Gestão de Serviços de Saúde: Karen Cardoso

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GESTÃO DE

SERVIÇOS
DE SAÚDE

Karen Cardoso
Gestão de equipes nos
serviços de saúde
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer a importância do trabalho em equipe no contexto atual


das organizações de saúde.
 Definir as principais características de uma equipe eficaz.
 Identificar o papel do gestor no trabalho em equipe.

Introdução
A eficácia de uma equipe depende essencialmente de sua composição,
de suas características e competências para alcançar as metas de trabalho
propostas. Assim, o papel do gestor é, sem dúvida, fundamental para
auxiliar a equipe a desenvolver todo o seu potencial e alcançar as metas
propostas pelo estabelecimento de saúde. Portanto, conhecer e com-
preender o significado da equipe no contexto hospitalar é fundamental
para depreender a importância do papel do gestor.
Neste capítulo, então, você vai conhecer o que caracteriza uma
equipe, seu conceito e composição, bem como as implicações da equipe
no contexto de trabalho em saúde. Nesse sentido, o contexto hospitalar
altamente especializado e complexo traz consigo a necessidade evidente
de diferentes tipos de competências, de modo a atender as inúmeras
necessidades desse serviço. Por isso, você também vai conhecer a figura
e o papel do gestor nesse contexto.
2 Gestão de equipes nos serviços de saúde

1 Trabalho em equipe nas organizações


de saúde
O trabalho em equipe nas organizações de saúde vem adquirindo importância
crescente devido à ampliação do entendimento de conceitos de trabalho em
saúde, integralidade, trabalho colaborativo e equipe multidisciplinar.
A integralidade é um dos princípios e diretrizes do Sistema Único de
Saúde (SUS) brasileiro e representa as ações que devem ser articuladas entre
si e os serviços de atendimento ao usuário do SUS, tendo como foco todas as
etapas para obter e manter a saúde, isto é, ações com o objetivo de promover,
prevenir, fazer o diagnóstico precoce, disponibilizar tratamento e reabilitação
conforme a necessidade do usuário e contemplando todos os níveis de com-
plexidade das unidades do sistema (BRASIL,1990).
Nesse sentido, com o passar do tempo e a evolução do significado do cuidado
em saúde do indivíduo, sua família e da população em geral, a Organização
Mundial da Saúde (OMS) sinalizou a necessidade de atender as pessoas em
suas diversas necessidades, indicando a equipe multidisciplinar como aquela
que teria melhores condições de suprir essas demandas. De acordo com Pe-
duzzi (2018), a esse cenário colaborativo e de integração entre os diferentes
profissionais de saúde em uma equipe, adiciona-se a necessidade de integra-
ção entre equipes e serviços com o objetivo de alcançar maior dimensão da
integralidade no atendimento ao usuário do sistema de saúde.
Embora a tendência de fragmentação da assistência e especialização seja
uma realidade devido à velocidade da tecnologia e à necessidade de cada área
profissional aprofundar seu conhecimento, a integralização da assistência em
saúde aponta a incapacidade de que apenas um profissional dê conta do conjunto
de demandas que os pacientes do sistema de saúde apresentam (PEDUZZI, 2018).
Dessa forma, o próprio processo de trabalho em saúde precisou ser revisitado,
repensado, e o trabalho em equipe, principalmente da equipe multidisciplinar,
ganhou força nas instituições como forma de atender a demanda crescente da
visão de integralidade da assistência e do atendimento com foco no paciente.
Mas o que é uma equipe? Para Peduzzi (2016, documento on-line), a equipe
é uma “[...] estratégia para a integração das especialidades e das múltiplas
profissões, imprescindível para o desenvolvimento da assistência e do cuidado
integral do paciente”. Assim, a equipe não é apenas um grupo de pessoas que
trabalha no mesmo horário e departamento, mas um grupo que compartilha
metas e objetivos e busca e compartilha soluções em comum, estabelecendo
uma relação, que, no contexto hospitalar, tem como foco o usuário.
Gestão de equipes nos serviços de saúde 3

Sendo uma estratégia que tem como base de ação a colaboração, cabe
conhecer o que significa esse conceito no contexto do trabalho em equipe.
Segundo Fonseca (2018, documento on-line):

Colaboração é quando dois ou mais profissionais de saúde atuam de forma


interativa, compartilhando objetivos, reconhecendo o papel e importância do
outro na complementaridade dos atos em saúde. Essa compreensão expõe a
necessidade de horizontalizar relações, questionando a histórica hierarquia
entre os profissionais e entre estes e os usuários.

Para Mosser e Begun (2015), a equipe tem grande importância para as


empresas, há diferenças entre as equipes em instituições de saúde de outros
tipos de estabelecimentos. Muitas vezes, o grupo de empregados de uma
empresa é entendido como parte de uma “equipe” — se consideramos que
todos trabalham para uma mesma empresa e são colegas, é possível concordar
com essa visão. No entanto, membros de uma equipe não dividem apenas um
espaço de trabalho, mas têm objetivos em comum, assumem a responsabilidade
como grupo, inclusive nos insucessos de seus esforços, ao cuidar de usuários
de saúde, por exemplo. No entanto, no contexto da assistência em saúde,
considera-se como equipe o grupo limitado de pessoas que varia em número
entre 10 e 25 pessoas e que interage diretamente com o paciente e sua família.
A composição pode variar conforme o perfil do serviço e do usuário, mas a
questão central de uma equipe em um contexto de saúde é estar trabalhando
e direcionando esforços para dar assistência ao paciente e sua família.

O modelo de assistência e o modelo de equipe


No modelo de assistência convencional, o atendimento do usuário ocorria
apenas com o profissional médico, ficando opcional que outros profissionais
especialistas estivessem envolvidos no processo. O que ocorre quando o
trabalho é em equipe é que o foco se encontra no processo colaborativo e,
assim, outros profissionais estão obrigatoriamente envolvidos na assistência
ao paciente e sua família, conforme a necessidade de cada caso. Nesse modelo
colaborativo, além do médico, há os profissionais especialistas em determinada
área e o gestor da equipe, que lidera o processo (MOSSER; BEGUN, 2015).
Um bom exemplo para compreender os diferentes modelos é o atendimento
a um paciente hipertenso. No modelo convencional, o paciente é tratado apenas
pelo médico, que faz todo o direcionamento do tratamento e acompanhamento
do caso. No modelo colaborativo, utilizando a equipe como ferramenta da
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assistência integral, o médico atua na sua especialidade, fazendo o diagnós-


tico e a prescrição de medicamentos e exames necessários; o enfermeiro e
o técnico de enfermagem fazem o acompanhamento do autocuidado e da
mudança de hábitos de saúde, bem como monitoram a pressão do paciente e
a adesão medicamentosa; o nutricionista verifica os hábitos alimentares e a
dieta; o psicólogo verifica alterações no comportamento para enfrentamento
da doença; o educador físico observa a condição física do paciente e orienta
as atividades físicas adequadas; e o assistente social analisa as condições
sociais da família e a inter-relação com o quadro de hipertensão.
Dessa forma, o trabalho em equipe no contexto dos estabelecimentos de
saúde é fundamental para propiciar um atendimento ao usuário seguindo o
princípio da integralidade e compreendendo que a soma e a união das espe-
cialidades e competências individuais a serviço da equipe podem multiplicar
os recursos humanos em uma instituição de saúde.

A equipe e seus benefícios e riscos


Dentre os principais benefícios do trabalho em equipe, está a soma da expe-
riência e do conhecimento dos seus componentes a serviço de objetivos em
comum, levando em consideração que a união desse conjunto tem a possi-
bilidade de atender as necessidades do usuário de forma mais plena. Dentre
outros benefícios, estão a agilidade no desempenho de tarefas com economia
de tempo e recursos, a capacidade de crescimento e desenvolvimento de seus
componentes, com produção e retenção de conhecimento e rotinas eficientes
testadas pelo grupo, capacidade de inovação perante novos desafios e com-
partilhamento de experiências (MOSSER; BEGUN, 2015).
O aprendizado não se restringe apenas à equipe em si, mas circula entre
o gestor e a instituição de saúde, enriquecendo o ambiente organizacional
como um todo. No entanto, os riscos também estão presentes no trabalho em
equipe, como, por exemplo, a “ociosidade social”, isto é, a observação passiva
de outros membros da equipe enquanto um dos membros, que muitas vezes é
mais apto, está desenvolvendo um trabalho ou atividade. A ociosidade social
pode ocorrer principalmente em equipes maiores, em que o comprometimento
e a união não são desenvolvidos com frequência, e a tarefa acaba por recair
sobre o membro mais ágil e competente (MOSSER; BEGUN, 2015). Nesse
sentido, perde-se também a oportunidade preciosa de aprendizado entre os
componentes da equipe e a transmissão do conhecimento.
Gestão de equipes nos serviços de saúde 5

Outro risco que pode ocorrer em uma equipe é o conflito de personalidades


ou a personalidade dominante, que acaba por intimidar os outros componentes
da equipe de forma que não se sentem à vontade de expressar dúvidas, opiniões
ou sugestões que poderiam melhorar a performance da equipe e evitar erros e
acidentes. Um exemplo é o médico com personalidade forte que comete um erro na
prescrição de um medicamento ou procedimento, de forma que o enfermeiro se sente
intimidado para questionar sua conduta — o excesso de hierarquia em uma equipe
pode comprometer o processo de tomada de decisão (MOSSER; BEGUN, 2015).
Da mesma forma, a inovação e a criatividade podem ser menores por receio
do profissional de expor as ideias ao grupo e não obter aprovação. Além disso,
caso não haja respeito e igualdade nas relações, a ideia ou solução, mesmo
que seja apropriada, pode ser bloqueada pelo grupo.

Segundo Braga (2011), os seguintes fatores podem comprometer o trabalho em equipe:


 baixa motivação dos servidores;
 equipamentos de informática obsoletos;
 espaços físicos inadequados para o desenvolvimento das atividades;
 número insuficiente de servidores nas unidades;
 procedimentos operacionais burocráticos e sem padronização;
 plano de cargos, carreiras e salários vigente inadequado;
 clima organizacional desfavorável à inovação e criatividade;
 pouco investimento em programas de qualidade de vida para servidores;
 baixa valorização dos servidores, com consequente falta de reconhecimento da
sua capacitação;
 atitude e comportamento das chefias desfavorável ao clima organizacional;
 ausência de plano de saúde.

As equipes e os diferentes níveis de colaboração


A percepção do nível de colaboração das ações da equipe define o sucesso
em determinar o foco no paciente e em suas necessidades, e não nos pro-
cedimentos técnicos em si, evitando a interposição de ações profissionais e
proporcionando a articulação:
6 Gestão de equipes nos serviços de saúde

A necessidade de articular as ações dos diferentes profissionais, estabelecendo


uma colaboração entre eles, requer a busca do entendimento, o reconheci-
mento de suas diferenças e dos benefícios da articulação para a atenção às
necessidades de saúde, o que, por sua vez, favorece o deslocamento da ação
profissional do foco nos procedimentos para o foco no paciente/usuário e,
portanto, para a interação profissional-usuário e entre os profissionais (PE-
DUZZI, 2016, documento on-line).

Para que o foco siga no paciente e na colaboração entre os diferentes


profissionais, é necessário compreender que há diversos tipos de equipe,
não sendo possível definir um conceito genérico e superficial. Diferente
da equipe multiprofissional, em que há diversos profissionais atuando, sem
obrigatoriamente integração ou inter-relação, a equipe interprofissional se
caracteriza por inter-relação entre os profissionais e pela colaboração como
processo. Dessa forma, Peduzzi (2016) distingue diferentes tipos de equipe,
observando que a mera justaposição ou o agrupamento de diferentes profis-
sionais atendendo a um mesmo paciente não configura uma equipe efetiva
com resultados positivos aos pacientes. Esse tipo inicial de processo é definido
com pseudoequipes, equipes fragmentadas, equipes de agrupamento, todas
com um grande potencial para a colaboração, mas sem ações de colaboração
ativas em sua totalidade.
Em uma fase seguinte do processo, a pseudoequipe ou equipe de semi-
-integração, é caracterizada pela transição do foco em interesses individuais e
atuação profissional semiestruturada, com a colaboração em desenvolvimento,
com foco na organização da assistência, mas ainda com foco profissional.
Finalmente, a equipe integrada se caracteriza por articulação das ações
entre os diferentes profissionais, interdependência e corresponsabilização
das ações, e os objetivos em comum têm foco no paciente. Essas equipes
podem ser consideradas equipes interprofissionais integradas com foco
no usuário/paciente.
Nesse sentido, de acordo com Peduzzi (2016, documento on-line), as equipes
interprofissionais integradas “[...] são aquelas capazes de assegurar efetiva
comunicação, articulação das ações e colaboração entre os profissionais das
diversas equipes do serviço e entre os profissionais e equipes de diferentes
serviços da rede” e que envolvem o núcleo das competências profissionais.
Esse núcleo, por sua vez, inclui o “[...] campo como conhecimentos, habilida-
des e atitudes comuns e compartilhadas pelas diferentes áreas profissionais
da saúde, e núcleo profissional como aquele que envolve as competências
específicas de cada profissão implicada no cuidado em saúde” (PEDUZZI,
2016, documento on-line).
Gestão de equipes nos serviços de saúde 7

Ao desenvolver e fortalecer as diferentes competências dos profissionais


de saúde, proporcionar um sistema administrativo ágil e desburocratizado
e um clima organizacional de confiança e respeito, o gestor e a instituição
estimulam o desenvolvimento de equipes interprofissionais integradas, focadas
na assistência ao paciente. Assim, a equipe e seus componentes se conectam
com a integralidade e seus significados entre o eixo das necessidades, que
compreende atender além das necessidades orgânicas dos indivíduos; o eixo
das finalidades, em que ocorre de forma integrada a promoção, a prevenção
e a recuperação da saúde; o eixo das articulações, que envolve ações de
interdisciplinares, intersetoriais e interprofissionais necessárias à qualidade
e melhores práticas e condições de saúde; e o eixo das interações, que inclui
aspectos subjetivos da interação entre as pessoas e que são responsáveis por
melhorar as condições na atenção à saúde (PEDUZZI, 2016).

2 Eficácia das equipes de saúde


As equipes têm características diferentes, mas uma das mais almejadas é a
eficácia. A equipe eficaz é aquela que consegue obter os melhores resultados
na assistência ao paciente e sua família, alcançando suas metas e propondo
novos desafios e patamares de excelência. A integração entre os componentes da
equipe é fundamental para que isso ocorra e, nesse sentido, a equipe eficaz tem
um conjunto de características que concorre para que essa integração ocorra:

Comunicação efetiva; reconhecer o trabalho do(s) outro(s) profissional(s),


suas especificidades; questionar a desigualdade na valoração dos distintos
trabalhos e respectivos agentes; construir objetivos comuns; promover a
tomada de decisão compartilhada, exercer autonomia profissional tomando
em consideração a interdependência das diversas áreas e construir um projeto
assistencial comum (PEDUZZI, 2014, documento on-line).

Embora a flexibilização da divisão do trabalho possa ocorrer, há necessidade


de estabelecer limites de atuação principalmente para desenvolver ações em
comum. Os limites se mostram necessários, pois é preciso preservar as ações
específicas de cada área profissional.
A comunicação efetiva, com base no respeito e na capacidade de todos
os componentes da equipe em executar sua parte no atendimento ao usuário,
é uma das características que consolidam a integração das equipes eficazes.
A comunicação e a interação entre os membros da equipe podem auxiliar na
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mediação de conflitos, na elaboração de acordos, consensos e rotinas que,


mesmo que provisoriamente instituídos, servem como ponte relacional e
apontam soluções no processo de trabalho, evitando atritos e promovendo
maior integração. Nesse sentido, as equipes podem ter um estilo de trabalho
derivado de um projeto assistencial em comum e pactuado entre os compo-
nentes (PEDUZZI, 2016).
No entanto, outras características são necessárias para que essa eficácia
seja direcionada ao alcance de objetivos e metas comuns, conforme você
confere no Quadro 1, a seguir.

Quadro 1. Características de uma equipe eficaz

Característica Definição

Meta da equipe compartilhada Os membros de uma equipe trabalham


com objetivos compartilhados,
buscando alcançá-los em esforços
comuns.

Responsabilidade compartilhada para Os créditos de sucesso são divididos


alcançar o objetivo com os membros da equipe, bem
como o seu insucesso. Bons resultados
e a responsabilidade dos erros são
compartilhados.

Quadro pessoal definido A composição do número de membros


é limitada, variando entre 10 e 25.

Autoridade de ação para alcançar o A equipe tem autonomia interna para


objetivo tomar as decisões necessárias para
alcançar suas metas.

Interdependência dos membros Os membros dependem uns dos outros


para executar diversas e diferentes
partes do trabalho.

Ausência de subgrupos independentes A equipe deve formar uma unidade sem


subdivisões.

Prestação de contas à organização A equipe necessita prestar contas


de suas atividades à organização
mantenedora.

Fonte: Adaptado de Mosser e Begun (2015).


Gestão de equipes nos serviços de saúde 9

As competências da equipe do estabelecimento


de saúde
Quais seriam as competências que equipes necessitam para desenvolver suas
atividades no estabelecimento de saúde? Essas competências abrangem o
conhecimento específico das suas áreas de atuação, mas não apenas esse. Ao
conhecimento específico é somado um conjunto de valores éticos e relacionais
que são importantes para o sucesso da equipe e para o exercício profissional.
A competência também pode ser compreendida como uma mescla entre o
conhecimento necessário imprescindível, um conhecimento especializado e
valores: “Assim, podemos entender uma competência como uma habilidade
necessária para o desempenho de uma função específica, ou como o conheci-
mento em um domínio particular, ou um valor que pode ser expresso em ação,
ou alguma combinação dos três” (MOSSER; BEGUN, 2015, p. 11).
Essas competências necessitam permear de diferentes formas o gestor e
cada componente da equipe, além do gestor do estabelecimento de saúde. Para
Mosser e Begun (2015), as competências são necessárias em quatro níveis
diferentes, conforme mostra a Figura 1.

Figura 1. As competências nos diferentes níveis da equipe.


Fonte: Adaptada de Mosser e Begun (2015).
10 Gestão de equipes nos serviços de saúde

Assim, é importante que você perceba que os gestores das equipes também
devem desenvolver competências que o ajudem a apoiar a equipe e exercer sua
liderança, o que é fundamental para que tenha sucesso como gestor.

As equipes de alto desempenho

As equipes de alto desempenho são aquelas que têm conhecimentos comple-


mentares, mantendo um profundo compromisso com as metas e os objetivos
do grupo. O nível do compromisso com o sucesso e o crescimento uns dos
outros é muito maior do que em outras equipes, o que eleva o desempenho
consideravelmente. Dessa forma, os níveis de desempenho estão extremamente
acima de outras equipes, pois o comprometimento com o sucesso de cada
membro da equipe é muito maior (ROCHA; ZERMIANI, 2017).
O fator relacional que envolve o compromisso com o sucesso do outro
tanto quanto com o seu próprio é uma das características das equipes de alto
desempenho, pois esse tipo de compromisso supre eventuais deficiências
que um dos membros da equipe tenha, mas que, ao ser apoiado pelo grupo,
consegue executar a tarefa e superar a expectativa.
De acordo com Rocha (2017), outra característica de equipes de alto de-
sempenho é o estabelecimento de objetivos elevados, que sejam desafiadores o
suficiente para estimular as pessoas e a equipe a se superarem. Esses objetivos
alcançáveis devem ser formulados dentro da equipe, em que as estratégias e
ações são pactuadas e planejadas em conjunto, dividindo em decisões e ações
para alcançar objetivos imediatos, em médio prazo e em prazos maiores — de
modo que a motivação da equipe é mantida elevada.
O atendimento de outras necessidades, como aceitação, afeto e controle,
também está presente nas equipes de alta performance. Nesse sentido, a ne-
cessidade de ser aceito, notado, ser diferente e ter controle é uma característica
humana normal e esperada nas pessoas, o que, em alguns grupos, pode virar
uma fraqueza e levar a disputas, mas, em equipes de alto desempenho, é um
fator para fortalecimento e união (ROCHA; ZERMIANI, 2017).
A criação de vínculos emocionais também é um diferencial nas equipes de alto
desempenho e que se caracterizam por relações mais verdadeiras, com comuni-
cação efetiva, maior feedback e respeito às normas de relacionamento humano.
Gestão de equipes nos serviços de saúde 11

Mas qual é o impacto das equipes nas instituições? Levando em conside-


ração que o capital humano é uma ferramenta que desenvolve e aperfeiçoa os
serviços prestados, não é de se admirar que o desenvolvimento dos indivíduos
deve ir além da preparação para as atividades laborais, mas necessita de um
senso de propósito e de valor:

Quando a empresa acredita no potencial de cada membro de sua equipe, dá um


sentido maior para a realização do trabalho, ou seja, instruir e capacitar geram
ideias e desafios motivadores. As organizações que criam desafios para os cola-
boradores, os incentivam a terem boas ideias e faz com que tornem os produtos
melhores. Isso é mais do que instruí-los (FONSECA, 2018, documento on-line).

Dessa forma, a motivação leva a equipe e seus componentes a quererem


desenvolver o trabalho e alcançar os objetivos e metas. Nesse sentido, as
empresas inovadoras estimulam e incentivam as equipes e seus colaboradores
a desenvolver ideias que aperfeiçoem serviços e produtos (FONSECA, 2018).
Pode parecer complexo desenvolver todas essas características em uma
equipe e orientá-la para que seja eficaz no processo de trabalho, mas o gestor de
equipes nos serviços de saúde deve preparar-se e desenvolver as competências
gerenciais necessárias para cumprir o seu papel na equipe.

3 O papel do gestor no trabalho em equipe


A estrutura convencional das instituições e dos estabelecimentos de saúde
traz consigo o peso da burocracia e a organização desconectada entre a gestão
administrativa e a gestão clínica. Essa visão desarticulada não facilita o desen-
volvimento de equipes eficazes e de alto rendimento. Para os profissionais de
saúde, a burocracia é limitante às ações que envolvem a agilidade, a criatividade
e a motivação no trabalho: “Aos olhos dos profissionais, as burocracias são orga-
nizações hierárquicas com incontáveis regras e políticas e controle centralizado
pelo escalão superior na hierarquia. Muitas vezes, as burocracias são percebidas
como impessoais, lentas e sufocantes” (MOSSER; BEGUN, 2015, p. 85).
12 Gestão de equipes nos serviços de saúde

Diferente da burocracia tradicional, a burocracia em estabelecimentos


de saúde tem como foco o poder da excelência ao invés do poder da posição
administrativa, buscando a manutenção dos padrões de qualidade e o cum-
primento da chamada “burocracia profissional”, que envolvem colocar em
prática diretrizes e protocolos que são desenvolvidos sem envolvimento da
área administrativa em instituições representativas fora do estabelecimento de
saúde ou por profissionais da própria instituição (MOSSER; BEGUN, 2015).
Assim, em instituições que têm uma burocracia profissional, um gestor tem
um papel importante em direcionar as ações que são responsáveis por alcançar
as metas e os objetivos dos serviços, como, por exemplo, “[...] planejamento
estratégico, sistemas de informação, análise financeira, marketing, gestão de
recursos humanos”, atuando como facilitadores da atividade fim (MOSSER;
BEGUN, 2015, p. 86).
Nesse contexto, é importante compreender por que o papel do administrador
ou gestor é tão importante para a equipe que presta assistência, independen-
temente de estar ou não inserido na equipe.
O gestor tem acesso a recursos aos quais, provavelmente a equipe, não
terá se não houver uma relação coordenada entre equipe e gestor, pois, como
mencionado, em várias instituições, a equipe é composta de profissionais
clínicos especializados, que não absorvem como sua a dimensão administrativa
do cuidado, focando na prática profissional específica.
Nesse sentido, segundo Mosser e Begun (2015, p. 92), os gestores são
considerados as “[...] peças fundamentais na prestação de atendimento baseado
em equipe” porque:

 possuem informação privilegiada e acesso a recursos financeiros e ma-


teriais que podem auxiliar as equipes a alcançar suas metas e objetivos;
 têm uma visão global da instituição, o que pode ser fundamental para
o processo de tomada de decisão e planejamento;
 estabelecem conexões com outros atores externos à instituição e com
outras equipes;
 têm acesso a outras instituições e canais de comunicação;
 podem contribuir com sua visão e experiência.

As competências do gestor da equipe


Segundo Peduzzi (2016), o gestor necessita ter competência para conseguir
promover e manter a integração do trabalho em equipe. Para isso, precisa:
Gestão de equipes nos serviços de saúde 13

 conhecer a missão, os objetivos e a visão da instituição e ser capaz de


compartilhar e articular com a equipe, de forma que essa equipe e a
organização estejam alinhadas em propósito — é importante, também,
conhecer e traduzir para a equipe a política organizacional;
 desenvolver a competência comunicacional de forma a traduzir e com-
partilhar informações, evitando a retenção e a paralisação do processo
de tomada de decisão das equipes;
 compreender e articular conceitos e ideias complexas de forma simples
e clara e compartilhá-los com a equipe, certificando-se de que a equipe
consegue compreender e compartilhar os mesmos conceitos corretamente;
 ter habilidade de envolver suas ideias e conceitos em situações de
diálogo, com capacidade de ouvir e verbalizar de forma articulada;
 promover o empoderamento da equipe e a sua autonomia, atribuindo
responsabilidade e autoridade e fortalecendo suas ações na instituição.

Uma das características importantes a ser desenvolvida pelo gestor é a


liderança. A partir do exercício da liderança na equipe, o desenvolvimento de
uma equipe de alto rendimento e o direcionamento para o alcance dos objetivos
da equipe e da assistência ao paciente são alcançados com mais facilidade.

Ser gestor versus ser líder


Um líder é uma pessoa que desenvolve, além das competências administrativas,
competências relacionais e de comunicação:

É uma influência interpessoal exercida em uma dada situação e dirigida por


meio do processo de comunicação humana para a consecução de um ou mais
objetivos específicos. Os elementos que caracterizam são, portanto, quatro:
a influência, a situação, o processo de comunicação e os objetivos a alcançar
(CHIAVENATO, 2008, p. 112).

Nesse sentido, a liderança difere da gestão em foco e propósito que extrapola


a simples tarefa e foca no direcionamento e apoio das pessoas e equipes. As
diferenças envolvem o processo de trabalho e a forma como se desenvolve
na instituição, assim como a influência interpessoal na equipe e nas pessoas.
Desse modo, as tarefas do líder são muitas, pois englobam ações de estru-
turação e definição de funções. A partir disso, e reconhecendo o potencial de
competências das pessoas individualmente e da equipe como um todo, consegue
“[...] distribuir funções, orientar, coordenar, controlar, motivar, elogiar, punir,
14 Gestão de equipes nos serviços de saúde

reforçar, contudo, o fundamental baseia-se no direcionar o grupo para metas


específicas” (SILVA, 2019, documento on-line).
Diferente do gerente, que executa todas essas atividades com a lente da tarefa,
o líder executa as tarefas administrativas levando em consideração outros aspectos,
além do conhecimento específico, como, por exemplo, a motivação, o desenvol-
vimento de pessoas e a comunicação efetiva como ferramentas do exercício da
liderança. Independentemente do estilo de liderança que adote, o gestor deve ter
algumas características como líder (SILVA, 2019). Um dos seus grandes desafios
está em descobrir o que realmente motiva indivíduos e equipes, mas cabe ao líder,
por meio de conexão, comunicação e inteligência emocional que estabelece com
o grupo, estar atento ao que move os indivíduos a alcançar as metas no trabalho.
A inteligência emocional envolve o equilíbrio das ações de relacionar-se com
as pessoas e o ambiente, aumentando sua capacidade de decisão e resiliência às
adversidades e diversas situações diárias que se apresentam. Essa inteligência
depende do desenvolvimento de algumas competências, que, segundo Oliveira
(2016), são fundamentais para exercer o papel de gestor líder.

 Autoconsciência: está relacionada com autopercepção, autoconhecimento,


isto é, conhecer seus próprios sentimentos, que influenciam o seu desempe-
nho e capacidade de avaliar-se e conhecer os seus limites, seus pontos fortes
e fracos, bem como se desenvolver e buscar constante aperfeiçoamento.
Também inclui a autoconfiança, isto é, a confiança em suas habilidades.
 Autogestão: relacionada à capacidade de compor alguns aspectos, como
autocontrole, controlando as emoções e impulsividade, principalmente
as emoções negativas direcionadas às ações úteis; transparência,
que envolve a capacidade de expressar sentimento, crenças e ações a
outras pessoas, de forma respeitosa e clara; adaptabilidade, ou seja, a
capacidade de lidar com situações novas e problemas complexos sem
perder o foco ou a capacidade de realização; consecução, que engloba
a capacidade de buscar sempre o melhor desempenho para si e para
sua equipe; iniciativa, isto é, perceber ou criar as oportunidades para
desenvolvimento da equipe e alcance de metas da equipe; e otimismo,
que é a capacidade de encontrar soluções mesmo em situações adversas.
 Consciência social: relacionada à capacidade do líder em desenvolver
empatia, que é a capacidade de perceber os diferentes níveis e sinais emo-
cionais das pessoas e das equipes, em diferentes contextos culturais, sociais
e educacionais; e a consciência organizacional, ou seja, conhecimento e
compreensão da política organizacional e tudo que pode influenciar o clima
organizacional, relações de poder, relacionamento e satisfação do cliente.
Gestão de equipes nos serviços de saúde 15

 Capacidade relacional: referente ao uso de inteligência emocional nas


relações de trabalho e composta de aspectos importantes, como inspiração
— o uso do da motivação do grupo por meio do exemplo; influência — isto
é, a capacidade de influenciar grupos e pessoas para determinada ideia
ou direcionamento; e desenvolvimento de pessoas — interesse de ajudar
outras pessoas no desenvolvimento de habilidades e do seu pleno potencial.

É, portanto, fundamental levar em consideração as diversas dimensões do


desenvolvimento de equipes efetivas, as características necessárias para equipes
eficazes e alto desempenho, bem como a importância do papel do gestor como
facilitador e direcionador das ações da equipe, com foco sempre no paciente.

A senhora Maria de Fátima é hipertensa e tem uma arritmia leve. É diabética e tem 80
anos. Além disso, faz tratamento para glaucoma, sofre de depressão, vive sozinha e
depende da pensão de aposentada para suas necessidades. Nesse contexto, a usuária
em questão é avaliada pelo clínico geral e geriatra que faz o seu acompanhamento.
Somado a ele, seguem-se outros especialistas, como o cardiologista, o endocrinologista,
o oftalmologista, a psicóloga, a enfermeira, a técnica de enfermagem, a nutricionista
e a assistente social. Nesse caso, há uma configuração tradicional, em que a idosa
é atendida individualmente pelos profissionais citados, sem, no entanto, nenhuma
interação, interdependência ou colaboração, risco de acompanhamento fracionado
e em repetição ou ausência de verificação das suas reais necessidades.
Em um contexto da estratégia da saúde da família que faz parte das políticas de
saúde do SUS, o caso de dona Maria de Fátima pode ser administrado com uma equipe
integrada por: um agente de saúde, que faz a conexão da idosa com a Unidade Básica
de Saúde; o clínico geral especialista em saúde da família, que monitora e acompanha
as patologias existentes e encaminha a paciente ao especialista quando necessário;
a enfermeira, que levantará as necessidades assistenciais e a adesão ao tratamento,
como o uso correto dos medicamentos e o risco de lesões de pele e outros sinais
e sintomas, bem como o monitoramento da pressão e outros sinais, auxiliada pela
técnica de enfermagem; a nutricionista, que acompanha a adesão à dieta adequada;
a assistente social, que acompanha todo o aspecto social e econômico da idosa que
mora sozinha e seus vínculos de apoio; o educador físico, que se preocupa com a
rotina de exercícios necessários, e a psicóloga, que observa o processo de depressão.
Esse é apenas um exemplo de um usuário comum no SUS. A equipe integrada se reúne
semanalmente para analisar os casos como de dona Maria de Fátima, observando suas
necessidades individuais, e traçar um plano de cuidados específico com base nos protocolos
e políticas já formuladas. Sem a articulação dos profissionais, não é possível atender as
necessidades de uma usuária como dona Maria de Fátima e mantê-la ao máximo com saúde.
16 Gestão de equipes nos serviços de saúde

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Gestão de equipes nos serviços de saúde 17

Leitura recomendada
HANSEN, M. T. Sucesso no trabalho: como os melhores gestores e funcionários trabalham
menos e rendem mais. Rio de Janeiro: Rocco, 2019.

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