Revista Ufrr
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No 26
ISSN 1413-9987
ISSN On-line 2317-1448
Indexada em Sumários Correntes Brasileiros - ESALQ; Indice Historico Español - Bibliografias de História de
España; Centro de Información y Documentación Científica - CINDOC; American History and Life ABC - Clio
- 130; Historical Abstract - ABC - Clio - 130; Hispanic American Periodical Index; Bibliographies and Indexes in
Latin American and Caribbean Studies; Social Sciences Index; Info-Latinoamerica (ILA); Ulrich’s International
Periodicals Directory.
Editora da UFRR
Campus Paricarana: Av. Cap. Ene Garcez, Direção
nº 2413. Bairro Aeroporto. Cezário Paulino Bezerra de Queiroz
CEP: 69304-000 Boa Vista / RR
Telefone: (55) (95) 3621-3111 Editoração Eletrônica e Capa
E-mail: [email protected] Rodrigo P. Chagas
www.ufrr.br Tayná de Mello Leite
Berto Batalha M. Carvalho
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 04
ARTIGOS
Dificuldade de demarcação da Pan-Amazônia e dos
territórios indígenas na região . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 07
Paulo Henrique Faria Nunes
Iniciati va para a Integração da Infraestrutura Regional
Sul-Americana (IIRSA) – Possibilidades e Desafios: Eixo Peru-
Brasil-Bolívia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Suely Aparecida de Lima
A prisão para efetivação da deportação no Brasil:
inconsistências com as normas da convenção americana de
direitos humanos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
Alan Robson Alexandrino Ramos
Antigas e novas dinâmicas de poder e território no Médio
Purus/AM. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
Willas Dias da Costa
Thereza C. Cardoso Menezes
TRÍPLICE FRONTEIRA BRASIL, PERU E COLÔMBIA E AS IMPLICAÇÕES
COM O NARCOTRÁFICO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
Luiz Felipe de Vasconcelos Dias Balieiro
Izaura Rodrigues Nascimento
O MUNDO DA HINTERLÂNDIA E OS AVANÇOS DA FRONTEIRA NO
ESPAÇO TOCANTINENSE .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99
Débora Assumpção e Lima
RESENHA
Educação à distância: sobre discursos e práticas. . . . . . . . . . 113
Andyara Maria G. P. Schimin
Ângelo Munhoz
Artigo
Dificuldade de demarcação da Pan-Amazônia e dos
territórios indígenas na região
Resumo Abstract
Este artigo analisa dois problemas relacio- This article analyzes two problems related to the
nados à cooperação amazônica: a delimi- Amazonian cooperation: the delimitation of the
tação da área de aplicação do Tratado de area subjected to the Amazon Cooperation Treaty
Cooperação Amazônica (TCA), conhecida (ACT), known as Amazonia pactual or Pan
como Amazônia pactual ou Pan-amazônia; Amazonia; and the demarcation of indigenous
e a demarcação de terras indígenas. Ao lands. Concerning the first issue, the study shows
abordar a primeira temática, constata-se that there is no any satisfactory conversation that
que não há um diálogo que possibilite a makes feasible the adoption of harmonic criteria
adoção de critérios harmônicos na defi- aiming the definition of the national areas.
nição das áreas nacionais. No tocante às Regarding the indigenous lands, Amazonian
terras indígenas, verifica-se que os Estados States have a legal framework complemented by
amazônicos dispõem de um marco legal international instruments although the ACT
complementado por instrumentos inter- has no granted special concern to this matter.
nacionais, embora o TCA não tenha dado However, the implementation of the national
destaque a essa matéria. Entretanto as policies has been unequal and inefficient what
diferenças e a ineficiência na condução das turns the indigenous lands and the traditional
políticas nacionais têm aberto o caminho knowledge instruments of foreign intervention in
para que as terras indígenas e o conhe- Amazonia”
cimento tradicional se tornem possíveis
instrumentos de ingerência estrangeira na Keywords:
Amazônia.
Amazonia; cooperation; integration; territory;
indigenous peoples.
Palavras-Chave:
Amazônia; cooperação; integração; territó-
rio; povos indígenas.
* Bacharel em Direito (UFG), especialista em Relações Internacionais (PUC Goiás), mestre em Geografia
(UFG), doutorando em Ciências Políticas e Sociais na Universidade de Liège (Bélgica). Professor e pes-
quisador na PUC Goiás e na Universidade Salgado de Oliveira (campus Goiânia).
A delimitação da Pan-Amazônia
6
A Amazônia brasileira, conforme a lei 1.806/1953, era menor do que a atual pois não contemplava toda
a área correspondente a Mato Grosso: “Art. 2.º A Amazônia brasileira, para efeito de planejamento econô-
mico e execução do Plano definido nesta lei, abrange a região compreendida pelos Estados do Pará e do
Amazonas, pelos territórios federais do Acre, Amapá, Guaporé e Rio Branco e ainda, a parte do Estado de
Mato Grosso a norte do paralelo de 16º, a do Estado de Goiás a norte do paralelo de 13º e a do Maranhão
a oeste do meridiano de 44.º”.
pa, mojeño-trinitario, mojeño-ignaciano, moré, mosetén, movima, pacawara, puquina, quechua, sirionó,
tacana, tapiete, toromona, uru-chipaya, weenhayek, yaminawa, yuki, yuracaré y zamuco” (art. 5.I); no
Equador, segundo o art. 2.º da Constituição do país, “ el castellano es el idioma oficial del Ecuador; el
castellano, el kichwa y el shuar son los idiomas oficiales de relación intercultural”; e na Venezuela, con-
quanto o castellano seja o idioma oficial, o art. 9.º da Constituição reconhece que os idiomas indígenas
“son de uso oficial para los pueblos indígenas y deben ser respetados en todo el territorio de la República,
por constituir patrimonio cultural de la Nación y de la humanidad”.
13
http://www.amerindian.gov.gy.
14
“Art. 89. Las Comunidades Campesinas y las Nativas tienen existencia legal y son personas jurídicas.
Son autónomas en su organización, en el trabajo comunal y en el uso y la libre disposición de sus tierras,
así como en lo económico y administrativo, dentro del marco que la ley establece. La propiedad de sus
tierras es imprescriptible, salvo en el caso de abandono previsto en el artículo anterior.
El Estado respeta la identidad cultural de las Comunidades Campesinas y Nativas”.
Um elemento que não pode ser ignorado é o diferente grau de importância atri-
buído à questão indígena pelos governos da Pan-amazônia: na Bolívia e no Equador,
por exemplo, a política indigenista não é somente um problema relativo às minorias
étnicas, visto que a maior parte da população descende diretamente dos povos origi-
nários. A eleição de Evo Morales na Bolívia, de origem aymará, é um reflexo da força
da democracia indígena nesses países (CAMARGO: 2006; MOLDIZ: 2009). Por-
tanto, a política indigenista nos países onde eles são a maioria diz respeito à ordem
política e social de uma maneira geral (LE BOT: 2009).
No Brasil, os povos originários representam uma parcela pequena da população,
sobretudo aqueles que são considerados efetivamente não inseridos na “sociedade
geral”. O caso brasileiro é bem peculiar, pois a maioria esmagadora da população
de ascendência indígena vive nas grandes cidades da região Norte do país, mas não
se declara pertencente a uma tribo ou etnia específica; são pessoas inseridas na so-
ciedade geral pelo simples fato de não se sentirem ou declararem membros de um
povo autóctone. Assim, nem sempre as políticas sociais dirigidas ao Estado como
um todo atendem aos interesses e necessidades dos povos indígenas brasileiros. Por
outro lado, percebe-se um certo ressentimento por parte da população que vive pró-
xima a áreas indígenas face aos “benefícios” que o Estado concede aos índios. Não
é difícil colher relatos, na Amazônia Legal, que retratam a insatisfação das pessoas
com o governo e com a atitude dos indígenas: produtores rurais reclamam de situa-
ções como furto de gado, presença de nativos – com a intenção de caçar e pescar em
suas terras – que adentram suas residências sem autorização e/ou causam danos a
bens e equipamentos (cercas, máquinas agrícolas); nas estradas, queixa-se da cobran-
ça ilegal de pedágios e da presença de índios que conduzem veículos sem habilitação;
as pessoas de baixa renda manifestam insatisfação sob o argumento que o governo
se preocupa “mais com os índios do que com os pobres”. Bares e restaurantes não
As terras indígenas dentro da Amazônia Legal estão recebendo financiamento para sua
demarcação do Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Ama-
zônia Legal (PPTAL) que faz parte do Programa Piloto de Proteção das Florestas Tro-
picais do Brasil (PPG7), financiado pelo Grupo de 7 países mais ricos do mundo. [...] O
PPTAL recebe apoio financeiro e técnico de agências internacionais: o Banco Mundial,
o Rain Trust Fund, o Kreditanstalt für Wiederaufbau (KFW), o Deutsche Gesellschaft
für Technische Zusammenarbeit (GTZ), e o PNUD, e do governo brasileiro por meio
da Funai, Ministério da Justiça e Ministério do Meio Ambiente, com orçamento total de
aproximadamente US$22 milhões, com a contrapartida do governo brasileiro de US$2,2
milhões destinados às indenizações de benfeitorias de boa fé feitas por não-índios nas
terras indígenas (BAINES: 2005, p. 251-252).
Considerações Finais
Referências Bibliográficas
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Artigo
Iniciativa para a Integração da Infraestrutura
Regional Sul-Americana (IIRSA) – Possibilidades e
Desafios: Eixo Peru-Brasil-Bolívia¹
Resumo Abstract
Este trabalho visa analisar as relações do This paper aims to analyse Brazil relations’
Brasil com o Peru e a Bolívia com base no with Peru and Bolivia based on Peru–
Eixo Peru–Brasil–Bolívia da Iniciativa para Brazil –Bolivia hub of the Initiative for the
a Integração da Infraestrutura Regional Integration of Regional Infrastructure in South
Sul-Americana (IIRSA), a partir de sua America (IIRSA) since it was incorporated by
incorporação pela UNASUL, em 2008, UNASUL, in 2008, up to 2014. The paper
até o ano de 2014. Serão considerados a will take into account the Brazilian’s Foreign
política externa brasileira e o projeto geo- Policy and its geopolitical project towards South
político dispensado à América do Sul para America to identify possibilities and challenges
identificar as possibilidades e os desafios involved in the process of regional integration
do processo de integração regional sul- of South America promoted by Brazil. Social
-americana promovido pelo Brasil, tendo scope is going to be the groundwork and the
como alicerce o âmbito social. A principal main hypothesis is that commercial gains and
hipótese desse trabalho é que os ganhos the physical integration alone, in the shape it’s
comerciais dos atores envolvidos e a inte- being implemented, do not reflect in social gains
gração física, por si só e da forma que vem regarding the populations from reached localities,
sendo implementada, não refletem em which can result in conflicts.
ganhos sociais no tocante às populações
das localidades atingidas, podendo resultar Keywords:
em conflitos. IIRSA; Foreign Policy; Regional Integration;
South America; International Relations.
Palavras-Chave:
IIRSA; Política Externa; Integração Re-
gional; América do Sul; Relações Interna-
cionais.
O conjunto dessas instruções sugeria três dimensões de uma nova abertura – daí o sucesso
desse termo na linguagem latino-americana: dos mercados de consumo, dos mercados de
valores e do sistema produtivo e de serviços. Para realizar essa mudança de modelo, as
táticas vinham anexas ao conjunto de instruções: eliminar o Estado empresário, privatizar
os empreendimentos estatais, realizar superávit primário, proteger os capitais e os empre-
endimentos estrangeiros e adaptar as instituições e a legislação de modo a produzir esse
novo marco regulatório (CERVO, 2008, p. 78).
² O Regionalismo Aberto significa, nas palavras de Fábio Borges, “que a integração serviria para uma me-
lhor inserção das econômicas da América Latina no cenário internacional e não apenas na própria região.
Essa estratégia seria mais eficiente que a do Regionalismo Fechado que prevaleceu até os anos 1980 que
visava diminuir o problema da deterioração dos termos de troca, sendo o mercado regional uma válvula
de escape dos bens nacionalmente e pouco competitivos em termos mundiais. Nesse sentido, o modelo
partia de dentro e fechava-se na própria região, vista como mera extensão do mercado interno. O chamado
regionalismo aberto já é percebido como um instrumento do Estado para alcançar o desenvolvimento
sustentável e a equidade social, ao alavancar os níveis de competitividade e produtividade em escala
regional, ao promover e explorar as complementaridades econômicas entre os países do subcontinente e
permitir uma harmonização de políticas e de normas que garantam um melhor acesso de suas econômicas
ao mercado mundial” (BORGES, 2011, p. 22).
9
INICIATIVA PARA LA INTEGRACION DE LA INFRAESTRUCTURA REGIONAL SURAMERICA-
NA. Eje Perú – Brasil – Bolívia. Visión de Negocios. Lima, 2003. 65 p. Disponível em: www.iirsa.org.
Acesso: 10 maio 2014.
10
Ibid., p. 7. Tradução nossa.
O Grupo 3 visa consolidar uma via de integração fluvial para facilitar a logística
de transporte das regiões de Madre de Dios, Rondônia, Pando e Beni, além de am-
pliar a oferta e abastecimento de energia11.
Até a presente data, quatro obras foram concluídas, sete estão em estudo, seis
em pré-execução e oito em execução. Entre os setores abrangidos, dez correspon-
dem ao transporte rodoviário, três ao transporte aéreo, cinco ao setor energético,
três ao controle fronteiriço e quatro ao transporte fluvial. As obras estão distribuídas
da seguinte forma: dezoito obras nacionais (oito na Bolívia, seis no Peru e quatro no
Brasil) e sete obras binacionais (três no Brasil-Peru, duas no Brasil-Bolívia e duas na
Bolívia-Peru).
O atual estágio das obras dificulta uma avaliação concreta em termos de impac-
tos diretos e/ou indiretos, negativos e/ou positivos. Porém, a IIRSA – no que diz
respeito ao desenvolvimento regional e à população local, entre outros fatores – ne-
cessita de estudos prognósticos e análises que possam apontar seus impactos, falhas
e equívocos, destacando os desafios para evitar custos humanos e a reprodução de
injustiças sociais, além de julgar a viabilidade dos projetos para a integração regional.
Possibilidades e desafios
11
INICIATIVA PARA LA INTEGRACION DE LA INFRAESTRUCTURA REGIONAL SURAMERI-
CANA. Eje Perú – Brasil – Bolívia. Visión de Negocios. Lima, 2003. 65 p. Disponível em: www.iirsa.
org. Acesso: 10 maio 2014.
Isso nos leva a uma das críticas à IIRSA, a qual entende que os projetos de obras
físicas privilegiam uma vertente comercial que ignora os diferentes grupos étnicos
presentes nas regiões fronteiriças, em outras palavras, não promove uma integração
que não seja baseada no comércio e consumo12. É nesse sentido que Castro tece
críticas severas e destaca que apesar da fronteira ser “produtora de redes de sociabi-
lidade e de conflitos, com base nos grupos que a conformam, tendo caráter econô-
mico, social, político e étnico” (2009, p. 122), o que tem prevalecido nos projetos da
IIRSA é o caráter econômico, e isso pode alimentar conflitos em relação aos outros
três caracteres. O desafio seria incluir a participação e contribuição da população dos
Estados partícipes e promover e/ou fortalecer laços entre os povos.
Essas críticas nos remetem à questão cultural, considerada de extrema relevância
dada a existência de múltiplas identidades culturais entre os povos da América do
Sul:
Outro desafio é fazer com que o projeto de integração cesse enquanto projeto
de governos nacionais para tornar-se projeto de Estados nacionais. Em outras pala-
vras, para o projeto de integração deixar de ser projeto de governo e transformar-se
em projeto de Estado, o único caminho é, primeiro, transformar a integração em
projeto dos povos. Isso requer tanto participação nos benefícios como participação
nas decisões que envolvem o processo integracional (SOUZA, 2012, p. 123).
Outra crítica diz respeito à diferenciação no trato entre Cone Sul e região ama-
zônica. Há “muita desigualdade no trato das relações entre os países da região”, o
12
Para maiores detalhes, consultar: ALAYZA; GUDYNAS, 2012.
[...] a Queiroz Galvão teve que sair da Bolívia acusada de graves fissuras na construção de
uma estrada, deixando a obra para outra construtora brasileira, OAS, que agora está sendo
acusada de corrupção e fraude no processo de licenciamento. Os impactos ambientais,
sociais e trabalhistas das atividades da mineradora Vale vem sendo sofridos por populações
e trabalhadores no Peru, Indonésia, Canadá, e outros países onde ela opera (GARCIA,
2009, p. 16).
13
Para maiores detalhes sobre o uso do rótulo subimperialista e críticas à atuação do BNDES, consultar:
BORGES, 2011; INSTITUTO ROSA LUXEMBURG STIFTUNG et al. (Orgs.), 2009; LOPES PINTO,
2012; RODRÍGUEZ, 2014; ALAYZA; GUDYNAS, 2012.
Sob diversas formas de organização coletiva, atores locais, em toda a extensão amazônica,
tem-se mobilizado para defesa de seus interesses, afirmando suas diferenças e reivindican-
do direitos sociais, étnicos e territoriais, sejam eles povos indígenas, pequenos agricultores,
quilombolas, pescadores, ribeirinhos, atingidos por barragens, ou por projetos de grandes
investimentos, ou outras categorias de identidade política. Em áreas de fronteira tem sido
fortalecida as articulações de movimentos sociais reunindo varias nacionalidades [...]. In-
14
Para maiores detalhes, consultar: BORGES, 2011.
[...] se essas relações não forem tratadas de maneira mais equilibrada pela parte brasileira,
os resultados poderão ser frustrantes. Isso pode acarretar muitos movimentos de resistên-
cias a atuação das empresas e também da diplomacia brasileira nesse estratégico vizinho.
Uma forma de evitar futuros conflitos é aprofundar os conhecimentos sobre esse vizinho
amazônico, identificando as expectativas e necessidades dos peruanos em relação ao Brasil.
Dessa maneira se poderão construir reais projetos de cooperação entre esses dois países,
com possibilidades de ganhos mútuos que vai além do puro lucro econômico de um pe-
queno grupo de empreiteiras brasileiras (BORGES, 2011, p. 104).
O autor faz referência ao Peru, no entanto, entendemos que essa mesma ob-
servação aplica-se à Bolívia, apesar da Bolívia ter sido contemplada com política
15
Um exemplo é a “Declaración de la II Cumbre Regional Amazónica: Vida Plena frente al IIRSA y
Desarrollismo”. A II Cúpula Amazônica dos Povos Indígenas foi realizada no final de 2013 na Colômbia,
convocada pela Coordinadora de las Organizaciones Indígenas de la Cuenca Amazónica (COICA), contou
com a participação de nove países: Bolívia, Brasil, Equador, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Peru,
Venezuela e Suriname. O objeto central da Cúpula foi a IIRSA, compreendida como “um ambicioso
projeto de reordenamento territorial cujo objetivo é, mediante a definição de rotas multimodais (hidro-
via, rodovias, vias férreas), reordenar uma ampla extensão do território da América do Sul para servir as
exigências do mercado mundial, aprofundando a visão extrativista que constitui uma séria ameaça para a
vida e culturas dos povos indígenas” (tradução nossa). Disponível em: <http://laboratoriosdepaz.org/vida-
-plena-amazonica-frente-al-iirsa-y-el-desarrollismo-declaracion-de-la-ii-cumbre-regional-amazonica-de-
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Considerações Finais
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Artigo
A prisão para efetivação da deportação no Brasil:
inconsistências com as normas da convenção
americana de direitos humanos
Resumo Abstract
Este artigo aborda o instituto jurídico This article discusses the legal institution
da deportação no Brasil, com análise of deportation in Brazil, with analysis of
da medida de prisão administrativa para administrative detention measure to execute
efetivação da deportação de estrangeiros the deportation of foreigners in Brazil in
no Brasil em confronto com as normas comparison with the provisions of the American
da Convenção Americana de Direitos Hu- Convention on Human Rights, part of the legal
manos, que integra a ordem jurídica pátria order homeland since 1992 and has legal status
desde 1992 e tem status jurídico supralegal supralegal in the legal system.
no ordenamento jurídico.
Keywords:
Palavras-Chave: Deportation; imprisonment; human rights.
Deportação; prisão; direitos humanos.
* Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Sociedade e Fronteiras pela Uni-
versidade Federal de Roraima. Delegado de Polícia Federal em Roraima. Email: alanrobsonce@yahoo.
com.br.
Podemos concluir das premissas expostas que ao cotejar duas normas brasilei-
ras – a lei 6.815/80 que “define a situação jurídica do estrangeiro no Brasil, cria o
Conselho Nacional de Imigração” (BRASIL, 1980) e a Convenção Americana de
Direitos Humanos, inscrita na ordem jurídica pátria pelo Decreto 678/92, temos a
supremacia dos termos desta norma de direitos internacional de direitos humanos
sobre a lei que regula a deportação. A Convenção Americana de Direitos Humanos
tem supremacia, no ordenamento jurídico brasileiro, sobre a lei do estrangeiro de
1980.
Todo e qualquer ato referente à deportação de estrangeiros do Brasil tem que ser
analisado sob ótica da compatibilidade com os compromissos de direitos humanos
assumidos pelo Brasil. Os atos de deportação ínsitos à lei 6.815/80 devem obedi-
ência à Convenção Americana de Direitos Humanos. A Convenção Americana de
Direitos Humanos prevê expressamente a possibilidade de deportação, conforme
interpretação conjunta do Artigo 22 que afirma que “toda pessoa que se ache legal-
mente no território de um Estado tem direito de circular nele e de nele residir em
conformidade com as disposições legais”.
Observamos, por outro lado, no artigo 22, limitadores às retiradas compulsórias
de estrangeiros dos países signatários da Convenção Americana de Direitos Huma-
nos. No preâmbulo da convenção, se afere o propósito de consolidar “um regime
de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos humanos
essenciais” e que “os direitos essenciais da pessoa humana não derivam do fato de
ser ela nacional de determinado Estado, mas sim do fato de ter como fundamento os
atributos da pessoa humana, razão por que justificam uma proteção internacional”
(BRASIL, 1992). Na convenção há limitações do poder de soberania estatal. É com
lastro na soberania que o Estado brasileiro deporta estrangeiros, retirando-os com-
pulsoriamente de seu território com medidas conforme a lei 6.815/80. Tal poder
de retiradas compulsórias no Brasil não é regulado tão somente por este dispositivo
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______. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais
na perspectiva constitucional. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado Editora, 2010.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32ª ed. São Paulo. Ma-
lheiros. 2009
VENTURA, Deisy. Política Migratória, uma dívida do Brasil. 2012. Disponível em: http://
www.univesp.ensinosuperior.sp.gov.br/preunivesp/4274/pol-tica-migrat-ria-uma-d-vida-
-do-brasil.html. Acesso em: 21 jul. 2014.
Artigo
Antigas e novas dinâmicas de poder e
território no Médio Purus/AM
Resumo Abstract
Este trabalho é um breve recorte da tese This paper is a brief outline of the doctoral thesis
de doutorado em andamento no programa in progress in the graduate program in Social
de Pós-Graduação em Antropologia Social Anthropology Federal University of Amazonas.
da Universidade Federal do Amazonas. We present some preliminary findings from field
Apresentamos algumas conclusões preli- work in the middle Purus region where we are
minares do trabalho de campo na região conducting a comparative analysis of the recent
do médio Purus onde estamos realizando past and the present moment watching the old
uma análise comparativa entre um passado and new dynamics of power and territory in
recente e o momento atual observando as the Middle Purus in southern Amazonas state
antigas e novas dinâmicas de poder e ter- where still predominate relations of domination
ritório no Médio Purus, no sul do Estado characterized by “patronage”. In this context of
do Amazonas onde ainda predominam indigenous lands and protected areas identified an
relações de dominação caracterizadas pelo intense social and environmental conflict involving
“patronado”. Nesse contexto de Terras the figures of employers, associations of farmers
Indígenas e Unidades de Conservação and indigenous peoples with state agents. The
identificamos um intenso conflito socio- research aims to understand some of the facets
ambiental envolvendo as figuras dos pa- and the social impacts of long and intense process
trões, das associações de agricultores e dos of transformation in the power relations in the
povos indígenas com os agentes do estado. region.
A pesquisa visa compreender algumas das
facetas e os impactos sociais do longo e
Keywords: Employers; Conflicts; South of the
intenso processo de transformações nas
Amazon; Indigenous peoples; Farmers.
relações de poder na região.
1
Esses municípios fazem parte da zona 7 no mapa das sub-regiões do Estado do Amazonas.
2
Em relação a este período de ocupação do Purus Agnello Bittencourt comenta: “Os retirantes eram in-
divíduos torturados pela calamidade do estio, os quais se dirigiam aos rincões desta planície então ainda
virgem, na sua maior longitude. Sofrendo tantas vezes a perda de entes extremosos, aniquiladas suas
propriedades, roídos pela saudade da aldeia natal, maltrapilhos, famintos, mas resignados e corajosos, ce-
arenses em sua maioria, afrontavam a distância, a imensidade da floresta, a correnteza do rio, os selvagens,
as intempéries...” (BITTENCOURT, 1973, p. 17).
3
De acordo com o religioso Sebastião Ferrarini o processo de ocupação do Vale do Purus teve como seu
primeiro residente o explorador Manuel Urbano Encarnação, juntamente com Manuel Nicolau de Melo.
O povoamento, de modo mais intenso e organizado, o que não significa oficialmente amparado, dá-se
com o português Antônio Rodrigues Pereira Labre em fins de 1871. Para aprofundamento da história de
ocupação do Purus consultar “O Progresso e Desenvolvimento no Purus” de Sebastião Antonio Ferrarini.
4
O município de Tapauá foi criado em 1955 da Lei n° 96 de 19 de dezembro.
5
Patrão é uma categoria criada a partir da estrutura da exploração da borracha. Representa a figura do
seringalista dono do seringal, de seus capatazes e gerentes de produção que eram os funcionários que
permaneciam mais tempo nos seringais.
Para além do conflito, o sistema do seringal produziu também um padrão de relação social
caracterizado pelo aviamento, onde o seringueiro recebe mercadorias do barracão, per-
tencente ao padrão, saldando as dívidas contraídas com borracha ou outros produtos de
valor extraído da floresta como castanha, por exemplo: a rigidez do sistema de aviamento
pelo uso da violência e ameaça de expulsão obedecia á lógica dos preços do mercado in-
ternacional, ou seja, quanto mais alto os preços da borracha, menor margem de manobra
de negociação tinha o seringueiro que era constrangido a vende a borracha somente para
seu patrão em condições por ele determinadas. Em geral, o sistema de aviamento era
pouco monetarizado, caracterizado pelo endividamento permanente em função dos preços
extorsivos das mercadorias negociadas em troca da produção de borracha e como pouca
abertura para concorrência de outros comerciantes ou regatões, os quais poderiam ter sua
atividade restringida, controlada ou impedida pelos seringalistas. É possível afirmar que
residia no controle estrito do fluxo de trocas um eixo central deste processo de domina-
ção, porém este sistema era também legitimado pela dominação tradicional manifesta na
pessoalidade das relações (WEBER, 1964) e expressa na centralidade das relações diádicas
(FOSTER, 1961), de compadrio e na ajuda emergencial aos “clientes”. O poder do pa-
trão respaldava-se na assunção por este da posição-chave de mediador entre o isolamento
do seringal e o acesso aos serviços essenciais acessíveis nos núcleos urbanos. Ao reiterar
quotidianamente esta função diante de seus clientes, era lhe imputado o título do “bom
patrão”, reproduzindo-se a crença na legitimidade ao sistema.
O Médio Purus se constituiu ao longo desta situação como lugar de fraca pre-
sença do Estado até a década de noventa. A economia seringalista era o vetor de
orientação de outras esferas da vida e o patrão tornou-se “coronel”, normatizando
e ditando o modo de vida dos seringueiros tendo por base o sistema do aviamento
que determinava um modelo clássico de controle e dominação.
O sistema de patronagem é um elemento discutido a exaustão nas diversas inter-
pretações do Brasil, constituindo um dos problemas centrais da estrutura social pa-
triarcal, herança da colonização, e as instituições liberal-democráticas, alimentando
um intenso e persistente debate em torno da formação social6 do Brasil nos moldes
ocidentais. Nessa perspectiva, a patronagem representa a continuidade do modelo
colonialista reproduzido nas relações de poder e dominação territorial. Conforme
assinala Cunha (2006, p. 227), trata-se de um fenômeno secular do clientelismo e,
posteriormente do patrimonialismo que, segundo Vianna (1999, pp.35) seria “um
sistema político de cooptação sobreposto ao de representação, uma sociedade es-
6
Para Alonso (1997), textos referenciais no debate sobre a formação social brasileira seriam: Casa-grande
& senzala: Formação da família patriarcal brasileira (1933), de Gilberto Freyre; Formação do Brasil
contemporâneo (1942), de Caio Prado Jr.; Formação histórica de São Paulo (De comunidade a metrópo-
le) (1954),de Richard Morse; Os donos do poder: Formação do patronato político brasileiro (1957), de
Raymundo Faoro; Formação econômica do Brasil (1958), de Celso Furtado; A formação do federalismo
no Brasil (1961), de Oliveira Torres; Formação histórica do Brasil (1962), de Nelson Werneck Sodré;
Formação política do Brasil (1967), de Paula Beiguelman.
Considerações Finais
FRANCO, Marcelo Horta M. 2009. Subsistema de saúde indígena e o desmonte das or-
ganizações indígenas no Sul do Amazonas. In: http://nosuldoamazonas.blogspot.com/
OLIVEIRA VIANA, Francisco José de. Instituições políticas brasileiras. Rio de Janeiro:
Itatiaia/Edusp/ Eduff, 1987.
VIANNA, Luiz Weneck. Weber e interpretação do Brasil. São Paulo: Novos Estudos CE-
BRAP, (53), 1999.
Artigo
TRÍPLICE FRONTEIRA BRASIL, PERU E COLÔMBIA
E AS IMPLICAÇÕES COM O NARCOTRÁFICO
Resumo Abstract
Na região do Alto Solimões, extremo In the Upper Amazon, extreme western
oeste do Amazonas, localiza-se a chamada Amazonas, it is located the Triple Amazon
Tríplice Fronteira Amazônica, formada Border, formed by the cities of Tabatinga/
pelas cidades de Tabatinga/Brasil, Santa Brazil, Santa Rosa/Peru and Letícia/
Rosa/Peru e Letícia/Colômbia. Esta Colombia. This border area is identified
zona fronteiriça é identificada como uma as one of the entry points of narcortics
das portas de entrada dos entorpecentes produced in Colombia and Peru in the
oriundos das zonas produtoras do Peru Brazilian territory. This article aims to
e Colômbia no território brasileiro. Este analyses the characteristics of drug trafficking
artigo objetiva promover a análise das in that zone, with a brief statement of its
características do narcotráfico na tríplice historical formation process , dynamics of coca-
fronteira amazônica, com uma breve ex- growing activity and drug trafficking in those
posição do seu processo de formação his- neighboring countries. Furthermore, are also
tórica, dinâmica da atividade cocaleira exposed, the production potential of cocaine
e do narcotráfico nesses países vizinhos, production, growing areas, and logistics employed
além de expor o potencial de produção by the criminal drugs trafficking groups to smuggle
de cocaína, zonas de cultivo, e logística drugs into Brazilian territory.
empregada pelos grupos envolvidos com
o tráfico de cocaína destas localidades para Keywords:
o território brasileiro. Drug trafficking; Amazon triple border; Public
safety.
Palavras-Chave:
Narcotráfico; Tríplice fronteira amazônica;
Segurança Pública.
* Mestre em Segurança Pública, Cidadania e Direitos Humanos pela Universidade do Estado do Amazo-
nas - UEA; especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo; graduado em Direito; Delegado de Polícia Civil. E-mail: [email protected]
** Doutora em Relações Internacionais e Desenvolvimento Regional (UnB/Flacso/UFRR). Mestre em
Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia (UFAM). Graduada em Ciências Sociais (UFAM).
Professora da Universidade do Estado do Amazonas - UEA, onde coordena o Curso de Mestrado Profis-
sional em Segurança Pública, Cidadania e Direitos Humanos. E-mail:[email protected]
Fonte: http://www.info.lncc.br
O aumento da repressão ao tráfico de drogas na década de 1990 e seu ápice em 1997 oca-
sionou a dissolução do Cartel de Letícia, o terceiro mais importante da Colômbia, e levou
consigo o padrão de crescimento econômico da cidade até então. Os bens dos traficantes
colombianos da cidade foram confiscados (mansões luxuosas, as empresas, centros comer-
ciais, hotéis, etc.), muitos chefes locais foram presos ou fugiram. [...] Por volta de 2000, a
situação financeira da Gobernacion del Amazonas e da Municipalidad de Letícia era grave
(STEIMAN, 2002, p. 69)
No final dos anos 80 e início dos anos 90, o território colombiano passa a
apresentar também grandes áreas de cultivo de coca, passando a concentrar todas
as etapas da produção do entorpecente. O mesmo ocorre, em sentido inverso, com
Bolívia e Peru, onde se verifica o aumento da produção de cocaína. Desse modo, o
caráter transnacional do processo produtivo é substituído por um método de organi-
zação que concentra todas as etapas da produção nos limites territoriais de cada país.
In the 1990s, Colombia also became a major producer of coca leaf and coca paste. On
the other hand, Peru and Bolivia experienced a decrease in coca leaf production and a
trend towards cocaine production. In other words, there seems to be a tendency towards a
vertically integrated mode of organisation within the limits of each country (MACHADO,
2002, p.158).
Fonte: Adaptado de World Drug Report 2014 por Luiz Felipe Balieiro
Uma vez delimitada a área de produção de coca que se relaciona de forma mais
aproximada com o Trapézio Amazônico, busca-se agora mensurar o impacto eco-
nômico do tráfico de cocaína na região. Para tanto, algumas premissas iniciais devem
ser observadas.
Como exposto anteriormente, foram identificados em 2013, 60.400 hectares
de cultivos de coca. Estes cultivos seriam suficientes para a produção de 121.242
toneladas de folhas de coca, das quais 9.000 são utilizadas em costumes tradicionais,
uso ancestral ou ainda pela indústria, e o restante é empregado pelo narcotráfico na
obtenção de derivados da coca (cloridrato de cocaína, pasta base).
Considerações Finais
Referências Bibliográficas
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Se-
nado 1988.
CHAUMEIL, J.P. Visão da fronteira: o caso do Trapézio amazônico. In: ARAÚJO, R. e LÉNA, P.
(Org.) Desenvolvimento Sustentável e Sociedades na Amazônia. Belém: Museu Paraense
Emilio Goeldi - Mpeg. p.355-377, 2010
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ração de Monografias, Dissertações e Teses. Manaus: 2ª edição, 2013.
MACHADO, L. O. Drug Trafficking and Money Laundering in the Amazon Region. Geoeconomic
and Geopolitical Effects. Em: Ch.Geffray; G.Fabre; Michel Schiray. (Org.). Globalisation, Dru-
gs and Criminalisation. CD-ROM ed. Unesco, 2002, p. 151-171.
STEIMAN, R. A geografia das cidades de fronteira: um estudo de caso de Tabatinga (Brasil) e Letícia
(Colômbia). Dissertação de Mestrado UFRJ. Rio de Janeiro, 2002.117 p.
UNODC. Peru: Monitoreo de cultivos de coca 2013. Lima: Cobol Srl, 2014. Disponível em
<”http://www.unodc.org/unodc/en/crop-monitoring/index.html”ht > Acesso em 30 de
junho 2014.
UNODC. World Drug Report 2014. New York: United Nations Publications, 2014. Disponível
em “http://www.unodc.org/unodc/en/data-and-”- analysis/index.htm?ref=menuside>
Acesso em 14 abril de 2014.
UNODC. World Drug Report 2013. New York: United Nations Publications, 2013. Disponível
em: “http://www.unodc.org/unodc/en/data-and-”- analysis/index.htm?ref=menuside>
Acesso em 14 abril de 2014.
Artigo
O MUNDO DA HINTERLÂNDIA E OS AVANÇOS DA
FRONTEIRA NO ESPAÇO TOCANTINENSE
Resumo Abstract
As categorias do imaginário responsáveis The categories of the imaginary charge the
em munir o ideário nacional da ideia de ser national ideology the idea of being
about the
da hinterlândia, atendo-se aqui a formação hinterland, referring here as the formation of the
do estado do Tocantins, apresentavam a state of Tocantins, which is presented as a wild,
região como selvagem, exótica e distante. exotic and distant region. The hinterland, “o
A hinterlândia, o sertão, não é um lugar, sertão”, is not a place but a condition attributed
mas uma condição atribuída a variados lu- to places; a symbol, a symbolic reality. “O
gares; um símbolo imposto, uma realidade sertão” cannot be measured, therefore the border
simbólica. O sertão não pode ser mensu- is movement and advancement for development,
rável, já que a fronteira é movimento e seu the valuation of the space within the capital.
avanço em prol do desenvolvimento, da The use of land, basic shape with which men
valoração do espaço dentro do capital. O use, organize and change the territory, develop
uso da terra, forma básica com a qual os economic activities, deploying structures and
homens se territorializam, desenvolvem fastening systems eventually tend to homogeneity,
atividades econômicas, implantam estru- and under these aspects the state of Tocantins
turas e sistemas de fixação acabam por consolidates as a space whith multi caracteristics,
tender a uma homogeneidade, e sob estes created by the various actors and their historical
aspectos o Tocantins consolida-se como complexities, different time-space relations, conflict
um sertão misturado, em que suas diversas and intentions to form an integrated system of
temporalidades, criadas pelos diversos Capital, even if located on the shore territory.
atores e suas complexidades históricas,
velocidades, conflitos e intencionalida-
des formam um território integrado ao Keywords:
sistema do capital, mesmo que localizado Frontier; hinterland; Tocantins; space
na margem. modernization.
Palavras-Chave:
Fronteira; hinterlândia; Tocantins; moder-
nização do espaço.
100 Textos&Debates, Boa Vista, n.26, p. 99-112, referência 2014. Publicação 2015
A hinterlândia, desta forma, é a região em que as frentes de expansão dariam
lugar a frentes pioneiras, movimento de integração do território nacional. José de
Souza Martins (1997) corrobora tal questão, em que:
O deslocamento progressivo das frentes de expansão tem sido, na verdade, um dos mo-
dos pelos quais se dá o processo de reprodução ampliada do capital, o da sua expansão
territorial. Um outro momento desse modo de expansão tem sido o que se dá através do
deslocamento das chamadas frentes pioneiras. Ambas, na verdade, são faces e momentos
distintos da mesma expansão (MARTINS, 1997, p.27).
Textos&Debates, Boa Vista, n.26, p. 99-112, referência 2014. Publicação 2015 101
Trabalho: pioneiro, fazendeiro pioneiro, agricultores pioneiros, massa de pionei-
ros, senhor do mundo pioneiro, pioneiro moderno;
Outros: sociedade pioneira, avanço pioneiro, universo pioneiro, rodovia pioneira,
grupos pioneiros.
Monbeig define a “franja pioneira” como uma expressão vaga, onde a fronteira
seria uma região instável e incerta, que progride irregularmente e em direções difusas
(MONBEIG, 1984, p.165). Leo Waibel é outro autor importante para auxiliar na dis-
tinção dos movimentos de expansão, em que o pioneiro não significa somente aque-
le que vive numa fronteira espacial; ele expande a ocupação do espaço, mas também
cria novos padrões e técnicas de vida (SILVA, 2007). Waibel permite diferenciar os
conceitos de fronteira e de zona pioneira, considerando que a expansão da fronteira
que havia adentrado o país pela pecuária não consolidou um povoamento e nem me-
lhorou o padrão de vida. Deste modo, o pioneiro cria um tipo de paisagem que não
é a terra civilizada e nem é mais o sertão, definindo assim a zona pioneira. O cultivo
da terra é o que constitui o fundamento econômico da zona pioneira, distanciando-
-se do padrão da “Marcha para Oeste” norte-americana e colocando o camponês
segundo conceituações europeias como o elemento que caracteriza a zona pioneira.
Outro aspecto que Waibel aborda justificando sua escolha pelo termo “zona pionei-
ra” é a sua localização em áreas de povoamento mais antigos e próximos às vias de
circulação modernas, estradas e ferrovias. Isso demonstra que a economia pioneira
era relevante para aos mercados de escalas maiores – a “zona pioneira” representa-
va uma situação de momento, podendo ser uma via eficaz de colonização (SILVA,
2007, p.80). Já as “frentes” (pioneiras, de expansão, de povoamento) podem ser
diferenciadas pelo caráter espontâneo ou privado, com mínima intervenção estatal
(MACHADO, 1992).
Não cabe nos trabalhos de Waibel4 a definição sobre fronteira agrícola que trans-
forma o espaço a partir dos elementos de expansão da civilização tecno-mercantil.
Ligia Osório Machado (1992, p.35-37) define que as “fronteiras agrícolas” têm pa-
drão espacial estreitamente vinculado à expansão das vias de circulação; atrelados
a movimentos espontâneos de imigração e de iniciativa de projetos de colonização
oficial ou privado, podendo estar especializadas em um único produto, como o ar-
roz, a soja e o trigo, na policultura, com grau de tecnificação e investimento variado.
A partir do conceito de fronteira agrícola, entende-se que sua expansão no ter-
ritório brasileiro estava vinculada ao aumento de produção com baixo coeficiente de
4
Um fato interessante é que para Waibel (1979, p.309) as regiões Norte e Centro-Oeste não seriam favo-
ráveis à agricultura intensiva devido às condições naturais, afirmando que a ocupação da hinterlândia era
de caráter mais geopolítico que econômico.
102 Textos&Debates, Boa Vista, n.26, p. 99-112, referência 2014. Publicação 2015
capitalização, sem criar obstáculos para a acumulação urbano-industrial, exproprian-
do os pequenos produtores e trabalhadores rurais que também avançavam com a
fronteira, criando um movimento contraditório do espaço, em que a não ocupação
efetiva e intensiva da terra também serve ao capital. Neste sentido, considera-se até
a década de 1920 o Estado de Goiás como frente pioneira. O estado permaneceu
semi-isolado do restante do país, mantendo vínculos econômicos que se refere ao
comércio de gado, em principal para o centro-sul e uma produção agrícola de subsis-
tência. Em 1913 a região foi cortada pela estrada de ferro que alcançou o município
de Ipameri-GO e assim passou a receber um fluxo migratório mais intenso. “Esta
ocupação desenvolveu-se de duas formas, constituindo-se em ‘frentes pioneiras’ as
áreas próximas à estrada de ferro e em alargamento das ‘frentes de expansão’ as
áreas mais distantes constituídas por terras devolutas” (CARNEIRO, 1988, p.71).
Contudo, esta franja pioneira não alcançava a parte norte do estado goiano, área
compreendia pelo atual estado do Tocantins.
Na década de 1940, foi criada a Fundação Brasil Central – FBC, que instrumen-
talizou a “Marcha para o Oeste”, posteriormente extinta e anexada à Superintendên-
cia do Desenvolvimento do Centro Oeste - SUDECO em 1967, um ano depois da
criação da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia – SUDAM (BRA-
SIL, 2001). Os objetivos destas instituições, e da Marcha para o Oeste, eram atrair
capital nacional e estrangeiro e preparar uma estrutura logística para o desenvolvi-
mento desse capital, que não menosprezava a vocação agropecuária, num primeiro
momento mais intenso nas margens do rio Araguaia. O Tocantins era caracterizado
por “um grande ‘bolsão de miséria’ deslocado e distante do processo de moderniza-
ção agrícola que dinamizou grande parte do território goiano” (AJARA et al.,1991,
p.5).
A crescente vinculação da nação ao território passa paulatinamente a mediar
a definição de Estado soberano. Atrelado de forma definitiva à tarefa de delimita-
ção espacial de uma área homogênea, o estado deve estar sob sua jurisdição direta,
apontando para as intrincadas interações que se observam entre o espaço construído
herdado. Tal espaço é uma rugosidade fruto do desenrolar histórico de ações colo-
nizadoras, que cria construções identitárias de base espacial nascidas em meio ao
surgimento e afirmação do nacionalismo (NOGUEIRA, 2012).
As categorias do imaginário responsáveis em munir o ideário nacional da ideia
de ser do Tocantins apresentavam a região como selvagem, exótica e distante; povo-
ada por índios, sertanejos e garimpeiros. Um sertão ainda atrasado, não integrado à
civilidade brasileira. A ideia de um deserto de homens menospreza o papel desem-
Textos&Debates, Boa Vista, n.26, p. 99-112, referência 2014. Publicação 2015 103
penhado pelas comunidades indígenas, de sertanistas e estrangeiros que também
adentraram o sertão tocantinense. A história do sertão remonta à entrada do sistema
mercantil exportador associado à expropriação das comunidades tradicionais.
A primeira metade do século XX desembocou na abertura de estradas, pistas
de aviões, fazendas de gado e cidades. Para Monbeig (1984), “quando esta [ferrovia]
prolonga os trilhos, embrenha-se o homem mais para dentro do sertão” (p.121).
Neste sentido, pode-se afirmar que o sertão não é um lugar, mas uma condição
atribuída a variados lugares; um símbolo imposto, uma realidade simbólica (MO-
RAES, 2003). O sertão não pode ser mensurável, já que a fronteira é movimento e
seu avanço em prol do desenvolvimento, da valoração do espaço dentro do capital,
do “fim do atraso” é a ação de chegar até o sertão e reconfigurá-lo, não necessa-
riamente colocando-o como centralidade, mas certamente transformando-o como
homogeneidade no espaço, produzindo-o a partir do mesmo modo de produção5,
de circulação, de trabalho e de signos. A civilidade pressupunha a incorporação da
disciplina do trabalho, hábitos de higiene, de moradia e de costumes considerados
tradicionais. A relação entre o sertão e o processo de colonização é estreita. Iluminar
o sertão seria imputar o sistema de valor daquilo que nega o sertão, concebido no
discurso hegemônico também como um território não urbanizado.
A relação com a natureza e as culturas rurais que vinham se desenvolvendo
autarquicamente entra no projeto dominador que as cidades modernizadas levam a
cabo, buscando integrar o território nacional sob a norma urbana (RAMA, 1985). A
modernidade está associada à racionalização que impõe a destruição das relações só-
cio-espaciais, costumes e crenças. Portanto, a expansão da fronteira até os rincões do
Brasil leva ao outro (representado pelos índios, quilombolas, ribeirinhas e sertanejos)
os objetos6 do urbano, criando uma rede produzida pela inteligência racionalizante
que, através da mecanicidade das leis institui a ordem7 urbana. “Tais elementos ordenam
o mundo físico, normatizam a vida da comunidade e se opõem à fragmentação e ao particularismo
de qualquer invenção sensível” (RAMA, 1985, p.51).
Sobre o viés da unicidade da técnica como processo de hegemonização, Milton
Santos apresenta que os objetos mundializados, que participam de um mesmo siste-
5
Entende-se que o modo de produção projeta relações temporais e sociais no espaço (LEFEBVRE, 2006).
6
O objeto nele mesmo e no seu próprio ser nos levam a ideia de coisa. Mas quando se vê o objeto enquanto
representação de outro, a ideia que se tem dele é a de signo. Assim, o signo encerra duas ideias, uma de
coisa que representa e outra de coisa representada, e sua natureza consiste em provocar a segunda ideia
através da primeira (RAMA, 1985).
7
“... a ordem dos signos imprimiu sua potencialidade sobre o real, fixando marcas, se não perenes, pelo
menos tão vigorosas para que ainda subsistiam hoje e as encontremos em nossas cidades; mais radical-
mente, na eminência de ver esgotada sua mensagem demonstrou assombrosa capacidade para rearticular
uma nova, sem por isso abandonar sua primazia hierárquica” (RAMA, 1985, p.33).
104 Textos&Debates, Boa Vista, n.26, p. 99-112, referência 2014. Publicação 2015
ma técnico travam um conflito permanente entre o tempo dos atores hegemônicos
e dos atores não-hegemônicos (SANTOS, 1994). Entretanto, o Estado planifica o
tempo, reduzindo as diferenças, as repetições, as circularidades e particularidades, se
impondo como vetor do local e regional ao global.
O uso da terra, forma básica com a qual os homens se territorializam, desenvol-
vem atividades econômicas, implantam estruturas e sistemas de fixação acabam por
tender a homogeneidade, e sob estes aspectos o Tocantins, antigo “nortão goiano”,
consolida-se como um sertão misturado, em que suas diversas temporalidades, cria-
das pelos diversos atores e suas complexidades, velocidades, conflitos e intenciona-
lidades formam um território integrado ao sistema do capital.
Textos&Debates, Boa Vista, n.26, p. 99-112, referência 2014. Publicação 2015 105
ganização territorial que inclui a região no circuito de trocas desiguais. Neste sentido,
a “estrutura oligárquica vem acompanhada da política de controle monopólico de
bens de produção, num contexto de altas taxas de analfabetismo, isolamento políti-
co-econômico, e burocratização dos recursos, que necessariamente perpassam o po-
der oligárquico” (EMMI, 1999, p.55). Era imprescindível quebrar o poder oligárqui-
co e permitir que a estrutura federativa estatal permeasse todo o território, de modo
que o capital estrangeiro atingisse a célula de acumulação primitiva na hinterlândia.
A organização do espaço centralizado e concentrado serve ao mesmo tempo
ao poder político e à produção material, otimizando seus ganhos. Essa centrali-
dade obedece ao modo de produção já preexistente, penetrando e subvertendo as
estruturas criadas no espaço para privilegiar um grupo hegemônico que agora se
apoia nas vias institucionais. É importante deixar claro que o que houve não foi um
rompimento político e sim uma adequação dos interesses do Estado nacional e da
oligarquia local para que pudessem caminhar juntos. No Tocantins, ainda aparecem
referências a esse poder local caracterizado por um controle paternalista, acompa-
nhado de traços de violência - cujas formas têm variado ao longo da história e se
manifestado por mecanismos que envolvem os níveis político, econômico e social.
O aumento intervencionista estatal foi possível com a reinvenção da Amazônia
Legal, implantando um centralismo administrativo na região a partir da Superin-
tendência do Plano de Valorização da Amazônia em 1953 e da SUDAM em 1965.
Os planos para a “Amazônia Tocantinense” na década de 1970 e 80 por meio da
SUDAM, POLOAMAZÔNIA (Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais
da Amazônia), SPEVEA (Superintendência do Plano de Valorização Econômico
da Amazônica) PROTERRA (Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo
à Agroindústria do Norte e Nordeste), PRODIAT (Projeto de Desenvolvimento
Integrado da Bacia do Araguaia-Tocantins), PRODECER, GETAT9 (Grupo Exe-
cutivo de Terras do Araguia-Tocantins) tiveram uma função mais ‘policiadora’ do
que integradora do território (LIRA, 2011).
Retoma-se o objetivo da expansão da fronteira agrícola: novos polos espaciais
de investimento e a integração dos mercados nacionais. Uma frente de expansão
maranhense se propagava no sentido norte do Tocantins, em progressivo movimen-
to em direção ao Pará, gerando uma crescente ocupação do norte deste território
recoberto à época pela mata de babaçu, dando espaço à rizicultura enquanto outra
9
Apesar de interligados pelos objetivos explicitados do avanço da fronteira na Amazônia, vale ressaltar
que planejamento de desenvolvimento e integração, visando a “recuperação” da economia da Bacia Ama-
zônica teve também como objetivo mapear as riquezas amazônicas, especialmente minerais, tal como
pode ser analisado no Projeto Carajás.
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corrente de ocupação rumava em direção ao sudeste tocantinense motivada pelos
garimpeiros maranhenses e piauienses (AJARA et. al, 1991).
A construção Belém-Brasília na década de 1960 repercutiu de imediato na inten-
sificação do fluxo de migrantes nas margens da rodovia que já vinham se deslocan-
do desde a década anterior, num movimento expansionista das frentes extrativista,
pastoril e agrícola, e ocupando de modo rarefeito a área do Tocantins-Araguaia. A
população aumentou de 328.486 em 1960 para 537.563 em 1970. Além disso, o cres-
cimento do número de cidades e dos aparatos de infra-estrutura e consumo também
levaram ao crescimento da população, que ia se modificando para uma população
majoritariamente urbana. Desde então, o Tocantins vem mantendo semelhantes ta-
xas de crescimento, chegando a uma população total de 1.478.164 em 2012 (IBGE,
2012). Mais do que o incremento populacional, a rodovia alterou, em grande parte,
o sentido de ‘espontâneo’ das frentes de expansão e a direção de ocupação do To-
cantins, que agora se aproximava da margem direita do rio. A migração não mais
ocorria como um extravasamento de atividades extensivas. Ao contrário, projetava
a privatização da terra e a mercantilização da economia regional direcionadas pelo
avanço da fronteira agrícola. Assim, a partir da década de 1970 a empresa agrícola se
cristaliza, já que o “governo considera impraticável a colonização fundamentada em
pequenos e médios proprietários frente à escala de investimentos e da organização
empresarial considerados para a rápida ocupação de uma área extensa como Ama-
zônia” (MARTINS, 1997, p.187-188). Estas empresas atraídas por incentivos fiscais
se estabelecem neste primeiro momento em especial na parte oeste, ao longo do
vale do Araguaia. Os empresários e pecuaristas desejavam ligar Santa Terezinha, no
Mato Grosso através da rodovia GO-262, à Belém-Brasília, na altura de Rosalândia
do Norte e em Goiás. Mais ao sul, a ilha do Bananal seria cortada por outra rodovia
em terras do Município de Formoso do Araguaia, em Mato Grosso, à transversal à
Belém-Brasília ao sul de Gurupi (BRASIL, 2001).
A separação do estado do Tocantins torna-se fundamental para a implemen-
tação do latifúndio e da empresa agrícola. Embora não seja objeto de análise, a se-
paração política-administrativa revelou que mais do que a expressão espontânea de
um anseio separatista de sua população empobrecida de origem nordestina baseada
por unidades de produção e padrões de interação de pequena escala que habita o
novo estado, a emancipação serviu à legitimação das elites regionais constituídas em
grande parte por goianos e mineiros ligados a interesses agropecuaristas (AJARA et.
al., 1991, FIRMINO et al, 2009).
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A criação da CONORTE – Comissão de Estudo dos Problemas do Norte Goia-
no, uma sociedade civil sem fins lucrativos criada em 1981 por um grupo elitista de
burocratas e empresários nortenses que tinham suas atividades nas capitais Goiânia
e Brasília foi fundamental para a emancipação do estado. O nascimento do estado de
Tocantins garantiria à elite local do norte goiano espaço no cenário nacional frente
ao estado de Goiás, especialmente àquela do sul do estado representada por Goiâ-
nia, que dominava a estrutura de poder e deixava o “nortão goiano” “esquecido”.
A CONORTE, marco histórico do ideário separatista, tinha como objetivo técnico
diagnosticar o potencial político e econômico da região. O argumento central era de
que a economia tocantinense “não se encontrava isolada da economia nacional, mas
a ela estava estreitamente vinculada, sobretudo enquanto fornecedora de fatores de
produção (mão-de-obra e capital)” (OLIVEIRA, 1998, p. 16). Além disso, na “Carta
ao Tocantins” a CONORTE aponta:
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Considerações Finais
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dade da simultaneidade entre a ordem (global) e a ação em espaços distantes (local).
Sobre a análise da evolução da agricultura na sociedade capitalista, Kautsky
(1986) aponta dois pilares: “a propriedade privada com referência à terra e o caráter
mercantil dos produtos agrícolas” (p.57). Do ponto de vista geográfico, a fronteira
expressa a expansão agrícola em área, a concentração fundiária, a transformação das
relações de produção, o êxodo rural, a modernização da base técnico-produtiva, a
implantação da rede de fixos (armazéns, indústrias, latifúndios, centros de pesquisa,
bancos, cidades, empresas, distribuidoras, portos, etc) e de fluxos de informação,
capitais, mercadorias e mão-de-obra, a integração espacial em diversas escalas geo-
gráficas, a extensão da fronteira urbano-industrial de um país, os conflitos fundiários
(SILVA, 2006). A teoria da expansão da fronteira é um desdobramento da expansão
territorial do capital (MARTINS, 1996).
Em suas diversas acepções, a fronteira sempre pressupõe movimento, um em-
bate de forças entre diferentes formas de reprodução da vida. A fronteira agrícola,
a partir dos elementos discutidos anteriormente, reflete a reprodução de um espaço
geográfico através de incorporação de terras sob a lógica dos sujeitos hegemônicos
do processo de reprodução do capital frente aos espaços da hinterlândia.
As mudanças da relação com a terra transformam o sertão, modificam as “terras
devolutas” do Estado em grandes propriedades privadas. Com a expansão de um
sistema viário e projetos de desenvolvimento o Estado auxilia a entrada do capital
nacional e estrangeiro no tanto na Amazônia quanto no território tocantinense. Vale
lembrar que a própria construção do Tocantins está calcada em acordos políticos das
elites locais para a manutenção do latifúndio, para a permanência dos privilégios de
classe e do avanço capitalista no campo.
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Andyara Maria G. P. Schimin *
Ângelo Munhoz **
RESENHA
PRETI, O. (Org.). Educação a distância: sobre discursos e práticas. 2. ed. Brasília: Liber
Livro Editora, 2012. 192 p.
Textos&Debates, Boa Vista, n.26, p. 113-117, referência 2014. Publicação 2015 113
A formação de professores é o tema inicial de discussão no livro, com dois
artigos. O primeiro, A formação do professor na modalidade a distância: (dez) construindo
metanarrativas e metáforas, de Oreste Preti discute a (re) qualificação do trabalhador na
educação; a Educação a Distância - EaD como uma nova prática ou um novo dis-
curso; e descreve a experiência do Núcleo de Educação Aberta e a Distância (Nead)
da Universidade Federal de Mato Groso - UFMT. O autor esquadrinha a experiência
na UFMT que em construção pelo Nead permitiu (re)construir práticas e (re)signifi-
car discursos sobre a formação do professor e a modalidade a distância que trazem
no seu bojo o amadurecimento de propostas formativas ensaiadas ao longo de três
décadas e são os resultados de possibilidades construídas coletivamente em parce-
ria, que assumiram características nacionais e locais. Ressalta que esses movimentos
buscam a consolidação de novos valores, a construção de novos sujeitos, de atores e
autores de seu destino, de uma sociedade mais solidária e democrática. Finalizando
o seu discurso, conclui que se deve recuperar os vínculos entre educação, trabalho,
produção, vida cotidiana e existência. Enaltece que tal vínculo é onde está o educa-
tivo e o formativo, não importando se na modalidade presencial ou a distância.
No segundo artigo do tema formação de professores, Educação a distância e a
formação de professores: Possibilidades de mudança paradigmática, a autora Maria Neder,
Doutora em Educação e professora do Departamento de Teorias e Fundamentos
da Educação, do Instituto de Educação da UFMT afirma que o essencial da EaD
está não somente na sua adjetivação (a distância), mas também naquilo que lhe é
susbstantivo (educação). Assegura que antes de se pensar na organização do projeto
pedagógico, se presencial, semipresencial, ou a distância, é necessário pensar sobre
o significado conferido à educação. Neder percebe que ao pensar em EaD deve-
-se pensar antes em educação, como prática social que contribui para construção
de significados, reforçando e/ou conformando interesses sociais e políticos, refle-
tindo nas questões contemporâneas como violência, discriminação, desigualdade,
exclusão, e na busca de ações práticas que contribuam na formação de uma ética de
convivência mais solidária.
A segunda parte do livro apresenta quatro artigos sobre práticas discursivas. O
primeiro, Educação a distância como processo semiodiscursivo, de Lúcia Possari, Doutora
em Comunicação e Semiótica, professora do Departamento de Comunicação Social
e dos mestrados em Linguagem e em Estudos de Linguagem do Instituto de Letras
da UFMT e do mestrado em Educação da Universidade de Cuiabá (Unic), afirma
que não se prescinde da presença de um corpo para se fazer significar. Relata sobre
dois tipos de leitores, o real que parafraseia, e o virtual que avança e permite que sua
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história de leituras amplie os sentidos: o polissêmico Possari, nos diz que na EaD
permite-se a construção de aprendizagem cooperativa, com trocas de idéias, imagens
e experiências, em redes com textos plurais que propiciam a participação de sujeitos
diferentes, com expectativas e níveis culturais diversos. Ressalta que essa interação se
dá por meio de textos-signos multifacetados. Concebe a autora que o sujeito-leitor
en- “reda” -se para a construção do conhecimento, expandindo sua memória discur-
siva e sua história de leituras, integrando as redes de conhecimento e tornando-se
mais adequado às respostas esperadas.
O segundo artigo sobre práticas discursivas – A “autonomia” do estudante na educa-
ção a distância: entre concepções, desejos, normatizações e práticas, elaborado por Oreste Preti,
versa sobre a construção da autonomia do estudante e a experiência do Núcleo de
Educação Aberta e a Distância (Nead/UFMT) que oferece pistas para que o discur-
so sobre a autonomia do estudante em cursos a distância, se efetive em práticas de
autonomia. Preti enfatiza que um dos objetivos principais das instituições de EaD é
formar estudantes autônomos, não no sentido de autonomização ou de autodidatis-
mo, mas fazer da autonomia uma construção pessoal e coletiva. O autor interroga:
“Mas como conciliar a individualidade, a diversidade, com um projeto político-pedagógico institu-
cinal, coletivo?” Segundo o autor, a experiência do curso de Pedagogia a distância da
UFMT oferece caminhos para compreender as possibilidades da EaD no processo
de contrução da aprendizagem autônoma do estudante. Preti arremata afirmando
que cabe aos educadores envolvidos em cursos a distância, dar conta de sua con-
cretude, de sua existência, apesar das limitações históricas, institucionais e pessoais.
No terceiro artigo sobre práticas discursivas, A avaliação e a avaliação na educação
a distância: algumas notas para reflexão, desenvolvido por Kátia Alonso, Doutora em
Educação, professora do Departamento de Ensino e Organização Escolar e Coor-
denadora de Educação Aberta e a Distância (Nead/UFMT), afirma que a avaliação é
parte integrante da ação educativa, pois se evidencia quando se desenvolve o proces-
so de ensino/aprendizagem, podendo, se necessário, redirecioná-lo ou reelaborá-lo.
Alonso compreende que toda avaliação acontece a partir de determinados referen-
ciais, e seus resultados devem ser confrontados com critérios estabelecidos, “juizos
de valor”. Alonso, também, certifica que o desafio da avaliação em EaD está em
desvenciliar-se da relação direta professor/aluno, uma vez que o processo ensino/
aprendizagem pode ser mediado por diversos meios tecnológicos. Assim, segundo a
autora, esses elementos formam novos ambientes de aprendizagem, saindo da sala
de aula presencial. Assegura que o processo avaliativo será definido pelos projetos
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educativos e os objetivos de formação a serem atingidos, determinando seus crité-
rios e instrumentos.
O quarto e último artigo sobre práticas discursivas, Os desafios do sistema de ges-
tão em EaD, de Onilza Martins atesta que as propostas de EaD devem sediar suas
organizações, estruturas e processos de gestão de sistemas, em espaços físicos de
acesso transparente aos estudantes e à sociedade. Releva que é necessário garantir,
desde o início, a entrega dos materiais aos alunos e todas informações necessárias
para o andamento do curso e que pesquisas tem assinalado preocupações dos ges-
tores quanto ao custo-benefício em relação aos resultados alcançados pelos alunos
na aprendizagem de qualidade, a diversidade de cursos, causa provável de evasões
e a construção de estratégias para superar impasses encontrados pelos estudantes.
Encerra sua percepção apontando a importância em reconhecer que o impacto das
tecnologias digitais na sociedade e na cultura que vivemos, reacende os debates tanto
nos sistemas de ensino a distância, como no presencial.
O livro busca apontar a EaD como uma modalidade adequada à formação de
professores; que dentre os seus benefícios, contribui para a expansão e consolida-
ção da educação continuada de seus profissionais, aspecto importante para o bom
desempenho docente. Os autores em sua maioria oriundos da Universidade Federal
de Mato Grosso relatam em seus artigos experiências vividas naquela instituição
de ensino. Por outro lado, eles preocupam-se em identificar elementos que possam
facilitar a aplicação da EaD nas mais diversas instituições de ensino, uma vez que
a adequação a realidade do contexto social é fortemente mencionado por todos. A
provocação no sentido de pensar diferente sobre planejamento político-pedagógico,
formação de professores, construção do conhecimento e avaliação foi uma constan-
te em todos os artigos do livro.
A obra apresenta ao longo de seus artigos questões para reflexão e descrição de
práticas educativas em EaD que são indispensáveis aos profissionais que trabalham
com educação, não só na modalidade a distância como na presencial. Entretanto, a
leitura deverá ser feita de forma crítica e contextual evitando a panacéia para solução
de todos os males da educação. Com um “olhar” mais perquirido, questões impor-
tantes ficaram ausentes na discussão, como: problemas de evasão, qualidade dos
cursos, avaliação de aprendizagem, métodos de estudo utilizados pelos estudantes,
e a importância do sistema de gestão em EaD. Essa última mesmo tendo um artigo
sobre o assunto, não foi suficiente tendo em vista que não houve dados de pesquisas
e exemplos sobre o tema.
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De qualquer forma, a obra agrega conhecimento colaborativo à Educação quan-
do propõe a adoção da EaD na formação de professores e nas atividades de ensino,
expondo as possibilidades e dificuldades encontradas para a integração das tecnolo-
gias de informação e comunicação no caminho até a sala de aula, propondo ações
reflexivas sobre quais serão as transformações necessárias no pensamento pedagó-
gico, nas políticas educacionais e na prática docente para a melhoria da educação
usufruindo-se da modalidade a distância.
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