Comunicação Entre Plantas
Comunicação Entre Plantas
Comunicação Entre Plantas
INTRODUÇÃO
A agricultura tropical passou a fazer abordagens que são utilizadas, sobretudo, para a
obtenção de produtos de qualidade. Os paradigmas buscados atualmente se fundamentam
na produção, na produtividade, na sustentabilidade ambiental e social e na qualidade.
Busca-se diminuir o impacto ambiental com o uso racional de defensivos e, principalmente,
com a procura de produtos biorracionais, relativamente inócuos para organismos não alvos e
inimigos naturais.
Embora pareça que o comportamento de plantas seja mais simples que o dos
animais, recentes descobertas desafiam essa noção revelando que as plantas antecipam
condições futuras com precisão ao perceberem e responderem a sinais confiáveis do
ambiente, também exibem memória alterando comportamento dependendo de suas prévias
experiências ou de seus ancestrais. Esse comportamento inteligente é exemplificado pela
versatilidade excepcional de plantas para lidar com estresses abióticos, bem como o ataque
microbiano e de insetos, equilibrando reações defensivas apropriadas. Uma das razões para
tanto é que os vegetais estão em constante comunicação com uma multidão de diversos
organismos. As plantas são multifacetadas fábricas de produtos químicos que produzem
uma grande variedade de compostos que variam de etileno e metanol a terpenoides
complexos e alcaloides contendo nitrogênio. Mais de 100.000 produtos químicos são
conhecidos por serem produzidos por plantas e, pelo menos, 1.700 desses são voláteis. O
estudo de voláteis de plantas tem sido restrito a produtos florais, mas estudos sobre voláteis
de plantas emitidos a partir dos tecidos vegetativos estão aumentando rapidamente. As
quantidades de compostos orgânicos voláteis que as plantas disseminam para a atmosfera
são enormes.
Observar as plantas como organismos - o que as plantas fazem e como elas estão
equipadas para fazê-lo - traz-nos surpresas. Todos apreciam as plantas como fornecedoras
finais de alimento e de grande parte dos bens da humanidade, bem como do reino animal
como um todo. As plantas, para tanto, desenvolvem suas atividades de tal forma discreta
que uma pessoa, por mais observadora que seja sempre será surpreendida com alguns
episódios que acontecem dentro delas.
As plantas, tal como os animais, não vivem sozinhas. Plantas em ambientes naturais
estão intimamente associadas com outras plantas.
Assim como o meio ambiente de qualquer animal inclui outros animais, cada planta é
influenciada pelas outras plantas de sua comunidade. Existe algo que se poderia chamar de
sociologia vegetal. Sabe-se, por exemplo, que no reino vegetal não é comum encontrar-se
competição por alimento, água ou luz. O que encontramos são formas mais sutis de
combate ou de cooperação.
As plantas, também, não são alvos passivos para organismos associarem, mas, ao
contrário, afetam ativamente a estrutura das comunidades. Na rizosfera, por exemplo,
liberando atrativos ou repelentes de suas raízes e participando da saúde das plantas. Como
acontece com algumas simbioses benéficas às plantas, tais como a associação de bactérias
fixadoras de nitrogênio e fungos micorrízicos com raízes. Outros, tais como a interação das
plantas com patógenos virais, microbianos, fúngicos e nematoides são prejudiciais.
Esses mecanismos são considerados defesa direta, uma vez que afetam diretamente
os herbívoros ao impedir que estes se alimentem. Outros tipos de defesa direta das plantas
são as barreiras físicas que impedem a entrada de patógenos ou artrópodes nos tecidos, ou
seja, a parede celular, suberina, calose e cutícula. Além das defesas diretas, a presença de
estruturas que oferecem proteção e alimento, tais como, domácias e nectários extraflorais
promovem a defesa indireta através da atração de parasitoides e predadores que exercem
controle biológico sobre insetos herbívoros.
Os voláteis induzidos após o ataque dos herbívoros e voláteis florais têm despertado
o interesse na comunidade científica, uma vez que eles não só guiam os inimigos naturais
em direção à planta hospedeira da presa, mas também na mediação de várias interações
ecológicas que têm potencial para o desenvolvimento de novas estratégias de controle de
pragas.
Vários estudos têm mostrado que voláteis de folhas verdes (GLVs) induzem a
transcrição de genes envolvidos nas respostas de defesa em Arabidopsis e estão envolvidos
na rota dos octadecanoides, responsáveis pela produção do ácido jasmônico. Os
terpenoides provocam efeito semelhante em feijão-de-lima (Phaseolus lunatus L.). Em milho,
a exposição de plantas sadias a plantas atacadas por Spodoptera littoralis (Lepidoptera:
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Os compostos voláteis agem como uma linguagem que as plantas usam para sua
comunicação e interação com o meio ao seu redor. Até 2006 cerca de 1.700 compostos
voláteis tinham sido isolados de mais de 90 famílias de plantas. Esses voláteis, liberados
pelas folhas, flores e frutos para a atmosfera e das raízes para o solo, defendem as plantas
contra herbívoros e patógenos ou provocam uma vantagem reprodutiva pela atração de
polinizadores e dispersores de sementes.
O papel do ácido jasmônico (JA) na defesa das plantas foi reconhecido quando se
demonstrou pela primeira vez que o jasmonato de metila induz a atividade de inibidores de
proteases, que são moléculas que funcionam como compostos de defesa direta. O JA se
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O etileno (ET) é uma terceira molécula envolvida nas respostas induzidas das plantas.
Em Arabidopsis, o ET e o JA agem juntos na indução da expressão de defensinas e genes
PR que codificam proteínas de defesa localizadas em vacúolos. Nessa espécie de planta,
esses dois compostos também agem em sequência para induzir a tolerância sistêmica a
patógenos, chamada de resistência sistêmica induzida. A produção do etileno em culturas
com células de tomate foi comprovada após dano e ação de elicitores como a sistemina,
fragmentos oligogalacturonídeos e JA, além disso, esse composto pode potencializar a ação
do JA em resposta ao dano. A biossíntese do ET, assim como a do JA, é estimulada após o
dano mecânico.
a) Uso de elicitores
As versões sintéticas de muitos voláteis induzidos após o ataque dos herbívoros têm
potencial para atrair inimigos naturais e promover o controle biológico em áreas agrícolas.
Estudos realizados em campo utilizando dispersores de liberação controlada avaliaram um
amplo número de compostos voláteis, incluindo, dentre outros compostos, derivados voláteis
de hormônios, GLVs e terpenos. Em geral, o MeSA atrai um amplo espectro de inimigos
naturais de diversas ordens e pode afetar a abundância de indivíduos de vários níveis
tróficos. Diferentemente do MeSA, os terpenos e os GLVs são rapidamente degradados
quando liberados na atmosfera. Isso explicaria a falta de atratividade dos inimigos naturais
onde foram testados GLVs e (E)-DMNT. É possível que os compostos reativos sejam
percebidos unicamente a uma curta distância pelos insetos. Entretanto, embora os GLVs
induzam a emissão de sesquiterpenos, no campo não aumentam o parasitismo nem a
atração de predadores do gênero Chrysopidae. Usando a tecnologia de RNA-seq já se
verificou ocorrência de mudanças de transcrição em laranja doce em resposta a aplicações
exógenas de SA e CHI.
Além de atrair inimigos naturais, os voláteis induzidos após o ataque dos herbívoros
também podem ser utilizados na captura de insetos-praga. O MeSA já foi testado para este
fim e teve resultados promissores. Por outro lado, esse composto pode inibir a oviposição e
reduzir a incidência de pragas. Por exemplo, fêmeas acasaladas de Mamestra brassicae
(Lepidóptera: Noctuidae) evitam plantas de Brassica napus com dispersores de MeSA e o
estabelecimento do afídeo Rhopalosiphum padi (Hemíptera: Aphididae) é adiado em cevada
quando MeSA é aplicado em pellets. O uso de voláteis combinados com feromônios também
pode ser uma alternativa para desenvolver atraentes mais eficientes de insetos-praga, uma
vez que já foi observado o sinergismo entre esses semioquímicos.
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A interação via voláteis entre plantas sem danos podem levar a mudanças nas suas
emissões de voláteis. A exposição de plantas de batata a voláteis de plantas de cebola
resulta em aumento da emissão de dois terpenoides, (E)-nerolidol e TMTT. O odor de batata
exposta à cebola foi significativamente mais atrativo para joaninhas que as não expostas.
Além disso, mistura sintética simulando o perfil volátil de batata exposta à cebola foi mais
atrativo que a mistura simulando a batata não exposta. Individualmente verificou-se que
TMTT foi atrativo a joaninhas e que (E)-nerilidol foi repelente. A troca de voláteis entre
plantas sem danos (não atacadas) e o consequente aumento da atratividade para joaninhas
pode ser um mecanismo que contribui para aumentar a abundância de inimigos naturais em
habitats de plantas complexos. A manipulação da emissão de voláteis em plantações pode
ser uma excelente estratégia de controle de pragas, minimizando problemas com pragas
agrícolas de uma maneira não agressiva ao meio ambiente. No entanto, apesar das boas
perspectivas, vários aspectos ainda precisam ser melhor explorados, garantindo a
sustentabilidade do sistema de controle. Sobre o ponto de vista ecológico, o conhecimento
das diferentes interações que mediam a emissão de voláteis é importante para explorar o
uso de voláteis induzidos.
É preciso entender, ainda, como a defesa das plantas afeta a comunidade de insetos
herbívoros, assim como a relação entre a produção de voláteis e a polinização. Também, se
a indução da planta e o uso de compostos sintéticos têm algum efeito nos inimigos naturais
e nos inimigos destes. Por exemplo, os jasmonatos incrementam a resistência a um amplo
espetro de pragas e o parasitismo no campo, mas a indução das plantas pode afetar a
eficiência dos parasitoides ao reduzir a qualidade do hospedeiro. Embora o fenômeno de
indução reduza o custo destinado à manutenção das defesas, se conhece muito pouco
sobre os custos metabólicos da planta ao ativar as defesas.
Muitas considerações são necessárias, ainda, para o uso de compostos voláteis. Por
exemplo, é necessário avaliar as taxas de emissão dos compostos, particularmente ao longo
do ano, pela sua relação direta com a temperatura. Também deve ser considerada a
longevidade dos compostos químicos no campo e a distância entre dispersores. Por outro
lado, emissões homogêneas no campo podem reduzir a eficiência dos parasitoides a baixas
densidades de praga. Porém, ainda é considerada uma alternativa para atrair inimigos
naturais em períodos curtos. Da mesma forma que ocorre com os elicitores, é necessário
avaliar o efeito nas dinâmicas populacionais dos herbívoros e inimigos naturais.
7. Considerações finais
Pode ser que nem todas as plantas estejam profundamente envolvidas em diálogos
mediados quimicamente. Entretanto, há forte evidência que plantas podem e exploram
informações vindas de vizinhas com danos. O desafio é determinar as circunstâncias
ecológicas e condições abióticas onde tais interações planta-planta são comuns. Os
recentes avanços da pesquisa com voláteis abrem um caminho para investigações novas e
excitantes.
Além disso, o uso de voláteis embora seja estratégia promissora clama, ainda, por
mais estudos de campo.
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