Cognatos e Falsos Amigos LSB e ASL

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Capítulo 4

Cognatos e falsos amigos entre LSB


e ASL
Thaysa dos Anjos Silva Romanhol1 Leandro Andrade Fernandes2

Resumo: O objetivo deste trabalho é comparar elementos lexicais da Língua


de Sinais Americana (ASL) e a Língua De Sinais Brasileira (LSB) a partir de uma
possível influência histórica da Língua de Sinais Francesa (LSF). O corpus para
esta investigação foi coletado do site de recursos American Sign Language Uni-
versity (ASLU). Foram coletados quinhentos e noventa e cinco sinais em ASL a
serem comparados com a LSB. Neste cotejo, o instrumento utilizado para a com-
paração na LSB foi o vocabulário presente no Novo DEIT-Libras e, a posteriori,
os sinais foram transcritos. Foi empregado para a escrita dos sinais aqui examina-
dos o Sistema Brasileiro de Escrita de Sinais – ELiS, por considerar que esta escrita
melhor representa as línguas de sinais. Os elementos lexicais analisados foram
divididos em cognatos, vocabulários similares e falsos cognatos. Certificou-se que
um mesmo signo possui um valor diferenciado se comparado com outra LS, com-
provando a arbitrariedade presente nessas línguas.

Palavras-chave: Cognatos. Falsos amigos. Línguas de Sinais.

1 Mestranda em Estudos da Linguagem pela Universidade Federal de Goiás-UFG/Regional


Catalão, bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás-FAPEG; pro-
fessora auxiliar de Libras na Universidade Federal de Uberlândia-UFU. Contato: thaysa.
[email protected].
2 Mestrando em Estudos da Linguagem pela Universidade Federal de Goiás-UFG/Regional
Catalão, bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás-FAPEG; pro-
fessor auxiliar de Libras na Universidade Federal do Tocantins-UFT. Contato: leandroan-
[email protected].
56 Perspectivas em estudos da linguagem

Apresentação

As inquietações para a realização desse trabalho surgiram do grupo de estu-


dos LALELIS3 criado na Universidade Federal de Goiás. As pesquisas na área de
cognatos em Línguas de Sinais, doravante LS, são pouquíssimas, principalmente
as envolvendo a LSB. A ideia geral desse estudo é comprovar ou refutar a hipótese
da ligação entre Língua de Sinais Americana (ASL) e a LSB como descendentes da
Língua de Sinais Francesa (LSF), a partir de comprovações históricas, bem como
verificar a similaridades de ambas as línguas. O corpus foi coletado em um site de
ensino da ASL, e comparado com os sinais de um dicionário de grandes corpora
da LSB. Foi usado para a escrita desses dados o Sistema Brasileiro de Escrita das
Línguas de Sinais-ELiS, que procura descrever os sinais a partir de seus parâme-
tros linguísticos. Será que a LSF tem grande participação lexical na descendência
da LSB e ASL? A quantidade de cognatos entre ambas as línguas poderia auxiliar
no aprendizado uma da outra? Elas possuem um grande léxico em comum?

1 Línguas de sinais em questão


As LS, e em especial os falantes surdos, foram alvos de discriminação durante
um longo período. O processo histórico da educação de surdos foi marcado por
conflitos desde a Idade Antiga, quando Aristóteles já alegava que só através da
linguagem uma pessoa poderia se tornar humana, e no caso dos surdos, estes
se caracterizavam como uma espécie sem chances de desenvolver as faculdades
intelectuais, tornados assim seres “insensatos e naturalmente incapazes de razão”
(STROBEL, 2009, p. 18). As pessoas com algum tipo de deficiência, nesse caso os
surdos, eram reconhecidos sob a perspectiva de uma abordagem clínica, medica-
mentosa, na qual era possuidor de um mal que deveria ser curado. Anos depois,
já na Idade Moderna, o monge Pedro Ponce de León (1520-1584) viveu na Espa-
nha e dedicou parte de sua vida à educação de Surdos, impulsionando com o
seu trabalho o abatimento de crenças firmadas no passado. Ele se dedicou aos
surdos utilizando como métodos de ensino simultâneos à escrita, dactilologia4 e
a oralização das palavras. Charles Michel de L’Epée (1712-1789) foi o primeiro
nome a considerar os “sinais” como a língua dos surdos, sendo o responsável pela
fundação do Instituto Nacional de Surdos-Mudos em Paris. Ele se apropriou do

3 Laboratório de Leitura e Escrita em LS, coordenado pela Professora Doutora Mariângela


Estelita de Barros.
4 Grafia atual: “datilologia”. Definição de Coutinho (2009, p. 49): Termo empregado
quando se utiliza o “alfabeto manual para a soletração de palavras das Línguas Orais”.
No caso acima, a soletração de palavras da língua espanhola.
Cognatos e falsos amigos entre LSB e ASL 57

alfabeto manual de León e criou seu próprio sistema baseado em uma estrutura
visual para ensinar a escrita do francês.
Nos Estados Unidos a LS obteve maior sucesso com Thomas Gallaudet e Lau-
rent Clerc. A procura de uma metodologia pela qual os surdos pudessem compreen-
der melhor os conteúdos em LS, Gallaudet vai à Inglaterra ao encontro de Sicard
e Clerc. Em 1817, Gallaudet e Clerc seguem para os EUA e fundam a escola inti-
tulada “American Asylum fot the Instruction and Education of Deaf ans Dumbs”.
A respeito da língua pela qual ele desenvolveu suas instruções, “no início, Clerc
trabalhou, sobretudo, com base na língua gestual francesa, que acabaria por evoluir
para uma língua gestual americana construída sob diferentes influências internas”
(COUTINHO, 2008, p. 40). A partir do contato entre LSF e ASL, os surdos que pas-
savam pela referida instituição fundavam outras escolas e disseminavam a língua
que outrora fora aprendida. Contudo, segundo Savitt (2007), a atual ASL pode ter
sofrido algum tipo de influência de outras LS já existentes nos EUA antes da che-
gada de Clerc, como é o caso da ilha de Martha Vineyard, de 1690. Devido a uma
doença hereditária que atacou grande parte da população, esta ilha ficou conhecida
pela grande quantidade de surdos que utilizavam a chamada Martha’s Vineyard
Sign Language-MVSL para se comunicarem.
Registros históricos apontam que a LSF influenciou não somente a ASL, mas
também a Língua de Sinais Brasileira-LSB. Ernest Huet foi um surdo francês que
veio para o Brasil em 1852 negociar com o imperador a implantação de uma escola
para surdos e trouxe com ele a LSF. Somente em 1857 conseguiu a aprovação
legal para o funcionamento do Instituto dos Surdos Mudos, atual Instituto Nacio-
nal de Educação de Surdo-INES (ROCHA, 2008). Dessa forma, Huet “trouxe o
alfabeto manual francês e alguns sinais para o Brasil. Os surdos brasileiros, que
deviam usar algum sistema de sinais próprio, em contato com a Língua de Sinais
Francesa (LSF) produziram a Língua de Sinais Brasileira” (MONTEIRO, 2006,
p. 296). Antes da chegada de Huet havia algum sistema de comunicação utilizado
no Brasil, mas este só foi desenvolvido a partir da combinação com a LSF. A LSB
só foi reconhecida oficialmente como língua há 14 anos mediante a promulgação
da lei 10.436/02. A referida legislação a declara como um sistema linguístico de
estrutura visual-motora, detentor de gramática própria, que expressa “ideias e
fatos oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil” (BRASIL, 2002).
Os estudos linguísticos sobre as LS foram marcados inicialmente por Willian
Stokoe, quando em 1965 analisou a estrutura da ASL. Ele foi um dos primeiros a
examinar a decomposição das menores partes de um sinal, sua organização interna,
e estabeleceu inicialmente que eles se constituíam em 3 partes: locação, configuração
de mão e movimento. Com base nesse estudo, posteriormente Battison (1974) inse-
riu mais duas categorias às já descobertas por Stokoe: orientação da mão e aspectos
não-manuais dos sinais. Aqui no Brasil, destacam-se estudos linguísticos de Ferreira
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-Brito (1995) e Quadros e Karnopp (2004) sobre LSB. São, portanto, os parâmetros
estruturais adotados para LSB: Configuração de Mão-CM, Ponto de Articulação-PA,
Movimento-MO, Orientação da Palma-OP, e Expressões Não Manuais-ENM.

2 O léxico
É sabido que a Linguística, ciência que se atribui da linguagem, possui vários
ramos de estudo ligados à língua. A fonética, semântica, sintaxe, e “junto à morfos-
sintaxe e à fonologia, o léxico constitui outro grande componente da língua” (ANTU-
NES, 2012, p. 27). O léxico comporta, portanto, o conjunto de escolhas lexicais
abstratas disponíveis aos falantes de uma dada língua. Isso porque ele compõe a parte
interior mental da língua, e também exterior, quando é manifestado individualmente
pela fala e se convencionaliza socialmente com os integrantes do grupo.
No momento da enunciação o indivíduo escolhe as palavras que são mais
familiares ao ambiente em que vive, a que é exposto culturalmente. O léxico muito
diz sobre a cultura de um povo, das características de uma comunidade linguística.
Os aspectos sociais e culturais classificados como “externos” à língua devem ser
levados em consideração se partimos da perspectiva de Sapir (1969), que indica a
relação de influência do ambiente sobre a língua. O autor afirma que língua e cul-
tura nascem juntas, mas a primeira não consegue acompanhar a segunda em um
determinado momento, pois a mudança cultural acontece de forma mais rápida que
as mudanças da língua. Contudo, a cultura influencia e exige mudanças linguísticas,
principalmente lexicais para acompanhar sua transformação.
O léxico é a parte da língua que mais sofre influência do ambiente, justamente
por ele contemplar todas as experiências vividas por dada comunidade, tendo a
característica de diferenciar grupos uns dos outros. A relação entre léxico e cultura
está tão intrínseca que “o léxico, ou seja, o assunto de uma língua, destina-se em
qualquer época a funcionar como um conjunto de símbolos, referentes ao quadro
cultural do grupo” (SAPIR, 1969, p. 51). Esse fator compõe a diferença de entradas
entre as variantes que existem em uma “mesma língua”, como é o caso do portu-
guês de Portugal e o do Brasil, e até mesmo entre as diferenças dialetais grafadas
em dicionários específicos. Todas as Línguas Orais, doravante LO, podem ou não
obter traços linguísticos em comum, e de igual maneira acontece também com as
LS. É um mito declarar que as LS espalhadas pelo mundo são idênticas, uma só
para todos os surdos situados em diferentes partes do mundo. Cada país tem a sua
própria LS, sua cultura, contemplando dessa forma a afirmação de Sapir.

3 Cognatos e falsos amigos


Levando em consideração as dessemelhanças lexicais presentes nas LO, o
cognato corresponde a uma ocorrência linguística que é utilizada como estratégia
Cognatos e falsos amigos entre LSB e ASL 59

no processo de ensino e aprendizagem de línguas que compartilham uma mesma


raiz, bem como no processo de tradução dessas línguas. As palavras cognatas
possuem forma e significado idênticos ou bem parecidos, levando o falante a fazer
uma confluência lexical entre as línguas. Contudo, muitas vezes essa ligação pode
ser um “falso amigo”, possuindo um

signo linguístico que, geralmente pelo efeito de partilha de uma mesma


etimologia, tem uma estrutura externa muito semelhante ou equivalente
a de outro signo numa segunda língua, cujo significado é completamente
diferente. Essa comunidade de formas ou aparências leva o falante bilín-
gue a estabelecer uma correspondência de significados ou, aproveitando
a mesma terminologia, a acreditar numa relação de amizade semântica
falsa. (VAZ DA SILVA; VILAR, [2003] 2004, p. 3).

A partir do proposto acima, contamos com duas estruturas que toda pala-
vra tem, a externa e a interna. A externa corresponde à escrita e à fala, já a parte
interna são os valores semânticos, as significações, estabelecendo, portanto a rela-
ção significante/significado do signo linguístico proposta por Ferdinand Saussure.
Desse modo, os falsos amigos seguem um princípio norteador: formas similares e
significados diferentes.
Nas LS, ocorre esse mesmo fenômeno lexical, não obstante, com algumas
diferenças. Enquanto que nas LO as formas externas consideram o som da pro-
núncia e diferenças na grafia, nas LS a similaridade dos cognatos é baseada na
comparação dos parâmetros linguísticos descritos no tópico anterior. Pesquisas
como a de Al-Fityani e Padden (2006) já consideraram essa mesma adaptação
dos cognatos das LO para as LS. Por conseguinte, evidenciamos aqui três princi-
pais classes: os cognatos, sinais com todos os parâmetros iguais, os cognatos de
vocabulários similares, aqueles que apresentam apenas um dos parâmetros dis-
tinto oferecendo o mesmo valor semântico, e os falsos amigos, com sinais que são
escritos e sinalizados da mesma forma e possuem diferentes valores semânticos.

4 Metodologia
O corpus para esta investigação foi coletado do site de recursos American
Sign Language University (ASLU), disponível em lifeprint.com e administrado
pelo prof. William G. Vicars, conhecido por Bill Vicars, surdo e professor asso-
ciado na California State University. O site é destinado ao ensino de ASL e está
dividido em quatro níveis, compostos por trinta lições cada um. As lições são rea-
lizadas em vídeo, contando com a participação de uma aluna real, em processo de
aprendizagem de ASL. Todas as lições, além do vídeo-aula correspondendo cerca
de trinta e cinco minutos cada, disponibilizam uma lista de vocabulários utili-
60 Perspectivas em estudos da linguagem

zados na referida aula, tendo em torno de vinte novas palavras. Além do curso
outros recursos estão disponíveis no site: lista dos cem primeiros sinais, prática de
soletração, informações sobre a história da ASL entre outros.
O site oferece gratuitamente apenas as quinze primeiras lições do nível inicial, a
realização do curso completo de ASL pelo ASLU requer a compra dos demais módu-
los. A continuação dos módulos pode ser encontrada em formato de discos, acessíveis
em livrarias ou por download no site lifeprint. Portanto, foram aproveitadas aqui
apenas as primeiras quinze lições e a lista dos cem primeiros sinais. Para a compara-
ção com a LSB foi utilizado o vocabulário presente no dicionário Novo DEIT-Libras,
obra que contém grande número de entradas em LSB e também nosso conhecimento
empírico como participantes das comunidades surdas e utentes da LSB.
Para a análise dos dados, os sinais selecionados foram escritos empregando
o Sistema Brasileiro de Escrita de Sinais (ELiS) proposto por Barros (1998, 2015).
Este sistema é de base linear e alfabética e é uma escrita eficaz para ser utilizada
com qualquer LS como apresentando por Fernandes (2013, 2015). Como base
teórica foi utilizada a teoria de McKee et al. (2000), que apresentam uma pesquisa
de comparação léxico-estatística entre LS, com critérios rigorosos que foram con-
siderados no momento das apreciações para os cognatos.
Importante destacar que foram levados em consideração quatro parâmetros
da LSB: CM, OP e MO, pois o quinto parâmetro, o de ENM no sistema ELiS, é
acoplado ao grupo de MO, não descrevendo todas estas expressões, já que muitas
destas são realizadas pelo leitor no momento da sinalização. A ELiS além de seus
visografemas (letras) faz o uso de diacríticos que foram nesta ocasião levados em
consideração no momento das apreciações. Deste modo, sinais em que se diferen-
ciam pela presença de diacríticos foram considerados como vocabulários similares.

5 Análise dos dados


Inicialmente os dados deste trabalho foram escritos no sistema ELiS, per-
fazendo o total de quinhentos e noventa e cinco sinais; os sinais presentes nas
lições que utilizam o processo de empréstimo linguístico por meio da digitação
não foram computados e analisados. Após a escrita foram separados os sinais que
apresentavam a característica de cognatos com o total de setenta e três sinais e os
cognatos de vocabulário similar, somando doze sinais. Além dos cognatos serão
apresentados os falsos amigos encontrados entre as duas línguas; para esta parte
da análise tomamos como referente o trabalho de Vaz da Silva e Vilar ([2003]
2004), adaptando esta teoria para as LS, perfazendo os falsos amigos o total de
vinte e quatro sinas. A seguir, será apresentada a parte dos vocabulários analisa-
dos e inventariados nesta pesquisa. A apresentação será dividida em três quadros,
Cognatos e falsos amigos entre LSB e ASL 61

após a explanação de cada uma, serão indicados pontos pertinentes para esta pes-
quisa e posteriormente algumas curiosidades encontradas entre as línguas-alvo.

Quadro 1 Cognatos com todos os parâmetros iguais

(continua)
62 Perspectivas em estudos da linguagem

Quadro 1 Cognatos com todos os parâmetros iguais (continuação)

(continua)
Cognatos e falsos amigos entre LSB e ASL 63

Quadro 1 Cognatos com todos os parâmetros iguais (continuação)

No quadro 1, foi possível perceber uma quantidade mínima de sinais entre


as línguas aqui analisadas que compartilham o mesmo referente. Historicamente
64 Perspectivas em estudos da linguagem

é sabido da forte influência que a ASL e a LSB tiveram da LSF, no entanto, esta
pesquisa pode reforçar a ideia de Woodward (1978), quando afirma que algumas
variedades da ASL surgiram anteriormente ao contato com a LSF. Tendo como
base a ideia de que se estas línguas compartilham a mesma raiz apresentariam
uma taxa maior de similaridade entre seus signos linguísticos, não sendo o ocor-
rido entre os dados aqui analisados.
Quadro 2 Cognatos vocabulários similares

Os sinais aqui ponderados denominados de cognatos similares apresentam


apenas um dos parâmetros distinto oferecendo o mesmo valor semântico. Deste
modo, foram levados em consideração os diacríticos que são utilizados no sistema
ELiS, tendo estes a função de modificar o visografema, dando à unidade distintiva
dos parâmetros outra significação. O grupo que mais apresenta variante é o de
Movimento, com seis sinais que se diferenciam dentro deste grupo. Em seguida,
temos os de Orientação da palma com dois, e os de Configuração de mão e Ponto
de articulação tendo apenas um em cada grupo. Levando em consideração os
diacríticos, é importante observar que o sinal de ‘gato’ se distingue apenas pela
presença de contato no ponto de articulação do sinal na LSB, enquanto o sinal
‘surdo’ se diferencia pela ausência do diacrítico de lateralidade indicando o con-
tato no canto direito da boca.
Cognatos e falsos amigos entre LSB e ASL 65

Quadro 3 Falsos amigos


66 Perspectivas em estudos da linguagem

Esta parte do trabalho evidencia os sinais encontrados e definidos nesta ocasião


como falsos amigos. Estes são percebidos quando há o contato entre duas diferentes
línguas que apresentam semelhanças entre algumas palavras/sinais. Nas LS, os fatores
externos são difíceis de serem analisados, no que se refere aos falsos amigos. Sinais
que possuem os mesmos parâmetros não podem ser sinalizados de formas diferentes,
ou serem sinalizados de formas iguais e escritos de forma diferente. Este fato nas LO
é corriqueiro devido às diversas formas de pronunciar uma mesma palavra.
Portanto, evidenciamos a importância do fator interno do sinal para a apre-
ciação dos falsos amigos nas LS que, muitas vezes, nos leva a uma tradução errada
do real significado do sinal. Assim, os falsos amigos aqui são definidos como
sinais que são escritos e sinalizados da mesma forma e possuem diferentes valores
semânticos. Ao visualizar o mesmo sinal não sabemos se trata de uma mesma
palavra em duas línguas diferentes, ou se estamos diante de duas palavras distin-
tas, como pode ser observado na tabela acima. Para esta compreensão, é neces-
sário relacionar o significado e o significante em ambas as línguas, levando em
consideração seu valor semântico e não apenas seus fatores internos.
Dentre os dados analisados podemos destacar algumas curiosidades entre as
duas línguas, o sinal “porta” em ASL é adotado pela ELiS
tendo a estrutura de um sinal composto. Na LSB utilizamos estes sinais, porém tendo
cada palavra seu significado, o de “abrir a porta” e de
“fechar a porta”. O mesmo ocorre com o sinal de “Casa” que,
na LSB, utilizamos apenas o primeiro sinal representando iconicamente o
telhado de uma casa, já em ASL além do telhado há a representação das paredes
laterais. Em ASL o sinal possui dois valores semânticos, o
de caixa e o de quarto, na LSB este sinal é utilizado apenas para se referir a “caixa”,
tendo o referente “quarto” um sinal próprio.
O sinal, em ASL, é uma das variações em LSB para “família”,
no entanto não foi computado a estes dados pelo fato de esta variação não estar
representada no dicionário Novo DEIT-Libras, nosso corpus de comparação,
ainda que esta variação do sinal seja utilizada cotidianamente dentre as comu-
nidades surdas, fazendo parte da LSB. Não podemos afirmar que seja esta uma
forma informal; para isto, necessita-se de um estudo mais aprofundado que indi-
que a formalidade da LSB. No entanto, ao entender que a fala/sinalização é um
ato individual e mais flexível que a escrita, podemos dizer que temos o mesmo
referente para este sinal entre as duas línguas.

Conclusões
Uma das características presentes nas LO é a arbitrariedade dos signos lin-
guísticos, o que se percebeu com os dados cotejados ser também marcante nas
Cognatos e falsos amigos entre LSB e ASL 67

LS analisadas. O mesmo signo possui um valor diferenciado se comparado com


outras línguas; portanto, podemos destacar aqui a arbitrariedade presente nas
LS, tendo como ponto de partida para esta afirmação a análise das duas línguas
presentes neste trabalho, o que reforça, mais uma, vez o status de língua das LS.
Como dito anteriormente, pelos dados históricos é sabido a possível influên-
cia da LSF sofrida pelas línguas mencionadas nesse trabalho (LSB e ASL) e con-
forme a teoria fundamentada por alguns autores. No entanto, os dados nos
mostram que elas podem não ser tão próximas assim, afirmando mais uma vez a
pesquisa feita por Woodward (1978).
São poucas as teorias e trabalhos realizados no que se refere aos cognatos
nas LS. Por isso, foi necessário ter como ponto de partida as teorias voltadas
para as LO, realizando uma adaptação destas teorias paras as LS, respeitando a
estrutura das mesmas. Durante a análise dos sinais elencados foi percebida uma
quantidade mínima de sinais com estas características. Diante disso, conclui-se
que a quantidade de cognatos encontrados entre ambas é pouca para sustentar
uma estratégia de aprendizagem entre elas. Deste modo, carece de uma pesquisa
mais aprofundada para consolidar a teoria aqui apresentada, podendo este traba-
lho abrir caminhos para pesquisas nesta área.

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