Livro Texto Unidade II
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Unidade II
5 ESCOLA DE FRANKFURT
Tais obras tinham como fundamento a construção de uma metodologia, de um modo de investigar
a sociedade que permitisse a efetiva realização de um conjunto teórico crítico, em que todas as ciências
sociais pudessem se integrar numa só concepção. A princípio, e por um bom período, a base da Escola
de Frankfurt foi a teoria marxista, mas uma teoria marxista vinculada aos procedimentos investigativos
das ciências sociais desenvolvidas na academia.
A interdisciplinaridade foi incorporada de tal modo que ficou como um dos principais legados da
Escola de Frankfurt. Isso porque pesquisar, investigar, enfim, estudar qualquer evento social ou cultural
exige a incorporação de vários campos de conhecimento, como filosofia, sociologia, antropologia,
psicologia e, por que não, política.
Foi justamente no Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt que ocorreu a formação da Escola de Frankfurt:
Esse instituto não estava voltado apenas para a formulação político‑partidária do marxismo, mas
também para a formulação metodológica multidisciplinar, com objetivos bem claros de crítica ao conceito
positivista de ciência. A Revista de Pesquisa Social, publicada pelo instituto, tinha as marcas do pensamento
de Marx, buscando conhecer, compreender e interpretar a sociedade capitalista pela vertente dos conceitos
e definições não só econômicos, mas principalmente filosóficos ou mesmo sociológicos.
A preocupação central dos pensadores da Escola de Frankfurt era, então, estabelecer um vínculo
entre a pesquisa empírica da realidade social e a filosofia. Para isso, era necessária uma teoria da história
que desse conta tanto da realidade quanto da racionalidade dessa realidade. A princípio, eles recorreram
às concepções hegelianas da história:
A preocupação inicial de formular uma metodologia única na investigação da realidade social foi,
com o tempo, profundamente modificada. Pode‑se mesmo dizer que foi abandonada e substituída.
Lembrete
Portanto, as obras de Hegel, Marx e Engels formaram o paradigma teórico para os pensadores da
Escola de Frankfurt. A teoria crítica da sociedade fundamentou‑se filosoficamente na concepção do
materialismo histórico exposta por Marx e Engels.
No entanto, como vimos, a busca por uma metodologia única se alterou com o tempo, e outros
fatores influenciaram profundamente as reflexões dos componentes da Escola de Frankfurt.
De modo geral, é possível dizer que dois fatores foram determinantes para as transformações no
percurso da Escola de Frankfurt: primeiro, as práticas políticas do stalinismo e do fascismo; depois,
a enorme produção da cultura de massa do capitalismo. Consideremos o primeiro fator. O governo
totalitário de Josef Stalin (1878‑1953) na União Soviética, o de Benito Mussolini (1883‑1945) na Itália
e o de Adolf Hitler (1889‑1945) na Alemanha motivaram o declínio e o afastamento da classe operária
do ideário e do movimento revolucionário proposto pelas concepções do marxismo histórico.
Pode‑se dizer que os pensadores da Escola de Frankfurt ficaram, de certa forma, decepcionados
com a emancipação do movimento operário em relação ao sistema capitalista de produção.
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MATERIALISMO E MARXISMO
Numa perspectiva internacional, o desempenho da classe operária não foi aquele que se esperava, isto
é, um desempenho revolucionário. A ausência de uma força opositora por parte da classe operária
em relação às ditaduras de Stalin, Mussolini e Hitler permitiu o desenvolvimento de práticas políticas
contrárias ao processo revolucionário operário.
Nas ditaduras mencionadas, o que ocorreu foi o distanciamento dos fundamentos da revolução
operária, conforme expostos nas obras de Marx e Engels. Em outras palavras, o movimento operário não
se mostrou suficientemente forte para criar obstáculos ao estabelecimento e ao funcionamento dos
governos de Stalin, Mussolini e Hitler. Esses governos foram exemplares na demonstração da verdadeira
exploração do homem pelo homem, isto é, as políticas adotadas nas três ditaduras foram contrárias aos
princípios marxistas de libertação da exploração:
No fim dos anos 1930, esse mundo idealizado veio final e definitivamente
abaixo: em termos de política prática, através da experiência do fascismo,
do stalinismo e da cultura de massa do capitalismo, juntando forças para
formar um todo totalitário; em termos de teoria, através da mudança de
um modelo positivo para outro, negativo, de trabalho social (OUTHWAITE;
BOTTOMORE, 1996, p. 243).
Vejamos agora o segundo fator. A indústria cultural pôs em circulação uma enorme quantidade
de fatos denominados de culturais, mas que efetivamente produziam muito mais alienação do que
emancipação pela arte. Segundo a análise da cultura de massa feita pelos pensadores da Escola de
Frankfurt, a produção capitalista de cultura é, antes de tudo, uma forma de manipulação ideológica.
Além disso, ela se opõe ao que é produzido pela cultura popular, pelo simples fato de ter como objetivo
a divulgação para o entretenimento, mas um entretenimento alienante, que despoja as pessoas do
processo de reflexão que a arte efetivamente favorece:
É oportuno registrar que a modificação nas reflexões filosóficas da Escola de Frankfurt, isto é, da
busca pela construção de uma metodologia única de investigação da realidade social às reflexões
voltadas para a produção cultural, não alterou em nenhum momento o posicionamento crítico acerca da
sociedade capitalista. Os estudos desenvolvidos em relação ao significado da ideologia dominante e
da feitura das manifestações artísticas se mantiveram constantes.
desenvolvimento não só das ciências sociais e da natureza como também das concepções políticas dos
séculos XIX e XX.
Comte, filósofo francês, elaborou uma complexa conceituação filosófica referente à história da
humanidade, elaboração essa que se constituiu numa escola filosófica denominada positivismo. Essa
denominação deriva do fato de Comte se opor ao idealismo de Hegel, apresentando o fato como
referencial para o conhecimento, e não a ideia. Comte concebeu três grandes estágios na história:
O positivismo, segundo esse autor, é a última etapa e a mais evoluída na história da humanidade.
É o momento histórico posterior à Revolução Francesa e corresponde às mais profundas e produtivas
elaborações científicas e industriais. Nesse estágio, o conhecimento é resultado da observação dos
fenômenos, processo que é submetido à formulação das leis universais da natureza e, finalmente, à
comprovação pela experiência.
Tais condutas de investigação avançaram das ciências da natureza para o conhecimento da sociedade
e da produção cultural. Foi exatamente esse avanço para os eventos sociais que os pensadores da Escola
de Frankfurt criticaram. De modo geral, o pensamento positivista considera a classificação das ciências de
maneira muito estanque – portanto, com metodologias específicas de abordagem dos fatos. Isso
desencadeou a busca por uma concepção teórico‑metodológica única por parte dos pensadores da
teoria crítica da sociedade.
Saiba mais
Do ponto de vista das práticas políticas influenciadas pela filosofia positivista destaca‑se,
particularmente, uma posição que pode ser assim sintetizada: ordem nas práticas sociais e políticas
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MATERIALISMO E MARXISMO
para efetivamente haver desenvolvimento, isto é, progresso social. Em oposição a essa ideia de ordem
e desenvolvimento do positivismo, os pensadores da Escola Frankfurt propunham a participação das
pessoas na formulação das políticas, isto é, a emancipação do homem.
É possível elencar as seguintes características das reflexões desenvolvidas pelos filósofos da teoria
crítica da sociedade:
Por serem inúmeros os fatores que permeiam os eventos sociais, é importante que as abordagens
incluam conceitos da sociologia, da antropologia, da política e evidentemente da filosofia. Portanto, é
possível dizer que a teoria crítica da sociedade apresenta‑se de forma muito mais próxima da realidade
social, afastando‑se das considerações filosóficas da divisão entre espírito e matéria do cartesianismo, e
também do positivismo, no sentido de fragmentação da realidade.
A contribuição da produção intelectual dos pensadores da Escola Frankfurt pode ser compreendida
do seguinte modo: o objeto das ciências sociais é um objeto construído historicamente; a sociedade,
tanto em sua forma como em sua dinâmica, é resultado da história; uma vez que a sociedade resulta
da historicidade, do movimento constante e dialético, é possível pensar em superar as contradições
inerentes às configurações sociais construídas pelo capitalismo, particularmente a contradição entre o
capital e o trabalho, que propicia a exploração do homem pelo homem.
Adorno diz que a sociedade capitalista é uma configuração social que tem como marca a coisificação,
isto é, nela tudo se transforma em coisa, desde as mercadorias até as pessoas, passando pelos bens
culturais. Portanto, o que não se transforma em coisa não tem nenhuma chance de sobrevivência.
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Unidade II
Esse processo de coisificação é resultado do capitalismo monopolista, que se prolonga de modo impiedoso
ao monopólio do trabalho de qualquer natureza, com implicações sociais, culturais e comportamentais.
Lembrete
A separação absoluta entre fato e sociedade, conforme a concepção positivista, é por demais
artificial. Em outras palavras, é uma reflexão a ser deduzida, dedução que, por sua vez, é refutada
por outra reflexão, pois não se sustenta em si mesma. As críticas de Adorno, assim como as de todos
os pensadores da Escola de Frankfurt, centram‑se no fato de que a concepção filosófica positivista
fragmenta as esferas de existência social e individual. O positivismo e o neopositivismo não apreendem
o que há de mais universal, o que é mais essencial; a positividade dos fatos em si mesma é uma
particularidade de uma totalidade.
A dialética busca apreender a totalidade com base na ideia de que é possível conhecer a objetividade
dos fatos que se apresentam na realidade. Ela é aplicável a qualquer situação ou fenômeno em sua
singularidade, sem deixar de lado o que é contraditório. A análise positivista, por outro lado, exclui
das investigações aquilo que é contraditório, aquilo que se mostra de forma muito distinta em suas
particularidades. Reúne aquilo que não se contradiz. Em outras palavras, é uma unificação por contínuo
lógico. Evidentemente, tal síntese não é a totalidade, pois deixa de fora muita coisa.
A conduta analítica dialética, segundo Adorno, não exclui o conhecimento como produto histórico:
Observação
Max Horkheimer (1895‑1973), filósofo e sociólogo, publicou em 1937 o artigo “Teoria Tradicional
e Teoria Crítica”, que de modo geral é considerado o texto de referência das reflexões filosóficas que
marcaram profundamente os pensadores da Escola de Frankfurt.
Horkheimer opõe a teoria crítica à concepção filosófica de René Descartes (1596‑1650) e à escola
positivista. É possível dizer que as reflexões críticas se iniciaram considerando a origem do conhecimento
científico as interações sociais em determinado momento histórico.
A distinção feita por Horkheimer entre teoria tradicional e teoria crítica ofereceu a oportunidade de
conduzir as interpretações da sociedade capitalista para além do significado da produção material. De
que maneira essa distinção permitiu levar as reflexões para um campo mais amplo, mantendo ao mesmo
tempo uma conduta dialética materialista ou histórica?
Além disso, a teoria crítica apresenta de modo significativo outras questões da existência
humana, e não só o pragmatismo das ações. Ela inclui o que efetivamente afeta a condição da
vida humana. É possível dizer que, por abordarem outras questões, os componentes da Escola
de Frankfurt mostraram, de forma objetiva, a negação da autonomia do indivíduo numa sociedade
administrada pelas grandes corporações industriais. Empreenderam ainda profundas reflexões
sobre estética, produção cultural, psicologia e psicanálise.
Voltemos brevemente a René Descartes. Ele é considerado pela história da filosofia o principal
pensador do idealismo, no sentido da essência do conhecimento, e também do racionalismo, no sentido
da origem do conhecimento. Em outras palavras, Descartes sustenta que a fonte do conhecimento é a
razão e que a essência dele é a ideia (o idealismo como conteúdo do conhecimento).
A concepção elaborada por Descartes, exposta principalmente na obra Discurso do Método, passou
a ser o referencial para as ciências. Sua metodologia e seus procedimentos foram determinantes para
as investigações da natureza, as quais proporcionaram considerável desenvolvimento das ideias de
dominá‑la e, mais do que isso, a utilização do raciocínio dedutivo nas pesquisas.
Pelo fato de o raciocínio dedutivo empregado ser o raciocínio matemático, houve uma verdadeira
matematização do conhecimento do mundo, não só o natural, mas também o social. Segundo Horkheimer,
a matematização e o pressuposto de que o conhecimento permite o domínio e a exploração da natureza
constituíram o núcleo da filosofia tradicional, ou melhor, da ciência em geral. Por ser assim, a filosofia
cartesiana, ou o método cartesiano, apresenta uma posição instrumental.
É instrumental por ser operacional, por propiciar intervenções efetivas mediante experiências e,
principalmente, por considerar a possibilidade de tudo ser quantificado e analisado através de suas
partes, dividindo‑se o todo. Dito de outro modo, a abordagem epistemológica de René Descartes é
fundamentalmente dedutiva.
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MATERIALISMO E MARXISMO
Vejamos agora algumas considerações desenvolvidas por Horkheimer em Eclipse da Razão, obra
escrita ao fim da Segunda Guerra Mundial. Esse livro traz uma série de reflexões que permitem, de forma
bem esclarecedora, apreender o significado da racionalidade nas configurações sociais. Já no prefácio,
Horkheimer destaca a importância das relações entre razão e desenvolvimento:
A desilusão a que Horkheimer faz referência é a dissipação do valor do indivíduo. Este busca
sua autopreservação, mas segundo o autor não há mais nada a ser preservado, pelo fato de que
o indivíduo não tem mais consciência de sua unicidade e muito menos de sua identidade. Não é
possível falar de indivíduo numa sociedade massificada e dominada ideologicamente por uma única
concepção, a saber, a concepção capitalista de consumo de massa dos mesmos produtos. Não há,
portanto, uma noção de indivíduo como categoria historicamente formada, não há uma consciência
de pertencimento universal:
Quando falamos do indivíduo como uma entidade histórica, não nos referimos
apenas à existência sensível e espaçotemporal de um membro particular da
raça humana, mas além disso à consciência de sua individualidade como
um ser humano consciente, inclusive o reconhecimento de sua própria
identidade (HORKHEIMER, 2015a, p. 143).
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Unidade II
O que é formalização ou automação social? É a imperiosa condição imposta pelo processo burocrático
de administração social para manter o poder e ter o domínio da posse. Em outras palavras, a consciência
da posse das coisas importa muito mais do que a consciência da condição social de indivíduo:
De modo geral, na literatura filosófica e mesmo nas literaturas sociológicas e antropológicas, aparece
esta análise: a individualidade é a característica que predomina nas configurações sociais de produção
capitalista, em que há um distanciamento do indivíduo em relação ao coletivo; a individualidade é
efeito da sociedade capitalista, no sentido de competição entre as pessoas.
No entanto, nas leituras da obra de Horkheimer, a postura individualista é resultado não de uma
competição, mas de uma integração ao ambiente de poder e posse, que tira as marcas de um dos
integrantes da sociedade, particularmente se esse integrante pertencer às camadas do poder.
Saiba mais
Essa posição individual numa sociedade em que há uma estrutura de poder distante do coletivo, seja
dos integrantes da massa, seja dos integrantes da elite, ocorre a partir de uma ideia de moral:
58
MATERIALISMO E MARXISMO
O liberalismo, portanto, propôs uma utopia de integração social, sustentando a competição entre
os indivíduos, e não a coesão social em benefício coletivo. Todas as facilidades seriam para o benefício
do indivíduo. Por movimentar uma enorme quantidade de pessoas numa competição bastante desigual
no mercado de troca – troca não só de mercadorias, mas também de poder –, o liberalismo propiciou
diretamente comportamentos pessoais distantes do coletivo. Tais comportamentos, segundo Horkheimer,
liberaram as pessoas para participar do desafio de conquistar uma posição de glória na estrutura social
de classe. Dito de outro modo, o liberalismo possibilitou a ganância, no sentido mais exato da palavra.
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A individualidade, de acordo com Horkheimer, é mais uma das coisas que o homem perdeu na
sociedade capitalista, voltada para a produção e o consumo de massa. Isso porque a individualidade é
a participação no coletivo baseada numa tomada de consciência, e não o distanciamento autônomo
concebido pela sociedade industrial, como um competidor entre outros:
Pela leitura de Eclipse da Razão, é possível dizer que há uma relação muito estrita entre o liberalismo,
o individualismo e a produção da ideologia. O individualismo é, segundo Horkheimer, a perda da
autonomia na tomada de decisões individuais. O indivíduo não está na condição de individualidade
porque não tem autonomia suficiente para tomar decisões. Estas são sempre orientadas pelas
configurações sociais administradas.
Isso contrasta com a concepção iluminista de sujeito, para a qual ele era centrado e dotado de razão,
imperativamente voltado para a consciência de suas ações. Apesar das transformações que ele sofria, o
sujeito continuava o mesmo, com a existência de sua identidade como pessoa:
6.2 Pragmatismo
No artigo “Observação sobre Ciência e Crise”, Horkheimer (2015b) diz que a concepção marxista de
sociedade inclui de modo bem pontual a ciência como força humana produtiva. Isso significa que a ciência
não é simplesmente um complemento ou um resultado; é ela que sustenta as descobertas que impulsionam
novas tecnologias e novas descobertas, as quais, por sua vez, vêm compor o complexo industrial produtivo.
Desse modo, todo conhecimento científico proporciona a criação de valores sociais. O conhecimento
que a ciência conquista representa um verdadeiro meio de produção:
No entanto, é imprescindível levar em conta o outro lado do que essa inclusão propicia: considerar
o conhecimento científico uma força produtiva não é o mesmo que considerar o espírito pragmático
uma condição para o conhecimento. Não há nenhuma justificativa para apresentar os interesses sociais
como parâmetros para a verdade:
Para entender o que significa não considerar o pragmatismo uma sustentação teórica, vale esclarecer
primeiro o que significa pragmatismo. Surgida nos Estados Unidos no século XIX, essa escola filosófica
teve momentos de profunda influência no pensamento norte‑americano. Não há unidade conceitual
entre os pensadores pragmáticos – verifica‑se, de fato, muita discordância teórica entre eles. No entanto,
é possível identificar um núcleo comum.
De acordo com Horkheimer, as reflexões filosóficas que geraram as ideias pragmáticas surgiram num
período histórico bem determinado, em que os negócios corriam de um modo que não exigia nenhuma
reflexão filosófica mais aprofundada:
Observação
A utilidade desta ou daquela ferramenta teórica não pode ser o critério de determinação da verdade,
porque há uma distância considerável entre o verdadeiro e o útil. Essa distância decorre do fato de que
algo pode ser útil para determinados grupos sociais, e não para outros – por exemplo, pode ser útil para
a dominação, e não para a liberdade. É possível apropriar‑se da utilidade da melhor ou da pior forma,
sem nenhuma preocupação com o conhecimento em si.
Portanto, a teoria crítica aponta, de maneira significativa, o que há de mais inadequado no pragmatismo,
pois é imprescindível considerar que a formulação científica, isto é, o conjunto de conceitos, definições e
metodologias, é o resultado de uma dinâmica entre os homens, e entres eles e a natureza.
A concepção da teoria crítica, por sua vez, propõe uma conduta de raciocínio que em muito se afasta
das concepções da metodologia cartesiana e, mais ainda, das ideias do pragmatismo e do idealismo da
dialética hegeliana. De inspiração dialética histórica, apreende a contradição entre as noções do que é
pragmático e do que é relativo em suas investigações do social.
A teoria crítica não se apresenta como um instrumento pragmático ou relativista, mas como uma
conduta de conhecimento que se distancia da abordagem metafísica e apreende a totalidade em
diversas perspectivas, não deixando escapar as particularidades, que são de caráter individual. Desse
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MATERIALISMO E MARXISMO
modo, valoriza a importância das reflexões necessárias para conhecer, compreender e interpretar a
realidade das configurações de uma sociedade administrada.
O que vem a ser uma sociedade administrada? Segundo os pensadores da Escola de Frankfurt,
particularmente Max Horkheimer, é a sociedade de produção capitalista que se apresenta de forma
dissimulada para os indivíduos. Isso porque ocorre um processo de alienação dos indivíduos em relação
ao todo e, até mesmo, em relação a sua própria existência.
A não distinção entre sujeito e objeto é um pressuposto epistemológico que muito contribui,
segundo Horkheimer, para apreender tanto o particular quanto o universal, uma vez que não há nesse
pressuposto a alienação do sujeito em relação ao contexto sociocultural em que ele está inserido. Com
isso, a razão adquire a posição de analisar, de forma crítica e produtiva, a sociedade que se apresenta
administrada para a produção industrial.
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Unidade II
É oportuno assinalar o significado que a razão instrumental adquire num contexto de alienação, pois
ocorre a aceitação de concepções positivistas não só do ponto de vista científico, mas também do ponto
de vista político, em que a ordem é a sustentação do desenvolvimento e do progresso social. A razão
instrumental é apreendida de forma pragmática: o que ela produz tem de favorecer a organização social e
a administração das ações individuais e coletivas, tanto por parte do Estado quanto por parte das indústrias.
Conforme a análise de Horkheimer, há uma interação ou, mesmo, uma complementação entre as
concepções filosóficas do positivismo e as concepções formuladas pela escola filosófica do pragmatismo.
Seja por interação, seja por complementação, o que se constata é que a aceitação do positivismo
vincula‑se à aceitação do pragmatismo. Em outras palavras, o que é útil para a produção é útil para a
expansão da razão.
Assim, ao se expandir, a razão não tem nenhuma preocupação com os critérios de verdade ou com a
crítica, mas tão somente com a verificação da correspondência entre o que é pensado, o que é praticado
e o que é produzido de maneira eficaz e eficiente. Os conceitos, as definições, a metodologia, enfim, todo
o conjunto de procedimentos científicos fica submetido ao que é comprovado, para ser transformado
em produto ou em eficiência de produção.
Desse modo, o universal vai perdendo terreno para os particulares e, inclusive, para os singulares, pois
a razão se apresenta de forma instrumental, não de forma crítica. A razão subjetiva, pela particularidade,
faz com que a razão objetiva crítica não tenha mais lugar nas reflexões. Nesse contexto, a razão objetiva
não consegue deter a destruição dos conceitos e definições e, muito menos, das narrativas mitológicas
que contêm a parte mais afetiva dos fenômenos socioculturais da humanidade.
De acordo com Horkheimer, a razão tornou‑se instrumental ou subjetiva exatamente pela ideia de
formar segundo a concepção positivista de ciência, isto é, pondo a forma acima do conteúdo. A razão
instrumental abdica da autonomia:
Cabe ainda considerar que a razão instrumental tem na palavra ou no pensamento seus principais
fundamentos, uma vez que os símbolos matemáticos, ou melhor, a linguagem matemática se apresenta
como superior para a dominação da natureza e para a construção de tecnologias direcionadas à
produção industrial. Por ser assim, tanto o pensamento (a razão) quanto a palavra são incorporados
como ferramentas, e o quantitativo torna‑se a própria razão. Dito de outra maneira, a quantidade é a
expansão da razão banindo a experiência intelectual.
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MATERIALISMO E MARXISMO
É preciso considerar ainda que, segundo Horkheimer, a razão instrumental, por apresentar os
conceitos e as determinações do conhecimento de modo subjetivo, também é responsável pela
alienação entre o sujeito e o objeto – a alienação do sujeito em relação ao contexto sociocultural em
que está inserido.
Horkheimer diz que a razão crítica – a razão não como instrumento, mas como condição de
reflexão, que permita a apreensão do mais universal e, ao mesmo tempo, dos particulares e singulares,
inspirados na dialética histórica – corre o sério risco de ficar para trás dos desenvolvimentos industriais
e científicos, os quais buscam firmar um sentido que pode ser uma verdadeira ilusão. Para evitar esse
risco, é fundamental considerar que a denúncia daquilo que hoje se chama razão é o maior serviço que
a razão pode prestar.
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Resumo
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MATERIALISMO E MARXISMO
Exercícios
III – A vinculação da Escola de Frankfurt ao autoritarismo político fez com que essa escola e seus
pensadores fossem desacreditados na Alemanha.
IV – Para os pensadores da Escola de Frankfurt era basal a defesa da liberdade e dos interesses coletivos.
V – Temas como a exploração da mão de obra e a crítica ao sistema capitalista dos modos de
produção foram abordados de forma marginal e pontual pelos pensadores da Escola de Frankfurt.
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MATERIALISMO E MARXISMO
A) F, F, V, V, V.
B) V, F, V, F, F.
C) F, F, F, V, V.
D) V, V, V, V, V.
E) F, V, F, V, F.
I – Afirmativa incorreta.
Justificativa: a Escola de Frankfurt se caracterizava por uma ferrenha oposição às teorias e aos
métodos vinculados à corrente positivista.
II – Afirmativa correta.
IV – Afirmativa correta.
Justificativa: apesar de a Escola de Frankfurt se consolidar como uma escola de pensadores teóricos,
esses autores também defenderam a liberdade coletiva e os interesses do grupo. Dessa forma, para além
de escrever sobre o desenvolvimento capitalista, a Escola de Frankfurt apoiava uma sociedade mais justa
e igualitária.
V – Afirmativa incorreta.
Questão 2. Max Horkheimer foi um dos principais representantes da Escola de Frankfurt. Entre os
conceitos que elaborou, com base no marxismo, encontra‑se sua compreensão sobre o indivíduo. Leia
este fragmento extraído do livro Eclipse da Razão: “O indivíduo outrora concebeu a razão exclusivamente
como um instrumento do eu. Agora, ele experimenta o inverso dessa autodefinição”. Agora, considere
estas afirmativas:
I – A individualidade é condicionada pela crise da razão e pela irracionalidade que integra a sociedade
capitalista, manifesta nos períodos de guerra.
II – O indivíduo sempre busca sua preservação. Na sociedade capitalista, porém, ele perde a
consciência de sua identidade.
IV – As elites, ou classes mais abastadas economicamente, não têm qualquer problema para
reconhecer e firmar sua identidade.
V – A individualidade não provém do modo de produção capitalista. Antes, está associada somente
à forma como os homens se relacionam com a razão.
A) I, II e III.
B) I, II e IV.
C) II, IV e V.
D) II, III e V.
E) III, IV e V.
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