Documento Sem Nome
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Uma das perguntas que tem sido feita a partir da eclosão dos protestos é: como é que
chegamos até aqui? Seria o racismo delírio, miopia, ignorância ou projeto? Para responder
essas perguntas, primeiro é preciso resgatar as narrativas que foram historicamente
forjadas.
Silvio Almeida, um dos maiores intelectuais contemporâneos, colocou uma lupa nessa
temática na sua obra intitulada “O que é racismo estrutural?” da coleção Feminismos Plurais
coordenado por Djamila Ribeiro. Durante muito tempo o racismo ficou adstrito apenas à
esfera do comportamento individual, mas o jurista e filósofo nos apresentou outras
dimensões esmiuçando o viés institucional e estrutural.
O racismo faz parte da história moderna guardando relação com a formação do Estado.
Segundo o jurista, o conceito de raça foi desenvolvido pelo modelo do Estado burguês para
eleger o sujeito universal e organizar as relações políticas, econômicas e jurídicas a partir
da categorização em classes dos indivíduos com o fim de preservar o grupo hegemônico.
Nesse contexto, como o Estado é responsável por formar uma unidade, o nacionalismo
tende a hierarquizar as multiplicidades cultural, étnica, religiosa e sexual, criminalizando,
domesticando ou estigmatizando aquele que não interessa à identidade nacional.
Nessa perspectiva, o autor aproveita as lições de Foucault para conceituar o racismo como
uma tecnologia de poder que opera por meio do controle havendo, por conseguinte, a
discriminação sistêmica de grupos étnico-raciais subalternizados.
Assim, como a tese do jurista está calcada no racismo estrutural, ele explora as diferenças
entre racismo individual, institucional e estrutural. No racismo individual é flagrante o viés
patológico, comportamental e imoral revelado por aquele que o pratica.
O autor alerta que o individuo que se apresenta como antirracista não pode argumentar que
o racismo é estrutural como desculpa para não rever as suas ações, vez que a
responsabilização é parte do processo. Assim, é fundamental perceber que há uma dialética
entre as ações individuais e a estrutura.
No tocante a representatividade, o autor elucida que por si só ela não é suficiente para
resolver o racismo, pois embora enxergar negros em espaços de poder seja importante, o
recrutamento de alguns negros nesses espaços serve puramente para reforçar o racismo,
visto que visibilidade negra não é poder. Assim, não é possível admitir uma maquiagem ao
problema, uma vez que o racismo exige mudanças profundas e concretas para que não
seja eterniza o cenário de desigualdade racial.
Assim, para o filósofo, há uma segregação não oficial entre negros e brancos, já que existe
uma naturalização de negros em posições subalternizadas e, de outro lado, há uma
supremacia branca politicamente constituída.
O estudioso perpassa por várias dimensões do racismo: histórica, política, ideológica,
econômica e jurídica, e como não pretendemos esgotar o tema, é crucial a leitura de sua
obra na integralidade, a qual sintetiza de forma incisiva, crítica, propositiva e primorosa que
o racismo é o grande obstáculo de um projeto de nação.