AULA 6 - Limites À Licitude Da Prova

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DIREITO PROCESSUAL PENAL 2

AULA 6 – Limites à Licitude da Prova

Distinção entre Prova Ilícita e Prova Ilegítima


A problemática em torno da prova ilícita e da prova ilegítima deve
ser analisada.

A prova admitida deve ser produzida e, a contrário senso,


somente pode ser admitida aquela prova que possa ser
produzida.

No que se refere à contaminação, uma prova ilicitamente


admitida, ainda que produzida, será nula por derivação.

Por outro lado, quando regularmente admitida, mas com defeito


na aquisição, não haverá qualquer contaminação da decisão de
admissão, pois a contaminação não tem efeito retroativo que
lhe permita alcançar o ato precedente.

A Constituição prevê no seu art. 5º, LVI, que são “inadmissíveis,


no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.

A Lei n. 11.690/2008 inseriu o tratamento da prova ilícita no Código


de Processo Penal, assim dispondo:

Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser


desentranhadas do processo, as provas ilícitas,
assim entendidas as obtidas em violação a
normas constitucionais ou legais.

Para o legislador, não há distinção entre provas ilícitas e provas


ilegítimas, na medida em que o art. 157 consagra as duas espécies
sob um mesmo conceito, o de prova ilícita.
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Ao afirmar que são ilícitas as provas que violem normas


constitucionais ou legais, coloca ambas – ilícitas e ilegítimas – na
mesma categoria.

Esse é o tratamento legal. Contudo, ainda encontramos na doutrina


a distinção entre prova ilegal, ilegítima e ilícita.

A prova “ilegal” é o gênero, do qual são espécies a prova ilegítima


e a prova ilícita.

Assim, doutrinariamente, podemos encontrar as seguintes


categorias:
• PROVA ILEGÍTIMA: quando ocorre a violação de uma regra de
direito processual penal no momento da sua produção em juízo, no
processo.
Exemplo: juntada fora do prazo, prova unilateralmente produzida
(como o são as declarações escritas e sem contraditório) etc.;

• PROVA ILÍCITA: é aquela que viola regra de direito material ou a


Constituição no momento da sua coleta, anterior ou concomitante
ao processo, mas sempre exterior a este (fora do processo).
Em geral, ocorre uma violação da intimidade, privacidade ou
dignidade (exemplos: interceptação telefônica ilegal, quebra ilegal
do sigilo bancário, fiscal etc.).

Mas essa distinção, à luz da redação do art. 157, perdeu sentido.


Portanto, adotaremos a categoria prova ilícita na perspectiva do
CPP.

TEORIAS SOBRE A ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS

Ainda que a Constituição seja categórica – não admissibilidade da


prova ilícita –, encontramos na doutrina, e também na
jurisprudência, situações de flexibilização desta regra.

Admissibilidade Processual da Prova Ilícita

Para essa corrente, a prova poderia ser admitida desde que não
fosse vedada pelo ordenamento processual. Não interessava a
violação do direito material.
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Para seus seguidores (minoritários hoje), o responsável pela prova


ilícita poderia utilizá-la no processo, respondendo em outro
processo pela eventual violação da norma de direito material (que
poderia constituir um delito ou mesmo um ilícito civil).

Como dito, no Brasil, hoje, é uma posição que não encontra mais
qualquer abrigo na jurisprudência.

Inadmissibilidade Absoluta

Defendem essa posição os que fazem uma leitura literal do art. 5º,
LVI, da Constituição, onde está previsto que são “inadmissíveis,
no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.

Tal teoria encontra eco, principalmente, nos casos em que na


obtenção da prova (ilícita) são violados direitos constitucionalmente
assegurados.

Partem, ainda, da premissa de que a vedação constitucional não


admitiria exceção ou relativização. É uma corrente que possui
vários seguidores e que encontra algum abrigo na jurisprudência
(inclusive do STF).

A crítica é exatamente em relação à “absolutização” da vedação,


num momento em que a ciência (desde a teoria da relatividade) e o
próprio direito constitucional negam o caráter absoluto de regras e
direitos.

Admissibilidade da Prova Ilícita em Nome do Princípio da


Proporcionalidade (ou da Razoabilidade)

Para os seguidores dessa corrente, a prova ilícita, em certos casos,


tendo em vista a relevância do interesse público a ser preservado e
protegido, poderia ser admitida.
Abranda a proibição para admitir a prova ilícita, em casos
excepcionais e graves, quando a obtenção e a admissão forem
consideradas a única forma possível e razoável para proteger a
outros valores fundamentais.

No Brasil é adotada com reservas, sobretudo, nas questões de


direito de família. Em matéria penal, são raras as decisões que a
adotam.
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Admissibilidade da Prova Ilícita a Partir da Proporcionalidade


Pro Reo

Nesse caso, a prova ilícita poderia ser admitida e valorada apenas


quando se revelasse a favor do réu.

Trata-se da proporcionalidade pro reo, em que a ponderação entre


o direito de liberdade de um inocente prevalece sobre um eventual
direito sacrificado na obtenção da prova (dessa inocência).

Situação típica é aquela em que o réu, injustamente acusado de um


delito que não cometeu, viola o direito à intimidade, imagem,
inviolabilidade do domicílio, das comunicações etc. de alguém para
obter uma prova de sua inocência.

Desnecessário argumentar que a condenação de um inocente fere


de morte
o valor “justiça”, pois o princípio supremo é o da proteção dos
inocentes no
processo penal.
Ademais, deve-se recordar que o réu estaria, quando da obtenção
(ilícita) da prova, acobertado pelas excludentes da legítima defesa
ou do estado de necessidade, conforme o caso.

Também é perfeitamente sustentável a tese da inexigibilidade de


conduta diversa (excluindo agora a culpabilidade).

Tais excludentes afastariam a ilicitude da conduta e da própria


prova, legitimando seu uso no processo.

Com certeza, diante das demais teorias expostas, é a mais


adequada ao processo penal e ao conteúdo de sua
instrumentalidade, na medida em que o processo penal é um
instrumento a serviço da máxima eficácia dos direitos e garantias
fundamentais previstos na Constituição.

A jurisprudência não é pacífica, mas há acórdãos acolhendo esse


entendimento.

PROVA ILÍCITA POR DERIVAÇÃO

O Princípio da Contaminação e sua (Perigosa) Relativização


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Definida a questão da admissibilidade, ou não, passemos ao


problema da contaminação da prova ilícita sobre as demais.

Uma vez considerada ilícita a prova (e não tendo sido ela admitida,
conforme as teorias anteriormente tratadas) deve ser verificada a
eventual contaminação que essa prova produziu em outras e até
mesmo na sentença, conforme exigência feita pelo art. 573, § 1º, do
CPP.

Vejamos a redação do art. 157:

Art. 157. (...)


§ 1º São também inadmissíveis as provas
derivadas das ilícitas, salvo quando não
evidenciado o nexo de causalidade entre
umas e outras, ou quando as derivadas
puderem ser obtidas por uma fonte
independente das primeiras.
§ 2º Considera-se fonte independente aquela
que por si só, seguindo os trâmites típicos e
de praxe, próprios da investigação ou
instrução criminal, seria capaz de conduzir ao
fato objeto da prova.
§ 3º Preclusa a decisão de desentranhamento
da prova declarada inadmissível, esta será
inutilizada por decisão judicial, facultado às
partes acompanhar o incidente.

Desses enunciados, extraem-se algumas regras:


• inadmissibilidade da prova derivada (princípio da contaminação);
• não há contaminação quando não ficar evidenciado o nexo de
causalidade;
• não há contaminação quando a prova puder ser obtida por uma
fonte independente daquela ilícita;
• desentranhamento e inutilização da prova considerada ilícita.

A redação do art. 157 é muito ruim, contraditória e mistura


conceitos.
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No Brasil, o STF proferiu interessante decisão sobre a prova ilícita


no julgamento do RHC 90.376/RJ, relator Min. CELSO DE MELLO,
2ª Turma, julgado em 03/04/2007414.

No caso em comento, em apertada síntese, tratava-se de uma


busca e apreensão de materiais e equipamentos, realizada em
quarto de hotel, sem o respectivo mandado judicial. O STF
entendeu que o quarto de hotel merece a mesma tutela de
inviolabilidade que a “casa”, art. 5º, XI, da Constituição, sendo ilícita
a prova produzida sem a respectiva autorização judicial. A seguir,
travou-se a discussão acerca da contaminação dos atos
subsequentes, tendo o STF sustentado a necessidade de
exclusão da prova originariamente ilícita e de todas aquelas
posteriores, que mesmo produzidas validamente estavam
contaminadas pelo efeito da repercussão causal.

São igualmente ilícitos os elementos obtidos pelas autoridades


estatais, que somente a eles tiveram acesso em razão da prova
originariamente ilícita.

Se a prova ilícita não foi absolutamente determinante para a


descoberta da prova derivada, ou se esta derivar de fonte própria,
não fica contaminada e pode ser produzida em juízo.

Assim, predomina o entendimento nos tribunais superiores de que


não se anula a condenação se a sentença não estiver fundada
exclusivamente na prova ilícita. Tampouco se anula a decisão
condenatória, em que pese existir uma prova ilícita, se existirem
outras provas, lícitas, aptas a fundamentar a condenação.

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