Neurose de Abandono

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Neurose de abandono

A neurose de abandono difere das neuroses anteriores, pois o complexo de Édipo


não exerce tanto poder em sua formação. Ela não faz parte das neuroses clássicas
discutidas e tratadas por Freud, embora ele fale de um estado de desamparo que acomete
o ser humano em geral.
O termo Neurose de abandono “abandonique” foi criado por Germaine Guex em
(1950) depois de vinte e cinco anos de exaustivo trabalho com neuróticos de abandono, e
que serve de base para o trabalho analítico com sujeitos que assim se apresentam. Essa
terminologia designa o quadro clínico onde predomina a angustia do abandono e uma
grande necessidade de segurança.
De acordo com Guex (1973) o indivíduo com sentimento de abandono, na maioria
das vezes, continua presa a satisfações pré-genitais, e se chega ao prazer genital o
investimento no objeto é muito mais afetivo do que sexual. É a relação com a mãe, que
condiciona a estrutura do abandono. Ele se genitaliza tardiamente e vive um complexo de
Édipo mal caracterizado. Nessa mesma medida, o desempenho do superego fica menos
fecundo do que em outros neuróticos, ele é regido pelo ideal do eu, tão tirânico como o
superego. Nisso o sujeito busca corresponder ao que os outros esperam dele, construir-se
na medida do desejo do outro para obter dele o amor esperado.
Nessa neurose o paciente vive em dois planos, primeira infância e na idade real,
confundindo ambas e comportando-se de maneira decorrente. O abandono é sentido como
atual e em cada nova situação em que se vê rejeitado os sentimentos são igualmente
experimentados.
Esse abandono não é necessariamente real, mas foi sentido como tal. O
“abandonique” vê tudo e todos, a começar por si próprio, do ponto de vista do abandono
vivido ou temido.
As etiologias da síndrome do abandono são: constituição da criança, atitude
afetiva dos pais, abandonos traumáticos. Os dois primeiros já são suficientes para a
ruptura do equilíbrio psíquico. Os acontecimentos traumáticos constituem um elemento
secundário. O fator constitucional desempenha um papel muito importante no
desenvolvimento da angústia de abandono.

“[...] diante de uma privação de amor sem motivação objetiva, como, por
exemplo, nos inúmeros casos de falsa presença materna, a criança se sente só,
não o compreende e se angustia. Ela pressente e sente os afastamentos que se
marcam, os abismos que se criam, a incompreensão que se instala. [...] A
criança pequena perde a auto estima, quando perde o amor; ela a reencontra,
quanto reencontra o amor. [...] Um ego amado sente-se forte, um ego
abandonado sente-se fraco e exposto ao perigo.” (GUEX, 1973, p. 120 - 121).

A pessoa com sentimento de abandono se apresenta com diferentes aspectos e nem


sempre é fácil chegar a um diagnóstico. São classificados em duas categorias: os
pacientes que tem uma consciência mais ou menos nítida de uma avidez afetiva, estes, na
analise, logo de início falam de suas decepções. Sabem da falta de confiança em si
mesmos. Já a segunda categoria estes não tem nenhuma consciência de sua avidez afetiva,
na análise pode orientar o analista para falsas direções e ao mesmo tempo
inconscientemente defendem-se contra a investigação analítica, temendo, acima de tudo,
revelar aspectos de sua personalidade profundamente infantis, que procuram esconder ao
máximo de si mesmos.
A agressividade como um dos componentes essenciais da síndrome do abandono,
assume diversas formas. É uma agressividade racional de quem foi privado de amor na
infância e diminui e depois desaparece no decorrer do tratamento analítico. É geralmente
uma agressividade voltada para si mesmo.
Além dos sintomas já citados o neurótico de abandono apresenta outros que pode
variar de um neurótico a outro: exigências sem limites de amor, exigências ligadas ao
pensamento mágico que o outro descubra e corresponda as suas intenções, necessidade
de ser absoluto, sentimento de incapacidade, fantasias masoquistas, culpa – se por não se
sentir amado, se acha desinteressante, coloca o outro a prova para provar que não é amado
e vai em busca disso pelas cobranças e exigências, forte afetividade, com predominância
das necessidades afetivas sobre as demais, intensa necessidade possessiva mais ou menos
camuflada, intolerância a privação, acentuada tendência à ansiedade. Em estados mais
extremos de masoquismo psíquico, o neurótico pode ter devaneios onde o desfecho é
sempre o abandono, o que lhe causa grandes sofrimentos.
O ego deste neurótico é lacunar: certos elementos podem alcançar um
desenvolvimento e uma força às vezes acima da média, enquanto outros continuam fracos
e infantis. É isto que permite frequentemente a esta categoria de neuróticos alcançar
verdadeiros sucessos em determinados campos, ao passo que, em outros domínios, os que
tocam mais de perto à sua vida afetiva, vivem numa insegurança profunda, e não
conseguem realizar o que aspiram.
Há um sentimento agudo de não valor. Na maioria dos casos, as circunstâncias
traumatizantes que privaram a criança de segurança afetiva ocorreram nos primeiros anos,
enquanto todo o seu desenvolvimento ainda estava por se fazer, e por conseguinte, a
aquisição do sentimento do valor próprio ainda estava por vir. Não se trata, portanto, neste
caso, de um sentimento de valor perdido, mas de um sentimento de valor não adquirido.
A terapêutica com o neurótico de abandono se realiza no plano do ego, em suas
experiências atuais e passadas. É nelas que o paciente encontra sua cura e libertação.

“Para um indivíduo com sentimento de abandono, no decorrer da análise,


chegar a virar a página sobre o passado, e aceita-lo como tal e ‘encerrar sua
conta’, como na vida atual ele deverá abandonar suas reivindicações para
passar a uma atitude construtiva, é preciso que tenha possibilidades interiores
de compreensão e generosidade. Sem um mínimo de capacidade oblativa, não
sairá de seu narcisismo ferido.” (GUEX, 1973, p. 130).

O analista se atém em dois pontos: as formas de defesa e o modo de amar. Para


isso o analista deve fazer o paciente voltar sempre aos mesmos pontos a fim de analisá-
lo de forma exaustiva, com relação a insaciável necessidade de amor e os medos que nela
se opõem. Para isso é preciso dar ao paciente uma nítida consciência de sua doença, uma
noção precisa de seu caráter patológico de suas reações.
Às vezes é necessário começar a análise por revalorizar e fortalecer o ego, pois
sem isso não é possível enfrentar acontecimentos dolorosos nem do passado e nem do
presente. Na síndrome do abandono o analista se encontra com o vivido extremamente
ativo.
A crise de cura é um dos momentos mais críticos da análise do indivíduo com
sentimento de abandono. Ao mesmo tempo em que o analista revela para o analisando
estas realizações novas, o analista deve fiscalizar de perto todos os mecanismos de evasão
que rondam o paciente e apoiá-lo de maneira sólida em seu esforço de adaptação ao real.
Todo o mecanismo de crise deve ser-lhe explicado, a fim de que ele considere como uma
crise de evolução, e não como uma regressão.
É, portanto, progressivamente que se deve levar o indivíduo com sentimento de
abandono a assegurar esta segurança interior sem recorrer ao analista. Deve-se utilizar o
máximo de cuidado no término da análise do neurótico de abandono. Precisa ser um final
fiscalizado e que este final não deve ser logo após a crise de cura. É preciso verificar a
necessidade de cada caso.

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