A Psicogenese Da Lingua Escrita
A Psicogenese Da Lingua Escrita
A Psicogenese Da Lingua Escrita
LETRAMENTO
Introdução
O processo de aquisição da língua escrita pelas crianças é uma temá-
tica muito discutida no campo da educação, principalmente a partir
dos estudos de Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1985) a respeito da
psicogênese da língua escrita. Tais estudos apontam que as crianças
constroem diferentes hipóteses sobre a escrita, resolvem situações-
-problema, buscam conhecimentos e elaboram, analisam e refletem
sobre aquilo que escrevem.
Neste capítulo, você vai reconhecer a psicogênese não como um
método pronto a ser seguido para se atingir uma aprendizagem sig-
nificativa, e sim como um processo de aquisição da língua escrita em
que o sujeito constrói suas ideias e conhecimentos a partir de diferentes
hipóteses. Essas hipóteses e níveis de escrita, mais especificamente a
pré-silábica, a silábica, a silábico-alfabética, a alfabética e a ortográfica,
também serão analisados ao longo do texto. Além disso, você vai ver
que o erro pode ser encarado como um processo construtivo no pe-
ríodo de alfabetização, o que permite à criança aprender a partir da
experimentação e percorrer caminhos que a auxiliem a alcançar níveis
mais elevados de escrita.
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Diante dos apontamentos levantados, por que dizer então que a psicogênese
não é um método e sim um processo de aquisição da língua escrita? Em primeiro
lugar, é importante conceituar a palavra “método”. Segundo o dicionário da
língua portuguesa Priberam (MÉTODO, 2018, documento on-line), entre tantos
significados, método seria “[...] o processo racional para chegar a determinado
fim, conhecimento ou demonstração de verdade”. Diante disso, na perspectiva
da educação, você pode considerar que um método é uma forma, um modelo
que norteia os estudos e o trabalho do professor, determinando como esse
trabalho deve ser realizado.
Em segundo lugar, conforme relata Albuquerque (2012), a psicogênese se
diferencia dos métodos tradicionais que priorizavam atividades de memori-
zação, percepção, coordenação motora e repetição de palavras simples e de
textos prontos e desconectados da realidade da criança. A psicogênese nasce
a partir da alfabetização como apropriação das funções sociais da escrita e do
aprendizado gradual com foco em como o aluno se alfabetiza. Aqui, o sujeito
não é um mero objeto no processo de aprendizagem, mas um indivíduo capaz
de produzir o próprio conhecimento e de procurar ativamente compreender
e reconstruir a linguagem. É preciso, portanto, fugir da concepção de que a
aprendizagem ocorre sem lógica e que se dá a partir de atividades motoras
e de percepção, bem como da noção de que a memória serve apenas como
depósito de informações.
Nesse sentido, Albuquerque (2012) destaca que, após o início dos traba-
lhos acerca da psicogênese da língua escrita, iniciaram-se muitas discussões
contrárias aos métodos tradicionais para se alfabetizar, e a palavra método foi
sendo substituída por práticas sociais de leitura e escrita. Portanto, é correto
afirmar que não existem métodos e manuais a serem seguidos para se atingir
a aprendizagem, tampouco algo que determine o que está certo ou errado na
hora de alfabetizar. A aquisição da leitura e da escrita depende da relação da
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Hipótese pré-silábica
A hipótese pré-silábica é característica do período em que a criança não percebe
a escrita como representação do que é falado, não havendo assim vínculos entre
a linguagem oral e o que está sendo escrito. Essa hipótese pode ser dividida
em dois níveis, o pré-silábico I e o pré-silábico II.
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Para que esse aluno pré-silábico avance, é necessário que ele conheça as
letras e o seu valor sonoro e que represente, na forma escrita, o papel das
letras por meio da expressão da fala. Para isso, é preciso pensar em algumas
estratégias e propostas didáticas importantes de trabalho com esse aluno.
Entre elas, você pode considerar as listadas a seguir.
Hipótese silábica
A hipótese silábica caracteriza-se pela tentativa da criança de vincular a
linguagem oral com a escrita. Essa hipótese é necessária e é um processo de
construção original de cada alfabetizando, pois é o período em que a criança
começa a encontrar uma regra para a escrita e a fortalecer sua capacidade
de explicar de que forma está utilizando as letras nas palavras. Isso lhe dá
segurança e lhe prepara para enfrentar novos desafios.
Essa escrita também se divide em dois níveis: silábico sem valor so-
noro e silábico com valor sonoro. No primeiro, a criança representa, para
cada sílaba, uma letra qualquer que não possui relação com o som que a
palavra representa. Na Figura 4, a seguir, você pode ver um exemplo do
nível silábico.
A psicogênese da língua escrita 11
Na hipótese silábica, para que a criança avance, é necessário que ela atri-
bua valor sonoro a todas as letras. Para isso, o professor deve proporcionar
atividades didáticas de reconhecimento da forma das letras e de associação
grafema-fonema, assim como dar ênfase à primeira e à segunda letras na
sílaba inicial da palavra, como forma de provocar dúvidas nas crianças sobre o
número de letras necessárias para formar uma sílaba. Entre algumas sugestões,
você deve estar atento à importância de:
Hipótese silábico-alfabética
Nessa hipótese intermediária, a criança começa a perceber que é necessário
escrever mais de uma letra para formar uma sílaba. Ela entende o quanto se
torna difícil ler uma palavra escrita silabicamente, da mesma forma que realizar
a leitura de algo escrito pelos já alfabetizados. Inicia-se então a utilização e a
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Hipótese alfabética
Na hipótese alfabética, a criança já compreende o sistema de escrita e sua
função social. Nessa fase, a criança percebe que é necessário escrever mais
de uma letra para formar a sílaba e tenta adequar a escrita à fala. Além disso,
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No vídeo disponível no link a seguir, você vai ver que o processo de alfabetização e
letramento ocorre a partir de três desenvolvimentos que acontecem articuladamente: o
desenvolvimento psicogenético, o conhecimento das letras e a consciência fonológica.
Magda Soares, professora especialista na temática alfabetização e letramento, aponta que
o percurso que a criança traça ao longo do processo de alfabetização é um caminho de
descoberta e construção do conhecimento da língua escrita. O professor tem o papel
fundamental de orientar esse processo de forma sistemática e planejada. A partir de
algumas situações de aprendizagem apresentadas no vídeo, é possível compreender
e ter maior clareza sobre como cada fase acontece e sobre como são as intervenções
do professor nesse trabalho.
https://goo.gl/Ha4XhY
[...] Para uma psicologia (e uma pedagogia) associacionista, todos os erros se pare-
cem. Para a psicologia piagetiana, é chave o poder distinguir entre os erros aqueles
que constituem pré-requisitos necessários para a obtenção da resposta correta.
Leitura recomendada
NOVA ESCOLA. Alfaletrar: psicogênese da língua escrita. Youtube, 19 jul. 2017. Disponível
em: <https://www.youtube.com/watch?v=aovD7Kq-Dmg>. Acesso em: 23 maio 2018.