais ideias de uma evolução de desen‑
volvimento estão relacionadas, geralmente, com secções longitudinais (Längsschnitte)
no ensino de História. Estas revelam o espaço da experiência histórica e processam
temas específicos do ensino compreensíveis numa conexão temporal.
Aqui podem surgir problemas durante a construção histórica de identidade.
O contraste entre a multitude de identificações e a necessidade da coerência dentro
delas pode ser mediado: o princípio fundamental da formação de identidade histórica
surge como um fio vermelho enredado pela interpretação e compreensão histórica
— e pela ideia do que significa ser-se um ser humano14.

13 KOSELLECK, 1987: 9-28; KOSELLECK, 2000: 97-118; RÜSEN, 2017: 82-83; RÜSEN, 2015c: 119-120.
14 RÜSEN, 2011, 2015b.

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DIÁLOGO(S), EPISTEMOLOGIA(S) E EDUCAÇÃO HISTÓRICA: UM PRIMEIRO OLHAR

4. INSPIRAR A APRENDIZAGEM HISTÓRICA APLICANDO


A FILOSOFIA FORMAL DA HISTÓRIA: AS FORMAS DO
PENSAMENTO HISTÓRICO
A teoria da narrativa histórica levou a Didática da História até ao conceito de
«competência narrativa», como o maior objetivo da aprendizagem histórica15. Aqui
procuramos compreender as diferenças destas propostas e a sua compreensão con‑
creta. Consequentemente, o  processo de aprendizagem e de ensino é focalizado e
pode ser analisado detalhadamente. Isso significa que, na prática de ensino, deve
ser concretizada uma referência permanente às formas do pensamento histórico e
os seus padrões de compreensão têm de ser desenvolvidos. As interpretações, que
aparecem no processo de ensino, devem ser abordadas enquanto tal, e ser pensadas/
refletidas na sua relação com as formas de pensamento que as dominam. Como é
que compreendemos o que aconteceu no passado? Como pensamos sobre ele? Como
podemos confirmar o que aprendemos, como podemos transmitir aos outros e tor‑
ná-lo discutível?
As apresentações narrativas, como tal, devem tornar-se um assunto a debater
com e entre os estudantes, de forma que os primeiros passos dessas apresentações
sejam dados e refletidos. Os critérios decisivos de sentido/significado pela narrativa
histórica devem ser abordados, pensados e ensaiados16. Se esta aprendizagem his‑
tórica ocorrer, para além de um conhecimento adquirido, ter-se-á desenvolvido a
capacidade de pensar.

5. INSPIRAR A APRENDIZAGEM HISTÓRICA POR MEIO DA


FILOSOFIA FUNCIONAL DA HISTÓRIA: A HISTÓRIA COMO
UM PODER DA VIDA
A viragem didática da filosofia funcional da História focaliza as condições cultu‑
rais e as circunstâncias da aprendizagem e do ensino histórico. Assim, o passado é
efetivado quando é visto e aprendido como História que prevalece em toda a parte.
A  sua vitalidade manifesta-se de diferentes maneiras: em circunstâncias históricas
que determinam a vida dos estudantes, nos poderosos preconceitos, nas imagens
produzidas pelos meios de comunicação, etc.
Estas predefinições devem ser os pontos de partida da aprendizagem. A Histó‑
ria, então, tornar-se-á reconhecida como um poder da rememoração cultural, bem
como relacionada com a política, com a estética e com as formas de representação
(nos meios de comunicação, nos museus e no quotidiano), com religião, e com a sua
importância para a perspetiva de mundo e seus conceitos, além do seu perigo como

15 SCHREIBER et al., 2006; BARRICELLI, 2011; SEIXAS, 2016: 83-100.


16 RÜSEN, 2008: 144-159.

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OS PRINCÍPIOS DA APRENDIZAGEM: A FILOSOFIA DA HISTÓRIA NA DIDÁTICA DA HISTÓRIA

ideologia — todas estas dimensões pertencem ao domínio da aprendizagem histó‑


rica. Este «poder» não deverá ser separado do estudo acerca dos temas do mundo
humano, mas, se possível, mantê-los sempre em estreita ligação. No entanto, estes
devem ser desenvolvidos de forma que o seu relacionamento interno e a sua depen‑
dência mútua tornem possível e realizável um «criticismo» objetivo.

6. PERSPECTIVAS
Ao relacionar a Filosofia da História com a aprendizagem histórica, as três formas de
pensamento são capazes de estabelecer uma inter-relação argumentativa pragmática
e coerente. A lógica desta argumentação ainda não está suficientemente decifrada.
A sua análise reflexiva como parte essencial da Didática da História deve ser elucidada
enquanto um elemento dos seus fundamentos teóricos. Tal situação reverter-se-ia
de uma mais-valia enorme para a prática da aprendizagem e do ensino da História.

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