A Megera Domada (Original)
A Megera Domada (Original)
A Megera Domada (Original)
CATARINA
BIANCA
BATISTA
PETRUCCHIO
GRÚMIO
GRÊMIO
HORTÊNCIO
TRÂNIO
VICÊNCIO
LUCÊNCIO
BIONDELLO
VIÚVA
CURTIS
CRISTÓVÃO SLY
ATO I
Cena I
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tempo dos meus estudos com a virtude e a parte dessa filosofia que se esforça
para a ventura que a virtude almeja. Que pensas? Para Pádua vim de Pisa como
alguém que deixasse uma lagoa não muito funda, para projetar-se no mar,
sequioso de estancar a sede.
TRÂNIO - Mi perdonate, meu gentil senhor, mas concordo convosco nisso tudo,
feliz por ver que persistis no intento de aspirar as doçuras da fragrante filosofia.
Apenas, meu bom mestre, embora admiradores da virtude, da moral disciplina,
não devemos virar estóicos - penso - ou mesmo estacas, nem ficar tão devotos
de Aristóteles que a Ovídio reneguemos como a réprobo. Com vossas relações
falai de lógica mas na prática usual sede retórico. Animai-vos com música e
poesia; quanto pedir o estômago, servi-vos de matemática ou de metafísica.
Onde não há prazer não há proveito. Em resumo, senhor: é aconselhável
estudar o que mais vos for do agrado.
LUCÊNCIO - Muito obrigado, Trânio; é bom teu plano. Ah, Biondello! Se em terra
já estivesses, poderíamos tudo já ter pronto numa casa de jeito preparada para
os amigos que eu fizer em Pádua. Mas, paremos. Que gente está chegando?
GRÊMIO - Antes cortá-la; para mim é áspera. Então Hortênsio, não quereis
esposa?
HORTÊNSIO - Oh! candidatos, minha senhora? Que entendeis por isso? Sim,
candidatos, quando vos tornardes mais cândida e gentil.
CATARINA - Não tendes causa, senhor, de tanto medo, que, em verdade, ainda
não encontrastes o caminho para o coração dela. Mas no caso de o achardes,
ficai certo, seu primeiro cuidado consistira em alisar-vos os cabelos com um
belo tamborete, pintando-vos o rosto de violete.
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GRÊMIO - E a mim também, bom Deus!
BATISTA - Senhores, porque eu possa pôr em prática quanto vos disse... Volta
para casa, Bianca. Que não seja isso, boa Bianca, razão de te agastares.
Continuo, minha querida, a te prezar como antes.
CATARINA - Bonequinha mimada! Melhor fora nos olhos dela enfiar os dedos
logo. Saberia porquê.
BATISTA - Senhores, calma. Não altero nada. Bianca, vai para dentro. (Sai
Bianca.) Como eu sei que a maior delícia dela consiste em música, instrumentos,
versos, vou chamar professores que lhe possam instruir a mocidade. Signior
Grêmio, ou vós, Hortênsio, caso conheçais algum, mandai que me procure logo.
Sou sempre amigo das pessoas cultas, nada poupando para dar às filhas gentil
educação. E agora, adeus. Catarina, ficai, pois ainda tenho de conversar à parte
com Bianca. (Sai)
CATARINA - Como! Não ficarei. Por que motivo? Quem me impõe hora disto,
hora daquilo? Não saberei orientar-me, acaso? (Sai.)
GRÊMIO - Ide para junto da mulher do diabo. Tendes tão altas qualidades que
ninguém aqui está disposto a suportar-vos. Nosso amor, Hortênsio, não é tão
grande que não nos permita soprar os dedos juntos e deixá-lo em jejum. Nosso
bolo está cru de ambos os lados. Adeus. Mas pelo amor que dedico à minha
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doce Bianca, se encontrar em qualquer parte um professor capaz de ensinar-lhe
aquilo em que ela mais se deleita, encaminhá-lo-ei para o pai dela.
HORTÊN5IO - Farei a mesma coisa, signior Grêmio. Mas uma palavrinha, por
obséquio. Muito embora a natureza de nossa rivalidade não nos tenha
permitido até agora nenhum entendimento, depois de refletir sobre o assunto
cheguei à conclusão de que para nosso bem comum - no caso de obtermos de
novo acesso à nossa encantadora amada e de voltarmos a ser os felizes rivais no
amor a Bianca - devemos conjugar esforços para alcançar um determinado fim.
GRÊMIO - Não sei. Enquanto a mim, fora mais fácil aceitar o seu dote, com a
condição de ser chibateado todas as manhãs no pelourinho.
HORTÊN5IO - É certo. Como dizeis, entre batatas podres não há o que escolher.
Mas desde que este obstáculo legal nos fez amigos, continuemos no mesmo
tom até conseguirmos um marido para a filha mais velha de Batista, deixando,
assim, a mais nova sem empecilho para casar-se... E recomecemos a luta!
Adorável! Bianca! Feliz de quem se casar com ela. Quem correr mais depressa,
obterá o anel. Que vos parece, signior Grêmio?
TRÂNIO - Será possível, meu senhor, dizei-me, que predomine o amor assim de
súbito?
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LUCÊNCIO - Ó Trânio, enquanto eu mesmo o não sentira, não julgara possível
nem provável. Mas vê: estando aqui, sem fazer nada, os efeitos do amor
encontrei no ócio, confessando-te agora, lisamente - a ti que és para mim o que
foi Ana para a rainha de Cartago - ó Trânio! abraso-me, definho, morro, Trânio,
se não casar com esta meiga jovem. Aconselha-me, Trânio; sei que o podes.
Trânio, ajuda-me; sei que queres isso.
TRÂNIO - Tempo não é, senhor, de censurar-vos. Não é com ralhos que a afeição
se expulsa. Se estais amando, só vos resta agora Redime te captum, quam queas
minimo.
LUCÊNCIO - Oh! vi suave beleza no seu rosto, como a da filha de Antenor que
outrora Júpiter obrigou a ser humilde, quando em Creta o levou, na frente dela,
com os joelhos a beijar a areia bela.
TRÂNIO - Não vistes nada mais? Não observastes como a irmã dela começou de
súbito a soltar invectivas, levantando tal tempestade que impossível for a
ouvido humano suportar o estrondo?
LUCÊNCIO - Vi que ela os lábios de coral movia o ambiente perfumando com seu
hálito. Celeste era e inefável tudo nela.
LUCÊNCIO - Trânio, que pai cruel! Mas não notaste que se ocupava em alcançar
para ela professores capazes?
TRÂNIO - Assim terá de ser. Em resumo, senhor: sendo ordens vossas, e estando
eu obrigado a obedecer-vos, pois vosso pai me disse ao nos partirmos: “Fica
sempre a serviço de meu filho” embora outra intenção ele tivesse, tenho
certeza - apraz-me ser Lucêncio, por amor de Lucêncio.
BIONDELLO - Onde é que estive? Não; dizei, primeiro, onde é que estais. Acaso,
mestre, as vestes vos roubou Trânio? Ou vós as dele? Ou ambos? Que se
passou? Dizei-me.
LUCÊNCIO - Não há tempo para gracejos. Vem aqui, maroto. Precisas ajeitar-te
às circunstâncias. Para salvar-me a vida, Trânio assume minha aparência e veste
minha roupa, como eu, para escapar, vesti a dele. Matei um homem mal saltei
em terra, e tenho medo de ter sido visto. Ficareis a serviço dele, como convém,
é o que vos digo; e eu daqui logo me afastarei, para salvar a vida.
Compreendestesme bem?
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TRÂNIO - O mesmo eu desejara, rapaz, com a condição de que Lucêncio
desposasse a caçula de Batista. Mas não por mim, maroto, por vosso amo, em
qualquer sociedade usai comigo de muita discrição. Sozinho estando, volto a ser
Trânio; mas com gente estranha, sou vosso amo Lucêncio.
LUCÊNCIO - Vamos logo, Trânio. Só nos falta pôr em prática uma coisa, que terá
de ser feita por ti, que é apresentares-te também como um dos pretendentes.
Se me perguntares porquê, bastará que te diga que tenho para isso razões boas
e de peso. (Saem. Falam as personagens do prólogo.)
SLY - Estou prestando, sim, por Santa Ana. É uma bonita história. Ainda vai
demorar muito?
SLY - É uma excelente obra-prima, madame senhora. Quem dera que já tivesse
acabado! (Sentam-se e continuam a olhar.)
Cena II
PETRUCCHIO - Verona, adeus por uns momentos; quero ver em Pádua uns
amigos, e entre todos o mui querido e dedicado Hortênsio. Sua casa é esta aqui,
se não me engano. Grúmio, maroto, bate! Estou mandando.
GRÚMIO - Bater em vós, senhor? Oh, senhor! Quem sou eu para bater em vós?
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PETRUCCHIO - Vamos, maroto; bate-me na porta, se essa cabeça estúpida te
importa.
GRÚMIO - Meu amo arruaceiro agora se revela. Mas se eu der nele, farei uso da
canela.
PETRUCCHIO - Então, maroto: bates ou não bates? Não? Nesse caso, bato eu
sem dó, para ouvir-te cantar sol, mi, lá, dó. (Puxa as orelhas de Grúmio.)
(Entra Hortênsio.)
HORTÊNSIO - Que é isso? Que aconteceu? Oh! o meu velho amigo Grúmio e o
meu bom amigo Petrucchio! Como vão todos em Verona?
PETRUCCHIO - Viestes nos separar, Hortênsio amigo? Con tutto il cuore bem
trovato, digo.
HORTÊNSIO - Alla nostra casa ben venuto, molto honorato signior mio
Petrucchio. Vamos, Grúmio, levanta-te; acalmai-vos.
GRÚMIO - Não; pouco importa tudo quanto ele possa dizer em latim. Se isso
não for um motivo legal para eu deixar o serviço dele... Ora vede, senhor, ele
mandou que eu batesse nele, que o surrasse com força. E agora dizei-me se fica
bem para um criado proceder dessa maneira com o patrão, uma pessoa que,
pelos meus cálculos, já terá seus trinta e dois anos? Mas se com força assim
tivesse feito, saíra Grúmio alegre deste pleito.
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como segue: morreu meu pai, Antônio, tendo agora saído eu sem destino,
tencionando casar bem e vencer do melhor modo. Ouro tenho na bolsa; bens,
na pátria. Assim, viajo para ver o mundo.
GRÚMIO - Ora vede, senhor; ele vos diz francamente o que pensa. Sendo assim,
dai-lhe ouro bastante e casai-o com uma boneca, ou com um figurino, ou com
uma velha que não tenha um só dente na boca, muito embora tenha tantas
doenças como cinqüenta e dois cavalos reunidos. Tendo dinheiro, para ele tudo
estará bem.
HORTÊNSIO - Bom Petrucchio, uma vez que andamos tanto, vou prosseguir no
que era, de começo, somente brincadeira. Tenho meios, Petrucchio, de ensejar-
te uma consorte bastante rica, mui formosa e jovem, e educada no jeito de
fidalga. Seu único defeito - e que defeito! - é ser intoleravelmente brava,
teimosa e cabeçuda sem medida, a tal ponto que, embora meus haveres fossem
menores, não a desposara por uma mina de ouro.
PETRUCCHIO - Conheço o pai, embora a não conheça; foi muito amigo de meu
pai defunto. Não durmo, Hortênsio, sem a ver primeiro. Ireis perdoar-me, assim,
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a liberdade, logo ao primeiro encontro, de deixar-vos, salvo se fordes até lá
comigo.
GRÚMIO - Peço-vos, senhor, deixai-o ir, enquanto ele está com essa disposição.
Por minha alma, se ela o conhecesse tão bem quanto eu, saberia que no caso
dele de nada valem as recriminações. Ela poderá, tal vez, chamá-lo umas dez
vezes de biltre ou coisa assim. Não lhe fará mossa nenhuma. Uma vez entrado
na dança, ele recorrerá ao vocabulário próprio. Vou dizer-vos uma coisa,
senhor: por pouco que ela lhe resista, ele lhe marcará o rosto com uma figura
que a deixará tão desfigurada como um gato sem olhos. Não o conheceis,
senhor.
GRÚMIO - Não há nenhuma velhacaria nisso. Vede como os moços sabem juntar
as cabeças para enganarem os velhos. Patrão, patrão, olhai para trás! Quem é
que vem chegando?
GRÊMIO - Oh, muito bem! Já examinei a conta. Ora me ouvi, senhor: quero que
todos sejam encadernados ricamente; livros de amor, somente, tomai nota; não
deveis ler-lhe nenhum outro assunto. Compreendestes-me? Além dos que
obtiverdes da liberalidade de Batista, vos farei donativos generosos. Tomai
vossos papéis; é necessário que perfumados sejam suavemente, pois mais
suave ela é do que os perfumes a que são destinados. Que ireis ler-lhe?
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LUCÊNCIO - Seja o que for, podeis estar certíssimo de que defenderei a vossa
causa como se fôsseis vós; sim, talvez mesmo com palavras de muito mais
efeito, salvo se fôsseis, meu senhor, um sábio.
GRÊMIO - Feliz encontro, meu signior Hortênsio. Não suspeitais para onde vou?
A casa de Batista Minola. Prometi-lhe que havia de esforçar-me na procura de
um professor para a formosa Bianca. E tive sorte; achei este mancebo que, pelo
seu saber e competência, muito se recomenda. Lê poesia e outros livros; só
bons, posso afiançar-vos.
PETRUCCHIO - De Verona; do velho Antônio, filho. Morreu meu pai; mas vive
meu dinheiro; viver pretendo agora prazenteiro.
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GRÊMIO - Prazenteiro, com uma fúria dessas? Fora estranho. Porém se assim
quiserdes, seja, em nome de Deus. Haveis de ter-me como auxiliar em tudo.
Mas é certo: namorareis aquela gata brava?
PETRUCCHIO - Por que vim cá, senão para isso mesmo? Pensais que um
ruidozinho me ensurdece? Já não ouvi rugirem leões há tempos? Já não ouvi o
mar, que o vento empola, bramir como javardo enfurecido, suando de
espumar? As baterias já não ouvi, acaso, na campanha, e a artilharia arrebentar
das nuvens? Nos grandes prélios já não tenho ouvido nitrir cavalos, ressoar
trombetas, não cessar nunca o alarma, para virdes da língua me falar de uma
donzela, que não chega a fazer tanto barulho como a castanha no fogão do
rústico? Ora! Espantalho é só para criança.
GRÚMIO (à parte) - Quisera ter tanta certeza disso como de um bom jantar.
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TRÂNIO - E vós com isso?
TRÂNIO - Não é livre esta rua, ou esta viela, para nós ambos?
TRÂNIO - Jamais, senhor; mas soube que tem duas: uma, formosa pela língua
afiada; a outra, pela modéstia, encantadora.
GRÊMIO - Pois não; deixo o trabalho para esse Hércules; que lhe seja maior que
os outros doze.
PETRUCCHIO - Permiti que vos fale com franqueza. Das duas filhas a mais moça,
aquela que desejais pescar, foi excluída pelo pai do convívio dos rapazes,
afirmando ele que a nenhum a entrega sem que a filha mais velha a casar
venha. Livre será então; não antes disso.
TRÂNIO - Se for assim, senhor, sendo vós o homem que nos irá favorecer a
todos, eu inclusive, quebrai logo o gelo, realizai logo a proeza de a mais velha
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conquistar, e a mais moça deixai livre por que todos possamos cortejá-la. O que
a alcançar não há de ser, decerto, tão desgracioso que se mostre ingrato com
relação a vós.
TRÂNIO - Cavalheiro, sovina não serei; e como prova vos convido a passar
comigo a tarde, para brindes à moça levantarmos. Como advogados
procedamos nisso, os quais, embora com calor discutam, depois comem e
bebem como amigos.
HORTÊNSIO - Petrucchio, a idéia pode dar bom fruto. Serei agora vosso bem
venuto.
(Saem.)
ATO II
Cena I
BIANCA - Querida irmã, não me façais a injúria, nem a vós mesma, de tratar-me
como criada ou baixa escrava. Isso me humilha. Quanto aos enfeites, basta me
soltardes as mãos, para que deles me desfaça; sim, do manto ao casaco. E tudo
quanto me ordenares, farei sem discrepância, tanto conheço meus deveres para
com as pessoas mais velhas.
CATARINA - Ora intimo-te a me dizer a qual dos pretendentes à tua mão dedicas
mais afeto. Não dissimules; conta-me a verdade.
BIANCA - Acreditai-me, irmã: nos homens vivos jamais notei fisionomia alguma
que particularmente me agradasse.
BIANCA - Se gostais dele, mana, aqui prometo nesse sentido lhe falar, contanto
que venhais a possuí-lo.
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CATARINA - Agora entendo: gostais mais de riquezas, preferindo Grêmio, por
isso, para que vos deixe, sem dúvida, mais bela.
BIANCA - Tendes ciúme de mim por causa dele? É brincadeira, Vejo-o bem. E ora
noto que outra coisa não fizestes senão brincar comigo. Quetinha, por
obséquio, as mãos soltai-me.
BATISTA - Que é isso, dona? Por que tanta fúria? Bianca, fica de lado.
Pobrezinha! Está chorando... Vai buscar a agulha; não te metas com ela. Que
vergonha! Por que motivo, espírito diabólico, quem nunca te fez mal assim
maltratas? Quando ela te falou em tom mais áspero?
(Sai Bianca.)
CATARINA - Já não me suportais? Agora vejo que ela é vosso tesouro e que é
preciso arranjar-lhe um marido. Em suas núpcias descalça dançarei; por causa
dela conduzirei macacos para o inferno Não me faleis, pois a chorar vou pôr-me,
até achar ocasião para vingar-me.
(Sai.)
BATISTA - Já houve alguém, como eu, tão molestado? Mas, quem vem vindo aí?
BATISTA - Sim, bom dia, vizinho Grêmio. Deus vos guarde, amigos.
PETRUCCHIO - E a vós, senhor. Dizei-me, por obséquio: não tendes uma filha,
Catarina de nome, encantadora e mui virtuosa?
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GRÊMIO - Sois muito brusco; procedei com método.
BATISTA - Sois bem-vindo, senhor, assim como ele, por amor vosso. Quanto à
minha filha Catarina - certeza tenho disso - não diz com vosso gênio, o que me
pesa.
PETRUCCHIO - Vejo que não quereis perder a filha, ou que não vos agrada
minha aliança.
PETRUCCHIO - Eu? Sou Petrucchio; foi meu pai Antônio, em toda a Itália muito
conhecido.
GRÊMIO - Acatando, Petrucchio, vossa história, permiti, por obséquio, que nós
outros, pobres peticionários, também azo tenhamos de falar. Ficai de lado;
apressais-vos demais.
GRÊMIO - Não o duvido, meu senhor; mas ainda haveis de amaldiçoar esse
noivado. Vizinho, o presente dele vos deixou satisfeito, tenho certeza disso.
Para vos prestar idêntica gentileza, uma vez que eu, mais do que qualquer outra
pessoa, tenho recebido de vossa parte tantas provas de deferência, tomo a
liberdade de apresentar-vos este jovem sábio (apresenta Lucêncio) que estudou
muito tempo em Reims e é tão perito em latim e grego como aquele o é em
música e matemática. Chama-se Câmbio. Por obséquio, aceitai os serviços dele.
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BATISTA - Mil agradecimentos, signior Grêmio. Sois bem-vindo, bondoso
Câmbio. (A Trânio.) Mas, meu amável senhor, tendes aparência de estrangeiro.
Poderei ter a ousadia de perguntar o motivo de vossa vinda?
TRANIO - Perdão, senhor, mas a ousadia é minha, pois, à vossa cidade sendo
estranho, apresento-me como pretendente à mão da bela e virtuosa Bianca.
Não ignoro, também, vosso propósito de dar a preferência à irmã mais velha. A
única permissão que vos impetro é que, sabendo a casa de onde eu venho, me
concedais acesso livre e idêntico acolhimento concedido aos outros. E para a
educação de vossa filha este instrumento simples vos oferto e estes autores
gregos e latinos. Aceitai-os, que são de grande mérito.
PETRUCCHIO - Meu assunto, signior Batista, exige muita pressa; não poderei
voltar todos os dias para fazer a corte. Conhecestes meu pai perfeitamente; em
mim o vedes, único herdeiro de seus bens e terras, que, em minhas mãos, longe
de diminuírem, tomaram grande impulso. Ora dizei-me: se eu conseguir o amor
de vossa filha, que dote ela trará no desposório?
BATISTA - Quando eu morrer, metade do que tenho; neste momento, vinte mil
coroas.
BATISTA - Sim, mas depois da cláusula precípua: o sim da noiva, porque isso é
tudo.
PETRUCCHIO - Ora, isso é nada. Posso asseverar-vos, pai, que tão decidido eu
sou quanto ela pervicaz e orgulhosa. Ao se encontrarem, duas chamas violentas
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aniquilam quanto a fúria lhes tenha alimentado. Conquanto o fogo brando se
embraveça com pouco vento, os furacões terríveis levam diante de si o fogo e
tudo. Ora, sendo eu assim, compete a ela ceder aos meus desejos. Sou muito
áspero; não vou fazer a corte como criança.
BATISTA - Que tenhas sorte em tudo e que abençoada seja tua pressa. Mas será
prudente contar com muitos infelizes termos.
HORTÊNSIO - Creio que ela dará melhor soldado. O ferro pode resistir-lhe,
nunca sonoroso alaúde.
HORTÊNSIO - Não, que ela o dobrou em mim, primeiro. Disse-lhe apenas que ela
se enganava com relação ao toque, procurando os dedos ajeitar-lhe junto às
cordas, quando ela, com espírito diabólico, impaciente, gritou: “Isso é que é
toque? Pois vou tocar de jeito”. Assim dizendo, na cabeça me deu tão forte
golpe, que através do instrumento abri caminho, algum tempo ficando
estupefacto, como pessoa presa ao pelourinho, a olhar pelo alaúde, enquanto
“Imundo rabequista”, “Zezé desafinado”, e outras vinte expressões ela jogava-
me, que adrede decoradas pareciam, tão-só para insultar-me.
PETRUCCHJO - Pelo mundo! Que rapariga alegre! Amo-a dez vezes mais agora
do que antes. Que vontade de conversar com ela alguns momentos!
PETRUCCHIO - Pois não; mandai-a vir; aqui a espero. (Saem Batista, Grêmio,
Trânio e Hortênsio.) Vou cortejá-la com algum espírito. Se me insultar, dir-lhe-ei
sem circunlóquios que como o rouxinol tem ela o canto; franzindo o rosto, lhe
direi que é límpida como a rósea manhã que o orvalho banha; se não disser
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palavra e ficar muda, elogios farei ao seu talento de expressar-se, afirmando
que a eloqüência dela é arrebatadora. Convidando-me a retirar-me, agradecido
mostro-me, como se o grato invite eu recebesse de ficar junto dela uma
semana. Se desposar-me não quiser, lhe falo sobre os proclamas e o feliz
evento. Mas ei-la aí. Vamos, Petrucchio; fala. (Entra Catarina.) Sois bem-vinda,
Quetinha. Esse, disseram-me, é o vosso nome; não é isso mesmo?
CATARINA - Sois lerdo para ouvir; quantos meu nome pronunciam, só dizem
Catarina.
CATARINA - Mas não um tolo como vós, se é certo que a mim vos referis.
CATARINA - Muito leve para ser apanhada por um rústico. Sou tão pesada
quanto devo sê-lo.
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CATARINA - Bruto seria para uma rolinha.
CATARINA - Na língua.
(Bate-lhe.)
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CATARINA - Se eu tivesse um espelho, mostraria.
CATARINA - E já enrugado.
PETRUCCHIO - Só de cuidados.
PETRUCCHIO - Teria ornado Diana uma floresta como Quetinha agora este
aposento com seu porte fidalgo? Oh! que ela seja Quetinha, e tu, Diana, porque
casta Quetinha fique e Diana, brincalhona.
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casamento; combinamos o dote. E agora, ainda que não queirais, tereis de
desposar-me. Podeis crer-me, Quetinha: eu sou o marido que vos convém. Por
esta luz o juro, que me permite ver tua beleza - essa beleza que de ti me deixa
de tal modo rendido - outro marido que não seja eu, não poderás ter nunca,
pois eu nasci para domar-te, para transformar a Quetinha rezingueira numa
Quetinha mansa, e tão amável como as Quetinhas donas de seus lares. Teu pai
vem vindo agora não te insurjas, pois quero Catarina para esposa.
BATISTA - Então, Signior Petrucchio, de que modo ides com minha filha?
CATARINA - Dais-me o nome de filha? Pois afirmo sob palavra. Que paternal
afeto revelastes querendo desposar-me com um lunático, um João praguejador,
um tresloucado, que quer impor-se só com juramentos.
PETRUCCHIO - Pai, o negócio é assim: vós e os mais todos que falais dela estais
muito enganados. Ela só é indigna por política; rabugenta não é, mas tão
modesta como a rola; não tem gênio esquentado, sendo tão fresca quanto a
manhã bela. Em paciência é Griselda rediviva; a romana Lucrécia, em castidade.
Em conclusão: deixamos combinado casarmo-nos no próximo domingo.
TRÂNIO - E assim vossa história? Então, boa noite para nosso contrato.
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Preparai os festejos, pai, mandando logo convite para os conhecidos. Certo
estou de que a minha Catarina vai mostrar-se galante.
BATISTA - Disso tudo não sei o que pensar; mas dai-me as mãos. Petrucchio,
Deus vos dê felicidade. Está assentado.
BATISTA - Tal como o comerciante, muito ou pouco nesta hora arrisco num
negócio louco.
TRÂNIO - Era uma carga que vos molestava; agora ou vos dá lucro ou vai ao
fundo.
GRÊMIO - Pacífico para ele foi esse ato. Mas agora, Batista, é mais que tempo
de falarmos em vossa filha Bianca. Chegou o dia por que tanto ansiávamos.
Vosso vizinho sou; a apresentar-me fui o primeiro como pretendente.
BATISTA - Jovem, nunca amá-la poderás com tantas veras como seu próprio pai.
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GRÊMIO - De começo, como sabeis, a casa que eu possuo na cidade adornada é
ricamente com baixelas de prata e ouro abundante, jarros, bacias para as mãos
lavar-lhe, tão delicadas. São minhas cortinas. Tudo isso será dela. Então, meu
caro signior Grêmio, deixei-vos achatado? de tecidos da Tíria; nos meus cofres
de marfim as coroas se comprimem; nas arcas de ciprestes tenho colchas,
cortinas, baldaquins, vestes custosas, batistas finas, almofadas turcas com
pérolas tecidas, franjas vindas de Venera, com fios de ouro ornadas, cobre e
estanho a valer, e tudo quanto faz parte de uma casa bem montada. Em minha
granja tenho uma centena de vacas prontas para boa ordenha, além de cento e
vinte bois no estábulo, e tudo o mais em proporção idêntica. Não nego que já
sou um tanto idoso. Se eu morrer amanhã, tudo isso é dela, caso, enquanto eu
viver, ela for minha.
TRÂNIO - Esse “caso” do fim chegou a tempo. Signior Batista, ouvi-me. Sou filho
único e herdeiro de meu pai. Se vossa filha se tornar minha esposa, três ou
quatro casas lhe deixarei na rica Pisa, tão belas como quantas tenha em Pádua o
velho signior Grêmio. Acrescentemos a isso uma renda de dois mil ducados por
ano em terras boas para amanho.
GRÊMIO - Dois mil ducados anuais de terra? Minhas terras não dão tamanha
renda. Mas prometo também que será dela minha carraca que ancorada se
acha no porto de Marselha. E ora dizei-me se não vos achatou minha carraca?
TRÂNIO - Grêmio, é sabido que meu pai possui nada menos que três carraças
fortes, e mais duas galeras e uma dúzia de embarcações menores. Isso tudo de
dote lhe asseguro e mais o dobro de tudo quanto possas ofertar-lhe.
GRÊMIO - Não; já ofereci tudo; é quanto tenho. Não posso dar-lhe mais do que
possuo; de meus bens e de mim será senhora, no caso de escolher-me.
BATISTA - Sim, confesso que é maior vossa oferta. Assegurando vosso pai a
fortuna como dote de minha filha, será vossa esposa. Mas sem isso, perdoai-
me: se morrerdes primeiro, qual será o dote dela?
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GRÊMIO - Vizinho, passai bem. (Sai Batista.) Não tenho medo de ti. Com a breca,
meu taful! Bem tolo seria vosso pai se te fizesse dádiva do que tem, para
debaixo viver de tua mesa na velhice. Uma raposa italiana, moço, não arrisca
assim fácil o pescoço.
(Sai.)
TRÂNIO - Pele engelhada, o diabo te carregue! Mas tenho um dez para ganhar o
jogo. Já encontrei a maneira de meu amo vir a sair-se bem. Não há motivo – não
o vejo - para que um Lucêncio falso não tenha um pai Vicêncio também falso.
Eis o estranho do caso: os pais, de regra, dão vida aos filhos; mas neste noivado
pelo filho vai ser o pai gerado.
(Sai.)
ATO III
Cena I
LUCÊNCIO - Asno atrasado, que não leu bastante para entender por que é que
existe música: não é para aliviar o entendimento depois do estudo e do trabalho
diário? Deixai-me ler, assim, filosofia e, ao descansar, servi vossa harmonia.
LUCÊNCIO - Neste ponto, senhorita: Hac ibat Simois; hic est Sigeia telius; Hic
steterat Priami regia celsa senis.
BIANCA - Traduzi.
LUCÊNCIO - “Hac ibat”, como já vos disse, “Simois”, eu me chamo Lucêncio, “hic
est”, filho de Vicêncio de Pisa, “Sigeia teilus”, disfarçado para alcançar vosso
amor. “Hic steterat” e o Lucêncio que se apresentou para vos fazer a corte,
“Priami”, é meu criado Trânio, “regia”, que tomou o meu nome, “celsa senis”,
para melhor enganarmos o velho pantalão.
BIANCA - Vamos ver agora se eu sei traduzir: “Hac ibat Simois”, não vos
conheço; “hic est Sigeia telius”, não tenho confiança em vós; “Hic steterat
Priami”, tomai cuidado para que ele não nos ouça, “regia”, não sejais muito
apressado, “celsa senis”, não desespereis.
HORTÊNSIO - O baixo está afinado. O biltre baixo é que estraga o conjunto. Que
entusiasmo mostra o nosso pedante! E que atrevido! Mas estou percebendo
que o maroto está fazendo a corte à minha amada. Vou passar a observar-te
com cuidado, professor de uma figa.
LUCÊNCIO - Não desconfieis, pois é certeza: o Eácida foi Ajax, pelo avô assim
chamado.
BIANCA - Sou forçada a dar crédito a meu mestre; se não, afirmo-o, ainda
argumentara muito sobre esse ponto duvidoso. Fiquemos por aqui. Agora, Lício,
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chegou a vossa vez. Bondosos mestres, não vos zangueis por eu me ter
mostrado pilhérica com ambos.
HORTÊNSIO(a Lucêncio) - Ora o posto me cedei, indo dar um bom passeio, pois
não tenho canção para três vozes.
LUCÊNCIO - Sois tão formal, senhor? (À parte.) Não me retiro; vou observá-lo,
pois se não me iludo, amando está o nosso belo músico.
HORTÊNSIO - Antes, senhora, de tocar nas cordas, para aprender a posição dos
dedos, os rudimentos da arte vou dizer-vos. Ensinarei a escala por um método
mais conciso, agradável e eficiente do que quantos ensinam meus colegas. Está
neste papel, com bela escrita.
(Entra um criado.)
CRIADO - Senhora, vosso pai disse que deixeis os livros, para ajudardes a
enfeitar o quarto de vossa irmã, pois amanhã é o dia do casamento dela.
(Sai.)
(Sai.)
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Cena II
(O mesmo. Diante da casa de Batista. Entram Batista, Grêmio, Trânio,
Catarina,Bianca, Lucêncio e criados.)
BATISTA (a Trânio) - Hoje é o dia das núpcias de Petrucchio com Catarina, meu
senhor Lucêncio; mas não temos notícia de meu genro. Que se virá a dizer?
Quanto motivo de zombaria, se não vier o noivo, já estando o padre à espera
para os ritos das núpcias realizar! Que diz Lucêncio da afronta que nos fazem?
CATARINA - Minha, apenas, é toda a afronta. Tive de, forçada, ceder a mão,
contra a vontade própria, a um sujeito estouvado, tipo excêntrico, que ficou
noivo à pressa e ora pretende casar-se com vagar. Bem que eu vos disse que era
louco varrido e que escondia sob a capa de amargas brincadeiras a grosseria
própria. Porque alegre sujeito parecesse, pediria de mil jovens a mão, marcara a
data do casamento, convidara amigos, fazendo publicar logo os proclamas, sem
pretender, porém, casar-se nunca. A pobre Catarina doravante vai apontada ser
por toda a gente, que dirá: “Olha a esposa de Petrucchio, quando Petrucchio se
casar com ela!”
BATISTA - Vai, menina; não te censuro por chorares hoje. Uma injúria como esta
deixaria vexado um santo, muito mais pessoa de gênio como o teu, tão
impaciente.
(Entra Biondelo.)
BIONDELLO - Então não será novidade saberdes que Petrucchio está a chegar?
BATISTA - Já chegou?
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BIONDELLO - Ainda não, senhor.
BIONDELLO - Quando ele estiver onde eu estou e vos vir como eu vos estou
vendo.
BIONDELLO - Oh, Senhor! O seu lacaio, enfeitado do mesmo jeito que o cavalo,
com uma meia de linho em uma das pernas e uma perneira de pano grosso na
outra, ligas listadas de azul e vermelho, um velho chapéu que, guisa de pluma,
traz “o humor de quarenta fantasias”; um monstro, um verdadeiro monstro nos
trajes, não se parecendo em nada com um pajem cristão ou com o criado de um
gentil-homem.
TRÂNIO - Algum capricho o leva a assim vestir-se, embora sempre usasse roupa
simples.
BATISTA - Alegra-me saber que ele já está em caminho; venha de que jeito vier.
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BATISTA - Mas não dissestes que ele já vinha vindo em caminho?
BIONDELLO - Não, senhor; o que eu disse foi que o cavalo dele o trazia no dorso.
BIONDELLO - Não, não, por São Jacó! Aposto um bom vintém em que um cavalo
só e um homem, mais ninguém, se eu junto os colocar não formarão um par.
PETRUCCHIO - Com roupa fina ou não, o que importava era a ansiedade de vir
ter convosco. Mas onde está Quetinha, minha noiva do coração? Meu pai, como
se sente? Meus senhores, franzis o sobrecenho. Por que esta bela companhia
fica como que estupefacta, parecendo ver algum monumento extraordinário,
prodígio raro, ameaçador cometa?
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TRÂNIO - Não vos apresenteis a vossa noiva com essa fantasia irreverente. Ide
ao meu quarto e ponde roupa minha.
BATISTA - Mas quero crer que não ireis à igreja vestido desse modo.
TRÂNIO - Com tais vestes deve ele ter em mente alguma coisa. Se for possível,
vamos persuadi-lo a vestir-se melhor, para ir à igreja.
BATISTA - Vou atrás dele, para ver como isso tudo vai acabar.
TRÂNIO - O amor de Bianca, senhor, é nada, sem que lhe ajuntemos a permissão
paterna. Para obtê-la, como já disse a Vossa Senhoria, vou procurar um homem
- pouco importa quem ele seja; havemos de instruí-lo - que Vicêncio de Pisa vai
chamar-se e aqui em Pádua caução nos dará plena de quanto prometi, e mais
ainda. Assim, de vossa dita, calmamente desfrutareis, e com consentimento
vireis a desposar a doce Bianca.
LUCÊNCIO - Não fosse o professor, meu camarada, tão de perto vigiar os passos
dela, fora fácil, parece-me, casarmo-nos por modo clandestino. Uma vez pronto,
embora diga “não” o mundo todo, contra o mundo, sozinho, a defendera.
(Volta Grêmio.)
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GRÊMIO - Casados? Descasados fora certo, que ela com ele não ganhou marido.
Tipo intratável!
GRÊMIO - Qual o quê! É uma ovelha, uma pombinha; junto dele é uma tonta.
Vou contar-vos, senhor Lucêncio. Ao perguntar-lhe o padre se por esposa ele
aceitava a noiva, “Sim, pelo raio!” disse, de tal modo gritando que, de medo, o
sacerdote deixou cair o livro, e, ao abaixar-se para apanhá-lo, o noivo
tresloucado deu-lhe tamanho murro que rolaram pelo chão padre e livro, livro e
padre. “Quem quiser”, disse, “que os levante agora”.
GRÊMIO - Era só medo, que ele sapateava, jurando sem parar, como se o padre
quisesse ludibriá-lo. A cerimônia concluída, pediu vinho. “À vossa saúde!”
gritou, como se a bordo ele estivesse com a maruja, a beber alegremente,
depois do furacão. Tendo bebido parte do moscatel, jogou no rosto do
sacerdote o resto, sem dar outra razão senão dizer-nos que era rala e faminta a
barba dele e parecia que implorava um gole. Depois, pelo pescoço toma a noiva
e com tal bulha lhe beijou os lábios que fez o eco estrondar na igreja toda.
Vendo isso, de vergonha vim correndo, como estou certo que os demais
fizeram. Nunca houve casamento tão maluco. Ouvi, porém! São os menestréis
que tocam.
PETRUCCHIO - De dia, ainda; antes que a noite chegue. Não vos mostreis
atônitos. Se viésseis a saber os negócios que me chamam, longe de me pedirdes
que ficasse, diríeis que me fosse. Agradecido me declaro a esta honrada
companhia, que testemunha pôde ser de como me entreguei a esta esposa
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pacientíssima, delicada e virtuosa. Ficai todos com meu pai e com ele
banqueteai-vos. Bebei em meu louvor. E agora, adeus.
TRÂNIO - Permiti que vos peça aqui ficardes até depois da ceia.
PETRUCCHIO - Contente, por pedirdes que fiquemos; porém, apesar disso, não
ficamos.
CATARINA - Pois muito bem. Farás o que quiseres, mas hoje não sairei, nem
amanhã; só quando o resolver. Senhor, a porta se encontra aberta; é ali vosso
caminho; podeis sair de trote, enquanto as botas tendes macias. Quanto a mim,
decido que só sairei quando me der na telha. Prometeis ser esposo bem cacete,
para assim procederdes desde início.
CATARINA - Zango, zango; que tens que ver com isso? Ficai calmo, meu pai; ele
aqui fica; estou mandando.
CATARINA - Senhores, dirigi-vos para a sala do festim nupcial. Agora vejo que
uma mulher pode virar cretina, se não mostrar coragem suficiente.
PETRUCCHIO - Todos irão cear, minha Quetinha, porque assim o ordenaste. Ide,
senhores, para o banquete! Obedecei à noiva, bebei à larga à sua virgindade,
soltai rédeas ao júbilo, mostrai-vos ledos até à loucura, ide enforcar-vos... Mas a
minha Quetinha encantadora deverá ir comigo. Nada disso, não precisais
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crescer para o meu lado, nem sapatear, nem escumar de raiva. Quero ser dono
do que me pertence; ela é minha fazenda, meus bens móveis, a mobília, o
celeiro, a casa, o campo, meu burro, meu cavalo, minha vaca, meu tudo, enfim.
Aqui ela se encontra. Quem coragem tiver, que toque nela; saberei defender-
me contra o ousado que o passo me quiser barrar em Pádua. Desembainha,
Grêmio, que cercados estamos por bandidos. Se homem fores, salva tua patroa.
Não, Quetinha, ninguém te tocará; hei de amparar-te contra um milhão que
seja.
ATO IV
Cena I
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isso antes de poder chegar para perto de algum fogo e descongelar-me.
Tenciono aquecer-me soprando no fogo. Com um tempo destes, um homem
mais alto do que eu se resfriaria facilmente. Olá! Curtis! Olá!
(Entra Curtis.)
GRÚMIO - Oh! vêm, Curtis; vêm. Por isso mesmo, fogo, fogo, sem nenhuma
água por cima.
GRÚMIO - Foi, Curtis, antes desta geada. Mas, como sabes, o inverno amansa o
homem, a mulher e o animal, pois assim o fez com meu velho amo, com minha
nova patroa e comigo mesmo, camarada Curtis.
CURTIS - Sai daí, louco de três polegadas! Não sou nenhum animal.
CURTIS - Por favor, bondoso Grêmio, conta-me como vai passando o mundo.
GRÚMIO - O mundo está frio, Curtis, em todos os ofícios com exceção do teu.
Por isso, trata de acender o fogo. Cumpre o teu dever para alcançares o que te
devem, porque o patrão e a patroa estão quase mortos de frio.
CURTIS - O fogo está preparado. Por isso, bondoso Grêmio, quais são as
novidades?
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GRÚMIO - Por isso mesmo, cuida do fogo, pois apanhei um frio extremo. Onde
está o cozinheiro? A ceia está pronta? a casa enfeitada? os juncos espalhados?
As teias de aranha retiradas? Todos os criados estão de casaco novo e meias
brancas e os demais serventes com suas fardas de gala? Os odres estão bonitos
por dentro e as jarras bonitas por fora? Os tapetes já foram estendidos, e tudo,
enfim, está em ordem?
CURTIS - Tudo está em ordem. Por isso mesmo, torno a perguntar: que
novidades há?
GRÚMIO - Em primeiro lugar fica sabendo que meu cavalo está estrompado; o
patrão e a patroa caíram.
CURTIS - Como!
GRÚMIO - Ora, caíram da sela na lama; isso daria uma bela história.
GRÚMIO - Por isso mesmo é que tem o nome de história sensível. Esse tapa só
serviu para chamar a atenção de tua orelha. Agora vou começar. Imprimis,
descemos por uma coluna sujíssima, vindo meu amo na garupa da patroa...
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escapou e saiu correndo, como a rédea arrebentou, como eu perdi o meu
rabicho, além de muitas outras coisas dignas de memória, que irão cair no
esquecimento, enquanto tu voltarás para tua sepultura, sem conhecimento de
nada.
CURTIS - Por essa relação, vê-se que ele é mais intratável do que ela.
GRÚMIO - Sim, o de que o mais atrevido dentre vós poderá certificar-se, logo
que ele chegar. Mas, para que tagarelar dessa maneira? Vai chamar Nataniel,
José, Nicolau, Filipe, Válter, Biscoitinho e todos os outros. Que venham com os
cabelos bem lisos, as blusas azuis bem escovadas e as ligas uniformes. Que
façam reverência com a perna esquerda, sem terem a ousadia de tocar num só
pêlo do rabo do cavalo de meu amo, antes de beijarem a mão dele e a da
patroa. Estão todos prontos?
CURTIS - Estão.
GRÚMIO - Tu, parece, porque estás mandando que lhe dêem cumprimento.
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GRÚMIO - Bem-vindo, vós; e vós, então? Que foi que houve convosco? E vós,
camarada? E assim todos os outros cumprimentos. Agora, meus guapos
companheiros, está tudo pronto? todas as coisas estão nos eixos?
PETRUCCHIO - Aqui, senhor! Aqui, senhor! Aqui, senhor! Cabeças ocas, moços
de estrebaria é o que sois todos. Deveres ninguém tem? Não há serviço?
Atenções ninguém mostra? Onde se encontra aquele tolo que eu mandei na
frente?
PETRUCCHIO - Ide, mariolas, preparar a sopa. (Saem alguns criados.) ”Onde está
a vida que eu vivia outorga? Onde estão...” Vem, Quetinha; vem sentar-te... Bá,
bá, bá! (Voltam os criados, com sopa.) Sois bem-vinda, Quetinha. - Quando é
isso? - Doce Quetinha, fica mais alegre. Mandriões, tirai-me as botas! Biltres!
Quando? Era um monge da ordem parda, que caminhava sem guarda. Vai para
o inferno, biltre! O pé me torces. (Bate-lhe.)Toma isto, e na Outra tenhas mais
cuidado. Quetinha, fica alegre. Tragam-me água! Para onde foi meu galgo
Tróilo? Chama-me o primo Ferdinando. Aí, maroto! (Sai um criado.) Quetinha, é
uma pessoa que precisas beijar e conhecer. E meus chinelos? E água, não
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trazem? Lava-te, Quetinha, lava-te e fica alegre. (O criado deixa cair o jarro.
Petrucchio bate nele.) Biltre, estúpido! Ainda o deixas cair?
PETRUCCHIO - Pois está queimada e, assim o resto. Sois todos uns cachorros. E
essa besta do cozinheiro, onde se encontra? Biltre! Velhacos, como tendes a
ousadia de servir-me de tudo o que eu não gosto? (Atira ao chão a mesa, pratos,
etc.) Retirai isso! Copos, pratos, tudo! Mal-educados! Grosseirões! Escravos!
Como! Estais resmungando? Já vos pego.
CATARINA - Marido, por favor, ficai mais calmo. A comida está boa; bastaria
ficardes bem-disposto.
(Volta Curtis.)
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como expressar-se, de que jeito ficar, tendo acabado por sentar-se, tal como
quem desperta de repente de um sonho. Mas, corramos, que ele vem vindo aí.
(Saem.)
(Volta Petrucchio.)
(Sai.)
Cena II
HORTÊNSIO - Para vos convencer do que vos disse, senhor, ficai de lado e tomai
nota como ele dá lições.
(Afastam-se.)
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BIANCA - E vós, mestre, que ledes? Respondei-me primeiro a essa pergunta.
BIANCA - Possais, senhor, ser mestre na arte que professais com devoção.
(Afastam-se.)
HORTÊNSIO - Como isso vai depressa! Não juráveis - dizei-me agora – que vossa
ama Bianca a ninguém mais amava em todo o mundo, se não esse Lucêncio?
HORTÉNSIO - Basta, basta de enganos. Não sou Lício, nem sou músico, como
pareço, mas alguém que sente repugnância em viver com esta máscara por uma
criatura que despreza um cavalheiro e endeusa um lorpa desses. Senhor,
chamome Hortênsio, é o que vos digo.
TRÂNIO - Quero também fazer o juramento não menos firme de jamais casarme
com ela, embora suplicar-me viesse para esse fim. Que peste! Vede como
bestialmente o corteja!
(Sai Hortênsio.)
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(Lucêncio e Bianca vêm para a frente.)
TRÂNIO - Senhora Bianca, caiba-vos a graça dos amantes que têm amor sem
jaça. Sim, apanhei-vos de surpresa, amiga, e a vós renunciamos, eu e Hortênsio.
TRÂNIO - Escolheu uma viúva frescalhona que noiva e esposa vai ficar num dia.
BIONDELLO - Ó meu caro patrão! Fiquei de espreita por tanto tempo, que
esfalfado me acho. Mas, afinal, descer vi da colina um angélico velho que nos
serve muito bem aos intentos.
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PROFESSOR - Deus vos guarde, senhor.
TRÂNIO - E a vós, senhor. Muito bem-vindo sois. Estais de viagem para mais
longe, ou à meta já chegastes?
PROFESSOR - Aqui me deterei por uma ou duas semanas, nada mais. Depois, em
Roma ficarei, para a Trípoli, em seguida, me dirigir, se Deus me der saúde
PROFESSOR - De Mântua.
TRÂNIO - Mântua, meu senhor? Oh! não queira Deus tal coisa! E a Pádua vindes,
sem vos importardes com vossa vida?
TRÂNIO - Muito séria; é fatal para os mantuanos que a Pádua venham. Não
sabeis a causa? Vossos navios acham-se detidos no porto de Veneza, tendo o
doge, por questão singular com o vosso duque, mandado proclamar o que ora
digo. É de admirar. Porém se aqui tivésseis chegado um pouquinho antes, quase
nada, ainda teríeis alcançado o arauto.
PROFESSOR - Oh! para mim é muito pior a coisa do que parece, pois comigo
trago ordens de pagamento de Florença, que devo apresentar.
TRÂNIO - Para servir-vos, meu senhor, farei isso, ao mesmo tempo que vos dou
um conselho. Porém antes informai-me se em Pisa já estivestes.
PROFESSOR - Sim, meu senhor; estive várias vezes; Pisa, famosa por seus
homens graves.
TRÂNIO - Pois é meu pai, senhor; e, sob palavra, parece-se convosco alguma
coisa.
TRÂNIO - Por que a vida vos salve neste aperto, vou ser-vos útil só por amor
dele. Assim, considerai que é muita sorte terdes os traços do senhor Vicêncio.
Assumireis o nome e o aspecto dele e em minha casa muito cordialmente
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ficareis alojado. E agora, muito cuidado para que ninguém suspeite de vossa
identidade. Compreendeis-me. Em casa ficareis até poderdes liquidar os
negócios da cidade. Aceitai de bom grado esse serviço.
TRÂNIO - Vamos então concretizar a coisa. De passagem vos digo apenas isto:
meu pai é aqui esperado a cada instante para em contrato assegurar o dote que
eu devo dar à filha de Batista. A par hei de vos pôr de quanto importa. Vamos,
senhor, vestir-vos como importa.
(Saem)
Cena III
GRÚMIO - Pode ser irritante. E que diríeis de tripas gordas muito bem assadas?
CATARINA - Oh! Gosto muito. Meu bondoso Grúmio, Arranja-me isso logo.
GRÚMIO - Estou indeciso; temo que seja por demais colérico. Que diríeis de bife
com mostarda?
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GRÚMIO - Hum! Mas mostarda é um poucochinho quente.
GRÚMIO - Isso eu não faço; de Grúmio não tereis mais que mostarda.
PETRUCCHIO (à parte) - Caso me ames, Hortênsio, come tudo. (Alto.) Que esse
prato te faça bem ao coração bondoso. Quetinha, come devagar. E agora, meu
doce amor, preciso é que voltemos à casa de teu pai, para fazermos um
barulhão com todas estas sedas, canhões, golilhas, anéis de ouro, capas,
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casaquinhos e mantas muito guapas, ventarolas e fitas mui vistosas, pulseiras de
âmbar pérolas e rosas. Oh! já acabaste? Espera-te o alfaiate, que vai vestir-te
com capricho e arte. (Entra o alfaiate.) Entra, alfaiate; mostra-me o que trazes.
Põe aqui o vestido. (Entra o modista.) Novidades, senhor? Que nos trouxestes?
PETRUCCHIO - Como! O molde para isso foi alguma sopeira? Ora, ora! Um prato
de veludo! Banal e sujo. É mais um caramujo, uma casca de noz, um
brinquedinho, gorrozinho de criança, bugiaria... Quero um maior, já disse! Levai
esse.
CATARINA - Não, não quero maior; está na moda; é assim que as damas
elegantes usam.
CATARINA - Penso, senhor, que devo ter licença para falar, conforme vou fazêlo.
Não sou nenhuma criança; muita gente melhor que vós já ouviu o que eu dizia.
Se não vos agradar, tapai o ouvido. Mas expressão terei de dar com a língua a
quanto o coração me traz opresso, para que ao cabo ele a estourar não venha.
Antes que isso aconteça, liberdade completa quero ter para expandir-me.
PETRUCCHIO - Tens razão; é uma touca abominável; parece mais cascão de
torta, ou antes, pastel de seda. Tenho-te amizade muito maior por não
gostardes dela.
CATARINA - Tenhais ou não, mais é bonita a touca; só ficarei com essa; mais
nenhuma.
(Sai o modista.)
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HORTÊNSIO (à parte) - Pelo que estou vendo, não pegará nem touca nem
vestido.
PETRUCCHIO - É certo, é certo; mas se estais lembrado, não vos mandei pôr a
perder o pano, seguindo em tudo a moda. Tratai logo de voltar para casa, a toda
pressa, saltando pelos regos do caminho, porque freguês, senhor, já não sou
vosso. Não ficarei com ele; fazei disto o uso que bem quiserdes. Fora! fora!
CATARINA - Nunca tive um vestido tão bem feito, tão na moda, elegante e bem
talhado. Quereis fazer de mim uma boneca?
ALFAIATE - Vossa Senhoria - foi o que ela afirmou - é que pretende transformála
em boneca.
ALFAIATE - Não; Vossa Senhoria está enganado; o vestido foi feito sob as vistas
do mestre da oficina; ordens deu Grúmio sobre a maneira como deveríamos
confeccioná-lo.
ALFAIATE - Mas acaso não lhe dissestes nada sobre o modo como queríeis que
ele fosse feito?
ALFAIATE - Já.
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GRÚMIO - Então não te encrespes para o meu lado. Já enfeitaste muita gente;
então não me venhas enfeitar, que eu não gosto de encrespados nem de
enfeites. Repito que disse ao teu oficial que cortasse o vestido, mas não lhe
disse que o cortasse em pedacinhos: ergo, estás mentindo.
PETRUCCHIO - Lê-a.
GRÚMIO - Enfiarei essa nota pela garganta dele, se ele continuar a afirmar que
eu disse semelhante coisa.
PETRUCCHIO - Prossegui.
GRÚMIO - Pois desde este momento ponho-me à tua disposição. Fica com tua
nota, entrega-me essa jarda e não me poupes.
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GRÚMIO - Falastes bem, senhor: é para a patroa.
PETRUCCHIO - Vamos, leva-o logo daqui, para teu mestre usá-lo como bem
entender.
GRÚMIO - Toma cuidado, maroto, se tens amor à vida! Levar o vestido de minha
ama, para teu mestre usá-lo como bem entender!
PETRUCCHIO - Vem, querida Quetinha; assim faremos uma visita a vosso pai
com estas vestes pobres e honestas. Nossas bolsas serão vaidosas; nossa roupa,
pobre. É o espírito que deixa o corpo rico. E assim como através das mais
espessas nuvens o sol penetra, de igual modo nas vestes mais humildes a honra
brilha. Mais nobre é o gaio do que a cotovia, por ter plumagem muito mais
bonita? Ou mais do que a enguia vale a serpe, porque os olhos sua pele nos
alegra? Não, querida Quetinha; nada perdes com essa roupa humilde e
desornada. Se a teus olhos é opróbrio, toda a culpa põe sobre mim. Por isso, fica
alegre, pois partiremos já, para festarmos em casa de teu pai, despreocupados.
(A Grúmio.) Chama meus homens; montaremos logo; põe os cavalos na
alameda grande. a pé iremos até lá. Vejamos: são sete horas, quero crer, agora;
chegaremos com tempo de jantar.
CATARINA - Senhor, posso afiançar-vos: são duas horas; nem a ceia, é certeza,
alcançaremos.
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(Saem.)
Cena IV
PROFESSOR - E por que não? Se não me trai o engenho, de mim ainda deve
estar lembrado meu amigo Batista. Foi em Gênova, há vinte anos; nós dois nos
hospedamos na estalagem do Pégaso.
(Entra Biondello.)
TRÂNIO - Podeis ficai tranqüilo. Olá, Biondello! vede lá como andais daqui por
diante, é o que vos digo. E tende bem presente que este amigo é o legítimo
Vicêncio.
BIONDELLO - Sim; contei-lhe que vosso pai se achava ora em Veneza e que com
ele em Pádua hoje contáveis.
TRÂNIO - És um rapaz esperto; recebe isto para a bebida. Mas aí vem Batista.
Assumi, meu senhor, vossa aparência. (Entram Batista e Lucêncio.) Signior
Batista, mui feliz encontro. (Ao professor.) Este é o senhor sobre que já falamos.
Revelai-vos agora um pai bondoso, dandome Bianca para minha herança.
PROFESSOR - Mais devagar, meu filho. Com vossa permissão, senhor; mas tendo
vindo até Pádua por algumas dívidas, fui informado por Lucêncio duma causa de
amor de grande relevância entre ele e vossa filha. Assim, em parte pelas
informações que de vós tenho, em parte pelo amor que ele lhe vota, por ela
retribuído, para que ele não espere demais concordo, em minha solicitude
paternal, em que esse casamento se faça. E se pensardes do mesmo modo que
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eu, haveis de achar-me disposto - após sobre isso conversarmos - para firmar as
cláusulas de nosso contrato para o dote. Pois convosco não posso revelar-me
desconfiado, signior Batista, tendo em vista as boas referências que sobre vós
obtive.
BATISTA - Não em minha casa, signior Lucêncio, que as paredes ouvem, como o
sabeis, e eu tenho um grande número de criados, sem contarmos que o velho
Grêmio ainda está de espreita, podendo vir, assim, a interromper-nos.
TRÂNIO - Em meus alojamentos, nesse caso. Meu pai vai ficar lá; e ainda esta
noite poderemos concluir nosso negócio com bastante sigilo e segurança.
Mandareis vosso criado chamar Bianca, enquanto este meu pajem vai correndo
buscar-nos o escrivão. O pior que pode dar-se por fim é que com tanta pressa
venhais a ter pitança mui delgada.
BATISTA - Estou de acordo. Câmbio, ide até casa dizer a Bianca que se tenha
prestes. Sim, podereis contar-lhe o que se passa: como o pai de Lucêncio se
acha em Pádua e que ela vai casar-se com Lucêncio.
LUCÊNCIO - Que isso aconteça é o que eu suplico aos deuses, de todo o coração.
TRÂNIO - Não percas tempo com os deuses; corre logo e não demores. Poderei
indicar-vos o caminho, Signior Batista? Sois bem-vindo. Todo vosso jantar
consistirá num prato. Entrai, senhor; em Pisa arranjaremos melhor as coisas.
BIONDELLO - Câmbio!
BIONDELLO - Não vistes quando o meu amo piscou para o vosso lado e sorriu?
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LUCÊNCIO - E que significará isso, Biondello?
BIONDELLO - Nada, por minha fé; mas ele me deixou atrás, para que explique o
sentido ou a moral de seus gestos e sinais.
BIONDELLO - Ei-la: Batista está em lugar seguro, conversando com o falso pai de
um filho embusteiro.
LUCÊNCIO - E dai?
LUCÉNCIO - E depois?
BIONDELLO - O velho padre da igreja de São Lucas ficará todo esse tempo à
vossa disposição.
BIONDELLO - Não saberei dizê-lo, a não ser que eles se encontram atarefados
com um falso contrato. Assegurai-vos, portanto, dela, cum privilegio ad
imprimendum solum. À igreja! Levai o padre, o sacristão e algumas
testemunhas suficientemente honestas. Se esta não for a ocasião que
esperáveis com tanta alegria, dizei adeus à formosa Bianca, sem perda de um
dia.
BIONDELLO - Não posso ficar mais tempo. Conheço uma rapariga que se casou
numa tarde, ao ir à horta apanhar salsa para encher um coelho. O mesmo
podereis fazer, meu senhor. E com isto, adeus. Meu amo mandou que eu fosse
à igreja de São Lucas, a fim de dizer ao padre que se aprontasse para quando
chegásseis com vosso apêndice.
(Sai.)
LUCÊNCIO - Posso-o, e fá-lo-ei, se ela ficar alegre. Há de ficar; por que duvidar
tanto? Eis o momento de me declarar; mal ficarei, se Câmbio a não pegar.
(Sai.)
Cena V
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(Uma estrada pública. Entram Petrucchio, Catarina, Hortênsio e
criados.)
PETRUCCHIO - Depressa, pelo céu! Vamos à casa de vosso pai, de novo. Oh Deus
bondoso! como brilha no céu a lua amiga!
PETRUCCHIO - Pois pelo filho de meu pai, eu mesmo, tem de ser lua ou estrela,
ou o que eu quiser, antes de à casa de teu pai nós irmos. Recolhei os cavalos!
Contrariado de novo! Contrariado sempre e sempre!
CATARINA - Deus bendito! pois é o sol abençoado! Mas já deixa de ser o sol,
quando negardes isso. Muda-se a lua como vosso espírito; será o que quiserdes,
e isso mesmo ficará sendo para Catarina.
PETRUCCHIO - Ora, Quetinha! Não estás louca, penso. É um homem velho, cheio
de rugas, murcho, enfraquecido, como estás vendo.
CATARINA - Velho pai, perdoa o engano de meus olhos. Ofuscados tanto o sol os
deixou, que quanto eu veja só verde me parece. Agora noto que és um pai
venerando. Novamente peço que me perdoes esse engano.
VICÉNCIO - Belo moço, e vós, alegre dama, que bastante me espantastes com
vosso cumprimento tão esquisito: chamo-me Vicêncio; moro em Pisa, e em
caminho estou de Pádua, fazer visita a um filho que há muito não revejo.
PETRUCCIO - Feliz encontro para nós e teu filho. E agora posso dizer que assim
por lei como por tua veneranda aparência, autorizado me acho para chamar-te
pai querido. A irmã de minha esposa, esta senhora, já desposou teu filho. Não te
espantes nem te aborreças, que é de bom conceito, de rico dote e de família
digna. Além do mais, tem tantas qualidades, que digna a deixam de tornar-se
esposa do mais nobre mancebo. Assim, permite que no velho Vicêncio eu dê um
abraço, e vamos juntos ver teu belo filho que tua vinda vai deixar alegre.
VICÊNCIO - Mas tudo isso é verdade, ou simplesmente vos divertis, por terdes
gênio alegre, com as pessoas que encontrais na estrada?
ATO V
Cena I
BIONDELLO - Não, por minha fé; primeiro terei de ver a igreja por cima de vosso
ombro; depois voltarei para junto de meu amo, o mais depressa que puder.
VICÊNCIO - Tereis primeiro de beber comigo; penso que nesta casa posso darvos
bom agasalho; e, pelo que parece, há festa aqui.
(Bate.)
GRÊMIO - Estão muito ocupados; será melhor baterdes com mais força.
VICÊNCIO - Como! E se alguém lhe trouxesse cem ou duzentas libras, para maior
animação de seus divertimentos?
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PROFESSOR - Guardai para vós mesmos vossas duzentas libras; enquanto eu
viver vida ele não precisará disso.
PETRUCCHIO - Não vos disse eu que vosso filho era muito estimado em Pádua9
Senhor, estais ouvindo? Deixando de lado frívolos circunlóquios, peçovos avisar
ao signior Lucêncio que o pai dele chegou de Pisa e que o espera aqui na porta
para falar-lhe.
PROFESSOR - Segurai bem esse biltre; estou certo de que ele pretende enganar
alguém na cidade, sob a capa de meu nome.
(Volta Biondello.)
BIONDELLO - Deixei-os juntos na igreja; o céu lhes dê bons ventos. Mas que
vejo? Meu velho amo Vicêncio! Estamos perdidos e reduzidos a zero.
VICÊNCIO - Vinde cá, meu velhaco. Então, já vos esquecestes de quem eu sou?
VICÊNCIO - Como, notório biltre! Nunca viste o pai de teu amo, nunca viste
Vicêncio?
BIONDELLO - Quem? meu velho e venerando amo? Claro que já o vi; ali está ele,
a contemplar-nos daquela janela.
(Bate em Biondello.)
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BIONDELLO - Socorro! socorro! Aqui está um louco que quer matar-me.
(Sai.)
(Retira-se da janela.)
VICÊNCIO - Quem sou eu, senhor? Não; eu é quem pergunto: quem sois vós,
senhor? Oh deuses imortais! Oh velhaco aparamentado! De casaco de seda,
calça de veludo, capa escarlate e chapéu de ponta! Estou arruinado! estou
arruinado! Enquanto em casa eu faço o papel de marido econômico, meu filho e
meu criado esbanjam tudo na universidade.
PROFESSOR - Fora! fora, asno furioso! O nome dele é Lucêncio; é o meu único
filho e herdeiro de tudo o que possuo, eu signior Vicêncio.
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TRÂNIO - Chamai um oficial de justiça. (Sai um dos criados e volta com um
oficial de justiça.) Levai este louco para a prisão. Pai Batista, ficais incumbido de
apresentá-lo às autoridades.
BATISTA - Nada de conversas, Signior Grêmio; digo-vos que irá para a prisão.
BIONDELLO - Estamos desgraçados. Ali está ele, renegai-o; jurai que não o
conheceis, se não estaremos perdidos.
LUCÊNCIO - Aqui está ele, o verdadeiro filho do Vicêncio verdadeiro, que pelo
casamento fez dele a tua filha, enquanto os olhos uns mistificadores te
enganavam.
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VICÊNCIO - E onde se acha esse patife, Trânio, que a ousadia teve de resistir-me
e de insultar-me?
VICÊNCIO - Hei de cortar o nariz daquele velhaco, que quis mandar-me para a
prisão.
BATISTA (a Lucêncio) - Mas dizei-me uma coisa, senhor: desposastes minha filha
sem pedir o meu consentimento?
VICÊNCIO - Tranqüilizai-vos, Batista, que nós vos deixaremos satisfeito; mas vou
já para dentro, tomar vingança desta picardia.
(Sai.)
(Sai.)
(Sai.)
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PETRUCCHIO - Então voltamos já. Rapaz, vira o cavalo.
PETRUCCHIO - Não está bem assim? Para se entrar na linha nunca é tarde
demais, ensina-me Quetinha.
(Saem.)
Cena II
HORTÊNSIO - Desejo, para nosso bem, que seja verdade o que dizeis.
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CATARINA - Que sentido, senhora, emprestais a isso?
PETRUCCHIO - Como assim! Concebe graças a mim? Que diz Hortênsio disso?
CATARINA - “Quem tem vertigens diz que o mundo roda.” Explicai-me, vos peço,
essa sentença.
VIÚVA - Que tendo vosso esposo uma megera, julga a mulher do próximo uma
fera. Agora conheceis o meu sentido.
BIANCA - Serei pássaro, então? Vou para o bosque; armai vosso arco para
perseguir-me. Sois todos mui bem-vindos. (Saem Bianca, Catarina e a viúva.)
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PETRUCCHIO - Antecipou-me; signior Trânio, o pássaro que quisestes pegar saiu
voando. Bebo à saúde dos que erram o alvo.
TRÂNIO - Ó meu Senhor! Lucêncio fez comigo como o galgo que corre atrás da
caça, mas só a apanha para o dono dele.
TRÂNIO - Foi bom, senhor, terdes saído à caça sem companheiro; porém dizem
todos que em grande aperto a corça vos traz sempre.
PETRUCCHIO - Bem; não direi que não. Mas como prova cada um de nós mande
chamar a esposa. A que se revelar mais obediente, solícita acorrendo ao seu
chamado, o prêmio ganhará que instituirmos.
LUCÊNCIO - Eu, decerto. Vai, Biondello; dize a tua ama que eu a estou
chamando.
BIONDELLO - Perfeitamente.
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(Sai.)
BATISTA - Filho, fico sendo teu parceiro na aposta. meio a meio, em como
Bianca vem.
LUCÊNCIO - Não quero sócio; quero ganhar tudo o que é meu, sozinho.
(Volta Biondello.)
BIONDELLO - A patroa, senhor, mandou dizer que está ocupada e que não pode
vir.
GRÊMIO - E bem gentil. Pedi a Deus, senhor, que muito pior a vossa não vos
mande.
HORTÊNSIO - Corre, maroto, e à minha esposa roga que me venha ver neste
instante.
(Sai Biondello.)
PETRUCCHIO - Oh, oh! rogar à esposa! Assim é que ela não vem mesmo.
HORTÊNSIO - Temo, caro senhor, que a vossa não se deixe dobrar a vossos
rogos.
(Volta Biondello.)
BIONDELLO - Disse que certamente estais brincando. Não quer vir; se quiserdes,
ide vê-la.
PETRUCCHIO - De mal para pior. Oh! não quer vir! Oh! que vergonha! Absurdo!
intolerável! Grúmio, ide procurar vossa patroa e ordenai-lhe que venha aqui
falar-me.
(Sai Grúmio.)
PETRUCCHIO - Qual?
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HORTÊNSIO - Não vem.
(Volta Catarina.)
(Sai Catarina.)
PETRUCCHIO - Ora essa! Paz, amor, vida tranqüila, máxima respeitada e uma
legítima supremacia. Em suma: tudo quanto torna doce e feliz nossa existência.
PETRUCCHIO - Quero ganhar ainda melhor a aposta: ela irá dar mais provas de
obediência, da recente virtude e deferência. Ela aí vem vindo e traz vossas
esposas renitentes, vencidas pela sua persuasão feminina. (Entra Catarina com
Bianca e a viúva) Catarina não te assenta essa touca; joga-a fora; calca aos pés
semelhante bugiaria! (Catarina arranca a touca e joga-a longe.)
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PETRUCCHIO - Catarina, dou-te a incumbência de mostrar a essas esposas
cabeçudas que deveres as prende aos seus senhores e maridos.
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PETRUCCHIO - Ó Quetinha gentil! vem dar-me um beijo.
PETRUCCHIO - Vamos dormir, Quetinha; três casados vejo aqui, porém dois bem
amarrados. A vós, boa noite; o vencedor fui eu, (a Lucêncio.) Muito embora
ganhásseis o himeneu.
(Saem.)
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