Bibliologia - Aula 3

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BIBLIOLOGIA

AULA 3

Prof. Roberto Rohregger


CONVERSA INICIAL

A Bíblia é a fonte da revelação de Deus para a humanidade e nela está


contido o plano de salvação e redenção do ser humano. Contudo, para
aceitarmos que este livro é de fato a Palavra de Deus, precisamos compreender
a sua origem e formação. Muitas pessoas, inclusive cristãos, desconhecem as
questões mais básicas sobre como a Bíblia chegou até nós, e também o seu
processo de formação: quem a escreveu? Em que idioma? Quem a traduziu?
Portanto, para refutar muitas teorias incorretas sobre a origem, fidelidade e
originalidade da Bíblia, precisamos conhecer a história de sua formação.
Nesta aula veremos os idiomas originais da Bíblia (hebraico, grego e
aramaico), os materiais nos quais foi escrita e os principais manuscritos. Desta
forma, vamos compreender a importância que os manuscritos mais antigos têm
para a fidelidade do texto bíblico, que se mantém até os dias atuais.

TEMA 1 – IDIOMAS ORIGINAIS DA BÍBLIA

A revelação de Deus por muito tempo passou de geração em geração de


forma oral. Apenas muito tempo depois dos acontecimentos bíblicos é que a
maioria deles foi registrada. Mesmo os Evangelhos foram escritos
posteriormente, no início da expansão do cristianismo, e os apóstolos é que eram
a Bíblia do Novo Testamento.

Enquanto os hebreus passavam sua cultura adiante de boca em boca,


os primeiros sistemas de escrita do mundo estavam entrando em uso.
Na Mesopotânea (atual Iraque), onde Abraão recebeu o chamado do
Senhor, um tipo de escrita chamada de cuneiforme estava sendo
usada. No Egito, onde os descendentes de Jacó trabalhavam como
escravos estavam em uso os hieróglifos. (Miller; Huber, 2006, p. 14)

Porém, tanto com relação ao Antigo Testamento quanto ao Novo, surge a


necessidade de registrar os eventos de forma escrita, uma vez que, segundo
Geisler e Nix, a linguagem escrita oferece vantagens à manutenção do registro
dos acontecimentos para a posterioridade, tais como:

Precisão: Uma das vantagens da linguagem escrita sobre os demais


veículos de comunicação é a precisão. Para que um pensamento seja
captado e expresso por escrito é preciso que tenha sido claramente
entendido pelo autor.
Permanência: Outra vantagem da linguagem escrita é sua
permanência. Constitui meio pelo qual se pode preservar o
pensamento ou a expressão, sem que os percamos por lapso de
memória, por vacilação mental ou por intrusão em outras áreas.

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Objetividade: A transmissão de uma mensagem por escrito também
tende a torná-la mais objetiva.
Disseminação: Outra vantagem da linguagem escrita sobre os demais
meios de comunicação é sua capacidade de propagação ou
disseminação. Independentemente do cuidado com que se processa
uma comunicação oral, sempre existe uma probabilidade de maior
corrupção e de alteração das palavras utilizadas em relação à
comunicação escrita. (1997, p. 124)

Ainda conforme Geisler e Nix (1997, p.125),” os idiomas originais usados


no registro da revelação de Deus, a Bíblia, vieram de famílias de línguas
semíticas e indo-europeias. Da família semítica se originaram as línguas básicas
do Antigo Testamento: o hebraico e o aramaico (siríaco)”.
Na escrita do Novo Testamento predomina o grego, diferentemente do
que é falado hoje. Também o aramaico foi utilizado na confecção original do NT.

1.1 Hebraico

Os textos em hebraico compõem praticamente todos os 39 livros do


Antigo Testamento. Apenas algumas passagens de Esdras, Jeremias e Daniel
foram escritas em aramaico.

O hebraico é a língua principal do Antigo Testamento, especialmente


adequada pra a tarefa de criar uma ligação entre a biografia do povo
de Deus e o relacionamento do Senhor com esse povo. O hebraico
encaixou-se bem nessa tarefa porque é uma língua pictórica.
Expressa-se mediante metáforas vívidas e audaciosas, capazes de
desafiar e dramatizar a narrativa dos acontecimentos. Além disso, o
hebraico é uma língua pessoal. Apela diretamente ao coração e às
emoções, e não somente à mente e a razão. E uma língua em que a
mensagem é mais sentida que meramente pensada. (Geisler; Nix 1997
p. 126)

A língua hebraica é chamada no Antigo Testamento de “língua de Canaã”


(Isaías 19.18) e “língua judaica” ou “judaico” (2 Reis 18.26,28; Isaías 36.13).

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Figura 1 – Texto em hebraico (à direta); à esquerda, sua a tradução em árabe

Crédito: DYZIO/Shutterstock.

O hebraico, como o padrão da maior parte dos idiomas originais do ramo


semítico, lê-se da direita para a esquerda.

1.2 Aramaico

O aramaico tem a mesma raiz do hebraico e, após o cativeiro babilônico,


torna-se o idioma comum falado entre o povo na Palestina. Segundo Geisler e
Nix, “O aramaico era a língua dos sírios, tendo sido usada em todo o período do
Antigo Testamento. Durante o século VI a. C., o aramaico se tornou língua geral
de todo o Oriente Próximo. Seu uso generalizado se refletiu nos nomes
geográficos e nos textos bíblicos (1997, p. 125).
Quando Israel inicia o regresso do exílio, em 536 a.C., já se falava o
aramaico como língua nacional. Quando as Escrituras foram lidas por Esdras, foi
preciso um intérprete:

Esdras abriu o livro diante de todo o povo, e este podia vê-lo, pois ele
estava num lugar mais alto. E, quando abriu o livro, o povo todo se
levantou. Esdras louvou o Senhor, o grande Deus, e todo o povo
ergueu as mãos e respondeu: "Amém! Amém! " Então eles adoraram
o Senhor, prostrados, rosto em terra. Os levitas Jesua, Bani, Serebias,
Jamim, Acube, Sabetai, Hodias, Maaséias, Quelita, Azarias, Jozabade,
Hanã e Pelaías, instruíram o povo na Lei, e todos permaneciam ali.
Leram o Livro da Lei de Deus, interpretando-o e explicando-o, a fim de
que o povo entendesse o que estava sendo lido. (Neemias 8:5-8)

No Novo Testamento, há alguns termos que são do aramaico, tais como:


Efatá (abre-te), em Marcos 7.34; Talitá cumi (menina levanta-te), em Marcos
5.41; Eli, Eli, lamá sabactâni (Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste),
em Mateus 27.46; Paulo usa em alguns escritos a palavra abba (Pai) em
aramaico (Romanos 8.15 e Gálatas 4.6).

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1.3 Grego

Esta é a língua na qual foi originalmente escrito o Novo Testamento.


Segundo Geisler e Nix, “além das línguas semíticas a influenciar o Novo
Testamento temos as indo-europeias, o latim e o grego. O latim influenciou ao
emprestar muitas palavras, como ‘centurião’, ‘tributo’, e ‘legião’, e pela inscrição
trilíngue na cruz (em latim, hebraico e grego) (1997, p.126).

Figura 2 – Texto escrito em grego

Crédito: Nathan Holland/Shutterstock.

O grego do Novo Testamento não é o grego clássico usado pelos


filósofos, mas o dialeto popular do homem da rua, dos comerciantes, dos
estudantes, que todos podiam entender: era o grego “Koiné” (Cunha, 2017, p.
112). Podemos ver o direcionamento divino no uso do grego:

a língua em que se escreveu o Novo Testamento foi o grego. Até fins


do século XIX, cria-se que o grego do Novo Testamento era a “língua
especial” do Espírito Santo, mas a partir de então essa língua tem sido
identificada como um dos cinco estágios do desenvolvimento da língua
grega. Esse grego coiné era a língua mais amplamente conhecida em
todo o mundo do século I. (Geisler; Nix, 1997, p.126)

A língua grega tem 24 letras; a primeira é alfa e a última, ômega.

TEMA 2 – MATERIAIS USADOS

A arte da escrita foi uma das grandes conquistas da humanidade e se


desenvolveu no decorrer da história possibilitando todos os tipos de
comunicação que temos atualmente. O registro das Escrituras acompanhou este
desenvolvimento, e foi se utilizando de vários matérias que possibilitaram o
registro escrito da revelação divina.

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Os autores das Escrituras empregaram os mesmos materiais em uso
no mundo antigo. Por exemplo, as tabuinhas de barro eram usadas não
só na antiga Suméria, já em 3500 a. C., como também por Jeremias
(17.13) e por Ezequiel (4.1). As pedras também eram usadas para
fazer inscrições na Mesopotâmia, no Egito e na Palestina, para
gravação, por exemplo, do Código de Hamurabi, dos textos da pedra
de Roseta e da pedra moabita. (Geisler; Nix, 1997 p.128)

Os materiais usados para escrever a Bíblia no decorrer da história foram


os mais variados, conforme Geisler e Nix:

Pedra – Foi empregada no Egito, Síria, Mesopotâmia, Israel e outros


países.
Tabuinha de barro ou argila – Material usado desde tempos
imemoriais na região da Mesopotâmia. Foi usado por Jeremias (17.13)
e por Ezequiel (4.1). Dois tipos de cerâmica têm sido encontrados pelos
arqueólogos: seca ao sol e seca ao forno.
Madeira – Era bastante usada pelos antigos para escrever. Alguns
acreditam que esse tipo de material de escrita foi usado por Isaías
(30.8), Habacuque (2.2) e por Zacarias, pai de João Batista (Lucas
1.63).
Papiro – Eram folhas de uma planta (Cyperus papyrus), cujo talo
cilíndrico alcança dois metros ou mais. Esse talo era descascado e
estendido em sentido cruzado, prensado, raspado e polido. Foi o
material que o apóstolo João usou para escrever o Livro do
Apocalipse (5.1) e suas cartas (2 João 12). Continua sendo usado
largamente no Egito, até hoje.
Velino, pergaminho e couro – São palavras que designam os vários
estágios de produção de um material de escrita feito de peles de
animais. Era curtido, raspado e polido. Foi usado pela primeira vez na
cidade de Pérgamo, na Ásia Menor, ao tempo do rei Eumenes II (197-
158 a.C.). (1997 p.128)

TEMA 3 – PRINCIPAIS MANUSCRITOS

A palavra manuscrito vem do latim manus (“mão”) e scriptus (“escrita”),


que juntos significam “escrito à mão”.
Os “originais” escritos pelas mãos de um profeta ou apóstolo são
chamados de autógrafos. Segundo Geisler e Nix,

Os escritos originais autênticos, saídos da mão de um profeta ou


apóstolo, ou de um secretário ou amanuense, sempre sob a direção do
homem de Deus, eram chamados autógrafos. Esses não existem mais.
Por essa razão, precisam ser reconstituídos a partir de manuscritos e
versões primitivas do texto da Bíblia. Tais manuscritos oferecem
evidências tangíveis e importantes da transmissão da Bíblia para nós
por parte de Deus. (1997, p.129)

Na ocasião em que a Bíblia veio a ser impressa em 1455 a.D., havia mais
de 2.000 manuscritos conhecidos, todavia, todos incompletos. Segundo
Champlim, “de todos os documentos do mundo antigo, o Novo testamento é
aquele que conta com o maior número de manuscritos” (2001, p. 62).

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TEMA 4 – SINAÍTICO: CÓDICE ALEF

Este texto é datado em torno de 340 a.C. e descoberto em 1844 pelo Dr.
Tischendorf, no convento de Santa Catarina, no Monte Sinai. Segundo
Bittencourt, após descobrir manuscritos contendo partes de Isaias e Macabeus,
este advertiu aos monges que era um material precioso, pois uma parte já havia
sido usada para acender a lareira do convento. “Depois disto volta Tischendorf
para Leipzig e dá 42 folhas a Biblioteca, as quais continham parte de 1Cronicas,
Jeremias, Neemias e Ester, que recebe o nome de Códice Frederico-Augustano
e, em 1846 publicou seu conteúdo” (1993, p. 80). Posteriormente, o Dr.
Tischendorf volta ao convento e completa os livros do Novo Testamento. Este é
o único códice que contém o Novo Testamento completo.
O manuscrito está digitalizado e pode ser consultado por meio do link:
<http://www.codexsinaiticus.org/en/>.

TEMA 5 – MANUSCRITO VATICANO: CÓDICE B

Documento muito importante, datado em torno do século IV (350,


possivelmente 325 a.C.), está escrito em grego e contém a tradução da
Septuaginta do Antigo Testamento, os Apócrifos e o Novo testamento. Segundo
Geisler e Nix:

Talvez seja o mais antigo uncial em velino ou em pergaminho, sendo


uma das mais importantes testemunhas do texto do Novo Testamento.
Foi desconhecido dos estudiosos bíblicos até depois de 1457, quando
foi catalogado na Biblioteca do Vaticano. Foi publicado pela primeira
vez em fac-simile fotográfico. Contém a maior parte do Antigo
Testamento grego (LXX), o Novo Testamento em grego e os livros
apócrifos, com algumas omissões. (1997, p.142)

Atualmente encontra-se na Biblioteca do Vaticano em Roma.

NA PRÁTICA

Compreender quais foram os idiomas originais das Escrituras é


extremamente importante, uma vez que a tradução depende de um
conhecimento de línguas antigas não mais faladas na atualidade, pelo menos
não como eram na época em que os livros da Bíblia foram escritos.
Reconhecer que é necessário um esforço para traduzir de um idioma
antigo para uma língua que não possui, muitas vezes, as mesmas características
de construção linguística é importante para compreender que muitas vezes
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alguns termos ficam mais restritos quando da sua tradução. Assim, ter o acesso
aos escritos no idioma e forma originais é fundamental para a pesquisa do texto
bíblico.
Outro aspecto importante no estudo da formação e transmissão bíblica é
compreender como ela se utilizou dos meios de divulgação, primeiramente pela
oralidade e posteriormente por meio da escrita.

FINALIZANDO

Nesta aula pudemos compreender a relevância do estudo das Escrituras


e como elas foram estruturadas, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento.
Percebemos a importância que a Bíblia tem a partir dos nomes dados aos seus
escritos no decorrer da história: A Lei, A Palavra de Deus etc. Outro ponto
importante que estudamos foi a divisão da Bíblia e diversidade de escritores que
encontramos desde os seus primeiros escritos, sem que o fio condutor seja
perdido, o que demonstra o direcionamento que Espírito Santo dava aos autores
inspirados. Desta forma, pudemos iniciar a nossa compreensão sobre a
disciplina de bibliologia e entendemos a importância que ela tem para
conhecermos as origens das Sagradas Escrituras.

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REFERÊNCIAS

BITTENCOURT, B. P. O Novo Testamento: metodologia de pesquisa textual.


3. ed. Rio de Janeiro: Juerpe, 1993.

CUNHA, F. G. Hebreus: a epístola de Paulo. 1. ed. São Paulo: Cidade Velha,


2017.

GEISLER, N.; NIX, W. Introdução bíblica: como a Bíblia chegou até nós. 1. ed.
São Paulo: Vida, 1997.

ROGERSON, J. A Bíblia: terra, história e cultura dos textos sagrados. v, I. 1. ed.


São Paulo: Del Prado, 1996.

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