Evidencia Ano II Numero 13 Dez 2020

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O

INSTITUTO DE PESQUISA E
anos

PERÍCIA EM GENÉTICA FORENSE


Evidência nº 13 - Ano II - Dezembro 2020

Evidência nº 13 - Edição especial IPPGF 15 ANOS - Ano II - Dezembro 2020

Evidência é uma publicação digital organizada por profissionais ligados às ciências forenses.
Equipe editorial: Alexandre Giovanelli, Denilson Siqueira, Marcos Paulo Salles Machado, Rafael Mayer
e Renato Bichara.
E-mail: [email protected]
Siga nosso perfil nas redes sociais! Acesse instagram.com/pericia_rj
Edições anteriores disponíveis em: www.policiacivilrj.net.br/evidencia.php
Endereço: Praça Tiradentes, n° 09, sala 709 - Centro - CEP 20060-070 - Rio de Janeiro - RJ

ISSN 2675-7486
SUMÁRIO

5 IPPGF faz 15 anos. histórias de várias vidas...


Selma Lílian Sallenave-Sales

13 Direções do Instituto
Entrevista com os diretores do IPPGF

22 Um olhar apaixonado sobre o Banco Estadual de


Perfis Genéticos
Ta ana Hessab

30 Sequenciamento Massivo Paralelo (SMP) em


Genética Forense
Carolina Bo no Gruszkowski Fratani e Rodrigo Soares de Moura Neto

38 Genética e tecnologia no combate aos crimes sexuais


no Rio de Janeiro: a união da Perícia e da Pesquisa
no IPPGF
Priscila Afonso Torres 3

46 DNA DE CONTATO EM LOCAIS DE CRIME:


POTENCIALIDADES E LIMITAÇÕES
Alexandre Giovanelli

54 IMPACTO DA LEI 13.964/2019 NA ANÁLISE DE AMOSTRAS DE


DNA DE TOQUE PRESENTES EM CENAS DE CRIMES
Ta ana Lúcia Santos Nogueira

61 15 anos de integração IPPGF e IGP-RS


Cecília Helena Fricke Ma e, Gustavo Lucena Kortmann e Trícia Cris ne Kommers Albuquerque

64 REDE INTEGRADA DE BANCOS DE PERFIS GENÉTICOS:


BASES SÓLIDAS E FUTURO PROMISSOR NA PROMOÇÃO
DA JUSTIÇA NO BRASIL
Ronaldo Carneiro da Silva Junior

72 INVESTIGAÇÕES FORENSES E ANÁLISE DE DNA DEGRADADO


Pablo Cavalcan , Alexandre Caiafa, Dayse Silva e Elizeu Fagundes de Carvalho

80 Do Local ao Laboratório
Lívia Cardoso Barroso
INSTITUTO DE PESQUISA E
PERÍCIA EM GENÉTICA FORENSE

anos
Aos dedicados servidores, personagens dessa história.
Rodrigo Soares de Moura Neto - Professor UFRJ (Diretor do Ins tuto); Ká a Araújo - Perita Criminal Bióloga (Diretora do Ins tuto); Rodrigo Grazinoli Garrido - Perito Criminal
Biomédico (Diretor do Ins tuto); Sandra Fernandes Pinto Martha - Perita Criminal Bióloga (Diretora do Ins tuto); Selma Lílian Sallenave Sales - Perita Criminal Bióloga
(Diretora do Ins tuto); Ta ana Hessab de Castro Aranha - Perita Criminal Bióloga (Vice -Diretora do Ins tuto); Priscila Afonso Torres - Perita Legista Bióloga (Diretora do
Laboratório Geral de DNA); Nádia Fernandes Freitas - Perita Criminal Bióloga (Chefe do Laboratório); Marcelo de Mello Mar ns - Perito Criminal Biólogo (Chefe do
Laboratório); Magno de Oliveira Amarantes - Inspetor de Polícia (Chefe de Serviço); Alexandre Giovanelli - Perito Criminal Biólogo (Chefe de Serviço); Alípio dos Santos Rocha
- Perito Legista Bioquímico (Gerente Técnico); Arthur de Mello Prates - Perito Legista Biólogo (Chefe de Serviço); Le cia Loss de Oliveira - Perita Legista Bióloga; Carolina
Bo no Gruszkowski Fratani - Perita Legista Bióloga (Chefe de Serviço); Eliane Przytyk Jung - Perita Criminal Quimica/Farmacêu ca; Lívia Cardoso Barroso - Perita Criminal
Biomédica; Marcelo de Sousa - Perito Criminal Biólogo; Rosangela Medeiros de Carvalho - Perita Criminal Bióloga; Agnaldo da Silva Martha - Inves gador de Polícia; Artur
Pereira de Oliveira - Auxiliar Policial de Necropsia; César Pinto dos Santos - Inspetor de Polícia; Davi Borges Prata - Técnico de Necropsia; Maria de Fá ma César de Oliveira -
Técnica de Necropsia; Fernando José Pigliasco d' Almeida - Inspetor de Polícia; Flávio Maciel Ribeiro - Auxiliar Policial de Necropsia; Livia Maria Rubem Vidal - Oficial de
Cartório; Marcel Fernando M. R. de Oliveira - Técnico de Necropsia; Márcia Chris na Bandeira de Mello - Oficial de Cartório; Mônica Corrêa Ne o Borges - Inspetora de
Policia; Monique Moreira Paiva - Inspetora de Policia; Patrícia Vianna Castro - Inspetora de Policia; Renato de Sá Pereira Filho - Inspetor de Policia; Valéria Silva Braz - Técnica
de Necropsia; Wellington Jacomeli A. Ma os - Auxiliar Policial de Necropsia; e, Sandra Machado Izabel da Silva – Auxiliar de Serviços Gerais
IPPGF faz 15 anos
Histórias de várias vidas...
Selma Lílian Sallenave-Sales

Em novembro de 2005 o Ins tuto de Perícias mais novo do Departamento Geral de Polícia
Técnico Cien fica, abria suas portas pela primeira vez. Criado através do Decreto nº
37.775/05 surgia em meio a Academia Estadual de Polícia Civil Sylvio Terra (ACADEPOL) o
Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense (IPPGF), fruto de uma inicia va da
an ga PCERJ/DPTC em parceria técnica com a Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ). Nessa época exis am somente 06 dos 22 atuais laboratórios periciais de gené ca
forense no Brasil.

A curiosidade sobre qual seria o bene cio que o “tal” exame de DNA poderia trazer para a
Perícia do Rio de Janeiro era imensa. Afinal de contas, um exame que detecta pequenas
quan dades de uma molécula estranhamente misteriosa depositada em manchas
biológicas de retalhos de roupa, facas, lâminas, carros, copos, frutas, impressões digitais,
chiclete, madeira, projé l, etc, nha mesmo que causar certa incredulidade [1].

Hoje, uma trajetória de 15 anos de sucessos 5e dificuldades, mas também, muita resiliência,
tem mostrado o quanto tem de poder o tal exame de DNA. Quantas pessoas puderam ser
iden ficadas quando já se pensava não ser mais possível? Quantos agressores foram presos
e condenados? Quantos corações sofridos por causa de um familiar desaparecido puderam
ter, ao menos, uma resposta? Quantos inocentes foram absolvidos? Histórias de várias
vidas que, inevitavelmente, nos remete a pensar em como tudo isso começou...

Pouco tempo após nossa inauguração e ainda em meio às adequações, treinamentos e


ajustes de uma ro na que jamais havia exis do no meio Pericial do RJ, o ataque ao ônibus
350, no final de novembro, veio nos mostrar os desafios que ainda estavam por vir. Esse
seria um dos nossos primeiros laudos e ainda, de repercussão. Cinco pessoas carbonizadas
e a responsabilidade enorme de dar uma resposta rápida a uma sociedade golpeada por
tamanha violência. Era somente o início de uma infinidade de casos que passariam a
circular pelas bancadas dos laboratórios do IPPGF nas mãos experientes de nossos Peritos
biólogos, biomédicos e bioquímicos. O Padre que queria voar com balões, o caso do menino
Juan, o desastre da Região Serrana, o desabamento dos prédios no Centro do Rio, o
desaparecimento do Amarildo, o incêndio na base militar da Antár da, o caso da menina
Rebeca na Rocinha, a grávida assassinada para sequestro do bebê, o embaixador Grego, o
sequestro do Policial Federal, o feminicídio da professora em Nova Iguaçu, o caso Flordelis...

5
Sofrimentos diversos entre tantos outros anônimos que nham no exame de DNA a chance
de se fazer jus ça e tentar amenizar a dor das famílias.

Mas afinal, o que faz o exame de DNA ser assim tão impactante? A resposta é simples: a
possibilidade de resolver questões que, tecnicamente, não poderiam ser resolvidas antes
da existência e aplicabilidade do exame. Exemplos disso são: a autoria de um homicídio
ob da através de uma mordida em uma fruta deixada na cena de crime ou em uma
maçaneta de porta, a iden ficação de um tronco humano carbonizado ou em
decomposição avançada, a iden ficação da ví ma no local do crime através da mancha de
sangue do chão em um caso de ocultação de cadáver... Enfim, possibilidades diversas que se
associam ainda com o fato de se poder arquivar eletronicamente um perfil de DNA em um
banco informa zado capaz de fazer comparações entre sequências gené cas e assim
ajudar a encontrar pessoas desaparecidas, estupradores em série, etc [2,3].

Em 2007, antecipando as expecta vas da criação de um banco de DNA no Brasil,


conquistamos o primeiro de vários projetos financiados pela Fundação de Apoio a Pesquisa
do Rio de Janeiro (FAPERJ) no Ins tuto: o projeto “Localizar”. Já naquela época, o obje vo
era minimizar o problema da baixa iden ficação de desaparecidos no Estado e aumentar a
demanda de perfis gené cos que pudessem ser incluídos em um futuro banco. Desta
forma, cerca de 400 amostras de pessoas não iden ficadas, sobretudo no período de 2003
6
a 2006, e que se encontravam acauteladas no Ins tuto Médico Legal Afrânio Peixoto (IML-
AP), foram recebidas, analisadas e comparadas com 100 amostras de familiares
encaminhadas pelo Serviço de Descoberta de Paradeiros, atualmente localizado na
Delegacia de Descoberta de Paradeiros (DDPA). Os perfis gené cos eram inseridos para
comparação em um banco desenvolvido pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL) cuja
cessão foi viabilizada pela colaboração entre os Drs. Rodrigo Soares de Moura Neto (UFRJ),
Diretor do IPPGF à época e Luiz Antônio Ferreira da Silva (UFAL).

Nenhum dos casos foi resolvido exclusivamente com a u lização do banco, no entanto,
cinco deles foram solucionados por confronto através da inves gação Policial durante a
realização do projeto, mostrando que aquele era o caminho certo a seguir. A par r do
“Localizar” foram também desenvolvidos vários trabalhos acadêmicos e de conclusão de
cursos de graduação, beneficiando diretamente a ro na do Laboratório [4-5].

Em 2008, já fazíamos parte de uma força tarefa, junto a outras Perícias Oficiais de DNA do
Brasil, para tornar uma realidade à implantação de uma Rede Integrada de Bancos de Perfis
Gené cos (RIBPG). Essa rede permi ria integrar todos os bancos Estaduais do País através
do Banco Nacional de Perfis Gené cos (BNPG). Em 2009, foi finalmente estabelecido um
convênio entre o FBI (Federal Bureau of Inves ga on) e o Departamento de Polícia Federal

6
e a publicação do Decreto nº 7.950/2013 do MJ criando a Rede Integrada de Bancos de
Perfis Gené cos (RIBPG), marcou o início de sua u lização oficial [6]. Foi nesse mesmo ano
que, em um marco histórico pro IPPGF, e para a perícia do Rio de Janeiro, vemos a primeira
iden ficação de uma pessoa desaparecida realizada no Brasil através, exclusivamente, da
u lização da Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos (RIBPG). Um misto de honra e
emoção em permi r que um pai à procura de um filho desde 2012 pudesse ter parte da sua
história encerrada [7].

Em 2009 éramos desafiados a coordenar o I Curso Teórico Prá co de Automação em DNA


oferecido às Perícias Oficiais do Brasil. O curso, viabilizado pela SENASP e patrocinado pela
empresa Life Technologies, tornou possível recebermos no IPPGF, durante 05 dias, Peritos
de 15 Estados brasileiros, além de Palestrantes Internacionais e de Ins tuições Públicas
Nacionais. Em uma inicia va inédita, os Peritos foram capacitados em plataformas
automa zadas de extrações de DNA. O evento reverberou pouco tempo depois no
incen vo ao aparelhamento de vários desses laboratórios periciais por todo o Brasil.

Contudo, umas das maiores provas dos limites que poderíamos alcançar foram os
deslizamentos causados pelas chuvas na região Serrana do Rio em Janeiro de 2011. A
magnitude do acontecimento ultrapassava em todos os níveis a capacidade de
gerenciamento de exames no laboratório. Atordoados, mas não menos resilientes,
7
processamos ininterruptamente centenas de amostras em um curto espaço de tempo. Fato
esse que nos permi u traçar a logís ca necessária quando do desabamento, em 2012, de
03 prédios no Centro do Rio de Janeiro resultando na morte de 19 pessoas e em 03
desaparecidos.

Em 2013, dando sequência aos nossos trabalhos de pesquisa que buscavam aprimorar
metodologias de busca de pessoas desaparecidas, vemos mais uma vez um projeto nosso
contemplado pela FAPERJ. Desta vez o trabalho era voltado para a iden ficação de
amostras cadavéricas u lizando, entre outras estratégias, da coleta de material de bexiga
urinária. O desenvolvimento do projeto durou três anos, resultando em dados que
serviriam de base para estratégias que pudessem ser aplicadas tanto na ro na pericial
quanto em possíveis eventos DVI (Disaster Vic ms Iden fica on/ Iden ficação de Ví mas
de Desastre em Massa). Assim, com o advento das Olimpíadas no Rio de Janeiro em 2016 e a
necessidade de diminuir a quan dade de ossadas processadas no Laboratório,
promovemos capacitações teóricas para Peritos Legistas e Técnicos de Necropsia de todo o
Estado. Trabalhos cien ficos e de conclusão de teses de graduação e mestrado também
resultaram desse esforço [8-9].

Baseado no aprendizado que adquirimos com os deslizamentos na região Serrana e com o

7
desenvolvimento de nossos projetos cien ficos é que em 2016 fomos capazes de planejar
estratégias de ação para possíveis eventos DVI (Disaster Vic ms Iden fica on/Iden ficação
de Ví mas de Desastre em Massa) durante as Olimpíadas. Assim, após sermos capacitados
por Peritos Especialistas da Polícia Federal, assumimos a Coordenação da Fase Ante-
Mortem da estrutura organizacional do DVI no RJ. Seríamos nós os responsáveis por criar
uma equipe mul disciplinar para acolher familiares de ví mas, cadastrar, coletar amostras
de referência para fins gené cos, receber documentos, triar, organizar e finalmente
trabalhar no confronto para possíveis iden ficações humanas. Treinamos, em curto espaço
de tempo, mais de 100 profissionais entre Inspetores Policiais da DDPA, Assistentes Sociais
da Secretaria Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos e profissionais da Cruz
Vermelha Brasileira. Toda a montagem das estratégias desenvolvidas por nós, bem como
aquelas desenvolvidas pelos Peritos coordenadores das outras fases DVI, gerou um legado
ines mável para a Perícia do RJ.

No entanto, tempos di ceis estavam por vir... Ao final de 2016 com os reflexos da crise
econômica do Estado, passamos por momentos bastante complicados. Apesar de todos os
esforços da Ins tuição e da nossa Direção Geral que se voltaram para o desenvolvimento de
estratégias e capacitações profissionais para tentar superar aquele momento, a carência de
recursos financeiros e humanos fizeram com que, pela primeira vez, laudos começassem a
se acumular no Ins tuto. Período esse que se
8 estendeu por todo o ano de 2017 e parte de
2018, quando então ocorreu a Intervenção Federal no Estado e foi possível novamente
receber insumos e equipamentos que nos permi ram reorganizar e reintensificar nossa
ro na pericial.

Quase simultaneamente, e na contra mão das dificuldades, passamos a assumir cargos de


grande responsabilidade frente à RIPBG. Nossos administradores do Banco se tornaram
representantes dos interesses dos laboratórios de DNA da região sudeste por dois anos.
Além disso, nos responsabilizamos pela Coordenação da Comissão de Esta s ca, ao mesmo
tempo que nos tornamos membros da Comissão de Qualidade [10, 11, 12].

O momento tornava-se então propício para retomarmos nosso empenho e seguirmos


adiante com as adequações técnicas e estruturais aos quesitos preconizados pela
Resolução nº 5/2014 do Comitê Gestor da RIBPG. Sim, gerenciar o banco de DNA do Estado
nos traria mais responsabilidades do que imaginávamos. Através dessa Resolução,
começou a ser obrigatória no Ins tuto, a realização de uma auditoria externa, alternada
com uma auditoria interna, a cada dois anos, com o intuito de manter a cessão de uso do
Banco de DNA do Estado. Desta forma, além dos cargos dos Administradores do Banco de
DNA no IPPGF, eram imprescindíveis a implementação dos cargos e funções de Gerente de
Qualidade e Gerente Técnico, a fim de juntos viabilizarem a implementação de um sistema

8
de Gerência de Qualidade que cumprisse os quesitos mínimos exigidos. Em junho de 2018,
depois de um dedicado trabalho em equipe, vemos a aprovação, sem nenhuma
inconformidade, em todos os quesitos obrigatórios da primeira auditoria externa
promovida pela RIBPG. Entre estes estavam: qualificação e experiência profissional,
infraestrutura técnica, elaboração de procedimentos operacionais padrão (POPs), fluxo de
trabalho, controle de amostras e documentos, teste de proficiência, limpeza, etc.

Responsabilidades ainda maiores viriam em 2019 com o início da coleta de amostras de


referência de condenados no escopo da Lei nº 12.654/2012 [13]. Outro momento que
marcaria para sempre a trajetória de nosso Ins tuto.

No contexto do projeto de fortalecimento da RIBPG pela SENASP/MJSP, nos organizamos


pela primeira vez para ingressar em presídios do Rio de Janeiro, com a meta previamente
compromissada de 1000 condenados. Sob a coordenação e execução dos Administradores
do CODIS, uma pequena, porém competente, equipe formada por 03 a 04 servidores do
Ins tuto iniciou as coletas no Ins tuto Penal Edgar Costa, passando posteriormente por
mais outros 06 presídios. A necessidade de fortalecer nossa equipe inicial fez nascer uma
importante parceria com o Ins tuto de Iden ficação Félix Pacheco (IIFP) que nos cedeu três
colegas Papiloscopistas com a perspec va de compor em 2020 a futura equipe de coleta.
Superando as expecta vas, pouco mais de 1000 perfis gené cos de condenados foram
9
coletados, processados e inseridos no banco do Estado do Rio de Janeiro em 07 meses. O
fruto de todo esse trabalho gerou a importante coincidência ocorrida entre um ves gio
sexual de um crime de estupro ocorrido em 2012 em São Paulo com o material coletado de
um homem custodiado no sistema prisional do Estado do Rio de Janeiro que teve seu
material biológico coletado em 2019 pela equipe do IPPGF.

O ano de 2019 foi verdadeiramente um ano de muitas vitórias, orgulhos e transformações.


Trabalhamos arduamente no processamento de amostras de casos abertos e, mesmo com
um número extremamente reduzido de servidores, conseguimos ser reconhecidos pela
RIBPG como o laboratório que inseriu o maior número de perfis gené cos de pessoas não
iden ficadas no Banco de DNA Nacional. Em uma cerimônia, promovida pelo Comitê
Gestor da RIBPG/MJSP em Brasília, fomos então congratulados com o cer ficado de
primeiro lugar entre os 20 laboratórios periciais do Brasil que compunham a Rede Integrada
à época.

Ainda em 2019, vemos a aprovação da FAPERJ em três projetos subme dos por nossos
Peritos no contexto do Edital “Programa de Apoio a Projetos de Inovação no Campo da
Ciência Forense 2018”. Três temas de grande importância para a Perícia em Gené ca
Forense: a) um projeto relacionado ao aperfeiçoamento de técnicas para a inserção de

9
perfis gené cos de amostras de casos abertos relacionados a crimes de violência sexual no
Banco de DNA do Estado, b) outro que aborda, além do desenvolvimento de metodologias
para processamento de amostras de DNA de toque, a capacitação de Peritos na coleta de
amostras em local de crime e, c) o terceiro relacionado ao desenvolvimento de uma
tecnologia de nova geração nunca antes implementada na nossa ro na pericial.

Recentemente, o projeto de violência sexual ganhou novo reforço através de um trabalho


em colaboração desenvolvido em parceria com o Dr. Claudio Cerqueira Lopes, professor
renomado do Ins tuto de Química da UFRJ. O trabalho envolve testar e avaliar a
sensibilidade do exame de DNA frente à u lização do reagente fenol aleína bifosfato
tetrassódio. O reagente desenvolvido pelo grupo do Dr. Lopes é u lizado na detecção de
amostras de sêmen em evidências forenses e uma vez demonstrada a sua não interferência
no exame de DNA, terá um uso ainda mais promissor para a Perícia em locais de crime [14,
15].

Todos esses projetos encontram-se em fase de desenvolvimento e a intenção é que 2021


seja um ano de muita aplicabilidade para todos os resultados ob dos.

Em 2020, impactados pela Pandemia, vemos que nos reinventar para manter nossa ro na
de confecção dos laudos periciais, desenvolvimento de projetos de pesquisa FAPERJ e
metas de processamento de amostras compromissadas
10 com a RIBPG/SENASP. A segunda
auditoria externa que também seria realizada no escopo da nova Resolução nº 12/2019 da
RIBPG não pôde também ser executada.

Em função da falta de acesso aos presídios, não foi possível atuar na coleta de 2000
condenados conforme acordado para 2020. Assim, além de manter nossa ro na pericial de
confrontos, vemos que remanejar nossa meta para a análise de 1100 amostras de casos
abertos, entre eles violência sexual e homicídios. Atentos ainda a Polí ca Nacional de Busca
de Desaparecidos e em consonância com o Grupo de Trabalho de Desaparecidos da RIBPG,
criado em 2020, nos focamos também no processamento e na execução de estratégias de
análise voltadas para esse po de caso [16, 17]. Com esse intuito, iniciamos em agosto a
coleta de familiares de pessoas desaparecidas de casos arquivados (sem confronto) junto a
DDPA (Delegacia de Descoberta de Paradeiros). Somente com essa medida, já conseguimos
adicionar mais de 100 perfis de casos abertos desses familiares em nosso Banco de DNA o
que potencializa a chance de resolução de casos.

Tantas inovações no IPPGF foram também coincidentes com as alterações da estrutura


básica da Secretaria de Estado de Polícia Civil pelo Decreto nº 46.885/2019. A nova
organização no Ins tuto pressupõe a perspec va de que ainda precisamos crescer
espacialmente expandindo o alcance de nossas ações, assim como nos tornar acreditados

10
pela ISO 17025/17. A distribuição atual reflete essa tendência:

1. Diretoria
1.1 Vice Diretoria
1.2 Serviço de Gestão de Qualidade
1.3 Serviço de Suporte Administra vo
1.4 Laboratório Geral de DNA
1.4.1 Serviço de Banco de Perfis Gené cos
1.4.2 Serviço de Perícias

Hoje, olhar para trás e ver o quanto conseguimos realizar nesses 15 anos nos enche de
orgulho. É muito gra ficante saber que nos corredores que infelizmente carregam tanta dor
das ví mas e seus familiares também carregam a certeza que temos de que servir a
sociedade com dedicação e profissionalismo é sempre o melhor de todos os caminhos.

Referências bibliográficas

[1] ROEWER, L. DNA fingerprin ng in forensics: past, present, future. INVESTIGATIVE GENETICS, v. 4, p. 22, 2013.

[2] DIAS FILHO, C. R., FRANCEZ, P.A. C. Introdução a Biologia Forense 2ª ed. Campinas: MILLENIUM EDITORA,
2018.

[3] BUTLER, J.M. Forensic DNA typing: biology, technology, and gene cs of STR markers. ACADEMIC PRESS,
2005. 11

[4] OLIVEIRA, L. R. ; SALLENAVE-SALES, S. . Avaliação de metodologias para extração de DNA na determinação de


perfis STR autossômicos em ossadas de indivíduos não iden ficados nos IMLs do Estado do RJ. In: 12º Encontro
Regional de Biomedicina, 2009, Botucatu. 12º Encontro Regional de Biomedicina, 2009.

[5]Banco de dados de DNA é a nova arma da Polícia para iden ficar desaparecidos, 2009 Disponível em:
h p://www.faperj.br/?id=1385.2.8

[6] BRASIL, Presidência da República. Decreto nº 7.950/13. Disponível em:


h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/decreto/d7950.htm

[7] HESSAB, T. Banco de Perfis Gené cos. Evidência, o Jornal da Perícia, Rio de Janeiro, v. 1, . p 4 - 5, 2018.

[8] BRITO, F.C.A., NUNES, M.R., PRATA, D.R.B.M., MARTHA, S.F.P., BOTTINO, C. G, GARRIDO, R. G.. DNA
extrac on of urinary bladder swabs collected from carbonized and decomposing corpses: Possible applica on
in disaster vic m iden fica on

[9] BRITO, F.C.A., PRATA, D.R.B.M., MARTHA, S.F.P., BOTTINO, C. G. Evalua on of the urinary bladder swabs as a
source of DNA for human iden fica on using two different extrac on methods Forensic Science Interna onal:
Gene cs Supplement Series v 5, 2015, p 484-486.

[10] PORTARIA DO MJSP Nº 1.147, DE 6 DE DEZEMBRO DE 2017

[11] RIBPG, Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos. Portaria nº3/2018. Comissão de Esta s ca, Comitê
Gestor da RIBPG, Brasília, 2018.

[12] ] RIBPG, Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos. Portaria nº1/2018. Comissão de Qualidade, Comitê
Gestor da RIBPG, Brasília, 2018.

11
[13] BRASIL, Presidência da República. Lei nº 12.654/2012. Disponível em:
h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12654.htm

[14] Peritos criminais criam projeto para aprimorar inves gação de crimes de violência sexual, 2020. Disponível
em: h p://www.faperj.br/?id=4036.2.4

[15] Perícia da Sepol-RJ conta com um novo aliado forense para desvendar crimes de violência sexual, 2020.
Disponível em: h p://www.faperj.br/?id=4054.2.6

[16] BRASIL, Presidência da República. Lei nº 13.812/2019. Disponível em:


h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13812.htm

[17] RIBPG, Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos. Portaria nº1/2018. Grupo de Trabalho de
Desaparecidos, Comitê Gestor da RIBPG, Brasília, 2020.

12

Sobre a autora

Selma Lílian Sallenave-Sales é bióloga, Doutora em Biologia Molecular pelo IOC/Fiocruz, Perita Criminal do
Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense (IPPGF), Diretora do IPPGF, Gestora de Qualidade do
IPPGF, Membro do Grupo de Trabalho sobre desaparecidos da RIBPG, Pesquisadora Coordenadora do
Projeto Faperj sobre violência sexual, Professora da FAETEC, Professora de Gené ca Forense da Pós
graduação e cursos da Bioforense Projetos Educacionais.

12
Direções
do instituto

O Evidência entrevistou os diretores do


Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca
Forense. Nossa primeira entrevistada é a
13
Dra. Selma Lílian Sallenave Sales atual
diretora do IPPGF. A perita criminal iniciou
sua gestão em março de 2020.

Qual a importância do IPPGF para a inves gação policial?

Considero o IPPGF um Ins tuto de excelência, pois, além de


oferecer um serviço Pericial diferenciado e de qualidade
produzindo laudos criminais de grande relevância,
desenvolve projetos de pesquisa cien fica de impacto em
sua área de atuação. Quantos laudos de iden ficação de
pessoas, crimes de estupro, crimes contra patrimônio e
homicídios já foram realizados no Ins tuto e que
contribuíram para a resolução de casos? A relevância é ainda
maior quando nos deparamos com a responsabilidade que
temos em gerenciar o Banco de Perfis Gené cos do Estado do
Rio de Janeiro, função essa que temos feito com grande
dedicação, elevando o nome da nossa Perícia, sobretudo na
busca por pessoas desaparecidas.

Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense

anos

13
Durante sua gestão, quais os avanços e as dificuldades você apontaria como cruciais para
o andamento das a vidades do IPPGF?

Embora eu esteja à frente da Direção do IPPGF há somente 9 meses, estou no Ins tuto
desde a sua criação há 15 anos atrás. Primeiro respondi, de 2009 a 2013 pela coordenação
do projeto “Localizar”, depois pela Chefia de Laboratório e Gerência de Qualidade de 2016 a
2020, até assumir o cargo de Diretora do IPPGF. Assim, posso dizer que vivenciei todos os
pos de dificuldades e avanços no Ins tuto. As dificuldades ao longo dos anos têm sido
sempre voltadas para aqueles pontos que mais afligem as ins tuições públicas que é a
carência de recursos financeiros e de quan ta vo de servidores. O quadro de servidores
infelizmente depende da liberação do concurso no estado, porém, o esforço conjunto da
Ins tuição SEPOL, bem como do MJSP/SENASP¹, na compra de insumos e equipamentos,
tem impulsionado o Ins tuto a um avanço tecnológico crescente. Da mesma forma, temos
aprovados, ao longo dos anos, vários projetos de pesquisa cien fica com fomento da
FAPERJ e o desenvolvimento de técnicas e metodologias aplicadas à nossa ro na; assim
como a aquisição de alguns equipamentos tem colaborado bastante para o nosso
crescimento.

Para você, quais são as principais perspec vas para o desenvolvimento do IPPGF,
sobretudo no que diz respeito à pesquisa cien fica e à integração com outras ins tuições?
14

A pesquisa cien fica e a integração com outras ins tuições sempre foram algo muito
presente no IPPGF. Até mesmo porque o desenvolvimento e o crescimento da perícia, como
em qualquer outra área de serviços, só evolui diante do inves mento na ciência. Conforme
mencionei anteriormente, o Ins tuto vem desenvolvendo ao longo de sua existência,
vários projetos de pesquisa fomentados, principalmente, pela FAPERJ. Tudo isso tem
influenciado não somente no desenvolvimento de metodologias de real impacto na nossa
ro na de trabalho, mas também na formação acadêmica de nossos próprios Peritos que
desenvolveram suas teses de Mestrado e Doutorado através de alguns desses projetos.
Vários deles foram realizados em colaboração com Ins tuições de grande reconhecimento
e pres gio cien fico como UFRJ, UERJ e IBEX. Atualmente o IPPGF possui três projetos
FAPERJ em vigor nos temas de violência sexual, DNA de contato e tecnologias de nova
geração. Três outros projetos foram subme dos esse ano ao edital CAPES no contexto do
Programa de Cooperação Acadêmica em Segurança Pública e que esperamos que sejam
plenamente aprovados.

1 Ministério da Justiça e Segurança Pública / Secretaria Nacional de Segurança Pública

Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense

anos

14
O Evidência entrevistou os diretores do
Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca
Forense. Nosso segundo entrevista é o
perito criminal Dr. Rodrigo Grazinoli
Garrido que esteve a frente do Ins tuto de
2010 a2020.

Qual a importância do IPPGF15para a inves gação policial?


Não é mais possível pensar a inves gação policial desatada da prova técnico-cien fica. As
novas tecnologias, entre elas, as relacionadas à gené ca forense têm contribuído
sobremaneira na determinação da autoria e materialidade de crimes. Assim, a despeito de
não haver hierarquia entre os meios de prova, a perícia, com todas as limitações do
conhecimento cien fico, mostra-se essencial na tenta va de se reconstruir os fatos.

No entanto, a ciência só é capaz de fazer seu papel na persecução penal, quando,


realmente, coloca o conhecimento mais atual a serviço da inves gação. Preocupa-se com o
desenvolvimento de novas técnicas, com a formação de seus cien stas e com a feitura dos
exames baseada em normas estritas. Nesse sen do, o IPPGF tem cumprido seu papel. O
Ins tuto, que já nasceu com o espírito da pesquisa, vem nos úl mos 15 anos formando seus
cien stas, propondo e ganhando fomento para projetos que buscam o estabelecimento de
novas técnicas e testando-se por meio de auditorias externas e testes de proficiência.

Agora, nada disso teria importância senão fundamentado em uma forma de agir que busca
sempre o respeito aos direitos fundamentais, vendo a gené ca como ciência que auxilia no
desvendar de crimes e nunca como um instrumento de opressão, sempre atento para não
cairmos em um lombrosianismo gené co.

Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense

anos

15
Durante sua gestão, quais os avanços e as dificuldades você apontaria como cruciais para
o andamento das a vidades do IPPGF?

Fiquei 10 anos na direção, assim vemos avanços e dificuldades inúmeras. As dificuldades,


na maioria das vezes, se repetem e estão muito relacionadas às dificuldades inerentes do
serviço público, como conseguir garan r as manutenções e aquisição de equipamentos,
compras de reagentes e concurso para novos servidores. Nesse sen do, quando
conseguimos vencer tais dificuldades, acabamos por entender como grandes conquistas.
Nessas conquistas, vemos sempre o apoio dos diversos Diretores do DGPTC e DGAF,
sobretudo, das Chefias (hoje Secretaria) de Polícia Civil, da Secretaria de Segurança; da
SENASP e do Gabinete de Intervenção Federal. Assim, compramos equipamentos de úl ma
geração, que permi ram acompanhar as inovações e a implantação da automação; fazer o
primeiro e, até agora, único, concurso para peritos em gené ca forense; a implantação do
Banco Nacional de Perfis Gené cos e, de alguma forma, manter o funcionamento do IPPGF
entre 2010 e 2020. Foram muitas reuniões, conversas e corridas, ainda com processos em
papel, da sede da Polícia Civil até a Secretaria de Segurança Pública em busca de manter e
aprimorara o IPPGF. Para se ter uma ideia, quando iniciei a gestão, não havia sequer o cargo
de Diretor do IPPGF, ao sair, deixei estabelecido todos os cargos, os quais foram
implantados, logo em seguida, com as devidas comissões. Contudo, reconheço como maior
avanço a formação de recursos humanos: muitos
16 de nossos peritos conquistaram os mais
elevados graus cien ficos, inclusive no exterior, durante minha gestão. Sempre fui um
entusiasta da educação, pois acredito que só assim podemos mudar uma realidade. Assim,
lutei para que vessem suas licenças e possíveis adequações de horário, permi ndo que se
especializassem. Além disso, com toda dificuldade e muito trabalho da equipe, o IPPGF vem
sendo aprovado em exercícios interlaboratoriais de nível internacional e foi aprovado em
todos os quesitos em auditoria proposta nacionalmente. Também entendo como grande
conquista as diversas aprovações de projetos por ins tuições de fomento, permi ndo que
cumpríssemos com a atribuição legal do cargo de Perito (Lei Estadual 3.586/2001), isto é, “o
estabelecimento de novas técnicas e procedimentos de trabalho”. O IPPGF, durante minha
gestão, contribuiu com diversos casos de repercussão por todo o estado, além de ser
decisivo na iden ficação de corpos, possibilitando que familiares invisibilizados na
sociedade recebessem um serviço essencial do Estado. Assim, fazendo também com
maestria sua função de ponta na Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, com diversos
elogios que par ram de autoridades, mas também de cidadãos simples, maior razão de
nossa atuação. Por isso, aproveito para parabenizar a todos os colegas, peritos, técnicos e
demais policiais, que contribuíram para o sucesso do Ins tuto. - Sem vocês, nada disso seria
possível!

Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense

anos

16
Para você, quais são as principais perspec vas para o desenvolvimento do IPPGF,
sobretudo no que diz respeito à pesquisa cien fica e à integração com outras ins tuições?

Como ins tuição cien fica, não entender o IPPGF trabalhando sozinho. Tomando como
base as respostas anteriores, penso que a maior perspec va de atuação é a garan a de um
ciclo virtuoso em que se observa con nuamente formação de recursos humanos, interação
com ins tuições de ensino e pesquisa, obtenção de fomento para Pesquisa,
Desenvolvimento & Inovação (P, D & I), produção técnico-cien fica e publicação. É claro que
este ciclo também contribui com a manutenção da a vidade fim, as perícias, mas nunca é
demais repe r que se faz necessário garan r o aporte de insumos, a manutenção e
aquisição de equipamentos e os concursos públicos para o Ins tuto. Em resumo, a
integração é condição necessária para uma ins tuição técnico-cien fica. É importante que
a ins tuição seja reconhecida no meio, pois, além de trazer auxílio em momentos que se
precisa de algo, como o uso de um equipamento ou o emprés mo de reagentes, também
traz confiança para a ins tuição entre seus pares. Tivemos a oportunidade de desenvolver,
apresentar e publicar trabalhos com pesquisadores de diversas ins tuições do Brasil, como
UFRJ, UERJ, UNIRIO, UFRRJ, UFRGS, UFES, órgãos de perícia de diversos estados, além de
ins tuições internacionais, como a Universidade do Porto e Coimbra. Dessa forma,
atualmente, o nome IPPGF encontra-se estampado em periódicos nacionais e
internacionais, em teses e dissertações, bem17como nos anais de eventos pelo mundo. Não
se pode descuidar desta integração, devendo-se aumentá-la ainda mais. Por fim, ainda
como perspec va geral para o IPPGF, não penso ser saudável para a ins tuição, ter diretores
com período de gestão tão grande quanto o meu (10 anos). Precisamos sempre oxigenar a
ins tuição, ter ideias novas e vontade renovada para resolver os problemas. A possibilidade
de uma gestão com mandato de tempo determinado, com diretores que conhecem a
gestão e aprovados em processo sele vo que avalia seus méritos técnicos e cien ficos
seria, a meu ver, uma ó ma proposta. Seguiríamos assim o exemplo de diversas ins tuições
cien ficas.

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17
O Evidência entrevistou os diretores do
Ins tuto de Pesquisa e Perícia em
Gené ca Forense. Nossa terceira
entrevistada é a Dra. Sandra Fernandes
Pinto Martha que esteve na gestão do
Ins tuto de março a setembro de 2016.

Qual a importância do IPPGF18para a inves gação policial?


A análise de DNA como prova criminal tornou-se a mais poderosa ferramenta para a
iden ficação humana e inves gação criminal. Desde a sua inauguração em 2005, o IPPGF
vem solucionando inúmeros casos, permi ndo condenar ou absolver um suspeito a par r
de uma ínfima amostra biológica encontrada na cena do crime.
Durante sua gestão, quais os avanços e as dificuldades você apontaria como cruciais para
o andamento das a vidades do IPPGF?
Foram muitos os desafios, uma vez que o período foi de adequação dos processos técnicos
e administra vos, visando os Jogos Olímpicos 2016. Apesar das dificuldades encontradas,
foi possível elaborar um plano de ação que possibilitaria atender toda e qualquer demanda
de exames de DNA, em caso de DVI – Iden ficação de Ví mas de Desastre em Massa.
Tamanha empreitada, em tão pouco tempo, só foi possível graças a dedicação e empenho
de toda a equipe de servidores lotados no IPPGF.
Para você, quais são as principais perspec vas para o desenvolvimento do IPPGF,
sobretudo no que diz respeito à pesquisa cien fica e à integração com outras ins tuições?
Todos os Peritos Criminais e Legistas lotados no IPPGF possuem tulações e experiência em
pesquisa. Entretanto, o incen vo da Administração Pública para que haja a troca de
experiência e conhecimento entre os profissionais da área forense e acadêmica do Brasil e
do mundo é de suma importância para o con nuo aperfeiçoamento profissional e
conhecimento técnico na área de Biologia Molecular, sempre em desenvolvimento.

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18
O Evidência entrevistou os diretores do
Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca
Forense. Nossa quarta entrevistada é a
Dra. Ká a Araújo que esteve na gestão do
Ins tuto de 2008 à 2010.

Qual a importância do IPPGF19para a inves gação policial?


O IPPGF é fundamental para a inves gação policial uma vez que sua atribuição, neste
contexto, é a realização do exame compara vo de perfis gené cos entre amostras
ques onadas e amostras de suspeitos ou de referência, aplicado na iden ficação humana;
de cadáveres; de ossadas; de ves gios coletados em locais de crime; de amostras biológicas
em suportes diversos e em crimes de violência sexual, entre outros. Considerando os
avanços tecnológicos na área da gené ca forense, os resultados dos exames de DNA
cons tuem uma prova consistente para o processo inves gatório. Entretanto, para que a
execução dos exames seja o mizada e sa sfatória são imprescindíveis a preservação dos
locais de crime e o cumprimento rigoroso da cadeia de custódia (do local do evento até a
realização do exame, bem como na contraprova, se houver). Assim, outros segmentos do
DGPTC são igualmente importantes, destacando-se o Serviço de Perícias de Locais, o Setor
de Bioquímica/SPQ/ICCE e Serviços do IMLAP.
Durante sua gestão, quais os avanços e as dificuldades você apontaria como cruciais para
o andamento das a vidades do IPPGF?
No período que permanecemos como dirigente do IPPGF, considerando a evolução dos
procedimentos per nentes aos laboratórios de exames de DNA, adquirimos alguns
equipamentos, insumos e materiais diversos; atualizamos protocolos para a execução de
diferentes etapas dos exames; implantamos a metodologia de manutenção dos aparelhos e

Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense

anos

19
aferição sistemá ca de instrumentos, com fichas específicas de acompanhamento das
visitas técnicas; atualizamos os protocolos de uso dos aparelhos fixando-os na bancada;
reorganizamos os procedimentos de acautelamento das amostras em geladeiras e câmara
fria, com listagem externa; u lizamos programas de computador para inserção das
informações sobre cada solicitação de exame: fechamentos de casos; localização das
amostras (contribuindo para o rastreamento das amostras no laboratório); liberação dos
laudos e respec vos resultados e digitalização dos laudos emi dos pelo Ins tuto. Iniciamos
um Projeto de Pesquisa, de inicia va da Dra Selma Sallenave, sobre crimes de violência
contra a mulher, com apoio da FAPERJ. Realizamos um dos primeiros eventos, com palestras
e cursos prá cos sobre AUTOMAÇÃO, na área da gené ca forense, com patrocínio da
SENASP, da Applied Byosystems/Life Technologies, da RCHISTO/TECAN, entre outras
empresas. Par cipamos de reuniões e cursos coordenados pela SENASP, com
representantes dos laboratórios oficiais de DNA do país, referentes a adesão e formalização
para implantação do Projeto CODIS/Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos. Apesar
de termos adquiridos alguns recursos, estes não foram suficientes para atender a demanda
do Laboratório. Alguns contratos de manutenção resultaram insa sfatórios, por questões
orçamentárias entre outros fatores. Algumas vezes fomos obrigados a interromper o
atendimento, por falta de recursos materiais, o que provocou grande pressão por parte de
órgãos superiores da PCERJ. A presença do Estado é fundamental, no que se refere a
importância da Polícia Técnica: desenvolver pesquisas; apresentar resultados, embasados
20
em provas, que contribuem para estabelecer a verdade, em prol da jus ça. Logo, o Estado
deve inves r e incen var as pesquisas realizadas pelos Órgãos Periciais. Não se jus fica que
os inves mentos sejam apenas provenientes da SENASP.

Para você, quais são as principais perspec vas para o desenvolvimento do IPPGF,
sobretudo no que diz respeito à pesquisa cien fica e à integração com outras ins tuições?

A pesquisa cien fica exige um processo con nuo do conhecimento. Em resposta às


inovações tecnológicas na área da Gené ca Forense é indispensável a capacitação dos
profissionais envolvidos; aquisição de equipamentos e insumos modernos e materiais
diversos, obje vando o emprego de técnicas mais eficientes e eficazes, que o mizem os
procedimentos para melhor atender a demanda de exames, inclusive pela implementação
dos princípios preconizados pela Rede Integrada do Banco de Perfis Gené cos e pela a
Legislação atualizada. A integração entre ins tuições de pesquisa, a meu ver, é pro cua
para todos. Há de se reconhecer que é de fundamental importância o comprome mento
do estado em inves r nos órgãos de perícia, em prol da sociedade e da Jus ça.

Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense

anos

20
O Evidência entrevistou os diretores do
Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca
Forense. Por fim, o perito que primeiro
esteve a frente do Ins tuto, Dr. Rodrigo
Soares de Moura Neto cuja a gestão se
deu de 2005 à 2008.
Qual a importância do IPPGF21para a inves gação policial?
Entre as técnicas de inves gação, hoje aplicadas pela PCERJ, a única que realmente é a
mesma em todo o Brasil é o “Exame de DNA”. Na realidade esta metodologia é u lizada por
todas as polícias do mundo, sendo o intercâmbio de dados realizado por meio eletrônico,
digitalizado. No Brasil, e em vários outros países, este intercâmbio é feito por meio do
CODIS.
Durante sua gestão, quais os avanços e as dificuldades você apontaria como cruciais para
o andamento das a vidades do IPPGF?
Nós iniciamos os trabalhos do Ins tuto e por isso, a par r da dedicação dos Peritos neste
início, o processo de estabelecimento das ro nas foi implantado do zero. Além disso, antes
da construção do IPPGF, vemos que implantar a “Cultura do DNA” em todos os setores da
Perícia para estabelecer uma correta cadeia de custódia.
Para você, quais são as principais perspec vas para o desenvolvimento do IPPGF,
sobretudo no que diz respeito à pesquisa cien fica e à integração com outras ins tuições?
Acho que a vocação está no nome “Pesquisa e Perícias”. Como esperado, a ciência evolui e a
tecnologia muda com o tempo. Então devemos estar preparados para o futuro. O IPPGF já
recebeu, e recebe, vários financiamentos em pesquisa da FAPERJ. Hoje esta prá ca se
estendeu para outros Ins tutos Periciais. Acompanhar a tecnologia requer inves mento em
formação de pessoal e pesquisa. Acredito eu que isso seja o que realmente define o IPPGF.

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anos

21
Um olhar apaixonado
sobre o Banco Estadual
de Perfis Genéticos
Ta ana Hessab

Paixão: termo empregado, dentre outras definições, para nomear uma forte admiração por
uma causa ou ideal. No meu entendimento, do ponto de vista profissional, pode confundir-
se com mo vação, propósito. Há alguns anos, uma paixão específica dentro da perícia me
mo va.

O nome dessa paixão é Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos (RIBPG). Importante
dizer que a criação dessa Rede foi fruto do trabalho de peritos excepcionais de diversos
lugares do Brasil que me precederam. O esforço conjunto desses profissionais e de
movimentos da sociedade civil culminou com a promulgação da Lei Federal nº 12.654, de
28 de maio de 2012, que alterou as Leis nos 12.037, de 1º de outubro de 2009, e 7.210, de 11
de julho de 1984, para prever a coleta de perfil gené co como forma de iden ficação
criminal; e do Decreto nº 7.950, de 12 de março de 2013, que ins tuiu a RIBPG.¹

Esses disposi vos legais em conjunto permi 22


ram realizar a inclusão em bancos de dados de
perfis gené cos de dois grupos: 1) ves gios e indivíduos cadastrados nos termos da Lei nº
12.654/012, incluindo, por exemplo, condenados por crimes hediondos; 2) cadáveres e
restos mortais não iden ficados, pessoas de iden dade desconhecida e parentes
consanguíneos de pessoas desaparecidas.

Inicio minha narra va em 2013. Naquele ano, foi necessário designar os administradores
de bancos de perfis gené cos que representariam o Estado do Rio de Janeiro juntamente à
RIBPG. A perita Rosangela Carvalho estava definida como administradora tular do Banco
Estadual de Perfis Gené cos do Estado do Rio de Janeiro (BEPG/RJ)². Faltava preencher a
vaga de administrador subs tuto. Os peritos mais experientes estavam com outras
questões prioritárias e os peritos mais novos à época, devido ao tempo, não atendiam ao
requisito mínimo para assumir a administração do Banco. Foi nesse contexto que eu fui
“escolhida” a nova administradora subs tuta do Banco Estadual.

Dessa forma, em 07 de maio de 2013, a perita Rosangela e eu par cipamos de nossa


primeira reunião da RIBPG, que ocorreu em São Paulo. Nesta oportunidade, foi feita uma
contextualização histórica sobre os primeiros países a u lizarem a ferramenta, seus
potenciais e sobre a publicação dos membros do Comitê Gestor da RIBPG³. Ainda consigo

1 Mais detalhes sobre esses disposi vos legais podem ser encontrados no ar go “Banco de Perfis Gené cos”, na edição nº 1 da Revista
Evidência.

2 À época, o atual Banco Estadual de Perfis Gené cos do Estado do Rio de Janeiro (BEPG/RJ) não havia sido nomeado dessa forma, mas como o
Banco manteve-se o mesmo, apesar das diferentes publicações, u lizei um único nome a fim de facilitar a compreensão.

3 O Comitê Gestor da Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos (CG-RIBPG) tem a finalidade de promover a coordenação das ações dos
órgãos gerenciadores de banco de dados de perfis gené cos e a integração dos dados nos âmbitos da União, dos Estados e do Distrito Federal.
resgatar a sensação daquele dia, consigo quase ver em terceira pessoa o meu olhar diante
dos casos de estupro resolvidos e evitados a par r daquela ferramenta, das condenações
equivocadas rever das... Aquele era o pedacinho do mundo no qual eu podia deixar minha
contribuição. Se por um lado, precisamos ter humildade para compreender as limitações da
perícia, por outro, faz-se necessário valorizar aquilo em que temos exper se e não há
dúvidas de que os bancos de dados são ferramentas poderosas não somente na elucidação
de crimes, mas também na sua prevenção.

Esse contato inicial foi seguido de pesquisas a fim de compreender mais a fundo os


potenciais e limitações dos bancos de perfis gené cos, incluindo seus aspectos legais.
Posteriormente, entre 16 e 19 de julho do mesmo ano, fomos à Brasília realizar o
treinamento ministrado por Peritos Federais para u lizar o so ware CODIS (Combined DNA
Index System), o mesmo empregado pelo FBI (Federal Bureau of Inves ga on) para bancos
de perfis gené cos.

Uma vez que aprendemos a u lizar o so ware e recebemos orientações de procedimentos


4
em relação ao servidor (que havia sido previamente instalado em 2010 ), realizamos
algumas reuniões com a equipe do DGTIT (Departamento Geral de Tecnologia da
Informação e Telecomunicações) a fim de restabelecer o acesso ao servidor e estabelecer
ro nas de manutenção e backup, que até hoje são realizadas por eles.

Superadas as questões de TI, ministramos o 23


primeiro treinamento aos colegas do Ins tuto
de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense (IPPGF), de forma que eles passaram a estar
capacitados como analistas de banco de perfis gené cos. A par r disso, houve um esforço
conjunto dos administradores e analistas para inserção de perfis gené cos do ano corrente
e de anos anteriores.

Vale explicar que antes de u lizarmos o CODIS, nossa ro na era concentrada nos casos
fechados, em que é solicitado confronto de perfis gené cos entre uma amostra
ques onada (cadáver, local de crime, etc.) e uma amostra de referência (o padrão, de fonte
biológica conhecida). Em caso de resultado nega vo (ou exclusão) de iden ficação de
restos mortais, por exemplo, a informação era reportada no laudo, porém não era possível
comparar os perfis gené cos de todos esses casos entre si para verificar a compa bilidade.
Os perfis gené cos oriundos desses laudos de exclusão foram alguns dos casos an gos
inseridos no CODIS após o treinamento.

No contexto desse esforço conjunto dos peritos do IPPGF, o resultado veio mais
rapidamente do que esperávamos. Em dezembro de 2013, conseguimos vincular um corpo
não iden ficado a um familiar que buscava o seu parente desaparecido. Tratava-se do
primeiro caso de iden ficação de corpo da RIBPG através do Banco de Perfis Gené cos5. O
familiar do caso era um pai que buscava o seu filho desde 19 de fevereiro de 2012. De forma
impressionante, esse corpo foi encontrado no dia seguinte à data do úl mo contato, mas
4 O so ware CODIS foi instalado em 2010, depois de firmado Acordo de Cooperação Técnica entre a então Secretaria de Estado de Segurança
Pública e o Ministério da Jus ça.

5 Informações adicionais podem ser ob das na matéria: h ps://odia.ig.com.br/_conteudo/no cia/rio-de-janeiro/2014-03-09/inves gacao-


com-alta-tecnologia.html

23
por estar carbonizado e, na ausência da indicação de possibilidade de vínculo entre eles,
não havia sido iden ficado. Faltava a ferramenta que permi sse a comparação simultânea
de diversos perfis gené cos para sabermos que se tratava daquele filho. Comparação que
foi possível somente por meio de confrontos realizados no BEPG/RJ, seguidas de análises de
DNA confirmatórias. O Laudo de Exame de DNA liberado pôde encerrar a busca desse pai.

O trabalho de inserção de perfis gené cos prosseguiu em paralelo à nossa ro na pericial.


Além de todo esse trabalho, a gestão do Banco envolvia a verificação de amostras inseridas
pelos peritos; a análise de coincidências; o contato com diferentes órgãos a fim de realizar a
sua manutenção informacional; a elaboração de Procedimento Operacional Padrão (POP);
o treinamento de peritos dentro e fora do IPPGF; o contato com a equipe CODIS do FBI, a fim
de esclarecer dúvidas; a revisão das diferentes versões do Manual de Procedimentos
Operacionais da RIBPG, a elaboração de relatórios semestrais para encaminhar à
coordenação do CG-RIBPG; o atendimento a O cios encaminhados por diversos órgãos,
dentre outras.

Ao longo desses anos, foram analisados diversos casos de indicação de coincidência e


vínculo gené co. Essa análise inclui tanto a repe ção do exame de DNA com outras
6
metodologias quanto o levantamento de metadados . Nos casos de coincidências e
vínculos gené cos interestaduais, a análise é realizada em conjunto com o outro
laboratório par cipante. Dessa forma, é possível perceber a importância do conhecimento
técnico-cien fico. O so ware indica a possibilidade,
24 entretanto, é a análise do expert que
permite verificar a per nência ou não daquele caso de coincidência ou vínculo gené co.

O trabalho foi seguindo e, em dezembro de 2014, os administradores de Bancos de Perfis


Gené cos receberiam um treinamento de atualização, para a versão 7 do so ware CODIS,
ministrado em Brasília, pelo FBI (Figura 1). Embora fosse somente uma vaga por Estado,
diante de sua previsão de aposentadoria, a perita Rosangela generosamente indicou que eu
par cipasse do curso. A experiência em Brasília foi mais um daqueles momentos incríveis
de aprendizado e troca com colegas do Brasil inteiro. Aliás, vejo na RIPBG um grande
exemplo de integração nacional para toda a área de Segurança Pública.

Figura 1 - Treinamento de
administradores CODIS, versão 7.
6 Informações não gené cas, adicionais sobre o caso. Esse levantamento é realizado através do número de procedimento e demais
informações disponíveis, no sistema da Secretaria de Estado de Polícia Civil (ROWeb).

24
No retorno ao Rio de Janeiro, ministrei mais uma etapa de treinamento aos peritos do
IPPGF a fim de manter a inserção de perfis na versão atualizada do so ware, que nha
passado por modificações expressivas. Pouco tempo depois, com o afastamento da perita
Rosangela, assumi a administração tular do Banco. Nesse mesmo momento, o perito
Arthur Prates foi designado o novo administrador subs tuto.

No contexto da existência do Banco, já nhamos condições de inserir perfis gené cos de


casos abertos. Quando a Ordem de Serviço que tratava da solicitação de exame de DNA foi
revisada pela equipe, ressaltamos a importância da previsão de encaminhamento desses
casos.

Os peritos haviam sido treinados, a inserção de casos recentes e an gos estava sendo
realizada, a possibilidade de encaminhamento de casos abertos estava prevista em Ordem
de Serviço. Tradicionalmente, o IPPGF recebia um número maior de solicitações de casos
fechados relacionados a pessoas desaparecidas. Era importante, então, incrementar a
solicitação de ves gios de casos abertos para serem inseridos no BEPG/RJ. Diante dessa
perspec va, no contexto da realização de dois cursos de aplicações da gené ca forense
para público externo ao IPPGF, ministrei treinamento sobre o Banco de Perfis Gené cos,
com ênfase no encaminhamento de ves gios de casos abertos.

Em 2017, já nhamos ganhado experiência na gestão do Banco Estadual. Compreendendo


a importância da contribuição dos peritos para o funcionamento de toda a RIBPG, de
dezembro de 2017 a dezembro de 2019, a par 25 r da aprovação dos demais administradores
da Região Sudeste e indicação do dirigente do órgão, nos tornamos membros do Comitê
Gestor da Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos (Figura 2), eu na condição de tular
e o perito Arthur na qualidade de membro subs tuto. Foram dois anos de reuniões
bimestrais em Brasília, tendo sido uma grande honra trabalhar ao lado de profissionais que
tanto se empenharam em prol da RIBPG. Essa gestão do Comitê Gestor desenvolveu
diversas a vidades, incluindo o projeto de coleta de material biológico de condenados, que
culminaram com o reconhecimento do trabalho pelo Ministério da Jus ça e Segurança
Pública, em 2019 (Figura 3).

Figuras 2 e 3 - Reunião do Comitê Gestor da RIBPG e Homenagem recebida do Ministro da Jus ça


e Segurança Pública..

25
Vale explicar que o Comitê Gestor da RIBPG possui a finalidade de promover a coordenação
das ações dos órgãos gerenciadores de banco de dados de perfis gené cos e a integração
dos dados, sendo composto por representantes do Ministério da Jus ça e Segurança
Pública; representante da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República;
representante do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; representantes
dos Estados ou do Distrito Federal, sendo um representante de cada região geográfica; e
ainda convidados do Ministério Público; da Defensoria Pública; da Ordem dos Advogados
do Brasil; e da Comissão Nacional de É ca em Pesquisa.

Esse Comitê conta também com duas comissões de caráter permanente e pode ins tuir
grupos de trabalho, com a finalidade de subsidiá-lo em temas específicos. Além da
par cipação como membros do Comitê Gestor, os peritos do Estado do Rio de Janeiro
veram mais oportunidades de contribuir com a RIBPG. A perita Selma Sallenave, com a
Comissão de Qualidade, a par r de março de 2018, e com o Grupo de Trabalho de
Desaparecidos, a par r de março de 2020; e eu, com a Comissão de Interpretação e
Esta s ca, desde março de 2014, tendo sido coordenadora desta Comissão de dezembro
de 2016 a abril de 2020, mais uma oportunidade de expandir horizontes e aprender com
profissionais das diferentes unidades da federação. Nesse período, elaboramos a minuta de
Resolução sobre a padronização de procedimentos rela vos a análises esta s cas,
aprovada pelo Comitê Gestor, e ministramos curso de esta s ca aplicada à gené ca
forense para a RIBPG, dentre outras a vidades.

No contexto de capacitações, estava previsto o treinamento de atualização para a versão 8


26
do so ware CODIS. De forma dis nta de 2014, uma equipe de peritos da própria RIBPG
ministraria o treinamento. Previamente à realização do curso, no final de 2018, essa equipe
de peritos recebeu auxílio da SENASP para ir ao encontro anual de administradores CODIS, a
CODIS Conference, do FBI, realizada na cidade de Norman, Oklahoma, Estados Unidos
(Figura 4). Nesta oportunidade, par cipamos do encontro de usuários internacionais
CODIS7, assis mos a palestras sobre questões mais técnicas, sobre casos relevantes
resolvidos com o auxílio da ferramenta nas diversas partes do mundo, e vemos a
oportunidade de testar a versão atualizada do so ware. Diante disso e da possibilidade de
interagir com diversos profissionais qualificados, esse foi um daqueles momentos da vida
em que pensei “Eu nem acredito que estou aqui” e abracei a oportunidade para aprender
ao máximo.

Figura 4 – Peritos da RIBPG na CODIS


Conference, do FBI.

7 Na CODIS Conference, esse nome é u lizado para designar os usuários CODIS de fora dos Estados Unidos da América.

26
Em 2019, foi realizado, em Brasília, o treinamento de atualização dos administradores
CODIS brasileiros para a versão 8 do so ware. Dessa vez, foram des nadas duas vagas para
cada unidade da federação. Como fui docente do curso, tanto o administrador subs tuto,
perito Arthur, como a perita Carolina Bo no par ciparam do treinamento (Figura 5), que
posteriormente foi replicado para os peritos do IPPGF. No mesmo ano, o IPPGF foi
homenageado pela RIBPG por ter contribuído com o maior número de inserções de perfis
gené cos relacionados à iden ficação de pessoas desaparecidas, no Banco Nacional de
Perfis Gené cos, no período de maio/2018 a setembro/2019 (Figura 6), colocando o Estado
do Rio de Janeiro em destaque nacional. Um importante trabalho de toda a equipe do
IPPGF.

Figuras 5 e 6 - Treinamento de administradores CODIS,


27 versão 8 e Homenagem recebida em nome
do IPPGF.

Não poderia deixar de citar a atuação do IPPGF no projeto de coleta de material biológico
de condenados. A par r do trabalho do Comitê Gestor da RIBPG, em conjunto com a
Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), em 2018, foi iniciado o projeto de
coleta de condenados nos presídios. Esse projeto contou com recursos da SENASP para a
sua execução e es mulou as equipes das unidades federa vas a realizarem as coletas, um
importante incen vo num contexto de falta de recursos de alguns Estados, concre zando
uma etapa que buscávamos desde o início da gestão.

Antes de iniciarmos, com o apoio e a presença da direção do Departamento Geral de Polícia


Técnico-Cien fica (DGPTC), realizamos duas reuniões com o Subsecretário Geral da
Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP) e outros servidores da SEAP, a
fim de tratar dos procedimentos de coleta.

Após as reuniões, ainda em 2018, demos início à coleta, no Ins tuto Penal Edgard Costa, em
Niterói. No ano seguinte, prosseguimos em outras unidades prisionais do Estado. Durante o
procedimento, explicávamos as etapas e sua base legal àqueles que seriam subme dos à
coleta. O ambiente era bastante dis nto do nosso trabalho usual, mas, com o tempo, nos
habituamos. Realizamos coletas, ouvimos histórias e em diversos momentos a Defensoria
Pública acompanhou o nosso trabalho. Nesse acompanhamento, eles puderam presenciar
os disposi vos que garan am o controle de qualidade da coleta, além da oportunidade de
esclarecerem eventuais dúvidas dos detentos.

27
Sob a gestão e execução da administração do Banco Estadual de Perfis Gené cos, um grupo
de três servidores, em alguns momentos quatro, realizou mais de 1.100 coletas no total,
sendo 31 no final de 2018, e o restante em 2019 (Figura 7). As coletas foram realizadas em
colaboração com a SEAP, que ficou responsável pela parte documental. Na úl ma coleta,
contamos ainda com a par cipação de dois servidores do Ins tuto de Iden ficação Félix
Pacheco (IIFP) que foram previamente treinados. No mesmo ano, realizamos o exame de
DNA de cerca de 1.000 amostras e liberamos seus respec vos laudos. Em 2020, foi
finalizado o processamento e liberação dos laudos restantes. Conseguimos obter o perfil
gené co completo de todas as amostras coletadas. Foi um desafio realizar a gestão do
BEPG/RJ, par cipar das reuniões em Brasília, das a vidades do CG-RIBPG, das a vidades da
Comissão de Interpretação e Esta s ca, das coletas e do processamento do material, mas o
esforço valeu a pena.

Esse trabalho intenso de equipe


resultou na coincidência entre o
perfil gené co de amostra coletada
de um custodiado, em 2019, com o
perfil oriundo de ves gio sexual,
coletado em São Paulo, em 2012. Na
esfera criminal, foram ob das
outras coincidências confirmadas,
dentre elas o material de contato da
empunhadura de uma faca e uma
28 amostra ques onada oriunda de
cadáver, ambos coletados pela
Figura 7 - Equipe de coleta na unidade prisional. perícia da Secretaria de Estado de
Polícia Civil (SEPOL), e a coincidência
entre ves gios de sangue deixados em casos de crimes contra o patrimônio, um coletado por
peritos da SEPOL e outro oriundo da Polícia Federal. Aproveito para ressaltar a contribuição
dos servidores do DGPTC como um todo. No IPPGF, estamos no final da análise, mas é o
trabalho de todos os responsáveis pelas coletas em local de crime, oriundas de violência
sexual e de restos mortais não iden ficados que viabiliza o nosso.

Em 2020, destaco o grande empenho dos peritos do IPPGF em processar e inserir perfis
gené cos de casos abertos no BEPG/RJ. Atualmente, o Banco conta com mais de 2.200 perfis
gené cos. Todas as metas de coleta e inserção estabelecidas juntamente à Secretaria
Nacional de Segurança Pública (SENASP) até então foram cumpridas, fator importante para o
recebimento da parcela do Fundo Nacional de Segurança Pública pelo Estado do Rio de
Janeiro.

Reconhecemos que ainda temos mais a fazer, mas valorizamos os nossos avanços diante das
dificuldades. Cada resultado posi vo faz esse trabalho valer a pena. Con nuamos
trabalhando e desejamos que o Banco gere cada vez mais resultados. Foi um prazer atuar na
administração do BEPG/RJ durante esses anos, sou muito grata pela oportunidade. Agradeço
a todos os que se empenharam para o estabelecimento da RIPBG e do BEPG/RJ, incluindo os
nossos gestores da SEPOL. E a paixão a cada dia aumenta mais.

28
Referências bibliográficas

Brasil. Decreto nº 7.950, de 12 de março de 2013.


Disponível em <h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/decreto/d7950.htm>.

Brasil. Lei nº 12.654, de 28 de maio de 2012. Disponível em <h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-


2014/2012/lei/l12654.htm >.

Brasil. Lei nº 13.756, de 12 de dezembro de 2018.


Disponível em <h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13756.htm>.
29

Gabinete de Intervenção Federal no Rio de Janeiro. Decreto nº 28, de 26 de outubro de 2018.

Hessab, T. Banco de Perfis Gené cos. Evidência, o Jornal da Perícia, Rio de Janeiro, 1, 4 - 5, 2018.

Ministério da Jus ça e Segurança Pública. Portaria nº 1.147, de 6 de dezembro de 2017.

Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos. Portaria nº 1 /2018. Grupo de Trabalho de Desaparecidos,
Comitê Gestor da RIBPG, Brasília, 2020.

Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos. Portaria nº 1/2018. Comissão de Qualidade, Comitê Gestor da
RIBPG, Brasília, 2018.

Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos. Portaria nº 3/2018. Comissão de Esta s ca, Comitê Gestor da
RIBPG, Brasília, 2018.

Sobre a autora

Ta ana Hessab de Castro Aranha é perita criminal, vice-diretora do IPPGF/DGPTC/SEPOL e administradora do


Banco Estadual de Perfis Gené cos - RJ. Possui Bacharelado em Ciências Biológicas - Modalidade Gené ca, pela
UFRJ, concluído com dignidade acadêmica Magna Cum Laude, mestrado em Biologia Celular e Molecular, pela
Fiocruz, e doutorado em Gené ca, pela UFRJ, com período de pesquisa na University of Melbourne. Foi membro
do Comitê Gestor da Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos, no biênio 2018-2019, e coordenadora da
Comissão de Interpretação e Esta s ca desse mesmo Comitê, de 2016 a 2020.

29
Sequenciamento
Massivo Paralelo (SMP)
em Genética Forense
Carolina Bo no Gruszkowski Fratani e Rodrigo Soares de Moura Neto

Contextualização

O Índice Global da Paz de 2020 (h p://visiono umanity.org/indexes/global-peace-index/)


mostra o Brasil na 126ª colocação de um total de 163 países, apresentando como principais
problemas altas taxas de homicídios e crimes violentos. Atualmente o índice de resolução
de homicídios no país gira em torno de 4-6% [1], fazendo com que a confiança da sociedade
em Ins tuições como a Polícia e o Poder Judiciário não ultrapasse 30% [2].

Além de medidas eficazes no setor social, o problema da violência pode ser comba do
através de um enfoque técnico-cien fico, aparelhando e aprimorando as análises periciais,
de modo a fornecer provas técnicas irrefutáveis à Jus ça e proporcionando maior
credibilidade ao setor de Segurança Pública. Medidas visando o aumento da confiança da
30
população neste setor podem propiciar um melhor ambiente para o crescimento de vários
setores produ vos.

Marcadores gené cos de interesse forense e sua análise

A Gené ca Forense é um campo da Biologia que visa estabelecer a iden dade do doador de
uma amostra biológica – por exemplo, sangue, sêmen, ossos, cabelos, dentes, músculo e
saliva – relacionada a alguma inves gação criminal através da análise de seu DNA. Tais
inves gações incluem exames de paternidade/vínculo gené co, iden ficação de ví mas de
desastres de massa, iden ficação de pessoas desaparecidas, crimes de violência sexual, etc
[3,4,5].

Os marcadores gené cos de interesse forense mais relevantes dividem-se em basicamente


3 categorias: as regiões microssatélites (STRs), os polimorfismos de nucleo deo único
(SNPs) e a região controle do DNA mitocondrial (mtDNA) (Figura 1). Resumidamente, as
metodologias de análise aplicadas ao estudo desses marcadores envolvem a amplificação
do material gené co numa reação de PCR (reação em cadeia da polimerase), seguida de
análise de fragmentos de DNA ou sequenciamento através de eletroforese capilar.

30
Figura 1: Os 3 pos de marcadores gené cos mais relevantes nas análises de ro na. Os
microssatélites (STRs) são regiões repe vas do DNA, nos quais se assume que uma
determinada sequência é constante, variando apenas o número de repe ções de um alelo para
o outro. Os polimorfismos de nucleo deo único (SNPs) podem ser inserções, deleções ou
subs tuições de uma base nitrogenada. A região controle do DNA mitocondrial (mtDNA) é rica
em polimorfismos, vinculando indivíduos por sua linhagem materna.

Apesar de serem técnicas consagradas e 31


que são executadas a mais de 30 anos nos
laboratórios de Gené ca Forense pelo mundo, existem limitações. Em muitos casos, a
própria natureza da amostra forense é limitante, pois devido à exiguidade do material ou
seu estágio de degradação, não há material disponível em quan dade suficiente para
proceder com várias análises e geno par todos os marcadores gené cos desejados. Além
disso, novos desafios tem surgido, como a necessidade de analisar amostras complexas,
envolvendo misturas de mais de 2 indivíduos, e amostras com pouquíssima quan dade de
DNA – como as amostras de toque, também chamadas touch DNA. Dessa forma, cada vez
mais serão necessárias novas tecnologias, mais sensíveis, robustas e que facilitem o
trabalho dos Peritos no seu dia a dia.

O Sequenciamento Massivo Paralelo (SMP) na gené ca forense

Ao longo dos anos 2010 surgiram as plataformas de sequenciamento massivo paralelo,


tecnologia também chamada de sequenciamento de segunda geração. As plataformas de
sequenciamento massivo paralelo (SMP) permitem a análise simultânea de milhares a
milhões de fragmentos de DNA, gerando grandes quan dades de dados a par r de
quan dades muito pequenas de material comparadas aos métodos tradicionais [6].

31
Independente do modelo de equipamento ou dos insumos u lizados, a metodologia de
preparo das amostras para o SMP segue um passo a passo similar: inicialmente, os
marcadores gené cos de interesse são amplificados numa reação de PCR. Em seguida, é
realizada a construção das bibliotecas de sequenciamento. Nesta etapa, cada amostra
recebe um iden ficador (“barcode”) que, por ser único, permite o processamento e a
análise de várias amostras conjuntamente, em um único tubo de reação, facilitando o
trabalho na bancada. As úl mas etapas envolvem algum po de amplificação clonal (para
aumentar a quan dade de DNA disponível) e a reação de sequenciamento em si. Por fim,
são realizadas uma série de análises computacionais para se chegar ao perfil gené co final
[7] (Figura 2).

32

Figura 2: Fluxo de preparo de amostras de DNA para SMP. O DNA (em azul) é amplificado e
depois iden ficado por sequências específicas (“barcodes”, em amarelo e vermelho). As etapas
de amplificação clonal e sequenciamento serão determinadas de acordo com o equipamento a
ser u lizado.

32
Algumas empresas já fornecem soluções customizadas para as análises forenses, tanto em
equipamentos quanto em insumos e so wares de análise de resultados. Dentre as
plataformas, estão disponíveis os modelos MiSeq FGx, da Illumina, e a linha Ion Torrent, da
Thermo Fisher Scien fic (Figura 3). Já os kits para amplificação e preparo das amostras são
disponibilizados pelas empresas Verogen, Promega e Thermo Fisher. Um breve
compara vo entre os kits disponíveis é apresentado na Tabela 1.

Figura 3: Plataformas disponíveis para análises por SMP na Gené ca Forense: MiSeq FGx
(Illumina) (esq), Ion Torrent PGM (centro) e Ion Torrent S5 (dir) (Thermo Fisher Scien fic).

Tabela 1: Compara vo entre kits disponíveis para análise de marcadores moleculares de


interesse forense por eletroforese capilar e SMP. A comparação se refere ao número de
marcadores gené cos que podem ser analisados simultaneamente numa única reação.
33

33
As vantagens da tecnologia MPS para as finalidades forenses são muitas, destacando-se:
maior sensibilidade (no mínimo 10 vezes em comparação com as técnicas de ro na
baseadas em eletroforese capilar), melhor desempenho nas análises de materiais an gos
ou extremamente degradados e a possibilidade de geno par quan dades superiores de
marcadores numa única reação, o mizando a análise de amostras exíguas.

Na úl ma década, foram publicados diversos trabalhos em que o SMP foi aplicado na área
forense com sucesso [8 a 15], inclusive com uma recente e inédita condenação em um caso
de estupro ocorrido na Holanda em 2015 [16]. No Brasil, pouquíssimas são ainda as
aplicações do SMP na ro na forense. Laboratórios da Polícia Federal e da Polícia Civil de
Minas Gerais contam com sequenciadores da Illumina; o primeiro u liza em poucos casos
de forma muito pontual, enquanto o segundo tem u lizado na iden ficação de ví mas do
rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, no ano de 2019.

Porém o primeiro grupo a trabalhar na pesquisa para implementação do SMP na Gené ca


Forense no Brasil está na UFRJ, com os Profs. Drs. Rodrigo Soares de Moura Neto e Rosane
Silva, do qual esta autora faz parte desde 2015. Contarei agora um pouco dos resultados
que já ob vemos ao longo dos úl mos 5 anos de trabalho.

34
O Sequenciamento Massivo Paralelo (SMP) no Rio de Janeiro

Iniciamos os trabalhos com SMP voltados para Gené ca Forense em 2015, através do
Doutorado em Biotecnologia pelo Inmetro cursado pela Perita Carolina Bo no, sob
orientação do Prof. Dr. Rodrigo Moura Neto e co-orientação da Profa. Dra. Rosane Silva. Foi
uma oportunidade única de conciliar o trabalho no meio acadêmico com a Perícia Ofical.

Entre 2015 e 2019, foi desenvolvida a tese in tulada “Validação de Plataforma de


Sequenciamento Massivo Paralelo (SMP) de DNA para Análises Periciais em Gené ca
Forense”. Trabalhamos em estudos de validação das análises de STRs autossômicos, mtDNA
e SNPs autossômicos e do cromossomo Y. Este trabalho rendeu a publicação de 2 ar gos
cien ficos [13,15], um capítulo no livro “Introdução à Gené ca Forense” escrito em
parceria com o colega Thiago Massuda, da Polícia Cien fica do Paraná [7], 2 orientações de
TCCs de Graduação em Biomedicina, além de par cipações em congressos nacionais e
internacionais (Figura 4). Outros ar gos ainda estão em submissão ou elaboração.

34
Figura 4: Par cipações em congressos nacionais e internacionais divulgando os resultados das
pesquisas sobre aplicação do SMP nas análises forenses. Da esquerda para direita, temos: Perita
Carolina Bo no no XXVI Congresso da Sociedade Internacional de Gené ca Forense (ISFG),
Cracóvia-Polônia, 2015; Perita Carolina Bo no e Prof Rodrigo Moura Neto no XXIII Congresso
Nacional de Criminalís ca, Búzios, 2015, onde palestraram juntos; Prof. Rodrigo Moura Neto no
evento HIDS, Barcelona-Espanha, 2016; Perita Carolina Bo no no XXVII Congresso da Sociedade
Internacional de Gené ca Forense (ISFG), Praga-República Tcheca, 2019, onde foi premiada com
uma bolsa de jovem pesquisador para par cipação no evento pelo Presidente e pela Vice-Presidente
da ISFG à época, Dr Walther Parson e Dra. Mechthild Prinz.

No final de 2018, fomos contemplados no edital nº 07/2018 da FAPERJ: “Programa de


Apoio a Projetos de Inovação no Campo da Segurança Pública - Ciência Forense”. Neste
novo trabalho ainda em execução, estamos desenvolvendo o projeto in tulado “Estudo de
Concordância dos Sistemas Precision ID em uma grande amostra populacional do Estado do
Rio de Janeiro, visando a implantação da tecnologia NGS em laboratórios criminais de DNA”.

Dentre os obje vos do projeto estão: avaliar


35 a concordância na geno pagem entre os 2
sistemas; iden ficar isoalelos STRs autossômicos na população do RJ (Figura 5) e quan ficar
o impacto destes no poder de discriminação dos exames de DNA, bem como estabelecer
suas respec vas frequências na população. Para isso, pretendemos geno par marcadores
gené cos STRs autossômicos, usados na ro na forense para iden ficação humana, em 500
indivíduos não relacionados da população do Estado do RJ, por eletroforese capilar e nas
plataformas Ion Torrent, da Thermo Fisher.

Figura 5: Isoalelos detectados em uma amostra geno pada no local gené co D3S1358. À esquerda, o
resultado ob do por eletroforese capilar mostra um genó po homozigoto, formado por 2 alelos com
17 repe ções de um bloco de 4 nucleo deos. À direita, a geno pagem realizada para a mesma
amostra no mesmo marcador gené co no Ion Torrent PGM mostra que na verdade o genó po é um
heterozigoto por sequência, ou seja, formado por 2 isoalelos com 17 repe ções de um bloco de 4
nucleo deos, porém com sequências diferentes entre si.

35
Até o momento já foram geno pados 318 indivíduos por eletroforese capilar e 109
indivíduos por SMP. Destes, 69 já veram seus perfis gené cos analisados e considerados
concordantes entre as 2 técnicas. Alguns achados interessantes já apontam que alguns
locais gené cos podem chegar a apresentar 2,5-3 vezes mais alelos quando consideramos
sua sequência e não apenas seu tamanho, o que se reflete num ganho geral no poder de
discriminação do SMP.

Considerações finais

Tendo em vista os trabalhos realizados por nosso grupo, bem como os dados já publicados
de pesquisas em diversos países, observa-se que a aplicação do SMP nas análises periciais
em Gené ca Forense pode auxiliar enormemente. Esta é uma técnica robusta, muito
sensível e que permite a observação de polimorfismos que normalmente não são
analisados com as técnicas atuais, seja pela alta demanda de tempo trabalhado, seja pela
exiguidade das amostras, ou pela falta de insumos padronizados para as análises de ro na.

Espera-se que, no médio prazo, o SMP esteja plenamente disponível para aplicação na
ro na forense de todo o mundo, auxiliando sobremaneira na análise de amostras
complexas, exíguas ou extremamente degradadas, aumentando o poder de discriminação
entre indivíduos ou mesmo possibilitando respostas que ainda não conseguimos tão
36
facilmente com as técnicas atuais.

Referências bibliográficas

[1] COUTELLE, J. E. “Qual a porcentagem de crimes solucionados pela polícia no Brasil?” Disponível em
h ps://super.abril.com.br/mundo-estranho/qual-a-porcentagem-de-crimes-solucionados-pela-policia-no-
brasil/ . Acesso em 02 mar 2019

[2] FGV Direito SP. Relatório ICJ Brasil: 1º semestre/2017.


Disponível em h p://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/19034/Relatorio-
ICJBrasil_1_sem_2017.pdf?sequence=1&isAllowed=y . Acesso em 02 mar 2019.

[3] ALVAREZ-CUBERO, M. J. et al. Gene c iden fica on of missing persons: DNA analysis of human remains and
compromised samples. Pathobiology : journal of immunopathology, molecular and cellular biology, v. 79, n. 5, p.
228–38, jan. 2012.

[4] BUDOWLE, B.; VAN DAAL, A. Forensically relevant SNP classes. BioTechniques, v. 44, n. 5, p. 603–8, 610, abr.
2008.

[5] BUTLER JM. Forensic DNA Typing. 2nd ed. Burlington: Elsevier Academic Press, 2005, 660 p.

[6] BRENNER, S. et al. Gene expression analysis by massively parallel signature sequencing (MPSS) on microbead
arrays. Nature Biotechnology, n. 18, p. 630-4, 2000.

[7] FRATANI, C. B. G. & MASSUDA, T. Y. C. Sequenciamento Massivo Paralelo (Genômica Forense). In: DIAS FILHO,
C. R. et al (org). Introdução à Gené ca Forense. Campinas: Millenium, 2020, p. 429-464.

36
[8] SEO, S. B. et al. Single nucleo de polymorphism typing with massively parallel sequencing for human
iden fica on. Interna onal journal of legal medicine, v. 127, n. 6, p. 1079–86, nov. 2013.

[9] BORSTING, C. et al. Evalua on of the Ion Torrent™ HID SNP 169-plex: A SNP typing assay developed for
human iden fica on by second genera on sequencing. Forensic Science Interna onal: Gene cs, v. 12, p. 144-
54, 2014.

[10] JUST, R.S. et al. Mitochondrial DNA heteroplasmy in the emerging field of massively parallel sequencing.
Forensic Science Interna onal: Gene cs, n. 18, p. 131–139, 2015.

[11] ZHOU, Y. et al. Strategies for complete mitochondrial genome sequencing on Ion Torrent PGMTM pla orm
in forensic sciences. Forensic Science Interna onal:Gene cs, n. 22, p. 11–21, 2016.

[12] FORDYCE, S. L. et al. Second-genera on sequencing of forensic STRs using the Ion TorrentTM HID STR 10-
plex and the Ion PGMTM. Forensic science interna onal. Gene cs, v. 14, p. 132–40, jan. 2015.

[13] BOTTINO, C.G. et al. STR genotyping using ion torrent PGM and STR 24-plex system: Performance and data
interpreta on. Forensic Science Interna onal: Gene cs Supplement Series, n. 5, p. e325–e326, 2015.

[14] BARRIO, P.A. et al. Massively parallel sequence data of 31 autosomal STR loci from 496 Spanish individuals
revealed concordance with CE-STR technology and enhanced discrimina on power. Forensic Science
Interna onal: Gene cs, n. 42, p. 49–55, 2019.

[15] BOTTINO, C.G. et al. Analysis of 124 SNP loci included in HID Ampliseq iden ty panel in a small popula on of
Rio de Janeiro, Brazil. Forensic Science Interna onal: Gene cs Supplement Series, n. 7, p. 243-244, 2019.

[16] VEROGEN. How Next Genera on Sequencing Resolved a Difficult Case, Leading to the First Criminal
Convic on of Its Kind. Disponível em h ps://info.verogen.com/first-ngs-court-convic on .
Acesso em 30 de outubro de 2020.
37

Sobre os autores

Carolina Bo no Gruszkowski Fratani é Perita Legista do IPPGF/SEPOL-RJ desde 2013. Possui Graduação em
Ciências Biológicas (Licenciatura e Bacharelado) pela Universidade Federal Fluminense, Mestrado em Biologia
Parasitária pela Fundação Oswaldo Cruz e Doutorado em Biotecnologia pelo Inmetro.

Rodrigo Soares de Moura Neto é Professor Titular do Ins tuto de Biologia da UFRJ. Possui Graduação em
Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Mestrado e Doutorado em Ciências
Biológicas (Bio sica) pela UFRJ. Fez o Pós-Doutoramento no Ins tute for Cancer Research, da Philadelphia, EUA.
Coordenou a implantação do Laboratório de DNA da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro (IPPGF), do qual foi
Diretor por três anos. Atuou como Pesquisador Colaborador da Divisão de Metrologia aplicada à Ciência da
Vida, do Inmetro, Coordenando o Programa de Metrologia Forense, até 2014. Desde 2019 é Cien sta do Nosso
Estado, pela FAPERJ.

37
Genética e tecnologia no
combate aos crimes sexuais
no Rio de Janeiro:
a união da Perícia e
da Pesquisa no IPPGF
Priscila Afonso Torres

Visão Geral da Violência Sexual

A violência sexual se configura como um fenômeno mul dimensional tão an go quanto a


história da humanidade. É uma demanda que precisa ser encarada como uma questão de
saúde pública, segurança e acesso à jus ça, requerendo do Estado polí cas e ações de
enfrentamento.

Fruto de relações sociais de dominação e imposição de diferenças que produzem


desigualdades de gênero, tornou-se banalizada e a nge principalmente as mulheres.
Contudo, pode acometer homens, idosos, crianças e adolescentes em ambiente privados
ou públicos e causar impactos e feridas visíveis e invisíveis, levando inclusive à morte.
38
Em 2018, segundo mais recentes dados divulgados pelo 13º Anuário de Segurança Pública
[1], produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, houve mais de 66 mil casos de
violência sexual no Brasil, o que corresponde a um número estarrecedor de mais de 180
estupros por dia, sendo 82% das ví mas do sexo feminino e tendo 54% até 13 anos de idade.
Desde 2009, quando houve a mudança no Código Penal brasileiro quanto à pificação do
crime de estupro e o atentado violento ao pudor passou a ser enquadrado como estupro,
este foi o número mais alto já contabilizado no país, chamando atenção para um problema
crescente e de di cil solução.

Ainda de acordo com dados do Anuário, os crimes de violência sexual possuem a


caracterís ca de extrema subno ficação às autoridades policiais e somente 7,5% das
ví mas registram ocorrência em delegacias, um percentual que varia de 16% a 32% nos
Estados Unidos, por exemplo. Esta baixa no ficação é associada a inúmeros fatores, como
ao receio das ví mas de sofrerem julgamento e constrangimento, ao temor de retaliação
por parte do agressor, à falta de confiança nas ins tuições e órgãos por onde a ví ma passa
ao realizar todo processo de denúncia e, ainda, na descrença da sociedade em que os
agressores sejam iden ficados e penalizados judicialmente.

Contudo, na úl ma década, mudanças na legislação e inves mento em tecnologia visando


ao processamento de amostras sexuais provenientes de casos an gos não solucionados,
denominadas “backlog de violência sexual”, armazenadas em unidade oficiais de perícia,
têm impulsionado a luta por jus ça às ví mas destes crimes bárbaros.

38
Legislação per nente

Um primeiro e enorme avanço veio através do decreto nº 7.950 [2], de 12 de março de


2013, que ins tuiu o Banco Nacional de Perfis Gené cos (BNPG) e criou a Rede Integrada de
Bancos de Perfis Gené cos (RIBPG), permi ndo o armazenamento, compar lhamento e
comparação de perfis gené cos em todo o território nacional. Através do uso do so ware
CODIS (Combined DNA Index Systems), o banco é capaz de apontar coincidências entre
perfis, também denominadas matches, de amostras ali depositadas, auxiliando em
inves gações e solucionando crimes, conforme abordado mais à frente. O BNPG é
gerenciado pelo Ministério da Jus ça e da Segurança Pública (MJSP) e é composto pelos
bancos estaduais administrados pelos ins tutos oficiais de perícias de cada estado, além do
banco da Polícia Federal, totalizando 22 laboratórios. No Rio de Janeiro, a administração e
controle do banco estadual são feitos pelo Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca
Forense (IPPGF), órgão do Departamento de Polícia Técnico Cien fica da Secretaria de
Estado de Polícia Civil do RJ e onde se encontra o Laboratório Geral de DNA do Estado.

Outra importante alteração da legislação foi ins tuída pela Lei Federal nº 12.654 [3], de 28
de maio de 2012, que acrescentou a possibilidade de uso do perfil gené co para
iden ficação criminal, além das vias já existentes de iden ficação da loscópica e
fotográfica.
39
Considerando que uma caracterís ca comum entre os crimes contra a dignidade sexual é a
reincidência do agressor, a criação do Banco de Dados e a viabilidade de inserção de perfis
de pessoas já condenadas por crimes prévios, como os de violência sexual, potencializou a
chance de resolução de outros crimes da mesma natureza ainda sem autoria definida.

Sendo assim, o processamento dos ves gios de backlog de crimes sexuais coletados pela
perícia, como sangue, sêmen, saliva ou fios de cabelo que tenham permanecido no corpo
ou roupas da ví ma ou mesmo no local em que o ato criminoso aconteceu, tem imensa
importância na busca por jus ça. As amostras ques onadas coletadas das ví mas podem
agora ser processadas diretamente sem terem que aguardar a inves gação indicar um
suspeito com quem comparar o possível material biológico ali existente, aumentando,
assim, as chances de que o DNA do agressor seja adequadamente isolado e inserido no
banco, visto que o tempo e as condições de armazenamento possuem grande influência no
sucesso da análise do DNA.

Contudo, para que bons resultados sejam alcançados, é necessário que as autoridades de
segurança pública trabalhem no sen do de orientar e acolher as ví mas da forma mais
digna e respeitosa possível, ao mesmo tempo em que sejam fornecidos meios para que o
atendimento médico e policial ocorra tão logo o abuso aconteça de forma que a ví ma seja
devidamente orientada quanto aos procedimentos necessários visando à preservação do
material gené co.

39
Nesse sen do, a par r de 2013 houve uma série de incrementos legisla vos que deram
maior visibilidade ao tema do enfrentamento à violência sexual como uma prioridade do
Estado brasileiro.

O Decreto nº 7.958 [4], de 13 de março de 2013, estabelece diretrizes para o atendimento


humanizado às ví mas de violência sexual pelos profissionais da área de segurança pública
e da rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS), orientando uma ação que
altere a atenção integral para pessoas em situação de violência sexual, com a
implementação do registro de informações e coleta de ves gios no SUS.

Já a Lei nº 12.845 [5], de 01 de agosto de 2013, é resultado da atuação conjunta da


sociedade civil, poder legisla vo e execu vo no sen do de uniformizar o trabalho
desenvolvido na área de saúde pública. A mesma dispõe sobre o atendimento obrigatório,
integral, mul disciplinar e imediato de pessoas em situação de violência em todos os
hospitais integrantes da rede SUS.

No ano seguinte, a Portaria do Ministério da Saúde nº 485 [6], de 1º de abril de 2014,


redefiniu o funcionamento do Serviço de Atenção às Pessoas em Situação de Violência
Sexual no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Em seu Art. 4o, há a previsão de criação,
contudo sem obrigatoriedade, de um “Serviço de Referência para Interrupção de Gravidez
nos Casos Previstos em Lei”, o qual, pelo Art 6º, fica autorizado a realizar a coleta e guarda
de material gené co durante o primeiro atendimento.
40
E recentemente, foi publicada a Portaria nº 2.282 [7], de 27 agosto de 2020, que dispõe
sobre o Procedimento de Jus ficação e Autorização da Interrupção da Gravidez nos casos
previstos em lei, no âmbito do SUS. Em seu Art. 1o, fica agora explícita a determinação para
que os profissionais que atendam ví mas de estupro preservem possíveis evidências
materiais do crime a serem entregues imediatamente à autoridade policial, tais como
fragmentos de embrião ou feto com vistas à realização de confrontos gené cos que
poderão levar à iden ficação do respec vo autor do crime, nos termos da Lei Federal nº
12.654, de 2012.

Coleta e processamento de Ves gios sexuais

Ressalvando que todos os procedimentos previstos em lei sejam corretamente seguidos, as


mudanças acima descritas na legislação do estado brasileiro evitam a peregrinação e o
maior sofrimento da ví ma, e, no que condiz à perícia gené ca, potencializam as chances
de que os ves gios sejam prontamente coletados e preservados.

O correto armazenamento das amostras, roupas ou objetos que possam conter o DNA do
agressor é um ponto chave que precisa sempre ser lembrado. Tais itens precisam ser secos
antes de embalados, acautelados em embalagem de papel e não de plás co e resfriados o
quanto antes para aumentar a chance de manter a integridade do material gené co ali
existente.

40
As amostras ques onadas de violência sexual mais comumente periciadas englobam
suabes ou lâminas com material coletado da vagina, ânus ou unhas da ví ma, bem como
vestes e objetos com possível presença de sêmen e/ou outros fluidos biológicos
(preserva vos, estofados, papéis, etc.). Na maioria destas amostras ocorre uma mistura de
DNAs da ví ma e do agressor e, nesses casos, somente excluindo da mistura a contribuição
gené ca da ví ma, é possível se chegar no perfil único do estuprador a ser inserido no
Banco de Dados.

Dessa forma, outro fator crucial para obtenção de perfil gené co apto a ser inserido no
Banco de Dados é a necessidade de que nos exames periciais prévios ao gené co, sempre
seja coletada uma amostra de referência de DNA de fonte exclusiva da ví ma, como, por
exemplo, uma amostra de células da mucosa oral (ví mas vivas) ou uma amostra de
sangue/tecido muscular/tecido ósseo (ví mas mortas). Muitos perfis deixam de ser
inseridos no Banco de Dados por conter misturas que não atendem aos critérios do Manual
da RIBPG [8]. Contudo, com a divulgação crescente do BNPG, com o treinamento técnico de
peritos e profissionais de saúde e com mais informação sendo difundida, espera-se que
cada vez mais evidências sexuais sejam adequadamente coletadas, sendo passíveis, então,
de serem inseridas no BNPG com êxito.

Inserção dos Perfis Gené41 cos em Banco de Dados

A par r do processamento destes ves gios, o caminho da resolução de um crime sexual via
banco de dados pode ocorrer basicamente de duas formas dis ntas. A maneira mais direta
se dá pela obtenção de um match entre o perfil de um ves gio sexual sem indicação de
suspeito e o perfil de um criminoso já inserido no banco de dados por determinação da Lei
12.654/2012. Dessa forma, o banco fornece uma evidência gené ca para que esse
condenado passe a responder por mais um crime, dando solução a um estupro que
permaneceu anos sem solução e que dificilmente seria desvendado sem o auxílio da
tecnologia e da gené ca.

A segunda forma em que o banco de dados pode ajudar na iden ficação de um autor de
violência sexual ocorre indiretamente através da vinculação de ves gios sexuais coletados
em crimes diversos, cujas inves gações iniciais não levaram à conexão dos mesmos. Após
as amostras coletadas serem processadas, o banco é capaz de indicar a coincidência dos
perfis gené cos das evidências, apontando que elas pertencem a um mesmo agressor.
Embora a iden ficação do criminoso permaneça indeterminada nesses casos, esse po de
resultado pode ajudar as inves gações a chegarem à autoria comum, por exemplo,
revelando o modus operandi do criminoso ou delimitando o raio de atuação do mesmo.

41
O IPPGF no combate aos crimes sexuais

Obje vando o processamento destes ves gios de casos sexuais passados e ainda não
solucionados, o IPPGF trabalha atualmente em duas frentes conjuntas. O intuito comum é
analisar se essas amostras de backlog possuem material biológico viável a ser inserido no
banco de dados, considerando o tempo que estão armazenadas, e se poderão contribuir
para a resolução de crimes an gos através da inserção no Banco de dados Estadual.

A primeira frente de trabalho em que o IPPGF atua é através de um projeto financiado pela
FAPERJ en tulado “A tecnologia a serviço da Perícia: A Violência Sexual e o Banco Estadual
de Perfis Gené cos do Rio de Janeiro”. O Projeto é coordenado pela Perita Criminal e
Diretora do IPPGF Dra. Selma Sallenave Sales e conta também com o Perito Legista MSc.
Arthur de Mello Prates, Chefe do Serviço de Banco de Dados de Perfis Gené cos do IPPGF, e
com a Perita Legista Dra. Priscila Afonso Torres, Diretora do Laboratório Geral de DNA do
IPPGF.

A ideia do Projeto surgiu porque o IPPGF possui acauteladas evidências de crimes sexuais
sem indicação de suspeito para confronto, recebidas anteriormente à criação do Banco de
DNA, sendo em sua maior parte de casos ocorridos entre os anos de 2007 a 2012. A par r da
criação do Banco, a possibilidade de se cruzar os perfis viáveis ob dos de tais evidências
passou a ser concreta e a elaboração do Projeto, fomentado pela FAPERJ, viabilizou o início
42
deste processamento.

A segunda e mais recente frente de trabalho do IPPGF para o processamento deste backlog
de evidênciais sexuais é resultado de uma parceria entre o MJSP e a Secretaria Nacional de
Segurança Pública (SENASP). Tal ação propiciou a modernização dos laboratórios de
gené ca forense das unidades de perícia nacionais integrantes da RIBPG através da
aquisição de insumos e da doação de plataformas automa zadas. Em retorno a esse grande
inves mento, todos os ins tutos e órgãos agraciados pela parceria, incluindo o IPPGF,
pactuaram metas de processamento de ves gios sexuais an gos. Nesse sen do, o
Ministério da Jus ça espera concluir até 2022 o processamento do passivo es mado em
mais de 150 mil amostras biológicas de backlog de crimes sexuais, acauteladas nos
ins tutos oficiais de perícia no Brasil.

Neste trabalho de frentes conjuntas desenvolvido pelo IPPGF, até o momento foram
processadas mais de 200 evidências sexuais, a ngindo antecipadamente, em meados de
outubro, a meta proposta junto ao convênio MJSP/SENASP para o ano de 2020. Dos
ves gios já analisados, em 30% foi possível obter perfil gené co sa sfatório do suspeito
para inserção no Banco. Cabe exaltar essa alta porcentagem de inserção, visto que as
chances de obtenção de perfil gené co sa sfatório para alimentar o banco são reduzidas
dadas as caracterís cas desse po de amostra: exíguas, an gas, potencialmente
degradadas e contendo mistura de DNAs (da ví ma com o suspeito).

42
Atualmente, o banco do Estado do RJ conta com 2.193 perfis gené cos, incluindo os de
condenados, de desaparecidos e familiares de desaparecidos e de locais de crimes, os quais
englobam os ves gios sexuais. Seguindo o ritmo atual de processamento destas evidências
sexuais no IPPGF, o obje vo é que, até o final do ano de 2021, o número das análises dobre,
aumentando, assim, o total de perfis gené cos inseridos no Banco.

Como resultado inicial dos esforços realizados no IPPGF no combate aos crimes de violência
sexual, recentemente foi apontada pela perícia carioca, através do uso do CODIS, a primeira
indicação de autoria de um crime an go, até então não solucionado.

Tal coincidência aconteceu entre um ves gio sexual e um homem condenado: a evidência
foi coletada de uma ví ma de um estupro ocorrido em 2012 no estado de São Paulo - um
suabe vaginal processado pela perícia oficial do Estado de São Paulo no âmbito do Projeto
de Processamento de Backlog de Ves gios Sexuais, fomentado pelo MJSP/SENASP; já o
homem condenado, estava custodiado no sistema prisional do Estado do Rio de Janeiro e
teve seu material biológico coletado em 2019 pela equipe do IPPGF, sendo seu perfil
inserido no Banco de dados em atendimento à Lei 12.654/2012. Ao cruzar os perfis, o CODIS
acusou o match e, finalmente, o agressor, preso desde 2019 no RJ por outro delito, foi
também acusado do estupro que havia come do há anos no estado de SP e que
permanecia sem solução até então.

Em analogia ao caso reportado acima e levando


43 em conta a caracterís ca de reincidência
comum a muitos estupradores, o uso crescente dos bancos de dados gené cos tem
também potencial de apontar coincidências entre vários crimes sexuais pra cados pelo
mesmo autor, inclusive em diferentes estados, mas que ficaram sem solução devido a
limitações das inves gações em conectar os casos.

Como exemplo disso, neste ano também foi reportado o primeiro caso do uso do BNPG
para iden ficação de um criminoso sexual em série, atuante em território nacional. Esse
caso, analisado pelo Laboratório de Biologia e DNA Forense da Superintendência de Polícia
Técnico-Cien fica de Goiás, resultou na prisão de um dos maiores estupradores em série do
Brasil, suspeito de ter atacado 47 pessoas. O caso foi tão emblemá co que foi classificado
como uma das 17 inves gações criminais mais importantes do mundo em 2020, no
programa “DNA – Hit of the Year” [9], que reconhece o valor da tecnologia dos bancos de
dados de DNA na resolução e prevenção de crimes.

Conclusão

No Brasil atualmente coexistem alguns diferentes fluxos de atendimento às pessoas que


sofreram agressões sexuais, mas todos devem considerar prioritariamente a preservação
de informações e ves gios do crime, evitando a revi mização. Cabe ressaltar que enfrentar
a violência sexual exige, sobretudo, a criação de condições para que as pessoas possam

43
escolher e decidir, a par r de informações amplamente difundidas, sobre todos os seus
direitos e sobre os serviços especializados ofertados, bem como sintam-se mo vadas a
procurar atendimento e denunciar.

A assistência a essas ví mas deve ser uma ação conjunta e o seu enfrentamento depende
de inicia vas mul ssetoriais que permitam atendimento, proteção, prevenção a novas
ocorrências e medidas que possibilitem a responsabilização dos agressores.
Figurando como uma potente estratégia nessa árdua batalha no combate aos crimes
sexuais, o processamento massivo do backlog de ves gios sexuais visando à inserção de
perfis em Banco de Dados já vem mostrando resultados promissores. O fato do trabalho do
IPPGF e de outras perícias no combate aos crimes an gos de violência sexual, mesmo ainda
estando em níveis iniciais, ter sido capaz de revelar coincidências interestaduais, indica que
estamos todos no caminho certo.

Nesse sen do, conforme mais amostras forem sendo progressivamente inseridas no Banco
de DNA, a perícia espera contribuir ainda mais para fazer jus ça às ví mas de violência
sexual, por tanto tempo descrentes, e, assim, finalmente dar subsídios à punição judicial de
seus agressores.

Aliando gené ca e tecnologia, de braços dados com o Ministério da Jus ça e com Agências
de Fomento, o Ins tuto de Pesquisa e Perícia em Gené ca Forense chega em 2020
comemorando os seus 15 anos de existência com orgulho de sua trajetória e do trabalho
desenvolvido, sempre buscando unir a Perícia44de qualidade à Pesquisa Cien fica de ponta e,
assim, fazer jus ao nome que carrega.

Referências bibliográficas

1 Anuário Brasileiro de Segurança Pública, Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Ano 13, 2019. ISSN 1983-
7364.

2 Brasil, Decreto nº 7.950/2013, de 12 de março de 2013.


Disponível em:. h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/decreto/d7950.htm. Acesso em
12/10/2020

3 Lei Federal nº 12.654/2012, de 28 de maio de 2012.


Disponível em:. h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12654.htm. Acesso em
12/10/2020

4 Brasil, Decreto nº 7.958, de 13 de março de 2013.


Disponível em: h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/decreto/d7958.htm. Acesso em
20/10/2020

5 Brasil, Lei nº 12.845, de 1º de agosto de 2013.


Disponível em: h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12845.htm. Acesso em
20/10/2020

6 Ministério da Saúde, Portaria no 485 de 01/04/2014.


Disponível em: h p://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2014/prt0485_01_04_2014.html. Acesso em
20/10/2020

44
7 Portaria nº 2.282, de 27 agosto de 2020.
Disponível em: h ps://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-2.282-de-27-de-agosto-de-2020-274644814.
Acesso em 20/10/2020

8 Manual de Procedimentos Operacionais da RIBPG, versão 4.


Disponível em: h p://www.jus ca.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/ribpg/manual/resolucao_14-
2019_aprova_o_manual.pdf/view. Acesso em 20/10/2020

9 Master Case List - DNA Hit of the Year, Version 4/24/2020.


Disponível em:
h p://www.dnaresource.com/documents/2020%20Hit%20of%20the%20Year/Master%20Case%20List,%20
2020%20Hit%20of%20Year.pdf. Acesso em 21/10/2020.

45

Sobre a autora

Priscila Afonso Torres é Perita Legista Oficial desde 2013. Possui graduação em Ciências Biológicas - Modalidade
Gené ca - pela UFRJ (2008), Mestrado (2010) e Doutorado (2014) em Ciências Biológicas - Bio sica - pela UFRJ.

45
DNA DE CONTATO
EM LOCAIS DE CRIME:
POTENCIALIDADES E LIMITAÇÕES
Alexandre Giovanelli
Introdução

O estado do Rio de janeiro apresenta elevada taxa de homicídio com tendência ao


crescimento nos úl mos anos [1], tendo a ngido o índice de 40 homicídios por 100 mil
habitantes no ano de 2017 [2]. Embora as causas sejam complexas e envolvam diversos
fatores [3], a melhoria da capacidade inves ga va dos órgãos de segurança pública é
considerada como fator posi vo para o combate a violência [4]. Dentre estes fatores
destaca-se o uso de tecnologias para a análise e processamento de evidências criminais,
cuja prerroga va legal é dos órgãos do estado conhecidos como polícia cien fica.

Nos úl mos anos o uso de técnicas associadas ao material gené co encontrado em cena de
crime tem apresentado grande avanço. Em 1997 foi reportado pela primeira vez que perfis
gené cos completos poderiam ser ob dos a par r de objetos tocados por um suspeito [5].
A par r daí diversos pos de objetos foram inves
46
gados quanto à possibilidade de coleta de
DNA, incluindo documentos, ferramentas, roupas, luvas, óculos, relógios, veículos, portas
[6-7]. Essa área de desenvolvimento vem sendo denominada de DNA de toque, DNA de
contato ou DNA ves gial.

No Rio de Janeiro todos os exames de DNA, para fins criminais, são realizados
exclusivamente pelo Ins tuto de Pesquisa e Perícias em Gené ca Forense (IPPGF), uma das
unidades do Departamento Geral de Polícia Técnico Cien fica da Polícia Civil. O IPPGF
possui diversas atribuições como a iden ficação de pessoas (corpos não iden ficados pela
da loscopia), a coleta de padrões gené cos de condenados de acordo com o estabelecido
na lei nº 12.654/2012 [8] e a inserção de perfis no Banco de Perfis Gené cos (so ware
CODIS), tanto para fins de iden ficação quanto para inves gação criminal. Neste úl mo
caso, o CODIS tem grande relevância, pois muitos dos ves gios encontrados em cena de
crime podem ser inseridos no banco de dados permi ndo estabelecer a conexão de
diferentes crimes com um único perpetrador. Potencialmente, este resultado pode levar a
uma melhoria das taxas de elucidação de homicídios, as quais são consideradas muito
baixas no Brasil e no Rio de Janeiro [9].

Ainda assim, o quan ta vo de perfis gené cos inseridos no CODIS, a par r de ves gios
coletados em local de crime, é reduzido. Tal fato está associado à escassez de pessoal aliada

46
às dificuldades inerentes ao processamento deste po de amostra, principalmente aquelas
relacionadas ao DNA de contato, que representa uma parcela elevada dos ves gios. Nos
úl mos anos, inclusive, a demanda por este po de exame vem aumentando, em grande
parte devido à reinauguração da Divisão de Homicídios da Capital em janeiro de 2010 e das
Divisões de Homicídio de Niterói e São Gonçalo e da Baixada Fluminense em fevereiro de
2014 [10]. A nova reestruturação destas Divisões com consequente alteração da estrutura
inves ga va e especialização das a vidades, incluindo a de peritos criminais, legistas e
papiloscopistas, levou à o mização dos trabalhos e um foco maior na coleta de evidências
[11]. Da mesma forma, a recente capacitação de peritos e agentes de inves gação,
realizada pelo Centro de Estudos do DGPTC, com colaboração do IPPGF, levou a um
incremento da coleta de ves gios visando o exame de DNA, em grande parte
encaminhados pelos peritos lotados nos postos de polícia técnica do interior do estado.
Ressalta-se que a tendência ao aumento da demanda de processamento de ves gios
relacionados ao DNA de contato, por parte de agências de inves gação criminal, é um
fenômeno mundial que vem aumentando progressivamente desde a década de 2000 [12].

Aplicações e potencialidades
O DNA de contato é recuperado a par r de célular epiteliais que são deixadas em uma
super cie quando uma pessoa toca determinado objeto. Isso é essencial em locais de
crime, onde o criminoso pode manipular diversos itens, deixando-os para trás. A tabela 1,
mostra alguns itens recebidos pelo IPPGF e a47
maior ou menor possibilidade de obtenção de
perfis gené cos completos ou parciais, com base em observações de três anos.

Tabela 1: Possibilidade de recuperação de DNA a par r de diferentes substratos.

47
É importante ressaltar que as taxas de recuperação de perfis gené cos a par r de DNA de
contato são, em geral, baixas, uma vez que estas amostras estão expostas às condições
ambientais que tendem a degradar o DNA, além de estarem relacionadas à pequena
quan dade de células depositadas. Nesse sen do, uma consideração importante é que,
quanto maior o esforço ou atrito da pele sobre determinada super cie, maior será a
liberação de células. Isso tem uma aplicação prá ca, pois irá direcionar a coleta de DNA para
determinadas regiões do objeto. Lembrando que no caso de DNA de contato, o uso de
substâncias químicas como luminol ou de luz forense tem pouca eficiência para a
visualização ou determinação da área de contato.

Assim, o perito deve sempre avaliar, com base em outros elementos do local, a possível
dinâmica do evento, fim de definir a região da coleta. Por exemplo, nos casos em que se
configure a agressão à uma ví ma, as regiões da roupa que se encontram esgarçadas seriam
as áreas ideais para a coleta de DNA de contato, visando obter um perfil gené co do
agressor. Há casos em que o criminoso, ao sair do local inopinadamente, abandona alguns
pertences como chinelo, boné e, em alguns casos, até peças de roupa. A coleta de DNA
nestes itens deve priorizar as áreas onde se espera um contato permanente e de maior
atrito com o corpo do suspeito. No caso de boné, as margens inferiores, principalmente na
área de encaixe da testa. No caso de camisa, as regiões preferidas seriam a gola e mesmo a
costura que fica junto à axila. A tabela 1 mostra os resultados de estudo realizado sobre
alguns itens de uso comum e as respec vas áreas e formas de coleta de DNA de contato [13].
48

Tabela 2 - Estratégias de amostragem recomendadas para obtenção de DNA ves gial.

48
Em armas de fogo, os estudos têm demonstrado uma maior eficiência da coleta quando
efetuada sobre as placas da empunhadura, no caso de revólver e pistola e da área frisada do
ferrolho de pistola. Em espingardas, a coronha (em especial o trecho lateral com frisos) e a
telha (modelos pump ac on) foram as áreas com maior chance de recuperação de DNA. Em
geral, todas as regiões em que há maior atrito e ao mesmo tempo frisos, favorecem o
acúmulo de restos celulares nas respec vas reentrâncias [14]. Para cartuchos de munição
deflagrados, as taxas de recuperação de DNA são muito baixas, principalmente para
munições de revólveres, pistolas e fuzis. Alguns estudos, demonstram uma eficiência maior
na obtenção de perfil gené co, pelo menos parcial, em cartuchos de espingarda calibre 12
(cartucho plás co) [15].

No caso de cigarros deixados em local de crime basta, por exemplo, a coleta do trecho que
contém o filtro. O contato da boca com o cigarro promove não só a liberação de células, mas
a fixação das mesmas no papel do cigarro devido a ação da saliva. Em geral, qualquer
super cie onde há contato de saliva, há maior sucesso na recuperação de células e
obtenção de perfil gené co.

Outro desafio importante na coleta de ves gios é o frequente antagonismo entre coleta de
DNA de contato e a coleta de impressão papiloscópica. Se a escolha inicial for pelo DNA de
contato, a mesma irá inviabilizar a coleta de impressões digitais. Se a escolha inicial for a
coleta de impressão digital, em geral, há um comprome mento na taxa de recuperação de
material biológico, pois as técnicas de levantamento
49 papiloscópico não levam em conta as
especificidades exigidas para o processamento de amostras de DNA. Vários autores vêm
sugerindo técnicas para recuperação de perfis gené cos depositados em levantadores
contendo impressões digitais latentes [16-19], incluindo o uso da PCR¹ direta [20].

Estudo realizado por Sessa et al. (2019) testando o contato de um agente externo em peças
de roupa usadas, demonstrou que mesmo o toque de 2 segundos foi suficiente para
produzir um perfil gené co completo deste agente externo. Entretanto, nesses casos em
que espera-se uma grande quan dade de DNA autóctone (da ví ma por exemplo), o ideal é
que a coleta de DNA de contato seja a mais restrita possível e direcionada para a área de
contato do agressor. Caso contrário, corre-se o risco de amplificar apenas ou
predominantemente o perfil gené co da ví ma [21]. Esse é o caso, inclusive, do DNA
recuperado a par r de marcas de mordida do agressor no corpo da ví ma [22].

Em suma, quaisquer pos de substratos podem abrigar quan dade de células suficiente
para amplificação e determinação de um perfil gené co de suspeito ou ví ma. Embora,
frequentemente, o DNA de contato seja u lizado para confirmar a presença de um agressor
na cena de crime, há outras possibilidades, como a de determinar se uma ví ma esteve
naquele local. Nesse úl mo caso, poderiam ser as roupas da ví ma arrecadadas na cena de
crime e cujo corpo não foi encontrado, ou a possibilidade de contato da ví ma com uma
super cie específica, por exemplo, o porta-malas de um veículo quando se suspeita de um

1 Polymerase Chain Reaction: ou reação em cadeia de polimerase é uma técnica de biologia molecular visando
a amplificação de várias cópias de regiões específicas do DNA.

49
sequestro. O DNA de contato, pode, ainda, ser u lizado para esclarecer a dinâmica
criminal. Williamson (2011) [23] cita o caso de uma mulher que foi estuprada e
estrangulada até a morte. Ela fora amarrada com vários pos de material, inclusive com
ras de couro. Foi encontrado esperma em sua camisola, cujo perfil combinava com um dos
supeitos. No entanto, essa evidência não era suficiente para a condenação uma vez que a
ví ma e o agressor se conheciam e ele alegava que havia anteriormente do relações
consensuais com a mulher. No entanto, a análise das ras de couro que serviram para atar a
mulher revelaram o perfil do suspeito, indicando que o encontro não fora consensual.

Importante notar, também, que diferentes pos de suporte influenciam na quan dade de
DNA recuperado. Estudo efetuado por Resende et al. (2016) [24] demonstrou que o contato
com super cies de madeira, seguida por vidro produzem maiores quan dades de DNA
quando comparadas com super cies de plás co, papel e alumínio. Outro fator que
influencia é a “qualidade” do doador. Existem pessoas que são excelentes doadoras,
enquanto outras deixam pouco material ao entrar em contato com um objeto [25]. Essas
diferenças são individuais, mas também estão relacionadas ao sexo e a idade do doador.
Crianças muito jovens, em geral, são excelentes doadoras de células, enquanto idosos,
principalmente acima de 60 anos, tendem a deixar menos células no ambiente ou células
qualita vamente inferiores, dificultando a recuperação de DNA [26].

Limitações50e cuidados

As técnicas atuais de amplificação de DNA são muito eficientes e sensíveis. Quan dades
extremamente pequenas de material biológico encontrados em cenas de crime são
suficientes para produzir um perfil gené co completo. Isso aumenta o risco de detecção de
DNA não relacionado diretamente ao evento, seja pela contaminação promovida pelos
próprios agentes policiais e peritos, seja por contatos prévios fortuitos de pessoas que
es veram no local antes do crime ou que veram o DNA secundariamente transferido por
meio de suportes diversos[27]. No caso, de contaminação pela equipe de inves gação é
essencial o cuidado no uso correto de EPIs, principalmente luvas, que devem ser trocadas
não só entre os exames de diferentes cenas de crime, mas também em uma mesma cena de
crime, a fim de evitar a transferência secundária de DNA que pode ter implicações
importantes no vislumbre da dinâmica criminal. Um estudo teórico demonstrou que o DNA
presente em um suporte como maçaneta, pode ser transferido para a luva do perito e desta
para outro objeto (transferência terciária). Ou seja, o próprio perito pode carrear DNA para
lugares distantes, contaminando toda a cena de crime [28].

Por isso mesmo, é importante que os perfis gené cos daqueles que examinam a cena de
crime estejam devidamente iden ficados, a fim de excluir um perfil que seja encontrado no
local de crime e que não esteja associado com o suspeito ou ví ma. Oorschot et al. (2010)
[29] recomendam que, no mínimo, sejam estabelecidos os seguintes procedimentos
operacionais padronizados para limitar a contaminação da cena de crime:

50
1. Restringir o acesso ao local a ser examinado ou que potencialmente pode incluir ves gios
de relevância para a inves gação;

2. Uso de luvas e máscaras por todos aqueles que precisam tocar ou observar de perto a
cena de crime;

3. Troca regular das luvas por todos aqueles que manipulam objetos no crime;

4. Evitar, tanto quanto possível, tocar áreas em que poderá ser feita a coleta de DNA;

5. Ter disponível o perfil de DNA de toda a equipe que entrou em contato com o local de
crime.

Especial atenção deve ser dada à questão da coleta de impressões digitais. Conforme dito
anteriormente, além de ser necessária a decisão sobre a prioridade de coleta de DNA de
contato ou de impressão digital, deve-se atentar para o fato de que muitas vezes o pincel
u lizado para revelar impressões latentes pode carrear DNA de um suporte para outro,
servindo de instrumento importante de contaminação [30].

Um caso bastante simbólico ocorreu em 2012, em San Jose - Califórnia (EUA) e que ilustra
muito bem os potenciais e as limitações do DNA de contato. Lukis Anderson era um
51 longa ficha criminal, embora sem casos de
morador de rua de 26 anos, alcóolatra, com uma
assassinato ou de outros crimes violentos. Por volta da meia noite de 29 de novembro do
mesmo ano, alguns homens invadiram a casa do milionário Raveesh Kumra, um inves dor
de 66 anos que vivia em Monte Sereno, um enclave do Vale do Silício, distante cerca de
16km do local onde vivia Lukis Anderson. Os assaltantes renderam e amarraram Kumra e
sua mulher. Roubaram vários pertences da casa e foram embora. A mulher conseguiu
chegar até o telefone e pedir socorro. No entanto, quando os policiais chegaram, Kumra
havia falecido por asfixia devido à mordaça em sua boca. Os inves gadores forenses
coletaram várias evidências. Em algumas delas foram recuperados perfis de DNA: na
mordaça, nas luvas usadas pelos agressores e nas unhas da ví ma. O perfil gené co
encontrado nas unhas coincidia com o de Lukis. Em pouco tempo Lukis foi encontrado,
preso e acusado de assassinato junto com os outros dois criminosos que pertenciam a uma
gangue. Entretanto os advogados de Lukis descobriram um fato surpreendente. Na noite do
crime, quase que no mesmo horário, o acusado havia sido internado em um hospital
pra camente em coma alcoólico. Inves gações posteriores mostraram que os paramédicos
da cidade atenderam primeiro a Lukis e, em seguida, a mesma equipe foi designada para
atender ao milionário morto. De alguma maneira houve a transferência de DNA pela ação
dos paramédicos. Após essa constatação, Lukis Anderson foi inocentado.

51
Conclusão
A u lização de técnicas e instrumentos de extração, amplificação e análise de DNA, cada
vez mais sensíveis, permite a detecção de quan dades mínimas de material gené co
presentes na cena de crime. Isso representa uma enorme ferramenta para a inves gação
criminal. No entanto, alguns cuidados precisam ser tomados tanto pela equipe de cien stas
forenses quanto de policiais, a fim de diminuir os riscos de contaminação nos locais
inves gados. Além disso, a relação direta e imediata estabelecida entre o encontro de um
perfil gené co e a presença da pessoa na cena de crime, deve ser avaliada de forma
criteriosa e em conjunto com outros elementos da inves gação e sempre levando-se em
conta a hipótese de possível transferência secundária de DNA.

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.
Sobre o autor

Alexandre Giovanelli é Perito Criminal da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro desde 2001. Possuiu graduação
em biologia (1996) e mestrado (2000) em ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, doutorado em
Ciências pela Fundação Oswaldo Cruz (2005) e Pós-doutorado em direitos humanos pela Universidade Católica
de Petrópolis. Lotado no Ins tuto de Pesquisa e Perícias em Gené ca Forense, Rio de Janeiro (RJ), Brasil

53
IMPACTO DA LEI 13.964/2019 NA
ANÁLISE DE AMOSTRAS DE DNA
DE TOQUE PRESENTES
EM CENAS DE CRIMES
Ta ana Lúcia Santos Nogueira

O novo ordenamento jurídico que alterou as leis penais e processuais, conhecida como a
Lei do Pacote An crime (Lei 13.964/2019), sancionada e publicada em 24 de dezembro de
2019, vem impulsionando os órgãos de perícia oficial, de modo geral, no sen do da
adequação de sua infraestrutura para o melhor tratamento do ves gio oriundo da cena de
crime, desde o momento da sua coleta até o seu descarte. Desta forma, especificamente
com relação ao que trata o capítulo II da referida Lei, “do exame de corpo de delito, da
cadeia de custódia e das perícias em geral”, o obje vo aqui é trazer à discussão questões
técnicas a nentes a coleta, acondicionamento, armazenamento e transporte de ves gios
biológicos presentes em cenas de crimes e o reflexo desses procedimentos na análise do
DNA, com vistas a um resultado sa sfatório e ú l à persecução penal.

DNA de toque, ou DNA de contato (entre54diversas outras denominações), são termos


comumente empregados para fazer referência a amostras biológicas coletadas em locais de
crimes, que são provenientes do toque, da interação da pele humana com as super cies em
geral. A simples manipulação ou toque em objetos, bem como todo e qualquer po de
contato, incluindo o uso de pertences pessoais como roupas, calçados, óculos, escova de
dentes, etc., gera a transferência de células da pele humana para os materiais tocados,
manipulados, e, consequentemente, há a presença de material gené co nessas células,
possível de ser analisado pela Gené ca Forense com o fulcro de gerar perfil gené co que
leve a determinação da autoria do delito e/ou que atenda as condições exigidas para sua
inserção no CODIS.

O que é DNA de Toque?


A transferência de células e, consequentemente, de DNA, da super cie da epiderme para a
super cie de materiais diversos ocorre de forma natural como resultado do toque. Há
várias teorias formuladas na tenta va de explicar que po celular está presente em
amostras provenientes de materiais que foram previamente tocados.

Muito se tem pesquisado sobre DNA de toque desde a primeira vez em que essa temá ca
foi descrita na literatura em 1997 por Oorschot e Jones [2]. As abordagens estudadas até os

54
tempos atuais incluem: - o po de super cie tocada, podendo ser classificadas como
porosas e não porosas; - técnicas de coleta empregadas na re rada do ves gio da super cie
em que foi depositado (com o auxílio de swabs, fita adesiva, raspagem, entre outras
técnicas); - tempo de contato suficiente para transferir material celular do indivíduo e gerar
um perfil gené co sa sfatório; - capacidade de um indivíduo em doar mais ou menos
material celular para super cies, sendo então, classificados como bons ou maus doadores; -
técnicas laboratoriais de extração de DNA adequadas para tais amostras; - transferência
secundária, terciária e transferências subsequentes que possam ainda conter material
gené co capaz de ser analisado; - limites de detecção e análise dos dados gerados no
laboratório de DNA, especialmente quando mais de um indivíduo é contribuinte para o
perfil gené co ob do, entre outras linhas de estudo [3, 4, 5].

Apesar da amplitude de possibilidades já estudadas, ainda restam pontos a serem


explorados a fim de que os resultados gerados se tornem ainda mais confiáveis.

Técnicas de Coleta das amostras


A coleta do material biológico cons tui uma etapa crucial para o sucesso da análise do DNA.
Especialmente, quando se trata de amostras latentes, consequentes do toque, as quais
possuem baixa quan dade de DNA disponível. Algumas questões cabem ser ressaltadas
aqui, por terem influência direta no processamento
55 da amostra no laboratório. São elas:

Observação do ves gio:

Conforme adequadamente descrito no ar go 158-B, item I, da Lei 13.964/2019, o


reconhecimento – “ato de dis nguir um elemento como de potencial interesse para a
produção da prova pericial”, reflete o olhar técnico do perito criminal no local do crime ao
constatar a presença de materiais na cena, que possam conter ves gios de toque, sendo o
primeiro passo para uma análise gené ca bem sucedida. A par r da observação inicial,
duas linhas de ação podem ser tomadas: coleta do ves gio no próprio local e envio ao
laboratório somente da alíquota a ser analisada; ou, encaminhamento do objeto/material
inteiro para o laboratório. Tais procedimentos devem ser alinhados com a equipe técnica do
laboratório de DNA, para uma melhor absorção e adequação da demanda no fluxo de
trabalho das análises gené cas.

Uso dos Equipamentos de Proteção Individual – EPIs:

Por serem ves gios latentes e com quan dades muito reduzidas de material gené co, a
possibilidade de contaminação da amostra com DNA exógeno, ou seja, DNA diferente
daquele que originalmente está presente no ves gio, é alta. Tal contaminação pode ocorrer
por descuido ou inobservância das recomendações a respeito do uso de equipamentos de

55
proteção individual, em especial luvas, máscara e touca. Sabe-se que as condições ideais de
uso dos EPIs em local incluem, além dos itens mencionados, o macacão de manga longa e o
propé (caso o macacão não o possua). Porém, em determinadas regiões do país, o clima
quente pode oferecer certo desconforto para o perito em local, que muitas vezes passa
longos períodos coletando ves gios, dependendo do caso. Desta forma, a preferência por
EPIs cons tuídos de materiais respiráveis, como o TNT (Tecido Não Tecido) com baixa
gramatura, traria menos incômodo ao profissional, em comparação com materiais à base
de polie leno de alta densidade, como os confeccionados em Tyvek (DuPontTM), muito
referenciado para u lização em perícia.

É importante destacar que a principal função dos EPIs no contexto da perícia de local para a
coleta de ves gios biológicos (principalmente quando existe a análise do DNA como
obje vo), é a proteção do ves gio em si contra a deposição acidental de células do
profissional.

Outra observação importante acerca do uso de EPIs é a necessidade impera va da troca


das luvas a cada vez que um ves gio diferente for coletado, na mesma cena de crime.
Evidências diferentes podem ter fontes biológicas diferentes e ambas podem ter relação
com a dinâmica criminosa. A troca das luvas evita a transferência de ves gios latentes de
um objeto para outro, reduzindo também a possibilidade de gerar sobreposição indesejada
56
de DNA que resultará em mistura de perfis gené cos não originalmente produzidos
relacionados ao fato delituoso.

Método de coleta do ves gio de DNA de toque:

Swabs cons tuem o disposi vo mais amplamente u lizado para a coleta de ves gios.
Porém, há variadas técnicas aplicáveis a amostras de DNA de toque, incluindo o
levantamento do ves gio com fita adesiva, u lização de disposi vos a vácuo para a recolha
dos ves gios, raspagem com papel de filtro FTA, recorte da área de interesse onde
provavelmente se encontra o ves gio latente (como por exemplo, no caso de peças de
roupas) [6, 7]. Dentre todas as metodologias, a técnica do duplo swab tem sido a mais
empregada [8], a qual consiste na aplicação do primeiro swab umedecido, seguido de outro
swab seco. O veículo u lizado para umedecer o swab também já foi alvo de discussões
cien ficas. Entretanto, várias possibilidades são tecnicamente aceitas por não interferirem
na integridade da amostra ou no rendimento do material a ser extraído posteriormente.
Configuram, principalmente, como soluções alterna vas para a coleta com swab úmido a
água des lada estéril, o Triton X-100 e o duodecil sulfato de sódio a 2% (SDS) [9].

Em 2015, um estudo realizado no âmbito da perícia criminal militar, analisou amostras


simuladas, sob condições controladas, de impressões digitais depositadas em lâminas de

56
vidro e em super cie de alumínio, sem o emprego de pós reveladores. O obje vo do estudo
foi avaliar a eficiência do cloreto de sódio a 0,9% como solução de coleta em comparação
com o SDS a 2%. Em todas as amostras testadas com soro fisiológico, foram ob dos perfis
gené cos completos, não sendo evidenciadas diferenças significa vas em relação àquelas
que foram coletadas com SDS a 2% [10]. Desde então, o cloreto de sódio 0,9% foi
padronizado, validado e vem sendo u lizado como veículo na técnica do duplo swab em
amostra de DNA de toque nas perícias militares.

O po de swab se configura também como foco de estudos por diferentes autores [11, 12,
13]. Swabs confeccionados em algodão podem reter fortemente o material celular no seu
interior, por possuírem um núcleo denso, o que pode resultar em menor quan dade de
DNA extraído. Adamowicz e colaboradores (2014) [12] demonstraram que adaptações na
etapa da extração do DNA, com ressuspensão do swab em tampão, pode aumentar o
rendimento de material gené co extraído de swabs de algodão tradicional. Outra opção de
swab desenvolvido com fibra de nylon, conhecido também com a designação de swab
“flocado”, tem sido u lizado com bons resultados na análise de DNA de toque. Como são
confeccionados com fios de nylon curtos paralelos, agrupados em uma haste de plás co e
sem um núcleo interno, o material celular não é re do no interior, sendo facilmente
desprendido do swab [13].
57
Apesar das variadas alterna vas de suportes comercialmente disponíveis, os swabs de
algodão tradicional têm retornado resultados sa sfatórios no processamento de amostras
de DNA de toque, desde que as variáveis normalmente presentes neste contexto sejam
acompanhadas.

Acondicionamento, Conservação e Transporte – do local ao laboratório de DNA


O ar go 158-D, em seu parágrafo 1°, concentra-se em uma etapa de extrema importância
nesse processo, que é o acondicionamento do ves gio. Neste sen do, podemos tratar o
termo “recipiente” de acondicionamento, conforme referenciado na Lei, como
“embalagem primária”, aquela que terá o primeiro contato com o material biológico
coletado no local do crime. Há também diferentes opções para o acondicionamento, como
colocar o ves gio recém coletado diretamente em sua embalagem original, (embalagem de
papel ou plás co fornecida pelo fabricante do produto), ou em embalagens de papelão
apropriadas para acomodar os swabs, as quais podem ser adquiridas ou confeccionadas
pelo próprio serviço de perícia [14].

Na maioria das vezes em que ves gios biológicos são coletados no local do fato, conforme
mencionado acima, necessitam de uma embalagem primária de acondicionamento, antes
de serem armazenados e lacrados em sacos de evidência, os quais podem ser considerados

57
como embalagem secundária ou defini va de acondicionamento. Sacos de evidência de
plás co ou de papel devem ser u lizados para acondicionamento conforme a condição do
ves gio. Amostras úmidas não devem ser man das por muito tempo em embalagens de
plás co, devido a possibilidade de proliferação de micro-organismos que podem resultar
na degradação da molécula do DNA. Em tais situações, recomenda-se acondicionar em
sacos de papel, que são respiráveis, não favorecendo a condensação de líquido no seu
interior pela presença da umidade, ou o acondicionamento temporário em embalagens
plás cas.

Cabe ressaltar que as amostras coletadas com swab úmido devem secar completamente
antes de permanecerem acondicionadas em defini vo, até que sejam encaminhadas para o
laboratório de DNA para análise. O parágrafo 3°, do ar go 158-D, retrata que o lacre da
embalagem onde o ves gio está acondicionado apenas poderá ser rompido pelo perito que
vai proceder a análise ou por pessoa autorizada. Nesse caso, procedimentos técnicos
poderão ser padronizados com o intuito de viabilizar soluções para os casos em que o
ves gio úmido coletado ultrapasse o período aceitável de acondicionamento em
embalagem fechada, a fim de que a amostra não sofra degradação e sua análise se torne
inviável.

Peculiaridades da análise do DNA


58
Certamente, o processamento de amostras de DNA de toque só é uma realidade devido à
alta sensibilidade das técnicas empregadas na Gené ca Forense. Contudo, o que em
primeira análise pode ser visto como vantagem, também pode apresentar desvantagens,
dependendo do caso.

Amostras dessa natureza são bastante desafiadoras. O perito no laboratório deverá seguir
a mesma linha de ação realizada no local de crime, quanto a observação do ves gio, a fim de
selecionar a melhor região para a coleta (quando esse não é coletado na cena e o
objeto/material é enviado por inteiro para o laboratório). Da mesma forma, quando a
amostra é coletada no local do crime, ter informações detalhadas sobre a técnica u lizada,
tempo decorrido desde a coleta do ves gio, podem nortear a escolha da metodologia de
extração de DNA mais adequada, por exemplo.

Cada vez mais, tem-se buscado por estratégias metodológicas que proporcionem maior
rendimento de DNA na etapa da extração, com alto grau de pureza, bem como o emprego
de kits de amplificação de marcadores de STR mais sensíveis, que possam detectar
quan dades mínimas de DNA extraído e que sejam menos susce veis à ação de agentes
inibidores da PCR. Isso é possível devido a u lização de DNA polimerases termoestáveis
mais resistentes e tampões contendo adi vos mais eficientes, conferindo assim, maior
robustez a reação de amplificação [15].

58
Dentre os diferentes métodos de extração de DNA disponíveis, os que empregam fase
sólida baseada em par culas magné cas ca ônicas e filtração com membranas de sílica são
os mais empregados atualmente em análises de amostras forenses, tanto em plataformas
automa zadas, quanto com o emprego de técnicas manuais. Contudo, alguns têm
apontado perda no rendimento de DNA extraído com a u lização de certas metodologias,
podendo variar conforme o po de suporte em que a amostra foi coletada [6, 7, 13]. Outros
trabalhos sugerem, inclusive, a PCR direta, onde se suprime a etapa da extração do DNA em
determinadas amostras, como forma de reduzir a perda de DNA nesta etapa. Contudo, a
possibilidade de maior interferência de inibidores da reação de amplificação deve ser
avaliada [16].

Considerações Finais
A análise de DNA de toque cons tui um tema que desperta grande interesse dos atores que
par cipam em quaisquer das fases da persecução penal, visto já ter sido extensivamente
evidenciado, tanto em literatura cien fica quanto na sua aplicação prá ca em diversos
países, as potencialidades do uso de ves gios provenientes do toque na elucidação de casos
criminais. Todavia, do ponto de vista técnico-cien fico, a integração entre a perícia de local
e a perícia de laboratório se mostra como extremamente benéfica para alcançar o obje vo
comum: a determinação da autoria. As responsabilidades técnicas de ambos os lados são
claras e importantes para o sucesso das análises
59 de DNA.

A maioria das questões pontuadas neste texto são aplicáveis a qualquer po de ves gio
biológico. Porém, quando estamos diante de amostras de DNA de toque, a nossa atenção se
torna ainda mais relevante. A adoção de medidas que visem o melhor aproveitamento do
ves gio, seja na escolha do procedimento de coleta, ou na metodologia de processamento
em laboratório, são decisões que devem ser tomadas levando em consideração o rol de
métodos disponíveis e a realidade de cada serviço pericial.

Conhecer as caracterís cas desse po de ves gio, que abrangem inúmeras fontes, é de
extrema importância no direcionamento das ações relacionadas a escolha dos métodos
mais eficientes para serem aplicadas tanto na coleta, quanto no ambiente do laboratório de
DNA. É recomendável que os serviços de perícia oficial promovam a reavaliação,
padronização e validações internas de suas metodologias voltadas a análise de ves gios de
toque desde os procedimentos de coleta.

O sucesso da análise do DNA de amostra de toque depende da combinação de vários


fatores aqui apresentados, inerentes ao indivíduo, às super cies, bem como aos métodos
empregados na coleta no local do fato, sua conservação e no processamento dos ves gios
no laboratório. Neste sen do, as determinações con das na Lei do Pacote An crime, no

59
que concerne especificamente o capítulo II, impactam diretamente no avanço tecnológico
da perícia brasileira, a par r do momento em que direciona ações importantes quanto ao
tratamento do ves gio.

Este ar go não se propôs a esgotar o tema. Afinal, em pouco mais de duas décadas, embora
muito tenha sido estudado, ainda restam lacunas a serem preenchidas para alcançar uma
maior compreensão deste po de ves gio biológico sempre presente e cada vez mais
demandado em inves gações criminais para análise de DNA.

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Sobre a autora

Ta ana Lúcia Santos Nogueira é perita em gené ca forense do Exército Brasileiro, graduada em farmácia-
bioquímica, mestrado em patologia pela UFF e doutorado em ciências com foco em gené ca forense pela UERJ.

60
15 anos de integração
IPPGF e IGP-RS
Cecília Helena Fricke Ma e, Gustavo Lucena Kortmann e
Trícia Cris ne Kommers Albuquerque

Entre 2002 e 2003, em municípios do interior da região norte do Rio Grande do Sul, 12
meninos com idades entre 8 e 13 anos foram mortos (alguns também violentados
sexualmente) por um serial killer que recebeu a alcunha de “o monstro de Passo Fundo”, em
função do município onde a maior parte das mortes aconteceu. Os meninos, todos de
origem humilde, eram atraídos por dinheiro em troca de um pequeno trabalho em algum
61 ou uma fazenda. No local, o agressor
lugar ermo, como um moinho desa vado
(posteriormente iden ficado como Adriano da Silva) u lizava de força e de técnicas de artes
marciais para nocautear as ví mas e as estrangulava por asfixia mecânica, com uma corda
de nylon. Para não deixar pistas, ele u lizava luvas e um lenço. Em 2006, ele afirmou à
jus ça que come a os crimes por “vício de matar”. Dentre os suspeitos, foram de dos seis
traficantes, um representante comercial e sete adolescentes. Em pelo menos duas das
ví mas, foram encontrados pelos pubianos sem bulbo na região perianal e na cueca dos
meninos. Na época dos crimes, a análise de DNA mitocondrial de pelos ainda não era
realizada em casos forenses no Brasil. Uma das peritas criminais da área de Gené ca
Forense do Ins tuto-Geral de Perícias do Rio Grande do Sul foi ao Uruguai para aprender a
técnica e u lizá-la para análise desses pelos pubianos. A comparação das sequências
apontou que o pelo pubiano encontrado na região perianal de uma das ví mas apresentava
DNA mitocondrial compa vel com o de Adriano da Silva. Esse foi o primeiro caso forense no
Brasil que u lizou a análise de DNA mitocondrial em pelos. Dos 12 homicídios, Adriano da
Silva foi condenado por 9 deles.

Em 2005 nascia o Ins tuto de Pesquisas e Perícias em Gené ca Forense do Departamento


Geral de Polícia Técnico-Cien fica (IPPGF/DGPTC). Um ano depois, a atual Diretora do
IPPGF, a Dra. Selma par cipava do curso avançado para capacitação na área de DNA
Mitocondrial no Ins tuto-Geral de Perícias do Rio Grande do Sul. Na época, as peritas

61
criminais Cecília Helena Fricke Ma e, Trícia Cris ne Kommers Albuquerque, Bianca
Almeida Carvalho e outros receberam a Dra. Selma e colegas oriundos de diversos estados
do Brasil pra aquele que foi o primeiro curso em DNA mitocondrial forense do país. Desde
então, o Ins tuto mais novo do DGPTC cresceu e é um dos destaques no cenário nacional na
iden ficação de pessoas desaparecidas, servindo de inspiração para muitos outros
laboratórios que almejam auxiliar mais famílias a encontrarem seus parentes por meio do
Banco de Perfis Gené cos de Pessoas Desaparecidas.

Dessa integração entre os laboratórios de Gené ca Forense de todo o Brasil, criaram-se as


condições necessárias para a implantação do so ware CODIS no Brasil em 2010 e da Rede
Integrada de Bancos de Perfis Gené cos (RIBPG), esta ins tuída pelo Decreto nº
7950/2013. A RIBPG foi criada com a finalidade principal de manter, compar lhar e
comparar perfis gené cos na apuração criminal e/ou na instrução processual. Trata-se de
uma ação conjunta entre Secretarias de Segurança Pública (ou ins tuições equivalentes),
Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP) e Polícia Federal (PF) para o
compar lhamento de perfis gené cos ob dos em laboratórios de gené ca forense.

No contexto de apuração criminal, perfis gené cos oriundos de ves gios de locais de
crimes são confrontados entre si, assim como com perfis gené cos de indivíduos
cadastrados criminalmente. Estes são incluídos em bancos de perfis gené cos
obrigatoriamente, nos casos de condenados 62
por crimes hediondos (art. 1º da Lei nº
8.072/1990) ou por crime doloso e violento contra a pessoa, ou ainda por meio de
determinação judicial, seja de o cio ou mediante solicitação da autoridade policial ou do
ministério público (art. 5º da Lei n° 12.037/2009).

Já no contexto de iden ficação de pessoas desaparecidas, perfis oriundos de restos mortais


não iden ficados, bem como de pessoas de iden dade desconhecida, são confrontados
com perfis de familiares ou de referência direta do desaparecido, tais como escova de dente
ou roupa ín ma. É garan do pela legislação vigente que a comparação de amostras e perfis
gené cos doados voluntariamente por parentes de pessoas desaparecidas seja u lizada
exclusivamente para a iden ficação da pessoa desaparecida, sendo vedado seu uso para
outras finalidades.

De acordo com o XII Relatório da Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos, por meio da
construção de árvores genealógicas, foi possível estabelecer vínculos gené cos entre
familiares e 54 pessoas desaparecidas, sendo o Rio Grande do Sul (n=28) e o Rio de Janeiro
(n=6), respec vamente, o primeiro e o terceiro estado que mais iden ficaram pessoas
desaparecidas com auxílio do Banco de Perfis Gené cos. Da mesma forma, de acordo com o
relatório, os dois estados são os que mais inseriram árvores genealógicas de familiares de
pessoas desaparecidas no BPG - 288 pelo Estado do Rio de Janeiro e 258 pelo Estado do Rio
Grande do Sul.

62
E nessa integração e troca de conhecimentos, onde os laboratórios se conectam, aprendem
tecnicamente um com o outro, se espelham na busca por excelência, quem ganha são as
sociedades carioca e gaúcha. Da triste realidade vivenciada pelos peritos criminais na
casuís ca forense, propiciar o fim da angús a a um familiar de pessoa desaparecida via
Banco de Perfis Gené cos é reconfortante. Vida longa ao IPPGF!

63

Referências bibliográficas

Site h ps://estado.rs.gov.br/laboratorio-do-igp-realiza-curso-na-area-de-dna-mitocondrial - Acessado em


28/10/2020.

Dias Filho, Claudemir e cols. Introdução à Gené ca Forense. Editora Millenium. Campinas – SP. 2020.

XII Relatório da Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos – Site h ps://www.jus ca.gov.br/sua-
seguranca/seguranca-publica/ribpg/relatorio/xii-relatorio-da-rede-integrada-de-bancos-de-perfis-
gene cos.pdf/@@download/file - Acessado em 28-10-20.

Sobre os autores

Cecília Helena Fricke Ma e é farmacêu ca, Perita Criminal Administradora do Banco de Perfis Gené cos do
Estado do Rio Grande do Sul, lotada na Divisão de Gené ca Forense do Ins tuto-Geral de Perícias do Rio Grande
do Sul, Especialista em Gené ca Forense e Biologia Molecular pela PUCRS.

Gustavo Lucena Kortmann é biólogo, Perito Criminal Chefe da Divisão de Gené ca Forense do Ins tuto-Geral de
Perícias do Rio Grande do Sul, Mestre em Gené ca e Biologia Molecular pela UFRGS.

Trícia Cris ne Kommers Albuquerque é bióloga, Perita Criminal do Estado do Rio Grande do Sul lotada na Divisão
de Gené ca Forense do Ins tuto-Geral de Perícias do Rio Grande do Sul, Doutora em Bioquímica pela UFRGS.

63
REDE INTEGRADA DE BANCOS
DE PERFIS GENÉTICOS:
BASES SÓLIDAS E FUTURO
PROMISSOR NA PROMOÇÃO
DA JUSTIÇA NO BRASIL
Ronaldo Carneiro da Silva Junior

RIBPG – UMA HISTÓRIA ESCRITA A MUITAS MÃOS

A implementação dos bancos de perfis gené cos no Brasil tem uma


longa história. Tudo começou no início dos anos 2000, quando o uso da
gené ca na solução de casos criminais começou a ser aplicada no país,
ganhando a atenção da sociedade. Nessa época ainda exis am poucos
laboratórios de gené ca forense no Brasil. Devido ao fato do exame de
DNA ser um exame compara vo e de não exis r na época os bancos de
perfis gené cos, estes laboratórios analisavam apenas casos fechados.
Os laboratórios também não intercambiavam
64
perfis gené cos entre si,
o que impedia o esclarecimento de crimes interestaduais e se
configurava em uma atuação bem limitada dessa tecnologia para um
país tão grande quanto o Brasil.

Em 2007 foi realizada, em Brasília/DF, a Reunião da Rede Nacional de


Gené ca Forense, grupo este que seria o precursor do que chamamos
hoje de Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos (RIBPG). Em 2009
esse grupo aceitou a oferta do Federal Bureau of Inves ga on – FBI
para uso da tecnologia de banco de dados CODIS (Combined DNA Index
System). Por meio de um “Le er of Agreement” entre o FBI e a Polícia
Federal foi firmado o acordo que possibilitou o uso do CODIS pela
RIBPG. A instalação e o treinamento foram realizados em 2010.

Por falta de legislação específica, neste primeiro momento os bancos


de dados foram u lizados apenas para a inserção de ves gios. O
ingresso de perfis de referência de suspeitos e de condenados só foi
possível com a promulgação da Lei 12.654/2012. A Rede Integrada de
Bancos Perfis Gené cos e o Banco Nacional de Perfis Gené cos foram
formalmente criados em 2013, com a publicação do Decreto 7.950.

64
LABORATÓRIOS INTEGRADOS E CUMPRIMENTO À LEGISLAÇÃO

A criação do Banco Nacional de Perfis Gené cos (BNPG) e da Rede Integrada de Bancos de
Perfis Gené cos (RIBPG) permi u o intercâmbio de perfis gené cos de interesse da Jus ça,
ob dos em laboratórios de perícia oficial, possibilitando a vinculação de indivíduos a locais
de crime ou diferentes locais de crime entre si.

Neste contexto, os perfis gené cos gerados pelos laboratórios de gené ca forense
integrados à RIBPG são enviados ro neiramente ao Banco Nacional de Perfis Gené cos. Em
tal banco de dados são feitos os confrontos de forma nacional com perfis gerados pelos 22
laboratórios de gené ca forense que compõem a RIBPG, bem como perfis encaminhados
de outros países por meio da Interpol. Regularmente, os perfis gené cos armazenados nos
bancos de dados são confrontados em busca de coincidências, os chamados “matches”.

RR
AP

AM MA
PA CE RN
PB
PI PE
AC
AL
RO TO SE
MT BA
65
DF
GO
MG
ES
MS
SP RJ
PR

SC
RS

Figura 1. Estados que compar lham perfis gené cos por meio da RIBPG (verde) e estados que estão
em processo de integração com a RIBPG (amarelo)

Além dos perfis ob dos a par r dos ves gios encontrados em locais de crime ou sob o
corpo de ví mas, também é possível a inserção no BNPG de perfis gené cos de indivíduos
cadastrados criminalmente. Estes úl mos são incluídos em duas situações:

1. Obrigatoriamente, nos casos de condenados por crime doloso e violento contra a pessoa
ou por crimes hediondos (art. 1º da Lei nº 8.072/1990) ou
2. Por meio de autorização judicial, seja de o cio ou mediante solicitação da autoridade
policial ou do Ministério Público (art. 5º da Lei 12.037/2009).

65
Outra finalidade da RIBPG é a iden ficação de pessoas desaparecidas. Para isso, há a
alimentação sistemá ca do BNPG com quatro pos diferentes de perfis gené cos:
cadáveres e restos mortais não iden ficados, pessoas de iden dade desconhecida,
referências diretas de pessoas desaparecidas e familiares de pessoas desaparecidas, as
quais são confrontadas periodicamente para verificação de eventual vínculo gené co entre
as mesmas.

FATORES DE SUCESSO
Um dos principais fatores de sucesso dos bancos de perfis gené cos no país é, sem dúvida,
o comprome mento e a ação integrada dos laboratórios de gené ca forense que
par cipam da RIBPG e, deste modo, inserem perfis gené cos no BNPG. Entretanto outros
pontos relevantes também devem ser ressaltados, tais como:

1) Existência de legislação específica sobre o tema, a qual define o uso dos bancos de perfis
gené cos no Brasil;

2) Inves mentos constantes do governo federal, por meio do Ministério da Jus ça e


Segurança Pública, para a implementação e manutenção desta ferramenta no país;

3) Adoção de um sistema robusto e bem consolidado de gerenciamento de perfis


gené cos, cedido pelo governo norte-americano e usado em mais de 50 países no mundo
(CODIS); 66

4) Fornecimento de infraestrutura e recursos humanos para a Administração do BNPG pela


Polícia Federal;

5) Existência de um Comitê Gestor da RIBPG (CG-RIBPG), com a finalidade de promover a


coordenação das ações dos órgãos gerenciadores de banco de dados de perfis gené cos e a
integração dos dados nos âmbitos da União, dos Estados e do Distrito Federal.

No que concerne ao Comitê Gestor, este é composto por representantes tulares e


suplentes, indicados da seguinte forma:

I - cinco representantes do Ministério da Jus ça e Segurança Pública;

II - um representante do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos;

III - cinco representantes dos Estados ou do Distrito Federal, sendo um representante de


cada região geográfica, sendo estes peritos oficiais de natureza criminal, administradores
dos respec vos bancos de perfis gené cos.

Além dos membros, são convidados para par cipar das reuniões, sem direito a voto, um
representante de cada um dos seguintes órgãos: Ministério Público, Defensoria Pública,
Ordem dos Advogados do Brasil e Comissão Nacional de É ca em Pesquisa.

66
Ele também conta com duas comissões permanentes (Comissão de Qualidade e Comissão
de Interpretação e Esta s ca), cons tuídas por especialistas das respec vas áreas, e que
subsidiam o CG-RIBPG em suas deliberações. Quando necessário são, ainda, cons tuídos
Grupos de Trabalho com a finalidade de assessorá-lo em temas específicos.

Deste modo, o Comitê Gestor da RIBPG foi projetado para ter a representação dos
principais entes interessados no assunto e isto se traduz em decisões técnicas, maduras e
representa vas de diferentes visões dentro das ins tuições que o compõem.

O PAPEL DA RIBPG PARA A PROMOÇÃO DA JUSTIÇA


A definição da autoria de um crime sempre foi algo desafiador dentro de um processo
penal, tanto pela ausência de suspeitos do ato delituoso quanto pela possibilidade da
injusta acusação de indivíduos com base em provas frágeis. Tal questão relaciona-se à
dificuldade de se obter provas materiais confiáveis que possam se conectadas ao autor do
delito.

Até alguns anos atrás, de fato não exis a no país uma ferramenta segura para a indicação
desta autoria. Apesar de grande parte dos criminosos deixarem seu material gené co no
local de crime, e mesmo com os avanços das técnicas de gené ca forense, os laboratórios
de DNA do Brasil nham sua atuação limitada. Com a criação da RIBPG, a qual permi u a
comparação regular dos perfis gené cos gerados pelos diferentes laboratórios de gené ca
forense de todo o país, este problema foi superado.
67 Atualmente, os ves gios biológicos
coletados em locais de crime sem suspeitos podem ser analisados e os respec vos perfis
gené cos ob dos podem ser inseridos nos bancos de perfis gené cos brasileiros visando a
busca de outros crimes relacionados ou a iden ficação de autoria a par r do DNA de
indivíduos previamente cadastrados em consonância com a legislação vigente.

Neste contexto, a Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos agrega robustez ao
processo penal, servindo não só para basear sentenças condenatórias, mas também para
inocentar indivíduos injustamente acusados. Ou seja, a RIBPG tornou-se uma ferramenta
importante na elucidação de crimes, bem como na garan a de que indivíduos
equivocadamente apontados como autores de atos criminosos não incorram em penas de
restrição à liberdade por delitos que não cometeram. Os casos relatados adiante
exemplificam o potencial desta Rede.

UM NOVO PARADIGMA PARA A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL


Um importante momento na trajetória da RIBPG foi a implementação do Projeto de Coleta
de Condenados nos Presídios Brasileiros, o qual proporcionou o incremento de perfis de
referência compar lhados pela RIBPG, atendendo aos disposi vos legais vigentes
(Minervino et al, 2019). Após a realização de mu rões de coleta entre os anos de 2018 e
2019, o número de amostras de referência no BNPG aumentou em 2675% e a quan dade
de coincidências teve um incremento de 277%.

67
Um caso de grande relevância que tomou notoriedade no ano de 2019, e que teve grande
influência deste projeto, foi a inves gação sobre o assassinato da menina Rachel Maria
Lobo Oliveira Genofre. A ví ma, com apenas 9 anos, desapareceu no dia 03 de novembro de
2008 em Curi ba/PR, no caminho entre a escola e a sua casa. Seu corpo foi encontrado 2
dias depois, no interior de uma mala abandonada sob uma escada na rodoferroviária de
Curi ba. Durante os exames médicos legais foi encontrado material de sêmen que, ao ser
analisado no Laboratório de Gené ca Molecular Forense da Polícia Cien fica do Paraná,
forneceu um perfil gené co de indivíduo do sexo masculino. Tal perfil gené co ingressou no
Banco Nacional de Perfis Gené cos em 2014, quando da integração do laboratório do
Paraná à RIBPG. Entretanto, não houve na época coincidência com qualquer outro perfil
gené co.

Durante os 11 anos de inves gação foi solicitada a realização de cerca de 170 exames de
confronto gené co com eventuais suspeitos. Contudo, nenhuma das análises resultou em
coincidência com o perfil gené co ob do a par r do ves gio. Ou seja, durante todo este
tempo, cerca de 170 indivíduos foram inocentados com o auxílio do exame de DNA.

Em 16 de setembro de 2019, porém, esta história tomou uma nova direção. Nesta data foi
detectada no Banco Nacional de Perfis Gené cos uma coincidência entre o perfil gené co
ob do da amostra coletada no corpo de Rachel Genofre e o perfil gené co de Carlos
Eduardo dos Santos. Tal indivíduo cumpria pena na Penitenciária de Sorocaba/SP e havia
do seu material gené co coletado, analisado
68 e inserido no BNPG pela Polícia Técnico-
Cien fica do estado de São Paulo dentro do contexto do Projeto de Coleta de Condenados.
A resolução deste caso representa bem a importância da promoção no Brasil da Rede
Integrada de Bancos de Perfis Gené cos e da alimentação constante de seus bancos de
dados com os perfis gené cos previstos em lei (Minervino et al, 2020).

DESTAQUE NO CENÁRIO INTERNACIONAL


Apesar de ainda ser recente, a RIBPG já conseguiu importantes realizações. Atualmente o
Brasil é o país com a maior rede de bancos de dados u lizando o CODIS fora dos Estados
Unidos. Além disto, em 2019 e 2020 dois importantes casos brasileiros cujas inves gações
foram auxiliadas pelos bancos de perfis gené cos veram destaque no programa
internacional DNA Hit of the Year. Tal inicia va, que tem como obje vo demonstrar o valor
da tecnologia dos bancos de perfis gené cos para resolver e prevenir a criminalidade, é
considerada o mais importante reconhecimento internacional da área.

O primeiro deles foi o primeiro caso no Brasil em que se iden ficou o autor de crimes
sexuais em série com o auxílio do Banco Nacional de Perfis Gené cos. Entre os anos de 2012
e 2015 mais de 50 mulheres foram estupradas nos estados do Amazonas, Mato Grosso,
Rondônia e Goiás. O agressor atuava da mesma maneira, mas se mudava constantemente,
o que dificultava as inves gações. Em setembro de 2015, no estado de Rondônia, após
cometer roubos e um estupro a uma secretária de um consultório odontológico, Célio

68
Roberto Rodrigues, de 35 anos, que também u lizava o nome de Herley Nascimento
Santos, foi preso. Após exames de DNA seu perfil gené co se mostrou compa vel com o
DNA coletado em mulheres estupradas nos estados do Mato Grosso e Amazonas. Em 2018,
ao analisar amostras de ví mas estupradas em Goiás, duas novas coincidências foram
constatadas com o perfil deste agressor. Tal caso foi laureado com a terceira colocação no
DNA Hit of the Year 2019.

Em 2020, novamente o Brasil foi destaque em tal premiação com o caso do assalto à
empresa Prosegur, ocorrido em 2017 em Ciudad del Este/Paraguai. Tal crime deu origem a
mais de 450 ves gios coletados por peritos criminais federais em Foz do Iguaçu. Estes foram
analisados no laboratório de gené ca forense do Ins tuto Nacional de Criminalís ca,
gerando mais de 580 amostras para análise de DNA. Ao final, 47 perfis gené cos
ingressaram no banco de dados, sendo 11 deles com fontes iden ficadas. No BNPG tais
perfis demonstraram compa bilidade com outros 18 locais de crime inicialmente não
vinculados ao caso, resultando ainda em mais 3 indivíduos iden ficados. Até o momento, a
RIBPG permi u vincular o assalto da empresa de valores Prosegur no Paraguai a crimes
ocorridos em 7 diferentes estados brasileiros entre os anos de 2013 e 2019. A
grandiosidade deste assalto e, principalmente, o uso amplo dos bancos de perfis gené cos
brasileiros no auxílio a esta inves gação levaram o Brasil a receber a premiação de primeiro
colocado no DNA Hit of the Year 2020, o que sem dúvidas foi um marco para toda a perícia
criminal do país.
69
Vale ainda ressaltar que o Brasil figura como o país La no Americano com maior número de
perfis gené cos inseridos no banco internacional da Interpol. Tal compar lhamento de
dados, realizado através do Banco Nacional de Perfis Gené cos, já possibilitou o registro de
“matches” com outros países e o apoio a inves gações de crimes transnacionais.

O FUTURO ATRAVÉS DA CIÊNCIA E DA INOVAÇÃO


Como já exposto, a RIBPG permi u a integração de vários estados do país, possibilitando a
troca de informações gené cas de interesse da Jus ça, dentro de parâmetro é cos e legais,
buscando a solução de crimes e a busca de pessoas desaparecidas. Para alcançar tais
realizações tem se inves do em projetos estratégicos e em inovação para que os bancos de
perfis gené cos possam agregar cada vez mais valor à jus ça e à segurança pública.

Uma das principais ações estratégicas atuais é o Projeto de Processamento de Backlog de


Crimes Sexuais, proposto e elaborado pelo Comitê Gestor da RIBPG por meio de um Grupo
de Trabalho ins tuído para esta finalidade. Um levantamento inicial, realizado no ano de
2018, constatou que exis am no país mais de 150 mil amostras biológicas de crimes sexuais
aguardando análise. Este diagnós co mo vou a compra de insumos e equipamentos via
SENASP/MJSP, visando o processamento das amostras e a inserção respec vos perfis
gené cos nos bancos que compõem a RIBPG. Ressalta-se que crimes sexuais possuem uma
alta taxa de reincidência e que atualmente muitos indivíduos condenados pelo crime de

69
estupro já tem seu DNA cadastrado no BNPG. Deste modo, o processamento das amostras
de crimes sexuais e sua inserção nos bancos de perfis gené cos tem um alto potencial para
elucidar os casos que ainda se encontram em aberto, possibilitando o esclarecimento dos
crimes.

No campo da inovação, a mais novo projeto trata-se do desenvolvimento de uma


ferramenta nomeada Sistema Integrado de DNA (SInDNA), a qual complementará o
trabalho já realizado com o CODIS no Brasil, potencializando o uso dos dados da RIBPG na
promoção da jus ça e da segurança pública. Tal sistema possibilitará que os dados dos
ves gios e dos indivíduos cadastrados criminalmente sejam previamente registrados e
geolocalizados para que, havendo uma coincidência, os locais de crime possam ser
geograficamente interligados de maneira quase automá ca, o que proporcionará uma
visualização mais adequada dos “matches” e de suas interligações (Silva Junior et al, 2019).

O Comitê Gestor da RIBPG também tem trabalhado a vamente para a integração dos
estados que ainda não compar lham perfis gené cos (Acre, Piauí, Rio Grande do Norte,
Roraima, Sergipe e Tocan ns). Tais Unidades Federa vas foram apoiadas na
implementação de seus laboratórios de gené ca forense, recebendo equipamentos e
insumos via SENASP/MJSP. Além disto, estes laboratórios têm recebido auxílio para a
implementação de seus Sistemas de Gestão da Qualidade e alinhamento aos regulamentos
da RIBPG, de modo que em um futuro não muito distante possam também compar lhar
perfis gené cos com esta Rede, completando assim a integração nacional por meio da
gené ca forense. 70

Paralelamente, busca-se promover o incremento do número de perfis gené cos


relacionados à busca de pessoas desaparecidas na RIBPG. Para tanto foi ins tuído um
Grupo de Trabalho no âmbito do Comitê Gestor com a finalidade de estudar a situação atual
no Brasil e propor ações visando a promoção dos bancos de perfis gené cos dentro deste
tema.

Por fim, mas não menos importante, a RIBPG tem trabalhado no campo da capacitação de
seus recursos humanos, com a ins tuição de vários cursos de curta e média duração tendo
como público alvo peritos criminais de todo o país.

CONCLUSÃO
A Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos é uma realidade em plena expansão. Sua
história, construída por vários atores e ins tuições, deu a ela as bases sólidas para que hoje
possa crescer e apresentar à sociedade resultados consistentes. Atualmente trabalha-se
para que todos os estados brasileiros possam usufruir desta ferramenta, visando a
integração nacional e a disseminação da tecnologia dos bancos de perfis gené cos pelo
país. O seu futuro guarda possibilidades de ampliação de seu uso, bem como de associação
com outras ferramentas, tendo na inovação um de seus motores. Este esforço conjunto,
que caracteriza a RIBPG, visa criar condições para que no Brasil seja construído o ambiente
necessário para uma sociedade mais segura e justa.

70
Referências bibliográficas

BRASIL, Presidência da República. Lei nº 12.654/2012.


Disponível em: h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12654.htm

BRASIL, Presidência da República. Decreto nº 7.950/13.


Disponível em: h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/decreto/d7950.htm
71

MINERVINO, A. C. ; SILVA JUNIOR, R. C. ; MALTA, A. E. A. ; BECKER, C. M. S. ; MALAGHINI, M. . Projeto de Coleta de


Amostra de Condenados: Incremento do Auxílio a Inves gações e a Jus ça. REVISTA BRASILEIRA DE CIENCIAS
POLICIAIS, v. 11, p. 69-89, 2020.

MINERVINO, ALINE C. ; SILVA JUNIOR, RONALDO C. ; DA MOTA, MARIANA F. ; MATTE, CECÍLIA H.F. ; KOSHIKENE,
DANIELA ; DE OLIVEIRA, JOÃO PAULO S.C. ; ARANHA, TATIANA H.C. ; TRINDADE, BRUNO R. ; JACQUES,
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RIBPG, Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos. XII Relatório da Rede Integrada de Bancos de Perfis
Gené cos. Comitê Gestor da RIBPG, Brasília, 2020.

SILVA JUNIOR, RONALDO CARNEIRO; MINERVINO, ALINE COSTA; MARTINEZ, LUCIANO LAMPER; RUSSO,
DANIEL; MIRANDA, DANIEL ARAÚJO. Geoloca on of the Brazilian Na onal DNA Database Matches as a Tool for
Improving Public Safety and the Promo on of Jus ce. FORENSIC SCIENCE INTERNATIONAL. GENETICS
SUPPLEMENT SERIES (PRINT), v. 1, p. 2-551, 2019.

SILVA JUNIOR, RONALDO CARNEIRO; WIRZ, LEANDRO NICOLÁS; REYES, ESTUARDO SOLARES ; DEL MORAL
STEVENEL, MIGUEL ANGEL . Development of DNA Databases in La n America. FORENSIC SCIENCE
INTERNATIONAL, v. 316, p. 110540, 2020.

Sobre o autor

Ronaldo Carneiro da Silva Junior é Perito Criminal Federal, Administrador do Banco Nacional de Perfis Gené cos
e Coordenador do Comitê Gestor da Rede Integrada de Bancos de Perfis Gené cos

71
INVESTIGAÇÕES FORENSES
E ANÁLISE DE DNA DEGRADADO
Pablo Cavalcan , Alexandre Caiafa, Dayse Silva
e Elizeu Fagundes de Carvalho

Ao longo da história da humanidade, a iden ficação individual foi sempre uma informação
essencial no âmbito do Direito Penal e Civil. Estudos diversos fixam nos derradeiros anos do
século XIX o nascimento das ciências forenses (Starr, 2010). Em meados da segunda metade
do século XX, os avanços cien ficos possibilitaram a elucidação de questões antes
consideradas insolúveis. No decorrer, portanto, dos úl mos 125 anos, a crescente interação
entre ciência e jus ça cons tuiu os elementos necessários para a fundamentação das
ciências forenses modernas.

No cerne dessa associação entre o Direito (Penal e Civil) e a ciência forense, a iden ficação
individual surge como uma ferramenta primordial. Atualmente, diversas metodologias se
aplicam à iden ficação humana: a papiloscopia (impressões digitais), comparações
dentárias (odontologia forense), iden ficação osteológica (antropologia forense) entre
outras. Mas, sem dúvida, a metodologia que mais avançou e revolucionou o meio forense
nos úl mos tempos, foi a iden ficação humana por DNA, técnica que compõe uma área da
72
ciência denominada Gené ca forense, ou ainda, Biologia Molecular Forense.

A publicação, em 1985, dos resultados de pesquisa cien fica desenvolvida na Inglaterra por
Alec Jeffreys e colaboradores sobre regiões hipervariáveis presentes no DNA humano
marcou o início de uma profunda mudança na área forense (Jeffreys et al., 1985). O elevado
número de polimorfismos observados no DNA indicava grande potencial de u lização
destes segmentos para a iden ficação humana, o que jus ficou a alcunha de DNA
fingerprint em clara alusão à metodologia de iden ficação humana através das impressões
digitais. Anos depois, as expecta vas criadas com a publicação do trabalho de Alec Jeffreys
foram alcançadas, aplicando-se a nova técnica de pagem gené ca na resolução de casos
de iden ficação humana.

Ao longo da década de 1990, verificou-se um crescente esforço da comunidade cien fica


internacional, e de diversos governos, na busca de novos desenvolvimentos, padronização
de técnicas e de controles de qualidade que permi ssem a segura implementação de
bancos de dados populacionais de sequências hipervariáveis do DNA humano, com vistas à
aplicação dessa tecnologia na esfera forense.

A par r do final da década de 1990, perícias por DNA se tornaram grada vamente provas
técnicas ro neiras imprescindíveis em diversos pos de processos judiciais e inspiração
para o cinema, a dramaturgia e a literatura de ficção.

72
A iden ficação humana por DNA causou uma verdadeira revolução no contexto forense,
com a reabertura e resolução de inúmeros casos judiciais que puderam ser concluídos com
presteza e fidedignidade.

A possibilidade de se atribuir ligação entre os perfis de DNA de criminosos e aqueles


ob dos de rastros biológicos coletados em locais de crime transformou esta metodologia
numa imprescindível ferramenta, posto que permi u a obtenção de prova técnica
inques onável, auxiliando fortemente a jus ça na incriminação dos verdadeiros culpados e
na absolvição de inocentes. São muitos os cenários nos quais as técnicas de pagem de DNA
surgem como ferramentas importantes na iden ficação humana, com destaque para casos
de inves gação de paternidade, resolução de crimes, estudos genealógicos, iden ficação
de ví mas de desastres naturais, acidentes em massa, conflitos civis, guerras, ataques
terroristas e desaparecidos (Jeffreys et al., 1992; Boles et al., 1995; Lleonart et al., 2000;
Holland et al., 2003; Lee et al., 2010; Alvarez-cubero et al., 2012; Montelius & Lindblom,
2012;Pajnic et al., 2010; Zietkiewicz et al., 2012).

O recente acidente ocorrido em Minas Gerais, que comoveu todo o país, é um exemplo de
acidente em massa no qual a obtenção de perfis de DNA foi sobremaneira importante para
a iden ficação das ví mas. O evento considerado o maior desastre mundial com barragens
(Oliveira, 2016) consis u no rompimento de represas da mineradora Samarco, ainda sob
inves gação na jus ça. Aproximadamente 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos de
73
mineração foram despejados no Rio Doce, causando um cenário de devastação inédito no
Brasil. O Distrito de Bento Rodrigues foi o mais afetado, tendo recebido o maior aporte de
rejeitos, entretanto, a massa de lama seguiu o leito do rio até o oceano, deixando um rastro
de mortes, devastação e poluição. No total, foram 15 mortos e 8 desaparecidos. Com o uso
de técnicas de iden ficação por DNA, partes dos corpos de ví mas, mesmo separados por
grandes distâncias, puderam ser iden ficadas – algo que não seria possível com as demais
técnicas de iden ficação existentes (Coissi e Marques, 2016).

Em 1990, na cidade de São Paulo, foi descoberta uma vala clandes na no Cemitério de
Perus com 1.049 ossadas (Verdélio, 2014). Inves gações realizadas mostraram se tratar de
restos mortais de ví mas do esquadrão da morte, da ditadura militar, e crianças mortas
após um surto de meningite de 1970 (ocultado pela ditadura). Todavia, 26 anos depois,
muito pouco se avançou na iden ficação das ossadas. A análise por DNA de restos mortais,
até o presente momento, revelou a iden dade de 3 pessoas, todas ví mas de crimes do
regime militar (Cruz, 2008; Pellegrini, 2015). Os materiais biológicos são objeto de grande
preocupação devido à elevação do tempo post mortem e ao armazenamento inadequado,
eventos que somados favorecem a degradação do material gené co, que paula namente
alcançará nível tão elevado que resultará na impossibilidade de se realizar a iden ficação
dos restos mortais humanos, mesmo pelas técnicas de pagem por DNA.

73
De fato, na área da gené ca forense, é recorrente a presença de amostras biológicas de
restos mortais com DNA altamente degradado e/ou em quan dades exíguas, o que implica
em um grande desafio à iden ficação humana (Silva et al., 2013; Cavalcan et al., 2015).
Metodologias eficientes para a pagem por DNA de materiais biológicos apresentando
elevados níveis de degradação e exíguas quan dades de material gené co exigem
preparações de DNA livre de inibidores da PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) e,
embora sejam objeto de constantes estudos, ainda não se encontram convenientemente
desenvolvidas. Somado a isso, a grande quan dade de casos a serem resolvidos e o escasso
tempo para tal representam desafios aos quais os laboratórios de gené ca forense estão,
usualmente, expostos. Ademais a análise de amostras de DNA altamente degradado é um
dos maiores desafios em casos forenses, pois requer extração a par r de materiais
complexos, tais como ves gios de amostras biológicas em cenas de crime e restos mortais
como ossos e dentes (Chung et al, 2004).

Em inves gações criminais e em casos de iden ficação de restos mortais é muito comum se
encontrar amostras de DNA altamente degradadas. A maioria dos laboratórios forenses
relata experiências onde o nível de degradação do DNA é tão alto que a metodologia de
análise convencional não é capaz de gerar resultados conclusivos. O sucesso de uma análise
está diretamente relacionado ao processo de deterioração ao qual a amostra biológica foi
exposta, interferindo no sucesso da geno pagem de diferentes formas: agentes que
podem afetar a estrutura do DNA através de nucleases, processos oxida vos e inibidores
74
co-extraídos, como, por exemplo, o ácido húmico (Burger et al, 1999).

O grau de severidade do processo de degradação se deve basicamente a dois fatores:


tempo e condições ambientais. As variantes ambientais que mais afetam a integridade do
DNA são a temperatura, umidade, pH e os componentes químicos presentes no solo,
ditando a velocidade e o grau da degradação (Fondevila et al, 2008).

Figura 1 – Fragmentos ósseos em decomposição. Condição em que a molécula de DNA apresenta-se em


estado de degradação.

74
Em inves gações forenses a análise de marcadores do po microssatélites do DNA nuclear
é a metodologia padrão. Os DNA microssatélites são caracterizados por apresentarem
pequenas sequências repe vas em tandem, conhecidas como “Short Tandem Repeats” -
STR. Os marcadores STR apresentam repe ções com unidade básica de 2-6 pb, formando
blocos de repe ção de 50 a 500 pb, sendo o polimorfismo baseado no número de
repe ções (Charlesworth, Sniegowski, Stephan, 1994). Nos anos 90, os marcadores STR
foram descritos pela primeira vez como uma ferramenta efe va na iden ficação humana
(Edwards et al, 1991). Com o advento da PCR e posteriormente a eletroforese capilar, as
técnicas de geno pagem de marcadores STR, tornaram-se usuais em laboratórios de DNA
forense. Devido à sua efe vidade na resolução de casos envolvendo inves gações de
paternidade/maternidade e principalmente em casos criminais, em poucos anos o sistema
STR se tornou a metodologia padrão no campo da gené ca forense. Porém em alguns casos
esta técnica pode não apresentar resultados posi vos em razão do tamanho dos
fragmentos de DNA gerados. Tratando-se de amostras deterioradas, é possível se observar
uma relação direta entre o tamanho dos fragmentos analisados e a frequência de insucesso
na geno pagem de marcadores microssatélites mais extensos. Quanto maior for o
fragmento a ser amplificado pela PCR menor será a chance de sucesso da geno pagem
desta região polimórfica, o que pode gerar um desequilíbrio de sinal entre as regiões de
menor e maior tamanho (Dixon et al, 2006). Apesar disso, atualmente existem alterna vas
que maximizam as chances de sucesso da análise por DNA de materiais biológicos
degradados. 75

Perspec vas para a iden ficação humana por análise de DNA degradado

MiniSTRs

Em casos nos quais o material gené co encontra-se bastante degradado e em pouca


quan dade (low template), as pagens com STRs tendem a gerar resultados incompletos
e/ou inconclusivos. Este é um quadro frequente na iden ficação de ví mas de desastres,
ataques terroristas e crimes de guerra, por exemplo (Alvarez-Cubero et al., 2012). Uma
alterna va, em tais circunstâncias, é u lizar os miniSTRs. Estes correspondem a STRs que,
devido a alterações introduzidas pelos cien stas forenses em seus respec vos iniciadores
da PCR, redesenhados para que se liguem ao DNA em região flanqueadora mais próxima às
unidades repe vas, geram amplicons (produtos da PCR) menores quando comparados
aos originais STRs: até 300pb de comprimento. A redução no tamanho e o aumento na
sensibilidade permitem a obtenção de perfis completos de DNA degradado em
quan dades tão exíguas quanto 128 picogramas (Mulero et al., 2008).

75
INDELs

Os polimorfismos de inserção e deleção são marcadores que podem ser u lizados na


iden ficação humana por DNA, pois apresentam importantes caracterís cas: (1) Se
apresentam vastamente distribuídos ao longo do genoma; (2) originados através de um
único evento mutacional, o que os torna bastante estáveis, devido sua baixa taxa de
mutação (10-9) (Nachman, Crowell, 2000; Butler, 2009); (3) diferenças significa vas nas
frequências alélicas entre grupos populacionais separados geograficamente, podendo ser
u lizados também como potenciais marcadores informa vos de ancestralidade; (4)
pequenos INDELs podem ser analisados em amplicons reduzidos e facilmente combinados
em sistemas mul plex, abrindo novas perspec vas para análise de DNA altamente
degradado; (5) sua geno pagem é rela vamente simples, podendo ser realizada através de
amplificação por PCR convencional, com primers marcados por fluorescência e
posteriormente separados e detectados por sistema automa zado (sequenciador
automá co); (6) diferentemente dos polimorfismos de nucleo deo único (SNP), a análise
de INDELs não requer metodologias complexas como o sequenciamento, por exemplo.
Porém, nada impede sua incorporação às tecnologias “high-throughput” (a exemplo dos
microarranjos) (Weber et al, 2002; Yang et al, 2005; Pereira et al, 2009b).

Em 2009, Pereira e colaboradores desenvolveram um sistema mul plex PCR capaz de


76
amplificar, em uma única reação, simultaneamente, 38 marcadores INDELs bialélicos
presentes em regiões não codificantes de cromossomos autossomos. Naquele trabalho, o
sistema mul plex PCR denominado Indel-plex ID foi u lizado para o estudo da estruturação
gênica das populações européia, africana e asiá ca. Para isso, foram geno pados 306
indivíduos de Angola e Moçambique, Portugal, Macau e Taiwan. O estudo também
demonstrou a aplicabilidade do mul plex em inves gações forenses, a par r de
marcadores INDELs amplificados com primers capazes de gerar amplicons menores que
160 pb, o que se relaciona com o elevado potencial de geno pagem de DNA degradado
(Pereira et al, 2009b).

DNA mitocondrial

Em casos nos quais nenhuma abordagem envolvendo métodos de pagem de DNA nuclear
é viável, uma alterna va é a u lização do DNA mitocondrial (mtDNA), uma pequena parte
do genoma humano que se localiza fora do núcleo celular, no interior das mitocôndrias, que
são organelas localizadas no citoplasma. O mtDNA corresponde a aproximadamente
16.569 pares de base dispostas em uma estrutura circular, na qual constam trinta e sete
genes compactamente dispostos em uma região codificante de 15.447 pares de base e uma
região não codificante de 1.122 pares de base, na qual não há nenhum gene e onde se

76
encontra a origem de replicação (Butler, 2012). Tais semelhanças com o genoma
bacteriano, associadas a outras caracterís cas da mitocôndria, corroboram a teoria da
endosimbiose, segundo a qual as células eucariotas surgiram com a incorporação de α-
proteobactérias aeróbicas por uma arqueobactéria anaeróbica, há aproximadamente 1,5
bilhões de anos (Sagan 1967). Como as mitocôndrias apresentam mais de uma cópia do seu
genoma e podem exis r centenas de mitocôndrias em uma célula, pode haver milhares de
cópias do DNA mitocondrial por célula (Satoh & Kuroiwa, 1991). Esta caracterís ca - o
elevado número de cópias - torna o DNA mitocondrial uma ferramenta alterna va, no
âmbito forense, quando o genoma nuclear encontra-se muito degradado ou em
quan dades exíguas para realização de pagem do DNA (Cavalcan , 2015). Todavia, a
ausência de recombinação e a hereditariedade não mendeliana matrilinear, limitam o
poder discriminatório do DNA mitocondrial, de tal forma que sua análise fornece apenas a
possibilidade de iden ficações circunstanciais e/ou demanda obtenção de informações
gené cas suplementares (Alaeddini et al. 2010). Embora todo o genoma mitocondrial seja
de interesse da gené ca forense, a região não codificante - também denominada região
controle ou alça D - concentra a atenção dos estudos forenses por apresentar as maiores
taxas de variação gené ca, inclusive com a presença de regiões hipervariáveis, devido à
menor pressão exercida pela seleção natural, dado que não há genes nesta região. De
acordo com as orientações da Sociedade Internacional de Gené ca Forense (ISFG), para fins
forenses, deve-se analisar, pelo menos, toda77a extensão da região controle (Parson et al.
2014). Ademais, novos estudos sugerem que o DNA mitocondrial também pode fornecer
informações relacionadas à idade de um determinado indivíduo, por meio da análise do
acumulo de mutações que surgem no genoma mitocondrial ao longo da vida pelo processo
natural de envelhecimento e fornecem um “relógio” gené co (Zapico & Ubelaker, 2016).

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Sobre os autores

Pablo Cavalcan é Doutorando em Ciências do Programa de Pós- Graduação em Biociências da UERJ.

Alexandre Caiafa é Mestre em Ciências pelo Programa de Pós Graduação em Biociências da UERJ, Professor
voluntário da UFMS.

Dayse Silva é Doutora em Ciências, Especialista em Gené ca Forense e Professora Associada da UERJ

Elizeu Fagundes de Carvalho é Doutor em Ciências, Professor Associado e Coordenador do Laboratório de


Diagnós cos por DNA da UERJ.

79
Do Local
ao Laboratório
Lívia Cardoso Barroso
Desde os dez anos, quando assis a maravilhada aos episódios da série americana CSI, eu já
sabia que ser Perito era o meu sonho! O tempo passou, decidi por fazer Biomedicina no
ves bular, o que me aproximou ainda mais desta realidade e, por fim, em 2013 veio o tão
esperado Concurso Público.

Foram muitas horas de estudo e de treino sico, muitas vezes cansa vo, muitas vezes sem
descanso nos finais de semana, mas sem nunca perder o foco na aprovação. Por pouco não
entramos, mas graças à determinação dos aprovados, conseguimos que houvesse uma
segunda turma no Curso de Formação e, em 2015, conquistamos a tão sonhada nomeação.
Desde então, foram cinco anos trabalhando em locais de crime dos mais variados: do
homicídio ao crime ambiental, do acidente de trânsito ao furto de água/ energia; muitas
das vezes sem conseguir dormir à noite. Mas, ao contrário do que vira tantas vezes na
televisão, não seguia da rua para o laboratório para conseguir dar con nuidade às análises.
O processo parecia interrompido e a saudade do ambiente laboratorial ba a com
frequência.

Uma vez, ao chegar ao plantão, já havia uma80equipe da Delegacia me esperando para fazer
o exame em um local de flagrante de estupro, onde a ví ma era a própria filha do suspeito.
No banheiro, havia um preserva vo usado no lixo, e prontamente percebi que se tratava de
um "caso fechado", onde todas as amostras estão disponíveis para coleta, e assim o fiz:
coletei o preserva vo e, na Delegacia, coletei suabe oral de ambos o suspeito e da ví ma.
Entreguei tudo à Autoridade Policial para que fosse encaminhado ao IPPGF para análise.

Neste dia me sen bastante realizada enquanto profissional, pois consegui, graças aos
meus conhecimentos, coletar provas sólidas e auxiliar na resolução do crime em questão.
Há pouco tempo surgiu a oportunidade de mudar de ares, quando fui convidada pela Dra
Selma para integrar a equipe dos peritos do IPPGF e, assim, retornar às origens laboratoriais
numa das áreas mais interessantes que existem, a Gené ca Forense.

Trocar locais abertos pelo laboratório, as roupas comuns pelo jaleco e outros EPIs, a arma e
o colete à prova de balas pela caneta e microtubos foi uma escolha di cil, porém acertada, e
espero conseguir contribuir de forma ainda mais significa va para a elucidação de crimes e
levar jus ça às ví mas, daqui pra frente.

Sobre a autora

Lívia Cardoso Barroso é perita criminal da pcerj desde 2005. Graduada em Biomedicina com habilitação em
Análises Clínicas (UFF), possui também Mestrado em Microbiologia Médica (UFRJ).

80
DACHSHUND FOI A
PRIMEIRA RAÇA DE
CACHORROS A SER
CLONADA!

oRIGENS

HMMM....
81

E TAMBÉM INSPIRAÇÃO
PARA O DELICIOSO
E.
CACHORRO-QUENT

81
82

somostodos
Perícia

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