2021.12 Revista Mercopol
2021.12 Revista Mercopol
2021.12 Revista Mercopol
senso (GILL, 2005). Crimes graves em série versos países. Estes perfis podem estar
podem ser vinculados e seus autores parados relacionados a crimes não resolvidos,
por meio da coincidência entre perfis criminosos condenados, suspeitos, corpos
genéticos oriundos de vestígios biológicos de não identificados ou pessoas
diferentes locais de crime, ou também pela desaparecidas. Assim, o Banco de DNA da
coincidência com amostras de referências INTERPOL é usado para vincular autores
previamente cadastradas na base de dados transnacionais a crimes cometidos em
(WERRETT, 1997). Quanto maior a inserção de outros países, além de fornecer uma
perfis genéticos de indivíduos criminalmente conexão entre os perfis genéticos de restos
cadastrados, sejam eles condenados ou humanos não identificados e pessoas
suspeitos, maior será o índice de detecção de desaparecidas em escala internacional
crimes e efetividade de bancos de dados de (FISCHER & HITCHIN, 2016) .
DNA (BUTLER, 2010). O intercâmbio internacional de dados
Cada país possui legislações próprias que requer a garantia de que o país mantenha
determinam em quais casos serão coletadas a propriedade de seus dados e o controle
amostras biológicas, como serão comparados da inclusão, exclusão e restrições de
os perfis genéticos e por quanto tempo serão acesso a outros países. Com base neste
armazenados (BUTLER, 2010). No entanto, princípio, nenhum país pode acessar
considerando que o uso da genética forense diretamente os bancos de dados de outro
está relacionado aos aspectos éticos e às país, sendo o envio e o gerenciamento de
melhores práticas para a obtenção do perfil dados realizado por meio do acesso ao
genético, essa questão precisa ser tratada em DNA Gateway, fornecido diretamente a um
escala global. Para tanto, a INTERPOL auxilia país por meio do Escritório Central
a comunidade forense e policial ao apoiar e Nacional da INTERPOL (NCB) (MEG,
promover o uso da análise de DNA no âmbito 2009) . No que diz respeito à
nacional, regional e internacional (MEG, confidencialidade dos dados, um
2009). parâmetro importante a ser considerado é
A Unidade de DNA da INTERPOL foi que os perfis devem ser codificados por
estabelecida na Secretaria-Geral, em Lyon- dados dissociados, conforme preconizado
França, em março de 2000, atendendo às pela Declaração Internacional sobre Dados
demandas de muitos países membros. Genéticos Humanos (UNESCO, 2004) .
Inicialmente, foi estabelecido um grupo de Em caso de correspondência entre perfis
consultores externos, o Grupo de genéticos, os países envolvidos são
Especialistas em Monitoramento de DNA da informados e convidados a cooperar
INTERPOL (MEG), para implementar bilateralmente, a fim de prosseguir com o
diretrizes de melhores práticas internacionais auxílio das investigações (MEG, 2009).
e o intercâmbio internacional de dados. Este Com a finalidade de monitorar o uso de
grupo atua no incentivo às autoridades dos genética forense e bancos de perfis
países membros no intuito de implementar genéticos em todo o mundo, a Unidade de
ou expandir bancos de perfis genéticos (MEG, DNA da INTERPOL realiza periodicamente
2009). uma pesquisa global como os países
O Banco de DNA da INTERPOL foi membros. A última pesquisa foi realizada
desenvolvido em 2002 e tem sido utilizado em fevereiro de 2019, quando 194
em investigações policiais para pesquisa e escritórios da INTERPOL foram solicitados
confronto de perfis genéticos oriundos de di- a fornecer suas estatísticas nacionais para
o período que terminava no fim do ano de bem como perfis recebidos de outros
2018. Um total de 108 países membros (56%) países por meio de INTERPOL (RIBPG,
responderam à pesquisa. Essas respostas 2021).
foram compiladas e adicionadas aos dados O Banco Nacional de Perfis Genéticos
fornecidos em pesquisas globais anteriores participa do envio e recebimento
realizadas pela Unidade de DNA. A Pesquisa internacional de perfis genéticos desde
Global de 2019 demonstrou que um total de sua criação pelo Decreto n.º 7.950 de 12 de
111 países relataram o uso de exames de DNA março de 2013 (BRASIL, 2013). Entre os
em investigações criminais. Destes países, 84 anos de 2014 e 2017, o Brasil recebeu de
afirmaram ter uma base de dados nacional, os outros países, por meio da INTERPOL, 90
quais, somados, totalizam 35.475.671 perfis solicitações de pesquisas de perfis
genéticos armazenados. Ao analisar genéticos na base de dados nacional.
especificamente o continente americano, Neste mesmo período, foram enviados
nota-se que na época 38 países eram apenas 9 perfis genéticos produzidos no
membros da INTERPOL, sendo a pesquisa Brasil para pesquisa em bases de dados
respondida por 39,5% (N = 16). No continente de outros países.
americano, 17 países utilizavam a genética Considerando a participação irrisória do
forense no auxílio a investigações e 15 países Brasil até o ano 2017 no uso da genética
possuíam bancos de perfis genéticos forense para o auxílio de investigações
(INTERPOL, 2019). internacionais, a partir de 2018, a Polícia
Em 2019, o Grupo Ibero-americano de Federal, em uma ação conjunta do
Trabalho em Análise de DNA (GITAD) Escritório Nacional da INTERPOL e do
realizou um levantamento sobre a situação Banco Nacional de Perfis Genéticos,
das bases de dados de DNA na América iniciou duas estratégias para aumentar a
Latina. A pesquisa contou com a participação participação brasileira no
de 15 países da região. Dentre os compartilhamento internacional de dados
participantes, 12 países latino-americanos de perfis genéticos. Primeiramente, foi
afirmaram possuir bancos de perfis genéticos. fomentado o recebimento de solicitações
Entre os que responderam positivamente, de pesquisa de perfis genéticos de outros
oito tinham bases de dados para fins países para confronto com a base de
criminais e 11 possuíam bases de dados para dados nacional, por meio de formulários
busca de pessoas desaparecidas (SILVA JR, et próprios da INTERPOL. Em seguida,
al., 2020). iniciou-se a inserção massiva de perfis
No Brasil, existe uma Rede Integrada de genéticos de restos mortais não
Bancos de Perfis Genéticos (RIBPG) criada identificados e vestígios de locais de
com o objetivo principal de manter, crimes brasileiros no Banco de DNA da
compartilhar e comparar perfis genéticos para INTERPOL (RIBPG, 2019b) . Como
auxiliar tanto na investigação criminal e resultado, a partir de 2018 até junho de
instrução processual quanto na identificação 2021, foram recebidas 160 solicitações
de desaparecidos. Os perfis genéticos gerados provenientes de outros países para
pelo RIBPG são rotineiramente enviados ao pesquisa na base de dados nacional,
Banco Nacional de Perfis Genéticos, onde são representando um aumento de 78% no
feitos confrontos no âmbito interestadual recebimento de solicitações. No mesmo
com os perfis gerados pelos 22 laboratórios período, 16.727 perfis oriundos de
de genética forense que compõem o RIBPG, vestígios de locais crimes e 3.199 perfis de
restos mortais brasileiros foram enviados conseguiu deter dois suspeitos: W.G.M. e.
para o Banco de DNA da INTERPOL para B.E.S.B.S. Concomitantemente, dois
confronto com perfis genéticos inseridos por peritos criminais federais realizaram a
diversos países. Como resultado deste perícia de local de crime e, considerando a
trabalho, em outubro/2020 foi confirmado o possibilidade de haver material genético
primeiro caso de sucesso decorrente dos infratores, os peritos realizaram a
diretamente desta medida de cooperação coleta de vestígios biológicos no local.
policial internacional, um caso Nesta oportunidade foi identificado que o
transcontinental (RIBPG, 2021). local não se restringia apenas a Agência
Apesar do crescente envio de perfis genéticos dos Correios, uma vez que havia uma
brasileiros para o Banco de DNA da abertura em uma parede entre a agência e
INTERPOL, a pouca utilização da ferramenta o estabelecimento comercial vizinho, uma
pelos países fronteiriços faz com que os papelaria. A Figura 01 apresenta o croqui
resultados ainda sejam tímidos e o potencial da Agência dos Correios e da Papelaria,
da ferramenta continue subutilizado, tanto no indicando o posicionamento dos vestígios
auxílio a investigações transnacionais quanto no local do crime (WOHLKE & M., 2017).
na identificação de pessoas migrantes Os vestígios foram devidamente
desaparecidas. Por outro lado, a iniciativa de embalados, registrados e enviados ao
fomento do recebimento de solicitações de Instituto Nacional de Criminalística (INC)
pesquisa de perfis genéticos de outros países, para a processamento laboratorial e
por meio da INTERPOL, para confronto com o cruzamento direto com os suspeitos de
Banco Nacional de Perfis Genéticos, tem W.G.M. e. B.E.S.B.S, bem como para
obtido cada vez mais resultados. Dentre os inclusão dos perfis genéticos obtidos a
países que participam ativamente no envio de partir dos vestígios no Banco Nacional de
solicitações para o Brasil, destaca-se a Perfis Genéticos.
atuação do Oficialato de Ligação em Saint Os materiais biológicos, tanto dos
Georges de L'Oyapock-Guiana Francesa. Este, vestígios quanto dos suspeitos, foram
rotineiramente, envia solicitações de analisados pelo laboratório de genética
comparação de perfis genéticos relacionados forense do INC entre março e maio de
a crimes ocorridos na Guiana Francesa e nos 2018. A partir de duas luvas, foram
quais exista a suspeita de envolvimento de obtidos dois componentes majoritários de
brasileiros como autores da ação delituosa. perfil genético de mistura e, a partir de
Desta ação, diversas investigações uma chave de fenda, um perfil genético
envolvendo os dois países puderam ser unitário. A Figura 02 apresenta fotos
auxiliadas, dentre as quais destaca-se o destes três vestígios. Os demais vestígios
estabelecimento de ligação entre três crimes, não possuíam DNA humano nuclear em
conforme descrito no estudo de caso a seguir. quantidade suficiente para amplificar os
marcadores genéticos, de acordo com os
Estudo de Caso parâmetros técnicos estabelecidos pelo
laboratório (CASTRO & FREITAS, 2018).
Crime 1 Estes dois componentes majoritários e o
A Agência dos Correios da cidade de Foz do perfil unitário foram comparados com os
Iguaçu/Brasil, localizada na Avenida Juscelino perfis genéticos obtidos de amostras
Kubitschek, foi arrombada na madrugada de coletadas dos suspeitos. Não houve
17 de julho de 2017. A equipe de investigação coincidências com o perfil do suspeito
GILL, P., 2005. DNA as Evidence — The MINERVINO, A. C., SILVA JR, R. C. &
Technology of Identification. N Engl J Med. BADARACO, J. L., 2020. Laudo nº
1285/2020-INC/DITEC/PF, s.l.: SISCRIM
GILL, P. & JEFFREYS, A. W. D., 1985. Forensic (sistema de acesso restrito à Polícia
application of DNA ‘fingerprints’. Nature, Federal).
Volume 318.
MINERVINO, A. et al., 2020. Projeto de
GILL, P. & LYGO, J. F. S. W. D., 1987. An Coleta de Amostras de Condenados –
evaluation of DNA fingerprinting for forensic Incremento do Auxílio a Investigações e a
purposes. Electrophoresis, Volume 8. Justiça. Revista Brasileira de Ciências
Policiais, Volume 11.
GLOBAL INICIATIVE, 2018. Organized crime
and its role in contemporary conflict - An RIBPG, 2019a. Manual de Procedimentos
analysis of UN Security Council Resolutions. Operacionais da RIBPG. [Online]
[Online] Available at:
Available at: https://www.justica.gov.br/sua-
https://globalinitiative.net/analysis/toc-unsc/ seguranca/seguranca-
[Acesso em 7 jul 2021]. publica/ribpg/manual [Acesso em 15 may
2021].
GUALDA, C. M. A. & JACQUES, G. S., 2018.
Laudo nº 1829/2018-INC/DITEC/PF, s.l.: SIS- RIBPG, 2019b. XI Relatório da Rede Inte-
Figuras