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Apostila 1

Disciplina: Pr-Clnica II (DP-201) Aspectos microbiolgicos da placa dental

rea de Microbiologia e Imunologia FOP-UNICAMP Profa. Dra. Renata O. Mattos Graner Prof. Dr. Reginaldo B. Gonalves Prof. Dr. Jos Francisco Hfling Leandro Moraes Furlan

Piracicaba 2005

Microbiologia da Cavidade Bucal

Alguns aspectos ecolgicos O termo ecologia se refere ao estudo das relaes entre os organismos e o ambiente (10). Os microrganismos (ex., bactrias, vrus, fungos, cianobactrias) esto em todos os lugares, e no fossem eles, nossa vida seria invivel. Os microrganismos vivem em ntimo contato com seres vegetais e animais e grande parte deles importante, ou mesmo essencial, para o correto funcionamento dos organismos multicelulares. Conhecimentos bsicos de microbiologia so importantes para a vida das pessoas, pois regem hbitos fundamentais de higiene, esterilizao, manipulao e conservao dos alimentos, ecologia, entre outros aspectos. So tambm instrumentos para pesquisa cientfica visando entendimento dos mecanismos moleculares da vida celular, fornecendo instrumentos biotecnolgicos estratgicos, para o tratamento de diversas doenas microbianas ou no (10). Por exemplo, as bactrias, h algum tempo, so manipuladas geneticamente para sintetizar insulina e outros hormnios de humanos, usados no tratamento da diabetes e outros distrbios endcrinos, respectivamente. Alguns exemplos do papel fundamental dos microrganismos: O ar que respiramos originado pelo metabolismo microbiano: as cianobactrias so responsveis pela oxigenao da Terra. Portanto, apesar de muito pequenos (por exemplo, as cianobactrias medem cerca de 8x50 m), coletivamente os microrganismos apresentam um poder metablico assustador. Diversas plantas, principalmente as leguminosas, utilizam nitrognio (nutriente essencial para a sntese de material gentico e outras funes celulares) a partir da converso do nitrognio da forma gasosa para a forma combinada. Este processo de converso chamado de fixao do nitrognio. A fixao do nitrognio feita por bactrias que colonizam as razes das plantas leguminosas como as do gnero Rhizobium. Estas bactrias so de grande importncia na agricultura, uma vez que a deficincia de nitrognio ocorre em diversos solos (10). Microbiota indgena: mantm o equilbrio ecolgico das diversas reas do corpo humano, impedindo a infeco por microrganismos patognicos. Estima-se que o corpo humano, com sua microbiota indgena, seja formado por um total de 1014 clulas, sendo que destas, cerca de apenas 10% so clulas mamferas (17). Embora imaginemos microrganismos como seres microscpicos isolados, no assim que eles vivem na natureza e nos organismos maiores. Todos os microrganismos vivem em comunidades celulares microbianas complexas (diversos tipos de microrganismos coexistem) e/ou esto em contato com clulas eucariticas dos seres multicelulares que habitam. As bactrias tm meios de se comunicar dentro de suas comunidades, como por exemplo, as que formam a a placa dental bacteriana. Portanto, os microrganismos conversam entre si, transmitindo informaes importantes para sua manuteno em determinada comunidade. Por exemplo, os microrganismos percebem quando est ocorrendo aumento da populao microbiana local. Ao perceberem este fenmeno, se preparam fisiologicamente para resistir condies decorrentes de uma superpopulao, como carncia de nutrientes, baixa tenso de oxignio e aumento do acmulo de produtos txicos derivados do prprio metabolismo. Isto

3 parece anlogo aos fenmenos populacionais das cidades ou ao comportamento das clulas organizadas nos diversos tecidos do seres multicelulares. De fato, muitos pesquisadores comparam populaes bacterianas organizadas, como a populao da placa dental bacteriana, a um ancestral de organismo multicelular ou a um tecido especializado como os diversos do corpo humano. Portanto, importante entender que as comunidades microbianas no so apenas um acmulo aleatrio de microrganismos, mas sim comunidades muito organizadas. H nestas comunidades microbianas, uma competio constante por nutrientes e espao, sendo que somente aqueles microrganismos mais adaptados s condies presentes que vo ocupar ou prevalecer naquele nicho ecolgico especfico. Esta competio rdua em comunidades microbianas expostas a condies de estresse (por exemplo, carncia de nutrientes e grande quantidade de produtos txicos) e isto limita a diversidade de microrganismos, uma vez que poucos so os capazes de se adaptar a condies extremas de estresse ambiental. Felizmente, considerando-se o grande poder dos microrganismos, apenas um pequeno nmero destes capaz de causar doenas, sendo portanto denominados de microrganismos patognicos. Alguns microrganismos patognicos podem, no entanto, causar morte epidmica em algumas populaes. Por exemplo, a peste bubnica, causada pela bactria Gram-negativa, a Yersinia pestis, transmitida atravs de pulgas de ratos e outros roedores, dizimou populaes europias na Idade Mdia e tambm se alastrou no Brasil, no final do sculo XIX e incio do sculo XX. A transmisso rpida do vrus da imunodeficincia adquirida (AIDS) tambm atingiu as populaes, principalmente a partir da dcada de 80, no sculo passado. Mais recentemente, o vrus causador da gripe asitica (SARS, de Servere Acute Respiratory Syndrome) tambm atingiu muitos pases orientais. Diferente dos patgenos letais, outros microrganismos vivem parasitando organismos superiores, causando doenas crnicas, as quais embora no letais causam muitos danos ao longo do tempo. Um exemplo so as micobactrias, envolvidas na patogenia de doenas comumente crnicas como a lepra e tuberculose. Um terceiro grupo de microrganismos, so os oportunistas. Os microrganismos oportunistas normalmente fazem parte da microbiota indgena, mas passam a aumentar em proporo e a agredir o hospedeiro, quando as condies ambientais afetam outros microrganismos comensais, ou quando h comprometimento dos mecanismos de defesa do hospedeiro. Veremos no decorrer do curso, que muitos patgenos bucais so microrganismos oportunistas. Em exemplo clssico o das candidases das mucosas bucais. A candidase bucal, popularmente conhecida como sapinho normalmente associada ao fungo da espcie Candida albicans. C. albicans vive em baixos nveis em comunidades microbianas bucais de indivduos saudveis. Entretanto, proliferam quando h destruio de grande parte da microbiota comensal, em decorrncia do uso prolongado de antibiticos, ou quando os sistemas de defesa esto debilitados. Nestas condies, Candida albicans adquirem caractersticas mais agressivas e podem causar dano aos tecidos bucais. Os microrganismos podem ser tornar mais agressivos? Sim, assim como ns humanos temos vrias funes do nosso organismo alteradas em decorrncia da influncia de fatores ambientais externos (estresse, falta de comida, poluio), os microrganismos tambm tm sua fisiologia alterada em resposta ao estresse ambiental. A adaptao fisiolgica dependente das caractersticas genticas dos microrganismos. Sabemos que os genes que compreendem nosso genoma diferem quanto sua atividade, sendo alguns ativados ou inibidos em resposta a um estmulo ambiental, enquanto outros permanecem ativados nas mais diversas condies. A adaptao fisiolgica depende da deteco de uma condio ambiental especfica e da transmisso deste sinal para o interior da clula, onde ocorrer a ativao ou inibio de genes envolvidos na adaptao quela condio especfica. Nem todos os microrganismos tm genes necessrios para se adaptar a uma presso ambiental especfica. Assim, aqueles que tm o conjunto de genes ideais, para uma determinada situao, so os que vo prevalecer naquele determinado ambiente. Diversos patgenos adquiriram caractersticas de virulncia atravs da

4 incorporao de material gentico exgeno (transformao) ou atravs de outros mecanismos de trocas genticas horizontais, como conjugao e transduo. Portanto, importante compreender que tanto as caractersticas microbianas como as ambientais determinam o tipo e composio da populao de um determinado nicho ecolgico. Os microrganismos afetam seus nichos ecolgicos e influenciam uns aos outros, o que compe um ecossistema. O termo ecossistema definido como uma comunidade de microrganismos no seu habitat natural. Microrganismos da cavidade bucal De todos os stios do corpo humano, a cavidade bucal aquela que apresenta os maiores nveis e diversidade de microrganismos. As caractersticas antomo-fisiolgicas da boca so responsveis por esta diversidade, uma vez que a boca apresenta diferentes tipos de tecidos e estruturas que variam quanto tenso de oxignio, disponibilidade de nutrientes, temperatura e exposio aos fatores imunolgicos do hospedeiro. Alm das superfcies moles e descamativas das mucosas, h superfcies rgidas no descamveis (estveis) das superfcies dos dentes. As superfcies das mucosas e dentes so ainda banhadas pela saliva ou pelo fludo crevicular (do grego, crevis=sulco). O fludo crevicular o exsudato dos lquidos teciduais/plasma que atinge o sulco gengival. Tanto as superfcies descamativas, como as superfcies duras dos dentes diferem em retentividade e exposio ao oxignio, nutrientes e fatores imunolgicos. Por exemplo, a mucosa do dorso da lngua muito mais retentiva do que a mucosa jugal. O dorso da lngua funciona como um reservatrio de diversos microrganismos, os quais vo posteriormente ocupar outros nichos nas superfcies dentrias supra e subgengivais. Muitos microrganismos Gram-negativos e Gram-positivos encontrados em altas propores no dorso lngua, podem ser patognicos ao colonizar a placa dental supra e subgengival. Por isto, a lngua pode funcionar como um reservatrio de patgenos dentrios e periodontais. As superfcies dentrias tambm diferem sensivelmente quanto a retentividade, lisura superficial e exposio aos componentes da saliva e fludo crevicular. Estas variaes influenciam na composio da microbiota local, sendo a composio da placa dental de um sulco da superfcie oclusal de um molar diferente da placa dental da superfcie vestibular de um incisivo. A comunidade microbiana de superfcies dentrias supragengivais so tambm diferentes das superfcies dentrias adjacentes ao sulco gengival. Os diversos nichos da cavidade bucal oferecem portanto, condies favorveis s exigncias nutritivas, respiratrias e de aderncia necessrias colonizao de grande variedade de microorganismos. Alm disto, fatores comportamentais (ex., dieta e hbitos de higiene bucal) e condies de sade do prprio hospedeiro (ex., fluxo salivar e condies do sistema imune adaptativo), exercem tambm grande influncia nas comunidades bacterianas da boca. A composio e diversidade da microbiota bucal pode variar de um indivduo para outro. Entretanto, a despeito das variaes entre indivduos, alguns grupos de microrganismos esto presentes em nichos bucais especficos na maioria dos indivduos. Estes so os microrganismos mais adaptados quelas caractersticas ambientais prprias de cada nicho, e compem a microbiota indgena. Os microrganismos que compem uma microbiota indgena, variam entretanto em proporo, sendo alguns presentes em nveis altos e outros em menor nmero. Outros microrganismos bucais esto apenas de passagem e no se estabelecem em um nicho ecolgico especfico. Estes so chamados de microrganismos transitrios e podem surgir de contatos salivares entre indivduos ou pelo transporte de microrganimos presentes em outras mucosas, como a nasofarngea. Logo ao nascimento, inicia-se o desenvolvimento da microbiota bucal. A compreenso deste processo muito importante para entendermos os mecanismos atravs dos quais cada

5 tipo de microrganismo se estabelece em um determinado nicho. Atravs destes conhecimentos, podemos ento desenvolver estratgias para controlar a colonizao por microrganismos potencialmente patognicos. A cavidade bucal compreende diversos tipos de bactrias, fungos e em menor proporo protozorios e vrus. A maior parte destes microrganismos so bactrias. Grupos especficos de microrganismos colonizam nichos distintos da cavidade bucal. Os nichos da cavidade bucal podem ser classificados em: A) Stios de superfcies duras (dentes): 1) placa supragengival (acima da margem gengival). Variam quanto ao tipo superfcies supragengival: I) reas de cicatrculas e fissuras, II) superfcies lisas vestibulares e linguais, III) superfcies interproximais. 2) placa subgengival (abaixo da margem gengival, no sulco gengival): o sulco gengival formado pelas superfcies duras dos dentes e superfcies moles do epitlio do sulco gengival. B) Stios de superfcies moles descamativas: 1) mucosas com epitlio queratinizado. 2) mucosa com epitlio no-queratinizado: sulco gengival (epitlio juncional). 3) dorso da lngua: tambm recoberta por epitlio queratinizado, mas considerada separadamente devido alta retentividade das superfcies papilares. Alguns exemplos de espcies bacterianas mais encontradas em alguns destes nichos so descritos na Tabela 1. A quantidade de microrganismos bucais continuamente controlada pela ao mecnica da saliva e musculatura, durante a mastigao e deglutio, juntamente com a descamao das mucosas e da atuao constante de vrios componentes do sistemas imunolgicos inato e adaptativo. Estima-se pela diversidade microbiana e disponibilidade de nutrientes que, se no houvessem estes fatores de defesa, a cavidade bucal seria totalmente preenchida por uma massa microbiana dentro de um perodo de 3 horas (14). Clulas de defesa (leuccitos) e outras substncias de imunidade (por exemplo, lisozima, sistema complemento e anticorpos), tm contnuo acesso cavidade bucal atravs da saliva e fludo crevicular. Maiores detalhes sobre os mecanismos de defesa sero abordados posteriormente.

6 Tabela 1. Exemplos de espcies bacterianas mais comumente identificadas nos diferentes nichos ecolgicos da cavidade bucal.
Nicho da cavidade bucal Placa dental supragengival Gneros mais comuns Streptococcus spp., Actinomyces spp. Placa dental subgengival Fusobacterium spp Actinomyces spp. Fusobacterium spp., Porphyromonas spp, Treponemas Dorso da lngua Espcies em maior proporo S. sanguinis ,S. gordonii, S. mutans. A.naeslundii, A. viscosus F. nucleatum A. naeslundii, A. viscosus F. nucleatum, P. gingivalis,T. denticola, Tannerela

spp. e outros gneros anaerbios. forsythensis*, Prevotella spp Veillonela spp., V. parvula, V. dispar Streptococcus spp., Actinomyces spp. S. salivarius, S. sanguinis, S. parasanguis, S. mitis, S. mutans A. odontolyticus. P. melaninognica. S. mitis, S. oralis, S. constellatus V. parvula.

Prevotella spp., Mucosa da bochecha, palato, Streptococcus spp. assoalho bucal. Saliva Veillonela spp., Reflete microbiota dos dentes e dorso da lngua
* Anteriormente denominada Bacteroides forsythus.

Fonte: Ref. (11) Para pensar: Voc acha que os diferentes nichos ecolgicos esto expostos aos mesmos
mecanismos de defesa do hospedeiro? caractersticas dos nichos bucais?

Como a composio da microbiota poderia variar dependendo das Aquisio e desenvolvimento da microbiota indgena Logo aps o nascimento, a criana entra em contato com diversos microrganismos presentes no ambiente em que vive, principalmente aqueles que colonizam a me e outras pessoas com quem mantm contato. Nos casos de parto normal, o primeiro contato com microrganismos maternos ocorre durante o parto, uma vez que a mucosa vaginal tambm apresenta sua microbiota indgena. Alguns dos microrganismos so transitrios, enquanto outros passam a colonizar a cavidade bucal. O termo colonizao se refere capacidade do microrganismo de se aderir a um determinado local e de se multiplicar neste local. Ao contrrio do que se possa imaginar em vista da fcil exposio da boca atmosfera, a grande maioria dos microrganismos colonizadores bucais que se estabelecem no primeiro ano de vida so anaerbios facultativos (microrganismos anaerbios tolerantes ao oxignio). Com a erupo dos dentes, h um crescente aumento dos nmeros de bactrias anaerbias estritas (no toleram oxignio), isto porque surgem reas menos expostas ao oxignio. Alguns microrganismos aerbios (crescem na presena de oxignio) podem tambm ser encontrados, mas em nveis baixos. Grande parte dos microrganismos anaerbios estritos (no toleram

7 oxignio) que compem a microbiota de adultos no so detectados na cavidade oral de crianas at o perodo inicial de erupo dentria, pois o sulco gengival, nicho mais colonizado por anaerbios estritos, ainda no est presente. No entanto, alguns gneros de bactrias anaerbias, como por exemplo Veillonella spp., podem ser encontrados nas crianas edntulas, provavelmente porque colonizam o dorso da lngua. Com a erupo dentria e a conseqente formao de ambiente anaerbio favorvel, ocorre aumento da concentrao de microrganismos anaerbios estritos.
Desenvolvimento da microbiota bucal do nascimento idade adulta.

A partir de 6-10 horas aps o nascimento ocorre rpido aumento do nmero de espcies microbianas viveis. Essa microbiota, no entanto, revela grande variabilidade em sua composio bacteriana nos primeiros dias de vida, podendo ser detectadas vrias espcies do gnero estreptococos (incluindo pneumococos e enterococos), estafilococos, veilonelas, sarcinas, peptoestreptococos, lactobacilos e bacilos (12,18). Muitos dos microrganismos com os quais a criana entra em contato antes do desenvolvimento de uma microbiota bucal estvel so transitrios. Por exemplo, as enterobactrias so transmitidas para as crianas atravs da cavidade bucal, mas somente vo se estabelecer no trato gastro-intestinal. Por outro lado, outras bactrias sero capazes de colonizar as mucosas bucais (ao nascimento, as crianas ainda no tem dentes irrompidos). Verifica-se, porm, que a maioria destes microorganismos encontrada em concentraes baixas, em contraste com as propores elevadas da microbiota do indivduo adulto. Uma espcie bacteriana detectada regularmente a partir do primeiro dia de vida so os Streptococcus salivarius. S. salivarius colonizam principalmente o dorso da lngua e outras superfcies da mucosa oral, no dependendo, portanto, da presena de dentes para sua colonizao e implantao definitiva. Nas primeiras semanas aps o nascimento, observa-se que as bactrias bucais so predominantemente do Gnero Streptococcus. Dentre este gnero, as espcies mais freqentemente isoladas so Streptococcus mitis, Streptococcus oralis e Streptococcus salivarius (9,20). Durante os primeiros meses de vida, a microbiota torna-se mais complexa, isto , aumenta em quantidade e diversidade de microrganismos (20). Com a erupo dos dentes decduos, iniciada por volta dos 6 meses de idade, so fornecidos novos tipos de superfcies e microambientes. Entre as espcies que se aderem com grande afinidade aos dentes, encontramos Streptococcus sanguinis, Streptococcus mitis e Streptococcus gordonii. Os dentes passam a apresentar tambm algumas espcies do gnero Actinomyces, e h aumento gradativo do nmero de bactrias anaerbias estritas (por exemplo dos gneros Fusobacterium and Prevotella). As espcies Streptococcus mutans e Streptococcus sobrinus, principais patgenos da crie dental, no so capazes de colonizar facilmente as superfcies dentrias, uma vez que outras espcies de estreptococos, como S. sanguis e S. mitis, tm maior afinidade s superfcies dentrias recobertas pela pelcula adquirida do esmalte (9). A complexidade da microbiota aumenta at atingir relativa estabilidade nos adultos jovens. Diversos fatores contribuem para este aumento da complexidade da microbiota bucal, entre eles fatores sociais (contato com maior nmero de indivduos), fatores ambientais (aumento da diversidade da dieta) e fatores fisiolgicos (modificaes das mucosas, erupo de maior nmero de dentes, aumento do fluxo e concentrao de componentes salivares). A criana com todos os dentes decduos irrompidos (aproximadamente entre os 2,5-3,0 anos de idade), adquirem uma microbiota mais estvel em termos de composio e complexidade. A microbiota bucal inclui um grupo de gneros e espcies bacterianas comum entre a maioria das pessoas, mas deve ser encarada como em equilbrio dinmico com o hospedeiro, alternando fases de maior ou menor estabilidade, dependendo das condies ambientais. Por exemplo, por volta do 5 a 12 anos de idade, com a troca dos dentes decduos pelos dentes permanentes, novas superfcies virgens (no colonizadas) estaro disponveis para colonizao microbiana.

8 A composio da microbiota destes novos nichos depender das condies ambientais e do hospedeiro presentes durante a fase de estabelecimento desta nova microbiota. Por exemplo, alteraes bruscas na dieta, observada em adolescentes em fase de vestibular, ou em universitrios cursando o seu primeiro ano de faculdade, podem promover alteraes na microbiota bucal. Outro exemplo de fatores que promovem a modificao da ecologia bucal, quando h a perda de dentes em indivduos idosos. A perda de dentes resulta em perda de microambientes e reduo da microbiota (20). Por outro lado, as prteses dentrias podem substituir os dentes para aquelas bactrias que dependem das superfcies duras no descamativas para se estabelecer (20), embora as prteses no substituam completamente a relao entre tecidos moles e duros que esto presentes com os dentes (sulco gengival). De qualquer forma, a fase inicial de desenvolvimento da microbiota bucal uma fase crucial para a sade bucal do indivduo durante toda a sua vida. H inmeras evidncias cientficas neste sentido como discutiremos em mais detalhes no decorrer do curso. Influncia dos fatores imunolgicos do hospedeiro no desenvolvimento da microbiota bucal Como dissemos anteriormente, se no houvesse os fatores de defesa, a proliferao de microrganismos seria to rpida que em 3h teramos a boca preenchida por uma massa microbiana (13). Duas classes de fatores imunolgicos impedem que isto ocorra: 1) os fatores de defesa inatos; 2) os fatores de defesa adaptativos. 1) Fatores de defesa inatos: como o prprio nome diz se refere aos fatores do sistema imune que esto presentes j ao nascimento. Estes so fatores de defesa fundamentais vida e compreendem: a) barreiras fsicas das prprias clulas epiteliais que revestem as mucosas, b) glicoprotenas presentes na saliva e outras secrees mucosas, as quais englobam microrganismos facilitando sua deglutio e bloqueando stios de adeso, c) clulas de defesa inata, principalmente macrfagos e neutrfilos, d) protenas sricas de defesa que formam o sistema complemento, e) enzimas bactericidas e bacteriostticas . A Tabela 2 mostra os principais fatores de defesa do sistema imune inato que controlam a microbiota bucal.

9 Tabela 2. Fatores do sistema imune inato que atuam no controle da microbiota bucal.
Fatores de defesa Definio inatos Mucinas e glicoprotenas Glicoprotenas de alto peso molecular inespecficas produzidas pelas glndulas salivares maiores e menores. Responsveis pela viscosidade da saliva. Lisozima Pequena protena catinica presente na maioria das secrees. Produzidas por clulas dos ductos da glndulas e tb por macrfagos e PMN Lactoferrina Glicoprotena que se liga ao ferro produzida por clulas dos ductos das glndulas salivares Lactoperoxidase e on Enzima e substrato secretados por tiocianato (SCN) glndulas salivares e acinares. Produzidos tb por macrfagos e PMN Histatina Peptdeos pequenos ricos no aminocido histidina. Produzidos por clulas acinares das glndulas salivares. Cistatinas Protenas ricas no amino-cido cistena, produzidas por clulas acinares e tambm presentes no plasma. Sistema complemento Protenas sricas produzidas no fgado que atingem vrios fludos do corpo. Compreendem as protenas C1, C2, C3, C4, C5, C6, C7 C8 e C9. Atingem a boca atravs do fludo crevicular Leuccitos da linhagem Compreendem os PMNc e macrfagos. mielide Atingem a boca atravs do fludo crevicular. 90% dos leuccitos no fludo crevicular so PMN (neutrfilos)
a

Funo de defesa da cavidade bucal Envolvem microrganismos dificultando sua adeso aos tecidos bucais, bloqueia stios de adeso, aglutinam bactrias (aglutininas), facilitando sua deglutio. Promovem a lise bacteriana atravs da hidrlise das ligaes glicosdicas da parede celular. Seqestra o ferro do ambiente, o qual nutriente importante para microrganismos. Compe um sistema anti-microbiano que envolve a oxidao do tiocianato a partir da H2O2.a Inibem fungos como Candida albicans, inibem co-agregao bacteriana b Inibem proteases produzidas por bactrias periodontopatognicas. Atuam em reao de cascata formando porinas que perfuram as membranas de microrganismos. Auxiliam no reconhecimento bacteriano por fagcitos, atuam como mediadores de inflamao Fagocitam e destroem microrganismos. Produzem citocinas que participam da inflamao.

Sistema antimicrobiano lactoperoxidase: o substrato da lactoperoxidase o on tiocianato (SCN -). O tiocianato oxidado pela lactoperoxidase, a partir de sua reao com H 2O2, gerando um agente oxidante, o hipotiocianato (OSCN-), o qual txico a bactrias. A lactoperoxidase e tiocianato so secretados na saliva, enquanto a H2O2 na maior parte, produzida por bactrias. Baixas concentraes de H2O2 esto presentes na prpria saliva. b Termo co-agregao ser explicado nas prximas apostilas. c PMN: leuccitos polimorfonucleares (recordar aulas de imunologia 2o. semestre).

Fonte: Ref.(12) 2) Fatores de defesa adaptativos: so fatores de defesa cuja resposta intensificada e melhorada aps o contato com o agente agressor. Este tipo de resposta portanto aprimorada cada contato com os antgenos. Os fatores de defesa adapativos compreendem os anticorpos e linfcitos T e B (leuccitos originados da linhagem linfoctica na medula ssea). O principal isotipo de anticorpos presente na saliva a IgAS (IgA secretora), cujas principais funes consistem em aglutinar microrganismos (facilitando sua remoo pela saliva), bloquear stios de aderncia bacteriana s mucosas ou aos dentes e inativar enzimas ou outras protenas bacterianas extracelulares importantes para a virulncia. No tpico de crie dental, discutiremos melhor a importncia da maturao do sistema adaptativo de mucosas no processo de aquisio de bactrias cariognicas. Alm da IgAS, outros dois isotipos sricos, a IgG e IgM, atingem a cavidade bucal atravs do exsudato da mucosa e fludo crevicular. Estes dois isotipos promovem opsonizao microbiana e marcam bactrias para a fixao do

10 complemento, sendo importantes no controle de microrganismos da placa subgengival, a qual iremos estudar em mais detalhes.1 Composio da microbiota bucal de indivduos adultos Como vimos no tpico de aquisio e desenvolvimento da microbiota bucal, sabe-se que determinados grupos de microrganismos so comumente detectados nos diferentes nichos da cavidade bucal na maioria das pessoas. A pergunta , Como isto foi determinado e como estes microrganismos comuns foram identificados?. Na verdade, os pesquisadores tm dedicado muitos esforos para coletar, cultivar e classificar microrganismos dos diversos stios da boca, em diferentes grupos de indivduos. Assim, amostras de saliva, placa dental supragengival e subgengival e esfregaos das diversas reas das mucosas so analisados atravs de diversas tcnicas de cultivo microbiano e de tcnicas moleculares. As amostras bucais so cultivadas em diferentes meios de cultura bacteriana, sob diferentes condies de atmosfera e temperatura (normalmente cultivadas a 36-37 oC). Aps o crescimento, as colnias bacterianas com diferentes caractersticas so isoladas e analisas microscopicamente e bioquimicamente. As caractersticas morfolgicas e bioqumicas so ento utilizadas para classificao dos microrganismos em gneros, espcies e subespcies 2. Cada espcie ou grupo de espcies microbianas apresenta crescimento em meios slidos (contendo gar), formando colnias com morfologias distintas quanto cor, tamanho, rugosidade, aderncia ao gar, produo de polissacardeos extracelulares, entre outras caractersticas. A partir dos dados acumulados, os cientistas podem estimar como ocorre o desenvolvimento da microbiota nos diversos nichos de colonizao bucal. A proporo em que as espcies so identificadas tambm determinada, o que permite estimar, por exemplo, que a maior proporo de microrganismos bucais so espcies de estreptococos. Todo o trabalho para isolamento, cultivo e classificao microbiana ainda no suficiente para conhecermos, em detalhes, toda a composio da microbiota bucal. Isto porque no h um meio de cultura ideal para crescimento de todos os tipos de microrganismos. Espcies microbianas distintas requerem muitas vezes, nutrientes especficos para se desenvolver in vitro. Assim, possvel que muitas espcies microbianas presentes na boca ainda no tenham sido identificadas por falta de condies de cultivo ideais. H evidncias de que a composio da microbiota bucal foi subestimada nos estudos com culturas, uma vez que apenas os microrganismos cultivveis nas condies laboratorias usadas foram isolados. Em muitas comunidades microbianas, h indcios de que menos de 1% dos microorganismos so cultivveis (15). Apesar disto, estima-se que cerca de 50% das espcies bacterianas bucais foi cultivada e identificada (16). Este um conceito importante, porque possvel que alguns patgenos compreendam o segmento de microrganismos no cultivveis, e ainda no tenham sido identificados. Sabe-se que microrganismos muito bem adaptados ao hospedeiro como o Treponema pallidum e Mycoplasma pneumoniae so extremamente difceis de serem mantidos em culturas, porque perderam a habilidade de sintetizar muitas molculas essenciais, que normalmente obtm de seu hospedeiro (16). A partir da utilizao de tcnicas de gentica molecular, novas espcies no cultivveis foram identificadas, uma vez que estas tcnicas utilizam-se do DNA extrado de amostras microbianas da boca, sendo que os microrganismos no precisam estar viveis para que sejam identificados. Assim, mesmo que uma determinada espcie no cresa no meio de cultura escolhido, o seu material gentico poder ser identificado. Sabemos que no genoma dos diversos microrganismos, existem seqncias que
verifique mais detalhes sobre como a IgA produzida e atinge as secrees nas suas apostilas de imunologia! Recorde opsonizao e sistema complemento.
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Vide glossrio no final da apostila.

11 so universais, isto esto presentes em todos os microrganismos. Uma destas seqncias, so as dos genes que codificam as molculas de RNA ribossmico (RNAr). As seqncias que codificam a parte de RNAr 16S (que forma a subunidade 30S dos ribossomos) so muito teis para classificao bacteriana3, pois alm de estarem presentes em todas as bactrias (so seqncias conservadas) , variam em alguns segmentos que so especficos para cada espcie. Os genes RNAr 16S so ento seqenciados, e comparados com as seqncias conhecidas como caractersticas de cada espcie microbiana conhecida. A anlise das seqncias que codificam RNAr 16S so hoje muito utilizadas para classificar e identificar os diversos microrganismos da boca. Para isto, coletam-se amostras bucais e, ao invs de cultiv-las, extrai-se o material gentico (DNA) e seqeciam-se as partes que codificam o RNAr 16S. As anlises genticas so mais sensveis, abrangentes e rpidas, mas ainda so muito trabalhosas, pois inmeros fragmentos de DNA devem ser seqenciados, suas seqncias organizadas e comparadas com bancos de dados que indicam o grupo de microrganismo correspondente (16). Hoje se estima que a cavidade bucal humana de um indivduo adulto hospede cerca de 700 espcies bacterianas distintas, sendo que 50% destas no so cultivveis nos meios de cultura desenvolvidos at hoje (16). A maioria destas espcies so comensais, mas um subgrupo consiste de patgenos oportunistas que podem causar doenas bucais (principalmente a crie dental e as doenas periodontais). Outros ainda podem estar envolvidos em doenas sistmicas (7). Nesta apostila, vamos dar nfase apenas a alguns dos gneros bacterianos mais comumente identificados na boca. Para facilitar o seu estudo, vamos agruplos quanto sua morfologia e sua colorao pelo mtodo de Gram.4. Assim os diversos gneros bacterianos estudados sero divididos em cinco grupos distintos: A) Cocos Gram-positivos, B) Cocos Gram-negativos, C) Bacilos e filamentosos Gram-positivos, D) Bacilos e filamentosos Gram-negativos, E) Espiralados e curvos. Outras classes de microrganismos com protozorios, fungos e vrus sero abordados no item F.

Cocos Gram-positivos 1) Gnero Streptococcus So anaerbios facultativos (podem ser cultivados tanto em aerobiose quanto em anaerobiose), exigindo meios de cultura ricos em nutrientes. So bactrias homofermentativas (produzem apenas um produto final durante a fermentao) produtoras de cido lctico. Suas clulas so esfricas ou ovais, medindo 0,5-2,0m de dimetro e apresentando-se dispostas em pares ou cadeias. So imveis, no formam esporos e, s vezes, encapsulados.5 Como todas as bactrias produtoras de cido lctico (veremos outros gneros)
Os ribossomos bacterianos so compostos por 2 subunidades compostas de protena e RNA (RNAr): as subunidades 50S e 30S. A subunidade 50S composta de duas partes de RNAr (23S e 5S) sendo o restante de protena. J a subunidade 30S tem um parte de RNAr (16S), sendo o restante de protena. Recordar matria do primeiro semestre!
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Nota: Recordar o princpio da colorao de Gram ensinado no primeiro semestre! Recordar as aulas de morfologia e fisiologia de microrganismos do semestre passado para entender estas descries.
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12 so anaerbicas. Entretanto, diferentes de muitos microrganismos anaerbios, as bactrias produtoras de cido lctico no so sensveis ao O2, portanto podem crescer na presena de oxignio, sendo definidas como anaerbias facultativas. O gnero Streptococcus engloba um enorme nmero de espcies distintas, as quais ocupam diversos habitats no corpo humano e no ambiente. Neste gnero, h espcies que habitam predominantemente a cavidade bucal e as mucosas do trato respiratrio superior de humanos. A maior parte destas espcies so comensais, mas h tambm patgenos oportunistas. O grupo de espcies que formam a microbiota da cavidade bucal referido por muitos autores como do grupo viridans, mas este termo no ser adotado nesta apostila. A vasta maioria das espcies de estreptococos bucais alfa-hemoltica. Streptococcus spp. podem ser classificados em trs grupos segundo o padro de hemlise analisado atravs de culturas em meios slidos contendo sangue (gar sangue): 1) Streptococcus beta-hemolticos: produzem uma zona larga descorada correspondente beta-hemlise. A beta-hemlise responde hemlise completa de hemceas decorrente da ao de streptolisinas O ou S, produzidas por estas bactrias. 2) Streptococcus alfa-hemolticos: ao contrrio dos alfa-hemolticos, no produzem hemolisinas, mas causam a formao de uma zona de esverdeada a marrom ao redor de suas colnias em gar sangue, o que no decorrente de uma hemlise verdadeira, mas sim da descolorao e perda de potssio das hemceas (alfa-hemlise). 3) Streptococcus gama-hemolticos: no produzem nenhum grau de hemlise. Streptococcus so tambm classificados segundo critrios imunolgicos com base na presena de antgenos de superfcie celular (normalmente glicoprotenas). A pesquisadora Rebecca Lancefield , identificou diversos antgenos de superfcie que caracterizavam grupos distintos de espcies de estreptococos. Os grupos de antigenicidade foram ento denominados de grupos de Lancefield. Os grupos de Lancefield foram nomeados por letras, de A a O. Streptococcus spp. beta-hemolticas apresentam antgenos do grupo A. Algumas espcies de estreptococos bucais no encaixam na classificao de Lancefield. Espcies de Streptococcus da cavidade bucal podem ser subdividido em quatro grupos principais com base nas semelhanas das seqncias do gene RNAr 16S: 1) Grupo salivarius: inclui 2 espcies no homem, Streptococcus salivarius e Streptococcus vestibularis. Aproximadamente 50% das cepas deste grupo correspondem ao grupo K de Lancefield. 2) Grupo mitis: inclui 6 espcies, Streptococcus oralis, Streptococcus mitis, Streptococcus gordonii, Streptococcus sanguinis, Streptococcus parasanguis, Streptococcus crista, Streptococcus pneumoniae. 3) Grupo mutans: inclui 7 espcies distintas, Streptococcus mutans, Streptococcus sobrinus e Streptococcus rattus, Streptococcus cricetus, Streptococcus ferus, Streptococcus downeii, Streptococcus macacae. Apenas as 4 primeiras espcies so detectadas no homem. As espcies S. mutans e S. sobrinus so exclusivas de humanos. A espcie S. rattus, raramente encontrada no homem, sendo seu habitat natural, a cavidade bucal de ratos. A espcie S. cricetus tambm eventualmente detectada no homem, mas primariamente colonizadora da cavidade bucal de hamsters e ratos selvagens. As espcies Streptococcus downei e Streptococcus macacae colonizam macacos. A espcie Streptococcus ferus coloniza a boca de ratos selvagens. As espcies de humanos no so

13 susceptveis ao antibitico bacitracina, caracterstica que facilita a sua diferenciao de outras espcies animais. As espcies de estreptococos do grupo mutans no se enquadram na classificao de Lancefield, embora algumas cepas da espcie S. mutans pertenam ao grupo E. Entretanto, uma outra classificao sorolgica foi desenvolvida para este grupo de microrganismos pelo pesquisador sueco Douglas H. Bratthall (2,3). Este pesquisador identificou 8 sorotipos distintos (a, b, c, d, e, f, g, h), nos quais se encaixam as 7 espcies distintas de estreptococos do grupo mutans: a) S. mutans: inclui os sorotipos c, e e f. b) S. sobrinus: inclui os sorotipos d e g. c) S. rattus: inclui o sorotipo b. d) S. cricetus: inclui o sorotipo a. e) S. downei: inclui o sorotipo h. f) S. ferus: inclui o sorotipo c. g) S. macacae: inclui o sorotipo c. O sorotipo e corresponde ao grupo E de Lancefield. O grupo mutans ser estudado com mais detalhes, quando discutirmos seu papel na patognese da crie dentria (Apostila 3). 4) Grupo anginosus: inclui as espcies Streptococcus anginosus, Streptococcus constellatus e Streptococcus intermedius. Estas espcies colonizam a cavidade bucal e trato respiratrio superior de humanos, sendo que algumas cepas esto associadas a infeces purulentas. So na maioria alfa-hemolticos, no podendo ser identificados segundo a classificao de Lancefield, pois contm cepas do grupos A, C, F e G. 5) Grupo piognico: embora Streptococcus pyogenes possa ser detectado na boca, esta espcie consiste em patgeno da mucosa do trato respiratrio superior. No pertence a nenhum dos grupos acima, mas sim ao grupo piognico. S. pyogenes so beta-hemolticos e pertencem ao grupo de Lancefield A, sendo comumente referidos como estreptococos do grupo B. Outra espcie tambm includa no grupo piognico, a espcie Streptococcus agalactiae, a qual do grupo B de Lancefield e muitas vezes citados como estreptococos do grupo B. S. pyogenes e S. agalactiae so raramente detectados na boca, mas seus genomas apresentam semelhanas ao genoma da espcie S. mutans em cerca de 70 e 68% da sua extenso, respectivamente (6). Dentre as espcies bucais, h diversas comensais no patognicas, enquanto outras so patgenos de uma das principais doenas de interesse da odontologia, a crie dentria. As caractersticas das espcies de Streptococcus mais importantes detectadas na cavidade bucal esto resumidas na Tabela 3.

14 Tabela 3. Principais caractersticas das principais espcies do gnero Streptococcus que colonizam a cavidade bucal. Espcie Nicho ecolgico Caractersticas Principal S. salivarius
Mucosa bucal Esto entre primeiros colonizadores da boca, persistem por toda a vida sofrendo pouca influncia de fatores externos. Produzem polissacardeos de frutose (frutanos) a partir da sacarose. Podem ser alfa ou beta-hemolticos No produzem polissacardeos a partir da sacarose. -hemoltico. So colonizadores primrios dos dentes, aumentando em proporo com a erupo destes. So comensais, estando associados placa de dentes hgidos. Produzem polissacardeos de glicose (glucano) a partir da sacarose. Produzem enzimas que clivam anticorpos IgA, as IgA1-proteases. A maioria do grupo de Lancefield H; -hemolticos. Esta espcie pode ser dividida em S. mitis biovar 1 e 2. So detectados antes e aps erupo dos dentes. Podem ser colonizadores primrios dos dentes em condies de sade, mas tambm em placas associadas a leses de crie. Variam quanto produo de polissacardeos a partir da sacarose. Algumas cepas produzem IgA1-proteases, mas isto incomum. -hemolticos. Difceis de serem diferenciados bioquimicamente dos S. mitis. Caractersticas muito semelhantes. Produzem IgA1-proteases; hemolticos. So do grupo H de Lancefield. Produzem polissacardeos a partir da sacarose. No produzem IgA1 proteases; -hemolticos. No produzem polissacardeos extracelulares a partir da sacarose. Gama-hemolticos, podendo ser -hemolticos.

S. vestibularis S. sanguinis

Mucosa bucal Alta afinidade s superfcies dentrias

S. mitis

Mucosas bucais principalmente.

Mucosa bucal e dentes, mucosa farngea Superfcies dentrias, S. gordonii mucosa bucal e farngea. S. parasanguis Mucosa nasofarngea e boca. Amostras de sangue e urina. Mucosa nasofarngea S. crista e boca

S. oralis

Espcie variante, semelhante a S. sanguinis. Algumas cepas produzem polissacardeo extracelular a partir da sacarose. hemolticos. No se enquadram na classificao de Lancefield. Podem ser identificados na boca. Os stios de colonizao S. pneumoniae Mucosas do trato respiratrio primria so as mucosas da orofaringe. Cepas variam quanto virulncia, podendo causar faringites, otite mdia, meningite. Produzem IgA1-protease. -hemoltico. a Superfcies dentrias Embora no sejam colonizadores primrios dos dentes, S. mutans aumentam em proporo em placas dentais associadas crie, pois so altamente tolerantes a meio cidos e apresentam grande capacidade de produzir diferentes tipos de glucano a partir da sacarose. No produzem IgA1 proteases; -hemolticos. Superfcies dentrias Semelhantes a S. mutans em vrios aspectos da patognese da S. sobrinus crie dental. So menos prevalentes. Algumas cepas apresentam alta virulncia. No produzem IgA1 proteases. Maior parte hemoltica; algumas cepas so -hemolticas. S. constellatus, Mucosas bucais e trato Podem estar associados microbiota comensal das mucosas bucais e respiratrias ou a infeces purulentas. Podem ser dos S. intermedius, respiratrio grupos A,C, F ou C de Lancefield. Cepas variam entre -,- ou S.anginosus. -hemlise.

Fonte: (22)

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2) Gnero Enterococcus Enterecoccus so estreptococos de origem fecal do grupo D de Lancefield. So hemolticos. Os enterococcus tm sido encontrados em baixas concentraes nas diversas reas da cavidade oral; a espcie mais isolada o Enterococcus faecalis que, por ser mais resistente aos agentes antimicrobianos, pode estar relacionado a processos infecciosos dos canais radiculares dentrios e bolsas periodontais (21). 3) Grupo de Cocos anaerbios Gram-positivos A nomenclatura dos gneros de cocos Gram-positivos anaerbios estritos ainda discutida. A espcie antes reconhecida como do gnero Peptostreptococcus, Peptostreptococcus micros, atualmente considerada como do gnero Micromonas, sendo a espcie renomeada para Micromonas micros. A espcie Peptostreptococcus magnus foi tambm recentemente reclassificada como Finegoldia magna (19). Estes gneros incluem cocos Gram-positivos anaerbios estritos, apresentando-se dispostos em cadeias longas ou curtas, cachos irregulares, ttrades e dois a dois. Espcies deste gnero so comumente detectadas na cavidade bucal. So considerados como parte da microbiota bucal comensal. A espcie Peptostreptococcus micros considerada comensal, sendo identificada como compreendendo at 3% da microbiota da placa dental subgengival de indivduos com periodonto saudvel. Entretanto, estes microrganismos podem agir como patgenos oportunistas e parecem aumentar em proporo em amostras microbianas associadas a infeces bucais como doena periodontal, abcessos endodnticos e periodontais (13). 4) Gneros Micrococcus e Staphylococcus Staphylococcus e Micrococcus so raramente identificados na cavidade bucal de indivduos saudveis, portanto so considerados como parte da microbiota indgena normal da boca. Micrococcus podem ser isolados da pele, embora sejam mais comumente identificados em objetos inanimados. No entanto, Staphylococcus aureus pode ser isolado de quadros de faringite, amigdalite, sinusite, osteomelite da face e abscessos dentrios (13). Micrococcus so aerbios obrigatrios. Apresentam forma de cachos irregulares, ttrades, ou agrupados de dois a dois. Assim como as bactrias do gnero Staphylococcus (mais raramente detectados na boca), so catalase-positivos, isto , produzem a enzima catalase, a qual degrada o perxido de hidrognio em gua e oxignio. Esta caracterstica utilizada para diferenciar estes dois gneros de outros gneros de cocos gram-positivos bucais, como Streptococcus (13). Para isto, goteja-se H2O2 sobre colnias de culturas em placa de Petri e verifica-se se h ou no a liberao de bolhinhas de ar. B) Cocos Gram-negativos 1) Gnero Veillonella So anaerbios estritos que se apresentam em arranjo de grandes massas e ou de cadeias curtas. As Veillonellas spp. colonizam as mucosas do trato respiratrio superior e da boca. A espcie mais comum na boca Veillonela parvula. Este espcie coloniza principalmente o dorso da lngua, mas pode estar associada placa dental, crescendo em

16 proporo na placa cariognica. Isto porque as Veillonella spp. utilizam cido lctico como fonte de energia. Assim, quando o biofilme dental tem mais bactrias acidognicas (como S. mutans), mais substratos so produzidos para as Veillonelas e estas passam a proliferar. Alm disto, uma placa cariognica, como vamos ver a seguir, apresenta maior espessura, diminuindo a exposio dos microrganismos do seu interior ao oxignio, o que favorece as Veillonela spp. Este u m bom exemplo de como a interao entre diferentes espcies de bactrias pode influenciar na composio da comunidade microbiana, como veremos na Apostila 2. 2) Gnero Neisseria O gnero Neisseria compreende bactrias aerbicas, que crescem melhor na presena de CO2 e que podem crescer lentamente em anaerobiose. No so mveis, como formato de cocos. As mucosas do trato respiratrio e cavidade bucal apresentam baixos nveis de bactrias deste gnero. Entretanto, algumas espcies, como a Neisseria sicca, so isoladas do dorso da lngua, outras reas das mucosas bucais e saliva. A espcie Neisseria mucosa pode ser detectada em altas propores na placa dental associada a superfcies hgidas e tambm em placas subgengivais associadas ou no doena periodontal (16). Algumas espcies de Neisseria so sacarolticas e produzem polissacardeos extracelulares. As Neisseria spp. podem contribuir para a formao de condies de anaerobiose nos estgios iniciais da placa dental, favorecendo a sucesso de microrganismos anaerbios (13). A espcie patognica, Neisseria gonorrhoeae, patgeno da gonorria, pode ser tambm identificada em indivduos infectados com faringite (21). 3) Gnero Moraxella Podem ser isolados na forma de cocos ou bacilos Gram-negativos, aerbios. Consiste em gnero semelhante ao gnero Neisseria, comumente isolados do homem. Algumas espcies deste gnero so comensais e outras patognicas. A espcie Moraxella catahallis (previamente designada como Branhamella catahallis) um patgeno do trato respiratrio associado otite mdia em crianas e infeces do trato respiratrio inferior em adultos. Estes microrganismos podem ser identificados na cavidade bucal, mas com baixa freqncia e baixos nveis (13,21). C) Bacilos e filamentosos Gram-positivos 1) Gnero Lactobacillus Compreende vrias espcies de microorganismos anaerbios facultativos (s vezes microaerfilos) e so tambm produtoras de cido lctico atravs da fermentao. Os Lactobacillus foram divididos em trs grupos principais, e compreendem cerca de 70 espcies distintas. As espcies de lactobacilos podem ser classificadas como homofermentativas, isto , produzem principalmente cido lctico, ou como herofermentativas, devido a produo de vrios cidos orgnicos, etanol e gs carbnico. Os lactobacilos so colonizadores das mucosas bucais, principalmente do dorso da lngua, assim como outras mucosas do corpo humano. So as bactrias mais resistentes a baixos pHs, podendo crescer bem em meios com pH de 4.0 (10). Os lactobacilos so importantes para a produo de diversos produtos que consumimos diariamente, principalmente derivados da fermentao do leite como iogurte, Yakult, alm em alguns processos de conservao (sua capacidade fermentativa associada resistncia a baixos pH inibe o crescimento de outros microrganismos). Por causa desta alta tolerncia a cidos os lactobacilos so facilmente isolados atravs da utilizao de meios de cultura ricos com pH entre 5.0 e 4.0.

17 Embora os lactobacilos sejam microrganismos comensais de mucosas do nosso corpo (verificar exemplos), na cavidade bucal, esto associados placa dental cariognica, sendo considerados patgenos da crie. Em condies de sade, lactobacilos so detectados em baixas propores. As espcies mais comuns na cavidade bucal so Lactobacillus casei e Lactobacillus acidophilus, ambas homofermentativas. Espcies heterofermentativas como Lactobacillus fermentum, Lactobacillus cellobiosus, Lactobacillus brevis, tambm podem ser detectadas na cavidade bucal, porm com menor freqncia (10) 2) Gnero Actinomyces Os Actinomyces fazem parte dos colonizadores primrios das superfcies dentrias, sendo predominantes tanto na placa supragengival como na placa subgengival (1,10,16). Actinomyces so bactrias sacarolticas e crescem na forma de cadeias filamentosas ramificadas que so denominadas miclio. Os miclios destas bactrias so anlogos aos miclios formados por fungos filamentosos. Algumas espcies tambm crescem na forma de bacilos curtos. So anaerbios facultativos, mas se desenvolvem melhor na presena de gs carbnico, tanto em aerobiose quanto em anaerobiose. Actinomyces so geralmente microrganismos no patognicos e seis espcies deste gnero j foram identificadas na placa dental (Tabela 4). As espcies mais prevalentes na placa dental bacteriana so Actinomyces naeslundii genoespcie 2 (previamente denominado Actinomyces viscosus sorotipo II), Actinomyces naeslundii sorotipo II e III e Actinomyces sorotipo IV. Este gnero foi associado ao desenvolvimento de leses de crie radicular, mas seu papel na patogenicidade de doenas bucais, como a crie e doena periodontal controverso. Tabela 4. Principais espcies do gnero Actinomyces detectadas na cavidade bucal Espcie Classificao anterior Actinomyces georgiae Actinomyces sp. subgengival atpico Actinomyces gerencseriae A. israelii sorotipo II A. israelii A. israelii sorotipo I A. odontolyticus A. odontolyticus A. naeslundii genospcies 1 A. naeslundii sorotipo I A. naeslundii genospcies 2 A. naeslundii sorotipo II e III, A. viscosus sorotipo II, A. meyeri Fonte: (13) 3) Gnero Corynebacterium Este gnero envolve um grupo diverso de espcies anaerbias facultativas encontrados em animais e plantas. Em crescimento normal Corynebacterium tm uma extremidade mais bojuda o que lhe d um formato semelhante a uma clava, o que determinou o nome deste gnero (do Grego: korinu = clava). A espcie Corynebacterium matruchotii detectada exclusivamente na cavidade bucal, mas em baixos nveis (13). So freqentemente encontrados na placa dental supragengival e subgengival, normalmente associada sade (16). 4) Gnero Eubacterium Esse gnero ainda no est bem definido e inclui microorganismos filamentosos anaerbios estritos que se apresentam variveis quanto colorao pelo mtodo de Gram.

18 Compreende espcies sacarolticas (por exemplo, E. saburreum e E. yurii) e assacarolticas (E. nodatum, E. saphenum, E. brachy). As espcies assacarolticas tm sido identificadas na placa associada a bolsas periodontais profundas (13,16). D) Bacilos e filamentosos Gram-negativos 1) Gnero Fusobacterium A maior parte das espcies deste gnero so anaerbios estritos. Sua forma mais comum a fusiforme, sendo bem alongados ( 5 a 25 m de comprimento), delgados e com as extremidades pontiagudas. Entretanto, algumas espcies podem apresentar forma mais bacilar. Produzem cido butrico e cido actico a partir da fermentao de amino-cidos e acares. Tambm removem enxofre dos amino-cidos cistena e metionina, produzindo ac. butrico, amnia, sulfito de hidrognio e metilmercaptana. Estes compostos produzem mal odor, estando associados halitose (8). Algumas espcies so mveis, outras no. A espcie mais comum na cavidade bucal o Fusobacterium nucleatum (no mvel), sendo parte da microbiota comensal. Entretanto, a classificao desta espcie tem sido revista e subdividida em diferentes subespcies, as quais podem estar associadas sade ou doena. Assim, a subespcie polymorphum est associada a condies de sade, enquanto a subespcie nucleatum mais comumente associada a bolsas periodontais. Fusobacterium spp. desempenham papel importante no desenvolvimento de placa dental bacteriana, pois funcionam como uma ponte entre os colonizadores primrios e secundrios dos dentes, atravs de co-agregao/adeso com diversos microrganismos comensais e/ou patognicos (vide Apostila 2). Embora no sejam considerados patognicos isoladamente, as subespcies associadas doena tm capacidade de co-agregar a patgenos da placa subgengival, como Porphyromonas gingivalis e Tannerella forsythensis, o que pode favorecer a colonizao por estes patgenos. A espcie Fusobacterium animalis encontra-se em maior proporo nas placas dentais cariognicas (1) e associada doena periodontal (16). Cepas de F. nucleatum aumentam em proporo tambm em outras infeces de cabea e pescoo, trax, pulmo, fgado e abdmen (13). 2) Gnero Bacteroides A maioria dos bacilos Gram-negativos anaerbios eram anteriormente classificados como do gnero Bacteroides. Bacteroides so microrganismos anaerbios estritos, sacarolticos. A maioria das espcies de Bacterides so comensais, sendo colonizadores predominantes d o trato intestinal Atualmente, poucas espcies bucais esto includas neste gnero, sendo Bacteroides fragilis a mais comum, embora esta espcie seja mais comumente detectada no intestino. A espcie B. forsythus, associada doena periodontal hoje denominada Tannerela forsythensis (13). 3) Gnero Porphyromonas Representam os bastonetes Gram-negativos anaerbios estritos, no-mveis e assacarolticos. A principal fonte de carbono e energia destas bactrias so as protenas, razo

19 pela qual este gnero est envolvido na destruio dos tecidos do hospedeiro. Hemina um substrato essencial para crescimento de Porphyromonas spp. Uma caracterstica tpica destes microrganismos a produo pigmento preto, quando cultivados em meio gar sangue, promovendo o crescimento de colnias bacterianas negras. Por isto, estas bactrias so comumente referidas como do grupo negro. Esta pigmentao ocorre devido aquisio de ferro, com acmulo de hemina (13). A espcie Porphyromonas gingivalis altamente patognica, sendo detectada comumente na placa subgengival em bolsas periodontais, em periodontites agudas e crnicas. P. gingivalis produzem um grande nmero de proteases, hemolisinas e produtos metablicos txicos que lesam os tecidos bucais. So capazes de invadir e destruir clulas e matriz extracelular dos tecidos gengivais e protenas importantes do sistema imunolgico como citocinas. Sua capacidade de invadir clulas epiteliais as protegem da ao de fagcitos (leuccitos do sistema imune inato: macrfagos e neutrfilos). Tambm degradam anticorpos e protenas do complemento. Apresentam cpsula, o que dificulta o reconhecimento e destruio por fagcitos e fmbrias que esto envolvidas na adeso pelcula adquirida do esmalte (vide Apostila 2) e s clulas epiteliais. Alm disto, apresentam tolerncia ao oxignio podendo resistir a exposies dos stios subgengivais. Outras espcies, como a Porphyromonas endodontalis, esto associadas a infeces para-endodnticas (13). Apesar da sua patogenicidade estar associada colonizao das reas subgengivais, espcies de Porphyromonas, assim como as espcies de Prevotella, podem ser detectadas em amostras de saliva (11). 4) Gnero Prevotella Bactrias deste gnero so bastonetes anaerbios estritos, sacarolticos (fermentam fortemente ou fracamente carboidratos). Algumas espcies so produtoras de pigmento negro sendo, juntamente com Porphyromonas, comumente referidas como do grupo de bactrias negras. Entretanto, outras espcies de Prevotella no produzem pigmentos negros. Quatro espcies so encontrados em maior proporo na placa subgengival associada doena periodontal e so todas espcies negras: Prevotella intermedia, Prevotella nigrescens, Prevotella melaninogenica e Prevotella loescheii. A diferenciao destas espcies difcil e sua classificao est sendo modificada. Entre as espcies bucais no pigmentadas encontramse Prevotella buccae, Prevotella oralis, Prevotella dentalis, Prevotella veroralis. Espcies deste gnero podem ser identificadas na placa subgengival, abcessos dentoalveolares e infeces para-endodnticas. Espcies como P. melaninogenica podem tambm so detectadas com freqncia no dorso da lngua e saliva (13). 4) Gnero Leptotrichia So bactrias filamentosas anaerbicas, que produzem grandes quantidades de cido lctico, sem a produo de acido butrico. A espcie mais encontrada na boca a Leptotrichia buccalis encontrada em grande proporo na placa dental supragengival e subgengival (1,13,16,21). Acredita-se que seja parte da microbiota comensal. 5) Gnero Actinobacillus So bacilos anaerbios facultativos, embora sejam tambm referidos como cocobacilos devido ao aspecto de bacilo curto. Em placas de cultura, formam colnias com aspecto de estrela. A espcie bucal mais estudada o Actinobacillus actinomycetemcomitans (Aa), pois

20 esta espcie comumente detectada em pacientes com periodontites agudas agressivas, como a periodontite juvenil localizada (PJL). Maior ateno a esta espcie tem sido dada recentemente pela sua possvel participao nas placas de gordura nas vasos sangneos, abcessos cerebrais, endocardite bacteriana e osteomielite. Aa produzem diversas proteases como as colagenases e IgG-proteases. Aa tm capacidade de despistar o sistema imunolgico, resistindo fagocitose e destruio por neutrfilos e produzindo substncias txicas aos leuccitos denominadas de leucotoxinas. Cepas distintas de Aa variam quanto produo de leucotoxinas, sendo as cepas mais leucotxicas associadas s periodontites agudas. Por outro lado, cepas menos leucotxicas esto mais frequentemente associadas s periodontites crnicas (4). A prevalncia de Aa na cavidade bucal parece ser maior nas populaes brasileiras, sendo esta espcie detectada em cerca de 75 e 40% dos indivduos com periodontites agressivas e crnicas, respectivamente. 6) Gnero Capnocytophaga Anaerbias facultativas mveis, as espcies deste gnero identificadas na boca incluem Capnocytophaga sputigena, Capnocytophaga gingivalis, Capnocytophaga haemotytica, Capnocytophaga ochracea. Capnocytophaga gingivalis e C. sputigena tm sido associada doena periodontal (16). Produzem IgA1-proteases (13). 7) Gnero Haemophilus Este gnero compreende a maioria dos bacilos Gram-negativos anaerbios facultativos da boca. Anteriormente no eram detectados atravs de cultura bacteriolgica, pois somente mais recentemente descobriu-se que estas bactrias necessitam de dois nutrientes essenciais para seu crescimento in vitro, hemina e adenina nicotinamida (dinucleotdeo). Tm formato bacilar e esto presentes tanto nas mucosas bucais como na saliva e superfcies dentrias. Algumas espcies detectadas na boca so Haemophilus parainfluenzae bitipos I, II e III, Haemophilus segnis e Haemophilus haemolyticus. Haemophilus influenzae um patgeno comum da mucosa naso-farngea, mas raramente isolado da boca (13). 8) Gnero Eikenella So anaerbios facultativos. As principais espcies deste gnero so a Eikenella saburreum e Eikenella corrodens. Colonizam principalmente o dorso da lngua e outras reas da mucosa, sendo detectadas em baixos nveis na placa dental (13). E) Microorganismos espiralados e curvos 1) Gnero Treponema So espiroquetas, o que se entende por bactrias Gram-negativas, mveis, espiraladas. Espiroquetas envolvem outros gneros alm de treponemas, incluindo-se o gnero Borrelia, Leptospira, Cristipira e Spirochaeta, os quais no abordaremos nesta apostila. Espiroquetas esto espalhados em diversos habitats aquticos e em animais, sendo alguns causadores de importantes doenas, como a espcie Treponema pallidum, patgeno da sfilis. Treponema spp. inclui espcies patognicas e comensais em humanos. Diferentemente de outros espiroquetas, as espcies de Treponema tm morfologia no de uma hlice acentuada, mas de

21 hlice esticada, formando curvas mais rasas. Apresentam flagelos responsveis por sua motilidade. Todos os espiroquetas presentes na cavidade bucal so do gnero Treponema. Estimase que a cavidade bucal abriga cerca de 60 espcies distintas de Treponema (16). Os Treponemas so numerosos na placa subgengival (16), sendo facilmente detectados em campo escuro. Algumas espcies so assacarolticas (por exemplo T. denticola), enquanto outras so capazes de fermentar carboidratos (T. socranskii). So difceis de serem cultivados in vitro (13). Na cavidade bucal, algumas espcies de Treponema so isolados de placas dentais subgengivais associadas doena periodontal. Estas compreendem Treponema denticola, Treponema socranskii subespcie buccale, Treponema maltophilum, e Treponema medium. O T. pallidum pode ser encontrado na cavidade oral, principalmente em indivduos com leses primrias (cancro duro) ou secundrias de sfilis (13,21). 2) Gneros Campylobacter, Wolinella e Selenomonas So descritos como bastonetes curvos, em espiral, mveis. So microaerfilos. As espcies Wolinella curva e Wolinella recta foram mais recentemente reclassificadas com Campylobacter curvus e Campylobacter rectus, respectivamente. Entre as espcies detectadas na placa dental subgengival associadas doena periodontal esto C. gracilis, C. concisus, C.rectus (16). So difceis de serem cultivados (13). As espcies de Selenomonas associadas doena periodontal incluem S. sputigena, S. noxia, S. infelix (16). Estes microrganismos so difceis de serem cultivados. Microrganismos bucais eucariticos Alm das bactrias (microrganismos procariotos), microorganismos eucariticos tambm colonizam a cavidade bucal. Estes ltimos incluem os fungos (leveduras) e protozorios. A) Fungos - Gnero Candida O gnero Candida o mais comumente identificado na boca. Cerca de 50% dos adultos saudveis apresentam espcies de Candida na boca. So considerados parte da microbiota comensal, mas so microrganismos oportunistas, causando a candidase, quando a microbiota comensal desestabilizada, ou em indivduos com deficincia do sistema imunolgico. A espcie mais comum na boca a Candida albicans, mas outras espcies so tambm comumente detectadas, como C. glabrata, C. tropicalis, C. dublinienses e C. krusei. Candida spp. crescem tanto na forma unicelular (forma de levedura), como na forma filamentar (formando hifas e/ou pseudo-hifas). A forma filamentar est normalmente associada virulncia, sendo identificada em casos de candidase. Candida spp. crescem preferencialmente em meios cidos, estando associadas a bactrias produtoras de cido lctico nos dentes e mucosas. Por isto, os nveis destes fungos so muitas vezes analisados na cavidade bucal como indicadores da atividade de crie, onde prevalecem as bactrias acidognicas6. B) Protozorios
6

Recordar a patogenia das espcies de Cndida descrita no primeiro semestre.

22 No fazem parte da microbiota comensal, embora possam ser detectados em algumas situaes. Os Gneros mais comumente identificados na boca incluem (1) Entamoebas e (2) Tricomonas. O primeiro gnero inclui a espcie Entamoeba gingivalis, identificada nos tecidos periodontais de indivduos que receberam radioterapia. O segundo, inclui a espcie Trichomonas tenax, identificada no sulco gengival, com patogenicidade desconhecida (13). Vrus Os vrus podem ser detectados na boca, mas so considerados transitrios, com exceo do vrus herpes simplex tipo I, pois estes podem ser frequentemente identificados em pequena proporo da saliva de indivduos assintomticos. Os vrus atingem a boca atravs da saliva ou fludo crevicular, em indivduos infectados em outras regies do organismo. O vrus da hepatite B podem ser detectados na saliva, assim como o vrus HIV (13).

Genoma dos principais patgenos da boca.

Os genomas de diversas espcies comensais e patognicas da cavidade bucal foram seqenciados, ou seus projetos de sequenciamento esto em andamento (5). Atravs do sequenciamento destes genomas, pode-se estimar/identificar os diversos genes bacterianos, obter informaes sobre suas seqncias regulatrias (promotoras e outras) e sua organizao genmica. Os dados do genoma so importantes para o estudo dos mecanismos que regulam a expresso gnica e identificao de genes de virulncia, os quais podem ser alvos para diversas terapias antimicrobianas. A comparao de genomas entre espcies bucais e outras espcies patognicas em humanos tem sido importante para a compreenso dos mecanismos moleculares de virulncia e da transferncia gentica entre as espcies. Mais de 250 projetos de sequenciamento de espcies microbianas distintas tm sido desenvolvidas no The Institute for Genomic Research (TIGR) e depositadas no banco de dados TIGR-Microbial Database, disponveis atravs do site http://www.tigr.org/. Os genomas so tambm depositados no GenBank, banco de dados pblico do National Center for Biotechnology Information, E.U.A., cujo acesso pode ser feito atravs do site do NCBI (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/genomes/). O total de 11 espcies distintas da cavidade bucal tem os seus genomas completos ou em fase de finalizao (Tabela 5).

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Tabela 5. Genomas de bactrias bucais completos ou em fase de concluso. Espcie Cepa Tamanho do Instituies envolvidas genoma (Mb*) Actinobacillus HK1651 2,2 Universidade de Oklahoma, actinomycetemcomitans E.U.A. Bacterides forsythusa ATCC 43037 TIGR, NCBI Fusobacterium nucleatum ATCC 25586 2,17 TIGR, The Forsyth Institute, E.U.A. Fusobacterium nucleatum ATCC10953 2,4 Baylor College of Medicine UCLA, E.U.A. Porphyromonas W83 2,34 TIGR, The Forsyth Institute, gingivalis E.U.A. Prevotella intermedia 17 2,8 TIGR, The Forsyth Institute, E.U.A. Streptococcus gordonii Challis 2,2 TIGR, E.U.A. Streptococcus mitis NCTC 12261 2,2 TIGR, E.U.A. Streptococcus mutans UA159 2,2 Universidade de Oklahoma, E.U.A. Streptococcus sanguinis SK36 Virginia Commonwealth University, TIGR, E.U.A. Streptococcus sobrinus 6715 TIGR, E.U.A. Treponema denticola ATCC 35405 3,0 TIGR, E.U.A.
a

Web sites para pesquisa www.genome.ou.edu, NCBI www.genome.ou.edu, NCBI www.TIGR.org, NCBI www.hgsc.tmc.edu/microbial/Fnuc leatum www.TIGR.org, NCBI www.TIGR.org, NCBI www.TIGR.org www.TIGR.org, NCBI www.genome.ou.edu, NCBI www.TIGR.org, NCBI www.TIGR.org www.TIGR.org

Recentemente reclassificado com Tannerela forsythensis. Fontes: (5); TIGR Database, NCBI Database.

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Agradecimentos
A elaborao desta apostila contou com a colaborao do aluno do Curso de Graduao em Odontologia da FOP-UNICAMP, Leandro Moraes Furlan (RA 24277).

Referncias
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Glossrio Microrganismos comensais: microrganismos que vivem em equilbrio com o hospedeiro, no causam doenas e so importantes para a manuteno da sade. Microrganismos oportunistas: microrganismos que no causam patologias em condipes normais, mas que se tornam invasivos quando as defesas naturais so comprometidas. Microrganimos parasitas: microganismos que crescem no interior ou em um hospedeiro Microrganismos patognicos (patgenos): microrganismos que causam uma doena no hospedeiro Gnero: uma coleo de espcies bacterianas que compartilham um grupo de caractersticas Espcie: em microbiologia se refere ao conjunto de cepas que compartilham as mesmas propriedades , mas que diferem em uma ou mais propriedades significativas de um outro grupo de cepas; duas espcies de procariotos geralmente diferem em 3% das suas seqncias do RNAr 16S (Brook, pg. 423). RNAr 16S: polinucleotdeo (aprox. 1500 bases) que funciona como parte da subunidade menor do ribossomo de procariotos. So seqncias conservadas que utilizadas para anlise evolutiva de procariotos. Corresponde ao RNAr 18S dos eucariotos. Microbiota indgena: conjunto de microrganismos que formam uma comunidade microbiana associada aos tecidos saudveis. A maior parte dos microrganismos da microbiota indgena so comensais, mas tambm podem existir microrganismos oportunistas e at mesmo alguns microrganismos patognicos em baixos nveis.