Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

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TERCEIRO SETOR,

VOLUNTARIADO E
DESENVOLVIMENTO
DE PROJETOS

Autoria: Prof. Dr. Loriberto Starosky Filho

1ª Edição
Indaial - 2020

UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:


Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Jairo Martins
Jóice Gadotti Consatti
Marcio Kisner
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Marcelo Bucci

Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Copyright © UNIASSELVI 2020
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.
F481t

Filho, Loriberto Starosky

Terceiro Setor, voluntariado e desenvolvimento de projetos. / Loriberto


Starosky Filho. – Indaial: UNIASSELVI, 2020.

162 p.; il.

ISBN 978-65-5646-249-3
ISBN Digital 978-65-5646-250-9

1. Terceiro setor. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci.

CDD 657.98

Impresso por:
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................5

CAPÍTULO 1
O Terceiro Setor..........................................................................7

CAPÍTULO 2
Gestão de Organizações do Terceiro Setor.......................... 57

CAPÍTULO 3
Projetos e Mobilização de Recursos.................................... 111
APRESENTAÇÃO
Prezado acadêmico, seja bem-vindo à disciplina Terceiro Setor, Voluntariado
e Desenvolvimento de Projetos, do curso de pós-graduação em Terceiro Setor e
Projetos Sociais da Uniasselvi.

O presente livro foi elaborado especialmente para você, com o propósito de


indicar caminhos para a construção de conhecimento a respeito deste tema tão
especial e importante para nossa sociedade.

O terceiro setor vem crescendo no Brasil, consolidando a sua posição como


um importante ator, seja na economia, nos aspectos sociais ou na democracia,
já que para se alcançar esta última e um Estado de Direito, é necessário que se
passe pelo desenvolvimento da sociedade civil organizada (o terceiro setor), com
destacada atuação e com autonomia em relação ao Estado.

É claro, para que isso seja viável, é necessário permitir a construção de um


ambiente favorável para o desenvolvimento das organizações do terceiro setor,
ou seja, um ambiente que podemos comparar a um ‘eco sistema’ do setor.

Algumas ações são necessárias. Citam-se por exemplo, o aperfeiçoamento


no âmbito legal, com as leis relacionadas a estas organizações e o adequado
ambiente normativo, capaz de acompanhar o protagonismo da sociedade civil,
além do âmbito de gestão, com o fortalecimento de estratégias ligadas ao
planejamento e o as formas de financiamento das atividades dessas organizações.

O terceiro setor auxilia o Estado na entrega de produtos e/ou serviços à


sociedade. E nos capítulos que seguem, você será convidado a mergulhar no
universo do terceiro setor, nos quais serão apresentados entre outros, a origem,
os principais conceitos, a abrangência de atuação, certificados e qualificações
possíveis, obrigações e responsabilidades, apresentando exemplos para ilustrar
os conteúdos e promover uma melhor compreensão.

O livro está estruturado em três capítulos: a) o terceiro setor; b) gestão de


organizações do terceiro setor e c) projetos e mobilização de recursos.

No primeiro capítulo nos dedicaremos a estudar, de modo mais macro,


o terceiro setor, apresentando suas origens, por quais nomes ele é conhecido,
além de delimitar em que áreas ele atua. Também vamos dedicar espaço para
falar sobre a economia solidária, assim como os tipos de títulos, qualificações e
certificações aos quais as organizações do terceiro setor poderão se habilitar.
Já no segundo capítulo, vamos nos debruçar sobre os aspectos de gestão
de uma organização do terceiro setor, iniciando pelo adequado enquadramento
legal, se constituída como associação ou outra forma, as formas tributárias às
quais estas organizações estão sujeitas, bem como os aspectos relacionados
ao dia a dia, com modelos de organização administrativa e financeira, passando
pelos aspectos relacionados aos recursos humanos e voluntariado, destacando
seus desafios, cuidados e possíveis resultados.

Por fim, no terceiro capítulo, trataremos de uma das maiores dores do


terceiro setor: a mobilização de recursos para sua manutenção. Do que vive o
terceiro setor? Como sobrevivem? Vamos estudar diferentes formas de captar
recursos para as organizações, seja por meio de projetos vinculados a leis de
incentivo, ou ainda resultante de geração própria de renda. Sem esquecer de
aspectos importantes como o monitoramento e avaliação de resultados.

Estamos certos de que não é possível esgotar o tema terceiro setor em


um livro. Por isso, não deixe de pesquisar outras informações sobre o assunto,
e que este livro seja um estímulo para que você continue buscando por mais
conhecimento e especialização no assunto.

Desejos de uma ótima caminhada.

Bons estudos!!!

Professor Loriberto.
C APÍTULO 1
O Terceiro Setor

A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Conhecer as origens, conceitos e as nomenclaturas relacionadas ao Terceiro


Setor.

• Identificar as áreas de atuação das organizações que compõem o terceiro


setor.

• Definir os limites e responsabilidades na atuação das organizações do terceiro


setor.

• Descrever os possíveis enquadramentos (certificações, títulos e qualificações)


aplicáveis às organizações do terceiro setor, assim como as obrigações
relacionadas.

• Interpretar o significado das diversas nomenclaturas utilizadas no terceiro setor.

• Analisar a abrangência de atuação do terceiro setor.

• Diferenciar os possíveis enquadramentos existentes, relacionando-os com os


tipos de organização.
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

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Capítulo 1 O Terceiro Setor

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
O crescimento do terceiro setor representa uma mudança na forma de
participação das pessoas em sociedade. Isso porque um bom número destas
organizações tem a participação de voluntários.

Sabemos que muitas sequer são registradas, ou seja, sequer aparecem nas
estatísticas do setor. São organizações de fato. Isso traz algumas implicações,
como a impossibilidade de receber recurso público.

Mas é bom destacar que o sistema de normas brasileiro facilita a constituição


de uma organização do terceiro setor. Basta que algumas pessoas com interesses
comuns se reúnam, formalizem um estatuto, encaminhem-no para registro em
cartório e pronto. A organização passa a existir de direito.

Por outro lado, esse mesmo sistema pode trazer alguns aspectos
inconvenientes, como as organizações que só existem no papel e que são usadas
em esquemas de desvio de recursos públicos. São as entidades-fantasma. Não
faltam notícias a respeito desse tipo.

Que bom que a esmagadora maioria existe e busca prestar sua assistência
e serviços de forma justa e honesta, em grande parte com recursos vindos
de doações espontâneas da própria comunidade. Outras, devido as suas
características de interesse público, celebram parcerias com o poder público,
sendo por ele subsidiadas.

O terceiro setor pode se tornar um componente vital para uma sociedade


justa e empreendedora, em que os indivíduos e as comunidades se sentem
capacitados para alcançar mudanças e atender às necessidades sociais e
ambientais. Contribuem para ajudar a realizar novos programas de bem-estar
social.

2 ENTENDENDO O TERCEIRO SETOR


Nesta seção, vamos conhecer as origens, os conceitos e os nomes pelos
quais o terceiro setor é conhecido. No entanto, as nomenclaturas utilizadas como
referência às organizações do terceiro setor têm outro significado e, dependendo
do contexto, são usadas indevidamente.

Vamos identificar e analisar a abrangência, os limites e responsabilidade


no que diz respeito ao campo de atuação das organizações do terceiro setor.

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Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Isso é importante, pois existem vários preconceitos com relação às atividades


desenvolvidas, que necessitam ser desmistificadas e esclarecidas.

Por fim, vamos identificar que algumas organizações do terceiro setor podem
buscar o reconhecimento público, por meio de certificados, títulos e qualificações.
Uma vez portadoras desses reconhecimentos, abrem-se novas portas quanto a
sua atuação e, juntamente, aumentam as obrigações e responsabilidades.

2.1 ORIGEM DO TERCEIRO SETOR

Não raras são as vezes que nos deparamos com a seguinte


pergunta: alguém aí sabe qual é a origem do terceiro setor?

É uma pergunta que pode ter inúmeras respostas a partir dos


A origem do terceiro diferentes registros e fontes que relatam o terceiro setor. Não se pode
setor pode ser tão afirmar – e confirmar – a origem com total certeza. Diante dos mais
antiga que remonta variados registros e citações de autores nacionais e internacionais,
à própria sociedade
a origem do terceiro setor pode ser tão antiga que remonta à própria
civilizada.
sociedade civilizada. E, por óbvio, provavelmente, muito diferente de
como o conhecemos na atualidade.

Em seu livro Administrando organizações do terceiro setor de 1999, Mike


Hudson apresenta registros, como que em uma linha do tempo, das possíveis
origens do terceiro setor, assim como da natureza de sua atividade. Na figura a
seguir, podemos visualizar essa linha do tempo.

FIGURA 1 – LINHA DO TEMPO – ORIGENS DO


TERCEIRO SETOR – NO MUNDO E BRASIL

FONTE: Adaptado de Hudson (1999)

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Capítulo 1 O Terceiro Setor

Hudson destaca que na base das organizações do terceiro setor encontram-


se as pessoas, que são sua razão e motivação de e para existir, ou seja, o
que motiva estas organizações é a vontade humana de promover ajuda ao
próximo, sem que se cobre algo em contrapartida. Veremos que isso possui uma
estreita relação com a caridade e filantropia, desenvolvidas no seio de muitas
organizações religiosas.

Com o crescimento das vilas e cidades, ocorreu um intenso movimento


de pessoas, que muitas vezes representou também o distanciamento de suas
famílias de origem, contribuindo para a necessidade de se buscar alternativas
para eventuais auxílios de natureza social. Ou seja, percebeu-se uma
preocupação com este próximo, para que este pudesse ter as mínimas condições
de sobrevivência.

Os primeiros registros remontam a 5.000 anos, quando civilizações egípcias


já tinham desenvolvido uma espécie de código moral, baseado nos conceitos
de justiça social. Inclusive, contaram com a ilustre participação do faraó, que
propiciou abrigo, alimento e vestimenta para os pobres. Além disso, as pessoas
eram encorajadas a ajudar quem estivesse em dificuldade.
JUSTIÇA SOCIAL –
tem sua origem nos
JUSTIÇA SOCIAL – tem sua origem nos pensamentos de pensamentos de
Aristóteles e Tomás de Aquino, e é uma construção moral e política Aristóteles e Tomás
baseada na igualdade de direitos e na solidariedade coletiva. de Aquino, e é uma
construção moral e
Nos anos do Império Romano (há cerca de 2.100 anos), também política baseada na
igualdade de direitos
ocorreram ações sociais, ou ações de caridade, caritas – palavra
e na solidariedade
originária do latim que significa amor ao próximo ou beneficência, coletiva.
em relação aos cidadãos mais necessitados ou com pouquíssimos
recursos. Outras ações que ganharam espaço foram as denominadas
Caritas – palavra
filantrópicas, da palavra filantropia, originária na Grécia e que significa
originária do latim
boa vontade para com as pessoas. que significa
amor ao próximo
Outra expressão de atividades sociais foi encontrada na Índia, ou beneficência,
aproximadamente entre os anos 274-232 a.C., onde o imperador em relação aos
Asoka ordenou que se construíssem diversas instalações para cidadãos mais
necessitados ou
atendimento médico, além da construção de poços de água e o
com pouquíssimos
plantio de árvores para que o povo pudesse deles usufruir. Buscava- recursos.
se o bem social.

Na China, há registros de trabalho voluntário organizado desde o século VII,


incentivado e institucionalizado pelo budismo. E no Japão, a prática filantrópica

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Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

também é muito antiga, sendo que lá se encontra o registro da primeira fundação


moderna – a Sociedade Gratidão, cuja data de criação remonta ao ano de 1829.

As ações filantrópicas e de caridade passaram a ter uma relação maior


quando associadas às organizações religiosas. Talvez os profetas judeus do
Antigo Testamento tenham sido pioneiros no que se refere à assistência social,
pois muito do seu trabalho estava relacionado à justiça social, à justiça política e
à igualdade econômica.

Mais adiante, os ensinamentos judeus tinham foco nos direitos dos pobres,
para amparo das viúvas, órfãos, deficientes, enfermos e prisioneiros. Assim, as
igrejas cristãs primitivas criaram fundos para apoiar os necessitados, onde se
esperava que os fiéis levassem seus donativos para serem compartilhados com
quem nada tinha.

E mesmo nas épocas mais remotas, alguns problemas já eram presentes,


como destaca Hudson. Ele cita, por exemplo, os mosteiros britânicos medievais,
que tinham uma tendência a distribuir donativos de forma indiscriminada,
contribuindo para a criação de uma classe denominada de mendigos profissionais.
Esse movimento contribuiu para que ocorresse oposição a esse tipo de ajuda.

Também os hospitais, originalmente construídos para atenderem os mais


pobres, começaram a servir para aquelas pessoas mais abastadas. Esse papel
conflitante de interesses, entre o terceiro setor filantrópico e o setor público
e privado contribuíram para colocar em dúvida as doações recebidas para a
caridade. No sítio eletrônico indicado, você pode ter mais informações a respeito
do tema ‘conflito de interesses’. A publicação é de 2020, do autor Wagner
Giovanini.

INDICAÇÃO DE SITE Para saber mais, acesse: <https://www.


compliancetotal.com.br/livro>.

Vejam que até a rainha da Inglaterra chegou a promulgar uma lei, permitindo
ao primeiro ministro que investigasse de que forma os recursos destinados à
filantropia eram usados e o mau uso deles acarretaria sanções aos que estivessem
praticando abusos, entre eles, perder apoio para continuar arrecadando donativos.
Parece atual, não é mesmo? Pois então! Essa lei é do ano de 1601!!!

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Capítulo 1 O Terceiro Setor

Continuando em nossa jornada pela história do terceiro setor, nos anos de


1.800, outras medidas foram tomadas pelos países, como a redução drástica
do repasse de recursos. E, diante dessa realidade, as instituições começaram
a adotar medidas mais coerentes em suas atividades, de modo a tentar otimizar
recursos. Uma das ações adotadas foi selecionar, para receberem atendimento,
aqueles muito pobres, sem condição alguma de sobrevivência, daqueles com
alguma condição.

Na década de 1840, ocorreu um movimento por parte do setor público,


com o aumento de intervenção em assuntos sociais, especialmente os ligados
à educação. Muito do que o setor filantrópico ou terceiro setor executava no
atendimento às necessidades das pessoas, passou a ser gradativamente
exercido pelo Estado. E, à medida que a atuação do Estado aumentava para
outros serviços e provisões também, o terceiro setor passou a ser visto como
suplementar aos serviços estatais.

Com o advento da segunda guerra mundial, o setor filantrópico sofreu uma


redução em seu modo de atuação, na medida em que as ações e atendimentos
eram centralizados pelo Estado. Essa situação só começou a reverter a partir da
década de 1960, com a identificação de novas necessidades e com a criação de
novos meios de arrecadar donativos.

A partir de então, em meados da década de 1970, a expressão ‘terceiro


setor’ começou a ser utilizada com maior frequência, por pesquisadores de
universidades norte-americanas, juntamente com outras similares, como
voluntary sector – setor voluntário ou nonprofit organizations – organizações não
governamentais.

O termo em si é uma tradução literal do inglês third sector e refere-se


especialmente às iniciativas de origem privada, sem finalidade lucrativa e que, de
alguma maneira, procuram atender o bem-estar de uma coletividade.

No início dos anos 1980, a expressão terceiro setor também foi adotada
pelos europeus, com um propósito bem específico: caracterizar um determinado
conjunto de organizações, para diferenciá-las em primeiro lugar, das organizações
estatais, em seus aspectos burocráticos, e em segundo lugar das organizações
mercantis, em seus aspectos de maximização dos seus lucros.

No Reino Unido, o third sector é legalmente conhecido como organizações


charities, ou de caridade. Na próxima seção, cuidaremos para explicar um pouco
de cada uma das expressões utilizadas para identificar o terceiro setor.

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Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Até aqui, apresentamos um panorama da origem do terceiro setor em âmbito


mundial.

E no Brasil, como se identifica a origem do terceiro setor? As primeiras


organizações do terceiro setor aparecem vinculadas à Igreja Católica, ainda no
período colonial. A igreja mantinha ligações com o Estado em seus primórdios,
com ações focadas em escolas e casas de saúde. As organizações eram
formadas por pessoas religiosas e com alto reconhecimento no âmbito da Igreja.
Elas realizavam um importante papel filantrópico e de assistência social.

Nessas
Nessas organizações voluntárias eram oferecidos serviços
organizações
voluntárias eram que iam da assistência médica e financeira até à organização de
oferecidos serviços funerais, além de indicar locais de refúgio e abrigo aos mendigos.
que iam da Em geral, as organizações voluntárias tinham estatutos próprios,
assistência médica mas que deveriam passar pela aprovação do governo e pela lei
e financeira até à eclesiástica. A independência na forma de atuação, no entanto era
organização de
respeitada.
funerais, além de
indicar locais de
refúgio e abrigo aos Como exemplos dessas organizações, podemos citar as
mendigos. Santas Casas de Misericórdia e os Institutos de Beneficência, que
se estabeleceram por todo o Brasil, com a construção dos primeiros
hospitais, hospedarias e asilos.

FIGURA 2 – SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE SANTOS – CONSTRUÍDA EM 1543

FONTE: <http://novomilenio.inf.br>. Acesso em: 15 set. 2020.

No final dos anos 1970, ocorreu um movimento que deu nova dimensão
às organizações do terceiro setor no Brasil. A anistia a exilados políticos e o
processo de abertura democrática impulsionaram a criação de uma multiplicidade

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Capítulo 1 O Terceiro Setor

de organizações de interesse social, de defesas dos mais diversos direitos,


relacionadas ao meio ambiente e organizações sindicais. Seu engajamento
estava focado na luta das desigualdades sociais e na construção de espaços
públicos, na busca da participação cidadã em agendas de interesse coletivo.

Desde então o terceiro setor tem se desenvolvido, ou seja, está aí, presente
e atuante em diversas frentes de ação. Conhecer um pouco da sua origem nos
ajuda a entender as lutas que estas organizações enfrentam a cada dia. Entender
esse contexto, em que muitas vezes elas são injustamente acusadas de algo
que não é de sua competência, ou de receber muito pouco reconhecimento pela
excelência com que realizam suas atividades.

1 Quais foram as primeiras organizações do terceiro setor a atuar


no Brasil?

Na próxima seção, vamos aprofundar os conceitos e abrangência deste setor


que desempenha um papel tão importante em nossa sociedade e que, muitas
vezes, não recebe a devida atenção.

2.2 DEFINIÇÕES, CONCEITOS E


NOMENCLATURAS UTILIZADAS
São muitas as expressões que buscam retratar o terceiro setor, tais como
terceiro setor, ONG, filantrópicas, fundações, associações, entidades sem fins
lucrativos, movimentos sociais, institutos, clubes, entre outras. Vamos
A expressão
apresentar nesta seção os conceitos e definições, além das mais
‘terceiro setor’ é
diferentes nomenclaturas utilizadas para explicar o terceiro setor. largamente utilizada
para indicar todas
A expressão ‘terceiro setor’ é largamente utilizada para indicar aquelas iniciativas
todas aquelas iniciativas que nascem da sociedade civil, sejam elas que nascem
regularmente constituídas, ou seja, possuem um CNPJ, ou não. Mas da sociedade
civil, sejam elas
existe um componente que diferencia estas organizações de outras:
regularmente
as diferentes formas de manifestar ajuda mútua, expressas em constituídas, ou
associações civis, movimentos sociais, não governamentais ou ainda seja, possuem um
ligadas à filantropia empresarial (BARBOSA, 2003; DRUCKER, 2002). CNPJ, ou não.

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Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

O que se pode afirmar é que o terceiro setor encontra-se fora do âmbito das
atividades estatais, também reconhecidas como sendo do primeiro setor e das
atividades privadas com fins particulares, o segundo setor ou ‘mercado’.

Convencionalmente, os setores foram agrupados por ordem sociopolítica,


em função da missão social de cada uma, não limitada em razão do seu resultado
econômico: primeiro setor, segundo setor e terceiro setor.

O primeiro setor, segundo este entendimento, apresenta-se na figura do


Estado, governamental e se exterioriza, essencialmente, pelos seus entes políticos,
que exercem função pública, como funções legislativas, judiciárias e administrativas.
Como exemplo de entidades do primeiro setor, citamos os Municípios, Estados, o
Distrito Federal e a União, Legislativo, Judiciário, assim como os órgãos públicos a
eles vinculados (COELHO, 2002).

FIGURA 3 – REPRESENTAÇÃO DOS TRÊS PODERES – BRASIL

FONTE: <https://plenarinho.leg.br/wp-content/uploads/2017/02/3-
poderes.jpg>. Acesso em: 15 set. 2020.

Já o segundo setor, é reconhecido como o setor produtivo ou econômico,


representado por empresas, que exercem função de natureza privada e que visam
à obtenção de lucro, ou seja, retorno financeiro sobre os seus investimentos.
As relações ocorrem entre fornecedores e clientes. Como exemplos, temos as
empresas individuais, os microempreendedores, as sociedades limitadas, as de
capital aberto ou fechado e as cooperativas (COELHO, 2002).

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Capítulo 1 O Terceiro Setor

FIGURA 4 – REPRESENTAÇÃO DE SETORES DA ECONOMIA – SEGUNDO SETOR

FONTE: <https://escolakids.uol.com.br>. Acesso em: 15 set. 2020.

Diante desta separação entre os setores é possível representar graficamente


como se apresentam e se relacionam as fronteiras entres os setores da sociedade,
além das sobreposições entre eles, que geram organizações secundárias nos
três setores. Vejamos:

FIGURA 5 – SETORES DA SOCIEDADE

FONTE: Anastácio et al. (2018. p. 34)


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Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

O terceiro setor, portanto, é formado especialmente por entidades da


sociedade civil, que não têm objetivo lucrativo, mas sim, procuram trabalhar em
cooperação com o poder estatal para atender essencialmente ao interesse público
e recebendo do segundo setor o investimento ou financiamento das ações. Seus
objetivos últimos não são econômicos, mas sim sociais.

Isso não quer dizer que essas organizações não possam ter recursos
excedentes, como sobras ou superávits. No Capítulo 2, vamos abordar com maior
profundidade esse aspecto tão importante para as organizações, mas que, muitas
vezes, é motivo de preconceito.

Por força de lei, as organizações do terceiro setor são dotadas de autonomia


e personalidade jurídica própria, de direito privado, constituídas pelo desejo
voluntário de pessoas e que buscam, em geral, cumprir um papel social de
relevância, em geral, preenchendo lacunas deixadas ou não atendidas pelos
outros setores. A sua grande força está ancorada nos preceitos da solidariedade
e voluntariado. Na figura a seguir, vemos alguns exemplos de organizações do
terceiro setor, com atuação no Brasil e no mundo.

FIGURA 6 – EXEMPLOS DE ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR

FONTE: <https://www.fabricadeideiasbrasileiras.com.br/>. Acesso em: 15 set. 2020.

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Capítulo 1 O Terceiro Setor

Na literatura, as organizações do terceiro setor são conhecidas – e às vezes


confundidas – por um conjunto de outras expressões, tais como organizações não
governamentais ou ONGs, sociedade civil organizada, setor sem fins lucrativos,
setor filantrópico OSCIP, associação, fundação, instituto, sociedade, entre outras
tantas. Algumas dessas se equivalem, outras são qualificações e outras ainda
são naturezas jurídicas, por isso, as confusões.

Não é por menos que a busca de um quadro de referência para o terceiro


setor remete a essas numerosas terminologias, tipologias e caracterizações.
Algumas mais amplas e unificadoras e outras que evidenciam um campo
heterogêneo e fragmentado, composto de organizações e movimentos com as
mais variadas finalidades, origens e filosofias de trabalho.

As autoras Dias e Bechara (2015) relatam que não é uma tarefa


fácil conceituar o terceiro setor. E isso se deve a muitos fatores,
dentre eles a própria dificuldade de delimitá-lo. As autoras apontam
que a complexidade conceitual pode ter origem na diversidade de
entidades ou ainda resultante da falta de normas jurídicas que tratem
da questão.

No âmbito acadêmico, os pesquisadores norte-americanos começaram


a se interessar pelas organizações sem fins lucrativos e, especialmente, por
possuírem uma abordagem dominante a nível internacional, acabou-se adotando
a nomenclatura de terceiro setor para abrigar todas as organizações não
governamentais.

Mas é necessário registrar que não há consenso, segundo Andion e Serva


(2006), já que essa visão não é compartilhada por pesquisadores europeus, para
os quais o terceiro setor é visto como uma sociedade de economia e solidariedade.

Apesar de se observar um interesse crescente nas pesquisas brasileiras


relacionadas ao terceiro setor, ainda é muito frequente o desencontro na
identificação e categorização dos diferentes segmentos de organizações sem fins
lucrativos presentes no Brasil.

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Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Como vimos, em partes isso é causado pelo elevado número de organizações


inseridas no âmbito do terceiro setor, dificultando um consenso quanto à definição
única para esse segmento.

Para nos ajudar a entender um pouco mais os conceitos do terceiro setor,


temos uma importante publicação da Organização das Nações Unidas (ONU), que
em 2003 publicou o Handbook on nonprofit institutions in the system of national
accounts (Manual sobre instituições sem fins lucrativos nos sistemas nacionais,
em tradução livre e que traz importantes distinções entre as organizações
do terceiro setor, ONGs e outras unidades institucionais, também chamadas
governamentais e de mercado.

Para saber mais, acesso a handbook aqui: <https://www.


sociedadenaccion.cl/wp-content/uploads/2015/06/United-Nations.-
Statistical-Division.-2003.-Handbook-of-Non-Profit-Institutions-in-the-
System-of-National-Accounts.pdf>.

Esse documento elaborado pela ONU pode ser considerado como um passo
importante para a melhoria das informações e conceitos sobre o terceiro setor.
Encontra-se uma definição que acomoda todas as entidades alcançadas pelo
terceiro setor e, ao mesmo tempo, esclarece as diferenças entre primeiro setor e
segundo setor. Vejamos o texto a seguir:

Instituições sem fins lucrativos são entidades jurídicas ou


sociais, criadas com a finalidade de produzir bens e serviços,
cujo estatuto não permite que eles sejam uma fonte de renda,
lucro, ou com outros ganhos financeiros para as unidades
que as estabeleceram, controlem ou financiam. Na prática
suas atividades produtivas são obrigadas a gerar superávits
ou déficits, mas quaisquer excedentes que acontecerem não
pode ser apropriado por outras unidades institucionais. [...]
Instituições sem fins lucrativos podem ser criadas para prestar
serviços para benefício de pessoas ou empresas que as
controlam ou financiam; ou elas podem ser criadas para serem
beneficentes filantrópicas ou para razões de bem-estar, para
fornecer bens ou serviços a outras pessoas em necessidade;
ou elas podem ser destinadas para fornecer serviços na área

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Capítulo 1 O Terceiro Setor

de saúde ou educação, serviços estes sem taxa, não para o


lucro (traduzido de ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS,
2003, p. 12 - 13).

Uma outra descrição importante a respeito das organizações do terceiro


setor nos é apresentada pelos pesquisadores Salamon e Anheier (1997), que
cuidaram ao descrever características encontradas nessas organizações, a partir
de algumas perspectivas. Veja o quadro a seguir que resume estas importantes
contribuições dos atores.

QUADRO 1 – CARACTERÍSTICAS DAS ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR

Perspectiva Conceito
Funcional São separadas do governo, com autonomias próprias
Legal Até um determinado ponto são institucionalizadas, ou seja, pos-
suem uma estrutura formalizada
Econômico-financeira Nenhum retorno de lucros é destinado para seus diretores
Estrutural Possuem característica de autogestão
Operacional Possuem um grau significativo de participação voluntária
Fiscal Possuem características especiais, gozando de isenção de alguns
tributos.

FONTE: Adaptado de Salamon e Anheier (1997)

1 O terceiro setor é formado por quais tipos de entidade?

2 Cite dois exemplos de organizações do primeiro e segundo setores.

Como os objetivos principais das organizações do terceiro setor são sociais,


vamos estudar um pouco mais as funções redistributivas de serviços na próxima
seção, que trata da abrangência de atuação.

2.3 ABRANGÊNCIA DE ATUAÇÃO


“As organizações
“As organizações do terceiro setor existem para provocar do terceiro setor
mudanças nas pessoas e na sociedade onde estão inseridas” existem para
(DRUCKER, 2002, p. 3). Essa frase encontra-se no primeiro provocar mudanças
parágrafo do livro de Peter Drucker sobre como se deve fazer a nas pessoas e na
administração de organizações sem fins lucrativos. Pensar na missão sociedade onde
estão inseridas”

21
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

da organização é um passo importante para quem ingressa no mundo do terceiro


setor. Respirar a organização, conhecer a razão de existir e ter brilho no olho
contribuem para que se alcancem os propósitos da atuação.

Já vimos as diversas nomenclaturas pelas quais o terceiro setor é


conhecido. Ele ainda pode ser classificado conforme sua função ou propósito de
existência. Assim, as organizações têm algumas características comuns, que são
manifestadas na maneira como se apresentam e nos programas e projetos de
atuação.

Dentre as diversas atividades que desenvolvem, podemos encontrar objetivos


diversos. Essas atividades estão classificadas em grupos e subgrupos, de acordo
com o trabalho da Organização das Nações Unidas (2003), que apresentamos no
quadro a seguir.

QUADRO 2 – GRUPOS E SUBGRUPOS DE ENTIDADES SEM FINS LUCRATIVOS


Grupos Subgrupos
Cultura e recreação Cultura e artes; esportes; outros clubes sociais e de rec-
reação
Educação e pesquisa Educação primária e secundária; educação superior; ed-
ucação – outros; pesquisa
Saúde Hospitais e reabilitação; lares de idosos; casa de inter-
venção de crise e de saúde mental; outros serviços de
saúde
Serviço social Serviços sociais; de emergência e socorro; apoio rendi-
mento e manutenção
Ambiental Ambiental; proteção animal
Desenvolvimento e habitação Econômica, social e desenvolvimento comunitário; habi-
tação; de emprego e formação
Direito, advocacia e política Organizações civis e advocacia; direito e serviços jurídi-
cos; organizações políticas
Intermediários filantrópicos e Fundações; outros intermediários filantrópicos e pro-
promoção do voluntariado moção do voluntariado
Internacional Atividades internacionais
Religião Associações e congregações religiosas
Associações profissionais e Associações empresariais; associações de profissionais;
empresariais sindicatos
Não especificados Não especificados anteriormente

FONTE: Adaptado de Organização das Nações Unidas (2003)

Outra classificação apresenta as organizações como sendo empreendimento


sem fins lucrativos, organizações não governamentais e fundações e institutos
empresariais.

Uma terceira classificação enquadra as organizações como de advocacy


(que lidam com a defesa de direitos), como organizações de caráter técnico e

22
Capítulo 1 O Terceiro Setor

prestadoras de serviço. E ainda uma última concepção, que classifica como


conservadoras, moderadas, questionadoras e transformadoras.

Se observarmos bem o Quadro 2, vamos perceber que essas classificações


estão abrangidas pela classificação da ONU e que podem ter serventia como um
direcionador para quem deseja realizar estudos acadêmicos mais aprofundados
sobre a temática.

No Brasil, percebemos que um grande número de entidades do terceiro setor


tem prestado diversos serviços que tipicamente são de natureza pública, nas
áreas da educação, saúde e assistência social.

Como qualquer outra organização econômica que tenha objetivos


distributivos, ou seja, que visam dedicar de alguma forma seu excedente em
benefício de uma categoria beneficiária, essas organizações do terceiro setor
realizam a distribuição para aqueles que usufruem dos produtos e serviços
oferecidos por ela.

Para saber mais, acesse a nossa constituição de 1988, no


sítio eletrônico: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/
constituicao.htm>.

Isso ocorre porque a constituição federal de 1988 inseriu a sociedade civil


organizada em várias questões de interesse social, como a saúde, a assistência
social, proteção da criança e adolescente, entre outras. E as organizações
que se prestam a realizar esses serviços são exatamente retratadas como as
pertencentes ao terceiro setor. E como já mencionamos anteriormente, um dos
desafios tem sido traduzir o que é e quem faz parte desse setor.

Outra característica importante no aspecto de atuação do terceiro setor é que


as restrições quanto à distribuição de recursos são geralmente impostas por lei.
O papel da restrição é ajudar a forçar a utilização para a categoria do beneficiário,
ou seja, de maneira correta, sem desvios.

Naturalmente, a restrição com relação a correta distribuição deve ser


complementada por regras que visam inibir outros formas ou padrões indevidos
de distribuição implícita, como o pagamento de salários excessivos aos gerentes

23
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

ou ainda a permissão para se realizar auto negociação – oportunista – por parte


dos curadores, entre outros.

Portanto, deve-se realizar um esforço na tarefa de produzir novos modelos


de sociabilidade, orientados para a criação de bens e serviços relacionais, ou seja,
em que as relações de confiança e reciprocidade são elementos fundamentais. É
claro para que se alcance sucesso, deve-se verificar um alto nível de envolvimento
das partes interessadas, uma participação cidadã.

Dados do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas)


de 2019, disponíveis no ‘mapa das organizações’ indicados no sítio a
seguir, mostram que existem mais de 780 mil organizações do terceiro
setor no Brasil. No mapa é possível identificar a área de atuação,
quantas organizações existem por região, qual a composição destas,
no que diz respeito aos recursos humanos e também indicadores
sobre a captação e mobilização de recursos. Acesse o site em:
<https://mapaosc.ipea.gov.br/>.

Elas participam ativamente do atendimento à população, inseridas em


diversas áreas, com atuação por meio da prestação de serviços, como saúde,
educação, assistência social, direitos humanos, na esfera ambiental, cidadania,
cultura, esporte, entre outras.

Há um senso comum de que boa parte dessas entidades auxiliam o Estado


naquilo que ele não dá conta de entregar à sociedade, preenchendo assim uma
lacuna importante no desenvolvimento dos direitos e da nossa sociedade.

Para melhor compreender as áreas de atuação do terceiro setor,


selecionamos alguns logotipos de organizações, retiradas dos sites das
organizações. Certamente você já ouviu falar de alguma delas.

24
Capítulo 1 O Terceiro Setor

Propomos aqui uma atividade de aprendizagem, na qual você


pode pesquisar e preencher o quadro a seguir, indicando qual a
área de atuação destas organizações e descrevendo quais são as
atividades realizadas pelas organizações. Reserve um tempo para
resolver a atividade.

FIGURA – LOGOMARCAS DE ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR

FONTE: Sites oficiais das organizações


Organização Área de Atuação Descrição
Trapamédicos
Cia Carona de Teatro
Instituto Guga Kuerten
Cerene
SOS Mata Atlântica
Ampara Animal

O crescimento do terceiro setor representa uma mudança na forma de


participação do cidadão em relação ao âmbito estatal. Um bom número dessas
entidades celebra parcerias com o poder público, sendo por ele subsidiadas.
Porém uma maioria depende de outras fontes de recursos para sua manutenção
e atendimento ao seu público. Nos Capítulos 2 e 3, vamos estudar um pouco
mais sobre as fontes de financiamento do terceiro setor.

Na próxima seção, vamos estudar um fenômeno que tem crescido no Brasil,


que é a economia solidária e social e estabelecer suas relações com o terceiro
setor.

25
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Para saber mais sobre o terceiro setor, indicam-se os seguintes


sítios eletrônicos: LEO INDICA <https://abong.org.br/> e <https://
www.filantropia.ong/>.

Você pode consultar este vídeo produzido pelo Observatório


do Terceiro Setor, criado em 16 de julho de 2019, que apresenta
uma plataforma de divulgação de conhecimento e informação de
organizações do terceiro setor no Brasil: <https://www.youtube.com/
watch?v=Ef439WJavUk>.

3 ECONOMIA SOLIDÁRIA E SOCIAL


A economia solidária é um movimento que funciona como forma de inclusão
social e geração de renda. Não raro, é chamado também de Economia Social. É
retratado como um jeito novo de produzir, vender, comprar e trocar aquilo que for
necessário para se viver, sem que ocorra exploração ou que se tenha vantagens
sobre o outro, somado a uma preocupação com o ambiente. Busca-se fortalecer
o conjunto, sendo cada participante responsável pelo bem do outro. Percebe-se
nessas relações um processo de ganha-ganha (ANASTÁCIO, 2018).

Essa forma de Essa forma de organização na economia surge como um


organização na jeito diferente de organizar o mercado de trabalho, que tem como
economia surge propósito minimizar as desigualdades sociais, divulgando valores
como um jeito como a cooperação e a solidariedade, pois o sistema econômico
diferente de
vigente evolui de forma desigual, ou seja, no capitalismo existe uma
organizar o mercado
de trabalho, que limitação quanto ao acesso à riqueza gerada.
tem como propósito
minimizar as Por outro lado, a economia solidária tem uma perspectiva
desigualdades oposta à ideia da benevolência, filantropia ou caridade, na qual uma
sociais, divulgando pessoa ajuda a outra, sem reciprocidade, criando muitas vezes uma
valores como a
situação semelhante a uma dívida que não pode ser honrada. Aqui, o
cooperação e a
solidariedade. que prevalece é a associação de forças.

Não é um movimento novo, nem foi criado no Brasil. É um movimento social


surgido na primeira metade do século XIX, juntamente com o movimento operário
associativo, ou seja, com o advento da indústria na Europa e Estados Unidos.

26
Capítulo 1 O Terceiro Setor

A solidariedade verificada na economia solidária ocorre quando os


trabalhadores excluídos do mercado de trabalho se unem para criar um
empreendimento coletivo, com o objetivo de produzir, comprar, dar crédito, entre
outras atividades.

Algumas organizações típicas da economia solidária são demonstradas no


quadro a seguir.

QUADRO 3 – TIPOS DE PRÁTICAS NA ECONOMIA SOLIDÁRIA


Grupos de produção comunitária, coop- Os trabalhadores buscam saídas coletivas para
erativas e associações de produção a sua situação de desemprego e para fortalecer
sua pequena produção
Comércio solidário e comércio justo in- Em que os produtos elaborados por pequenos
ternacional grupos são vendidos a um preço justo, seja na
própria comunidade, seja através de redes inter-
nacionais de importação e exportação
Sistemas locais de intercâmbio Se valem de moedas sociais de circulação local
criadas pelos grupos para facilitar a troca de pro-
dutos e serviços no interior dos próprios grupos
e entre eles
Organizações de certificação e eti- Que atuam visando possibilitar aos consumi-
quetagem dores identificar com facilidade os produtos e
serviços da economia solidária a partir de selos
que lhes são conferidos assegurando a sua qual-
idade social
Consumo crítico e solidário e grupos de Em que as pessoas selecionam os produtos e
aquisição solidária serviços considerando os impactos de seu con-
sumo sobre as cadeias produtivas e sobre os
ecossistemas e, ao comprar juntas, diretamente
dos produtores ou em lojas e armazéns solidári-
os, geram vantagens recíprocas tanto para si
mesmas na condição de consumidores quan-
to para os próprios produtores pela prática do
preço justo
Financiamento solidário Tanto da produção quanto do consumo, como
no caso dos Bancos do Povo ou Bancos Comu-
nitários, Cooperativas de Crédito e Bancos Éti-
cos
Economia de comunhão Em que a empresa compartilha os lucros dan-
do-lhes uma tripla destinação: reinvestimento na
empresa, pagando justa remuneração aos tra-
balhadores; auxílio aos necessitados e difusão
da cultura de comunhão
Difusão de softwares livres e tecnolo- Viabilizando o acesso a tecnologias produtivas
gias livres e sustentáveis que podem ser apropriadas livremente na pro-
moção do bem-viver das comunidades

FONTE: Adaptado de Mance (2005)

A seguir, vamos apresentar as características das organizações que estão


inseridas no contexto da economia solidárias, apresentando alguns casos de
sucesso e alguns que fracassaram em sua tentativa.

27
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

3.1 CARACTERÍSTICAS
Como qualquer outra forma de organização, também as que compõem o
conjunto de atividades da economia solidária têm suas características próprias.
Queremos destacar as principais, para uma melhor compreensão de sua
abrangência e possibilidades de ação.

Os principais autores que estudam a economia solidária


A economia solidária apontam que a competição econômica gera sociedades com muitas
é, portanto, um desigualdades. É um reflexo do capitalismo selvagem que impera
projeto de sociedade nas maiores economias do mundo. Esses autores defendem que
que vai em busca
para ter uma sociedade com maior igualdade, é necessário estimular
de uma nova forma
de se organizar a solidariedade.
economicamente.
Passa a funcionar A economia solidária é, portanto, um projeto de sociedade que
como uma vai em busca de uma nova forma de se organizar economicamente.
estratégia de Passa a funcionar como uma estratégia de enfrentamento ao
enfrentamento ao
desemprego e à exclusão social. Diante disso, passa a oferecer uma
desemprego e à
exclusão social. experiência relacional, pautada em fundamentos de cooperação
econômica e autogestão.

Para ter sucesso, esse tipo de organização deve ser fundado


sob alguns princípios:

a) a propriedade dos meios de produção é coletiva, ou seja, pertence


aqueles que trabalham na produção, de forma igualitária;
b) a gestão é democrática, seja ela direta ou representada, especialmente
se a organização tem um número elevado de membros;
c) a discussão e decisão sobre a distribuição da renda líquida deve ser
exclusiva dos seus membros;
d) a decisão do destino do excedente anual também é tomada de forma
conjunta, sendo que cada membro tem direito a um voto.

28
Capítulo 1 O Terceiro Setor

Para complementar os princípios, vamos destacar no quadro a seguir quais


são as características que devem estar presentes, para que uma organização
possa ser considerada de economia solidária.

QUADRO 4 – CARACTERÍSTICAS DA ECONOMIA SOLIDÁRIA


Característica Descrição
Cooperação A existência de interesses e objetivos comuns, a união dos es-
forços e capacidades, a propriedade coletiva de bens, a partilha
dos resultados e a responsabilidade solidária.

Na maioria dos casos, essas organizações coletivas agregam um


conjunto grande de atividades individuais e familiares.
Autogestão Os participantes das organizações exercitam as práticas partici-
pativas de autogestão dos processos de trabalho, das definições
estratégicas e cotidianas dos empreendimentos, da direção e
coordenação das ações nos seus diversos graus e interesses.
Dimensão Econômica É uma das bases de motivação da agregação de esforços e re-
cursos pessoais e de outras organizações para produção, bene-
ficiamento, crédito, comercialização e consumo.

Envolve o conjunto de elementos de viabilidade econômica, per-


meados por critérios de eficácia e efetividade, ao lado dos aspec-
tos culturais, ambientais e sociais.
Solidariedade O caráter de solidariedade nos empreendimentos é expresso em
diferentes dimensões:

• na justa distribuição dos resultados alcançados;

• nas oportunidades que levam ao desenvolvimento de


capacidades e da melhoria das condições de vida dos
participantes;

• no compromisso com um meio ambiente saudável;

• nas relações que se estabelecem com a comunidade


local;

• na participação ativa nos processos de desenvolvimen-


to sustentável de base territorial, regional e nacional;

• nas relações com os outros movimentos sociais e popu-


lares de caráter emancipatório;

• na preocupação com o bem-estar dos trabalhadores e


consumidores;

• no respeito aos direitos dos trabalhadores e trabalhado-


ras

FONTE: Adaptado de Rotschild-Witt (1979)

Para o formato de organizações da economia solidária, a autogestão, ou


auto-organização, é um elemento essencial para sua atuação. A governança
democrática é central para esse tipo de organização, que se opõem a modelos

29
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

hierárquicos, com cargos e funções, característicos de modelos corporativos


(LAVILLE, 2011; LECA; GOND; CRUZ, 2014; ROTHSCHILD-WITT, 1979).

No modelo das organizações sociais, a cooperação, a solidariedade e a


economia comunitária são ideais que vão contribuir para o alcance da autonomia,
independência e preocupação com a comunidade (LAVILLE, 2011; LECA; GOND;
CRUZ, 2014; ROTHSCHILD-WITT, 1979).

O movimento da economia solidária brasileira tem se caracterizado pela


busca de alternativas econômicas ao sistema capitalista. Historicamente o país
tem um problema social de milhares de trabalhadores, que, em situação de
vulnerabilidade social, mobilizam-se para enfrentar esse problema (ANDION;
SERVA, 2006).

Apesar de serem apresentadas como alternativas interessantes, restrições


podem ser impostas e com isso limitar a atuação dessas organizações. Um
exemplo é o acesso a recursos públicos. Na próxima seção, vamos estudar as
organizações de interesse público, os requisitos necessários para se habilitar a
receber recursos públicos. E, na maioria das vezes, as organizações da economia
solidária ficam impedidas, pois as suas características acabam se contrapondo às
exigências legais das organizações de interesse público (VIEIRA; LOPES, 2014).

Neste contexto, um papel importante junto às organizações é a participação


das incubadoras tecnológicas de cooperativas populares, também conhecido
como ITCPs. Elas surgem a partir do envolvimento de universidades junto aos
grupos de economia solidária. O que se verifica é que com a criação das ITCPs
foram resgatados os elementos de igualdade, colaboração e preocupação com o
bem-estar do ser humano (RAMOS, 2003).

Para exemplificar, trago dois exemplos de organizações de economia


solidária, sendo que uma obteve sucesso e a outra não. Primeiramente, vamos
falar de uma pequena cooperativa solidária de trabalho têxtil, que ainda está
em atividade na cidade de Blumenau – SC, denominada Coopergips, que tem
chamado atenção pelos resultados positivos alcançados.

E o outro caso, também de uma pequena cooperativa, essa com atuação na


área de transportes, infelizmente não teve a mesma sorte que a Coopergip’s, pois
teve sérios problemas. Por conta disso, não vamos revelar o nome, para evitar
constrangimentos.

30
Capítulo 1 O Terceiro Setor

FIGURA 7 – LOGOMARCA DA COOPERGIP’S

FONTE: <http://coopergips.blogspot.com/>. Acesso em: 5 out. 2020.

A Coopergip’s nasceu em um contexto de política pública de inclusão


produtiva, desenvolvido pela secretaria municipal de assistência social do
município de Blumenau. Seu propósito foi inserir uma população socialmente
excluída do mercado de trabalho. O grupo é formado por mulheres em busca da
manutenção de sobrevivência.

A constituição da cooperativa se deu no ano de 2005 e contou com a


participação de 19 mulheres. Produzia inicialmente artesanatos e produtos de
cama, mesa e banho. A partir do ano de 2011, começaram a produzir indumentária
médica, atendendo a uma cooperativa médica da cidade, representando um
importante passo na consolidação da cooperativa.

Sobre a experiência de participar de uma organização de economia solidária,


observou-se nos relatos de cooperadas e ex-cooperadas, de que nem todas
atingiram satisfação com a atividade cooperativa, em grande parte por não atingir
determinado patamar de renda.

Como as decisões são tomadas coletivamente, foram


Cooperadas que
estabelecidas metas para a produção, que consequentemente estão extremamente
trariam melhor resultado financeiro, além da forma como seria a satisfeitas com
distribuição dos excedentes. Para as ex-cooperadas, esse foi um fator o andamento
determinante para sua saída. da cooperativa,
demonstrando
acreditar no
No entanto, os relatos de cooperadas que estão extremamente
modelo, e melhor,
satisfeitas com o andamento da cooperativa, demonstrando acreditar enxergando uma
no modelo, e melhor, enxergando uma possibilidade até então distante possibilidade até
da sua realidade, que é a reinserção delas no mercado de trabalho. então distante da
sua realidade, que
A outra cooperativa é uma organização que foi composta por é a reinserção delas
no mercado de
70 cooperados. Sua área de atuação é o transporte e fretamento
trabalho.
rodoviários e sua sede ficava no estado de Santa Catarina. A

31
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

motivação principal da criação dessa cooperativa foi o cansaço dos trabalhadores


devido à exposição e exploração por parte das empreiteiras, prestadoras de
serviço para municípios, especialmente para secretarias de obras.

Relatam os cooperados que os dois primeiros anos da fundação foram


muito difíceis, pois não conseguiam participas em licitações. Segundo seus
depoimentos, a concorrência com a iniciativa privada era desigual.

No ano de 2002, conseguiram uma articulação entre uma ITCP e uma


prefeitura e a partir dessa colaboração, a cooperativa ganhou uma obra de grande
porte. Começou então a obter receita e ter reconhecimento na região.

Tudo ia muito bem até que tiveram um problema de desfalque, com o desvio
de significativos recursos por parte do presidente e do tesoureiro. Segundo
relato de um membro, a cooperativa só não fechou naquele momento porque os
membros ainda enxergavam aquele empreendimento como a realização de um
sonho, que infelizmente fechou, tempos mais tarde.

Se compararmos as experiências desses dois exemplos com os princípios


da economia solidária, rapidamente vamos entender onde cada uma acertou ou
falhou.

Como atividade complementar, você pode preencher, no quadro


a seguir, suas impressões sobre o que foi positivo e o que foi negativo
nessas duas experiências.

Princípios Coopergip’s Cooperativa de


Transporte
Propriedade dos meios de pro-
dução

Gestão democrática

Distribuição da renda líquida

Decisão do destino do exce-


dente anual

32
Capítulo 1 O Terceiro Setor

Na próxima seção, vamos apresentar outras experiências relacionadas


às redes de colaboração no Brasil e no mundo.

3.2 REDES DE COLABORAÇÃO E


EXPERIÊNCIAS NO BRASIL E MUNDO
Como temos visto até aqui, o terceiro setor tem um importante papel de
mobilizar as pessoas que têm propósitos semelhantes, devido à proximidade e
confiabilidade de umas para com as outras, possibilitando exercer papéis de ação
coletiva e intervenções em pequenos grupos.

Mas, se as diversas práticas bem-sucedidas de economia solidária


continuarem no isolamento, elas acabam por fragilizar o modelo e consequente
possibilidade de expandir local e globalmente. O que se observa é um movimento
mundial, no sentido de se organizarem redes socioeconômicas, que buscam
em ações conjuntas articular processos coletivos de financiamento, produção,
comercialização, consumo e também o desenvolvimento tecnológico.

As redes de colaboração de economia solidária: objetivam integrar


empreendimentos solidários de produção, comércio, serviços e consumo, bem
como organizações sociais diversas, promovendo reinvestimentos coletivos,
fortalecendo e criando novas empresas, além de reorganizar solidariamente as
cadeias produtivas.

As redes de colaboração solidárias podem desempenhar um importante


avanço na construção de uma nova formação social. Alguns autores vêm
chamando de uma sociedade pós-capitalista, pois na economia solidária a
reprodução do valor econômico está centrada no trabalho e consumo solidários e
não na concentração da riqueza.

Para se tornar viável, esse modelo alternativo depende da difusão do


consumo solidário, do reinvestimento coletivo dos excedentes e da colaboração
solidária entre os participantes. Na base desses três aspectos, está o princípio
ético que diz que, quanto mais amplia o bem viver de todos, mais se aprimora o
bem viver de cada um.

Como organizar uma rede de economia solidária? Pode-se partir daquilo


que já é conhecido, ou seja, leva-se em consideração as demandas concretas
de consumo das famílias e se realiza um levantamento das potencialidades
locais. Depois desse levantamento, segue-se com a elaboração de projetos
que, preferencialmente, sejam complementares, para depois selecionar

33
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

adequadamente os instrumentos ou tecnologias sociais a serem adaptadas e


empregadas para fortalecer esse arranjo produtivo local, que ao longo do tempo
vai se constituir com a organização da rede socioeconômica.

Para uma adequada construção de rede de colaboração, alguns


passos são apontados como essenciais. Vamos conhecer cada um.

a) Realizar um diagnóstico – deve-se considerar qual o consumo


da população a ser abrangida, considerando a alimentação,
habitação, higiene e limpeza, além de serviços pessoais.
É importante detalhar ao máximo, com as quantidades. Na
sequência, fazer um levantamento de quais atividades produtivas
se encontram na região, ou seja, que tipos de produtos podem
ser disponibilizados.
b) Elaborar um projeto de empreendimento econômico – conhecidos
os levantamentos do diagnóstico, é possível construir um arranjo
socioprodutivo para estabelecer estratégias de logística para
armazenamento, distribuição e até a comercialização.
c) Selecionar tecnologias sociais, ou adaptar os instrumentos
existentes – visando potencializar atividades projetadas, pode-
se dispor de linhas de crédito solidárias, fomentar a criação de
associações de compras, ou de prestação de serviços, e trabalhar
com a capacitação e desenvolvimento de empreendimentos e
produtores.
d) Gestão participativa – estimular a participação das pessoas
na tomada de decisões, já que esse formato em rede deve ser
democrático.

34
Capítulo 1 O Terceiro Setor

A figura a seguir ilustra uma rede de colaboração solidária, com todo o seu
possível alcance.

FIGURA 8 – O CAMPO DA ECONOMIA

FONTE: SENAES-TEM (2005, s.p.)

Em âmbito mundial, existem algumas organizações que têm se esforçado na


promoção do comércio justo, cujos fundamentos são as características das redes
de colaboração. Citamos a European Free Trade Association (EFTA), a Fairtrade
labelling Organizations Internacional (FLO), a World Fair Trade Organization
(WFTO) e a Fair Trade Federation (FTF).

Essas organizações divulgaram, no ano de 2014, dez princípios que devem


ser observados para sustentar o comércio justo mundial. São eles: 1) Criação de
oportunidades para produtores economicamente desfavorecidos; 2) Transparência
e responsabilidade na troca de informação e na tomada de decisões; 3) Práticas
comerciais justas, estáveis, duradouras, em respeito pelo bem-estar social,
ambiental e econômico dos pequenos produtores; 4) Pagamento de um preço justo
pelo trabalho dos produtores, sem desigualdades entre gêneros; 5) Renúncia total
ao trabalho infantil ou forçado; 6) Compromisso de não discriminação, igualdade

35
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

de gêneros e liberdade de associação; 7) Boas condições de trabalho, saudáveis


e seguras; 8) Incentivo à capacitação dos produtores e desenvolvimento das suas
competências; 9) Promoção dos princípios do Comércio Justo aos consumidores;
e 10) Respeito pelo ambiente.

No Brasil, são inúmeras organizações preocupadas na mobilização e


fortalecimento das organizações para construção de redes de colaboração.
Citaremos apenas algumas aqui: a Unisol, que reúne produtores da agricultura
natural, o COSolidário, situado no Centro Oeste, Rede Baurú Solidária, Rede
Brasil Justa e Solidária e a Justa Trama.

FIGURA 9 – LOGOMARCA JUSTA TRAMA

FONTE: <https://www.justatrama.com.br/sobre-nos/>. Acesso em: 15 set. 2020.

Quero destacar a Justa Trama, que é uma rede composta por trabalhadores
organizados em pequenos empreendimentos da economia solidária. Nela, estão
inseridos agricultores, fiadores, tecedores, costureiras, artesão, coletores e
beneficiadores de sementes.

Convido você a visitar a página da Justa Trama e conhecer


um pouco mais desse modelo. Essa rede abrange cinco estados
brasileiros (RS, MG, CE, MS, RO) e tem cerca de 600 trabalhadores
envolvidos, garantido renda e acesso a novos mercados. Disponível
em: <https://www.justatrama.com.br/sobre-nos/>.

36
Capítulo 1 O Terceiro Setor

Esse fortalecimento das e nas redes solidárias permite que as organizações


da economia solidária ingressem no mercado, não para concorrer com as outras
organizações solidárias, mas para se ajudar a conseguir fazer frente às grandes
empresas do mercado. O resultado disso é que... bem, acesse o sítio da Justa
Trama e veja um pouco dos resultados.

No sítio do Conselho nacional de Economia Solidária: <https://


www.ipea.gov.br/participacao/conselhos/conselho-nacional-de-
combate-a-discriminacao-lgbt/142-conselho-nacional-de-economia-
solidaria/278-conselho-nacional-de-economia-solidaria> é possível
encontrar um pouco de como a Economia Solidária tem se
desenvolvido no país. Acesse o conteúdo e responda à questão da
atividade de estudo.

1 Quais são as finalidades do Conselho Nacional de Economia


Solidária?

Na próxima seção avançamos para o último tópico deste capítulo. Vamos


conhecer um pouco mais das organizações de interesse público.

4 ORGANIZAÇÕES DE INTERESSE
PÚBLICO
Algumas organizações do terceiro setor cooperam com o Estado, no
atendimento do interesse público. Para tanto, celebram termos de cooperação
e fomento, recebendo recursos orçamentários dos entes federativos, ou ainda a
cessão de bens e outros instrumentos previstos em leis específicas. Ou seja, o
poder público paga para as organizações atuarem em seu nome.

Para que isso seja possível, essas organizações precisam observar um


conjunto de normas e regras, para que possam estar habilitadas a realizar

37
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

contratos com o Estado. Nos próximos itens, queremos explorar um pouco mais
essas possibilidades, estudando a o enquadramento dessas organizações,
os certificados, qualificações e títulos possíveis de alcançar e, talvez o mais
importante, as obrigações e responsabilidade advindas dessa relação.

4.1 ENQUADRAMENTO: QUEM PODE


SER
De um modo geral, podemos dizer que as organizações que atendem a
critérios estabelecidos em lei, que tenham normas em seus estatutos que atendam
aos requisitos legais, que não tenham sido instituídas pelo poder público e que
desenvolvam atividades típicas de interesse público, estão aptas a buscarem o
reconhecimento como organização de interesse público.

Mas devemos lembrar que nem todas as organizações do


Nem todas as
terceiro setor possuem uma função pública, com objetivos de
organizações
do terceiro setor promover o bem-estar social. Algumas existem tão somente para
possuem uma atender a interesses de grupos específicos, dos quais podemos
função pública, citar os sindicatos, as associações de seguro mútuo, ou ainda,
com objetivos de relembrando o Quadro 2, dos grupos e subgrupos de organizações,
promover o bem- em que encontramos organizações como clubes sociais, de esporte
estar social.
e de congregações religiosas.

4.2 CERTIFICAÇÕES,
QUALIFICAÇÕES E TÍTULOS
As organizações do terceiro setor podem buscar um reconhecimento junto ao
poder público. Esse reconhecimento, ou ‘selo’, em geral, classificam-se em títulos,
certificações e qualificações. Apesar de se tratar de formas de reconhecimento,
eles não são obrigatórios e cada um possui características próprias, pois são
concedidos para funções específicas.

E por que uma organização deveria ter títulos, certificados ou qualificações?


A literatura nos dá algumas pistas a respeito. Vejamos:

a) diferencia as entidades que os possuem, inserindo em um regime


de tratamento jurídico específico;
b) demonstra que a organização possui credibilidade;
c) facilita a captação de investimentos privados e obtenção de
financiamentos;

38
Capítulo 1 O Terceiro Setor

d) possibilita o acesso a benefícios fiscais;


e) permite que o poder público celebre convênios, para repasse de
recursos públicos.

Podemos ver que existem algumas, digamos, vantagens para as


organizações que possuem estes ‘selos’. É importante destacar que cada
um possui uma legislação específica, ou seja, que deve ser cumprida pela
organização interessada em obtê-lo.

Também é importante destacar que alguns deles podem ser cumulativos,


ou seja, a organização pode ter mais de um simultaneamente. Veremos isso na
sequência.

O mais antigo de todos no Brasil é o ‘Título de Utilidade Pública Federal’,


reconhecido pela sigla UPF, que foi criado pela Lei nº 91/1935 e revogado pela lei
conhecida como ‘Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil’, pela
Lei nº 13.019/2014.

Embora no âmbito federal esse título não exista mais, nos municípios e em
âmbito estadual, ainda estão vigentes, cada ente com suas próprias regras e
normas para requerimento.

Como exemplo, vamos apresentar as condições para se buscar a utilidade


pública no estado de Santa Catarina. A regulamentação está contida na Lei
estadual nº 16733/2015. Destacamos no quadro a seguir alguns aspectos
interessantes.

QUADRO 5 – REQUISITOS PARA RECONHECIMENTO


DE UTILIDADE PÚBLICA ESTADUAL – SC

Quem pode solicitar Membros da assembleia legislativa


Quais atividades Educação gratuita, saúde gratuita, assistência social, segurança
alimentar e nutricional, prática gratuita de esportes, cultura, defesa
e conservação do patrimônio histórico e das artes, o voluntaria-
do e a filantropia, a defesa, preservação e conservação do meio
ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; o desen-
volvimento econômico e social e o combate à pobreza; a experi-
mentação, não lucrativa, de novos modelos socioprodutivos e de
sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito;
os direitos estabelecidos, construção de novos direitos e asses-
soria jurídica gratuita de caráter suplementar; a ética, a paz, a ci-
dadania, os direitos humanos, a democracia e outros valores uni-
versais; e os estudos e pesquisas científicas, desenvolvimento de
tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e
conhecimentos técnicos e científicos.

39
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Quais atividades são Benefício mútuo destinadas a proporcionar serviços ou bens a um


proibidas número restrito de associados, não extensivos à comunidade em
que atua; religiosas ou voltadas para a disseminação de credos,
cultos, práticas e visões devocionais e confessionais; partidárias e
assemelhadas, inclusive suas fundações; e creditícias que tenham
vinculação com o sistema financeiro nacional a que se refere o art.
192 da Constituição Federal.
Requisitos Ser constituída no estado de Santa Catarina, possuir CNPJ, efe-
tivo e contínuo funcionamentos nos doze meses anteriores à for-
mulação do pedido, assinada por uma das seguintes autoridades:
a) Chefe do Poder Executivo Municipal, Secretário Municipal ou
Procurador do Município; b) membro do Poder Legislativo Munic-
ipal; c) autoridade judiciária; d) membro do Ministério Público; ou
e) Delegado de Polícia; f) conselhos municipais da área em que a
entidade atua; Apresentar ata da fundação, estatuto e alterações,
registrados em Cartório; ata da eleição e posse da diretoria em
exercício, registradas em Cartório; não remunere cargos de dire-
toria ou conselho; que comprove ter exercido atividade mediante
relatório; que tenha a lei de utilidade pública municipal.

FONTE: O autor

Como se observa, a lista de documentos necessários é bem ampla. Somado


a essa lista, ainda existe a possibilidade de a assessoria legislativa entender ser
necessário maior detalhamento, e por conta disso solicitar documentos adicionais.

O ‘selo’ seguinte ao qual vamos nos referenciar é o CEBAS – Certificado de


Entidade Beneficente de Assistência Social. Essa certificação foi criada pela Lei nº
8742/1993, e, em geral, organizações que têm atuação tradicional na assistência
social, educação e saúde é que buscam essa certificação. Atualmente é a Lei nº
12101/2009 que rege o CEBAS.

As organizações que buscam o CEBAS necessitam comprovar o atendimento


de uma série de requisitos. Atualmente, o CEBAS é concedido pelo Ministério
correspondente à atividade da organização. Assim, temos o CEBAS na área da
Saúde, na Educação e Assistência Social. No quadro a seguir, vamos resumir os
principais pontos.

QUADRO 6 – COMPROVAÇÃO E REQUISITOS – CEBAS

CEBAS SAÚDE CEBAS EDUCAÇÃO CEBAS ASSISTÊNCIA SO-


CIAL
Deve celebrar contra- Prestar informações ao censo Organização deve prestar
to ou convênio com o da educação básica e educação serviços ou realizar ações so-
gestor do SUS (Siste- superior, conforme definido pelo cioassistenciais, de forma gra-
ma Único de Saúde) MEC tuita, continuada e planejada,
para os usuários e para quem
deles necessitar, sem discrim-
inação

40
Capítulo 1 O Terceiro Setor

Ofertar a prestação Conceder bolsas de estudos na Terão prioridades na cele-


de serviços ao SUS proporção de 1 bolsa integral bração de convênios, contratos
no percentual mínimo para 5 pagantes. ou instrumentos congêneres
60%, comprovado com com o poder público para ex-
base nas internações Obs.: estes critérios podem ser ecução de programas e proje-
e atendimentos ambu- alterados tos.
latoriais
Deve informar: o total Ofertar bolsas em todas as suas Deve estar inscrita no Consel-
de internações e aten- unidades ho Municipal de Assistência
dimentos ambulatori- Social
ais não SUS e SUS
Manter o Cadastro A seleção dos alunos benefi- Integrar o cadastro nacional de
Nacional de Estabe- ciários de bolsa seguirá critérios entidades e organizações de
lecimentos de Saúde definidos pelo MEC assistência social
– CNES
FONTE: O autor

É importante destacar que os requisitos e comprovações listados no quadro


anterior são um resumo da lei. As organizações interessadas em requerer o
certificado devem acessar o decreto nº 8242/2014, que regulamenta todo o
processo de certificação.

Encontre informações relacionadas ao processo de certificação


no CEBAS no seguinte sítio: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
Ato2011-2014/2014/Decreto/D8242.htm#art70>.

O CEBAS é uma certificação muito importante para as organizações do


terceiro setor, especialmente pelo grande benefício tributário concedido às
organizações certificadas. Isso porque, conforme previsão da Lei nº 12101/2009,
as organizações portadoras do CEBAS ficam isentas da parte patronal das
contribuições sociais incidentes sobre a folha de pagamento, além da contribuição
social sobre o lucro líquido (CSLL), a contribuição para o financiamento da
seguridade social (COFINS) e a contribuição para o PIS/PASEP.

41
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Traduzindo em número, vamos ver um caso prático: LEO ESTUDANDO


Imagine um hospital, de pequeno porte, que tenha 50 funcionários em sua
folha de pagamento. O valor total das remunerações, entre salários e outras
gratificações, somam o montante de R$ 160.000,00 por mês. Esse hospital
também tem uma atividade sujeita ao pagamento de tributos sobre faturamento e
que representam receitas no valor de R$ 20.000,00 mensais.

Com base nesses dados, vamos simular as duas situações: a primeira delas
considerando que esse hospital não tem o CEBAS, e na segunda situação, com o
CEBAS. Com essa simulação, vamos verificar quanto (em R$) o hospital deixa de
recolher aos cofres públicos, por conta da sua certificação junto ao CEBAS. Para
realizar o cálculo, sabemos que a contribuição social patronal é de 20%, além da
incidência do PIS na ordem de 1% sobre o valor da folha. Esses percentuais têm
sua base em legislação tributária específica.

Para a atividade comercial, ocorre a incidência de 7,6% de COFINS e 2,88%


de CSLL. Esses percentuais constam em legislação específica, pelo que se
recomenda sempre consulta prévia.

QUADRO – SIMULAÇÃO TRIBUTÁRIA – ORGANIZAÇÃO DO TERCEIRO SETOR
ITENS SITUAÇÃO 1 SITUAÇÃO 2 (R$) DIFERENÇA (R$)
(R$)
Folha de pagamento 160.000,00 160.000,00

INSS 20% 32.000,00 0,00

PIS 1% 1.600,00 0,00

Total folha e encargos 193.600,00 160.000,00 -33.600,00

Base de cálculo tributos 20.000,00 20.000,00

COFINS 7,6% 1.520,00 0,00

CSLL 2,88% 576,00 0,00

Total tributos 2.096,00 0,00 -2.096,00

ECONOMIA GERADA EM UM MÊS -35.696,00

ECONOMIA PERCENTUAL ESTIMADA 22,3%

FONTE: O autor

42
Capítulo 1 O Terceiro Setor

Dessa maneira, é possível concluir que é vantajoso para a organização


possuir esse certificado. Para conseguir a certificação, há um longo caminho,
que não é fácil, assim como a sua manutenção também não é fácil, já que as
exigências para manutenção são elevadas. Porém, em termos financeiros, são
valores que, acumulados, representam uma economia significativa para as
organizações do terceiro setor.

O próximo item de nosso estudo é a qualificação como OSCIP – Organização


da Sociedade Civil de Interesse Público. A OSCIP é uma qualificação prevista
na Lei nº 9790/1999 e regulamentada pelo Decreto nº 3100/1999. A qualificação
de OSCIP está ao encargo do Ministério de Justiça, que é o responsável pela
concessão, manutenção e também desqualificação (perda) do selo.

Encontre a lei que instituiu a qualificação de OSCIP no seguinte


sítio eletrônico: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9790.
htm>.

É muito comum ouvirmos a expressão “eu abri uma OSCIP”. A rigor, o que
ocorre é a constituição de uma organização do terceiro setor, com interesses
sociais e que apresenta em seu estatuto as disposições necessárias para se
buscar a qualificação de OSCIP.

Portanto, o que a sigla OSCIP representa é uma qualificação jurídica, que


permite a essas organizações tratamento diferenciado em algumas áreas, como
formalizar parcerias com o poder público.

Para se qualificar como OSCIP, a organização deve se enquadrar em pelo


menos uma das finalidades e objetivos previstos na lei, que traz uma lista ampla
dessas atividades. Essa lista está no artigo 3º da lei. Vejamos quais são:

I - promoção da assistência social;


II - promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio
histórico e artístico;
III - promoção gratuita da educação, observando-se a forma
complementar de participação das organizações de que trata
esta Lei;

43
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

IV - promoção gratuita da saúde, observando-se a forma


complementar de participação das organizações de que trata
esta Lei;
V - promoção da segurança alimentar e nutricional;
VI - defesa, preservação e conservação do meio ambiente e
promoção do desenvolvimento sustentável;
VII - promoção do voluntariado;
VIII - promoção do desenvolvimento econômico e social e
combate à pobreza;
IX - experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-
produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio,
emprego e crédito;
X - promoção de direitos estabelecidos, construção de novos
direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar;
XI - promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos
humanos, da democracia e de outros valores universais;
XII - estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias
alternativas, produção e divulgação de informações e
conhecimentos técnicos e científicos que digam respeito às
atividades mencionadas neste artigo.
XIII - estudos e pesquisas para o desenvolvimento, a
disponibilização e a implementação de
Mas, não basta tecnologias voltadas à mobilidade de pessoas,
apenas apresentar por qualquer meio de transporte.
essas atividades.
A Lei nº 9790/1999 Podemos observar que a lista de atividades é ampla,
exige que os abrangendo um número significativo de organizações. Várias dessas
estatutos contenham
atividades não tinham possibilidade de buscar título de utilidade
de forma expressa,
a observância pública ou obter a certificação no CEBAS, por esses selos terem
de princípios mais restrições em relação ao seu acesso.
legais, adoção de
práticas de gestão Mas, não basta apenas apresentar essas atividades. A Lei nº
transparente, ter 9790/1999 exige que os estatutos contenham de forma expressa,
um conselho fiscal
a observância de princípios legais, adoção de práticas de gestão
constituído, a forma
como o patrimônio transparente, ter um conselho fiscal constituído, a forma como o
será destinado, patrimônio será destinado, os critérios de prestação de contas,
os critérios de e uma inovação até então ausente nas demais leis que tratavam
prestação de contas. de questões relacionadas a organizações do terceiro setor: a
possibilidade de instituir remuneração aos dirigentes que atuam na
A possibilidade gestão executiva, ou que prestem serviços específicos.
de instituir
remuneração aos Portanto, a organização do terceiro setor que possui a
dirigentes que qualificação como OSCIP pode usufruir de algumas vantagens
atuam na gestão
em relação a outras organizações. No quando a seguir, são
executiva, ou que
prestem serviços apresentadas as principais vantagens.
específicos.

44
Capítulo 1 O Terceiro Setor

QUADRO 7 – VANTAGENS – OSCIP


Ter um reconhecimento público

Possibilidade de celebrar termos de parceria com o poder público

Possibilidade de receber doações dedutíveis do imposto de renda de pessoas jurídicas

Possibilidade de remunerar dirigentes

Possibilidade de receber bens apreendidos, abandonados ou disponíveis pela Receita


Federal

FONTE: Adaptado de Brasil (1999)

Vale destacar que algumas organizações não podem pedir a qualificação


como OSCIP. São elas: os sindicatos, associações de classe ou de representação
de categoria profissional, as instituições religiosas ou voltadas para a disseminação
de credos, cultos, práticas e visões devocionais e confessionais, as organizações
partidárias e assemelhadas, as entidades de benefício mútuo destinadas a
proporcionar bens ou serviços a um círculo restrito de associados ou sócios, as
instituições hospitalares privadas não gratuitas e suas mantenedoras, as escolas
privadas dedicadas ao ensino formal não gratuito e suas mantenedoras, as
organizações sociais, as cooperativas, as fundações públicas e as fundações,
sociedades civis ou associações de direito privado criadas por órgão público ou
por fundações públicas.

E quando uma organização que pretenda buscar a qualificação não preenche


os requisitos, o que ela deve fazer? Mesmo que naquele momento não esteja apta
a requerer sua qualificação, ela poderá promover todas as alterações necessárias
para adequar-se e então realizar seu requerimento.

A Lei nº 13019/2014, conhecida como Marco Regulatório, e já citada em nosso


livro, trouxe algumas mudanças importantes a respeito do tempo de existência da
organização, para buscar a qualificação. Ela necessita ter no mínimo três anos de
constituição. Antes dessa mudança, bastava ter completado um exercício fiscal
(geralmente coincidindo com o calendário). Essa mudança teve como objetivo
principal barrar o acesso à qualificação daquelas organizações ditas entidades-
fantasma. É semelhante a um estágio probatório.

Na próxima seção, vamos falar um pouco sobre as obrigações e


responsabilidades das organizações de interesse público e do terceiro setor em
geral.

45
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

4.3 OBRIGAÇÕES E
RESPONSABILIDADES
Observe o texto da reportagem e responda: O que o texto pode nos
indicar? Que é necessária maior transparência e visibilidade às informações que
interessam não só aos associados de organizações, mas também a um número
maior de interessados, como os beneficiários, parceiros, financiadores, sociedade
e o poder público. São os chamados stakeholders, o público com quem as
organizações se relacionam.

FIGURA 10 – REPORTAGEM SOBRE PUBLICIDADE NA IGREJA

FONTE: Folha de S. Paulo (2002, s.p.)

Nem sempre é possível distinguir organizações idôneas das entidades-


fantasma. E isso prejudica a reputação do terceiro setor como um todo. Um dos
resultados dessa desconfiança é a dificuldade em se criar uma cultura de doação
em favor das organizações.

46
Capítulo 1 O Terceiro Setor

O que se espera então das organizações do terceiro setor e as de interesse


público? Em primeiríssimo lugar, é melhorar a forma de qualificação e divulgação
por parte dessas organizações. Ou seja, além dos selos vistos na seção anterior,
espera-se por algo a mais das organizações. E esse algo a mais guarda uma
relação com algo que parece antigo e fora de moda: a ética e moral.

A sociedade como um todo tem mais confiança em organizações


É possível controlar
que são transparentes administrativa e financeiramente. Assim, é os recursos
possível controlar os recursos empregados em parcerias e convênios empregados
de interesse público, pois trata-se de recursos oriundos do pagamento em parcerias e
dos tributos. O nome disso é controle social. convênios de
interesse público,
pois trata-se de
O controle social das organizações com selos, especialmente
recursos oriundos
as qualificadas como OSCIP, deve estar à disposição de qualquer do pagamento dos
pessoa que tenha interesse em checar se as informações são tributos. O nome
verdadeiras. Está na lei. E estar à disposição significa abrir seus livros disso é controle
com informações que vão desde as questões financeiras e contábeis, social.
até aspectos mais administrativos, como o estatuto e formação da
diretoria.

Aqui percebemos obrigações e responsabilidades que essas organizações


e seus diretores estão sujeitos. E são obrigações severas, afinal, uma denúncia
vinda de qualquer cidadão, com evidências de irregularidades, pode ocasionar a
perda da qualificação e trazer prejuízos aos termos de parceria em andamento.
Esses processos, que não podem ser feitos de forma anônima, podem ocorrer no
âmbito administrativo ou mesmo no judiciário.

Mas essas obrigações e responsabilidade não se limitam simplesmente a


disponibilizar as informações. Um termo de parceria por exemplo, firmado entre
o poder público e uma OSCIP, deve prever uma série de especificações a serem
cumpridas. Vejamos alguns itens que deverão constar obrigatoriamente no termo
de parceria:

a) estipulação das metas e dos resultados a serem atingidos e os


respectivos prazos de execução ou cronograma;
b) previsão expressa dos critérios objetivos de avaliação de
desempenho a serem utilizados, mediante indicadores de
resultado;
c) previsão de receitas e despesas a serem realizadas em seu
cumprimento, estipulando item por item as categorias contábeis
usadas pela organização e o detalhamento das remunerações e

47
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

benefícios de pessoal a serem pagos, com recursos oriundos ou


vinculados ao Termo de Parceria, a seus diretores, empregados e
consultores;
d) estabelece as obrigações da Sociedade Civil de Interesse
Público, entre as quais a de apresentar ao Poder Público, ao
término de cada exercício, relatório sobre a execução do objeto
do Termo de Parceria, contendo comparativo específico das
metas propostas com os resultados alcançados, acompanhado
de prestação de contas dos gastos e receitas efetivamente
realizados, independente das previsões mencionadas;
e) publicação, na imprensa oficial do Município, do Estado ou da
União, conforme o alcance das atividades celebradas entre o
órgão parceiro e a Organização da Sociedade Civil de Interesse
Público, de extrato do Termo de Parceria e de demonstrativo da
sua execução física e financeira.

Veja a figura a seguir, que ilustra uma publicação em imprensa oficial de um


termo de parceria.

FIGURA 11 – EXTRATO DE TERMO DE PARCERIA

FONTE: IMAP (2017, s.p.)

Seguindo com as responsabilidades e obrigações, não dá para deixar de


fora os princípios da administração pública, que encontramos na Constituição
Federal e estão diretamente relacionados com as organizações do terceiro setor
que utilizam recursos públicos, sejam eles provenientes de termos de parceria,
contratos de gestão, ou mesmo de incentivos fiscais.
48
Capítulo 1 O Terceiro Setor

O quadro a seguir apresenta esses princípios e seus respectivos significados.

QUADRO 8 – PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Legalidade significa dizer que deverão cumprir o que diz a legislação vigente e
seus atos constitutivos
Impessoalidade determina que seus processos decisórios sejam imparciais
Moralidade as escolhas da gestão devem ser éticas e íntegras
Publicidade seus atos e fatos devem ser divulgados, tais como relatórios e contas,
para que qualquer pessoa tenha conhecimento
Economicidade deverá observar o que tiver maior relação custo/ benefício, otimizando
o emprego do capital e suas contratações devem ser por preços de
mercado – vantajosos/justos para a organização
Eficiência impõe-se ao estabelecimento de metas, formulação de projetos e
avaliação de resultados

FONTE: O autor

A transparência consiste na abrangente disponibilidade de informações


que sejam relevantes e confiáveis sobre os seguintes aspectos: a) o desempenho
periódico, b) a situação financeira, c) as oportunidades, e d) a avaliação dos riscos
para o financiador de projetos.

Para esse conjunto de ações, tem-se emprestado o termo accountability, que


não tem uma tradução para o português, mas que diz respeito à forma como se
procede uma prestação de contas e, relacionando ao nosso estudo, o que as
organizações do terceiro setor devem divulgar.

Ser uma organização do terceiro setor não significa estar imune a problemas,
como os escândalos de corrupção ocorridos no início dos anos 1990, que
apontaram irregularidades na transferência de recursos do governo federal para
organizações ilegítimas e que culminaram com a criação de duas Comissões
Parlamentares de Inquérito (CPIs), em 2001 e 2007, trazendo uma visão
incriminadora e resultando em mácula à reputação do terceiro setor de forma
geral.

Por conta disso, um movimento se levantou no sentido de disciplinar as


relações entre o poder público e as organizações, de modo a minimizar riscos
de fraude e corrupção. A celebração de parcerias entre poder público e as
organizações não era garantia de eficiência da atuação.

Assim nasceu o marco regulatório das organizações da sociedade civil,


ou marco regulatório do terceiro setor, e que é apontado como um divisor de
águas na relação entre o poder público e as organizações da sociedade civil,
especialmente, nos aspectos relacionados ao repasse e gestão de recursos
públicos, as chamadas parcerias voluntárias.

49
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Para finalizar, é importante destacar que a organização ou seus dirigentes


que agirem de forma fraudulenta ou de forma dissimulada, poderão ser
penalizadas em três âmbitos:

1) no âmbito tributário – pode sofrer uma ação de descaracterização


de sua natureza jurídica, estando sujeita a recolher todos os
tributos sobre os valores arrecadados e severas multas pela
simulação e omissão de receitas;
2) no âmbito civil – em decorrência de irregularidades, sofrer
sanções como o cancelamento do registro e impedimento
de se constituir novamente, além de estar sujeita a arcar com
indenizações contra fé pública;
3) no âmbito criminal – os dirigentes podem sofrer ações
relativas à sonegação fiscal, simulações, má-fé, entre outros
enquadramentos.

Por fim, indicamos os materiais a seguir para você aprofundar os seus


estudos. O artigo, assinado por Rafaela Silva, apresenta conceitos relacionados
às organizações sociais e de interesse público, sob um olhar jurídico. Já o
vídeo, produzido pelo GIFE, reporta aos desafios regulatórios para o repasse de
recursos. Bons estudos.

Artigo: <https://jus.com.br/artigos/54024/organizacoes-sociais-
e-organizacoes-da-sociedade-civil-de-interesse-publico>.
Vídeos: <https://www.youtube.com/watch?v=Kz8sl0CAHE8>.

Agora que você já se familiarizou com as certificações e


qualificações, anote no quadro a seguir quais são as principais
vantagens para a organização buscá-las.

50
Capítulo 1 O Terceiro Setor

5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Assim chegamos ao final desta primeira jornada. Encerramos o Capítulo 1 e
antes de seguir adiante, vamos rememorar os assuntos que abordamos até aqui.

Iniciamos nossa trajetória entendendo as origens, as definições, os conceitos


e as principais nomenclaturas usadas no terceiro setor. Aprendemos que não há
como identificar exatamente quando o terceiro setor surgiu. Mas sabemos que ele
está presente no nosso dia a dia há tempo, seja na área da educação, cultura,
meio ambiente; e que, no Brasil, as primeiras organizações eram ligadas à igreja,
lá na época colonial.

Vimos que o terceiro setor é conhecido por um bocado de nomes, como


entidades filantrópicas, ONGs, institutos, entre outros tantos, para representar tão
somente as organizações nascidas por iniciativa da sociedade civil, sem finalidade
de lucro e que estão em busca do bem-estar social.

Identificamos também as áreas de atuação das organizações do terceiro


setor, que em geral funcionam como complemento às atividades desenvolvidas
pelo setor público.

Entender um pouco da origem das organizações nos ajuda a enxergar onde


é possível chegar com a forma de atuação das organizações. Isso foi relatado na
segunda seção, na qual abordamos os aspectos da economia solidária e social.

Compreender que a união de objetivos de diversas organizações facilita o


acesso a uma série de serviços e possibilidades de melhoria nas condições de
vida e trabalho, como o proposto pelas organizações de economia solidária.

Por fim, estudamos as organizações do terceiro setor que são de interesse


público, ou seja, aquelas que visam atender a sociedade de forma cooperada com
o poder público.

Verificamos que as organizações que atendem aos dispositivos legais podem


se enquadrar como organizações de interesse público e, com isso, buscar os
selos de reconhecimento: títulos de utilidade pública, certificações e qualificações.

No final da seção, discutimos a respeito das obrigações e responsabilidades


reservadas às organizações de interesse público – e, por extensão, aos seus
dirigentes. Vimos que pisar fora da faixa pode trazer consequências severas aos
envolvidos.

51
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

No próximo capítulo, nossa jornada será no interior de uma organização do


terceiro setor. Vamos entender como é o processo de gestão de uma organização,
desde a sua constituição, identificando a natureza jurídica que se aplica a ela,
compreendendo e organizando os documentos que a organização precisa manter
atualizada e disponível.

Posteriormente, vamos criar modelos para as rotinas administrativas e


financeiras da organização, conhecendo instrumentos e ferramentas de suporte
à decisão. Nesse momento, será importante ter uma orientação tributária, para
o adequado enquadramento e, com isso, usufruir dos benefícios aplicáveis ao
terceiro setor.

Na sequência do capítulo, entraremos nas rotinas relacionadas à gestão de


recursos humanos. Como já discutido nas páginas anteriores, o terceiro setor tem
uma participação forte de voluntários em suas atividades e na composição de
seus quadros e uma gestão adequada ao voluntariado também se faz necessária
para cumprir com obrigações e responsabilidades.

Esperamos você.
Bons estudos!!

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55
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

56
C APÍTULO 2
Gestão de Organizações do
Terceiro Setor

A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Identificar a natureza jurídica aplicável às organizações do terceiro setor;

• Conhecer os aspectos tributários do terceiro setor;

• Definir modelos de controle administrativos e financeiros;

• Conhecer os aspectos e implicações do trabalho voluntário no terceiro setor,

• Organizar a documentação mínima exigida de uma organização;

• Criar modelos de controle administrativo e financeiro de acordo com o tipo de


organização;

• Avaliar a consistência da estrutura de gestão ora elaborada;

• Estruturar um modelo de gestão do voluntariado.


Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

58
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
No Capítulo 1 destacamos o crescimento do terceiro setor e nos preocupamos
com delimitar o espaço dele.

Neste capítulo, vamos avançar um pouco mais em nossos estudos. Vamos


partir do pressuposto de que uma organização está na fase de constituição, ou
seja, quando um grupo de pessoas tenha decidido se reunir para trabalhar em
prol de uma causa e, nesse caso, faz-se necessário começar a olhar com mais
atenção para as questões jurídicas que envolvem essa decisão.

O primeiro aspecto a ser considerado é o adequado enquadramento


dessa pessoa jurídica que está nascendo. Sabe-se que para o registro de uma
organização, basta que se apresente o estatuto e ata de fundação em cartório de
registro e a organização passa a existir.

Porém, se esse passo não for dado com segurança, os reflexos poderão
trazer sérias consequências, como excesso de tributação, impossibilidade
de captar recursos como organização do terceiro, impossibilidade de admitir
voluntários para o serviço. Assim, o adequado reconhecimento da natureza
jurídica poderá ajudar a impulsionar as atividades da organização.

Outro aspecto importante está relacionado à organização interna dessa


pessoa jurídica que acaba de nascer. Preocupar-se com uma estrutura
organizacional administrativa e financeira vai contribuir para que a entidade tenha
o fôlego necessário para atravessar a sua jornada, definida pela sua razão de
existir.

E não menos importante são os aspectos relacionados a recursos humanos,


tão relevantes para as organizações do terceiro setor, especialmente quando se
pode contar com uma força de trabalho voluntário. Porém, não basta apenas ter
a disposição e disponibilidade para receber alguém que se propõe a ajudar, é
necessário um planejamento e um conjunto de providências para que a relação
entre organização e voluntário possa se dar de forma transparente e justa.

2 ASPECTOS SOCIETÁRIOS E
LEGAIS
Nesta seção, vamos avançar para os conceitos e possíveis aplicações
relacionadas aos aspectos societários e tributários aos quais às organizações

59
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

do terceiro setor estão sujeitas. Compreender a natureza jurídica aplicável


ao terceiro setor é importante, pois dela derivam outras abordagens, como os
aspectos tributários, de organização administrativa e de recursos humanos, que
serão abordadas nas Seções 3 e 4.

Para entender “natureza jurídica”, são necessários alguns comentários


iniciais sobre as disciplinas do direito. Determinar uma natureza jurídica é
identificar as características, qualidades ou afinidades com pontos do direito.
São aspectos inerentes a alguém ou alguma coisa. É sua essência, aquilo que
sobressai.

Na legislação brasileira, temos o Código Civil (Lei nº 10.406/2002) que nos


apresenta os tipos de pessoas, que podem ser físicas ou jurídicas. Com relação
às pessoas jurídicas, tem-se a separação entre as de direito público e de direito
privado. E, no detalhamento das pessoas jurídicas de direito privado, encontramos
o enquadramento ou a natureza jurídica em que estão inseridas as organizações
do terceiro setor.

2.1 NATUREZA JURÍDICA DAS


ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO
SETOR
Como descrito na introdução desta seção, a natureza jurídica
A natureza jurídica
consiste no estabelecimento legal de um instituto jurídico, que no
consiste no
estabelecimento caso das organizações do terceiro setor é o seu reconhecimento e
legal de um instituto constituição na legislação vigente. No Brasil, a legislação base para
jurídico, que no caso os enquadramentos das naturezas jurídicas é o Código Civil, a Lei
das organizações nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
do terceiro setor é o
seu reconhecimento
Do texto da lei, a partir do artigo 44, pode-se extrair que,
e constituição na
legislação vigente.quanto à forma de constituição, as organizações do terceiro setor
são de direito privado e são representadas essencialmente pelas
associações e pelas fundações. Com a vigência de outra lei, a nº
13.204/2014, outras atividades, ligadas às cooperativas e entidades religiosas,
foram alçadas ao reconhecimento jurídico como organizações do terceiro setor.
Apresentaremos esse conceito adiante. Por ora, vamos focar nas associações e
fundações, que são as naturezas jurídicas clássicas.

60
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

As duas formas – associação e fundação – possuem características próprias


que as diferenciam entre si. Analisaremos as características de ambas a partir
das diferenças apontadas no quadro a seguir.

QUADRO 1 – DIFERENÇAS BÁSICAS ENTRE ASSOCIAÇÃO E FUNDAÇÃO


ASSOCIAÇÃO FUNDAÇÃO
Constituída por pessoas. Constituída por patrimônio, aprovado pre-
viamente pelo Ministério Público.
Pode (ou não) ter patrimônio. O patrimônio é condição para sua criação.
A finalidade é definida pelos associados. A finalidade deve ser religiosa, cultural, ou
de assistência, definida pelo instituidor.
A finalidade pode ser alterada. A finalidade é perene.
Os associados deliberam livremente. As regras para deliberações são definidas
pelo instituidor e fiscalizadas pelo ministério
Público.
Registro e administração mais simples. Registro e administração são mais buro-
cráticos.
Regida pelos artigos 44 a 61 do Código Civ- Regida pelos artigos 62 a 69 do Código Civ-
il. il.
Criada por intermédio de decisão em as- Criada por intermédio de escritura pública
sembleia, com transcrição em ata e elabo- ou testamento. Todos os atos de criação,
ração de um estatuto. inclusive o estatuto, ficam condicionados à
prévia aprovação do Ministério Público.
FONTE: Adaptado de OAB/SP (2005)
Associação: uma
organização que
Os autores Azevedo e Senne (2006) apresentam aquela que
surge da vontade
talvez seja a definição clássica para associação: uma organização de um grupo de
que surge da vontade de um grupo de pessoas unidas por uma causa pessoas unidas
ou objetivos sociais comuns e que seu propósito não tenha finalidade por uma causa ou
de obter lucratividade. Portanto, a associação nasce quando não há o objetivos sociais
fim lucrativo ou que ela não tenha a intenção de dividir os resultados comuns e que seu
propósito não tenha
financeiros alcançados, mesmo que ela possua patrimônio e que
finalidade de obter
tenha receitas. lucratividade.

A despeito dessa questão, uma organização do terceiro setor não vai


perder sua natureza jurídica por estar formando patrimônio, seja ele por meio da
contribuição de seus associados, seja por meio de doações, ou ainda, em forma
de negócios para aumentar ou manter suas atividades, como uma associação
esportiva que vende aos seus associados uniformes ou itens correlatos. Em
alguns casos, porém, essa prática poderá trazer outras consequências, como a
necessidade de recolher algum tributo – assunto do qual trataremos adiante.

Nas associações encontramos um interesse, um fim e um meio próprio,


que poderão ser alterados livremente e a qualquer tempo, desde que motivado

61
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

pela vontade de seus associados e promovido por meio de documento próprio, o


estatuto, votado e aprovado em assembleia geral dos associados.

O estatuto é o documento de constituição de uma associação pelo qual


se pode caracterizar a natureza jurídica da organização. Se essa constituição
ocorresse por outro instrumento, como um contrato, a caracterização da natureza
jurídica ficaria prejudicada.

As associações podem ser fechadas, específicas ou abertas. Associações


Filantrópicas (abertas), associações em defesa da vida (abertas), culturais,
desportivas e sociais (abertas), consumidoras (aberta), associações de classe
(específicas), produtores (abertas). As de caráter fechado são caracterizadas
pelos sindicatos. Para as específicas, o exemplo mais comum são as Associações
Comerciais e Industriais. E as abertas são as demais, ambientais, assistência
social, entre outras. No entanto, sua natureza jurídica não é alterada apesar
dessa classificação.

Fundação, que é A outra forma de natureza jurídica das organizações do


uma organização terceiro setor, por sua forma de constituição, é a fundação, que é
que tem origem em
uma organização que tem origem em um patrimônio ou conjunto de
um patrimônio ou
conjunto de bens. bens. Por essa característica própria, pode-se dizer que é um tipo
especial de pessoa jurídica, diferente das demais que conhecemos.
Uma fundação pode ser constituída a partir da decisão de um só indivíduo,
diferentemente das associações.

Szazi (2000) define fundação como sendo um patrimônio destinado a servir,


sem intuito de lucro, a uma causa de interesse público determinada, que adquire
personificação jurídica por iniciativa de seu instituidor.

Assim, ela nasce do desejo de um instituidor, que doa parte de seu patrimônio
para o bem comum. Na prática, esse indivíduo ou indivíduos ou ainda outras
pessoas jurídicas de naturezas distintas necessitam lavrar uma escritura pública
ou ainda declarar o desejo, por meio de um testamento, no qual será designada
qual a parcela de seus bens se destina à fundação e para qual finalidade eles
devem servir.

O Código Civil (Lei nº 10.406/2002), em seu artigo 62, parágrafo único, indica
que a partir da sua instituição, as fundações somente poderão ser constituídas
com a finalidade religiosa, moral, cultural ou de assistência.

Qualquer fundação terá o acompanhamento do Ministério Público (na


linguagem jurídica encontraremos a expressão “velar”), onde ela estiver
situada, por meio de seus procuradores, que têm poder para examinar toda a

62
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

documentação da fundação, solicitar informações, pedir prestação de contas,


requerer inquéritos policiais, pedir a prisão preventiva, iniciar ação penal, pleitear
anulação de assembleias e resoluções, além de pleitear também rescisões de
contratos. Ou seja, tudo o que se fizer necessário para que a finalidade instituída
da fundação não se desvirtue, desencaminhe, nem se dilua.

Assim como no caso das associações, as fundações também podem ter


seus estatutos alterados, mas isso depende sempre de autorização do Ministério
Público, que como vimos, tem poder de vetar qualquer alteração. É importante
registrar que as alterações só podem ser de natureza administrativa, ao regime
jurídico ou à autonomia, ou seja, a sua finalidade não poderá sofrer alterações.

Como regra geral, quando falamos de natureza jurídica no âmbito do terceiro


setor, estaremos falando de associações ou fundações. As exceções à regra
necessitam sempre de uma avaliação criteriosa, pois podem ser organizações
com outras naturezas travestidas como organizações do terceiro setor.

Como atividade complementar, responda à pergunta a seguir.

1 Quais são as diferenças principais entre associações e fundações,


no que se refere às deliberações e finalidades?

Na próxima seção, vamos nos debruçar sobre os aspectos tributários do


terceiro setor.

2.2 TRIBUTOS NO TERCEIRO SETOR


Frequentemente ouvimos que as organizações do terceiro setor não pagam
nada de impostos. Criou-se esse senso comum que é equivocado, diga-se de
passagem. O terceiro setor possui alguns benefícios na esfera tributária, mas não
necessariamente significa que é totalmente isento de pagamento de tributo.

Cabe inicialmente relembrar o conceito de tributo e suas classificações no


âmbito do direito tributário para então analisarmos as questões tributárias que se
aplicam especificamente às organizações do terceiro setor.

63
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

O conceito de tributo está descrito no artigo 3º do código


“Art. 3º Tributo é
toda prestação tributário nacional (Lei nº 5172/1966): “Art. 3º Tributo é toda prestação
pecuniária pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa
compulsória, em exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e
moeda ou cujo cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”.
valor nela se possa
exprimir, que não
Significa dizer que é uma obrigação que todas as pessoas têm
constitua sanção de
ato ilícito, instituída perante o Estado. O tributo não é facultativo, portanto, independe
em lei e cobrada da vontade das pessoas. Ele é expresso em moeda e deve ser
mediante atividade cumprido com o pagamento em dinheiro ou sistema equivalente.
administrativa Outra característica é que o tributo não tem característica punitiva,
plenamente mas sim vinculado ao um lançamento por parte do agente público.
vinculada”.
O tributo é classificado conforme seus objetivos e funções em
espécies. A figura a seguir apresenta essa classificação.

Para saber mais sobre o código tributário nacional, você pode


acessar o sítio eletrônico: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/
l5172.htm>.

FIGURA 1 – ESPÉCIES TRIBUTÁRIAS

FONTE: Adaptado de sapodavea.globspot.com. Acesso em: 8 out. 2020.

64
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

As organizações que compõem o terceiro setor (associações e fundações)


gozam de dois institutos relacionados aos tributos: a imunidade e/ou a isenção
tributária, cada qual com suas próprias características e abrangências. Embora
na essência os dois institutos representem o não pagamento de algum tributo,
cada um tem origem e efeitos diferentes. Vamos analisar cada um deles.

Primeiramente, falaremos da imunidade. A imunidade tem seu fundamento


legal na Constituição Federal do Brasil de 1988. Isso significa que seus efeitos são
perenes ou mais difíceis de serem revogados, já que implicaria em mudanças na
constituição. Sabemos que, para alterar, excluir ou incluir um texto na constituição,
é necessário que se tenha um quórum qualificado no Congresso Nacional.

Dito isso, no artigo 150, inciso VI, alínea “c” da Constituição Federal, nós
temos a seguinte determinação em relação a matéria tributária:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas


ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios:
[...]
VI – Instituir impostos sobre:
[...]
a) Patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos,
inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos
trabalhadores, das instituições de educação e de assistência
social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
[...]

Percebe-se que a imunidade é uma proibição aos entes políticos (União,


Estados, Distrito Federal e Municípios), de tributar determinadas pessoas, atos e
fatos, com relação aos impostos, que são uma das espécies de tributos. Portanto,
podemos concluir que a imunidade alcança a espécie “impostos” dos tributos.

E os impostos abrangidos pela imunidade são aqueles relativos ao


patrimônio, renda e serviços das entidades do terceiro setor. Mas quais seriam
estes “impostos”? Novamente vamos buscar na legislação a resposta para esse
questionamento. No quadro a seguir, temos um resumo dos impostos e seus
vínculos aos entes públicos.

65
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

QUADRO 2 – IMPOSTOS ABRANGIDOS PELA IMUNIDADE


DAS ENTIDADES DO TERCEIRO SETOR

Esfera Federal Esfera Estadual Esfera Municipal


Imposto sobre a Renda Imposto sobre a Circulação de Impostos sobre a Proprie-
(IR) Mercadorias (ICMS) dade Predial e Territorial
Urbana (IPTU)
Imposto sobre Produtos Imposto sobre a Propriedade Imposto sobre Serviços de
Industrializados (IPI) de Veículos Automotores Qualquer Natureza (ISSQN)
(IPVA)
Imposto Territorial Rural Imposto sobre Transmissão Imposto sobre Transmissão
(ITR) Causa Mortis ou Doação de Inter Vivos de Bens Imóveis
Bens e Direitos (ITCMD) (ITBI)
Imposto sobre Importação
(II)
Imposto sobre Exportação
(IE)
FONTE: O autor
Destaca-se que uma discussão sobre os efeitos da imunidade incide-
se também sobre as contribuições especiais, com um foco específico sobre as
contribuições sociais das organizações. Também com fundamento na constituição,
no artigo 195, parágrafo 7º:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a


sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei,
mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes
contribuições sociais:
[...]
Parágrafo 7º. – são isentas de contribuição para a seguridade
social as entidades beneficentes de assistência social que
atendam às exigências estabelecidas em lei.
[...].

É necessário tecer um comentário a respeito dos requisitos da lei


mencionados em ambos os preceitos para os quais a carta magna remete. Essa
função de estabelecer os requisitos coube ao Código Tributário Nacional, que na
Lei nº 5.172/1966, em seu artigo 14, incisos I, II, III, lemos:

[...]
I – Não distribuem qualquer parcela de seu patrimônio ou de
suas rendas a qualquer título;
II – Aplicarem, integralmente no País, seus recursos na
manutenção dos seus objetivos institucionais;
III - Manterem escrituração de suas receitas e despesas em
livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua
exatidão.

66
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

O outro instituto é a isenção, que é a desobrigação do pagamento de


determinado tributo, observados os requisitos legais. A isenção se caracteriza
como renúncia ou um favor legal do Estado em benefício da organização.

A isenção é sempre decorrente de uma lei que especifique as A isenção é sempre


condições e requisitos exigidos para sua concessão. Diferentemente decorrente de uma
da imunidade, que é constitucional, a isenção tem caráter temporário, lei que especifique
ou seja, quando ela for concedida, já se pode determinar seu prazo as condições e
de vigência. Na prática, não se observa a revogação de isenções requisitos exigidos
para sua concessão.
tributárias para organizações do terceiro setor, salvo aquelas
originadas por descumprimento dos requisitos legais.

Assim, as isenções podem alcançar todas as espécies de tributos (impostos,


taxas, contribuições de melhoria, contribuições especiais e empréstimos
compulsórios). Cada esfera de governo (federal, estadual ou municipal) legisla
sobre a isenção dos tributos de sua competência.

Podemos resumir as diferenças entre a imunidade e isenção no quadro a


seguir.

Poderíamos nos perguntar: qual a vantagem que o Estado obtém


em dar isenção ou imunidade a uma categoria de entes jurídicos? A
resposta pode ser muito simples. E encontramos também a base na
legislação brasileira.

QUADRO 3 – DIFERENÇAS ENTRE IMUNIDADE E ISENÇÃO


Imunidade Isenção
Regida pela Constituição Federal. Regida por legislação infraconstitucional, ou
seja, de competência do ente político que tenha
competência para instituir determinado tributo.
Não pode ser revogada, nem mesmo Pode ser revogada a qualquer tempo.
por Emenda Constitucional.
Não há o nascimento da obrigação A obrigação tributária nasce, mas a entidade é
tributária. dispensada de pagar o tributo.
Não há o direito de cobrar o tributo. Há o direito de cobrar, mas ele não é exercido.
FONTE: O autor

67
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Como as entidades do terceiro setor geralmente trabalham com recursos


de terceiros, seja por doação, contrato de parcerias, convênios, subvenções,
elas são obrigadas a prestar contas disso à comunidade. E para compor essa
prestação de contas, as organizações devem apresentar documentos idôneos
e válidos, como notas fiscais, faturas de energia elétrica, folhas de pagamento,
entre outros.

Desta forma, essas organizações do terceiro setor fazem com que outras
pessoas jurídicas e físicas se legalizem, emitindo os documentos fiscais
necessários e, com isso, aumentam a base de tributação. Aumentando a base
de tributação, aumenta a arrecadação de tributos e assim ela pode gozar
dos benefícios concedidos por sua parcela de contribuição no aumento da
arrecadação de tributos.

Mas é importante frisar que, apesar de as entidades do terceiro setor


gozarem dos benefícios de isenção ou imunidade, elas não são eximidas da
responsabilidade de obrigações acessórias, como as retenções na fonte sobre
rendimentos pagos, obrigações tributárias, previdenciárias e legais.

Iniciamos esta seção abordando o senso comum de que as organizações


do terceiro setor não pagam tributos e, no decorrer do estudo, esclarecemos que
existe sim essa possibilidade, dependendo da natureza e origem do recurso.

Agora, cabe-nos questionar: há a incidência de algum tributo/


contribuição para as organizações do terceiro setor? Essa questão,
diferente da anterior, não tem resposta pronta.

Apesar de os agentes de fiscalização (fisco) entenderem que algumas


receitas são passíveis de tributação, é necessário ponderar o seguinte, para
aplicar corretamente a isenção ou imunidade:

1. Objetivos da entidade? Quando se constrói o Estatuto, é


preciso deixar muito claro quais os objetivos da entidade e uma
cláusula específica que trate da origem das receitas. Se houver
caracterização de concorrência com outras empresas, pela
prática de atividade empresarial, poderá haver a tributação e a
perda da condição de isenção.
68
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

2. Contabilidade regular e adequada. A contabilização adequada


dos atos fará prova em favor da organização, que em uma
eventual briga judicial, poderá ofertar sua contabilidade à perícia
para provar sua condição de isenta/imune.
3. O Imposto sobre Operações Financeiras é cobrado normalmente,
haja vista que de forma geral as organizações do terceiro setor
não possuem finalidade de operar com o mercado financeiro.
4. Contribuições previdenciárias – apenas as entidades com o
certificado de assistência social (CEBAS), que estudamos no
capítulo anterior, é que tem condições de pleitear a isenção da
contribuição patronal. As demais estão sujeitas ao recolhimento
de acordo com o regulamento próprio da previdência.

Nos quadros que seguem, apresenta-se de forma resumida a base legal para
isenção de tributos aos quais as organizações do terceiro setor estão sujeitas. É
importante lembrar que essa base legal pode sofrer alterações, portanto, a sua
aplicação é válida para o mês de junho do ano de 2020 e tem caráter didático.
Após essa data, é importante rever a legislação para o adequado enquadramento.

Com relação à Contribuição para o Financiamento Social (COFINS), o


Quadro 4 apresenta a base legal e a base para o cálculo, prazo de recolhimento
e alíquota aplicável.

QUADRO 4 – COFINS (ARTIGO 14 INCISO X DA MP 2.158-35/2001)

Regime • Cumulativo.

• Não-cumulativo: quando auferir receitas não


decorrentes de suas atividades próprias e tais
receitas estiverem sujeitas à incidência não-cu-
mulativa da COFINS.
Receita atividade própria Isenção da COFINS faturamento.
Receita atividade não própria Incidência da COFINS faturamento.
Período Mensal.
Base de cálculo Faturamento proveniente da receita de atividade não
própria.
Alíquota 7,6% receita atividade não própria.
Prazo de recolhimento Dia 15 do mês seguinte.

FONTE: O autor

No Quadro 5, temos a demonstração das bases para a Contribuição


Social sobre o Lucro Líquido e, no quadro 6, as incidências do Programa de
Integração Social (PIS).

69
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

QUADRO 5 – CSLL
Origem Isenção de impostos sempre decorrente de lei (art. 15
da Lei nº 9532/97).
Enquadramento Filantrópico, cultural, recreativo, científico e asso-
ciações civis.
Regime tributário Isenta da CSSL (IN 390/2004 e art. 15 Lei nº 9532/97).
FONTE: O autor

QUADRO 6 – PIS/PASEP ENTIDADES SEM FINS LUCRATIVOS


– ART. 14 MP 2158-35/2001 E ART. 47 DA IN 247/2002
Regime Cumulativo
Modalidade de recolhimento Folha de pagamento (1%)
Período de apuração Mensal
Base de cálculo Folha de salário mensal
Prazo de recolhimento Dia 15 do mês seguinte
Código DARF 8301
PIS Importação Incidência, exceto as importações feitas pela entidade
beneficente de assistência social
FONTE: O autor

Já no Quadro 7, encontramos a base para os cálculos do Imposto de


Renda da Pessoa Jurídica. Esse imposto é importante para as organizações
do terceiro setor, pois a partir dos códigos de recolhimento vinculados a ele, a
Secretaria da Receita Federal obtém dados para confrontar com outras fontes
para identificar a isenção de uma organização.

QUADRO 7 – IRPJ – ART. 150 INCISO V DA CF/88; LEI 9532/97 ART. 15

Origem Isenção de impostos, sempre decorrente de Lei (Art. 15 da


Lei nº 9532/97) “Art. 15. Consideram-se isentas as institu-
ições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científi-
co e as associações civis que prestem os serviços para os
quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição
do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos.
Parágrafo 1º. – a isenção a que se refere este artigo apli-
ca-se exclusivamente em relação ao imposto de renda da
pessoa jurídica e à contribuição social sobre o lucro líquido,
observado o disposto no parágrafo subsequente. Parágrafo
2º. – não estão abrangidos pela isenção do imposto de ren-
da os rendimentos e ganhos de capital auferidos em apli-
cações financeiras de renda fixa ou renda variável”.
Enquadramento Filantrópico, cultural, recreativo, científico e associações
civis
Regime tributário Isenta do IRPJ

70
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

Requisitos • Sem finalidade lucrativa.

• Não remunerar seus dirigentes.

• Aplicar seus recursos nos objetivos sociais.

• Manter escrituração completa.

• Guardar em boa ordem os documentos contábeis,


fiscais, pelo prazo de cinco anos.

• Presentar declaração anual de rendimentos.

• Caso apresente superávit em determinado exer-


cício, destine à manutenção e ao desenvolvimento
dos seus objetivos sociais.

• Obrigada à retenção e recolhimento de impos-


tos sobre rendimentos pagos ou creditados e à
prestação de informações (art. 167 do RIR/99).
Remuneração de dirigentes Possível quando exercer o cargo de gerência ou chefia in-
terna (não diretor).
Escrituração contábil Obrigatória a manutenção da escrituração completa.
Aplicação financeira Sofre o desconto do Imposto de Renda na Fonte, tratando-o
como exclusivo na fonte (não compensável).
Emissão de nota fiscal Atender à legislação estadual ou municipal, conforme o
caso.
Receita de aluguel de imóvel Receita tributável, sujeita à discussão na esfera administra-
tiva ou judicial
Receita de cantina/restau- Isenta do IRPJ
rante
Receita de venda de livros Isenta do IRPJ

Receita de venda do ativo Entendimento como isenta


imobilizado
Prática reiterada de ativi- Receita tributável pelo IRPJ – concorrendo com outras em-
dade comercial presas sujeitas a tributação
FONTE: O autor

Não menos importante é a relação que as organizações têm com os


tributos retidos na fonte. Esses, por força de lei, ficam sob responsabilidade de
pagamento de quem os reteve. Portanto, é de extrema importância a organização
ter uma boa assessoria, para que não sofra ação alguma por parte do fisco, em
relação aos tributos retidos na fonte. O Quadro 8 nos apresenta as características
desses tributos.

71
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

QUADRO 8 – DESCONTO NA FONTE DO IMPOSTO


DE RENDA E DAS CONTRIBUIÇÕES
Tipo de rendimento Contribuições (PIS, COFINS e CSSL) Rendimentos
profissionais listados no art. 647 do RIR/99: limpeza,
manutenção, vigilância, transporte de valores, locação
de mão de obra, factoring e outros serviços listados na
IN nº 459/2004
Beneficiário do rendimento Pessoa jurídica
Responsável pela retenção Tomadora do serviço
Base de cálculo Valor bruto
Alíquota 4,65% - regra geral
Dispensa de retenção e recolhi- Pagamento de rendimento igual ou inferior a R$
mento 5.000,00/mês
Momento de efetuar o desconto Por ocasião somente do pagamento do rendimento
do IR Fonte
Prazo de recolhimento Até o último dia útil da quinzena seguinte ao paga-
mento do rendimento
Código do DARF 5952 (regra geral)
Compensável o valor do IR Fonte Os valores retidos poderão ser compensados pela PJ
prestadora de serviços com as suas respectivas con-
tribuições devidas

FONTE: O autor

Por fim, o Quadro 9 apresenta as características do Imposto sobre


Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em Santa Catarina, no que diz
respeito às organizações do terceiro setor. Destaca-se que, para cada unidade
da federação, é necessário fazer uma pesquisa local, assim como relacionado
ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), que é gerido pelos
municípios – e aqui não teríamos espaço para abordar todos os municípios
brasileiros.

QUADRO 9 – INCIDÊNCIA ICMS – SANTA CATARINA

Origem Art. 28 a 52 do RICMS – a central credita o ICMS da compra


de acordo com as regras do RICMS e emite NF na saída (há
fato gerador do ICMS na saída a qualquer título) COM DE-
STAQUE NORMAL DE ICMS. A central poderá requerer ao
DIAT, regime especial para reduzir a base de cálculo do ICMS
na saída para seus integrantes, de forma que a tributação
seja a mesma que incidiu na entrada interestadual. A afiliada
credita o ICMS destacado na NF pela central de acordo com
as regras do RICMS.
Isenções Para assistência social
Regimes Especiais Poderão ser solicitados regimes especiais para redução da
base de cálculo.

FONTE: O autor

72
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

Os aspectos tributários que cabem às organizações do terceiro setor não


ficam limitados ao que estamos apresentando nesta seção. O direito tributário é
amplo, também quando se olha especificamente para o terceiro setor. Sugere-se
que o acadêmico busque conhecer mais a temática, pois aqui apresentaram-se
os elementos básicos dela que é tão importante no âmbito das organizações do
terceiro setor.

Cabe ainda um alerta, pois, se em algum momento a fiscalização, seja em


qualquer esfera (Federal, Estadual ou Municipal), verificar que a organização
não está atendendo a qualquer requisito estabelecido em lei, sua imunidade e/ou
isenção poderá ser cassada e seus administradores responderão por esses atos,
além disso, ela terá que recolher aos cofres públicos todos os tributos devidos a
partir da verificação da irregularidade. Mas isso é assunto para outra disciplina
ligada ao direito.

Como sugestão de atividade complementar, lanço o seguinte


desafio para você: pesquise quatro organizações do terceiro setor
da sua cidade. Em seguida, identifique se elas possuem isenção ou
imunidade com relação aos tributos. É importante justificar o porquê
do enquadramento. Utilize o modelo a seguir.

Nome da Organização Enquadramento tributário Justificativa

Para aprofundar a temática dos tributos, sugere-se acessar o


vídeo disponível no Youtube, clicando no link a seguir: <https://youtu.
be/jkZbJ8bSS2Y>. O vídeo foi produzido pelo Grupo de Institutos,
Fundações e Empresas (GIFE) e nele o tema tributação é debatido
pelo professor Eduardo Pannunzio da FGC.

73
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Na próxima seção, vamos nos debruçar sobre o marco regulatório do terceiro


setor e entender seu alcance e seus efeitos.

2.3 MARCO REGULATÓRIO


A Lei nº 13.019/2014 A Lei nº 13.019/2014 ficou batizada como sendo o “Marco
ficou batizada como Regulatório do Terceiro Setor ou das Organizações da Sociedade
sendo o “Marco Civil (MROSC)”. Ela foi pensada a partir da percepção de que
Regulatório do
era necessário que se desenvolvesse uma regra moderna para
Terceiro Setor ou
das Organizações disciplinar as relações entre o Poder Público e as organizações do
da Sociedade Civil terceiro setor, sob uma perspectiva gerencialista, ou seja, de controle
(MROSC)”. por resultados nas possíveis parcerias mútuas de cooperação.

Você pode acessar a lei do marco regulatório no sítio eletrônico:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13019.
htm>.

A ideia de se ter um marco regulatório já vinha sendo discutida no Brasil há


muito tempo. Quando a Lei nº 9.790/1999, a lei das OSCIPs (Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público), entrou em vigor, ela teve por um período o
“status” de marco regulatório do terceiro setor. Mas ainda era muito insipiente, era
necessário algo mais robusto.

É bem verdade que a partir da Lei nº 9.790/99 ocorreu um avanço significativo


quando se trata de legislação cujo alcance evidenciasse a existência das mais
diversas organizações do terceiro setor, permitindo também a elas buscarem
recursos públicos. Até então, a Constituição Federal, o Código Tributário Nacional
e umas poucas leis específicas davam um tratamento diferenciado a umas poucas
atividades desenvolvidas, como educação, saúde e assistência social.

O avanço mais significativo em busca de um marco regulatório ocorreu a


partir da criação de um grupo de trabalho, no ano de 2011, que teve a participação
de 150 pessoas, entre agentes governamentais, representantes de organizações
e especialistas. O trabalho do grupo foi concluído no ano de 2012, com a
proposição de um anteprojeto de lei, que segue os trâmites para sua promulgação
em 2014.

74
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

A lei tem como fundamentos para sua existência a gestão pública A lei tem como
democrática, a participação social, o fortalecimento da sociedade civil fundamentos para
e a transparência na utilização de recursos públicos. Significa dizer sua existência a
gestão pública
que o texto trouxe vários aspectos que revelam diversos avanços em
democrática, a
relação a toda a legislação vigente até então, como o controle por participação social,
resultados, a criação do PMIS – Procedimento de Manifestação de o fortalecimento
interesse Social, o chamamento público, a corresponsabilidade de da sociedade civil
todos os gestores da organização do terceiro setor, além dos gestores e a transparência
públicos responsáveis pelo repasse ou não do recurso. na utilização de
recursos públicos.

Art. 18. É instituído o Procedimento de Manifestação de Interesse


Social como instrumento por meio do qual as organizações da
sociedade civil, movimentos sociais e cidadãos poderão apresentar
propostas ao poder público para que este avalie a possibilidade de
realização de um chamamento público objetivando a celebração de
parceria.

De modo amplo, esse marco regulatório traz em sua essência as normais


gerais para a formalização de parcerias voluntárias entre a administração pública
e as organizações da sociedade civil, com ou sem o repasse de recursos. Isso
quer dizer que existem princípios, fundamentos, diretrizes e critérios básicos,
aplicados de forma igual em todo o país, para todas as organizações alcançadas
por esse marco.

Em certa medida, a aplicação do marco regulatório é residual, por alcançar


praticamente todas as organizações que não possuem qualificação como
Organizações Sociais ou OSCIP. Esse é, sem dúvida, um passo importante, pois
dispensa a exigência de qualificação específica para a celebração de contratos e
parcerias com o poder público.

Alguns aspectos da lei são considerados positivos e inovadores, como


a etapa de planejamento prévio de qualquer projeto, a elevação dos níveis de
transparência e participação popular, o acesso ampliado das organizações
aos recursos, as vedações do poder público para cooperar com determinadas
organizações, a execução em rede de projetos e a simplificação e melhoria dos
instrumentos de controle.

75
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Por outro lado, também existem alguns aspectos que ainda são
considerados problemáticos na nova lei, especialmente por ainda existirem focos
de insegurança jurídica, ou seja, pontos que a qualquer momento podem gerar
demandas e processos questionando determinadas ações, o universo ainda
limitado de organizações favorecidas, já que nem todas conseguem se adequar
em suas organizações internas para estarem habilitadas a buscar recurso, e, por
fim, uma tendência forte de padronização e burocratização.

Na próxima seção, vamos tratar de aspectos administrativos e apresentar


um pouco da organização interna de uma organização. De qualquer modo, existe
uma série de vedações à celebração de acordos entre o poder público e as
organizações. E o artigo 39 da lei apresenta quais são essas vedações:

I - Não esteja regularmente constituída ou, se estrangeira, não


esteja autorizada a funcionar no território nacional.
II - Esteja omissa no dever de prestar contas de parceria
anteriormente celebrada.
III - Tenha como dirigente membro de Poder ou do Ministério
Público, ou dirigente de órgão ou entidade da administração
pública da mesma esfera governamental na qual será
celebrado o termo de colaboração ou de fomento, estendendo-
se a vedação aos respectivos cônjuges ou companheiros, bem
como parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até o
segundo grau. 
IV - Tenha tido as contas rejeitadas pela administração pública
nos últimos cinco anos, exceto se:  
a) for sanada a irregularidade que motivou a rejeição e quitados
os débitos eventualmente imputados;  
b) for reconsiderada ou revista a decisão pela rejeição;  
c) a apreciação das contas estiver pendente de decisão sobre
recurso com efeito suspensivo;  
V - Tenha sido punida com uma das seguintes sanções, pelo
período que durar a penalidade:
a) suspensão de participação em licitação e impedimento de
contratar com a administração;
b) declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a
administração pública;
c) a prevista no inciso II do art. 73 desta Lei; (suspensão
temporária da participação em chamamento público, por prazo
não superior a dois anos)
d) a prevista no inciso III do art. 73 desta Lei; (declaração de
inidoneidade)
VI - Tenha tido contas de parceria julgadas irregulares ou
rejeitadas por Tribunal ou Conselho de Contas de qualquer
esfera da Federação, em decisão irrecorrível, nos últimos 8
(oito) anos;
VII - tenha entre seus dirigentes pessoa:
a) cujas contas relativas a parcerias tenham sido julgadas
irregulares ou rejeitadas por Tribunal ou Conselho de Contas
de qualquer esfera da Federação, em decisão irrecorrível, nos

76
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

últimos 8 (oito) anos;


b) julgada responsável por falta grave e inabilitada para o
exercício de cargo em comissão ou função de confiança,
enquanto durar a inabilitação;
c) considerada responsável por ato de improbidade, enquanto
durarem os prazos estabelecidos nos incisos I, II e III do art. 12
da Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992.

Como mencionado na Seção 2.1, em que tratamos das naturezas jurídicas,


o marco regulatório trouxe dois tipos de organização para o mesmo patamar
das associações e fundações: as cooperativas de trabalho e as organizações
religiosas que se dediquem a atividades ou projetos de cunho social, desde que
essas atividades sejam distintas das suas atividades exclusivamente religiosas.

Por fim, nem todos concordam com a classificação dada ao MROSC como
sendo um “marco regulatório”. Isso porque justifica-se que existe farta legislação
que já normatizava as relações do poder público com as organizações do terceiro
setor. Mas mesmo que a Lei nº 13.019/2014 não seja considerada como um
marco, há de se concordar que é um feito importante essa tentativa de consolidar
em um único documento o que se encontrava espalhado.

Para aprofundar seus estudos no tema, sugerimos a leitura do


artigo publicado em 10/2014, de autoria de Paulo Massaru Uesugi
Sigiura, no qual o autor relata os destaques e conclusões a respeito
do marco regulatório, disponível no seguinte sítio eletrônico: <https://
jus.com.br/artigos/32671/marco-regulatorio-do-terceiro-setor>.

Na próxima seção, vamos tratar de aspectos administrativos e financeiros,


importantes para qualquer organização do terceiro setor, independentemente
de seu tamanho. É difícil gerenciar algo que não possua o mínimo de controle e
organização.

77
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

3 ASPECTOS ADMINISTRATIVOS E
FINANCEIROS
Na Seção 2 apresentamos conceitos relacionados aos aspectos societários
e legais de uma organização do terceiro setor. Evidenciamos que o estatuto é o
documento no qual se evidencia a natureza jurídica dessas organizações.

Mas o papel do estatuto vai muito além. É o documento que vai regular
todo a vida de uma organização. No estatuto, serão delimitados os objetivos da
organização, as regras de funcionamento, a forma como se dará a administração,
quais recursos para manutenção. Enfim, o estatuto é a base para qualquer ação
que a organização pretenda realizar.

Dito isso, vamos avançar nos aspectos administrativos e financeiros


pertinentes às organizações do terceiro setor.

3.1 IMPORTÂNCIA DE UMA


ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA
“Não repare a bagunça...” “desculpa qualquer coisa...”

FIGURA 2 – ESCRITÓRIO BAGUNÇADO

FONTE: <https://tramparonline.com/>. Acesso em: 22 set. 2020.

78
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

“Seja bem-vindo...” “aceita um café?” “em que posso ajudar?”

FIGURA 3 – ESCRITÓRIO ARRUMADO

FONTE: <https://tramparonline.com/>. Acesso em: 22 set. 2020.

A partir da observação das duas figuras, proponho uma


provocação a cada um de vocês: em qual dos dois ambientes você
se sentiria mais acolhido, com mais disposição a trabalhar, e onde
você teria um melhor rendimento?

Acredito que a maioria vai responder que se sentiria melhor no ambiente


retratado na Figura 3, não é mesmo? Pois bem, esse pequeno experimento
proposto pretende nos levar a uma reflexão importante, quando olhamos para as
organizações do terceiro setor: como está a situação da casa? Estou com ela
arrumada? Por onde posso começar a me organizar?

Em muitos casos, o que se observa é um amadorismo na forma de administrar


uma organização. Uma gestão sem muitos controles, cheia de vícios e práticas
pessoais, que sem dúvida causa danos à cultura de qualquer organização e
aos seus procedimentos operacionais, o que a deixa longe de qualquer técnica
administrativa ou aderente a regras de conformidade. Isso não quer dizer em
absoluto que as pessoas que assim agem tenham má-fé, apenas que elas não
dominam conhecimento e técnicas de gestão.

Como já mencionado, o estatuto é o primeiro instrumento de gestão que a


organização terá em mãos, já que em seu conteúdo serão definidos a composição

79
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

e o funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos da organização,


entre outros aspectos relacionados ao dia a dia das atividades. Vamos analisar
os principais aspectos que não devem ser esquecidos em um estatuto, além de
outros instrumentos que auxiliarão na governança da organização.

A governança é A governança é a forma como as regras, normas e ações são


a forma como as estruturadas, sustentadas, reguladas e responsabilizadas. O grau
regras, normas
de formalidade depende das regras internas de uma determinada
e ações são
estruturadas, organização e, externamente, com seus parceiros de negócios.
sustentadas,
reguladas e Uma vez que os objetivos da organização estejam definidos,
responsabilizadas. O deve-se criar a estrutura para seu funcionamento. A forma
grau de formalidade de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos,
depende das
administrativos e de controle determinará, entre outras coisas, quão
regras internas de
uma determinada rapidamente as decisões da organização serão tomadas. A figura a
organização e, seguir apresenta a estrutura clássica de uma organização.
externamente, com
FIGURA 4 – ESTRUTURA DE FUNCIONAMENTO DE
seus parceiros de
UMA ORGANIZAÇÃO DO TERCEIRO SETOR
negócios.

FONTE: O autor

O órgão deliberativo é a Assembleia Geral, que tem o poder máximo dentro
da organização. É o órgão soberano e que pode tudo. Entre suas atribuições,
destacamos: aprovação do estatuto, em que são estabelecidas as regras
relacionadas à forma como se elegem os membros dos órgãos de gestão e
controle, a forma como novos associados são admitidos, demitidos ou excluídos,
os deveres e direitos dos associados, as penalidades, a forma de obtenção de
recursos e a forma como se deve prestar contas, os requisitos para se alterar

80
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

o estatuto, zelar pelo patrimônio e garantir o cumprimento das finalidades do


estatuto. A Assembleia Geral é composta por todos os membros em situação
regular na organização.

Os órgãos de gestão são compostos pelo Conselho de Administração


e pela Diretoria ou Secretaria Executiva. Esses são encarregados de prover a
execução das finalidades da organização, representando-a, supervisionando-a,
elaborando as regras de funcionamento interno, contratando e demitindo
funcionários e prestadores de serviço. Sob esses órgãos pesa a responsabilidade
do bom funcionamento e boa gestão dos recursos da organização.

Os órgãos de gestão são responsáveis por organizar as funções


administrativas importantes para o funcionamento das organizações: a função
planejamento, organização, direção e controle. Essas funções, descritas por
Henri Fayol em 1916, são essenciais ao trabalho de qualquer gestor. E devem ser
entendidas como um ciclo que se repete dentro da organização.

FIGURA 5 – FUNÇÕES ADMINISTRATIVAS SEGUNDO FAYOL

FONTE: <https://www.admfacil.com/principais-funcoes-
do-administrador/>. Aceso em: 22 set. 2020.

A função de planejamento tem o objetivo de prever e preparar A função de
o futuro da organização. Ali são determinados os objetivos, definem- planejamento tem o
se os recursos e quais os meios que serão utilizados para alcançar objetivo de prever e
os objetivos. Sem um planejamento, tem-se dificuldade para definir o preparar o futuro da
que se deve fazer, qual caminho seguir e como avaliar os resultados. organização.
Nessa função, define-se o que fazer.

81
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

A recomendação aos gestores é construir o planejamento estratégico,


que é voltado para uma visão ampla, global e de longo alcance. Esse documento
é amplamente utilizado no ambiente corporativo e, para as organizações do
terceiro setor, seguem-se os mesmos passos daqueles estabelecidos para
qualquer empresa. A figura a seguir apresenta as diferentes etapas no processo
de elaboração do planejamento estratégico.

FIGURA 6 – ETAPAS DO PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

FONTE: <https://www.portal-administracao.com/2014/06/planejamento-
gestao-estrategica-o-que-e.html?m=1>. Acesso em: 8 out. 2020.

Em geral, as organizações estão sujeitas a um alto grau de incertezas,
especialmente no que se refere ao financiamento das atividades, tornando a tarefa
de revisar o planejamento estratégico algo frequente. Por outro lado, torna-se um
processo constante de aprendizagem a respeito da dinâmica de funcionamento da
organização, que melhora a capacidade de tomar decisões rápidas e acertadas.
Os aspectos financeiros serão abordados nas próximas seções.
Na função de
organização, Na função de organização, viabiliza-se a execução dos
viabiliza-se trabalhos necessários para alcançar os objetivos propostos no
a execução planejamento. Dito de outra forma, nessa função se estabelecem
dos trabalhos as atribuições e responsabilidades, são distribuídos os recursos e
necessários
definidas as formas de trabalho. Aqui, estabelece-se quem faz o
para alcançar os
objetivos propostos. que, com que recursos e de que forma.

Nessa função, a divisão de responsabilidade procura garantir que seja


realizado todo o trabalho necessário para alcançar determinado objetivo. Então, a

82
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

função organização busca definir quem toma as decisões e sobre quais assuntos,
estabelecer quem deve realizar quais atividades, apontar quem deve acompanhar
e controlar cada atividade além de indicar as relações entre os membros.

Alguns instrumentos podem ajudar a explicar estas responsabilidades. O


principal, como já mencionado, é o estatuto, que dá uma visão macro da estrutura
administrativa, mas outros como organogramas, regimento interno, manuais de
processos ou rotinas com descrição de cargos podem ser utilizados também sob
esta função.

Ressalta-se que a estrutura deve ser dimensionada conforme o tamanho da


organização. A figura a seguir apresenta um modelo de organograma aplicável a
uma organização do terceiro setor.

FIGURA 7 – ORGANOGRAMA DE ONG

FONTE: <http://vivario.org.br/organograma/>. Acesso em: 8 out. 2020.

Vimos que antes de dar início às atividades, a organização deve realizar seu
planejamento e depois organizar os trabalhos. Mas essas funções, por si só, não
são suficientes para garantir que de fato as atividades sejam realizadas.

83
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Na função direção, são tomadas decisões, entre elas conduzir e


Na função direção,
são tomadas motivar as pessoas a exercerem suas tarefas com o fim de alcançar
decisões, entre os objetivos. Nessa função os gestores orientam e estimulam seus
elas conduzir e subordinados a realizarem o trabalho necessário para atingir os
motivar as pessoas objetivos propostos no planejamento e cujas funções foram delimitadas
a exercerem suas na organização dos trabalhos.
tarefas com o fim
de alcançar os
objetivos. Nessa função de direção, primeiramente, os gestores
responsáveis devem ter capacidade para coordenar os trabalhos
a serem realizados de modo a liderar e motivar seus subordinados. Ou seja, a
liderança do gestor deve ser desejável, possibilitando que as pessoas consigam
fazer seus trabalhos da melhor forma possível e com a melhor utilização de
recursos possível.
A função controle
compara os Por fim, a função controle compara os objetivos estabelecidos
objetivos com recursos previstos com os resultados atingidos e recursos
estabelecidos com gastos, com a finalidade de tomar medidas corretivas caso seja
recursos previstos necessário. A avaliação dos resultados, comparando-os com o que
com os resultados fora planejado, ajuda a manter a organização nos caminhos previstos
atingidos e recursos
no planejamento.
gastos.

A comparação com o desempenho real é a essência dessa função. O controle


encontra-se presente no nosso dia a dia em ações mínimas que, na maior parte das
vezes, passam despercebidas. As organizações necessitam estabelecer controles
sobre seus recursos, atividades ou ainda produtos ou serviços gerados. Esses
controles podem se dar de forma interna ou externa, dependendo da natureza do
projeto. A figura a seguir apresenta as quatro fases relacionadas ao controle.

FIGURA 8 – QUATRO FASES DO CONTROLE

FONTE: Chiavenato (2004, p. 185)

84
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

Em geral, os padrões de desempenho nas organizações do terceiro setor


são estabelecidos de forma qualitativa e quantitativa. Isso pode trazer alguma
dificuldade em estabelecer quando se está em início de atividade. Uma sugestão
é utilizar-se de experiências passadas por outras organizações semelhantes.

É muito importante que se observem quatro características presentes na


mensuração de resultados: ela deve ser útil, precisa, atual e econômica. Um
controle que não seja útil para o que serve se não jogar no lixo? Portanto, há
de se ter um cuidado em todo o processo de controle, revisando os processos
constantemente, evitando assim desgaste entre as pessoas e consumo
desnecessário de recursos.

Para finalizar, em apoio aos órgãos deliberativos e de gestão, encontramos o


órgão de controle interno, denominado de Conselho Fiscal. Esse órgão tem uma
importante função, pois cabe a ele exercer a fiscalização sobre o patrimônio, a
escrituração, a movimentação financeira, de modo que o estatuto esteja sendo
cumprido e de que as demais leis que regem a atividade da organização estejam
sendo observadas.

O conselho fiscal tem uma responsabilidade muito grande, que antes da Lei nº
13.019/2014, o Marco Regulatório, entrar em vigor, era manifesto implicitamente,
porém, agora, evidenciou-se de tal forma que se tornou órgão obrigatório nas
organizações. O Conselho Fiscal pode sofrer penalidades caso seja identificada
omissão em relação a alguma irregularidade ou ainda se ele foi conivente com
alguma irregularidade praticada pelos órgãos de gestão.

Chegamos ao final da seção navegando por vários aspectos relacionados à


importância de se manter uma boa gestão administrativa em uma organização do
terceiro setor. Na próxima seção, começaremos a nos ocupar com os aspectos
financeiros das organizações. Nossa conversa começa com a elaboração do
orçamento.

1 Com base no material que estudamos, identifique quais os órgãos


necessários para a estrutura de uma organização do terceiro
setor.

85
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

3.2 ELABORAÇÃO DO ORÇAMENTO


Apesar das organizações do terceiro setor terem caráter “sem fim econômico
ou lucrativo”, isso não significa dizer que ela não possa ter resultados positivos.
Pelo contrário, ela deve aplicar seus recursos obtidos, as suas sobras ou
superávit, para manter suas atividades e aumentar o seu patrimônio, garantindo
sustentabilidade financeira. O que a expressão “sem finalidade econômica”
quer trazer como significado é que a organização não deve distribuir entre seus
associados a sobra ou resultado ou ainda remunerar seus dirigentes por sua
função de dirigente.

De modo geral, as organizações do terceiro setor possuem uma participação


econômica significativa, que não pode ser ignorada. Por isso deve, a exemplo das
empresas e governo, planejar e controlar suas atividades, seja em âmbito social,
organizacional ou econômico. E, para tanto, fazer uso de ferramentas gerenciais
para auxiliar na gestão da organização.
O orçamento “é um
plano detalhado Uma das ferramentas utilizadas na gestão financeira é o
da aquisição e do orçamento. A definição clássica para orçamento encontramos em
uso de recursos, Garrison e Noreen (2001, p. 262), que declaram que o orçamento “é
financeiros ou de um plano detalhado da aquisição e do uso de recursos, financeiros
outra natureza, ou de outra natureza, durante um período especificado”. Embora o
durante um período
orçamento normalmente fique associado ao controle de gastos pela
especificado”.
maioria das pessoas, ele permite ao gestor trabalhar, inclusive, com
outras funções, como as de controle e de planejamento. Logo, permite examinar o
passado, como também prever o futuro da organização.

O orçamento encontra-se inserido no contexto do planejamento e controle


das organizações. A sistematização e formalização de um orçamento envolvem
o preparo e utilização dos objetivos globais e de longo prazo da organização, já
desenvolvidos no planejamento estratégico. Mas também é recomendável conter
um plano de resultados em curto prazo detalhado, de acordo com diferentes
níveis relevantes de responsabilidade e um sistema de relatórios periódicos de
desempenho para os níveis de resultado.

O orçamento apresenta os seguintes benefícios para as organizações, de


acordo com Garrison e Noreen (2001, p. 379):

(i) Provê uma forma de comunicação gerencial acerca dos planos.


(ii) Força os gerentes a pensar sobre ações para o futuro, evitando que
estes, na ausência do orçamento, gastem esforços em ações do dia a
dia.

86
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

(iii) Provê uma forma de alocar recursos entre os departamentos e as áreas.


(iv) Pode evitar o surgimento de potenciais restrições.
(v) Coordena as atividades por meio da integração dos planos das várias
áreas e auxilia que estes estejam na mesma direção.
(vi) Define metas e objetivos e serve como benchmarks para futura avaliação
de desempenhos.

Podemos dizer que o orçamento trata do plano financeiro para implementar a


estratégia da empresa para um determinado período. Ele auxilia o gestor a focar
suas atenções nas operações e também nas finanças da organização, apontando
para o eventual surgimento de problemas e, com isso, auxiliando no cumprimento
dos objetivos e metas traçadas pela organização.

Portanto, o orçamento é considerado por muitos autores como uma


ferramenta fundamental para a prestação de contas dos gestores, pois, mesmo
que os compromissos dos gestores não estão especificados e definidos no plano
estratégico, acabam sendo firmados no momento da montagem do orçamento.

A construção de um orçamento exige, pelo menos, três momentos


fundamentais: sua previsão ou elaboração, sua execução e sua avaliação ou
controle.

A fase inicial compreende que se faça de um lado a previsão dos gastos


em determinado período, que pode ser mensal, anual ou ainda por projeto
específico, e de outro lado, a previsão dos ingressos ou receitas a serem obtidas.
É importante, nesse momento, detalhar ao máximo as rubricas orçamentárias,
que nada mais são do que os itens que compõem o orçamento. Algumas dessas
rubricas necessitam a ajuda de profissionais de outras áreas, como contadores,
para realizar cálculos relacionados aos encargos trabalhistas.

FIGURA 9 – PROCESSO ORÇAMENTÁRIO

FONTE: O autor
Já na fase de execução é na qual ocorrem os gastos previstos, ou seja,
o desembolso de recursos para cumprir as obrigações assumidas e também
o ingresso dos recursos, sejam provenientes de mantenedores ou vindos de
prestação de serviços ou venda de produtos.

87
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

E, na fase de controle, é o momento de acompanhar como os gastos e


receitas se comportaram. O trabalho aqui consiste em analisar se os gastos
estão ocorrendo dentro do que foi previsto e se as entradas de receitas estão
ocorrendo conforme o previsto. Aqui, caso necessário, fazem-se ajustes para que
o orçamento não fique prejudicado.

Para uma melhor visualização, sugere-se construir uma estrutura em forma


de tabela orçamentária, na qual poderão ser registradas todas as rubricas
envolvidas, com o detalhamento do período de abrangência, a estimativa de
valores para ingresso e desembolso, assim como os valores realizados para fins
de controle.

O quadro a seguir apresenta um modelo resumido de orçamento a ser


utilizado por organizações do terceiro setor.

QUADRO 10 – MODELO ORÇAMENTO


Organização: 1º Trimestre
Resumo orçamentário Previsto $ Realizado $ Variação %
Receitas com ...
Receitas (doações)
(-) Custos/deduções
= RECEITA LÍQUIDA
(-) Despesas Administrativas
(-) Despesas com atividade fim
(-) Investimentos
(-) Gastos com folha de pagamento
(=) DESPESA LÍQUIDA
(=) + SUPERÁVIT / - DÉFICIT
FONTE: O autor

Agora que entendemos a importância da organização administrativa e de que


forma devemos elaborar um orçamento, vamos estudar os controles financeiros
indispensáveis para as organizações do terceiro setor.

1 Cite pelo menos dois benefícios que o orçamento traz para as


organizações.

88
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

3.3 ELABORAÇÃO DE CONTROLES


FINANCEIROS

Caro acadêmico, como você encara o assunto gestão e


controles financeiros?

Para a maioria das pessoas é uma fonte de preocupação, pois geralmente


é visto como uma atividade difícil, que exige muito conhecimento. É fato que,
de forma geral, exige conhecimento especializado. No entanto, com um mínimo
de informações técnicas e muito bom senso, pode-se desenvolver uma alta
capacidade de gestão financeira prática.

O reflexo da falta de conhecimento é que as finanças pessoais são tratadas


sem planejamento, ou seja, as pessoas gastam sem refletir ou sem considerar
taxas de juros e financiamento. E se não conseguem controlar as finanças
pessoais, levam essa falta de organização também para outros ambientes, como
o empresarial.

Se pensarmos no âmbito das organizações do terceiro setor, existe uma


dificuldade muito grande no uso de ferramentas de gestão financeira, o que, por
vezes, compromete a manutenção de muitas delas de se manterem, ou pior, de
manterem seus programas e projetos por um tempo maior, afetando assim os
objetivos pelos quais elas existem.

Isso ocorre em grande parte porque a gestão dessas organizações não


é realizada de maneira profissional e sim pelo trabalho de voluntários que,
embora tenham as melhores intenções possíveis, nem sempre dispõem dos
conhecimentos técnicos necessários para efetuar a gestão financeira dessas
organizações.

A maioria das organizações do terceiro setor possuem uma estrutura


financeira baseada no recebimento de doações de terceiros. Assim, não existem
períodos programados dos ingressos dos recursos. Com essa dependência de
recursos de terceiros, das organizações, é exigido um contínuo aperfeiçoamento e
controle da sua administração financeira. Essa dependência de recursos externos

89
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

exige que se faça um adequado planejamento dos momentos dos gastos, das
aplicações. E o mais importante: ter um controle e acompanhamento rígidos das
despesas a serem realizadas em determinado período.

No quadro a seguir, apresentamos as principais ferramentas para auxiliar as


organizações do terceiro setor a organizar sua administração financeira. Estes
instrumentos devem ser adotados para iniciar uma administração financeira com
eficiência. Porém não se deve ficar limitado a eles, cada organização pode criar
outros instrumentos de apoio à tomada de decisões.

Um processo simplificado de gestão financeira compreende a elaboração


de um orçamento, que já dedicamos um espaço na seção anterior, a abertura
de contas correntes, sendo uma para as despesas ordinárias da organização e
outras específicas para cada projeto; possuir um fundo de caixa para pagamento
de pequenos gastos; possuir um fluxo de caixa mensal; realizar o controle
dos gastos com contas a pagar; conciliação os saldos de contas correntes,
manutenção de escrita contábil e relatórios financeiros segregados por ingressos
e por gastos realizados.

QUADRO 11 – INSTRUMENTOS PARA ADMINISTRAÇÃO


FINANCEIRA NO TERCEIRO SETOR

Orçamento O orçamento é um instrumento de natureza econômica elab-


orado com o objetivo de prever determinadas quantias que
serão utilizadas para determinados fins. Expressa o plano,
os programas, os projetos e as atividades da organização.

Conta Corrente específica Serve para exercer um controle efetivo do fluxo de valores
nas Entidades sem Fins Lucrativos.

Evita que recursos liberados e vinculados a projetos sejam


misturados a recursos não vinculados.
Fundo Fixo de caixa para Para controle do dinheiro em caixa destinado ao pag-
pequenos gastos amento de pequenos gastos e para evitar transações
desnecessárias em banco.
Fluxo de caixa mensal O controle das contas a pagar deve ser bastante rígido, de
modo a evitar os pagamentos após a data de vencimento
e, com isso, onerar com juros e multa, ou dependendo do
caso, o protesto ou ajuizamento do título vencido.

Conciliação mensal dos sal- É importante fazer pelos menos uma vez por mês a verifi-
dos das contas bancárias cação dos cheques emitidos, depósitos realizados, débitos
e créditos efetuados pelo banco, para confirmação do saldo
bancário constante do extrato de contas.

Escrituração Contábil A escrituração é obrigatória para todas as organizações,


com ou sem fins lucrativos. E, nas entidades sem fins lu-
crativos, é condição para manutenção de seus benefícios
tributários, como já mencionamos anteriormente.

A utilização da escrituração contábil poderá ser importante


ferramenta para a gestão financeira na entidade.

90
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

Relatório financeiro O relatório financeiro é a forma pela qual se demonstram os


recursos obtidos e sua aplicação.

As ESFL convivem basicamente com repasses de recur-


sos de terceiros ou com pequenos projetos de geração de
renda, que exigem dos seus gestores, relatórios financeiros
periódicos sobre recursos administrados em determinado
período.
FONTE: Adaptado de ABONG (2003)

Quando se pensa em quanto recurso destinar para o fundo fixo de caixa,


deve-se pensar no que esses valores serão utilizados. Por exemplo, servirão para
pagamento de despesas com correios, com autenticações, com estacionamento,
com condução urbana, entre outras. Uma vez determinado o valor, ele ficará sob
responsabilidade de uma pessoa, que prestará contas regularmente a ser definido
pela gestão. A recomposição do saldo do fundo se dará mediante o saque em
conta do valor correspondente.

No quadro a seguir, apresenta-se um modelo de boletim do fundo fixo de


caixa, demonstrando os gastos realizados em determinado período.

QUADRO 12 – MODELO DE BOLETIM DO FUNDO FIXO DE CAIXA


BOLETIM DO FUNDO FIXO DE CAIXA

Período: XX/XX/XXXX à XX/XX/XXX


Especificação do gasto Documentos Fiscal Valor (RS)
1. Correios Recibo nº XXX 12,00

(1) Total das despesas R$............................ (12,00)


(2) Limite do Fundo Fixo R$ .................. 50,00
(3) Saldo R$ ..................... 38,00
(4) Reposição fundo realizado em XX/XX/XXXX 12,00
(5) Assinatura do re- Coordenado Data: XX/XX/XXXX
sponsável
FONTE: O autor

A respeito do fluxo de caixa, a importância de sua utilização se dá


especialmente pela dependência dos ingressos de terceiros. O processo de
planejamento do fluxo de caixa de uma organização consiste em implantar uma
estrutura de informações que seja útil, prática e econômica.

Com o fluxo, é possível prever em que situações a organização terá ou não


recursos à disposição para cumprir algum compromisso financeiros. O mesmo
ocorre com aqueles recursos que são vinculados a algum projeto. Controlar o seu
fluxo ajuda a organizar como aplicar melhor eventuais sobras de recursos.

91
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Ou seja, o fluxo de caixa tem como objetivo básico a projeção dos ingressos
e saídas dos recursos financeiros para determinado período, em que poderá
verificar se há necessidade de captar empréstimos ou aplicar os excedentes de
caixa.

Geração de caixa é algo fundamental para qualquer organização, seja ela


do terceiro setor ou não, desde o seu estágio inicial, em seu desenvolvimento e
mesmo no momento da extinção. Considerar o fluxo de caixa de uma organização
um instrumento gerencial não significa que ela vai prescindir da contabilidade e
dos relatórios gerenciais por ela gerados. Trata-se de considerar que o fluxo de
caixa também deva ser arrolado como instrumento que traga subsídios para o
processo de tomada de decisões.

Para elaborar um fluxo de caixa mensal, é necessário seguir os seguintes


passos:

• Separar os gastos por períodos.


• Fazer levantamento dos recursos totais, disponíveis e indisponíveis para
todo o período do fluxo.
• Relacionar as possíveis receitas a serem auferidas no período, como
doações, rendimentos financeiros, bazar etc.
• Verificar o total de recursos com que poderá contar em cada semana
para cumprir os compromissos financeiros.
• Relacionar minuciosamente todos os compromissos a pagar, por data de
pagamento, separando-os e somando-os por semana. Quando o valor
for desconhecido, fazer estimativas, mas não deixar de incluir.
• Subtrair o total dos recursos disponíveis das despesas a pagar por
semana, para verificar a sobra para a semana seguinte, até completar o
período total do fluxo de caixa.

92
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

No quadro a seguir apresenta-se um modelo de fluxo de caixa.

QUADRO 13 – FLUXO DE CAIXA

FONTE: O autor

Antes de finalizar esta seção, é importante citar dois importantes aliados


para um adequado controle financeiro da organização: um bom sistema de
escrituração contábil e controles internos. A contabilidade é obrigatória a todas
as organizações, conforme determinam as normas brasileiras de contabilidade. E
é por intermédio da contabilidade que a organização consegue comprovar a sua
condição de estar isenta dos tributos, conforme exige o código tributário nacional.

E um bom sistema de escrituração nos leva a buscar


profissionais habilitados para realizar essa tarefa. Um contador que Um sistema de
tenha conhecimento do terceiro setor ajudará no atendimento às controles internos
permite acompanhar
formalidades exigidas para este tipo de organização. A adequada
e criticar o
escrituração ajudará a organização a alcançar seus objetivos. A desempenho das
contabilidade do terceiro setor será tema para outra disciplina de atividades, proteger
nosso curso. os ativos, disciplinar
o relacionamento
Já um sistema de controles internos permite acompanhar e dos agentes de
execução com as
criticar o desempenho das atividades, proteger os ativos, disciplinar o
atividades e orientar
relacionamento dos agentes de execução com as atividades e orientar a elaboração
a elaboração de informação confiável. A ação do controle interno no de informação
âmbito das organizações do terceiro setor visa manter sob controle confiável.
o patrimônio, verificar o cumprimento de acordos e contratos, zelar

93
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

pelo cumprimento estatutário e pelas determinações das autoridades nos âmbitos


federal, estadual e municipal.

Para auxiliar a atividade de controle interno, podem-se utilizar índices


econômicos, financeiros e sociais. Alguns são adaptados dos tradicionais índices
financeiros largamente utilizados no segundo setor.

QUADRO 14 – ÍNDICES FINANCEIROS E ECONÔMICOS


APLICÁVEIS AO TERCEIRO SETOR
Índices financeiros e econômicos
Expressão Título Finalidade
AC/PC Liquidez corrente Ativos circulantes disponíveis
para liquidar obrigações de curto
prazo
Disponível/saldo de pro- Liquidez específica Expressa o montante de recur-
jetos sos disponíveis para cumprir as
atividades do projeto no período
seguinte
Patrimônio Social/imobili- Grau de imobilização do Expressa o percentual de imobili-
zado * 100 PS zação do patrimônio social
PC/PC+ELP+PS * 100 Grau de endividamento a Expressa o percentual de endivid-
curto prazo amento a curto prazo
PC+ELP/PC+PEPL+OS Grau de endividamento Expressa o percentual de endivid-
* 100 geral amento total
Despesa realizada/re- Relação de despesa real- Expressa o percentual das des-
ceita recebida * 100 izada dos projetos e receit-
pesas efetivamente realizadas em
as recebidas relação às receitas recebidas no
período. Deve ser analisado em
separado: doações vinculadas a
projetos e os recursos próprios
Gratuidade/despesa total Relação gratuidade e des- Avaliar o percentual de gratu-
* 100 pesas totais idades concedidas no período em
relação às despesas totais
Gratuidade/receita total * Relação gratuidade e re- Avaliar o % de gratuidades rece-
100 ceitas totais bidas no período em relação às
receitas totais
Despesas por atividade/ Participação de cada ativ- Avalia o nível de representativi-
despesa total * 100 idade nas despesas totais dade de cada atividade nas des-
pesas totais
Receitas por atividade/ Participação de cada ativi- Avalia o nível de representativi-
receita total * 100 dade nas receitas totais dade das receitas auferidas em
relação a receita total
Receitas próprias/receita Esforço de captação Avalia a capacidade de a entidade
total * 100 própria gerar renda própria em receitas
totais

FONTE: O autor

94
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

QUADRO 15 – ÍNDICES DE EFICIÊNCIA E GESTÃO APLICÁVEL AO TERCEIRO SETOR


Índices de eficiência e gestão
Expressão Título Finalidade
Despesa realizada/ Eficiência na apli- Avalia o valor unitário gasto por benefi-
número de beneficiári- cação dos recursos ciário. Pode se tratar de recuperação de
os crianças de rua, de gastos por crianças
em escolas, por idoso em lares de apoio,
pacientes em hospital etc.
Despesa realizada/ Eficiência na apli- Avalia o valor unitário gasto por área de-
área demarcada cação dos recursos marcada, quando se tratar de projeto in-
dígena. Substituindo-se por área apenas,
tem-se o gasto unitário por área de atu-
ação.
Custo orçado/custo re- Eficiência no con- Avalia a capacidade de previsão e plane-
alizado * 100 trole dos recursos jamento. É interessante que seja feito por
projetos.
Área construída em Eficiência da estru- Avalia a acomodação dos beneficiários
m2/ beneficiários tura física por metro quadrado.
Ativos/beneficiários Eficiência na dis- Avalia os resultados alcançados na apli-
tribuição de ativos cação de ativos como medicamentos,
diversos vacinas, cestas básicas, material escolar
etc.
FONTE: O autor

A recomendação é não se limitar a estes indicadores, mas sim adaptar para


a realidade de sua organização. Havendo a necessidade de ampliar a lista de
índices, a organização pode ficar à vontade para melhorar seus instrumentos de
análise.

Apresentamos um conjunto de documentos que ajudam as


organizações nas suas rotinas diárias. Utilizando as mesmas quatro
organizações pesquisadas na seção anterior, faça outro exercício,
mediante pesquisa junto a essas organizações, identificando quais
dos instrumentos que estudamos elas têm utilizado no seu dia a dia.

Organização Instrumento de controle Utiliza? Sim / não

95
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Sugiro que você assista à entrevista do prof. Tozzi, na qual ele


aborda temáticas referentes à gestão de organizações do terceiro
setor. Acesse em: <https://youtu.be/2hwqnOUAfnE>.

Além disso, acesse o sítio eletrônico do programa de gestão


promovido pela AMBEV, que beneficia centenas de organizações.
Disponível em: <https://liderancacomvalores.com.br/ambev-lanca-o-
voa-2019-programa-voluntario-de-mentoria-para-ongs/>.

Na próxima seção, vamos analisar como se dão as relações trabalhistas nas


organizações do terceiro setor.

4 RECURSOS HUMANOS E O
VOLUNTARIADO
Para iniciar este tema, é bom lembrar que o direito do trabalho não foi fruto de
concessões ou invenção de alguém que acordou de manhã e disse ‘hoje vou criar
regras trabalhistas’. Foram pelo menos dois séculos de lutas que culminaram, no
Brasil, em um sistema mínimo de proteção de direitos da classe trabalhadora e
que se encontram consolidados na CLT – Decreto Lei nº 5.452/43. O principal
fundamento desse sistema é dar proteção jurídica ao empregado.

Para saber mais sobre o decreto de Lei nº 5.452/43, acesse o


sítio eletrônico da CLT, disponível em <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>.

No entanto, para que se comece a configurar o vínculo de emprego, não é


suficiente a simples prestação subordinada e habitual de serviço. É necessário
também que o contrato de trabalho tenha caráter oneroso, ou seja, ele deve ter
em vista certa remuneração.

96
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

As organizações do terceiro setor, como vimos em seções Podemos classificar


anteriores, não possuem características de empresa que visam ao os trabalhadores
lucro e à rentabilidade. Essa condição ocasiona muitas dificuldades de do Terceiro Setor
sustentabilidade. Toda prestação de serviço gratuita sempre é bem- em pelo menos
três categorias:
vinda. Desse modo, podemos classificar os trabalhadores do Terceiro
“os diretores e
Setor em pelo menos três categorias: “os diretores e conselheiros”, conselheiros”,
“os funcionários e servidores contratados” e os “voluntários”. “os funcionários
e servidores
Os diretores e conselheiros, por força de estatuto, são voluntários contratados” e os
e, na maioria das vezes, não recebem remuneração alguma pela “voluntários”.
sua prestação de serviços. Os funcionários contratados seguem
as normas previstas na CLT, assim como qualquer trabalhador pertencente ao
segundo setor. A terceira categoria, dos voluntários, possuem características e
regras próprias, que estudaremos um pouco mais a fundo nesta seção.

4.1 REGRAS PARA ATUAÇÃO DO


VOLUNTÁRIO
O voluntariado é uma tradição em países com maior evolução na distribuição
de renda e na prática da prestação voluntária de serviços de interesse social. As
pessoas que agem de forma voluntária, em geral, atuam por uma causa ou por
um ser humano em especial e, em vários exemplos, elas próprias passam por
alguma transformação, assim são motivadas a também contribuírem de alguma
forma.

FIGURA 10 – CONVITE PARA SE TORNAR VOLUNTÁRIO

FONTE: <http://etecaf.com.br/programa-de-voluntarios-
facaadiferenca/>. Acesso em: 8 out. 2020.

O trabalho voluntário tem atraído pessoas de todas as gerações, das mais


jovens até aquelas que já estão aposentadas. Estas últimas encontram no
voluntariado uma forma de continuarem contribuindo com seu conhecimento e
auxiliando para uma nova ordem social. Engajamento social e cidadania podem
ser sentimentos facilmente encontrados no trabalho voluntário.

97
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Mas no Brasil vivemos por muitos anos um grande problema: caso de


uma pessoa, muitas vezes, condoída com a situação de penúria de alguma
organização benemerente ou dos seus usuários, sem qualquer vinculação ou
remuneração, passava a dedicar parte de seu tempo a tal instituição, auxiliando
no atendimento que por ela era prestado. Com o decorrer do tempo, esse mesmo
voluntário passava a ser tratado como se fosse um funcionário da organização.

Porém, no primeiro desentendimento, normalmente por ocasião de


mudança dos administradores, o então “voluntário/funcionário” é dispensado das
suas atribuições, até então realizadas com o maior cuidado e zelo. E, com um
sentimento de humilhação e ingratidão, ele ingressa na justiça em busca de seus
‘direitos trabalhistas’.

Essa ilustração representa um caso verídico, ocorrido em uma instituição


hospitalar no Estado de Santa Catarina. E como encerrou essa história? A Justiça
do Trabalho, sem melhor alternativa, condenou a organização ao pagamento de
elevada indenização.

Muitas organizações sofreram condenações semelhantes, simplesmente


por não terem buscado um instrumento que pudesse lhes dar a segurança na
relação organização versus voluntário. As organizações devem estar atentas para
o seguinte: querer incluir voluntários em serviços administrativos, que dependam
do cumprimento de horário mais rigoroso ou aqueles que são cumpridos no
mesmo horário de expediente de qualquer empresa poderá ser caracterizado
como vínculo empregatício, pois essa atividade traz ao voluntário a expectativa
de remuneração.

Voluntário, portanto,
é aquela pessoa Voluntário, portanto, é aquela pessoa que eventualmente se
que eventualmente apresenta para auxiliar em determinada tarefa, que precisa ficar
se apresenta muito clara. Adiante veremos que existe um documento que serve
para auxiliar em para dar a devida cobertura jurídica para o trabalho voluntário – o
determinada tarefa, termo de adesão ao trabalho voluntário.
que precisa ficar
muito clara.
A organização pode criar regras para o trabalho voluntário? A
resposta é sim. Cada organização pode estabelecer os procedimentos para que
uma pessoa possa se candidatar a uma vaga como voluntário. Citamos alguns
exemplos que constam no manual do voluntário do Centro de Voluntariado de
São Paulo no quadro a seguir.

98
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

QUADRO 16 – PROCEDIMENTOS – VOLUNTÁRIO

Procedimentos para se tornar um voluntário:


a) Ter mais de 18 anos.
b) Assistir a palestra de orientação ao trabalho
voluntário oferecida.
c) Preenchimento do cadastro.
d) Apresentar cópia dos documentos.
e) Passar por uma entrevista com o
coordenador de voluntariado.
f) Conhecer a organização e as oportunidades
de trabalho voluntário.
g) Receber o manual do programa ‘xx’.
h) Assinar o termo de adesão anualmente.
i) Participar do treinamento e capacitação.
j) Passar por um período de experiência de XX dias.

FONTE: Adaptado de CVSP

Esses critérios podem ser ampliados ou reduzidos, de acordo com as vagas


disponíveis e as especificidades do trabalho voluntário a ser requisitado. Por
exemplo, em uma organização de assistência social, que realiza atendimento
odontológico gratuito para determinado público, se o trabalho voluntário for
para um dentista, será exigido que ele tenha qualificação na atividade. Caberá,
portanto, a cada organização do terceiro setor especificar as regras para a
atuação do voluntário.

A Internacional Association for Volunteer Efforts – IAVE, entidade internacional


que trabalha para apoiar, fortalecer e promover o trabalho do voluntário, apresenta
os princípios básico do voluntário, que são apresentados no quadro a seguir.

QUADRO 17 – PRINCÍPIOS DO VOLUNTÁRIO

- Reconhecer e respeitar a dignidade e a cultura de cada ser humano.


- Reconhecer o direito de cada homem, mulher e criança de associar-se livremente,
sem distinção de raça, religião, condição física, social, econômica ou outra.
- Oferecer seus serviços aos demais, sem qualquer remuneração, individualmente
ou através do es¬forço conjunto.
- Detectar as necessidades e estimular a participação da comunidade na
resolução dos próprios pro¬blemas.
- Promover a responsabilidade social, a participação cidadã, a comunidade,
a solidariedade interna¬cional.
- Melhorar a qualidade de vida, fornecendo respostas aos grandes
desafios do mundo de hoje.

FONTE: Adaptado de <https://www.iave.org>. Acesso em: 8 out. 2020.

Na próxima seção, vamos identificar em quais áreas e quais atividades é


possível receber o trabalho de voluntários.

99
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

4.2 ÁREAS OU ATIVIDADES APTAS A


RECEBER VOLUNTÁRIOS
A ação voluntária, que ocorre no encontro da solidariedade com
Via de regra, o a cidadania, não tem pretensão de substituir as funções do Estado,
trabalho voluntário nem tampouco quer chocar com o trabalho remunerado, porém,
pode ser realizado
exprime a capacidade que a sociedade organizada tem de assumir
dentro de qualquer
entidade pública responsabilidades para construir coletivamente estratégias para
ou de qualquer enfrentar uma série de problemas socioambientais.
organização do
terceiro setor, nas Via de regra, o trabalho voluntário pode ser realizado dentro de
suas mais diversas qualquer entidade pública ou de qualquer organização do terceiro
áreas de atuação.
setor, nas suas mais diversas áreas de atuação, que estudamos no
Capítulo 1. As entidades públicas devem ter um cuidado muito mais
rigoroso caso venham a aceitar o trabalho voluntário, de modo a não se tornarem
vítimas de demandas trabalhistas.

Já no âmbito das organizações do terceiro setor, o que pode ocorrer é que


nem todas abrem as portas para esse tipo de serviço. Isso pode ocorrer por
diversas razões. Uma delas é a própria dificuldade que a organização encontra
para se organizar com o trabalho voluntário, que exige da entidade planejamento,
direção e controle. Outro motivo frequente é decorrente de experiências negativas
que as organizações tiveram no relacionamento com voluntários.

Mas uma vez que vagas para voluntários são abertas, elas devem ser
preenchidas, pois são oportunidades de trocas entre as duas partes. De um lado
a organização ganha, pois supre uma necessidade pontual e conta com uma
carga de experiência trazida pelo voluntário. E ganha o próprio voluntário, que
pode adquirir experiência em sua área de formação ou ainda a possibilidade de
gerar uma oportunidade para desenvolver novas habilidades.

Analisando relatos de pessoas que realizam trabalho voluntário,


dá para se ter uma ideia do que ele significa. Adiante, são
apresentados três depoimentos de voluntários. Prestem atenção a
algumas expressões destacadas.

“Faço este trabalho por amor ao próximo. Tem uma frase


bonita: eu vou ajudar alguém sem saber a quem. Para mim, isso

100
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

aqui é uma alegria, faço com carinho. Preciso ajudar o próximo. Até
quando eu puder, eu vou continuar”. Voluntária de uma APAE.

“Isso aqui me faz bem, é saúde. A gente conversa com todo


mundo, brinca, conta piada, descontrai. Aqui passo essas horas
maravilhosas e venho para fazer os trabalhos para ajudar os outros.
Tudo me faz querer continuar. Isso aqui é tudo para mim”. Voluntária
de um asilo.

“Eu sinto que, quando eu não venho, que tem alguma coisa
me faltando, sinto falta quando não venho. É muito gratificante estar
com as colegas, quando você chega, esse ambiente de trabalho é
agradável. Você chega aqui, começa a fazer as coisas e esquece de
tudo. Depois tem a gratificação com o trabalho, em saber que você
está ajudando alguém”. Voluntária de um asilo.

Percebe-se que a pessoa do voluntário, no exercício desse


serviço, é recompensada por sentimentos intangíveis. Muitas
pesquisas têm demonstrado que neste momento de saída da sua
rotina, o voluntário consegue desligar-se de seus problemas e outros
contextos sociais, promovendo sensações de alívio e fonte de prazer.

Na próxima seção, abordaremos os procedimentos para que um voluntário


seja admitido no serviço, além de indicarmos dicas para sua manutenção e, se
houver necessidade, o seu desligamento.

4.3 ADMISSÃO, MANUTENÇÃO E


DESLIGAMENTO DE VOLUNTÁRIOS
Como mencionamos no início desta seção, o primeiro movimento para o
serviço voluntário deve ser dado pela organização, ao divulgar as suas vagas de
voluntariado disponíveis, contendo as especificações para cada atividade.

Algumas organizações, no intuito de atraírem um quadro qualificado de


voluntários, realizam a divulgação com um breve histórico do projeto em que a
vaga será aberta, ou ainda, como podemos constatar na figura a seguir, para
que o voluntário compreenda onde estará inserido. Com esse movimento, a
organização evita uma possível frustração do voluntário, que esperava atividade
diferente. E a própria organização evita esforços desnecessários e com custo
para preparar o voluntário para a atividade.

101
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

FIGURA 11 – ANÚNCIO DE VAGA PARA VOLUNTÁRIO

FONTE: <http://www4.goiania.go.gov.br/portal/site.
asp?s=782&tt=not&cd=13897&fn=true>. Acesso em: 8 out. 2020.

É bom ter claro que o trabalho voluntário não é igual ao estágio, que por sua
vez tem outra regulamentação. E mesmo que se tenha a legislação do voluntariado
em mãos, é necessário tomar alguns cuidados a fim de se prevenir de demandas
judiciais no futuro. Trabalho voluntário é coisa séria.

Após a seleção do voluntário, caberá à organização confeccionar e assinar o


termo de voluntariado, previsto na lei do voluntariado, que surgiu como uma solução
para os problemas trabalhistas enfrentados pelas organizações.

O legislador teve mais sensibilidade e sensatez do que ocorre com a maioria


dos processos legislativos e providenciou uma forma de resolver a grave situação
que era vivida pelas organizações do Terceiro Setor. Com uma lei de apenas cinco
artigos, produziu-se um grande avanço na questão do voluntariado em nosso país.

Vejamos o que consta na Lei nº 9.608/98:

Art.1. Considera-se serviço voluntário, para fins desta lei, a


atividade não remunerada, prestada por pessoa física à entidade
pública de qualquer natureza ou instituição privada de fins não
lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais,
científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive,
mutualidade.
Parágrafo único. O serviço voluntário não gera vínculo
empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista
previdenciária ou afim.
Art.2. O serviço voluntário será exercido mediante a celebração
de termo de adesão entre a entidade, pública ou privada, e o
prestador de serviço voluntário, dele devendo constar o objeto e

102
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

as condições de seu exercício.


Art.3. O prestador do serviço voluntário poderá ser ressarcido
pelas despesas que comprovadamente realizar no desempenho
das atividades voluntárias.
Parágrafo único. As despesas a serem ressarcidas deverão
estar expressamente autorizadas pela entidade a que for
prestado o serviço voluntário.
Art. 4. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5. Revogam-se as disposições em contrário.

A lei traz a obrigatoriedade de se firmar um “acordo”, representado pelo Termo


de Adesão ao serviço voluntário, em que a organização e o voluntário exprimem
quando e como se dará a prestação de serviço. Portanto, o documento deve conter
corretamente a identificação das partes, que tipo de serviço ser prestado e quais as
condições, como carga horária, local, material de apoio e outros.

FIGURA 12 – MODELO DE TERMO DE ADESÃO AO TRABALHO VOLUNTÁRIO

FONTE: <https://www.laringomalacia.org/termo-de-adesao>. Acesso em: 8 out. 2020.


103
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Uma pessoa sente-se motivada em suas atividades quando é reconhecida


pelo que faz. Também no trabalho voluntário, isso é verdadeiro. Para isso,
recomenda-se que a organização que disponibilizou vagas para o serviço
voluntário tenha como regra supervisionar o trabalho dos voluntários. Dar a devida
atenção, respondendo perguntas, deixando claras as diretrizes e demonstrando o
apreço pelo voluntário, ajuda a manter esse voluntário fiel na organização.

Outra ação importante na manutenção de um voluntário é oferecer


capacitações periódicas, de modo a torná-lo mais confiante e seguro na realização
de suas atividades. Além disso, a capacitação proporciona ao voluntário conhecer
e desenvolver novas habilidades, tornando-o apto para desempenhar outras
tarefas.

FIGURA 13 – RECONHECIMENTO E ALEGRIA

FONTE: <https://motivacaoefoco.com.br/a-importancia-do-
reconhecimento/>. Acesso em: 8 out. 2020.

A capacitação deve ser um momento de estímulo aos voluntários da


organização. Criar oportunidades para aprimorar aprendizados traz muitos
benefícios. Um exemplo pode ser uma oficina de troca de experiências entre
voluntários mais antigos e os novatos. Nessas oficinas, podem ser sugeridos
temas específicos relacionados à organização ou a algum tema relevante para os
voluntários.

E, certamente, um dos momentos mais difíceis na relação entre a organização


e o voluntário é quando o desgaste entre as partes bate à porta e é necessário
promover o desligamento do voluntário do seu serviço.

Quando um voluntário não se adapta ao serviço, a organização deve ajudá-


lo a perceber isso, de modo objetivo, sugerindo, por exemplo, outras instituições
ou atividades em que suas habilidades sejam mais apropriadas. Mas não é

104
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

apenas pelo desempenho ineficiente que se deve promover o desligamento de


um voluntário.

Por vezes, razões com maior peso ou importância podem influenciar tal
decisão, especialmente por motivos éticos e morais, como a divulgação indevida
de informações confidenciais de beneficiários, ofensas a outros voluntários,
funcionários ou beneficiários, ou ainda aproveitar-se de situações para obter
vantagens indevidas. Para todos os casos, deve-se deixar claro o motivo do
afastamento, permitindo uma boa relação e, dependendo do caso, até mesmo um
retorno.

Ainda é possível que o próprio voluntário solicite seu desligamento.


A recomendação é de que não se deva questionar os motivos alegados,
prevalecendo o respeito pela decisão. De todo modo, é importante agradecer a
dedicação e contribuição em prol da organização.

Para formalizar esse desligamento, recomenda-se fazer constar, no termo


de adesão, uma anotação assinada pelas partes referentes a essa finalização da
prestação de serviço voluntário.

Como última atividade deste capítulo, você pode retornar às


quatro organizações selecionadas e realizar uma pesquisa para
saber se elas têm voluntários nas atividades e se elas possuem o
termo de voluntariado assinado. Se não tiverem, você pode fazer a
sua ação voluntária, e ajudar a organização a regularizar a situação.

Organização Possui voluntários?

105
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Quer conhecer um pouco mais sobre o voluntariado, e histórias


bacanas? Acesse os vídeos a seguir: Leandro Karnal: <https://www.youtube.
com/watch?v=K8jSXfP7bhU>; Sofia Calderano: <https://www.youtube.
com/watch?v=_Y2KIYyBKTo>; Cristiano Zanetta: <https://www.youtube.
com/watch?v=Wb6aoBQF9WE>. No primeiro, o professor Leandro Karnal
apresenta benefícios para acrescentar conteúdo a sua vida. No segundo, o
depoimento de Sofia Calderano, no evento TEDx, sobre sua experiência em
comunidades carentes na reconstrução de casas. E o terceiro, traz a história
do “batman brasileiro” (Cristiano Zanetta), cuja experiência chocante se dá
em um hospital oncológico infantil.

5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Com o tema voluntariado encerramos este segundo capítulo. Um capítulo
denso, com muito conteúdo e informações extremamente importantes para o
dia a dia das organizações do terceiro setor. A seguir vamos relembrar o que
aprendemos neste capítulo.

A gestão de organizações do terceiro setor perpassa por diversas temáticas,


sendo que neste capítulo cuidamos de algumas delas.

Na primeira seção, estudamos os aspectos legais e societários. Identificamos


a natureza jurídica aplicável às organizações e que o seu correto enquadramento
vai impactar decisões relacionadas a aspectos tributários, de organização
administrativa e nas questões relacionadas a recursos humanos, especialmente
no serviço voluntário.

Verificamos também como se dá o enquadramento tributário das


organizações do terceiro setor. Compreendemos o significado dos tributos e
suas principais funções, com isso, ficou evidenciado que as organizações estão
sujeitas ao pagamento de alguns tributos. E para outros, no entanto, não há a
cobrança, pela isenção legal, e outros tributos nem incidência têm, como no caso
das imunidades.

Nossa jornada seguiu pela lei que está agora batiza de Marco Regulatório do
Terceiro Setor e adentramos em alguns aspectos da aplicação e limitação dessa
lei.

106
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

Na segunda seção, realizamos uma imersão em aspectos administrativos e


financeiros, na qual tivemos a oportunidade de conhecer alguns dos instrumentos
necessários para uma adequada gestão financeira, como o orçamento, ao qual
dedicamos um espaço para demonstrar sua aplicação e construção.

Por fim, analisamos os aspectos de recursos humanos nas organizações do


terceiro setor, especialmente no relacionamento com os voluntários. Identificamos
quais as regras aplicáveis a esse tipo de serviço, qual a abrangência de atuação
dos voluntários e qual o instrumento jurídico para dar suporte a essa relação.

Desde o início de nossa jornada, temos evidenciado a constante necessidade


que as organizações do terceiro setor têm de buscar recursos para a continuidade
de suas atividades. Considerando isso, no próximo capítulo, vamos tratar de
projetos e mobilização de recursos.

Desenvolver programas e projetos é uma alternativa para ampliar o leque


de financiamento das atividades. Mas não basta apenas um projeto. Elaborar um
projeto exige dedicação e planejamento. Recursos existem, mas por vezes o que
falta são bons projetos. É uma máxima que encontramos em qualquer esfera,
seja do primeiro, segundo ou terceiro setor.

Esperamos vocês logo mais.

Bons estudos!!!

REFERÊNCIAS
ABONG. Manual de administração jurídica, contábil e financeira para
organizações não-governamentais. São Paulo: Peirópolis, 2003.

ALBUQUERQUE, A. C. C. Terceiro setor: história e gestão de organizações.


São Paulo: Summus, 2006.

AZEVEDO, O. R.; SENNE, S. H. L. Obrigações fiscais das entidades sem fins


lucrativos e sociedades cooperativas. São Paulo: IOB Thomson, 2006.

BARBOSA, M. N. L. Manual de ONGS: guia prático de orientação jurídica. 4. ed.


rev. atual. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003.

CHIAVENATO, I. Teoria geral da administração. 7. ed. Rio de Janeiro: Elsevier,


2004.

107
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

CVSP – CENTRO DE VOLUNTARIADO DE SÃO PAULO. Manual do programa


de voluntariado. 2017. Disponível em: <http://voluntariadocvsp.blogspot.com/>.
Acesso em: 25 set. 2020.

DALRIO, M. C. O trabalho voluntário: uma questão contemporânea e um


espaço para o aposentado. São Paulo: Editora Senac, 2004.

DRUCKER, P. F. Administração de organizações sem fins lucrativos:


princípios e práticas. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002. 166 p.

FRANÇA, J. A. (Org.). Manual de procedimentos para o terceiro setor:


aspectos de gestão e de contabilidade para entidades de interesse social.
Brasília: CFC: FCB: Profis, 2015.

GARRISON, R. H.; NOREEN, E. W. Contabilidade gerencial. 9. ed. Rio de


Janeiro: LTC, 2001.

MARTINS FILHO, I. G. Manual do trabalho voluntário e religioso: aspectos


fiscais, previdenciários e trabalhistas. São Paulo: LTr, 2002.

OAB/SP. Cartilha do terceiro setor. São Paulo: Nova Bandeira, 2005.

OLIVEIRA, A. Manual do terceiro setor e instituições religiosas: trabalhista,


previdenciária, contábil e fiscal. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

PAES, J. E. S. Fundações, associações e entidades de interesse social:


aspectos jurídicos, administrativos, contábeis, trabalhistas e tributários. Brasília:
Jurídica, 2006.

RESENDE, T. A. Roteiro do terceiro setor. Associações e fundações: o que


são, como instituir, administrar e prestar contas. 3. ed. rev. atual. e ampli. Belo
Horizonte: Prax, 2006.

SESC.DN.DPD.GEP. Manual de procedimentos e gestão do voluntariado:


mesa Brasil SESC. Rio de Janeiro: SESC, Departamento nacional, 2007.

SZAZI, E. Terceiro setor: regulação no Brasil. São Paulo: Petrópolis, 2000.

108
Capítulo 2 Gestão de Organizações do Terceiro Setor

TENÓRIO, F. G. Gestão de ONGs: principais funções gerenciais. 9. ed. Rio de


Janeiro: Editora FGV, 2005.

VIVARIO. Organagrama. 2017. Disponível em: http://vivario.org.br/


organograma/. Acesso em: 22 set. 2020.

109
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

110
C APÍTULO 3
Projetos e Mobilização
de Recursos

A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Identificar as necessidades do público-alvo, conforme


a área de atuação da organização.

• Elaborar projetos, com critérios e indicadores para sua avaliação.

• Conhecer as fontes de recurso para financiamento de projetos.

• Relatar os resultados alcançados ao final dos projetos.

• Construir projetos e programas.

• Construir um plano de captação e mobilização de recursos.

• Demonstrar as fontes de captação e mobilização de recursos.

• Criar critérios e indicadores adequados para cada modelo de projeto.

• Avaliar a consistência dos projetos.


Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

112
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Este capítulo é especial, pois trata de um assunto que é essencial para
qualquer organização do terceiro setor: a captação e mobilização de recursos.

É normal que as organizações busquem recursos para garantir a realização


de suas ações e da sua própria sustentabilidade. Até pouco tempo, financiadores
apoiavam as organizações com recursos financeiros sem restrições ou
contrapartidas. No entanto, o que se percebe é um movimento no sentido de que
alguns desses apoiadores, em geral empresas, procurem projetos que possam
ser avaliados e que tenham condições de demonstrar o impacto diretamente na
sociedade.

Falar em captar e mobilizar recursos não é só tratar da questão financeira,


mas também de recursos humanos e materiais.

E para que essa mobilização alcance os resultados pretendidos, alguns


procedimentos se fazem necessários – em alguns casos até são exigidos. E aqui
entram os aspectos relacionados à construção de projetos, sejam eles com intuito
de buscar fontes públicas ou não e que vamos analisar neste capítulo.

Na primeira seção, vamos entender as diferenças entre programas e projetos,


normalmente tratados como sinônimos. Mesmo tendo, em última análise, as
mesmas finalidades, ambos têm natureza e construção diferentes.

A segunda seção se ocupa das fontes de recursos. Vamos estudar várias


fontes possíveis, embora não se deva ficar restrito a elas. Com a tecnologia cada
vez mais pulsante, as organizações do terceiro setor também devem buscar na
tecnologia novas formas de buscar recursos.

Por fim, na terceira seção, vamos tratar do monitoramento e da avaliação de


projetos, e o quão significativas são essas etapas no processo. Monitorar bem o
que se foi planejado contribui para alcançar o resultado prometido.

Bons estudos!

2 PROGRAMAS E PROJETOS
Nesta seção, vamos estudar um assunto que é superimportante para as
organizações do terceiro setor que são os projetos. Frequentemente se ouve
na mídia e/ou junto a patrocinadores e financiadores que recursos para projetos
existem, mas o que falta na realidade são bons projetos para receberem recursos.

113
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Vamos nos ocupar com os elementos essenciais para a elaboração de bons


projetos, a busca de fontes de recursos para execução de um programa ou projeto.
Aliás, essa será a primeira tarefa: estabelecer as diferenças e semelhanças entre
os programas e os projetos.

Iniciamos com a discussão a respeito do que vamos fazer: programas ou


projetos. Avançamos na sequência para a elaboração dos projetos, com um passo
a passo de cada ponto necessário. Nesse momento vamos dedicar um maior
espaço, já que é necessário explicar os caminhos que precisam ser trilhados e
é muito importante estar atento aos pequenos detalhes, que podem fazer toda a
diferença para alcançar o cumprimento daquilo que foi prometido.

E, ao final de seção, vamos dedicar um espaço para tratar de algo que é


muito importante em qualquer projeto apresentado por organizações do terceiro
setor: qual o impacto do projeto, que realidade ele pretende modificar.

2.1 DIFERENÇAS ENTRE


PROGRAMAS E PROJETOS
É muito comum que programas e projetos sejam tratados como
Um programa é
se fossem a mesma coisa. No entanto, há uma diferença significativa
formado por um
conjunto de projetos, entre um e outro. Pode-se dizer que um programa é formado por
que tem caráter um conjunto de projetos, que tem caráter institucional, com diretrizes
institucional, com bem definidas, e estão voltados para um ou mais objetivos de uma
diretrizes bem instituição. Adiante vamos trazer alguns exemplos de programas.
definidas, e estão
voltados para um ou
Programas são, portanto, agrupamentos de vários pequenos
mais objetivos de
uma instituição. projetos e eventualmente, de operações rotineiras. Enquanto todo
projeto, por definição é temporário, os programas geralmente têm
natureza permanente, ou seja, em diversas ocasiões observam-se momentos em
que alguns projetos estão iniciando e outros terminando.

Sob a ótica das organizações do terceiro setor, podemos dizer que


os programas geralmente estão vinculados a alguma política pública, e a
organização, direta ou indiretamente está conectada a algum programa. O quadro
a seguir apresenta alguns exemplos de programas.

114
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

QUADRO 1 – EXEMPLOS DE PROGRAMAS – POLÍTICAS PÚBLICAS


Programa Descrição
Bolsa Família Programa de transferência direta de renda, direcionado
às famílias em situação de pobreza e de extrema pobre-
za em todo o país.
Benefício de Prestação Contin- O BPC garante o pagamento de um salário mínimo
uada (BPC) mensal ao idoso acima de 65 anos ou ao cidadão com
deficiência física, mental, intelectual ou sensorial de lon-
go prazo.
Minha Casa, Minha Vida Oferece um subsídio para financiamento da casa
própria, ou seja, um valor para reduzir a prestação do
financiamento. Prevê diversas formas de atendimento
às famílias que necessitam de moradia.
Programa de Erradicação do Iniciativa que visa proteger crianças e adolescentes,
Trabalho Infantil (PETI) menores de 16 anos, contra qualquer forma de tra-
balho, garantindo que frequentem a escola e atividades
socioeducativa. O PETI repassa, mensalmente, pela
Caixa, um auxílio financeiro às famílias que varia de
R$ 25,00 a R$ 40,00 por criança, dependendo da área
onde vivem.
Programa de Cisternas Através do armazenamento da água da chuva em cis-
ternas construídas com placas de cimento ao lado de
cada casa, as famílias que vivem na zona rural dos
municípios do Semiárido passam a ter água potável a
alguns passos de suas casas.
FONTE: O autor

Dos programas citados no Quadro 1, vários projetos são O projeto é então


a menor unidade
desenvolvidos para que o programa alcance o seu objetivo. O
administrativa de
projeto é então a menor unidade administrativa de qualquer plano ou qualquer plano ou
programa, seja ele de natureza pública ou privada. programa, seja ele
de natureza pública
Os projetos têm natureza temporária, ou seja, possuem em sua ou privada.
estrutura um início e um fim definidos, ou seja, têm data para começar
e data para terminar, quando as metas e objetivos forem cumpridos. Em casos
excepcionais, pode acontecer deles terminarem quando a organização determinar
não ser possível cumprir metas e objetivos.

Um projeto é um empreendimento planejado que consiste em agrupar um


conjunto de atividades interrelacionadas e coordenadas, com o fim de alcançar
objetivos específicos dentro dos limites de um orçamento e de um período
previamente estabelecido.

Cada organização tem a liberdade de elaborar e executar os seus próprios


projetos, de acordo com sua área de atuação. Alguns desses projetos podem estar
vinculados diretamente a um programa ou trabalhar no que é conhecido como
“eixos paralelos”, que vamos explicar na próxima subseção. No quadro a seguir,

115
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

apresentam-se uns poucos exemplos de projetos executados por organizações


do terceiro setor.

QUADRO 2 – EXEMPLOS DE PROJETOS


Projeto Instituição Área de atuação Descrição
Esporte Comu- Instituto Unimed Esporte para cri- Oportuniza modalidades
nitário Santa Catarina anças e adoles- diversas para alunos de
centes escolas públicas
#fomedeque Hospital Pequeno Atuação em atendi- Proporcionar alimentação
Príncipe mento pediátrico saudável e produtos de hi-
giene no contexto da pan-
demia do Covid-19
Teto Teto Brasil Voluntariado Trabalhar em comunidades
precárias para superar a
pobreza, com formação e
ação de voluntários e con-
strução de moradias
FONTE: O autor

Um projeto é um empreendimento detalhado e planejado com clareza, que


deve estar organizado em um conjunto de atividades que serão implantadas. Cada
atividade deve estar interligada, para que o objetivo final seja alcançado. Vamos
encontrar projetos de caráter ambiental, educativo, social, cultural, científico e/ou
tecnológico.

E para que serve um projeto? De forma simples, ele serve para dar respostas,
apresentar resultados. Podem até ser mais de uma resposta ou resultados, mas
é certo que devem responder a um problema concreto. Para alcançar isso, vamos
estudar na sequência como se elabora um projeto que atenda ao proposto.

Para reforçar a ideia de projetos, sugere-se a seguinte atividade:


pesquise na internet duas organizações da sua região, que divulguem
a execução de projetos. Utilize o modelo.

Instituição Área de atuação Projeto Descrição

116
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

2.2 ANTES DE TUDO – UM BOM


PROJETO
Um projeto começa quando uma ideia ou um pensamento passa a ser
delineado, ou seja, quando começamos a passar ele do abstrato para o concreto.
Um projeto pode ser uma intenção ou sonho (“meu projeto de vida é comprar uma
casa...”; “meu projeto é viajar pelo mundo...”), uma filosofia (“o meu projeto é de
que o nosso país seja mais justo...”), uma concepção de um produto ou serviço
(“o projeto deste carro é semelhante ao anterior...”) ou ainda um empreendimento
ou investimento (“o município vai iniciar um novo projeto neste bairro, com a
urbanização dele...”).

Os projetos são
Mas quando focamos sob a ótica do terceiro setor, os projetos
propostos para
são ideias que viram ações, que em última análise apresentam uma resolver problemas
resposta a uma pergunta, a uma dor, a um problema. Ou seja, os específicos para
projetos são propostos para resolver problemas específicos para públicos específicos.
públicos específicos.

Se observarmos as definições acima, somos remetidos a extrair algumas


deduções: projetos podem ser criativos e inovadores, projetos necessitam de
um plano, ou seja, é preciso cumprir um ritual dentro de um esboço, em um
determinado esquema, ainda que ele seja provisório, eles podem ser adequados
para a nossa realidade e podem ou não ser executáveis.

Em geral, para as organizações do terceiro setor, os projetos são de


intervenção, ou seja, eles surgem a partir da necessidade de resolver algum
problema. Um único problema ou um conjunto deles pode constituir o que se
chama de “situação problema”.

Existem situações-problema de ordem social que estão relacionados às mais


diversas necessidades pessoais. Desse modo, podemos identificar, por exemplo,
a ausência de equipamentos de saúde (unidades básicas), equipamentos de
educação (escolas), projetos de assistência social e equipamentos e projetos
ligados ao esporte e lazer. Surge então a necessidade de refletir e de organizar
formas de agir para que se amenizem ou revertam esses problemas.

Do ponto de vista conceitual, o projeto pode se caracterizar como um


instrumento pelo qual se propõe aos sujeitos envolvidos com um dado problema a
se colocarem no centro das tomadas de decisões para a resolução do problema,
dentro de um determinado tempo e com determinadas condições. Significa que

117
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

esses sujeitos podem ser os próprios demandados de uma comunidade, técnicos,


gerentes, dirigentes, parceiros, agentes sociais etc., o que torna o processo mais
próximo da realidade.

Um projeto é
Portanto, um projeto é um instrumento de sistematização
um conjunto
de informações de ações que nos levam a resolver problemas. No caso das
organizadas em organizações do terceiro setor, seu intento é resolver problemas
função do tempo, sociais. Dizendo de outra forma, um projeto é um conjunto de
do espaço e dos informações organizadas em função do tempo, do espaço e dos
recursos, visando recursos, visando alcançar os objetivos propostos.
alcançar os
objetivos propostos.
Mas então, como eu organizo um projeto? Quais são as etapas
necessárias para se elaborar um projeto? Não há outra forma de iniciar um projeto
senão por um bom planejamento. Isso demanda um tempo, já que se espera
juntar um grupo que possa discutir a respeito da situação. Quando a organização
do terceiro setor identifica uma situação problema que pretende resolver, alguns
passos básicos são requeridos.

O caminho para elaboração de um projeto passa por pelo menos quatro


momentos, que alguns autores chamam de fases e outros etapas, que vamos
estudar a partir de agora: Etapa 1: a identificação de um problema; Etapa 2: a
viabilidade; Etapa 3: programação das atividades e recursos necessários; e Etapa
4: análise da importância do projeto.

Neste material vamos apresentar essas quatro etapas, mas a dica é você
não ficar limitado a elas. Como sugestão de pesquisa, consulte os guias de
gerenciamento de projetos da PMI – Project Management Institute.

A figura a seguir representa a análise inicial de um projeto, composto pelas


Etapas 1 (identificação) e 2 (viabilidade). É importante lembrar que tudo isso deve
ser registrado por escrito, para não se perder informação alguma.

FIGURA 1 – ETAPAS BÁSICAS NA ELABORAÇÃO DE PROJETOS

FONTE: Tenório (2002, p. 15)

118
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

É possível visualizarmos os elementos que estruturam o início da elaboração


de um projeto de intervenção, que quase sempre correspondem à introdução do
projeto, também denominada de diagnóstico ou anteprojeto. Após conhecer cada
um, você verá que os elementos se relacionam entre si e que o que permite a
relação para responder ao problema é um constante processo de análise referente
ao alcance de objetivos. Vamos ver cada uma dessas fases.

A identificação consiste em checar a oportunidade de se intervir com um


projeto em algum problema. Delimita-se seu objeto e âmbito, identificando as
hipóteses preliminares sobre a situação-problema a ser enfrentada e as possíveis
limitações que devem ser levadas em conta.

Na identificação é desejável que se escreva o suficiente para apresentar um


tripé importante, muito útil para dar o pontapé inicial de qualquer projeto: delimitar
o problema, o potencial e o referencial. O quadro a seguir ilustra o significado de
cada elemento.

QUADRO 3 – ELEMENTOS PARA DELIMITAÇÃO DO PROJETO


O problema Situa-se na ausência ou insuficiência de espaços, programas, pessoal
etc. Nesse caso, devem ser relatados os dados da realidade que dizem
respeito ao que estamos problematizando, fornecendo as fontes de
onde surgem as informações. Por exemplo: dados do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), secretarias municipais etc.
O potencial Refere-se às possibilidades amplas que temos para intervir diante dos
problemas identificados. Nesse caso, precisamos informar a existência
disponível, por exemplo, de pessoal, espaços, materiais, parcerias etc.
O referencial Relaciona-se, especificamente, com as possibilidades de recursos fi-
nanceiros disponíveis pelo governo ou empresas (disponibilizados por
editais específicos ou em fluxo contínuo). As possibilidades de financia-
mento, principalmente, aquelas que estiverem previstas em legislação
como obrigação do Estado e que normalmente ocorrem por meio de
concorrências, devem ser indicadas.
FONTE: Adaptado de Borges (2018)

Considerando que a partir da identificação da situação-problema estaremos


em um constante processo de análise para implementar um projeto, resta ainda
verificar as possibilidades da intervenção. Essas possibilidades são referidas como
viabilidades e cada uma se referirá a diferentes aspectos que podem contribuir ou
não para a efetivação de qualquer projeto. A figura a seguir apresenta os tipos de
viabilidade que devem ser analisados.

119
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

FIGURA 2 – VIABILIDADES PARA A ELABORAÇÃO DE PROJETOS

FONTE: Tenório (2002, p. 15)

Vejamos o significado de cada uma das viabilidades apresentadas na Figura


2 e de acordo com a explanação encontrada em Tenório (2002). A viabilidade
técnica se refere às condições operacionais, ou seja, aqueles elementos
necessários para desenvolver o projeto, como o espaço físico, os materiais a
serem usados e o pessoal envolvido.

O estudo da viabilidade econômica verificará qual a contribuição que o


projeto trará para a comunidade e o grupo social beneficiado. Aqui também serão
considerados os recursos já existentes, como os recursos naturais e recursos
humanos.

Já a viabilidade financeira diz respeito às condições objetivas de


financiamento do projeto. Desse modo, a análise estará centrada nas despesas
que existirão no decorrer da execução do projeto. Como resultado da análise,
espera-se que os recursos financeiros sejam suficientes para cobrir todos os
gastos envolvidos, conforme programação prevista.

A viabilidade gerencial diz respeito a todas as condições legais e técnicas


da administração do projeto que permitirão o seu funcionamento. Sob o aspecto
legal, por exemplo, como está a situação do local onde o projeto ocorrerá. Quanto
ao aspecto técnico, se as especificações atendem às necessidades gerenciais do
projeto.

A viabilidade ecológica tem por objetivo verificar se as consequências do


projeto podem trazer prejuízo ao meio ambiente, sendo que os ganhos para o
meio ambiente se constituem em condições favoráveis ao projeto.

120
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

Por fim, a viabilidade social analisa todos os benefícios que o projeto


pode trazer para o grupo social beneficiado ou para as pessoas que, direta ou
indiretamente, estão relacionadas a esse grupo. Essa análise é precedida de
levantamento de informações sobre os hábitos e práticas sociais, de modo a
facilitar o diagnóstico da situação.

Mas os estudos de viabilidade não devem se esgotar com a identificação


destes seis aspectos: técnico, econômico, financeiro, gerencial, ecológico e
social. Outros elementos poderão auxiliar para a análise de viabilidade. Como
mencionamos, eles devem ser vistos de forma integrada, já que o resultado de
análise de uma viabilidade vai influenciar outras.

Resumindo: o processo de diagnóstico serve para conhecer a realidade


fazendo-se as seguintes perguntas:

• Quais os principais problemas?


• Quais as maiores necessidades?
• Quais as possibilidades de mudar essa realidade?

Reforçando: a construção do documento “projeto” deve se dar desde o início


das etapas de identificação e viabilidade. Para que o resultado seja a projeção no
papel, tudo o que é necessário para o desenvolvimento do conjunto de atividades
a serem executadas é: quais os objetivos, que meios serão buscados para
atingi-los, quais são os recursos necessários, onde serão obtidos e como serão
avaliados os resultados.

Organizar um projeto em um documento ajuda a sistematizar o trabalho em


fases a serem cumpridas e auxilia no compartilhamento da imagem do que se
quer alcançar, além de identificar deficiências que devem ser superadas e apontar
possíveis falhas durante a execução das atividades previstas.

Um bom projeto escrito tem que se mostrar capaz de comunicar todas as


informações necessárias e, por isso, são requeridos alguns elementos básicos
para sua apresentação, ou seja, o que não pode faltar na estrutura do projeto e
que estão demonstradas no quadro a seguir. O documento projeto é um mapa,
um guia de orientação.

121
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

QUADRO 4 – ESTRUTURA DE APRESENTAÇÃO DE PROJETO


Elemento Descrição
Título O título deve refletir o conteúdo da proposta.
Equipe Quem serão as pessoas responsáveis pela ideia e sua ex-
ecução.
Justificativa Definição clara do problema a ser tratado. Aqui se deve com-
preender a relevância das ações propostas.
Objetivos Definição clara do objetivo geral, que é a realidade que se pre-
tende modificar, e os objetivos específicos, que auxiliarão no
alcance do geral.
Procedimentos Descrição de todas as atividades e como serão implementa-
das. Aqui são apontados todos os passos que serão dados e,
no conjunto, mostram qual o caminho escolhido para alcançar
os resultados. Aqui respondem-se as perguntas: Como? Onde?
Cronograma Datas de implementação das atividades. Responde-se à per-
gunta: Quando?
Avaliação Como, quando e por quem será avaliado o projeto.
Disseminação Do projeto para o ambiente. Um projeto deve ser divulgado, de
modo que possa ter o acompanhamento da sociedade.
Orçamento Recursos necessários.
Apoio institucional Quem apoia o que o projeto propõe, quais as instituições en-
volvidas e dispostas a participar da ideia.
Anexos Sempre que necessário
FONTE: Adaptado de Kisil (2004)

Existem algumas recomendações quando se procede a escrita do documento.


Entre elas, ser claro, direto e conciso. Em um projeto, não há nada que possa
ser explicado em poucas palavras e parágrafos. Deve-se evitar redundâncias, ou
seja, a repetição da mesma coisa de modos diferentes. Também se deve evitar o
uso de palavras a mais, que não contribuirão com a compreensão do texto.

Agora vamos avançar para a Etapa 3, que consiste na programação das


atividades e identificação dos recursos necessários. As perguntas a serem
respondidas nessa etapa são: como vamos agir e quanto vai custar.

Primeiramente vamos discorrer acerca da programação das atividades. Aqui


deve-se escrever o que será feito e não o que se pretende melhorar, pois isso
já foi registrado nas etapas anteriores. A programação segue alguns passos,
que vamos explicar a seguir. O resultado consiste na elaboração do “plano de
trabalho”, tendo o “quadro de verificação dos procedimentos”, o “cronograma de
atividades” e “memória de cálculo” como documentos auxiliares.

No plano de trabalho, estão descritos os passos que mostram o caminho


para alcançar o resultado. Para cada procedimento, deve-se delimitar as ações
no tempo e espaço, as atividades detalhadas e as pessoas envolvidas. Significa
que responderemos às perguntas: Como? Onde? Quando? E quem?

122
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

No quadro a seguir, apresenta-se uma sugestão de plano de trabalho, que


pode ser adaptado de acordo com a realidade de cada organização.

QUADRO 5 – MODELO PLANO DE TRABALHO


Projeto: nome sobrenome
Como? (ações e atividades) Onde? Quem? Quando?
1.
2.
n...
FONTE: Adaptado de Kisil (2004)

Na coluna “como?”, devem ser detalhadas todas as ações, atividades e


os métodos que se pretende utilizar. Destaca-se que esse campo pode ser
subdividido, de modo que se possa verificar cada objetivo com suas ações
pertinentes.

A organização deve ter em mente quais ações podem ser desenvolvidas para
alcançar cada objetivo proposto. Essas ações podem ser agrupadas em linhas
de trabalho, para facilitar o entendimento. Na sequência definir quais métodos de
trabalho podem ser adotados, ou seja, quais atividades podem ser atribuídas para
cada ação.

Assim, é importante descrever como o trabalho será feito e não apenas o


que vai ser feito. Como exemplo, cita-se: “[...]os treinamentos serão trimestrais
e envolverão três representantes de cada comunidade [...]”, ou ainda “[...] a
Universidade local dispõe de profissionais especializados para prestar assistência
técnica aos produtores participantes do projeto [...]” (KISIL, 2004, p. 31).

Como um documento auxiliar, pode-se criar um quadro de verificação dos


procedimentos, como o que apresentamos no quadro a seguir.

QUADRO 6 – VERIFICAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS DO PROJETO


Objetivos Ações Atividades
Ação 1 a) ....
b) ....
c) ....
Ação 2 a) ....
Objetivo 1 b) ....
Objetivo ‘n’ Ação ‘n’ ...
FONTE: Adaptado de Kisil (2004)

Quando se faz a redação da metodologia de trabalho, deve-se justificar cada


item, pois isso dará coerência e consistência, além de apresentar racionalidade

123
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

nas escolhas feitas. Pode-se usar como justificativa outros projetos que utilizaram
a mesma metodologia e que alcançaram bons resultados. Outras formas, como
depoimentos e opiniões de especialistas também contribuem para fortalecer a
escolha de um método de trabalho.

Seguindo nosso “Quadro 5 – Modelo de plano de trabalho”, chegamos à


coluna do “onde?” o projeto vai ocorrer. A abrangência geográfica e social também
deve estar muito clara e pode ou não estar vinculada diretamente a cada ação.
Por exemplo, meu projeto pode prever a intervenção em um bairro e todas as
ações serão direcionadas a esse espaço. Porém, posso ter uma ação que seja
pontual, em uma escola ou praça específica.

Informações como a abrangência populacional indicam o número e a


localização das pessoas que estão sendo atingidas pelo projeto. Essa indicação
é importante para informar quais os limites geográficos da intervenção do projeto.
Além disso, descrever o espaço físico indica onde serão desenvolvidas as
atividades, contendo especificações de endereço e tamanho. Lembre-se do que
vimos na Etapa 1, quando estudamos a identificação e viabilidade. Se necessário,
retorne e reveja os conceitos.

Seguindo a ordem do modelo de plano de trabalho, chegamos ao momento


de perguntar “quem?” vai fazer. Nomes e funções das pessoas envolvidas devem
estar definidos. O envolvimento de voluntários é válido, desde que atendidos os
requisitos que estudamos no Capítulo 2.

As funções de cada pessoa envolvida devem estar muito claras, para que se
coloque a pessoa certa na responsabilidade certa. Essa etapa da elaboração do
plano deve ocorrer preferencialmente após a definição dos procedimentos.

Mas como escolher a pessoa certa? Não existe uma fórmula para isso. Mas
pode-se sugerir maneiras de como fazer. Uma das maneiras é por indicação.
Essa se dá de várias formas: por afinidade com alguma temática, por experiência
de atuação, por projetos já liderados. Mas atenção, para evitar constrangimentos,
não é recomendável que alguém indique a si próprio, pois não haver concordância
de alguém da equipe.

Outra maneira é fazer a contratação de novas pessoas para compor a


equipe. Por vezes é o melhor a ser feito, já que a boa vontade das pessoas no
terceiro setor não é garantia de bons resultados.

Esse também é o momento em que as atribuições relacionadas às decisões


do projeto precisam estar definidas. Quem será o coordenador? De que forma as

124
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

decisões serão tomadas? Qual a autonomia dos envolvidos ou qual o limite para
tomada de decisões?

Finalizando o plano de ação, chegamos à pergunta ‘quando?’ fazer. Montar


o cronograma é distribuir as atividades no decorrer do período previsto para
executar o projeto. Ainda que as previsões possam conter erros, o cronograma de
atividades deve ser feito com muita seriedade, pois sempre apresenta benefícios,
seja para a coordenação do projeto, para as equipes ou ainda para ações com
doadores.

Apresentamos no quadro a seguir um modelo de cronograma de atividades,


que pode ser adaptado conforme a organização.

QUADRO 7 – MODELO DE CRONOGRAMA


Objetivos Ações Atividades Mês 1 Mês 2 Mês 3 Mês 4 ..... Mês ‘n’
Ação 1 a) ....
b) ....
c) ....
Ação 2 d) ....
Objetivo 1 e) ....
Objetivo ‘n’ Ação ‘n’ ...
FONTE: O autor

Fechando a Etapa 3, vamos abordar os recursos necessários para executar


o projeto. O orçamento é o planejamento financeiro do projeto, distribuído ao
longo do tempo em que ele será executado. Sugere-se classificar os valores em
origens e aplicação dos recursos.

Por recursos entende-se todos os bens, insumos e serviços que serão


utilizados na execução do projeto. Como exemplos de recursos, Kisil (2004, p.
48) cita os seguintes: “equipamentos, suprimentos, salários da equipe, benefícios
trabalhistas dos funcionários, viagens, consultores externos, mobília, aluguel,
treinamentos, terra, veículos etc.”.

No orçamento devem ser incluídos todos os recursos necessários com seu


respectivo valor em moeda. Salienta-se que mesmo os recursos que não serão
adquiridos em moeda, como doações de equipamentos ou alimentos, eles devem
compor a planilha. Inclusive o trabalho voluntário deve ser estimado e lançado no
orçamento.

O orçamento é uma estimativa e por isso pode apresentar variações ao longo


do tempo. Por isso a importância de registrar todos os valores envolvidos, pois
caso seja necessário atualizar os seus valores e itens, essa transparência ajudará
na tarefa de convencimento.

125
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Na elaboração do orçamento, deve-se fazer a lista de recursos necessários


para as atividades. A partir do cronograma é que se inicia a elaboração da planilha
orçamentária. Para cada uma das atividades e ações, deve-se registrar tudo o que
for necessário para a sua realização. Nessa avaliação dos recursos necessários
também deverá constar a sua eventual fonte. Como exemplo, apresenta-se o
quadro a seguir.

QUADRO 8 – AVALIAÇÃO DE RECURSOS E FONTES


Projeto X
Atividades:
Tarefas:
Recursos Recursos já Recursos a serem Fontes de re- Equipe re-
necessários disponíveis obtidos cursos sponsável

FONTE: Kisil (2004, p. 51)

Um segundo registro necessário em uma planilha orçamentária é a


segregação dos gastos em pelo menos três categorias: recursos humanos,
investimentos e gastos operacionais. Na categoria recursos humanos devem ser
registrados os gastos com o pessoal permanente, os treinamentos e capacitações
e as consultorias.

Na categoria investimentos são informados os bens permanentes que serão


utilizados. E, nos gastos operacionais, devem ser registrados tanto os gastos
contínuos como também os previsíveis, necessários para que o projeto funcione
sem interrupções.

Para tornar mais fluída a informação relacionada ao orçamento, deve-se ter


a memória de cálculo para os gastos de cada atividade. Embora não conste no
documento final do projeto, esse documento esclarece muitas dúvidas, explicando
como se chegaram a alguns quantitativos ou parâmetros de valores utilizados.

Recomenda-se ter uma planilha contendo a memória de cálculo para cada


atividade desenvolvida. No quadro a seguir, apresenta-se um modelo de memória
de cálculo.

126
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

QUADRO 9 – MEMÓRIA DE CÁLCULO


Objetivos Ações Atividades Mês 1 Mês 2 Mês 3 Mês ‘n’
Ação 1 a) .... Recursos Humanos $ 0,00 Recursos Humanos Recursos Humanos
$ 0,00 $ 0,00

Investimentos $ 0,00
Gastos Operacionais $
Objetivo 1 0,00 Gastos Operacionais Gastos Operacionais
$ 0,00 $ 0,00
b) .... Recursos Humanos $ 0,00

Investimentos $ 0,00

Gastos Operacionais $
0,00
c) .... Recursos Humanos
$ 0,00

Investimentos $ 0,00

Gastos Operacionais
$ 0,00
Ação 2 d) ....
e) ....
Objetivo A ç ã o ...
‘n’ ‘n’

FONTE: O autor

Uma vez que essas tarefas estão concluídas, o passo final é a elaboração do
orçamento que será incorporado ao documento projeto. Os documentos auxiliares
citados até aqui serão consolidados em uma planilha contendo os valores por
período de execução. Esses períodos vão depender de cada projeto. Se forem de
curto prazo, pode ser apresentado de forma mensal e, se for de longo prazo, pode
ser de forma anual.

No quadro a seguir, apresenta-se um modelo de orçamento de desembolso.


Se o seu projeto se transformar em uma proposta de financiamento e se for
aprovada por algum financiador, significa que ele compreendeu o que sua
entidade pretende realizar, percebeu sua importância e as possibilidades de
êxito. Em outras palavras, ele acredita nas metas, vê que os objetivos seguem no
mesmo rumo e vê as chances de sucesso.

127
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

QUADRO 10 – ORÇAMENTO DE DESEMBOLSO


Categoria/Item Origem Agência Financiadora Contrapartida institucional
Ano 1 Ano 2 Ano 1 Ano 2
RECURSOS HUMANOS
Pessoal Permanente Funcionários insti- 5.400 6.000 3.000 3.200
tucionais
Consultoria 2.000 2.500 0 0
Total Recursos humanos 7.400 8.500 3.000 3.200
INVESTIMENTOS
Microcomputadores Patrimônio insti- 0 0 2.000 2.500
tucional
Filmadora e máquina 750 0 0 0
digital
Total Investimentos 750 0 2.000 2.500
GASTOS OPERACIONAIS
Suprimentos es- Doação comércio 500 600 0 0
critório
Manutenção in- Parceria com 700 800 0 0
formática prestador
Combustíveis Parceria com posto 1.000 1.200 700 800
Aluguel 3.000 3.200 0 0
Total Gastos Operacionais 5.200 5.800 700 800

FONTE: O autor

Por fim, a Etapa 4, na qual é analisada a importância do projeto. Essa etapa


será discutida na próxima seção.

Como já destacamos, os projetos têm começo, meio e fim, ou seja, possuem


o que se chama em gerenciamento de projetos de ciclo de vida. Esse ciclo
consiste nas fases dele. Em geral, as fases são sequenciais, permitindo que se
faça o monitoramento em cada momento. O ciclo de vida oferece uma estrutura
básica para o gerenciamento do projeto, independentemente do trabalho
específico envolvido.

FIGURA 3 – ESTRUTURA DO CICLO DE VIDA

FONTE: PMI (2008, p. 16)


128
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

Como é possível verificar na Figura 3, o ciclo de vida contém as fases do


projeto, que são as divisões em que a presença de controles adicionais pode ser
importante para garantir de forma efetiva o término do projeto, com a entrega dos
resultados pretendidos. Esse modelo é ilustrativo, já que o número, a necessidade
e o grau de controle das fases dependem da complexidade e impacto potencial
de cada projeto. Nesse assunto vamos nos aprofundar na Seção 4 deste capítulo.

Vamos exercitar? Considere a seguinte situação: uma


organização pretende realizar um projeto de educação ambiental em
escolas públicas, no decorrer do mês de junho, quando se comemora
o dia do meio ambiente. A organização não possui funcionários,
apenas voluntários, que são em 12 no total. Com base nesses
dados, pense em um possível plano de trabalho, utilizando o modelo
proposto.

Projeto: nome sobrenome


Como? (ações e atividades) Onde? Quem? Quando?
1.
2.
n...

Agora, vamos dedicar um espaço para abordarmos os impactos que os


projetos podem ter ao final de sua execução.

2.3 QUAL(IS) O(S) IMPACTO(S) DO


PROJETO?
Projetos sociais buscam resolver algum problema. Já destacamos isso
na seção anterior. Responder à pergunta ‘o que queremos?’ nos impulsiona a
identificar as oportunidades de intervenção em alguma comunidade.

Quando o projeto passa pelas etapas que discutimos até aqui, queremos
realmente que ele tenha sucesso ao final de sua execução. Isso certamente nos
deixará satisfeitos, já que o propósito foi alcançado.

129
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Frequentemente, vemos diversas intervenções ocorrendo em comunidades


carentes, favelas, de agricultura familiar, de comunidades afetadas pela seca e por
aí vai. No entanto, existe um aspecto que é muito importante e relevante quando
se “pensa projetos” e que, muitas vezes, sequer é colocado à mesa de reuniões:
o beneficiário da intervenção do projeto deseja de fato que isso aconteça?

Muitas vezes, os beneficiários não são ouvidos em suas dores. Significa


dizer que alguém, fora do contexto deles, decide que tipo de intervenção será
realizada. Considerar cada realidade ajuda a responder à questão do impacto.
Negligenciar aspectos que se refiram ao relacionamento dos atores envolvidos
pode ser um risco ao fracasso do projeto.

E qual o impacto que minha organização busca? Uma mudança duradoura


e com efeitos de longo prazo ou a fome do dia de hoje? Pretende-se um impacto
positivo ou negativo? A força e a riqueza de um projeto estão na capacidade
de transformação de coisas, situações e pessoas, criando mecanismos de
desenvolvimento social.

A provocação que aqui trago em relação ao impacto é para que você, futuro
gestor de projetos e de organizações do terceiro setor, lembre-se de que cada
projeto é uma iniciativa específica para resolver um conjunto de problemas e que
se deve buscar planejamentos amplos para resolver os problemas.

Como atividade complementar, vamos nos utilizar novamente


das quatro organizações que você pesquisou no Capítulo 2. Agora,
sua tarefa será identificar os projetos que são executados por essas
organizações, elaborando uma lista e identificando os impactos que o
projeto causou, com as informações que você aprendeu nesta seção.

Organização Projeto Impactos

130
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

Para saber mais sobre projetos, assista ao vídeo disponível


em: <https://www.youtube.com/watch?v=MTEclPBkFjQ>. Nele, o
professor Cícero Feltrin apresenta, em uma oficina, o passo a passo
para elaboração de projetos, com vistas a captar recursos. O vídeo é
de maio de 2018.

Na próxima seção, vamos tratar da captação e mobilização de recursos, com


suas mais variadas possibilidades.

3 CAPTAÇÃO E MOBILIZAÇÃO DE
RECURSOS
Na Seção 2, aprofundamos nosso estudo na elaboração de um projeto.
Agora chegou a hora de buscar os recursos para viabilizar a execução do projeto.
Nesta seção vamos conhecer e buscar alternativas ao caminho das pedras de um
número muito grande de organizações do terceiro setor: a captação e mobilização
de recursos.

3.1 TIPOS DE FONTES


É provável que você já tenha ouvido alguém dizer que dinheiro não nasce em
árvores. É uma expressão antiga, mas utilizada com muita frequência, inclusive
no âmbito das organizações empresariais. Quantas entidades, ao buscarem ajuda
para o financiamento de seus projetos, depararam-se com essa barreira no que
diz respeito a recursos.

FIGURA 4 – DINHEIRO EM ÁRVORE

FONTE: <https://medium.com/@dtiriba/dinheiro-nasce-em-
%C3%A1rvore-4a0101252114>. Acesso em: 22 set. 2020.
131
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Já que dinheiro não nasce em árvore, é importante entendermos o que são


fontes de recursos e onde elas estão. Por definição, “são instituições ou indivíduos
que podem apoiar financeira ou fisicamente a proposta de sua instituição” (KISIL,
2004, p. 14).

Saber quem pode ser uma fonte de recursos para a organização do terceiro
setor ajuda bastante e, para auxiliar, vamos começar do início. Mas, por onde
começar? Em primeiro lugar elaborando um plano de captação. Atuar com
estratégias na captação gera melhores resultados.

Alguns autores, como Cruz e Estraviz (2003) e Heyman (2017) recomendam


que as organizações do terceiro setor não devam depender apenas de uma fonte
de recurso, independentemente da origem e natureza do recurso. Isso porque, se
essa fonte deixar de contribuir, a organização ficará em situação financeira muito
ruim. Na Figura 5 tem um exemplo da distribuição de fontes de recursos em uma
organização, com fontes diversas e não concentradas, ou seja, nenhuma delas
com mais de 50%.

De modo geral, as fontes de recurso podem ser de natureza


As fontes de recurso
podem ser de pública, privada, nacional ou estrangeira. Sim, inclusive estrangeira.
natureza pública, Nos anos de 1960 a 1980 surgiram muitas organizações do
privada, nacional terceiro setor que recebiam recursos por intermédio de organismos
ou estrangeira. de cooperação internacional. Por muitos anos esses recursos
Sim, inclusive internacionais foram significativos e fundamentais para que
estrangeira.
consolidassem projetos sociais e ambientais.

Agências ligadas à ONU (Organização das Nações Unidas) e Banco Mundial


são exemplos de instituições multilaterais internacionais que têm interesse em
financiar programas e projetos de organizações do terceiro setor brasileiras.

Também alguns países do hemisfério norte, como Estados Unidos e Canadá,


e na Europa, disponibilizam auxílios para o desenvolvimento de organizações.
Um mecanismo de fomento utilizado são os acordos de cooperação técnica, além
de aportes financeiros.

Ainda no âmbito internacional, algumas organizações não governamentais


e fundações privadas também representam apoio financeiro ao terceiro setor
brasileiro. Em geral, essas organizações investem em capacitação e projetos
menores, que apoiam especialmente a população marginalizada.

132
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

Mas muitos dos financiadores internacionais diminuíram as doações


para organizações brasileiras, o que fez com que as organizações brasileiras
começassem a buscar localmente o financiamento de suas atividades.

FIGURA 5 – GRÁFICO DE DISTRIBUIÇÃO DE RECURSOS

FONTE: O autor

Vamos versar um pouco sobre as principais fontes públicas acessíveis às


organizações do terceiro setor. Uma delas são as linhas de crédito oferecidas por
agentes financeiros públicos, como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social), BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo
Sul), ou ainda outros agentes locais, como os Bancos do Povo. Esses agentes
oferecem linhas de crédito com juros subsidiados e que podem, em alguns casos,
comporem inclusive fundos perdidos.

Outra fonte pública são os recursos de fundo perdido. Tratam-se de recursos


disponibilizados sem reembolso ou outro custo vinculado. Normalmente estão
vinculados a fundos nacionais, estaduais ou municipais, como Fundo Nacional
do Meio Ambiente, Fundo Estadual da Cultura, Fundo Municipal de Saúde. No
entanto, podem ser recursos oriundos de outras fontes públicas, como as emendas
parlamentares, cuja liberação depende de aprovação e previsão orçamentária.

A forma de acesso aos fundos é preestabe­lecida e toda oferta desse tipo


de recurso pode estar disponível por períodos contínuos ou mediante processos
de seleção. No primeiro caso, a obtenção do recurso dependerá da iniciativa da
entidade ou consórcio de entidades para elaborar e apresentar uma proposta de
financia­mento a determinado fundo.

Já no segundo caso, os recursos são colocados à disposição con­forme a


necessidade do contratante do projeto. E o processo de seleção inicia com a

133
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

publicação de editais, atendendo ao Marco Regulatório do Terceiro Setor, que


estudamos no Capítulo 2. Para os dois casos é exigida apenas a prestação de
contas de uso do recurso.

Outra fonte pública importante são os convênios e termos de parcerias, que


são acordos firmados entre o poder público e a organização do terceiro setor
e que preveem a colaboração das partes para alcançar objetivos comuns. Em
geral, a administração pública fica responsável por repassar recursos para a
organização conveniada executar serviços.

Por fim, outra fonte pública é originária dos incentivos fiscais, que são
oferecidos pelo governo à iniciativa privada sob a forma de de­dução de impostos
e não se apresenta como uma forma direta de captação, mas sim como
benefício fiscal. Os incentivos têm se mostrado uma fonte muito interessante às
organizações. Vamos dedicar uma subseção só para tratar deles.

A estrutura de financiamento e administração de recursos públicos apresenta


uma diversidade grande nos procedimentos, como citamos alguns casos. Para
exemplificar, apresentamos o quadro a seguir que sintetiza a classificação dos
recursos públicos no âmbito federal para algumas áreas.

QUADRO 11 – RECURSOS DISPONÍVEIS NO ÂMBITO DO GOVERNO FEDERAL


Tipos de recursos disponíveis no âmbito do governo federal
TIPO Saúde Educação Assistência Cultura Meio Am- Tr a b a l h o , Agricultura D i r e i t o
Social biente Emprego e e Reforma humanos
Renda Agrária
Fundo Perdido/ X X X X X
demanda es-
pontânea
Recursos a fun- X X X X X X
do perdido / de-
manda induzida
Recursos na X X X
forma de linha
de crédito com
juros subsidia-
dos
Recursos na X X
forma de incen-
tivos fiscais a fi-
nanciadores de
projetos

FONTE: Manual de Fundos Públicos (2003, p. 33)

Depois de apresentarmos as fontes internacionais e das públicas, vamos


apresentar as fontes de recurso privadas. Encontramos pelo menos cinco
fontes diferentes: indivíduos, empresas, outras organizações do terceiro setor,
instituições religiosas e geração de renda própria. A respeito dessa última, vamos
abordar mais na Seção 3.3.

134
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

FIGURA 6 – FONTES DE RECURSOS PRIVADOS

FONTE: O autor

Se a organização está desenvolvendo atividades sociais, contar com a


participação de indivíduos é legítimo e contribui para aproximá-los da causa.
Os indíviduos representam parcela significativa dos recursos captados pelas
organizações. Pesquisa apresentada no Giving Report 2019 Brasil demonstra que
70% dos brasileiros doaram dinheiro a alguma organização do terceiro setor nos
últimos 12 meses. Em valor, a média de doação foi de R$ 200,00 (duzentos reais).
No sítio eletrônico indicado, você tem acesso ao conteúdo dessa pesquisa, que
foi desenvolvida pelo Instituto para o Desenvolvimento do investimento Social.

Para saber mais, acesse: <https://www.idis.org.br/wp-content/


uploads/2019/02/CAF-Brazil-Report-2018-Final.pdf>.

FIGURA 7 – ILUSTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS

FONTE: <https://wdrfree.com/stock-vector/download/cartoon-icon-of-sketch-stick-
figures-in-cute-miniature-scenes-140934032>. Acesso em: 22 set. 2020.

135
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos


Muitas organizações deixam de lado a busca de doações de indivíduos, pois
avaliam que o trabalho para alcançar esse recurso é muito maior do que o valor
efetivamente recebido. Para Cruz e Estraviz (2003), isso pode ser verdadeiro em
um primeiro momento. No entanto, o envolvimento dos indivíduos na causa pode
trazer doações duradouras, alcançando inclusive outros indivíduos que até então
nada doavam. Isso significa fidelizar o doador.

Aumentar o número de associados contribuintes requer a realização de


algumas ações com os indivíduos, como um lançamento de campanha ou evento.
Essas ações têm o propósito de alcançar muitos novos doadores. A vantagem de
se ter um número elevado deles é que, mesmo ocorrendo a saída de um ou outro,
não haverá perda substancial de receita.

Outra maneira de se alcançar novos indivíduos doadores é utilizar-se do


telemarketing, embora muitas pessoas sintam-se “invadidas em sua privacidade”,
quando alguma organização as convida para contribuir via telefone. Se não
houver carisma e empatia por parte da pessoa que solicita o recurso, corre-se o
risco de causar uma imagem negativa para a organização.

A outra fonte privada são as empresas. A primeira coisa que se deve fazer
antes de solicitar recursos para empresas é fazer uma pesquisa para entender o
potencial do apoiador. Para isso, é importante identificar a área de atuação, porte,
faturamento e histórico da empresa, inclusive se ela apoia ações sociais. Após
esse levantamento, pergunte a si mesmo se a empresa pode se interessar pelo
projeto.

FIGURA 8 – ILUSTRAÇÃO DE EMPRESA

FONTE: <http://pintardesenhosdecolorir.blogspot.com>. Acesso em: 22 set/ 2020.

Caso a sua resposta for positiva, busque identificar o potencial de doação


com o qual a empresa pode auxiliar o projeto da organização. Em seguida,
identifique quem é a pessoa que vai decidir ou pode influenciar na decisão de
apoio financeiro. Contato e relacionamento vão abrir as portas para uma reunião
e apresentação do projeto.

136
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

Cruz e Estraviz (2003) nos dão as seguintes dicas para a apresentação: ela
deve ser visualmente atraente, com um relato suscinto e claro do histórico da
organização. Além disso, mostre projetos já executados e, com relação ao novo
projeto, deixe claro quais são os objetivos, quem é o público, qual a duração,
qual o impacto dele na sociedade e quais os custos do projeto. Para finalizar a
apresentação, peça o montante desejado, juntamente com um cronograma de
desembolso.

Todavia a organização do terceiro setor não deve esperar que a empresa


aporte recursos na primeira abordagem. Pode ser que ela decline do pedido.
O que fazer nesses casos? Combine novos passos, talvez uma outra reunião.
Não deixe de enviar uma carta de agradecimento pela reunião e/ou parceria. É
fundamental que se cultive o relacionamento, pois a empresa poderá se interessar
por outros projetos da organização.

Uma empresa pode decidir apoiar uma organização do terceiro setor se


percebe que ela tem credibilidade, ou ainda, se espera em troca divulgação. Você,
enquanto captador, deve ter em mãos um conjunto de benefícios para oferecer ao
financiador. No quadro a seguir apresentamos alguns benefícios que podem ser
oferecidos ao apoiador.

QUADRO 12 – BENEFÍCIOS
Tipo de Benefício Descrição
Apoio à causa A empresa será identificada como apoiadora da causa.
Divulgação dos resultadosA forma como serão mensurados e avaliados os resultados
e a sua divulgação ajudam na decisão da empresa, pois
isso pode ajudar a agregar valor para a empresa.
Retorno de imagem para a Inserção de logo da empresa nos materiais e apresentações
empresa em eventos públicos, citação do financiador nas aparições
na mídia, menção em publicações ou relatórios da organi-
zação, banner com logo do financiador, entrega de folder/
material publicitário do financiador em eventos ou para os
beneficiários do projeto.
Benefícios fiscais Demonstração dos incentivos fiscais com dedução de trib-
utos.
Outros benefícios Oferecimento de cotas de ingressos, disponibilização de
mailing dos participantes, participação dos funcionários da
empresa nas ações do projeto.
FONTE: O autor

Outras duas fontes possíveis são provenientes de organizações religiosas


e outras organizações do terceiro setor. No caso das religiosas, em geral, é
exigido que se tenha afinidade com a confissão. Uma vantagem em ter projeto

137
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

escolhido por igreja é que, em geral, os membros tendem a contribuir. As igrejas


são grandes receptoras de doações. Na pesquisa do Giving Report 2019 Brasil,
as igrejas aparecem em primeiro lugar com 58% dos entrevistados doando nos
últimos doze meses.

Outras organizações do terceiro setor podem apoiar atividades filantrópicas,


mediante seleção de projetos que busquem resultados próximos aos programas
de políticas públicas (que já vimos anteriormente). Ao contrário das empresa, aqui
não se tem necessariamente contato direto com o financiador. Boa parte delas
recebe as propostas com preenchimento de solicitação padrão em seus sítios
eletrônicos.

Chegamos ao final desta seção navegando por várias fontes de recurso para
organizações do terceiro setor.

Como sugestão de atividade, utilize as quatro organizações


selecionadas e aponte quais são suas fontes de recurso, com base
no que você aprendeu nesta seção.

Organização Fontes de recurso

Vamos discutir na sequência os incentivos fiscais e a geração de renda


própria.

3.2 INCENTIVOS FISCAIS


A definição de incentivos fiscais é apresentada pela OAB/SP (2005, p.15):

Incentivos fiscais são instrumentos utilizados pelo governo


para estimular atividades específicas, por prazo determinado.
Existem incentivos que facilitam a transferência de recursos
para atividades relacionadas ao Terceiro Setor, com o objetivo

138
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

de fortalecer o tecido social do País. Tais incentivos são


também importantes ferramentas para a consolidação da
sustentação-financeira das entidades sem fins lucrativos.
O Brasil dispõe de mecanismos de incentivo fiscal desde 1990, quando o
estatuto da criança e adolescente previu aos contribuintes do imposto de renda
destinarem seu imposto para os fundos. É uma sistemática muito interessante,
já que o governo renuncia a uma parcela de sua arrecadação para incentivar
atividades culturais, sociais, educacionais, esportivas e de saúde em benefícios
de várias pessoas.

Encontramos incentivos fiscais nas três esferas (federal, estadual e


municipal), cada qual com seu próprio regramento. Na figura a seguir, destacamos
seis leis federais que estimulam projetos sociais de organizações do terceiro setor.

FIGURA 9 – LEIS DE INCENTIVO FEDERAIS

FONTE: <https://app.incentiv.me>. Acesso em: 22 set. 2020.

Destaca-se que para utilizar o mecanismo “lei de incentivo”, o primeiro passo


para a organização do terceiro setor é ter seu projeto aprovado na pretendida lei
de incentivo, seguindo as normas da legislação e as diretrizes do departamento
responsável pela análise. Uma vez que o projeto esteja aprovado, a organização
pode buscar a captação junto a empresas e indivíduos contribuintes do imposto
de renda. No quadro a seguir, são apresentadas as características gerais de cada
uma das leis de incentivo.

139
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

QUADRO 13 – CARACTERÍSTICAS GERAIS – LEIS DE INCENTIVO


Tipo Norma Tipos de projetos O que pode receber
Lei de Incentivo Lei nº 8.313/1991 Projetos culturais pre- Até 6% do imposto de ren-
à Cultura vistos nos artigos 18 da devido da pessoa física
e 26 da lei, aprovados e até 4% da pessoa jurídica.
pela Secretaria Espe-
cial da Cultura.
Lei de Incentivo Lei nº 11438/2006 Projetos desportivos Até 6% do imposto de ren-
ao Esporte e paradesportivos de da devido da pessoa física
participação, educa- e até 1% da pessoa jurídica.
cional e de rendimen-
tos, aprovados pela
Secretaria Especial
do Esporte.
Pronon – Pro- Lei nº 12715/2012 Projetos de pre- Até 1% do IR de pessoas
grama Nacio- venção e combate físicas ou jurídicas.
nal de Apoio à ao câncer, aprovados
Atenção On- pelo Ministério da
cológica Saúde.
Pronas/PCD – Lei nº 12715/2012 Projetos de pre- Até 1% do IR de pessoas
Programa Na- venção e reabilitação físicas ou jurídicas.
cional de Apoio de pessoas com defi-
à Atenção da ciência, aprovados
Saúde da Pes- pelo Ministério da
soa com Defi- Saúde.
ciência
Lei de incentivo Lei nº 8069/1990 Projetos aprovados Até 6% do imposto de ren-
aos Direitos da por editais, cujas re- da devido da pessoa física
Criança e Ado- gras são definidas e até 1% da pessoa jurídi-
lescente pelo respectivo con- ca. O recurso fica em fundo
selho gestor do fundo. para ser acessado por orga-
nizações credenciadas.
Lei de incentivo Lei nº 10741/2003 Projetos aprovados Até 6% do imposto de ren-
aos Direitos dos e Lei nº por editais, cujas re- da devido da pessoa física
idosos 12213/2010 gras são definidas e até 1% da pessoa jurídi-
pelo respectivo con- ca. O recurso fica em fundo
selho gestor do fundo. para ser acessado por orga-
nizações credenciadas.
FONTE: Adaptado de <http://captamos.org.br>. Acesso em: 8 out. 2020.

Essas leis estão ligadas diretamente à dedução no recolhimento do Imposto


de Renda. A aplicação e gerenciamento dos recursos são fiscalizados pelo Estado,
para que efetivamente se cumpra o previsto nos projetos aprovados. Por ter essa
participação pública no processo de aprovação de projetos até sua prestação
de contas, a utilização dessas fontes de recurso traz em si uma segurança que
muitos apoiadores buscam.

Vamos destacar algumas particularidades de cada lei de incentivo. Iniciamos


com a lei de incentivo ao esporte, a Lei nº 11.438/2006, que é separada em três
manifestações desportivas diferentes:

140
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

a) Desporto de participação – ele é caracterizado por ser aquele


que busca o desenvolvimento do indivíduo por meio do esporte.
É o esporte como lazer.
b) Desporto educacional – a característica é que ele se destina a
alunos regularmente matriculados em instituições de ensino,
sendo que a maioria dos beneficiários deve ser oriundo de escolas
públicas. Nessa manifestação, o esporte é um instrumento
auxiliar no processo educacional.
c) Desporto de rendimento – busca o esporte de resultado, praticado
segundo regras formais. Nesse caso destaca-se a presença de
atletas ou atletas em formação.

Para saber mais sobre a lei de incentivo ao esporte, acesse:


<https://gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/lei-de-incentivo-
ao-esporte>.

A lei de incentivo à cultura, também conhecida como lei Rouanet, foi instituída
em 1991 pela Lei nº 8.313. Atualmente é o principal mecanismo para o fomento
das atividades ligadas à cultura. Apesar de não ser restrito às organizações do
terceiro setor, elas têm feito uso dela.

A lei prevê duas modalidades de fomento aos projetos aprovados na


secretaria especial da cultura: o patrocínio e a doação. O patrocínio é a
transferência definitiva e irreversível de dinheiro ou serviços, tendo como
finalidade a promoção, a cobertura de gastos ou ainda a utilização de bens
móveis ou imóveis do patrocinador, sem a transferência de domínio, para a
realização de programa, projeto cultural ou ação cultural. Na doação, existe a
transferência definitiva e irreversível de dinheiro ou bens em favor do proponente,
cujo programa, projeto ou ação cultural tenha sido aprovado.

Os projetos podem ser enquadrados nos seguintes segmentos artísticos-


culturais: artes cênicas (teatro, ópera, dança, mímica e circo); livros de valor:
artísticos, literários e humanísticos; música erudita ou instrumental; música
popular brasileira; artes visuais (pintura, fotografia, escultura); doação para
bibliotecas; produção de filmes de curta e média metragem; e preservação do
patrimônio cultural que inclui o folclore (Carnaval, Festa Junina, entre outras
festividades).

141
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

No site oficial da lei de incentivo à cultura, é possível obter mais


informações, como todo o passo a passo para inscrição de projetos.
Acesse em: <https://leideincentivoacultura.cultura.gov.br>.

Na área da saúde, temos uma lei que atende a dois programas: O PRONON
(Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica) e o PRONAS/PCD (Programa
Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência). A Lei nº
12715/2012 instituiu esse incentivo, que era um clamor antigo das organizações
do terceiro setor que atuam na área da saúde.

O PRONON tem como finalidade captar e canalizar recursos para a


prevenção e o combate ao câncer, abrangendo a promoção da informação, a
pesquisa, o rastreamento, o diagnóstico, o tratamento, os cuidados paliativos
e a reabilitação referentes às neoplasias malignas e afecções correlatas. Essa
previsão está no artigo 3º da lei.

As ações e os serviços de atenção oncológica a serem apoiados com os


recursos captados pelo PRONON compreendem prioritariamente: a prestação de
serviços médico-assistenciais; a formação, o treinamento e o aperfeiçoamento
de recursos humanos em todos os níveis; e a realização de pesquisas clínicas,
epidemiológicas e experimentais.

Com relação ao PRONAS/PCD, o objetivo da captação de recursos serve


para estimular e desenvolver a prevenção e a reabilitação da pessoa com
deficiência, incluindo-se a promoção, a prevenção, o diagnóstico precoce, o
tratamento, a reabilitação, indicação e adaptação de órteses, próteses e meios
auxiliares de locomoção. Essa previsão está no artigo 7º da lei.

Os recursos obtidos pelo PRONAS/PCD são investidos em ações e serviços


de reabilitação, compreendendo a prestação de serviços médico-assistenciais, a
formação, o treinamento e aperfeiçoamento de recursos humanos e a realização
de pesquisas clínicas, epidemiológicas e experimentais.

142
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

No site do Ministério da Saúde, encontram-se maiores


informações sobre os prazos para cadastramento das organizações,
envio dos projetos e trâmites para captação de imposto, liberação,
execução e prestação de contas. Acesse em: <http://saude.gov.br/
acoes-e-programas/pronon-pronas>.

Outra forma de incentivo fiscal, agora voltado ao atendimento dos direitos


da criança e adolescente, é o FIA – Fundo da Infância e Adolescência, que pode
ter outras denominações, a depender da região. Em sua origem, o FIA é federal,
com a promulgação da Lei nº 8069/1990, conhecido como estatuto da criança
e adolescente, mas sua gestão pode ocorrer nas três esferas, sendo possível
encontrar fundos municipais e estaduais, além do federal.

O FIA é controlado e gerido pelos conselhos de direitos. Tais conselhos


constituem-se como órgãos deliberativos paritários, em que a sociedade civil e o
poder público têm igual número de representantes. O objetivo geral é coordenar
ações complementares às políticas públicas para crianças e adolescentes,
proporcionando a participação da sociedade civil nessas atividades. Tem em suas
mãos a responsabilidade de fiscalizar e monitorar o uso do recurso, mediante
aprovação prévia de projetos, selecionados mediante chamamento público,
conforme prevê o marco regulatório do terceiro setor.

Para pesquisar mais a respeito, indicamos o site do conselho


nacional dos direitos da criança e adolescente. É possível encontrar e
endereço dos conselhos estaduais e municipais. Acesse em: <https://
direitosdacrianca.gov.br/>.

Os recursos destinados ao Fundo do Idoso têm como objetivo viabilizar


os direitos assegurados à pessoa idosa, previstos na Constituição Federal.
A lei que criou o fundo é relativamente nova, do ano de 2010 e ainda não
está completamente consolidada, a exemplo do FIA. O seu funcionamento é
semelhante ao FIA, tendo um conselho de direitos que controla o uso do recurso.

143
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

As organizações beneficiadas que recebem os recursos — prioritariamente


organizações do terceiro setor credenciadas pelos conselhos — devem prestar
contas aos conselhos e ao poder público.

Para obter mais informações a respeito desse fundo, visite o site


do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos disponível
em: <https://gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/pessoa-idosa> e,
alternativamente, o site da prefeitura de Porto Alegre disponível em:
<http://portoalegre.rs.gov.br/smgl/default.php?p_secao=115>.

Para finalizar os incentivos fiscais, existe uma previsão de renúncia fiscal


no Marco Regulatório – Lei nº 13019/2014 – que estudamos no Capítulo 2, cuja
doação por parte da empresa é dedutível da base de cálculo do imposto. Nesse
caso não há necessidade de aprovação prévia de projetos.

A organização poderá usar os recursos de forma livre. Para a empresa, é


imprescindível o atendimento das seguintes condições:

a) Doação limitada a 2% do lucro operacional.


b) A organização que receber a doação deve ser constituída no país e
prestar serviços de interesse público.
c) Doações em dinheiro devem ser feitas mediante crédito em conta
corrente bancária da organização.
d) Receber da organização o recibo conforme modelo disponibilizado pela
receita federal.

As organizações do terceiro setor devem utilizar desse mecanismo sempre


que possível. Se por um lado é uma forma legal de captar recursos para financiar
seus projetos, de outro lado, é um benefício que pode ser elencado para as
empresas que desejam aportar recursos.

Cabe ainda a título de informação, apresentar o quadro a seguir, contendo


os percentuais possíveis de destinação do imposto de renda por lei de incentivo.

144
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

QUADRO 14 – PERCENTUAIS DE DESTINAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA


Incentivos fiscais Empresas Lucro Real Pessoas Físicas – Mod-
elo de entrega completo
% do IR devido % do IR devido
Lei de Incentivo à Cultura 4%
Lei de Incentivo ao Esporte 1%
Fundo da Infância e Adolescência 1%
Fundo do Idoso 1%
6%
PRONON 1% 1%
PRONAS/PCD 1% 1%
FONTE: O autor

Salienta-se que a pessoa jurídica pode destinar em todas as leis de forma


independente, sem que tenha concorrência no percentual devido, ao contrário da
pessoa física, em que quatro leis concorrem para alcançar o mesmo percentual de
destinação.

Conhecer as leis de incentivo fiscal ajudam a organização na busca por mais


recursos, especialmente, no desenvolvimento de projetos específicos. Mas queremos
deixar dois recados importantes para você: primeiro, propositalmente, não informamos
neste material as normativas de encaminhamento de cada projeto, pois elas sofrem
constantes mudanças, e assim, correríamos o risco de disponibilizar um material
desatualizado. Assim, quando sua organização do terceiro setor buscar uma lei de
incentivo, faça uma pesquisa a partir dos links disponibilizados neste material para
buscar as informações necessárias ao encaminhamento; segundo: existe um universo
de leis de incentivo municipais e estaduais. Não temos espaço para tratar delas neste
material. Assim, a sugestão é que você busque junto ao seu município e estado
conhecer as leis de incentivo vigentes e, tendo oportunidade, fazer uso delas também.

Para fixar este conteúdo, proponho a seguinte atividade: uma


pessoa física contribuinte do Imposto de Renda tem imposto devido
de R$ 22.650,00. Com base no Quadro 14, faça uma composição de
quanto essa pessoa poderia destinar para projetos incentivados.

Lei de Incentivo Valor %


Lei de Incentivo à Cultura
Lei de Incentivo ao Esporte
Fundo da Infância e Adolescência
Fundo do Idoso
PRONON
PRONAS/PCD

145
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Na sequência vamos abordar outra fonte muito importante: geração de renda


própria.

3.3 GERAÇÃO DE RENDA


O sonho que toda organização do terceiro setor deveria ter é alcançar a
sua autossutentabilidade. Podemos nos perguntar se isso é possível, já que
basicamente o trabalho das organizações consiste em atividades sociais. A
desejada autossustentabilidade passa por projetos de geração de renda. E essa
geração passa pela venda de produtos e prestação de serviços relacionados às
causas sociais.

Talvez você fique com uma pulga atrás da orelha, pois no Capítulo 2
esclarecemos que as organizações do terceiro setor não buscam lucros. Isso
é verdadeiro. Assim como também é verdadeiro que as organizações podem
desenvolver projetos de renda própria. Cruz e Estraviz (2003) detacam que, em
muitas organizações do terceiro setor, a renda própria representa mais de 65% de
todos os recursos. No quadro a seguir, apresentamos algumas estratégias para
geração de renda.

QUADRO 15 – ESTRATÉGIAS DE GERAÇÃO DE RENDA


Estratégia Descrição
Eventos Organizar um desfile, festa, leilão ou outra forma.
Marketing Relacionado à A organização firma parceria para vender uma imagem, pro-
Causa – MRC duto ou serviço, com benefício para os dois lados.
Licenciamento Cria-se um personagem, e sua história e imagens são ofere-
cidas para outros utilizarem em seus produtos.
Aluguel Algumas organizações possuem espaços ociosos, como au-
ditório. Elas podem alugar o espaço por evento ou período
determiando.
Venda de Serviços e pro- Muitas organizações possuem bazares, panificadoras ou
dutos prestam serviços específicos, dentro de suas atividades es-
tatutárias.
Fundo Patrimonial São criados a partir de campanhas específicas, como para
construção de uma nova ala na organização ou mesmo para
manutenção das atividades cotidianas.
FONTE: O autor

A grande vantagem dos recursos advindos da geração de renda é que esses


recursos são de livre utilização, diferente dos projetos, que normalmente estão
atrelados a objetivos e desembolsos pré-definidos.

146
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

Na geração de renda, é muito importante que a organização tenha previsão


estatutária de sua utilização. Salientamos que a geração de renda não deve ser
a atividade principal da organização. É um meio pelo qual ela arrecada recursos
para seus fins. Caso fique caracterizado um desvirtuamento da finalidade, a
organização terá problemas fiscais e tributários, como vimos no Capítulo 2, no
qual tratamos do regime tributário.

O Marketing Relacionado a Causas, ou MRC, é uma maneira de mobilizar


recursos em benefício de uma ação específica ou de uma organização. Godoy
(2009) cita que o MRC surgiu na década de 1980, com uma campanha da
operadora de cartão de crédito American Express, como uma estratégia de
vendas com intuito de arrecadar recursos para restaurar a estátua da Liberdade.
Para as organizações, é uma maneira de alavancar parcerias com empresas, já
que é possível obter benefício mútuo.

Recente pesquisa da Ipsos (https://ipsos.com/pt-br/estudo-marketing-


relacionado-causa-2019) revelou que 77% dos entrevistados são favoráveis ao
MRC. Desses, cerca de 90% comprariam produtos de empresas que tivessem
algum tipo de relação com organizações sociais. Esse tipo de aliança começa a
influenciar o modo de consumo das pessoas. Por detrás, um sentimento que as
organizações do terceiro setor carregam consigo: a credibilidade.

Na figura a seguir vemos um exemplo clássico do uso do marketing


relacionado à causa no Brasil.

FIGURA 10 – MRC – MCDONALD’S X HC UBERLÂNDIA

FONTE: <https://www.hospitaldocancer.org.br/comeca-venda-de-tiquetes-para-o-
mcdia-feliz-em-prol-do-hospital-do-cancer-em-uberlandia/>. Acesso em: 22 set. 2020.

147
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

A venda de produtos e a prestação de serviços são atividades que cada


vez mais têm sido utilizadas pelas organizações do terceiro setor. No entanto, é
necessário cautela e cuidados quando se decide realizar essas atividades. Como
já destacamos, é necessário que a comercialização e a prestação de serviços
estejam previstas no estatuto como atividades meio para o sustento financeiro da
organização.

Segundo a OAB (2005), se tanto a venda de produtos quanto a prestação


de serviços ocorrer de forma habitual, deve-se ter o cuidado com o tratamento
tributário, cumprindo com o previsto na legislação. Assim, para não estar em
desconformidade, é recomendado que a organização promova a inscrição dessas
atividades junto aos respectivos órgãos de fiscalização (estadual e municipal)
e cumpra com as obrigações acessórias (emissão de nota fiscal, entrega de
declarações e demonstrativos) e, se for o caso, promover o recolhimentos dos
tributos devidos.

Uma outra maneira de renda própria é a realização de eventos. Os eventos


especiais oferecem uma possibilidade de arrecadar recursos de diversas fontes:
indivíduos, pequenas e grandes empresas. Porém, um evento exige um bom
planejamento, para que tudo esteja preparado até a data do evento.

Além da possibilidade de captar recursos, os eventos podem servir como


um passo importante para trazer mais doadores e ampliar a base social da
organização. Na figura a seguir, você encontra um exemplo de evento: o “Jantar
Dourado”, promovido anualmente pelo Hospital Santo Antônio de Blumenau – SC,
em prol de sua ala oncológica pediátrica.

FIGURA 11 – EVENTO – JANTAR DOURADO

FONTE: <http://jantardourado.com.br/home/>. Acesso em: 22 set. 2020.

148
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

Rodrigues (2002) lembra de aspectos éticos que devem ser levados em


consideração quando se realiza um evento e o principal está relacionado à
transparência: o dinheiro arrecadado deve ser gasto apenas nos propósitos para
o qual o evento foi criado. Um evento especial pode aumentar o reconhecimento
da organização e facilitar o levantamento de outros recursos no futuro.

A autora também sugere que, ao final do evento, realize-se uma avaliação


do evento, com pelo menos as seguintes ponderações: se o retorno financeiro
foi superior ao investido para organizar e o tempo dos voluntários envolvidos;
se o retorno não foi suficiente; se houve melhora na imagem da organização,
ganho em publicidade, novos voluntários, novos doadores; se há engajamento
dos membros da organização; se alcança o público certo; se o evento realmente
é especial, no sentido de se pensar em uma nova edição.

Outra possibilidade de renda são os fundos patrimoniais. Esses podem ser


constituídos por bens de qualquer natureza, incluindo dinheiro, propriedades,
obras de arte etc. Esses fundos devem ser bem administrados de modo que
tragam maior segurança financeira às entidades. Freller (2017) destaca que
dentre as possibilidades de fundos estão a doação de legados, ou seja, uma
pessoa destina um patrimônio para determinada organização utilizar após a sua
morte.

Por fim, citam-se ainda como alternativas de geração própria, as campanhas


do tipo porta a porta (que demandam uma estrutura considerável, mas trazem
bons resultados), a participação com estandes em exposições ou eventos de
terceiros e as tradicionais rifas, sorteios e loterias. O uso dessa última (loterias)
tem se ampliado entre as organizações do terceiro setor, especialmente depois
do marco regulatório, que ampliou a abrangência de organizações que podem se
utilizar desse mecanismo.

Recomenda-se que, para todas as formas de geração de renda própria


aqui apresentadas e outras que a organização venha a desenvolver, faça-se um
estudo de viablidade antes de iniciar um projeto de geração de renda. Nesse
estudo, deve-se analisar os riscos envolvidos, especialmente na esfera tributária,
lembrando que nem todas as receitas são isentas ou imunes. De resto, usar a
critatividade e ser inovador sem moderação vai contribuir para a autonomia
financeira da organização.

149
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

A atividade complementar continua utilizando como referência


as quatro organizações que você selecionou. Agora, a sua tarefa é
listar todas as fontes de recursos da organização. Procure detalhar
ao máximo como a organização faz para arrecadar fundos e, se
houver oportunidade, apresente novas formas a ela. Você pode
contribuir para a sustentabilidade dela. Utilize o modelo.

Organização Fonte de recurso Descrição

Na próxima seção, vamos abordar o monitoramento e avaliação de projetos


desenvolvidos pelas organizações do terceiro setor.

4 MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO
O monitoramento e avaliação consistem no exame sistemático e objetivo de
um projeto ou programa. Ele pode estar finalizado ou ainda em curso. A avaliação
contempla o desempenho, implementação e resultados, com vistas a determinar
a eficiência, eficácia, impacto, sustentabilidade e relevância dos objetivos. Caso
necessário, pode-se corrigir rumos ou mesmo suspender um programa ou projeto.

Apesar de ainda não estar incorporado ao cotidiano das organizações, em


parte pela complexidade de metodologias, em parte pelo desinteresse, é, nas
palavras de Cotta (1998, p.103) “um poderoso instrumento gerencial, capaz de
subsidiar o processo decisório e de lançar luz sobre a lógica das intervenções na
realidade social”.

Vamos tratar de alguns aspectos relacionados ao monitoramento e avaliação,


de modo que a organização possa canalizar esse instrumento a seu favor.

150
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

4.1 CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO


Qual é o pensamento que nos sobrevém quando ouvimos o termo
“avaliação”? Talvez um ato de julgar ou ainda um processo de comparação entre
uma coisa e outra ou com um padrão estabelecido. Por exemplo, posso avaliar
o desempenho do meu carro com o desempenho de outro. Ou ainda, avaliar um
estudante ao final de uma disciplina.

FIGURA 12 – TABELAS DE AVALIAÇÃO

FONTE: <https://agoraentert.com.br/insights/5-motivos-para-acabar-com-as-
avaliacoes-de-desempenho-tradicionais/>. Acesso em: 22 set. 2020.

Quando iniciamos este capítulo, tratamos o projeto como um meio utilizado


para resolver algum problema identificado. Portanto, monitorar e avaliar esse
projeto deve ser algo constante, com vistas a checar se as metas e os objetivos
estão sendo cumpridos, ou seja, se o que foi prometido está sendo entregue.
Caso se verifique a falta, torna-se necessário corrigir os rumos.

As avaliações podem ocorrer de forma interna ou externa. As internas são


realizadas pelo próprio pessoal da organização e participação dos beneficiários
e são importantes para desenvolver, no pessoal que está trabalhando no projeto,
um sentimento de apropriação, além de aspectos como efetividade, eficiência
e andamento do projeto. Já as externas, embora menos utilizadas por serem
onerosas, oferecem uma análise independente sobre o desempenho do projeto.

Talvez pareça repetitivo, mas não o é: é necessário planejar como se vai


realizar a avaliação e o monitoramento de um projeto. Responder às perguntas
sobre por que avaliar, quando e quem vai avaliar ajuda a delimitar o escopo dessa
atividade. Ter esses elementos claros resultará na correta análise dos resultados.

151
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

FIGURA 13 – AVALIAÇÃO DE RESULTADOS

FONTE: Unesco (2009, p. 19)

Na avaliação de projetos, é imprescindível obter um feedback dos resultados


alcançados. É claro que para que isso ocorra, a organização necessita criar os
devidos instrumentos, ou seja, os critérios de avaliação e as formas de coleta das
informações.

Os critérios para o monitoramento e avaliação de projeto devem produzir


informações e dados confiáveis para subsidiar decisões quanto ao andamento
do projeto. Na Seção 2.2 aprendemos sobre a elaboração de um bom projeto, em
que foram estabelecidos os objetivos, ações, atividades e recursos necessários.
E a partir deles, é que se realizam as perguntas necessárias para estabelecer os
critérios de avaliação.

No quadro a seguir, apresentamos um modelo de matriz de avaliação, com


perguntas que ajudam na elaboração de critérios, a partir dos objetivos, ações
e atividades estabelecidos. As respostas podem auxiliar na elaboração dos
indicadores, que veremos na próxima seção.

QUADRO 16 – ESCOLHENDO OS CRITÉRIOS


Objetivo/ação/atividade Pergunta Resposta
1. Qual o propósito principal do ob-
jetivo/ ação/atividade?
2. Como sei se a atividade está
sendo bem-sucedida?
3. Qual a relevância?

FONTE: O autor

Um detalhe importante nessa fase: se a organização apresenta dificuldades


em determinar os critérios que vai utilizar para avaliar um projeto, é muito provável

152
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

que os objetivos não estejam claros o suficiente. A ausência de perguntas


avaliativas faz com que o processo de avaliação não tenha um foco definido e
comprometa o desempenho do trabalho.

As respostas às perguntas vão gerar informações necessárias para


embasar o julgamento do valor das ações e atividades do projeto. Desenvolvem-
se as medidas para a aferição dos resultados obtidos. Essas medidas são os
indicadores que vamos analisar na próxima seção.

1 Por que é importante desenvolver critérios de avaliação de


projetos?

4.2 INDICADORES
Os indicadores são formas específicas de se operacionalizar os critérios de
avaliação estabelecidos, já que os critérios são compostos por dados qualitativos.
Eles ajudam a avaliar o andamento do projeto com indicadores do processo
e auxiliam a organização a verificar se os resultados esperados foram ou não
alcançados, com os indicadores de resultado.

Com os indicadores, define-se os dados que serão coletados. Armani (2006)


indica que esses devem estar diretamente relacionados com os principais objetivos
do projeto. Medem resultados qualitativos e quantitativos, portanto, podem ser
vistos (observação), ouvidos (resposta de um participante), lidos (registros de
uma agência), sentidos (clima da reunião) ou mesmo percebidos pelo tato ou pelo
olfato. São as evidências que respondem às perguntas.

Como se fosse uma régua, alguns indicadores são bastante óbvios e


fáceis de medir, outros nem tanto. Mas o que se deve ter em mente é que eles
sejam objetivamente verificáveis. Para isso, por vezes, é necessário transformar
conceitos em indicadores e para isso é necessário saber as variáveis envolvidas e
como medir as suas variações. No quadro a seguir, apresentamos um exemplo de
construção de indicadores a partir de um conceito.

153
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

QUADRO 17 – CONSTRUÇÃO DE INDICADORES


Conceito Variáveis Indicadores
Representação em conselhos - Grau de participação em conselhos
municipais (alto, médio, baixo).

- Qualidade da participação.
Nível de associativismo - Número e tipo de organizações pre-
sentes na comunidade.

- Grau de autonomia das organizações


Cidadania (alto, médio, baixo).

- Número de participantes regulares nos


principais eventos e reuniões.

- Índice de sindicalização dos tra-


balhadores empregados.
Envolvimento com a gestão de - Percentual de pais/mães votantes nas
serviços sociais básicos eleições para diretor da escola.

- Percentual de pais/mães participantes


nas reuniões de pais e mestres.

- Grau de envolvimento (alto, médio,


baixo) na gestão do posto local de saúde.
FONTE: Adaptado de Armani (2006)

Percebe-se que os indicadores podem ser qualitativos ou quantitativos. De


certa forma, a ênfase recai sobre os aspectos quantitativos, pois são mais fáceis
de se verificar e têm visibilidade que lhes dá um sentido exato.

A qualidade dos indicadores é fundamental para a adequada análise e


gerenciamento do projeto. Armani (2006) sugere alguns passos para o processo
de elaboração dos indicadores, que apresentamos no quadro a seguir.

QUADRO 18 – PASSOS NO PROCESSO DE ELABORAÇÃO DOS INDICADORES


Para quê? Definir a variável específica a ser avaliada.
O que? Indicar concretamente o que se vai avaliar.
Quanto? Quantificar a variação esperada.
Quem? Definir o grupo social de referência.
Quando? Indicar a partir de quando e por quanto tempo.
Onde? Indicar a localização geográfica de referência.
Como? Indicar os meios de verificação.
FONTE: Adaptado de Armani (2006)

E como saber se o indicador criado é apropriado para minha análise? Neste


caso, deve-se responder às perguntas: É viável? Cuja resposta analisa o que
o indicador demandará de tempo de recursos para ser verificado. É válido? A
resposta vai considerar se o indicador em questão é capaz de demonstrar que o

154
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

aspecto medido e avaliado é fruto do projeto. Cada indicador deve ter associado
seu meio de verificação. Assim, é necessário que os objetivos, resultados e
atividades estejam interligados nessa análise. Pode-se ainda classificar os
indicadores em quatro categorias, que apresentamos no quadro a seguir.

QUADRO 19 – CLASSIFICAÇÃO DOS INDICADORES


Indicador Descrição Exemplos
Operacionais Indicam-nos se os recursos - Pelo menos 80% das atividades foram
previstos (financeiros, mate- realizadas conforme cronograma e
riais e humanos) foram dis- orçamento.
ponibilizados na quantidade,
forma e tempo adequado à re- - Pelo menos 70% das atividades
alização das atividades. desenvolvidas foram avaliadas com
qualidade “alta”.
Desempenho Dão evidências de que as situ- - Garantir que pelo menos 50% das cri-
ações, serviços e produtos anças atendidas retornem à escola.
planejados como resultados
foram alcançados. - Aproveitamento satisfatório nos cursos
de pelo menos 70% dos participantes.
Efetividade Indicam os efeitos que o uso - Redução de pelo menos 40% no
dos resultados pelos benefi- número de crianças que vivem nas ruas
ciários gerou. Indicam mu- após 24 meses do projeto.
danças na qualidade de vida,
comportamento e em atitudes. - Pelo menos 80% das crianças que
deixaram a rua continuam fora dela
após 12 meses do projeto.
Impacto São aqueles que indicam os - Aumento da renda mensal média dos
benefícios mais amplos e de jovens envolvidos após 24 meses.
longo prazo gerados pela re-
alização dos objetivos do pro- - Manutenção de pelo menos 70% das
jeto. crianças na escola.

FONTE: Adaptado de Armani (2006)

Os indicadores são importantes para demonstrar como está o andamento


do projeto. Pode-se realizar as avaliações a qualquer momento e não apenas no
final da execução. Como já mencionamos, o monitoramento e avaliação podem
mostrar que é necessário a organização corrigir o rumo de um projeto.

Apresentamos aqui uma modelagem de indicadores, porém existem outros


métodos para estabelecer tanto critérios quanto indicadores. Sugerimos que você
acesse um dos sítios indicados na Seção 3.2 (fontes de recurso incentivos fiscais),
pois, em geral, encontram-se manuais de elaboração de projetos, e indicação dos
indicadores desejados. Utilize o quadro a seguir para registrar os indicadores
encontrados.

155
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Lei de Incentivo Indicadores

4.3 RELATÓRIOS
Terminada a execução do projeto e coletadas as informações do monitoramento
e avaliação, procede-se a elaboração dos relatórios. A tabulação dos dados deve ser
clara, de modo que as evidências das diversas fontes de coleta possam ser reunidas
e comparadas. A Unesco (2009, p. 66) aponta algumas questões que podem ajudar
nessa tarefa:

• As informações mostram que os objetivos foram atingidos?


(Seja o mais específico possível ao descrever como os resultados
foram alcançados).
• Quais são os resultados do projeto? (Considere tanto os
resultados esperados como os inesperados e da mesma forma
os desejados e os indesejados).
• Os dados destacam algum sucesso?
• Existem áreas problemáticas que requeiram atenção particular?
• Houve algum obstáculo à realização dos objetivos
preestabelecidos?

Os relatórios consistem na análise de tudo o que foi realizado no decorrer do


projeto, trazendo de forma detalhada cada ação e atividade realizada e como isso
impactou no resultado. Segundo orientações do PMI (2008), as comunicações
do projeto devem observar no mínimo os seguintes itens: identificação das partes
relacionadas, planejamento da comunicação, distribuição da comunicação,
gerenciamento das expectativas das partes interessadas e reportando o desempenho.

FIGURA 14 – COMUNICAR É UMA HABILIDADE

FONTE: <https://bsbr.com.br/gerenciamento-das-
comunicacoes-projeto/>. Acesso em: 22 set. 2020.
156
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos


Na etapa de identificar as partes interessadas, a organização identifica
quem são os públicos que podem ser ou foram afetados pelo projeto e os que
têm interesse nos resultados. As partes podem ser indivíduos, patrocinadores,
clientes ou governo. Esse levantamento ajuda a determinar o nível de informação
que será divulgado e deve-se documentar as informações relevantes a cada um
deles, desde o início do projeto.

Identificados os diferentes públicos, o planejamento da comunicação


consiste em determinar as necessidades de informação de cada parte. Nessa
etapa, a organização pode elaborar um mapa identificando quem precisa de quais
informações, quando elas serão necessárias, como serão fornecidas e por qual
canal.

No processo de distribuição das informações, colocam-se as informações


necessárias à disposição das partes interessadas no projeto. Cabe ressaltar que
a organização do terceiro setor deve manter à disposição do público um relatório
completo de todas as suas atividades, já realizadas ou em execução.

O gerenciamento das expectativas das partes interessadas nada mais


é do que se colocar à disposição, para atender a demandas e necessidades
específicas, promovendo uma interação e integração entre a organização e os
diversos públicos.

Por fim, a etapa de reportar o desempenho consiste no documento final


disponibilizado aos interessados. Alguns financiadores podem dispor de modelos
ou orientações específicas quanto aos relatórios finais. Cabe à organização,
quando inicia o planejamento de um projeto, certificar-se a respeito das exigências.

Para exemplificar, apresentamos no quadro a seguir o roteiro para


elaborar o relatório de cumprimento do objeto disponibilizado pelo ministério da
Cidadania, com relação aos projetos aprovados pela Lei de Incentivo ao Esporte.

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Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

QUADRO 20 – ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DE


RELATÓRIO DE CUMPRIMENTO DO OBJETO

ROTEIRO PARA ELABORAR O RELATÓRIO DE CUMPRIMENTO DO OBJETO

Itens sugeridos (incluir outros que julgue relevantes):

1. CONSECUÇÃO DO OBJETO

Relatar, considerando o contido nos itens Objetivos e Metas Qualitativas


e Quantitativas da Descrição do Projeto, os resultados quantitativos e as metas al-
cançadas, comparando os resultados obtidos com os esperados (eventos realizados,
público). Descrever indicadores utilizados (situação antes e após o projeto); comentar
as variações. Enfatizar dados quantificáveis.

Descrever o impacto do projeto na comunidade e no desenvolvimento do es-


porte. Comentar sobre o público beneficiado direta e indiretamente pela implantação
do projeto.

Informar os eventos realizados (relacionar nome do evento, local e data) e


as atividades desenvolvidas, cotejando o que foi executado com o que foi aprovado
no Plano de Trabalho (Estratégias de ação) e, caso tenham sido executadas de forma
diferenciada, ou não executadas, justificar, conforme Lei 11.438/06:

“Art.10 Constituem infração aos dispositivos desta Lei:


...
IV – Adiar, antecipar ou cancelar, sem justa causa,
atividade desportiva beneficiada pelos incentivos nela
previstos. ”

Informar ações adotadas com vistas a atender o art. 16 do Dec. 6.180/07.

“Art. 16. Nos projetos desportivos e paradesportivos,


desenvolvidos com recursos oriundos dos incentivos
previstos no art. 1º, deverão constar ações com vistas
a proporcionar condições de acessibilidade a pessoas
idosas e portadoras de deficiência.
Parágrafo único. Sem prejuízo do disposto no caput, o
Ministério do Esporte poderá estabelecer outras formas
para a democratização do acesso a produtos e serviços
resultantes dos projetos desportivos e paradesportivos
aprovados. ”

158
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

2. COMPROVANTE DE EXECUÇÃO

Comentar fotos, reportagens, publicações e outras formas de divulgação e reg-


istro da execução do projeto.

3. EXECUÇÃO FINANCEIRA

Considerando as ações estabelecidas nos itens Estratégias de ação, Crono-


grama de execução física e financeira e Orçamento Analítico, comentar as dif-
erenças mais significativas entre os valores orçados e os realizados, justificando-as
se for o caso. Justificar a escolha das ações para uso dos rendimentos das apli-
cações. Informar saldo de recursos não utilizados.

4. PONTOS POSITIVOS E NEGATIVOS

Comentar dificuldades encontradas em cada etapa do projeto (elaboração do


projeto, aprovação, captação de recursos, execução, prestação de contas parcial),
problemas ocorridos e sugestões de melhorias.

5. CONCLUSÃO

Comentários finais.

FONTE: Adaptado de https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/


lei-de-incentivo-ao-esporte/modelos-e-manuais. Acesso em: 8 out. 2020.

Como última atividade complementar, você pode checar junto às quatro


organizações, como é o processo de monitoramento e avaliação dos projetos.
Caso tenha oportunidade, contribua com ideias e sugestões.

Lembre-se de que o material aqui disponibilizado não é definitivo, ou seja,


busque sempre conteúdos novos e atualizados.

159
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

Sugerimos os seguintes materiais para seu aperfeiçoamento


no tema “monitoramento e avaliação de projetos”. No site: <https://
ipea.gov.br/ppp/index.php/PPP/article/viewFile/228/212>, o professor
Paulo de Martino Jannuzzi apresenta um ensaio sobre a avaliação
de programas sociais no Brasil, provocando os leitores a repensarem
práticas e metologias. E no vídeo disponível em: <https://youtube.
com/watch?v=2SizOzLHg88>, promovido pela Fundação Itaú Social,
o professor Luiz Guilherme Scorzafave apresenta as etapas para
avaliação de projetos e políticas sociais.

5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Prezado acadêmico, finalizamos o capítulo e a disciplina, monitorando
e avaliando projetos. Mais uma vez um capítulo denso, com muito conteúdo e
informações importantes referentes à sustentabilidade das organizações do
terceiro setor. Vamos relembrar o que aprendemos neste capítulo.

Iniciamos estudando a diferença de programas e projetos e seguimos


percorrendo os caminhos para elaborar um bom projeto, desde a identificação
do problema a ser resolvido e a sua viabilidade, passando pelos aspectos
de apresentação e escrita, com a descrição detalhada dos objetivos, ações
e atividades a serem desenvolvidas. Na sequência aprendemos a montar o
cronograma das atividades, fechando com o orçamento do projeto.

Seguimos estudando a captação e mobilização de recursos financeiros,


físicos e humanos. Identificamos quais são as principais fontes e dedicamos um
espaço para versar sobre as principais nas esferas pública e privada.

Salientamos que as fontes privadas têm se mostrado as que mais contribuem


para o sustento das organizações e reforçamos a necessidade de a organização
olhar para o desenvolvimento de fontes de geração de renda própria, atendendo,
no que for pertinente, às obrigações fiscais e tributárias.

Dedicamos um espaço para tratar das leis de incentivo, que são uma fonte
interessante para financiar projetos específicos, com todas as possibilidades
no âmbito federal. Evidenciamos que nas esferas municipal e estadual também

160
Capítulo 3 Projetos e Mobilização de Recursos

existem leis de incentivo, mas o nosso espaço seria muito pequeno para abranger
a todas.

Por fim, analisamos os aspectos de monitoramento e avaliação dos projetos


e como isso impacta positivamente na reputação da organização. Transparência
nas atividades e prestação de contas ajudam no fortalecimento e consolidação de
qualquer organização.

Desejamos sucesso a você que seguiu conosco até aqui.


Esperamos encontrá-lo(a) em breve.

Bons estudos!!!

REFERÊNCIAS
ABONG. Manual de administração jurídica, contábil e financeira para
organizações não-governamentais. São Paulo: Peirópolis, 2003.

ABONG. Manual de fundos públicos 2003: controle social e acesso aos


recursos públicos – ed. rev. e ampl. São Paulo: Peirópolis, 2003.

ARMANI, D. Como elaborar projetos? Guia prático para elaboração e gestão


de projetos sociais. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2006.

BORGES, C. N. F. Roteiro para elaboração de projetos. Belo Horizonte:


Editora UFMG, 2018. 93p.

COTTA, T. C. Metodologias de avaliação de programas e projetos sociais: análise


de resultado e de impacto. Revista do Serviço Público. Ano 49, n. 2, abr-jun
1998.

CRUZ, C. M.; ESTRAVIZ, M. Captação de diferentes recursos para


organizações sem fins lucrativos. 2. ed. São Paulo: Global, 2003.

FRELLER, M. Guia sobre incentivos fiscais para captadores de recursos de


OSCs. 1. ed. São Paulo: Instituto Filantropia, 2017.

GODOY, M. 103 Dicas: o que toda empresa precisa saber para utilizar incentivos
fiscais. São Paulo: DCL, 2009.

161
Terceiro Setor, Voluntariado e Desenvolvimento de Projetos

GRANEMANN, S. H. Desenvolvimento de capacidades: elaboração de


Projetos/ Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD/Brasil e
Confederação Nacional de Municípios – CNM. Brasília: CNM/PNUD, 2013.

HEYMAN, D. R. Guia prático de captação de recursos: conheças as principais


fontes, estratégias e ferramentas para captar recursos em organizações da
sociedade civil. 1. ed. São Paulo: Instituto Filantropia, 2017.

KISIL, R. Elaboração de projetos e propostas para organizações da


sociedade civil. 3. ed. São Paulo: Global, 2004.

LAFER, I. M. Dicas para captação de recursos para projetos. Cartilha IDIS.


2014. Disponível em: https://www.idis.org.br/dicas-para-captacao-de-recursos-
para-projetos/. Acesso em: 22 set. 2020.

OAB/SP. Cartilha do terceiro setor. São Paulo: Nova Bandeira, 2005.

PMI – PROJECT MANAGEMENT INSTITUTO, INC. Um guia do conhecimento


em gerenciamento de projetos. 4. ed. Pensilvânia: Guia PMBOK, 2008.

RESENDE, T. A. Roteiro do terceiro setor. Associações e fundações: o que


são, como instituir, administrar e prestar contas. 3. ed. rev. atual. e ampli. Belo
Horizonte: Prax, 2006.

RODRIGUES, A. M. (org.) Captação de recursos: da teoria à prática. São


Paulo: Graphbox, 2002. Disponível em: http://docplayer.com.br. Acesso em: 22
set. 2020.

SÃO PAULO (ESTADO). Secretaria do Meio Ambiente. Coordenadoria de


Planejamento Ambiental Estratégico e Educação Ambiental. Manual para
Elaboração, Administração e Avaliação de Projetos Socioambientais /
Secretaria de Estado do Meio Ambiente, Coordenadoria de Planejamento
Ambiental Estratégico e Educação Ambiental. São Paulo: SMA / CPLEA,
2005.

TENÓRIO, F. G. et al. (Coord.). Avaliação de projetos comunitários: uma


abordagem prática. 4. ed. São Paulo: Loyola, 2002.

TENÓRIO, F. G. et al. (Coord.). Elaboração de projetos comunitários: uma


abordagem prática. São Paulo: Loyola, 1995.

UNESCO. Guia para monitoramento e avaliação de projetos baseados em


comunidades. Paris: Unesco, 2009.

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