Produtor Rural: Uma Visão Panorâmica Do Controle Biológico Na Agricultura Moderna

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ISSN 1414-4530

iéne
Produtor Rural
n º 73

Uma visão panorâmica do controle


biológico na agricultura moderna
Vítor Gazotto Cassiolato
Felipe Nogueira de Sá Marto
Livia Amaral
Cauê Carmona Groot
Laura Scovoli Soares Biston
Bianca Gonçalves Rodrigues
Fernando Dini Andreote

Universidade de São Paulo


Escola Superior de Agricultura"Luiz de Queiroz"
Divisão de Biblioteca
ISSN 1414-4530

Universidade de São Paulo - USP


Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ
Divisão de Biblioteca - DIBD

Vítor Gazotto casslolato 1


Felipe Nogueira de Sá Marto 2
Livia Amaral 3
Cauê Carmona Groot 4
Laura Scovoli Soares Biston 5
Bianca Gonçalves Rodrigues 6
Fernando Dini Andreote 7

1
Graduando em Engenharia Agronômica - ESALO/USP - [email protected]
2 Graduando em Engenharia Agronômica- ESALO/USP - [email protected]
3 Graduando em Engenharia Agronômica - ESALQ/USP - [email protected]
4 Graduando em Engenharia Agronômica- ESALO/USP - [email protected]

5 Graduando em Engenharia Agronômica - ESALO/USP - [email protected]


6 Graduando em Engenharia Agronômica- ESALO/USP - [email protected]

7 Professor Associado - Dep. de Ciência do Solo - ESALQ/USP - [email protected]

Uma visão panorâmica do controle


biológico na agricultura moderna
D01: 10.11606/9786587391144

Série Produtor Rural nº 73

Piracicaba
2022
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Reitor - Prof. Dr. Carlos Gilberto Carlotti Junior
Vice-reitora - Profa. Ora. Maria Arminda do Nascimento Arruda
Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz"
Diretor - Prof. Dr. Durval Dourado Neto
Vice-diretor - Prof. Dr. João Roberto Spotti Lopes

DIVISÃO DE BIBLIOTECA- DIBD


Av. Pádua Dias, 11 - Caixa Postal 9
13418-900 - Piracicaba - SP
[email protected] • www.esalq.usp.br/biblioteca

Revisão e edição Eliana Maria Garcia


Foto da capa https://blog .agromove. com. br/wp-contenV
uploads/2019/05/ladybug-3478620_1920.jpg
Editoração eletrônica Maria Clarete Sarkís Hyppollto
Impressão e acabamento Serviço de Produções Gráficas - ESALQ
Tiragem 300 exemplares

Catalogação na Publicação
DIVISÃO DE BIBLIOTECA· DIBD/ESALQ/USP

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna / Vítor Gazotto Cassiolato...
[et ai.]. - - Piracicaba : ESALQ - Divisão de Biblioteca. 2022.
87 p. : li. (Série Produtor Rural, n. 73)

ISSN: 1414-4530
ISBN: 978-65-87391-14-4
D01: 10.11606/9786587391144

1. Controle biológico 2. Agricultura 3. Pragas agrlcolas 4. Doenças de plantas 1. Cassiolato.


V. G. li. Marto. F. N. de Sá Ili. Amaral L IV. Groot. e. e. V. Biston. L s. s. VI. Rodrigues. B. G.
VII. Andreote, F. O. VIII. Escola Superior de Agricultura ·Luiz de Queiroz". Divisão de Biblioteca
IX. Titulo X. Sérte

CDD 632.96

Elaborada por Maria Angela de Toledo Leme • CRB-8/3359

Esta obra é de acesso aberto. É permitida a reprodução parcial ou @lc �-i C\@.
lotai desta obra, desde que citada a fonte e a autoria e respeitando �
a Licença Crealive Commons Indicada
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO................................................................................... 5
2. ASPECTOS GERAIS DOS PRODUTOS BIOLÓGICOS........................... 7
3. MANEJO PREVENTIVO DA MICROBIOTA DO SOLO........................... 11
3.1. Nutrição de plantas ....................................................................... 12
3.2. Sistema plantio direto.................................................................... 13
3.3. Plantas de cobertura...................................................................... 17
4. GRUPOS DE ORGANISMOS UTILIZADOS NO CONTROLE BIOLÓGICO . 21
4.1. Nematoides................................................................................... 21
4.2. Bactérias ...................................................................................... 25
4.2.1. Bacil/us thuringiensis ................................................................. 25
4.2.2. Bacil/us subtilis .......................................................................... 26
4.2.3. Bacil/us amyloliquetaciens ......................................................... 28
4.2.4. Bacillus lichenitormis e Bacil/us methylotrophicus ...................... 28
4.2.5. Pasteuria nishizawae .................................................................. 29
4.3. Protozoários ................................................................................. 30
4.4. Fungos ........ ........................ .......... ............................................... 31
4.4.1. Metarhizium anisopliae .............................................................. 31
4.4.2. Metarhizium rileyi ...................................................................... 33
4.4.3. Beauveria bassiana .................................................................... 35
4.4.4. Pochonia chlamydosporia ........................................................... 37
4.4.5. Trichoderma spp. ................................... ......... .......................... 40
4.4.6. Filo Microsporidia ou Microspora ............................................... 41
4.5. Ácaros ..................................................................... ..... ............... 45
4.5.1. Stratiolaelaps scimitus ................................................................ 45
4.5.2. Phytoseiulus macropilis e Neoseiulus californicus ....................... 46
4.5.3. Amblyseius tamatavensis ............................................................ 47
4.5.4. Aplicação .. ..... ........................ ..... .............. ................... .......... .... 47
4.6. Vírus.......... ................................................................................ 48
4.7. Insetos....................................................................................... 54
4.7.1. Cotesiaflavipes............... ........... ......... ... .. ..... .... ............ ........ ... 54
4.7.2. O GêneroTrichogramma ........................................................... 55
4.7.3. Te/enomus podisi ..................................................................... 56
4.7.4. Trisso/cus basa/is...................................................................... 57
4.7.5. Orius insidiosus ........................................................................ 58
4.7.6. Ceraeochrysa cubana eChrysoperla externa............................. 58
4.7.7. Doru /uteipes ............................................................................ 59
4.7.8. Família Coccinellidae................................................................ 60
4.7.9. Outrosinsetos usados como agentes de controle........................ 61
4.7.10. Aplicação............................................................................... 63
5. CONCLUSÃO.. .............. ..... .... ..... ................... ........................ ........ 65
REFERÊNCIAS .............................. ................... ........................ ..... ..... 67
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA.............................. ............................... 87
o
uCI:
Os defensivos naturais, baseando-se em seu princípio
ativo, podem ser divididos em duas partes: as substân­
(), cias produzidas por organismos e os agentes biológicos
::::,
a de controle.
o
a:
As substâncias produzidas se ramtticam em dois ti­
pos: os bioquímicos e os semioquímicos. O primeiro
1-
z
..
tem papel de estimulador e indutor de resistência em
• plantas, como hormônios, enzimas e extratos de algas.
Já o segundo está relacionado com a comunicação en­
tre organismos, sendo que, se esses forem de espécíes
dtterentes, são tratados como aleloquímicos, enquanto
que se forem da mesma espécie o termo empregado é
feromônios (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS
DE CONTROLE BIOLÓGICO - ABCBio, 2019). Ambos os
princípios podem ser utilizados em sistemas de controle
baseados em armadilhas.
Já os agentes biológicos de controle, foco desta apre­
sentação, podem ser microbiológicos - indivíduos predo­
minantemente microscópicos, como bactérias, fungos,
vírus, protozoários e nematoides - ou macrobiológicos,
os quais podem ser vistos a olho nu, como insetos e áca­
ros.
Os macrorganismos atuantes no controle biológico
são principalmente os insetos, os quais podem ser clas­
sificados no geral como predadores, ou seja, que predam
diversas presas durante seu desenvolvimento; e parasitoi­
des, os quais exigem um hospedeiro para chegar à fase
adulta. Já os microrganismos podem ser classificados
de diferentes maneiras, por exemplo, como entomopa­
tógenos - quando caracterizados como causadores de
doenças em insetos - biofungicidas ou bionematicidas,

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 5


quando empregados no controle de fungos e nematoides, respectivamente.
São conhecidas ferramentas de biocontrole com microrganismos distribuídos
entre os grupos de vírus, bactérias, fungos e nematoides.
De modo abrangente, as interações biológicas que ocorrem nos diferentes
sistemas de biocontrole podem ser divididas em diferentes formas. Segun­
do Silva (2020), as relações ecológicas entre os organismos podem ocor­
rer de três maneiras. Em primeiro lugar, tem-se o antagonismo direto, o qual
envolve mecanismos de parasitismo e predação. Há também o antagonismo
de caminho misto, resultante, por exemplo, da produção de enzimas líticas e
antibióticos, e interferências físicas e químicas sobre o desenvolvimento dos
organismos. Por último, tem-se o antagonismo indireto, que está relacionado
aos mecanismos de competição e de indução de resistência em plantas.
O objetivo deste texto é descrever as características de cada grupo de or­
ganismos utilizados como agente biológico de controle na agricultura atual,
caracterizada por uma crescente exploração destes recursos de biocontrole no
desenvolvimento de um processo mais eficiente e sustentável.

6 Série Produtor Rural n' 73


Os benefícios gerados pelo emprego dos produtos
biológicos nos sistemas de produção agrícola são muitos,
entre os quais cita-se:
• A redução do impacto ambiental provocado pela agri­
cultura, haja vista que os defensivos químicos tendem
a ser substituídos e/ou reduzidos com o uso de produ­
tos de controle biológico. Com isso, garante-se maior
segurança ao ambiente, trabalhadores rurais e consu­
midores, uma vez que não fazem mal à saúde huma­
na e também possuem alta persistência no ambiente.
Ademais, possuem alta seletividade, o que diminui o
leque de ação desse produto, evitando que atue sobre
organismos benéficos, como os inimigos naturais, o
que implica no restabelecimento desses organismos
na lavoura;
• A dificil seleção de resistência nas pragas-alvo, uma
vez que o mecanismo de ação desses organismos
consiste em diversas rotas de ação, sejam elas meta­
bólicas ou baseadas na predação/parasttismo;
• Maior oportunidade de uso desses produtos visto que
são registrados para o alvo e não para a cultura;
• Menor custo com insumos devido a um ambiente mais
equílibrado ecologicamente, já que há o estabeleci­
mento da população do agente de controle;
• Menor despesa envolvida no desenvolvimento de no­
vos agentes de controle em relação aos produtos quí­
micos.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 7


Todavia, há de se ressaltar que o uso de produtos biológicos possui alguns
desafios, tais quais:
• A dificuldade na produção em massa desse agente de controle devido à
possibilídade de ocorrência de contaminações no caso de microrganismos,
à demanda por mão-de-obra especializada, e à necessidade de desenvolvi­
mento de dietas específicas para o crescimento do agente, incluindo tam­
bém o impasse na obtenção de matérias-primas;
• O entrave na tropicalização dos produtos biológicos, ou seja, na adaptação
deles às altas temperaturas e à ecologia local, e no desenvolvimento de um
maior tempo de vida, tolerando mais o tempo de prateleira e transporte;
• Uma porcentagem de controle que não erradica a praga ou doença, e, de­
rivado disso, a necessidade de entendimento do conceito de conviver com
elas a um nível que não cause danos;
• Exigências de condições ambientais específicas no momento da aplicação,
como alta umidade relativa do ar e menor temperatura, velocidade do vento
e incidência de raios ultravioletas (após as 16 horas);
• Demanda por conhecimento técnico para correta manutenção e aplicação.

Após terem sido observadas as vantagens e desafios dos produtos biológi­


cos, recomenda-se que o produtor tome alguns cuidados na manutenção des­
ses insumos, como o armazenamento em local seco e fresco, e pulverização
(espectro de gotas e abrangência adequada), usando-se espalhante adesivo e
potencializando a persistência do produto na planta (VALICENTE, 2009). De­
mais recomendações são peculiares a cada produto e, por isso, a bula deve ser
sempre consultada e seguida. No caso de entomopatógenos, a pulverização
deve ser feita após os primeiros sinais do ataque de pragas.
A respeito do tempo de prateleira dos agentes controle, salienta-se que os
microbiológicos apresentam maior tempo de prateleira quanto menor a tem­
peratura, com alguns produtos suportando 6 meses de tempo de prateleira a

8 Série Produtor Rural n' 73


15°C. Já os macrobiológicos não possuem tempo de prateleira, demandando
uma venda programada.
Vale lembrar ainda que quando se trata de agentes microbiológicos de con­
trole, um ponto importante é a identificação da cepa ou estirpe com que se está
trabalhando. Ou seja, não basta apenas se identificar a espécie do microrganis­
mo, mas também a cepa, uma vez que dentro de uma espécie, cepas diferentes
podem apresentar funções muito distintas. Como exemplo dessa identificação
cita-se o "Bacil/us amy/o/iquefaciens BV03", onde "BV03" identifica a cepa do
organismo.
Em relação aos macrorganismos, por fim, um ponto a se lembrar é o de
que ao se comparar parasitas com parasitoides, os parasitas possuem maior
número de presas durante o seu ciclo do que os parasitoides, o qual tem um
hospedeiro por ciclo. Desta forma, a ação de controle dos parasitas tenderia
a ser mais rápida. Ademais, comparando os macrorganismos com os micror­
ganismos, o segundo tem elevada dependência da presença dos hospedeiros
para que se torne eficiente, salvo casos excepcionais que tais organismos so­
brevivem sem o hospedeiro. Somando esse fato ao aspecto de que o tempo de
ação deles não é muito rápido, conclui-se que este é um ponto que deve ser
mais aprimorado para melhorar a eficiência destes produtos.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 9


Ili=
<C o Mediante todas as alternativas que serão apresen­
a_.

tadas, trazemos uma que tem grande importância no
º cn ambiente agrícola e que, na sua ausência, as demais al­
-o ternativas de controle tornam-se menos eficientes. Isso,
za- a consequentemente, tem uma influência direta tanto no

Ili -
custo de produção, quanto na produtividade das cultu­
�o ras. Abordaremos, portanto, a importância do manejo
a:
a. - preventivo, tanto para potencializar o que já está presente
1D na área de cultivo, quanto para proporcionar melhor ren­
oi
., u
dimento do que é adicionado mediante outras práticas de
manejo.
z == Nesse sentido, mantemos a ciência de que a biota
<C do solo tem influência direta em processos e ciclos bio­
== geoquímicos, sendo a sua conservação e manutenção
necessárias para a conservação da saúde do solo e fun­
cionalidade. Dentre esses processos podemos citar a ci­
clagem de nutrientes, manutenção dos fluxos de energia,
decomposição e ciclagem da matéria orgânica, produção
de metabólitos (como fitormônios, sideróforos, ácidos
orgânicos), a degradação de agroquímicos, decomposi­
ção de xenobióticos, a fixação de nitrogênio atmosférico,
além da influência na estrutura física do solo, sendo a mi­
crobiota protagonista na produção de substâncias agre­
gantes e cimentantes, como políssacarídeos e glomalina
(SOBUCKI et al., 2019; ANTUNES, 2018).
As práticas conservacionistas estimulam a atividade
de microrganismos benéficos presentes no solo, cuja
ocorrência é estimada em 1 O a 50 mil espécies por gra­
ma, dos quais, apenas uma pequena fração são passíveis
de serem cultivados em laboratório. Elas também resul­
tam no sequestro de carbono e na manutenção da quali-

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 11


dade do solo (SOBUCKI et ai., 2019). Podemos listar, entre essas práticas, as
que estão expostas a seguir.

3.1. Nutrição de plantas


Nesse tópico podemos voltar a atenção à adubação nitrogenada. A pre­
sença do nitrogênio é essencial para as plantas, as quais possuem etapas de
processos fisiológicos que dependem inteiramente da disponibilidade desse
nutriente, tais como fotossíntese, respiração desenvolvimento e atividade das
raízes, absorção iônica de outros nutrientes, crescimento, diferenciação celular
e genética (PRADO, 2004). Todavia, tratando-se do solo, a adubação nitroge­
nada resulta na acidificação do solo, o que interfere no equilíbrio da comunida­
de microbiana (ANTUNES, 2018).
A ação da microbiota no solo, por meio da liberação de enzimas respon­
sáveis pela hidrólise enzimática gerada por atividade bioquímica, atuantes no
processo de mineralização conferem ao solo o nitrogênio em forma inorgânica,
sendo dividido em amônia (NH4+) e/ou nitrato (N03"). Mas isso corresponde
apenas a 2% do N encontrado no solo. O restante, aproximadamente 98% do
N é encontrado sob forma orgânica. Para que haja equilíbrio, portanto, o re­
comendado à prática de manejo de adubação do solo é que seja incluída a
aplicação prévia de calcário, cuja ação é a neutralização da ação acidificante,
além do estímulo à nitrificação em solos ácidos (ANTUNES, 2018).
Considerando que tratamos de manejo preventivo como um todo, vale a
observação de que as práticas conservacionistas são interligadas, portanto,
a resposta de um fator é comumente influenciado por outros fatores, como
veremos a seguir, considerando que a nutrição de plantas está estreitamen­
te vinculada à atividade enzimática do solo, a qual, antecipando a discussão,
é fortemente influenciada pelo manejo proporcionado pelo sistema de plantio
direto (SPD).
De acordo com o que é exposto na literatura, a atividade da enzima urease,
participante do ciclo do nitrogênio, não diferiu quando comparada em diferen-

12 Série Produtor Rural n' 73


tes épocas do ano ou com diferentes rotações de culturas, mas difere quando
o sistema de manejo é comparado. Essa enzima catalisa a reação de hidrólise
da uréia em duas moléculas de amônia e uma de dióxido de carbono. No tra­
balho realizado por Barbieri (2017), a resposta obtida foi de maior atividade
da enzima urease no SPD não escarificado, o que também foi observado por
outros autores.
Já a fosfatase ácida, que é fundamental para a mineralização do fósforo
no solo, transformando o P orgânico em inorgânico, e, portanto, prontamente
disponível para as plantas, apresentou uma grande variação entre as épocas de
coleta e quanto às diferentes culturas usadas em rotação, mas não em relação
ao tipo de manejo.

3.2. Sistema plantio direto


O sistema plantio direto é o que mais se destaca no quesfo de práticas de
conservação relacionadas ao aumento de produtividade. A adoção da rotação
de culturas, um dos pilares que caracterizam o SPD, é determinante no aumen­
to do aporte de matéria orgânica no solo, além da promoção da ciclagem de
nutrientes.
A matéria orgânica, por sua vez, é a principal responsável pela união entre
todos os processos biológicos, físicos e químicos. Dentre as suas funcionali­
dades podemos listar o aumento da porosidade do solo, que resulta na maior
infiltração de água e capacidade de retenção de umidade, além da promoção
de maior diversidade e atividade biológicas, do aumento da disponibilidade de
nutrientes e consequente melhora na fertilidade do solo. Todos esses atributos
tornam a matéria orgânica um indicador chave, dada a sua sensibilidade às
modificações de caráter antrópico (ANTUNES, 2018; SILVA et ai., 2021; QUA­
DROS et ai., 2012).
Conforme citado por Barbieri (2017), o SPD proporciona o incremento nos
valores de carbono da biomassa microbiana e a menor interferência na ativida­
de microbiológica do solo. Conclui-se, a partir disso, que esse sistema propor-

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 13


ciona, pelo aumento da biomassa, a menor perda relativa de carbono via respi­
ração, proporcionando a possibilidade de determinar o acúmulo de carbono no
longo prazo. Outro fator a ser comentado é o fato do incremento da atividade
enzimática resultado pelo SPD. O sistema de preparo convencional (SPC), por
sua vez, apresentou maiores valores de quociente metabólico (qCO). Ape­
sar das singularidades de cada um dos sistemas, ambos influenciam o perfil
de distribuição das propriedades biológicas do solo, principalmente quando o
ponto de referência é um sistema de vegetação nativa.
No estudo realizado por Barbieri (2017), objetivou-se recolher informação
sobre a qualidade, diversidade e atividade biológica do solo, mediante os parâ­
metros de atividade enzimática (urease, fosfatase ácida), a hidrólise do diaceta­
to de fluoresceína, carbono e nitrogênio da biomassa microbiana, além da taxa
de respiração basal e análise da diversidade genética a partir da comparação
entre os sistemas de plantio convencional e direto e respectivos manejas.
Os primeiros termos já foram previamente abordados, mas para explanar
brevemente o significado dos demais e a importância da análise de cada um
deles torna-se necessária a seguinte sequência:

a) Biomassa microbiana (BMS) e respiração do solo, o quociente me­


tabólico (qC02)
A combinação dessas medidas determina a quantidade de C02 evoluída
por unidade de biomassa, também denominada quociente metabólíco ou res­
piratório (qC02). Simplificando, essa variável indica a eficiência da biomassa
microbiana em processar o carbono disponível, além de possuir sensibilidade
suficiente para ser considerado um indicador para estimar a atividade biológica
no substrato.
A fertilidade natural do solo depende unicamente da ciclagem de matéria
orgânica e é mediada pela taxa de respiração microbiana. Conclui-se, portanto,
que o declínio na atividade microbiana resulta no impacto à fertilidade natural
do solo, afetando tanto ecossistemas naturais, quanto os implementados.

14 Série Produtor Rural n' 73


O aumento da biomassa microbiana está relacionado à adoção do plantio
direto e com o aumento da quantidade de resíduos culturais na superfície do
solo. Os altos níveis de BMS podem ser atribuídos à disponibilidade de nutrien­
tes, carbono orgânico e resíduos de plantas no solo, além do aumento nos
teores de umidade e redução de temperatura (BARBIERI, 2017).

b) Respiração basal
A taxa de respiração basal é um indicador sensível e revela de forma rápi­
da as alterações nas condições ambientais que afetam a vida microbiana e é
definida corno a sorna total de todas as funções metabólicas nas quais o C02
é produzido. É influenciada por fatores corno presença e quantidade de matéria
orgânica no solo, temperatura, umidade, aeração (SILVA; AZEVEDO; DE-POLLI,
2007).
A escolha do sistema de manejo é um dos principais fatores que determina
se o solo é capaz de atuar como fonte ou dreno de C-C02 • O aumento dos
resíduos vegetais e a consequente retenção do carbono no solo aumentam a
capacidade de dreno do C-C02 atmosférico e a mitigação de acontecimentos
como o aquecimento global.
O revolvimento do solo resulta na fragmentação de agregados, e intensa
oxigenação do solo, o que culmina na liberação de C02 preso nos espaços po­
rosos, e intensa atividade catalítica oxidativa, o que aumenta a liberação de C02
para a atmosfera. Isso também interfere na dinâmica da comunidade microbia­
na, que sofre com a influência de altas temperaturas, principalmente no período
do verão, somado à ausência de cobertura no solo, tendo como consequência
o aumento da amplitude térmica. Tudo isso ocasiona urna maior difusividade
e aumento do fluxo de C-C02 no sistema, dada a maior degradação da matéria
orgânica do solo.
No caso da presença da cobertura do solo em sistemas conservacionis­
tas, a matéria orgânica é afetada pelos processos microbianos, dependendo
de diversos fatores relacionados aos aspectos ambientais (clima e condições

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 15


físico-químicas do solo), às características do material orgânico, à biologia do
solo, e outros. Assim, visto o número de variáveis que controlam esse proces­
so, as transformações que ocorrem sobre matéria orgânica podem apresentar
diferentes intensidades e produtos.

e) Diversidade genética
O solo é constituído por uma infinidade de funções metabólicas e diversi­
dade genética advindas dos microrganismos. Dada a grande diversidade mi­
crobiana e o gigantesco potencial, a maioria dos impactos sobre processos
microbiológicos do solo tendem a passar despercebidos. Um bom exemplo
para isso é o fato de não haver espécies de microrganismos classificadas em
risco de extinção, além de sua projeção ser distinta ao observado para outros
grupos de organismos (BUENO; MENDES, 2021).
Dada a possibilidade de avaliação por meio de técnicas moleculares, é pos­
sível identificar o número de espécies microbianas presentes no solo, e tem-se
como resultado comum a observação de números muito maiores do que os
encontrados quando as análises são baseadas nos cultivas em laboratório.
Mais de 50.000 diferentes sequências de DNA de bactérias foram encontradas
em um grama de solo. Destas, 90-99% não são conhecidas (BUENO; MENDES, 2021).
Há alguns questionamentos, também propostos por Bueno e Mendes
(2021), como: "Quando convertemos uma área nativa de cerrado para um
plantio de soja ocorrem perdas da diversidade microbiana semelhantemente ao
que ocorre com as plantas e animais? Essas perdas são relevantes? Perdemos
espécies que eram únicas? Essas perdas poderiam acarretar perdas de alguma
função do solo (por exemplo, degradação de algum composto agroquímico)?".
Os estudos mais recentes têm sido focados em compreender e atender a
estes questionamentos. O que já se obtém de resultado pode ser atribuído aos
diferentes sistemas de manejo. Resultados sugerem que o solo sob plantio di­
reto apresenta uma estrutura da comunidade bacteriana mais similar à presente
sob Cerrado nativo, quando comparado ao plantio convencional, o que também
significa maior diversidade microbiana.

16 Série Produtor Rural n' 73


O sucesso do SPD se deve, majoritariamente, ao fato da permanência da
palha deixada tanto pela cultura comercial, quanto pela cultura de cobertura
eventualmente incluída no manejo. A sorna de ambos os resíduos das culturas
resulta na maior estabilidade de produção, da recuperação e manutenção da
estrutura do solo, o que interfere diretamente no fluxo de água e ar. Comparado
ao SPC, o revolvimento do solo, em linha geral, resulta na sua degradação,
devido à redução no teor de matéria orgânica, perda da estabilidade dos agre­
gados e redução na capacidade produtiva do solo. É preciso salíentar que todas
as propriedades do solo são inter-relacionadas, bem corno a fauna edáfica, isto
é, o conjunto de animais que vive dependendo diretamente do solo, e a comuni­
dade microbiana, sendo ambas influenciadas pelo manejo de preparo do solo,
dadas todas as transformações acarretadas a partir dele.

3.3. Plantas de cobertura


Um dos desafios do plantio direto reside no combate de pragas de solo,
corno os fitonernatoides, por exemplo. Corno todo manejo na agricultura, é de
conhecimento geral que nada mais eficiente quando há a integração de práti­
cas de modo a potencializar a resposta de todas as envolvidas. No presente
exemplo, essa é urna das possibilidades: a integração entre o SPD e o uso de
culturas de cobertura.
A ausência do revolvimento do solo e constante cobertura favorecem a pre­
sença de algumas pragas e para prevenir ou até mesmo remediar essa situação
o uso de plantas não hospedeiras é urna boa alternativa. Isso também vale para
a inclusão de culturas não hospedeiras no ciclo de rotação de culturas.
Seguindo o exemplo de fitonernatoides, que pode ser estendido às demais
pragas e doenças, para que a escolha da cultura a ser incluída no sistema seja
eficiente há alguns princípios a serem atendidos, conforme citado por Freire et
ai. (2011 ), sendo:
i) Espécie ou espécies de fitonernatoides na área;
ii) Abundância populacional do fitonernatoide;

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 17


iii) Suscetibilidade das espécies/cultivares/híbridos aos nematoides.
O benefício do uso de culturas de cobertura se dá pela possibilidade de
geração de biomassa e posterior incorporação do material vegetal ao solo,
o que, conforme já anteriormente citado, não possui apenas as propriedades
fitorremediadoras, mas também contribuem para a incorporação e aumento
de matéria orgânica. Voltando ao foco de controle biológico, o controle pro­
priamente dito se dá pela ausência de hospedeiros e também pela ação direta
de moléculas tóxicas aos nematoides presentes na planta. Inclusive, esses
compostos nematicidas são isolados, identificados e usados como extratos
de plantas para adubação verde ou biofumigação, constituindo importantes
ferramentas de controle contra esses patógenos (FREIRE et ai., 2011). Adicio­
nalmente, esta diversificação das fontes de matéria orgânica promovem maior
diversidade e atividade microbiana nos solos.
Um exemplo pertence à família Asteraceae, gênero Tagetes, espécie T. pa­
tu/a (conhecida como cravo-de-defunto), cuja folhagem quando incorporada
ao solo confere uma redução na infecção de nematoide Me/oidogyne incognita.
Outro grupo de plantas que pode ser citado é o do Feijão-de-Porco (Canavalia
ensitormis), cujo uso como adubo verde proporcionou uma redução de 63%
na população do fitonematoide Tubixaba tuxaua no cultivo de milho. O último
caso se trata de uma planta que é fonte natural de lectinas, que são capazes de
interferir na atração e na consequente migração dos nematoides até os hospe­
deiros, bloqueando o sistema quimiorreceptor dos nematoides, o que reduz ou
até mesmo impossibilita a sua capacidade de iniciar o processo de infecção
(FREIRE et ai., 2011).
Além disso, pensando na construção do ambiente, ao incluir plantas de
cobertura no sistema agrícola há uma alteração na concentração de plantas,
as quais podem atuar como recurso alimentar e abrigo para insetos que são
inimigos naturais das pragas que acometem a cultura em questão, além da
maior quantidade de alimento suplementar, como néctar e pólen, o que também
incrementa a capacidade reprodutiva desses inimigos. Por outro lado, também
atua sobre insetos especialistas que apresentam funções especfficas no meio

18 Série Produtor Rural n' 73


e dificuldade de colonizar e permanecer no ambiente diversificado, o que não
ocorre no caso de área com monocultura (ANDOW, 1991). Para exemplificar,
são insetos classificados como polinizadores (abelhas, borboletas, maripo­
sas), predadores (joaninhas, tesourinhas) e parasitoides (vespinhas) (ARAUJO,
2021).
Pensando nisso, há ainda outro fator que precisa ser avaliado na escolha
das plantas de cobertura:
iv) Inflorescência em grande quantidade: a fim de fornecer néctar e pólen
também em grande quantidade para os inimigos naturais.
As plantas mais estudadas no Brasil, visando à eficácia do controle de
pragas pela atração de inimigos naturais são:
a) Nabo forrageíro (Família Brassicaceae, sp. Raphanus sativus)
b) Trigo mourisco (Família Polionaceae, sp. Fagopyrum esculetum)
c) Cravo de defunto (Família Asteraceae, spp. Tagete patula, Tagete erecta)
d) Coentro (Família Apiaceae, sp. Coriandrum sativum)
e) Endro (Família Apiaceae, sp. Anethum graveolens)
Exemplo prático citado por Gonçalves (2020) são os predadores da família
Coccinillideae, popularmente chamados joaninhas e que são predadores natu­
rais de pulgões. A população desses insetos é favorecida pela presença das
Apiáceas Coentro, Funcho (Foenicu/um vu/gare) e Endro.
A confusão ou repelência causada por odores das plantas e os contras­
tes de cores são responsáveis pelo bloqueio da orientação do inseto até sua
planta de preferência, dado que também terá uma maior área para explorar, já
que há maior quantidade de plantas no ambiente. Além disso, os efeitos do
microclima, tais como sombreamento, proteção contra o vento, mudança na
temperatura e redução de insolação favorecem a migração de insetos de áreas
de entorno (GONÇALVES, 2020).
Para fins de manejo há, ainda, outras questões que devem ser observadas,
podendo ser listadas da seguinte forma:

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 19


i) Observar o estado da planta hospedeira;
ii) Saber qual a época ideal para dessecação, roçada ou incorporação ao solo;
iii) Entender qual a fitotoxidade para as culturas;
iv) Conhecer a estabilidade dos compostos nematicidas no solo;
v) Saber qual o tipo de solo.
A razão para essa última observação consiste na possibilidade de que os
compostos ativos sejam adsorvidos pela argila e inativados, possuindo, por­
tanto, menor eficiência quando usados em solos de textura argilosa.
Para mostrar a amplitude de variáveis envolvidas nessa prática de manejo,
outro fator que pode ser observado é o da incorporação dos nutrientes do
material vegetal, uma vez em decomposição no solo. Podem ter influência na
indução de resistência de plantas a doenças, uma vez que resultam na possível
modificação anatômica das plantas por meio de mecanismos como tornar a
epiderme mais grossa, lignificada e com acúmulo de silício, além das possí­
veis interferências nas propriedades fisiológicas e bioquímicas (MARSCHNER;
RIMMINGTON 1988; FREIRE et ai., 2011).
Há, ainda, outro grupo de microrganismos que vale ser citado e que é favo­
recido pelos efeitos da presença das plantas de cobertura em áreas agrícolas:
os decompositores. De acordo com Duarte, Cardoso e Fávero (2008), a com­
posição e a atividade da comunidade microbiológica depende de fatores como
as condições do solo, aeração, umidade, temperatura, pH, disponibilidade de
nutrientes e quantidade e qualidade do material orgânico disponível para de­
composição.
Desta forma, a biodiversidade em sistemas agrícolas, seja ela de organis­
mos vegetais ou microbiológica, proporcionará maior equilíbrio e resiliência ao
agroecossistema frente ao ataque de pragas, patógenos e plantas infestantes.
Logo, o manejo preventivo provê maior eficiência, sanidade e sustentabilidade
aos sistemas agrícolas, sempre buscando a menor necessidade de intervenção
humana e uso de insumos.

20 Série Produtor Rural n' 73


u,
o o 4.1. Nematoides
u
a-
�8
Os nematoides são organismos milimétricos que vivem
◄ em muitos ambientes, inclusive no solo, onde as espécies
t! ... apresentam diversos hábitos alimentares. Apesar de se­
::! o rem conhecidos de forma ampla pelos danos causados às
1- m
::, - raízes das plantas cultivadas, alguns nematoides podem

u, w ser aplicados no combate a insetos e outros organismos


o ...
i
que atacam algumas culturas. É possível citar, dentre os
:E nematoides usados para o controle biológico, as espécies
u, 1- Heterorhabditis bacteriophora, Heterorhabditis baujardi,
-z
Zo Steinernema brazilense, Steinernema teltiae, Heterorhab­
ditis indica, Romanomermis cu/icivorax, Steinernema ra­
o
�(,)
li: rum e Deladenus siricidicola. Contudo, pode-se dizer que
oz o uso de nematoides no controle biológico ainda é limitado
quando comparado com fungos e bactérias.
A espécie H. bacteriophora é indicada para qualquer
u,
o cultura onde ocorram os seus alvos biológicos, sendo
eles a vaquinha-verde-amarela, a broca-do-cupuaçu e o
bicudo-da-cana-de-açúcar. O controle promovido por esta
espécie ocorre a partir da penetração dos nematoides no
corpo dos insetos por meio de seus orifícios naturais e,
uma vez dentro do organismo, passam a liberar bactérias
do gênero Photorhabdus que causam septicemia em in­
setos - ou seja, causando a ruptura dos tecidos internos
- causando sua morte em aproximadamente 48 horas.
Nesse processo, observa-se uma relação de simbiose en­
tre o nematoide e a bactéria, visto que as bactérias não
conseguem sobreviver em ambientes livres, abrigando-se,
portanto, no intestino dos nematoides. Dessa forma, além
de fornecer abrigo, os nematoides levam as bactérias até
o hospedeiro. Em contrapartida, as bactérias produzem

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 21


enzimas que digerem o tecido dos insetos, disponibilizando alimento para o
nematoide.
Além disso, os nematoides Steinernema spp. e Heterorhabditis spp.
possuem uma associação mutualística que estabelecem com as bactérias
Xenorhabdus e Photorhabdus, respectivamente, resultando em uma morte rá­
pida dos insetos parasitados. Assim, o mecanismo de ação dos dois grupos é
muito similar, como mostrado na Figura 1.

1
2
Heterortiabdilis

.,/ Steinernema

Figura 1 - Ciclo biológico dos nematoides dos gêneros Steinernema e Heterorhabditis. (1) Juvenis
infectivos penetram no Inseto pelas aberturas naturais; (2) A bactéria é liberada, o inseto morre,
e o nematóide alcança a fase adulta; (3) O nematoide se reproduz em 2 a 3 gerações; (4) Juvenis
infectivos emergem do cadáver a procura de novos hospedeiros
Fonte: Leite (2020)

22 Série Produtor Rural n' 73


Agura 2 - Juvenís infectivos do nematoide Steinemema sp.
Fonte: Leite (2020)

Em relação à espécie De/adenus siricidicola, seu principal alvo biológico é


a vespa-da-madeira, a qual ataca a cultura do Pinus. Nesse caso, o nematoide
age por meio da esterilização das fêmeas do inseto, processo que se dá pela
penetração das fêmeas do nematoide na larva da vespa com auxílio do seu
estilete. Essa penetração ocorre na fase de pupa do hospedeiro e, quando
os nematoides juvenis migram para os órgãos reprodutores do hospedeiro,
penetram nos ovos e impedem o desenvolvimento dos ovários, tornando-os
estéreis (PENTEADO et ai., 2002).
Uma informação relevante é a de que existe a possibilidade de ocorrer a
perda da eficiência por conta da manutenção da cultura do nematoide em la­
boratório, visto que o organismo tem uma fase de vida livre, na qual ele se
alimenta de fungos, e outra fase parasitária, que é quando penetra nas larvas
dos hospedeiros e tornando-as estéreis. Dessa maneira, a manutenção da cul­
tura em laboratório pode fazer com que o nematoide perca a capacidade de
se transformar na forma parasitária, limitando, assim, sua capacidade de
infecção. Logo, para evitar esse processo, é adequado que todo ano

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 23


sejam realizadas coletas em campo para obtenção novas linhagens de
nematoides infectivos a partir de insetos adultos.
Dos produtos comerciais que empregam estes nematoides, cada dose
pode conter aproximadamente 1 milhão de indivíduos, o que faz com que uma
dose aplicada em dez árvores de Pinus resulte em uma aplicação de cerca de
100.000 desses indivíduos por árvore.
O nematoide R. cu/icivorax foi muito utilizado na década de 1970 para o
controle biológico de larvas de mosquito. Atualmente, no entanto, essa espécie
não é mais comercializada devido a dificuldades em sua produção em grandes
quantidades, tendo sido subsfüuído pela bactéria Baci/lus thuringiensis.
Visto isso, vale frisar que os nematoides possuem potencial para o controle
biológico, mas ainda são pouco empregados no Brasil. Isso deriva da gran­
de dificuldade para criá-los de forma massiva, uma vez que a tecnologia de
produção ainda não foi completamente dominada. Dessa maneira, assim que
esse impasse se resolver, o cenário brasileiro deverá ser alterado, visto que os
nematoides possuem muitas vantagens em sua utilização (Tabela 1).

Tabela 1 - Nematoides para controle de pragas agrícolas e seus respectivo


alvos de atuação

Agente de controle Principais alvos *


Diabrotica speciosa (vaquinha-verde-amarela)
Heterorhabditis bacteriophora Conotrachelus humeropictus (broca-do-cupuaçu)
Sphenophorus levis (bicudo-da-cana-de-açúcar)
Heterorhabditis baujardi Conotrache/us psidii (gorgulho-da-goíaba)
Steinemema brazifense Sphenophorus /evis (bicudo-da-cana-de-açúcar)
Heterorhabditis indica
Steinemema feltiae Bradysia sp. (fungus gnats)
Steinemema rarum
De/adenus siricidicola Sirex noctilio (vespa-da-madeira)
Romanomermís cu/icivorax Larvas de mosquito
*Uso em qualque r cultura na qual ocorram

24 Série Produtor Rural n' 73


4.2. Bactérias
As bactérias são organismos que possuem muitas aplicações na agri­
cultura, podendo atuar em importantes processos, como na suplementação
nutricional (ex.: fixação biológica de nitrogênio) ou na proteção das plantas,
atuando com ação inseticida, nematicida, fungicida, dentre outras.
Existem produtos biológicos capazes de disponibilizar esses organismos
que agem controlando pragas e doenças. De acordo com as bulas, a con­
centração de microrganismos nestes produtos é muito alta. Por exemplo,
em aplicações de Bacif/us thuringiensis em soja, a quantidade varia em tor­
no de 462 bilhões de esporos viáveis por hectare. Já no caso de Pasteuria
nishizawae, essa concentração pode ser de 4,5 trilhões por cada 100 quilogra­
mas de sementes tratadas.
Em sua atuação como inseticida, as bactérias têm destaque no controle
de insetos como lagartas, moscas e besouros, sendo sua eficácia maior em
lagartas jovens de borboletas e mariposas (POLANCZVK; ALVES, 2004). O me­
canismo de ação das bactérias no controle de insetos, nematoides e ácaros é
bastante diversificado, tendo como principais exemplos a síntese de substân­
cias antibióticas e toxinas.

4.2.1. Bacil/us thuringiensis


O gênero Bacil/us é amplamente utilizado nessa área, sendo a espécie B.
thuringiensis a de maior destaque. Seu mecanismo de ação é mufo eficaz,
baseando-se na produção de cristais de proteínas tóxicas aos insetos. Esses
cristais são ingeridos pelas larvas do inseto e, em função do pH alcalino do
aparelho digestivo da praga, os cristais se solubilizam e liberam as toxinas.
Estas impactam as células, resultando no rompimento da estrutura, o que pa­
ralisa e mata a praga (MACHADO et ai., 2012). A eficiência deste processo se
comprova no fato de que essa mesma bactéria é a doadora do material genéti­
co (gene "cry") da proteína presente na tecnologia de plantas transgênicas BT.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 25


4.2.2. Bacillus subtilis
Uma espécie amplamente utilizada no mercado de biológicos é 8acillus
subti/is. Esta espécie é um caso para o que descrevemos acerca das cepas/
estirpes. A variar da estirpe com que se trabalha, os mecanismos de ação
podem consistir na indução de crescimento e resistência da planta, além da
produção de compostos que demonstram efeitos antagônicos em outros mi­
crorganismos (LANNA FILHO; FERRO; PINHO, 201 O).
Naturalmente as plantas apresentam um mecanismo de resistência capaz
de retardar ou paralisar o desenvolvimento de um patógeno. Os mecanismos
que agem para realizar essa defesa natural são: resistência sistêmica adquirida
(SAR) e a resistência sistêmica induzida (ISR), ambas controladas por uma
proteína (denominada NPR1) que pode ser ativada por microrganismos e se
caracterizam por serem adquiridas com o tempo (LANNA FILHO; FERRO; PI­
NHO, 2010).
Quando o patógeno penetra na planta, é desencadeada a produção de ácido
salicílico (AS) responsável por ativar a SAR. Com a presença de substâncias
produzidas por 8. subfilis (ou outros microrganismos) nos tecidos vegetais,
são induzidas as produções de ácido jasmônico (JA) e etileno (ET) que ativam
a ISR. Essas duas formas de indução de resistência se cruzam na rota de sina­
lização com a proteína NPR1, o que resulta na defesa da planta contra o agente
patogênico (LANNA FILHO; FERRO; PINHO, 201O).
Segundo Lanna Filho, Ferro e Pinho (201 O), essa bactéria também pode
atuar na indução de crescimento da planta, pois melhora as condições do solo
e aumenta a fixação biológica de nitrogênio, a produção de hormônios vegetais
e a solubilização de nutrientes. Com essas melhorias nas condições, é possível
que a planta se desenvolva de uma forma mais expressiva, podendo aumentar
sua resistência aos patógenos. 8. subfilis também pode agir liberando com­
postos que inibem o desenvolvimento de outros organismos ou competindo
com eles. A produção de substâncias tóxicas promove tais mecanismos de
ação, sendo muito eficientes no controle de doenças, principalmente de fungos
fitopatogênicos.

26 Série Produtor Rural n' 73


Patógeno Bacillus subti/is

SA
l

PRs Alua empr/111i11g na


expre.ssão dos genes de defesa

SAR ISR
Figura 3 - Representação esquemática das rotas de sinalização desencadeada por patógenos e
agentes de biocontrole. o patógeno atua desencadeando a biossíntese do âcido salicílico (AS). que irá
promover a resistência sistêmica adquirida (SAR). Em contrapartda, a bactéria inicia a biossíntese de ãcido
jasmõnico (JA) e etileno (ET) que irá promover a resistência sistêmica induzida (ISA). Ambas as rotas de
sinalização são governadas pela proteina NPR1
Fonte: Lanna Filho, Ferro e Pinho (201 O)

De acordo com Vallad e Goodman (2004), os dois mecanismos de resis­


tência, SAR e ISR, podem ser estimulados por condições ambientais específi­
cas, além da ação dos microrganismos. A SAR mais tradicional pode ser acionada
pelo acúmulo de ácido salicílico (SA) após exposição da planta a organismos virulentos
ou não e a microrganismos não patogênicos, ou artificialmente com substâncias quími­
cas como ácido salicílico (GARCIA-AGUSTIN; LAPENA, 2016}.
Já a ISR é potencializada por outras bactérias promotoras de crescimento,
como Pseudomonas, mas também pode ser induzida por antibióticos, surfac­
tantes ou indutores químicos. Diferente da SAR, seu mecanismo de ação não
depende do acúmulo de proteínas relacionadas à patogênese ou ao acúmulo de
ácido salicílico (SA}, mas sim dos caminhos relacionados ao ácido jasmônico
(JA} e etileno (ET} e à proteína NPR1 (VALLAD; GOODMAN, 2004; LLORENS;
GARCIA-AGUSTIN; LAPENA, 2016).

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 27


4.2.3. Baci/Jus amyloliquefaciens
Outra espécie em destaque é Baci/lus amyloliquefaciens, que se assemelha
à B. subtilis e, através da produção de substâncias antibióticas, combatem
agentes causadores de danos às plantas (SANTOS, 2018). Seus principais
alvos são o nematoide-das-lesões-radiculares (Pratylenchus brachyurus) e o
fungo causador do mofo-branco (Sc/erotinia sclerotiorum).

Figura 4 - À esquerda, cepa de Bací/lus amylol/quefacíens atuando no controle de ne­


matoides e à direita, a testemunha
Fonte: Freire (2020)

4.2.4. Baci/lus licheniformis e Baci/lus methy/otrophicus


Espécies utilizadas no controle biológico de pragas e patógenos (SANTOS,
2018) cujos mecanismos de ação assemelham-se aos dos outros Bacil/us.
Sendo assim, produzem substâncias que penetram na praga ou patógeno,
provocando paralisia ou até a morte do mesmo. O principal alvo de
B. methy/otrophicus são os nematoides (CARVALHO, 2017).

28 Série Produtor Rural n' 73


4.2.5. Pasteuria nishizawae
A espécie Pasteuria nishizawae também merece destaque devido a sua
ação exclusivamente nematicida, tendo como principal alvo o nematoide-do­
-cisto-da-soja (Heterodera glycines). Segundo as bulas de produtos que pos­
suem P. nishizawae, esta bactéria é classificada como um parasita obrigatório
e, ao se aderir aos nematoides, mesmo na forma de esporos, dificulta sua
locomoção nas áreas próximas das raízes das plantas. Se a quantidade de es­
poros aderidos é menor, o nematoide consegue penetrar na raiz, sendo, então,
parasitada. Consequentemente, quando o nematoide se diferenciar em fêmea
nas raízes, os esporos irão penetrar no seu sistema e o deixarão estéril. Por
isso, quando o cisto estourar devido à presença da fêmea parasitada, haverá a
liberação de esporos do agente de controle.

Tabela 2 - Bactérias para controle de pragas e doenças e seus respectivos alvos


de atuação

Agente de controle Principais alvos *

Bacillus thuringiensis Insetos da ordem Lepídóptera


Bactérias (Xanthomonas spp., entre outras)
Bacil/us subtilis Fungos (Alternaria spp., Colletotrichum spp.,
Fusarium spp., Rhizoctonia spp., Sclerotinia spp.,
entre outros)
Bacillus amylo/iquefaciens Pratylenchus brachyurus
Bacil/us licheniformis Meloidogyne incognita e Pratylenchus brachyurus
Bacillus methy/otrophicus Nematoides
Pasteuria nishizawae Heterodera glycines
*Uso em qualquer cultura na qual ocorram

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 29


4.3. Protozoários
Os protozoários compõem um grupo diverso de microrganismos o
qual se organizava em sete filos (categorias de organização biológica)
até o final do século passado: Myxozoa, Ascetospora, Labyrinthomorpha,
Ciliophora, Sarcomastigophora, Apicomplexa e Microspora, sendo estes três
últimos conhecidos pelo potencial no controle biológico (POLTRONIERI, 2020).
Atualmente, no entanto, o filo Microspora foi transferido para o reino Fungi
(FONTES; VALADARES-INGLIS, 2020) e, portanto, será melhor explicado no
capítulo sobre os fungos.
Devido ao potencial de regulação da população de insetos por esses orga­
nismos, pesquisas têm sido feitas com o intuito de desenvolver produtos que
possam ser usados comercialmente. Nelas, embora poucas, constatou-se que
poucos protozoários possuem capacidade de serem incluídos em programas
de MIP (GARCÍA et al.1, 2008 apud VALICEN TE, 2009). Isso é devido ao fato
de poucos possuírem alta virulência ou ação rápida nos hospedeiros inverte­
brados (GARCÍA et ai., 2008 apud VALICENTE, 2009), sendo predominante a
característica de causarem infecções fracas, as quais implicam em debilidade
geral e em morte lenta do hospedeiro, além de acarretarem na redução da
potência reprodutiva do alvo. Ademais, não existem métodos para produção
em massa desses indivíduos.
Segundo Silva, Nascimento e Siqueira (2007), entre os protozoários que
matam insetos, a maioria é encontrada no trato digestivo destes, possuindo
ação lenta. Já as formas mais agressivas pertencem ao filo Apicomplexa e ao
antigo filo Microspora.
Corno comentado anteriormente, os estudos acerca deste grupo ainda são
escassos. Em especial no Brasil, tal situação também é válida, principalmente
quando se trata da relação de controle de insetos por protozoários.

1 GARCIA, J.J. et ai. Uso de protozoârios entomopatogênicos em programas de controle microbiano


nos países latino-americanos. ln: ALVES, S.B.; LOPES, R.B. (Ed.). Controle microbiano de pragas
na América Lalina. Piracicaba: FEALQ, 2008. p. 203-214.

30 Série Produtor Rural n' 73


4.4. Fungos
Assim como as bactérias, os fungos também apresentam diversas aplica­
ções no controle biológico, podendo atuar como inseticidas, acaricidas, nema­
ticidas e fungicidas.
As formulações de produtos biológicos de natureza fúngica correspon­
dem a cerca de 15% do mercado mundial de bioinsumos (ALMEIDA; BATISTA
FILHO, 20012 apud DALZOTO; UHRY, 2009), sendo a gama desses produ­
tos bastante ampla, na qual inúmeras espécies são usadas para a realização
deste tipo de controle. Dessa forma, no presente trabalho serão destacados
os seguintes grupos: (i) Metarhizium anisop/iae; (ii) Metarhizium rileyi; (iii)
Beauveria bassiana; (iv) Pochonia ch/amydosporia; (v) Trichoderma spp. e (vi)
Filo Microspora.

4.4.1. Metarhizium anisopliae


O fungo Metarhizium anisopliae é classificado como um importante inseti­
cida microbiológico por conta de sua ampla utilização no controle de algumas
espécies de insetos, dentre os quais se destacam importantes pragas, como
as cigarrinhas-das-pastagens (Deois f/avopicta e Zulia entreriana) e a cigar­
rinha-das-raizes da cana-de-açúcar (Mahanarva fimbriolata), além de muitos
outros alvos.
O mecanismo de ação de M. anisopliae consiste em sua adesão e germi­
nação dos esporos no tegumento das cigarrinhas - tanto em sua fase juvenil
(ninfa) quanto em sua fase adulta -, resultando na penetração no corpo dos
insetos e posterior colonização, processos que acarretam na morte dessas
potenciais pragas (Figura 5).
Para sucesso do crescimento do micélio de M. anisopliae, as condições fa-
voráveis descritas são de temperaturas na faixa de 25 a 28º C e elevada umida-

2 ALMEIDA, J.E.M. de; BATISTA FILHO, A. Banco de microrganismos entomopatogênicos. Biotec­


nologia Ciência & Desenvolvimento, Brasília, v. 4, n. 20, p. 77-86, 2001.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 31


de relativa (HALLSWORTH; MAGAN, 1999 3 apud LOUREIRO et ai., 2012). Além
disso, ocorre pouca formação de esporos (esporulação) em extremos de 15 e
40ºC, sendo significamente reduzida se exposta a períodos de baixa umidade
relativa e estiagem. (ARTHURS; TOMAS, 2001 4 apud LOUREIRO et ai., 2012).
O conhecimento do comportamento da produção de conídios (isto é, um
tipo de esporo) de M. anisop/iae em função das diferentes condições ambien­
tais é de fundamental importância pois, de acordo com Loureiro et ai. (2012), a
produção desses esporos é responsável pela transmissão secundária do fungo
entre os insetos presentes na cultura afetada, permitindo, assim, diminuir a
frequência de pulverizações necessárias para manter as populações dos inse­
tos-praga em níveis reduzidos.

Figura 5 - Cigarrinha -das-pastagens (Deois flavopicta) morta pelo micélio de M. anisop/iae


Fonte: Pires (2018)

3 HALLSWORTH, J.E.; MAGAN, N. Water and temperature relations of growth of lhe entomogenous
fungi Beauveria bassiana, Metarhizium anisopliae, and Paecilomyces farinosus. Journal oi lnver­
tebrate Pathology, Amsterdam, v. 74, n. 3, p. 261-266, Nov. 1999.
1 ARTHUS, S.; THOMAS, M. Elfects oi temperature and relative humidity on sporulation oi
Metarhizium anisopliae var. acridum in mycosed cadavers oi Schistocerca gregaria. Journal oi
lnvertebrate Pathology, Amsterdam, v. 78, p. 5 9-65, 2001.

32 Série Produtor Rural n' 73


Os micopesticidas utilizam as estruturas fúngicas de conídios e blastos­
poros formulados como pós-molháveis ou misturados com óleos. A presença
desses metabólitos não é considerada de risco à saúde humana e animal, já
que os níveis não são altos o suficiente para causar danos (FONTES; VALADA­
RES-INGLIS, 2020).
Em média, são aplicadas quantidades de conídios viáveis na ordem de 3,5
a 5,2 bilhões por hectare de acordo com as doses dos produtos. Sua aplicação
pode ser realizada de forma terrestre, utilizando pulverizadores de barra ou
costal, ou de forma aérea através de aeronaves agrícolas, numa altura de voo
de 3 a 4 metros sobre a cultura.

4.4.2. Metarhizium ri/eyi


A espécie Metarhizium ri/eyi é um fungo pertencente ao filo Ascomycota
e é classificado taxonomicamente juntamente com outros fungos de poten­
cial entomopatogênico (KEPLER et ai., 20125 apud ABATI, 2015), como, por
exemplo, Metarhizium anisopliae abordado no item anterior. Morfologicamente,
os conidióforos de M. rileyi apresentam uma variação de coloração do verde
pálido ao verde acinzentado, além de um micélio esbranquiçado (HUMBER,
19976 apud ABATI, 2015).
Assim como M. anisopliae, o M. rileyi apresenta grande potencial in­
seticida observado no controle de lagartas, em especial as pertencen­
tes à família Noctuidae, que são as mais sensíveis a esse patógeno (DEVI
et ai., 2013; SRISUKCHAYAKUL; WIWAT; PANTUWATANA, 2005; ABATI,
2015). Dentre os hospedeiros desse fungo, estão: Anticarsia gemmatalis,
Chrysodeixis inc/udens, Cofias /esbia, He/icoverpa armigera, Helicoverpa zea,

$ KEPLER, R.M. et ai. New teleomorph combinations in lhe entomopathogenic genus


Metacordyceps. Mycologia, NewYork, v.104, n. 1, p. 182-197, 2012.
6 HUMBER, R.A. Fungi: identification. ln: LACEY, L. (Ed.). Manual oi techniques ln insect pathology
New York: Academic Press, 1997. p. 153-186.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 33


Heliothis virescens, Plathypena scabra, Pseudoplusia includens, Spodoptera
trugiperda e Trichoplusia ni (GAZZONI et ai., 1994; RIZZO; LA ROSSA, 1994;
SRISUKCHAYAKUL; WIWAT; PANTUWATANA, 2005; ABATI, 2015), dentre os
quais recebem destaque A. gemmatalis, H. armigera e S. trugiperda.
O mecanismo de ação de M. rileyi é bastante semelhante ao de M.
anisopliae. Seus esporos se aderem ao corpo dos hospedeiros e se multiplicam
até ocorrer a penetração e posterior colonização dentro do corpo das lagartas,
ocasionando a morte destes indivíduos (SOSA-GOMÉZ; BINNECK; LASTRA,
2020). Dessa forma, a infecção é bastante visível no campo devido ao aspecto
branco conferido às lagartas após toda a superfície do seu corpo apresentar-se
coberta (Figura 6).

Figura 6 - Lagarta da família Noctuidae coberta pelo micélio de Metarhizium rileyi


Fonte: Sos a-Goméz, Binneck e Lastra (2020)

No entanto, assim como ocorre na maioria dos fungos utilizados no contro­


le biológico, o M. rileyi apresenta condições ideais para boa infecção e garantia
de sua virulência, como temperatura, pH, umidade e luz. A faixa de temperatura
ideal para a germinação e penetração de seus esporos no corpo das lagartas
varia de 20 a 25ºC. Em relação ao pH, Sautour et ai. (201O) destacam que al­
guns isolados fúngicos sobreviveram adequadamente entre valores de pH entre
4 e 9, como o isolado Nm006 (ABATI, 2015); contudo, valores de pH entre 5 e
8 garantiram maior velocidade de crescimento do fungo. No que diz respeito à

34 Série Produtor Rural n' 73


umidade, os esporos de M. rileyi apresentaram grande atividade em umidades
entre 95 e 100%, não possuindo formação de conídios em valores mais baixos.
Além disso, nos trabalhos de Tang e Hou (2001), foi verificada a influência do
fotoperíodo no crescimento fúngico e ação contra as lagartas, sendo que em
períodos escuros (também classificados como escotofase) a mortalidade das
lagartas e a esporulação de M. rileyi foram consideravelmente menores se
comparados a períodos com incidência de luz.
Por fim, a formulação de bioprodutos deve levar em consideração a estru­
tura dos microrganismos para sucesso na aplicação e controle. No caso de
M. ri/eyi, os blastosporos são facilmente produzidos em meios líquidos, mas
não infectivos quando aplicados diretamente nas larvas (RIBA; GLANDARD,
1980; ABATI, 2015). Entre as principais formas de produção de M. rileyi, a pro­
dução in vitro ganha destaque, a qual se subdivide em três diferentes técnicas,
como: fermentação líquida, fermentação sólida ou fermentação bifásica.

4.4.3. Beauveria bassiana


A espécie Beauveria bassiana é classificada como um inseticida e um
possível acaricida microbiológico, sendo responsável por enfermidades em
mais de uma centena de espécies (STEINHAUS, 1969; ALESHINA 7 , 1980 apud
COUTINHO; CAVALCANTI, 1988) e indicada para controle de diversos insetos­
-praga, como: o ácaro-rajado (Tefranychus urticae), o gorgulho-do-eucalipto
(Gonipterus scutel/atus), a broca-do-café (Hypothenemus hampei), a cochoni­
lha-ortézia (Orthezia praelonga), a mosca-branca (Bemisia tabac1), os cupins
(Coptotermes sp.), o moleque-da-bananeira (Cosmopolites sordidus) e o áca­
ro da falsa ferrugem (Phyl/ocoptruta o/eivora).

7 STEINHAUS, E.A. Enfermidades microbianos de los insetos. ln: BACH, P. de. Control biologico de
las plagas de lnseclos y malas hierbas. México: Continental, 1969. p. 607-645.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 35


Seu mecanismo de ação consiste na penetração dos conídios na cutícula
do inseto (ou seja, seu tegumento) através de enzimas específicas (LEFEB­
VRE, 1934; VEY; FARGUES, 1977; FERRON, 1978; PEKRUL; GRULA, 1979ª
apud DALZOTO; UHRY, 2009). Após essa penetração, são formadas hifas e
tubos germinativos que permitem ao fungo atravessar todo o tegumento do
inseto-alvo até alcançar sua hemolinfa, onde ocorre a multiplicação do fungo
e acúmulo de uma considerável massa de células fúngicas, levando o inseto à
morte. Dessa forma, se existirem condições favoráveis, o fungo pode emergir
e externar suas hifas, formando uma massa branca no corpo da praga atacada
(DALZOTO; UHRY, 2009), como mostra a Figura 7.

Figura 7 - Mosca-da-couve (De/ia radicum) morta pelo micélio da 8. bassíana


Fonte: Goettel (2005)

8 PEKRUL, S.; GRULA, E.A. Mode of infection oi lhe corn earworm (Helíothís zea) by 8. bassiana
as revealed by scanning electron microscopy. Journal of lnvertebrate Pathology, Amsterdam,
V. 34, p. 238-247, 1979.

36 Série Produtor Rural n' 73


As concentrações de conídios viáveis de B. bassiana inseridas com o uso
do produto variam de acordo com a dose recomendada, a qual é específica
para o controle das diferentes pragas. No caso da broca-do-café e da mos­
ca-branca, por exemplo, são adicionadas quantidades na ordem de 2,5 a 5
bilhões de conídios viáveis por hectare. O modo de aplicação dos produtos
contendo B. bassiana se dá através de pulverização, podendo, inclusive, ser
feita a aplicação foliar.
De acordo com estudos realizados por Lorencetti et ai. (2018) para verificar
a eficiência de B. bassiana no controle do inseto-de-bronze (Thaumastoooris
peregrinus, uma importante praga florestal) foi verificado que a germinação
dos conídios do fungo ocorre geralmente após 12 horas da aplicação e a co­
lonização após três dias, período em que o fungo já apresenta uma grande
concentração de conídios no ambiente. Porém, o tempo de mortalidade dos
insetos-alvo depende do tamanho de seu corpo.
Contudo, as condições ambientais também devem ser levadas em con­
sideração na definição de uma estratégia de controle eficiente baseado em
B. bassiana, uma vez que esse fungo é bastante sensível à umidade relativa,
temperatura e incidência de luz (ALVES, 19989 apud LORENCETTI et ai., 2018).

4.4.4. Pochonia chlamydosporia


Classificado como um nematicida microbiológico, a especIe
Pochonia ch/amydosporia é indicada para controle de nematoides do gênero
Meloidogyne, sendo estes organismos bastante prejudiciais a diversas culturas
(PINHEIRO, 2021).
O mecanismo de ação da P. ch/amydosporia consiste basicamente no
parasitismo dos ovos dos nematoides presentes no solo, alimentando-se de

u ALVES, S.B. Fungos entomopatogênicos. ln: ALVES, S.B. (Ed.). Controle microbiano de insetos.
2. ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p. 289-381.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 37


seu embrião e, com isso, garantindo uma redução considerável na popula­
ção desses patógenos. Além disso, Fernandes et ai. (2014) destacam que
P. ch/amydosporia não é dependente da presença do nematoide para a sua
nutrição, podendo atuar como saprófita na ausência do hospedeiro.
A aplicação ao solo de P. ch/amydosporia é realizada preferencialmente
por meio de clamidósporos, isto é, estruturas de resistência (KERRY; BOUR­
NE, 20021º apud PODESTÁ et ai., 2009). Geralmente, o fungo é aplicado
numa proporção de 5.000 clamidósporos por grama de solo, sendo consi­
deradas, também, outras quantidades de clamidósporos para o controle de
Meloidogyne spp. (DE L EIJ et ai., 1992; LOPES et ai., 2007; GIARITTA, 200811
apud PODESTÁ et ai., 2009).
De acordo com os ensaios realizados por Podestá et ai. (2009) e seus
resultados apresentados na Tabela 3, é possível observar um maior vigor das
plantas em relação à altura - em centímetros - e um índice bastante reduzido
de ovos e galhas de nematoides do gênero Meloidogyne em plantas de toma­
teiro quando feita a aplicação de P. chlamydosporia, comprovando, assim, sua
eficiência de controle.
Visto isso, são adicionados, normalmente, de 28 a 42 bilhões de clami­
dósporos do fungo por hectare. Seu modo de aplicação se dá na forma líquida
em jato dirigido ao solo com posterior incorporação mecânica ou via água de
irrigação.

1°KERRY, B.R.; BOURNE, J.M. A manual for research on Vertici/lium ch/amydosporium: a poten­
tial biological contrai agent for root-knot nematodes. Gent: lnternational Organization for Biological
and lntegrated Control for Noxious Animais and Plants, 2002. 84 p.
11 GIARETTA, R.D. Isolamento, identificação e avaliação de Pochonia chlamydosporia no con­
trole de Me/oidogyne javanica e na promoção de crescimento de tomateiro. 2008. 83 p. Tese
Doutorado em Fitopatologia) - Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2008.

38 Série Produtor Rural n' 73


Tabela 3 - Efeito da aplicação de O, 5.000 ou 10.000 clamidósporos de
Pochonia chlamydosporia isolado de Pc-1O em solo natural ou
autoclavado sobre a altura de tomateiros, o número de galhas e
de ovos de Meloidogyne javanica, 60dias após transplantio das
mudas

Altura de plantas (cm)


Tratamento de solo
o 5.000 10.000 Médias
Solo natural 37 36 42 38b
Solo autoclavado 42 42 47 43a

Número de galhas (cm)


Tratamento de solo-----------------
5.000 10.000 Médias
Solo natural 349 334 300 328 a
Solo autoclavado 319 218 181 239b

Número de ovos (cm)


Tratamento de solo
o 5.000 10.000 Médias
Solo natural 244.161 167.571 92.559 168.097a
Solo autoclavado 200.100 415.427 77.083 130.870b
Fonte: Podestá et ai. (2009)

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 39


4.4.5. Trichoderma spp.
O grupo Trichoderma spp. é composto por espécies deste gênero com ativi­
dades nematicidas e fungicidas, atuantes no controle de diversos patógenos de
solo, como os fungos Fusarium so/ani (causador da podridão radicular seca),
Rhizoctonia solani (podridão-radicular), Sc/erotinia sclerotiorum (causador do
mofo-branco) e Thielaviopsis paradoxa (causador da podridão-abacaxi), além
do nematoide-das-lesões (Pratylenchus zeae).
No mercado de biocontrole existem diversos produtos baseados em dife­
rentes espécies de fungos do gênero Trichoderma, dentre as quais se desta­
cam T. harzianum, T. asperellum, I stromaticum, T. koningiopsis e I viride.
Os mecanismos de ação do grupo Trichoderma são variados, podendo se
dar por meio de competição, antibiose, parasitismo e indução de resistência
em plantas (LUCON; CHAVES; BACILIERI, 2014). Na competição, o patóge­
no e o Trichoderma disputam os mesmos recursos para sua sobrevivência,
como alimento e espaço. Essa competição pode impedir que espécies fún­
gicas prejudiciais desenvolvam estruturas de infecção e consigam entrar em
contato com as plantas. Na antibiose, por sua vez, o Trichoderma (ou seja, o
antagonista) produz uma ou mais substâncias que inibem o crescimento ou a
reprodução dos patógenos presentes no solo ou na própria planta em estágio
inicial de infecção. Por fim, o parasitismo consiste na utilização dos fungos pa­
togênicos na alimentação das espécies de Trichoderma. Estes fungos, quando
aplicados de maneira preventiva, podem agir como indutores de resistência
quando entram em contato com a planta, de acordo com Lucon, Chaves e
Bacilieri (2014).
Como comentado anteriormente, a gama de produtos baseados nesse gru­
po de fungos é muito ampla. Assim, as recomendações de dosagem, época e
intervalo de aplicação, bem como seu modo de aplicação, são específicas para
a cultura e para o produto a ser utilizado, sendo indispensável a consulta das
bulas antes da realização do biocontrole.

40 Série Produtor Rural n' 73


4.4.6. Filo Microsporidia ou Microspora
Microsporidia (ou também Microspora) é um filo de fungos que sofreu al­
gumas modificações taxonômicas recentemente, sendo classificado como um
filo pertencente ao reino Protista (o qual inclui protozoários e algas) até o final
do século passado.
De acordo com Fontes e Valadares-lnglis (2020), os microsporídeos são
parasitas intracelulares obrigatórios de animais, tanto vertebrados quanto in­
vertebrados, havendo algumas espécies usadas no controle biológico de gafa­
nhotos no Brasil - dando destaque àAntonospora /ocustae. Os microsporídeos
compreendem mais de 140 gêneros com mil e quatrocentas espécies, embora
sua diversidade atual seja estimada como muito maior (SZUMOWSKI; TROE­
MEL, 2015; WILLIAMS, 2009; CHEN et ai., 2017). Além disso, Góis (2008)
destaca que no controle de cochonilha-algodão (Planococcus citn) - uma das
principais pragas de citros identificadas em Portugal - os microsporídeos são
importantes fatores de regulação das populações de insetos, sendo encon­
trados no trato intestinal desses insetos juntamente com protozoários do filo
Apicomplexa.
Silva, Nascimento e Siqueira (2007) apresentaram resultados interessantes
referentes ao isolamento de microsporídeos do gênero Vairimorpha presentes
em lagarta-da-soja infectadas. Evidenciou-se sintomas como perda do apetite,
problemas de coordenação dos movimentos, mudança de coloração, interfe­
rência no desenvolvimento da pupa e em seu número, e também no número de
posturas pelas fêmeas adultas, acarretando, consequentemente, na diminuição
da população das lagartas e em uma maior redução dos problemas na cultura
da soja. Vale ressaltar que alguns microsporídeos são relativamente virulentos,
podendo matar as larvas antes ou durante a pupação, sendo mais comum,
contudo, causar danos crônicos no hospedeiro (SOLTER; MADDOX, 1999; SIL­
VA; NASCIMENTO; SIQUEIRA, 2007).
Visto isso, os organismos que compõem o filo Microsporidia apresentam
um mecanismo de invasão celular em comum, apesar de existir uma grande
gama de hospedeiros e diferentes tipos de células infectadas (FRANZEN, 2005;

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 41


FRANZEN et ai., 2005; CHEN et ai., 2017). De início, alguns esporos dormentes
dos microsporídeos se aderem às células dos hospedeiros (HAYMAN et ai.,
2005; CHEN et ai., 2017). Em seguida, a infecção inicia-se com a expulsão de
um tubo dos esporos dormentes dos microsporídeos que perfuram a membra­
na plasmática das células do hospedeiro e permitem, assim, uma transferência
de esporos ativos para o interior das células desse hospedeiro (WILLIAMS,
2009; CHEN et ai., 2017).
No entanto, esse parasitismo pode impactar também organismos impor­
tantes no controle biológico e benéficos em determinadas culturas, como é o
caso do gênero de microsporídeos Nosema spp. De acordo com Reis (2012),
os organismos deste gênero alteram importantes parâmetros biológicos do
parasitoide Cotesia flavipes, o qual é responsável pelo controle da broca-da­
-cana-de-açúcar (Diatraea saccharalis). Os parasitoides infectados apresentam
uma menor capacidade em localizar o hospedeiro se comparados a indivíduos
sadios, o que pode impactar negativamente na eficiência das técnicas de bio­
controle.
Dessa forma, ao passo que o mecanismo de ação dos microsporídeos e
sua gama de hospedeiros se mostram bastante amplos e projetam um futu­
ro promissor para possíveis comercializações de produtos biológicos, seus
efeitos sobre espécies benéficas e prováveis desequilíbrios ecológicos nos
agroecossistemas podem ser elevados. Assim, são necessários estudos mais
aprofundados sobre a diversidade do fílo Microsporidia, sua interação com os
hospedeiros e sua capacidade de utilização no controle biológico como um
todo a fim de potencializar a atividade agrícola e estimular a utilização dos
produtos de biocontrole.
Além dos grupos descritos, existem outros produtos baseados em diferen­
tes espécies de fungos que são utilizados no controle biológico. Entre essas
espécies estão:

42 Série Produtor Rural n' 73


• Paeci!omyces lilacinus: amplamente utilizado no controle de nematoides,
principalmente espécies do gênero Meloidogyne;
• Paeci/omyces fumosoroseus: utilizado no controle de mosca-branca
(Bemisia tabac1) em diversas culturas. Além disso, alguns estudos mostram
seu potencial controle de pulgões, como mostra Loureiro e Moino Júnior
(2006);
• Hirsutella thompsonii: atua no controle de algumas espécies de ácaros, prin­
cipalmente em culturas de citros;
• lsaria tumosorosea: usado principalmente para o controle de hemípteros,
como a mosca-branca e pulgões;
• Clonostachys rosea: usados no controle de patógenos fúngicos dos gêneros
Fusarium, Sc/erotinia e Rhizoctonia, além de ser capaz de parasitar insetos e
cistos de nematoides dos gêneros Heterodera e Globodera (TOLEDO et ai.,
2006; VEGA et ai., 2008; SUTTON et ai., 199712 apud SARAIVA et ai., 2014).
• Arthoborus o/igospora: usado no controle do nematoide Me/oidogyne
javanica;
• Dacty/el/a /eptospora: usado no controle de nematoides, principalmente na
cultura dos citros.
De forma a facilitar a organização e visualização dos grupos descritos, a
Tabela 4 mostra os fungos utilizados no controle biológico e seus respectivos
alvos.

12 SUTTON, J.C. et ai. G!iocladium roseum: a versatile adversary oi Botrytis cinerea in crops. Plant
Disease, St. Paul, v. 81, p. 316-328, 1997.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 43


Tabela 4 - Fungos para controle de pragas e doenças e seus respectivos alvos de atuação
Agente de controle Principais alvos*
Deois flavopicta (cigarrinha-das-pastagens)
Metarhizium anisopliae Zu/ia entreriana (cigarrinha-das-pastagens)
Mahanarva fimbriolata (cigarrinha-das-raízes)
Pochonia ch/amydosporia Meloídogyne sp. (gênero de fitonematoides)
Fusarium solanl (fungo da podridão radicular seca)
Rhízoctonia solaní (fungo da podridão radicular)
Trichoderma spp. Sc/erotinia sc/erotiorum (fungo do mofo-branco)
Thielaviopsis paradoxa (fungo da podridão-abacaxi)
Pratyfenchus zeae (nematoide-das-lesões)
Tetranychus urticae (ãcaro-raíado)
Gonipterus scutellatus (gorgulho-do-eucalipto)
Hypothenemus hampe/ (broca-do-café)
Beauverla bassiana Orthezia praelonga (cochonilha-ortêzia)
Bemlsia tabaci (mosca-branca)
Coptotermes sp. (cupins)
Cosmopolites sordidus (moleque-da-bananeira)
Phyl/ocoptruta oleivora (ácaro-da-falsa-ferrugem)
Algumas espécies de Chorthippus (gafanhotos)
Filo Microsporidia Planococcus citri (cochonilha-algodão)
Anticarsía gemmata/is (lagarta-da-saía)
Paecilomyces !ílacinus
Meloidogyne sp. (gênero de fitonematoides)
Arthoborus oligospora
Paecilomyces fumosoroseus Bemisia tabaci (mosca-branca)
/saria tumosorosea Ordem Stemorrhyncha (pulgões)
Hírsutella thompsonii Algumas espécies de ácaros
Gênero Fusarium (podridão radicular)
Gênero Sc/erotinia (mofo-branco)
Gênero Rhizoctonia (podridão radicular)
Clonostachys rosea
Nematoides do gênero Heterodera
Nematoides do gênero Globodera
Dactylella leptospora Algumas espécies de nematoides, principalmente na cultura
dos citros
Anticarsia gemmata/is
Chrysodeixis inc/udens
Cofias /esbia
Helicoverpa armigera
Metarhizium rileyi Helicoverpa zea
Heliothis vírescens
Plathypena scabra
Pseudoplusía includens
Spodoptera frugiperda
Trichop/usía ni
* Uso em qualquer cultura na qual ocorram

44 Série Produtor Rural n' 73


4.5. Ácaros
Os ácaros predadores são empregados para o controle biológico como
uma opção para auxiliar no manejo integrado de pragas. As principais pragas
controladas por ácaros predadores no cenário agrícola são: ácaros fitófagos,
que alimentam-se de plantas, tripes, mosca-branca e pragas de solo como a
mosca fungus gnats (POLETTI, 2010).
Abaixo estão os ácaros mais empregados no biocontrole de pragas
do Brasil:

4.5.1. Stratio/ae/aps scimitus


O Stratiolaelaps scimitus é um ácaro predador que atua no controle de uma
praga de solo comum em viveiro de mudas de hortaliças, plantas ornamentais
e frutíferas, a mosca fungus gnats. O ácaro atua predando o ovo e a larva da
praga (POLETTI, 2010).

Figura 8 - Stratiolaelaps scimitus predando ovo e larvas de fungus gnats


Fonte: a esquerda, Planei Natural Research Center (2014); a direita, Moreira (2019)

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 45


4.5.2. Phytoseiu/us macropilis e Neoseiu/us californicus
Outros dois ácaros empregados no biocontrole são o Phytoseiu/us
macropilis e o Neoseiu/us ca/ifornicus, ambos da família Phytoseiidae, im­
portantes no controle de ácaros fitófagos. Os dois ácaros citados predam to­
das as fases de desenvolvimento do ácaro-rajado, praga de diversas culturas
de importância econômica. Existe diferenciação entre estas duas espécies
quanto aos hábitos alimentares. O ácaro predador P. macropilis possui uma
dieta específica de ácaros-rajados, desenvolvendo-se facilmente em grandes
populações da praga e morrendo na ausência dela. Já o ácaro predador N.
ca/ifornicus possui uma dieta mais ampla, alimentando-se de pulgões, tripes,
pólen e ácaro-rajado, permitindo sua sobrevivência em uma população mais
baixa da praga, possibilitando sua utilização em baixas a médias infestações
da praga (SATO, 2020).

Figura 9 - A esquerda, o ãcaro P. macropilis e, a direita, o ãcaro Neoseiu/us ca/ifornicus, ambos


predando o ácaro-rajado
Fonte: a esquerda, Alchetron; a direita, Good Frui! and Vegetables (2020)

46 Série Produtor Rural n' 73


4.5.3. Amblyseius tamatavensis
O Amb/yseius tamatavensis, ácaro nativo do Brasil, também da família
Phytoseiidae, tem mostrado eficiência no controle da mosca-branca biótipo B,
presente principalmente na cultura do tomate (ALVARO, 2019). Recentemente
houve o registro deste ácaro no MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento).

4.5.4. Aplicação
Quanto à aplicação de ácaros, esta pode ser calculada em quantidade de
ácaros por metro quadrado ou hectare, e a dose varia de acordo com o produto
e a situação analisada. Geralmente, são aplicados de centenas a milhares de
indivíduos por metro quadrado e de dezenas a centenas de milhares por hec­
tare. O recipiente contendo os ácaros pode variar de tamanho e quantidade de
ácaros predadores, sendo necessário a rápida utilização do produto após seu
recebimento.

Tabela 5 - Ácaros utilizados no controle biológico e seus respectivos alvos

Agente de controle Principais alvos*

Phytoseiulus macropilis
Neoseiulus ca/ifornicus Tetranychus urticae (ãcaro-rajado)
Phytoseiulus persimilis

Amblyseius tamatavensis Bemisia tabaci biótipo B (mosca-branca)


Neoseiulus cucumeris
Neoseiulus barkeri Tripes
/phiseius degenerans
Hypoaspis spp.
Fungus gnats (mosca-dos-fungos)
Stratio/aelaps scimitus
*Uso em qualquer cultura na qual ocorram

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 47


4.6. Vírus
Dentre os mais de 20 grupos de vírus conhecidos por apresentar patoge­
nicidade a insetos, a principal família de vírus utilizada como agente biológico
de controle é a Baculovírus (MARTIGNONI; IWAI, 198613 apud VALICENTE,
2009), a qual possui o maior potencial de controle e que envolve tipos virais
que agem especificamente sobre invertebrados e, por isso, apresentam baixo
risco ao meio ambiente. Essa família se divide em dois gêneros, os granulo­
vírus e os nucleopoliedrovírus, sendo este último o que envolve as espécies
mais utilizadas (VALICENTE; TUELHER, 2009) e que é conhecido como
vírus da poliedrose nuclear. O gênero Nucleopoliedrovírus ainda se
divide nos sub-gêneros: "Vírus de Simples Nucleocapsídeo" (SNPV) e
"Vírus de Múltiplos Nucleocapsídeos" (MNPV).

Nudeopolyhedrovirus Granulo,irus

.?..OOO qm 2.000tpn

M:\'PV S'.\'PV GV

Figura 1 O - A família baculovírus


Fonte: Craveiro (2012)

13 MARTIGNONI, M.E.; IWAI, P.J. A catalogue oi virai diseases oi insecls, mites, and tlcks. 4111 ed.
Port!and: USDA, Fores! Service, Pacific Northwest Research Station, 1986. 51 p. (USDA. General
Technical Report, PNW-195).

48 Série Produtor Rural n' 73


Um aspecto importante a se ressaltar quanto aos baculovírus é sua estru­
tura de resistência e proteção que permite a transmissão do vírus de um inseto
para o outro (transmissão horizontal) (BLISSARD; ROHRMANN, 199014 apud
VALICENTE, 2009). Assim, o vírus apresenta infectividade mesmo estando fora
do hospedeiro (HUNTER-FUJITA et ai., 199815 apud VALICENTE, 2009), o que
possibilita formular bioinseticidas que consigam ser armazenados enquanto
não forem usados no campo.

Figura 11 - Vírus da poliedrose nuclear em uma célula.


Fonte: Valicente (2020)

Em primeiro lugar, é necessário entender que os vírus que serão descritos


possuem mecanismo de ação similar, agem sobre lagartas e necessitam estar
presente nas folhas para apresentarem efeito, uma vez que serão ingeridos
quando lagartas consumirem os fragmentos vegetais.

"BLISSARD, C.W.; ROHRMANN, e.E. Baculovirus dlversity and molecularbiology. Annual Review
oi Entomology, Palo Alto, v. 35, p. 127-155, 1990.
15 HUNTER-FUJITA, E.R. et ai. (Ed.). lnsect viruses and pest management. New York: John Wiley,
1998. 632 p.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 49


Quanto à ação dos vírus, ao serem ingeridos e entrarem em contato com a
condição alcalina do trato digestivo do inseto, terão a cobertura proteica dissol­
vida e liberarão as partículas virais, promovendo a infecção no organismo. Tais
partículas penetrarão nas células do sistema digestivo e passarão a se replicar
ao se aproveitarem do metabolismo, espalhando-se pelo corpo do organismo
principalmente via "sangue" (Figura 12). Como a replicação acarreta na ruptura
da célula da lagarta e ela ocorre em todos os tecidos, a lagarta acaba mor­
rendo (VALICENTE; TUELHER, 2009), o que demora de 4 a 6 dias após feita a
aplicação.

NPV infection of an insect host

�-�r�
MI GUT

lnge.stion of

• - • - •�=i7
l)1d>lut1on of polyhedra, relm<lng vir,oM:

Polyhedro with
embedded vírions

Peritrophíc
membrone
1-----------­ --�-

Figura 12 - Processo de infecção da lagarta pelo baculovlrus. Inicialmente ocorre a ingestão do


vírus, o qual ao entrar em contato com um diferente pH do trato digestivo, terá sua cobertura
dissolvida. Com isso, libera-se as partículas virais, que penetram nas células do trato digestivo.
Assim, inicia-se o processo de replicação e disseminação do vírus pelo corpo do inseto. Apôs
a replicação, ocorre a quebra das membranas celulares, e isso ocorrendo nos diversos tecidos,
provoca a morte do inseto, liquefazendo-o internamente
Fonte: Valicente (2020}

50 Série Produtor Rural n' 73


Um ponto relevante é o de que após a morte da lagarta, os seus tecidos se
liquefazem e esse líquido está repleto de vírus (infecção secundária), acarre­
tando em novos ciclos de infecção e rápida infestação. Assim, recomenda-se
que seja feita a coleta de lagartas mortas na lavoura, para posterior processa­
mento destas e pulverização do líquido resultante repleto de baculovírus sobre
a cultura. Para tanto, atualmente, obteve-se alguns isolados de baculovírus
cujas lagartas infectadas não apresentaram liquefação de seus tecidos (Figura
13), o que facilita e otimiza a coleta dessas larvas, melhorando o controle.

Figura 13- Lagartas infectadas por baculovlrus, sendo que na esquerda, diferente da direita, houve
liquefação dos tecidos
Fonte: a esquerda (USDA, 2020); a direita (F. Valicente)

Alguns sintomas que podem ser observados nas lagartas infectadas são a
perda de apetite, a redução de mobilidade, a descoloração e o aspecto flácido
e oleoso do corpo. Outro fato interessante é que o inseto morre dependurado
pelas patas abdominais.
Como relatado, a infecção pelo vírus ocorre via ingestão de folha pela lagar­
ta, desta forma, fatores que influenciam na alimentação da lagarta são extrema­
mente importantes, como o tamanho da larva, o qual relaciona-se com a taxa de
alimentação, e o comportamento alimentar. Além disso, é necessário que a folha
esteja coberta do vírus, o que é afetado pela qualidade da pulverização. Por fim,
as condições climáticas também interferem, sendo que em período chuvoso os

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 51


vírus são mais virulentos e se espalham mais, e em períodos abaixo de certa
temperatura a lagarta tende a não se alimentar, não sendo infectada.
Quando se trata das pragas Helicoverpa armigera e Spodoptera trugiperda
(lagarta-militar) é importante ressaltar que o período ideal de aplicação do pro­
duto é quando essas lagartas se encontram entre o primeiro e o terceiro ínstar,
de 1 a 13 mm e de 1 a 8 mm, respectivamente. Já a lagarta-falsa-medideira
(Chrysodeixis includens) é tolerável até o quarto ínstar, ou seja, de 1 a 16 mm.
Em relação ao uso dos vírus como agente de biocontrole, a morte dos
insetos não é rápida, porém após terem sido infectados reduzem em até 93%
a sua alimentação e também diminuem sua mobilidade (VALICENTE, 2020).
Outro ponto de destaque é a complexidade da produção massal deste biode­
fensivo, o que pode ser um obstáculo para a expansão de seu uso.
Ademais, vale lembrar que são encontrados não só produtos com uma es­
pécie, mas também existem produtos com uma mistura de espécies de vírus.
Sua aplicação pode alcançar 300 bilhões de corpos virais por hectare.
Em suma, existem diversos vírus encontrados que são potenciais agentes
de controle biológico, exemplos são para o controle do mandarová em algumas
culturas (Granulovírus Erinnyis e/lo) (BARRERA et ai., 2014), e para o controle
da lagarta-do-álamo (Baculovirus Condylorrhiza vestigialis) (CASTRO et ai., 2004).
O mandarová-da-mandioca (Erinnyis e/lo L.) ataca as folhas de todas as
idades, dando preferência às mais novas, podendo causar uma desfolha total
das plantas, prejudicando a produtividade da planta desfolhada, reduzindo em
até 64% do rendimento das raízes, e também favorecendo o crescimento de plan­
tas daninhas por aumentar a incidência de luz no solo (RINGENBERG et ai., 201O).
A infecção da lagarta por Granulovírus Erinnyis ello acontece também após
a ingestão das folhas com o vírus. Assim como ocorre em outras espécies
infectadas por Baculovírus, os sintomas após a infecção são vômitos, corpo
flácido, palidez, letargia e, então, morte da lagarta. Do mesmo modo, devido
à sua ação um pouco mais lenta, é importante aplicar nos estádios iniciais da
praga para reduzir os danos causados pela desfolha e aumentar a sua eficiência,
pois a sua ação está associada ao tamanho e ao sistema imunológico da lagar-

52 Série Produtor Rural n' 73


ta, sendo a sua mortalidade maior naquelas que estão nos primeiros estágios
larvais (FAZOLIN et ai., 2007; RINGENBERG et ai., 2010).
Abaixo se encontra uma tabela (Tabela 6) de exemplares virais e seus al­
vos respectivos, sendo possível evidenciar que tais agentes não possuem um
grande espectro de hospedeiros. Nesta tabela se encontram os principais vírus
utilizados atualmente para o controle de pragas como também os que estão
sendo pesquisados.

Tabela 6 - Vírus para controle de pragas agrícolas e seus respectivos alvos de


atuação

Agente de controle Principais alvos*

**AgMNPV -Anticarsia gemmatalis Anticarsia gemmatalis (lagarta-da-soja)


multiple nuc/eopo/yhedrovirus He/icoverpa armigera (lagarta-do-algodão)
**AcMNPV - Autographa californica
Helicoverpa armigera (lagarta-do-algodão)
multiple nuc/eopo/yhedrovirus
**ChinNPV - Chrysodeixis includens Chrysodeixis inc/udens/Pseudoplusia
nuc/eopotvhedrovirus includens (lagarta-falsa-rnedi deira)
Cu/ex nigripalpus (mosquito vetor de doenças
CuniNPV - Cu/ex nigripalpus humanas)
nucteopolyhedrovirus Cu/ex quinquetasciatus (mosquito vetor de
doenças humanas)
HearGV - Helicoverpa armigera He/icoverpa armigera (lagarta-do-algodão)
granulovírus

**HearNPV _ Helicoverpa armigera Helicoverpa armigera (lagarta-do-algodão)


nucleopolyhedrovirus Heliothis virescens (lagarta-da-maçã)
Helicoverpa zea (broca-grande-do-fruto)
**HezeSNPV - Helicoverpa zea single
He/icoverpa armigera (lagarta-do-algodão)
nucleopolyhedrovirus
SeNPV - Spodoptera exígua Spodoptera exígua
**SfMNPV - Spodoptera frugiperda Spodoptera frugiperda (lagarta-militar ou
nucleopolyhedrovirus lagarta-do-cartucho-do-milho)
*Uso em qualquer cultura na qual ocorram i
••Agentes de controle mais disseminados na agricultura brasile ra

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 53


4.7. Insetos
Os insetos representam uma parte importante dos atuais produtos dispo­
níveis no mercado de controle biológico (ABCBio, 2019). Os principais insetos
comercializados podem ser divididos em grupos de acordo com o mecanismo
de controle executado, dividindo-os em parasitoides, predadores e insetos es­
téreis.
Os parasitoides têm como mecanismo de ação a colocação de ovos, ato
conhecido como oviposição, em lagartas, pupas ou ovos de pragas, com
consequente desenvolvimento do parasitoide e morte da praga (BUENO;
SPALDING; BUENO, 2020). Exemplos de parasitoides são: Cotesia flavipes,
Telenomus podisi, Trissolcus basa/is, Tetrastichus howardi e insetos do gênero
Trichogramma.
Os predadores realizam o controle por meio da predação direta, com
utilização da praga para sua alimentação. Exemplos de predadores são:
Cryptolaemus montrouzieri e Orius insidiosus.
Os insetos estéreis têm como mecanismo de ação o impedimento do sur­
gimento de novos indivíduos de pragas, por meio da realização de uma re­
produção ineficiente. O indivíduo estéril ao cruzar com o fértil não permite a
formação de novos indivíduos. Um exemplo de inseto desse grupo é a pupa
de macho estéril da mosca das frutas, Ceratitis capitala (IMPERATO, 2015).
Serão descritos os insetos mais empregados no biocontrole de pragas na
agricultura brasileira.

4.7.1. Cotesia f/avipes


A Cotesia f/avipes, uma microvespa parasitoide, atua no controle da praga
broca da cana-de-açúcar. O mecanismo de ação dela se dá pela colocação de
ovos no corpo da lagarta da broca, os quais liberam novos indivíduos da vespa
que parasitam e matam a lagarta ao se desenvolverem e completarem seu ciclo
usando a estrutura da lagarta como suporte e fonte nutricional (NAVA, 2009).

54 Série Produtor Rural n' 73


Figura 14 - À direita, Cotesia ffavipes ovipositando na broca-da-cana. À esquerda, larvas de
Cotesia f/avipes saindo do corpo da lagarta da broca
Fonte: a esquerda, Negri (2012); a direita, Oliveira (2015)

4.7.2. O Gênero Trichogramma


As microvespas parasitoides do gênero Trichogramma incluem
T. galloi, T. pretiosum e o T. atopovirilia. O mecanismo de ação entre
eles é semelhante, e se dá pela colocação de seus ovos em ovos da
praga-alvo. Os ovos ao se eclodirem liberam indivíduos que parasitam e
matam os ovos da praga ao se desenvolverem e completarem seu ciclo.
A diferença entre as espécies do gênero se dá pelas pragas controladas,
sendo T. gal/oi responsável pelo controle da broca da cana-de-açúcar,
e o T. pretiosum juntamente com o T. atopoviri/ia de pragas como
Spodoptera trugiperda (lagarta-do-cartucho), He/icoverpa zea (lagarta­
da-espiga-do-milho), Chrysodeixis includens (lagarta-falsa-medideira),
entre outras (PARRA, 2015; BESERRA; PARRA, 2004).
Um estudo conduzido com as espécies T. pretiosum e T. atopovirilia,
visando à comparação do parasitismo em ovos de Spodoptera
trugiperda (lagarta-do-car tucho), mostrou uma diferença significativa
do número de ovos parasitados pela espécie T. atopovirilia em relação
a T. pretiosum, sendo a primeira responsável pelo maior ataque aos
ovos do hospedeiro e consequentemente uma espécie promissora para
o controle dessa praga (BESERRA; PARRA, 2004). Assim, o estudo

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 55


pressupõe que o T. atopovirilia é mais eficaz no controle de pragas que
possuem ovos mais aglomerados e sobrepostos, como no caso da
Spodoptera, pelo fato de conseguir atingir os ovos mais internos.
É importante relatar a ausência do registro de T. atopovirilia no MAPA
como um produto biológico, desta forma a manutenção natural deste
organismo na área produtora pode ser feito, por exemplo, através da
utilização de inseticidas seletivos ao parasitoide.

Trlc.hogrammo parasitando ovos

Escureornento dos OYOS


Emergé:no. do para.satotde • Indicando parasitismo
busc• por nows c,;os

Figura 15 - Ciclo comum do gênero Trichogramma


Fonte: Nora (2020)

4.7.3. Telenomus podisi


Telenomus podisi, que também é uma microvespa parasitoide, tem o me­
canismo de ação semelhante ao Trichogramma, mudando apenas a praga em
que atua, o percevejo-marrom, praga importante na cultura da soja (PACHECO
et ai., 2000).

56 Série Produtor Rural n' 73


Figura 16 - Tetenomus podisí ovlpositando ovos do perceveío-marrom
Fonte: Carneiro (2020)

4.7.4. Trisso/cus basa/is


Outra microvespa parasitoide de ovos, ou seja, que coloca ovos dentro dos
ovos da praga, é a Trisso/cus basa/is, utilizada para o controle de percevejos na
cultura da soja, principalmente o percevejo-verde (CORREA, 1993).

Figura 17 - Trlssolcus basa/is oviposltando nos ovos do percevejo-verde


Fonte: Haydu (1991)

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 57


4.7.5. Orius insidíosus
O Orius insidiosus é um percevejo do grupo dos predadores e apresenta
o aspecto generalista, atuando sobre diversas pragas. Porém, em produtos
registrados pelo MAPA, ele é recomendado somente para o controle de tripes,
por meio da predação destes em suas diversas formas de desenvolvimento
(LEFEBVRE, 2013).

Figura 18 - Orius insid/osus predandouma ninfa de tripes


Fonte: Moreira (2019)

4.7.6. Ceraeochrysa cubana e Chrysoperla externa


Esses dois crisopídeos são predadores e conhecidos popularmente como
"bicho-lixeiro". Eles possuem diversidade alimentar e, por isso, são responsá­
veis pelo controle de diversas pragas, como afídeos, pequenas lagar tas, áca­
ros, cochonilhas, moscas-brancas e pulgões (ALVIM, 2016). Não há o registro
de um produto comercial no MAPA, porém há a sua comercialização em peque­
na escala. A melhor estratégia para manutenção do "bicho-lixeiro" na área é a
utilização de inseticidas seletivos a este inseto.

58 Série Produtor Rural n' 73


Figura 19-A esquerda, a fase larval do "bicho-lixeiro", que possui carapaça com restos de presas.
A direita, um 'bicho-lixeiro" adulto
Fonte: a esquerda, Soares (2017); a direita, Total Survival (2020)

4.7.7. Doru /uteipes


Conhecido popularmente como "tesourinha", este predador generalista é
importante pela sua alta fome e capacidade de atacar diversos insetos-pra­
ga, principalmente em suas formas jovens e ovos. Algumas pragas impor­
tantes atacadas pela "tesourinha" são: bicudo-do-algodoeiro, broca-da-cana e
Spodoptera frugiperda (lagarta-do-cartucho), sendo esta última praga
uma importante causadora de prejuízos em muitas culturas, mas em especial
à do milho (SILVA, 2017). Não há registro de um produto comercial com este
predador no MAPA, assim é essencial que se mantenha a população natural de
Doru /uteipes através da utilização de produtos químicos seletivos.

Figura 20 - Doru Juteipes predando ovos de Spodoptera frugiperda


Fonte: Aickr (2018)

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 59


4.7.8. Família Coccinellidae
A família Coccinellidae presente na ordem Coleoptera é conhecida por
apresentar predadores característicos do controle biológico: as joaninhas.
Estes insetos em sua maioria são predadores generalistas, alimentando-se
principalmente de pulgões. As fases adultas e de larvas realizam o controle
biológico (OLIVEIRA et ai., 2004). O único produto registrado no MAPA é de
Cryptofaemus montrouzieri, uma joaninha predadora responsável pelo controle
de pulgões e da praga cochonilha-rosada (SANCHES et ai., 2010). É importan­
te frisar que a manutenção da população natural de joaninhas é necessária e
pode ser realizada por meio da aplicação de inseticidas seletivos.

Figura 21- Crypto/aemus montrouzieri pre­


dando cochonilha-rosada
Fonte: Triffecta (2021)

Figura 22 - Joaninha predando pulgões


Fonte: Schwanz (2017)

60 Série Produtor Rural n' 73


4.7.9. Outros insetos usados como agentes de controle
Alguns insetos também importantes para o controle de pragas nas lavou­
ras, principalmente nas culturas de soja, milho, cana e algodão são descritos
na tabela abaixo (Tabela 7). É importante comentar que grande parte destes ci­
tados não são comercializados, então é importante que se realize sua manuten­
ção no agroecossistema. Alguns dos insetos mencionados são incomuns no
Brasil, porém apresentam grande importância no controle biológico mundial.

Tabela 7 - Insetos utilizados como agentes biológicos de controle


(continua)
Agente de controle Principais alvos*
Trichapada giacome/1/1 Percevejo-verde
Cotes/a llavipes Broca-da-cana-de-açúcar (Diatraea saccha1a/is)
Trichogramma galloi Broca-da-cana-de-açúcar (Diatraea saccharatis)
Chrysodeixis inc/udens (lagarta-falsa-medideira)
Trichogramma pretiosum Helicoverpa zea
Trichogramma atopovirilia Spodoptera frugiperda (lagarta-militar ou lagarta-do-cartu­
cho-do-milho)
Te/enomus podlsi Percevejo-marrom
Trisso/cus basa/is Percevejo-verde
Orius insidiosus Tripes
Cochonilha
Mosca-branca
Ceraeochrysa cubana Pequenas lagartas
Ácaros
Pulgões
Cochonilha
Mosca-branca
ehrysoperla externa Pequenas lagartas
Ácaros
Pulgões
Spodoptera frugiperda (lagarta-militar ou lagarta-do-cartu­
Doru luteipes cho-do-milho) (ovos e lagartas pequenas)
Helicoverpa zea (ovos e lagartas pequenas)
Família Coccinellidae Pulgões
Pupa de macho estéril da Mosca-das-frutas
mosca das frutas
Tetrastichus howardi Helicoverpa a1migera (lagarta-do-algodão)
Broca-da-cana-de-açúcar (Diatraea saccharalis)

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 61


Tabela 7 - Insetos utilizados como agentes biológicos de controle (conclusão)
Agente de controle Principais alvos*
Calosoma sp. Lagartas desfolhadoras
Mosca-branca
Geocoris spp. Bemisía spp.
Lagartas de primeiro e segundo Instar
Ácaros
Helicoverpa zea
Nabis spp. Anticarsia gemmatalis (lagarta-da-soja)
Chrysodeixis includens (lagarta-falsa-medideíra)
Diabrolica speciosa
Anticarsia gemmatalis (lagarta-da-soja)
Podisus nigrispinus Chrysodeixis includens (lagarta-falsa-medideira)
Complexo Spodoptera
Alcaeorrhynchus grandis Anticarsia gemmatalis (lagarta-da-soja)
Microcharops bimaculata Anticars ia aemmatalis !lagarta-da-soja\
Te/enomus remus Complexo Spodoptera
Hexacl<ldia smithii Percevejo-marrom
Encarsia formosa
Eretmocerus mundus
Mosca-branca
Eretmocerus eremicus
Macrolophus pYqmaeus
Feltiella acarisuga Ácaros
Aphelinus abdominalis
Aphidius ervi
Pulgões
Episyrphus baiteatus
Aphidius cotemani
Dacnusa s1biriCê.
Moscas-minadoras
Dig/yphus isaea
LeptomastÍX dacty/opii Cochonilha-farinhenta
Lydella minense
Hypobracon sp. Broca-da-cana-de-açúcar (Diatraea saccharalis)
Agathis sp. (parasítoldes de larva)
Para/heresia claripa/pis
Xanthopimpta stemmator
Broca-da-cana-de-açúcar (Diatraea saccharalís)
Trichospilus diatraeae
(parasitoides de pupa)
Palmistichus elaeisis
Te/enomus remus Spodoptera trugiperda (lagarta-militar ou lagarla-do-car­
(parasitoide de ovos) tucho-do-milho)
*Uso em qualquer cultura a qual ocorram

62 Série Produtor Rural n' 73


4.7.10. Aplicação
A aplicação de insetos se dá pela liberação de uma quantidade determinada
de indivíduos, geralmente dezenas a centenas de milhares por hectare, poden­
do esta área ser dividida em pontos de aplicação. Atualmente, é possível tanto
a aplicação aérea por drones ou aviões como a aplicação terrestre.
Os recipientes de produtos variam conforme o tipo e quantidade de insetos
e modo de aplicação. É importante ressaltar que certos produtos trazem os
insetos em estágios de pupa, sendo necessário uma aclimatação do produto
antes de sua liberação para que se obtenha o efeito de controle desejado.

Figura 23 - A esquerda, aplicação de Cotesia f/avipes via drone. A direita, aplicação terrestre de um
Inseto usado no controle biológico
Fonte: a esquerda. Geocom; a direita, Revista RPAnews (2019)

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 63


o A demanda mundial por alimentos tende a aumentar
•◄ nos próximos anos. Para tanto, os países produtores de­
cn
...
::, vem aumentar suas produções para que esta demanda
seja suprida e isso pode ser feito, ou pelo aumento de área
CJ
z agrícola, ou pelo aumento de produtividade. Tendo em vista
o a sustentabilidade do agroecossistema, a primeira opção
CJ não é viável, assim, a saída para os produtores é que haja
o incremento na produtividade. Esse feito tende a ser al­
cançado conforme a produção agrícola se transforme de
um modelo convencional para um sustentável, isto é, que
abarque mais tecnologias e conhecimentos no processo
produtivo, reduzindo o impacto ambiental e mantendo o
equilíbrio ecológico.
Por esse motivo, o surgimento de uma agricultura mo­
derna que emprega tais saberes tornará o sistema mais
resiliente, ou seja, com maior capacidade de suportar es­
tresses bióticos e abióticos, o que reduzirá o impacto ne­
gativo do homem no meio.
Nesse contexto, o uso de produtos biológicos é desta­
que visto os benefícios propiciados. Em especial no con­
trole de pragas e doenças, agentes de controle biológico
são casos de sucesso, vide o crescimento promissor das
empresas desse setor. Além disso, pesquisas sobre esse
tema têm sido feitas com o objetivo de desenvolver e me­
lhor compreender novos organismos.
Por fim, o conhecimento gerado deverá alcançar os
produtores, onde se destaca o papel do engenheiro agrô­
nomo na função de difusão destas tecnologias para o esta­
belecimento de uma agricultura moderna que seja produti­
va e ao mesmo tempo sustentável.

Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 65


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Uma visão panorâmica do controle biológico na agricultura moderna 87


Gn,po do (domôo om Mictobóologlo do Solo
ESAI.Q - USP

Vftor Gazotto Cassiolato


Felípe Nogueira de Sá Marto
UviaAmaral
Cauê Carmona Groot
Laura Scovoli Soares Biston
Bianca Gonçalves Rodrigues
Fernando DiniAndreote
A Série Produtor Rural é
editada desde 1997 pela
Divisão de Biblioteca da
Escola Superior de
Agricultura "Luiz de
Queiroz"/USP e tem
como objetivo publicar
textos acessíveis aos
produtores com temas
diversificados e
informações práticas,
contribuindo para a
Extensão Rural.

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