Texto 4-Orlandi - Dispositivo de Análise
Texto 4-Orlandi - Dispositivo de Análise
Texto 4-Orlandi - Dispositivo de Análise
Orlandi
ANÁLISE De
DisCURSO
Orlandi, Eni P.
Análise do discurso princípios procedimentos, Eni P. Orlandi
e
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não há sentidos "literais" guardacdos em
Temos afirmado que relação do analista com os objetos simbólicos que analisa,
algum lugar seja
o cérebro ou a lingua
-
- e que
"aprendemos
sentidos e os sujeitoS se constituem em processos em produzindo um deslocamento em sua relação de sujeito com
a usar. Os a interpretação: esse deslocamento vai permitir que ele
Simbolicos dos quais não temos
que há transferências, JogOS - o trabalho da
trabalhe no entremeio da descrição com a interpretação.
controle e nos quais o equivoco ideologia e d
est o largamente presentes. O que se espera do dispositivo do analista é que ela lhe permita
inconsciente
-
e m conta ideologia e
alteridade do cientista, a leitura outraqueele pode produzir. Nesse lugar,
dispositivo deve poder levar ele não reflete mas situa, compreende, o movimento da interpretação
inconsciente assim considerados.
inscrito no objeto simbólico que é seu alvo. Ele pode então contemplar
Odispositivo, a escuta discursiva, deve explicitar os gestos (teorizar) e expor (descrever) os cfeitos da interpretação. Por isso é que
de interpretação que ligam processos de identificação
se aos dizemos que o analista de discurso, à diferença do hemeneuta, não
dos suas filiações de sentidos: descrever a relação do interpreta, ele trabalha (n)os limites da interpretação. Ele não se coloca
sujeitos,
sujeito com sua memória. Nessa empreitada, descrição fora da história, do sinmbólico ou da ideologia. Ele se coloca em uma
e
interpretação se interrelacionam. E é também tarefa do analista posição deslocada que Ihe permite contemplar o processo de produção
distingui-las em seu propósito de compreensão. de sentidos em suas condições.
Podemos mesmo dizer que a interpretação aparece em dois Sem procurar eliminar os efeitos de evidência produzidos
momentos da análise: pela linguagem em seu funcionamento e sem pretender colocar
se fora da interpretação - fora da história, fora da língua - o
a
a. em umprimeiro momento, é preciso considerar que analista produz seu dispositivo teórico de forma a no ser vítima
interpretação faz parte do objeto da análise, isto é, o sujeito desses efeitos, dessas ilusões, mas a tirar proveito delas. E o faz
que fala interpreta eo analista deve procurar descrever
esse
pela mediação teórica. Para que, no funcionamento do discurso,
gesto de interpretação do sujeito que constitui o sentido
submetido à análise;
na produção dos efeitos, ele não relita apenas no
sentido do
reflexo, da imagem, da ideologia, mas reflita no sentido do
b. em um segundo momento, é preciso compreender que pensar. Isto significa colocar em suspenso a interpretação.
não há descrição sem interpretação, então o próprio analista Contemplar. Que, na sua origem grega, tem a ver com deus,
está envolvido na interpretação. Por isso é necessario Com o momento em que o herói contempla antes da luta: ele
introduzir-se um dispositivo teórico que possa intervir na encara sua tarefa. Ele a pensa.
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da teoria, no sentido de que não há análise A exaustividade almejada - que chamamos vertical - deve
Em nosso caso, trata-se
teorica permanente, em todos os passos
de discurso sem a mediação serconsiderada em relação aos objetivos da análise e à sua
a intermitenc1a entre descrição e
da análise, trabalhando temática. Essa exaustividade vertical, em profundidade, leva a
ambas, o processo de compreensão
interpretação que constituem, conseqüências teóricas relevantes e
não trata os "dados" como
analista de discurso "encara" a linguagemn
do analista. E assim que o meras ilustrações. Trata de *fatos" da linguagem com sua
conta, ele constrQi finalmente seu dispositivo memória, sua espessura semântica, sua materialidade
Tendo isso em
experimental e o de arquivo. Quanto à natureza da linguagem, qual ele parte. O que faz ele diante de um texto? Ele o remete
imediatamente a um discurso que, por sua vez, se explicita
devemos dizer que a análise de discurso interessa-se por práticas
em suas regularidades pela sua referência a uma ou outra
discursivas de diferentes naturezas: imagem, som, letra, etc.
formação discursiva que, por sua vez, ganha sentido porque
Não se objetiva, nessa forma de análise, a exaustividade deriva de um jogo definido pela formação ideológica
que chamamos horizontal, ou seja, em extensão, nem a dominante naquela conjuntura.
ompletude, ou exaustividade em relação ao objeto empirico.
A dificuldade está em que não há um contato inaugural
Ele é inesgotável. Isto porque, por definição, todo discurso
com o discurso (ou discursos), com o material que é nosso
se estabelece na
relação com um discurso anterior e aponta objeto de análise. Isto porque ele não se dá como algo ja
para outro. Não há discurso fechado em si mesmo mas um discernido e posto.Em medida o corpus resulta de
grande
processo discursivo do qual se podem recortar e analisar uma construção do próprio analista.
estados diferentes.
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A análise é um processo que começa pelo próprio
estabelecimento do corpus e que se organiza face à natureza do
cuja repetição é garantida pelas regras da
material e à pergunta (ponto de vista) que o organiza. Daí a
interessa sua materialidade, que é
língua pois nos
necessidade de que a teoria intervenha a todo momento para
se remete a regras mas as suas
linguístico-histórica, logo não
"reger" a relação do analista como seu objeto, com os sentidos.
à memória, onde intervém a
condições de produção em
relação
com ele mesmo, com a interpretação. ideologia, o inconsciente, o
esquecimento, a falha, o
equívoco. O que nos interessa não são
Conseqüentemente, também no dizemos da análise que as marcas em si mas o seu
funcionamento no discurso. E este
ela é objetiva mas que ela deve ser o menos subjetiva funcionamento que procuramos descrever e
compreender.
possível, explicitando o modo de produção de sentidos do
Uma Questão de Método
objeto em observação.
Há uma passagem inicial fundamental que é a
Por isso mesmo, concluida a analise, o que podemos avaliar que se faz entre
a superfície lingüística (o material de
é a capacidade analítica do pesquisador, pela habilidade com linguagem bruto coletado,
tal como existe) e o objeto discursivo, este sendo definido
que ele pratica a teoria, face a sua responsabilidade teórica, pelo
fato de que o corpus já recebeu um primeiro tratamento de
portanto, e sua capacidade de escrita- explicitação da análise análise superficial, feito em uma
primeira instância, pelo
-
lingüísticas face ao mesmo processo discursivo. Com i t conceitos e noções, poisa análise de discurso tem um
detectamos a relação do discurso com as formações discursi as. procedimento que demanda um ir-e-vir constante entre teoria,
O obieto discursivo não é dado, ele supõe um trabalho do consulta ao corpus e análise. Esse procedimento dá-se ao longo
de todo o trabalho0.
analista e para se chegar a ele e preciso, numa primeira etapa de
análise, converter a superficie linguistica (o corpus bruto), o Começamos por observar o modo de construção, a
dado empírico, de um discurso concreto, em um objeto teórico estruturação, o modo de circulação e os diferentes gestos de
isto é, um objeto lingüisticamente de-superficializado, produzido leitura que constituem os sentidos do texto submetido à
por uma primeira abordagem analitica que trata criticamente a análise. A partir desse momento estamos em condição de
impressão de "realidade" do pensamento, ilusão que sobrepõe desenvolver a análise, a partir dos vestígios que aí vamos
encontrando, ir
palavras, idéias e coisas. podendo mais longe, na procura do que
chamamos processo discursivo.
A partir desse momento, estamos em medida de analisar
No exemplo que tomamos, só podemos compreender o que é
propriamente a discursividade que é nosso objetivo porque já
esse modo peculiar de significar do discurso político
começamos a entrar no processo discursivo e saímos de seu universitário, se aprofundarmos a análise e atingirmos, em uma
produto acabado, no qual estávamos presos, e cujos efeitos nos
segunda fase, o processo discursivo. Nessa nova passagem,
afetam lingüística e ideologicamente. A análise, aliás, visa
agora do objeto parao processo discursivo, passamos ao mesmo
justamente deslocar o sujeito facea esses efeitos. Esse é jáum tempo do delineamento das formações discursivas para sua
movimento de compreensão que se sustenta em uma primeira
relação com a ideologia, o que nos permite compreender como
etapa de análise praticada pelo dispositivo analítico. se constituem os sentidos desse dizer. No caso de Vote Sem
No exemplo que apresentamos, construímos o objeto Medo, é nesse passo que vemos, na rede de filiação de sentidos
discursivo, colocando o texto exposto no campus Vote Sem Medo e suas relações desenhadas pela ideologia, o compromisso desse
em relação com o texto por nós formulado como contraponto dizer com a memória do fascismo, como um efeito que os
Vote Com Coragem. Essa já é uma construção da análise e desfaz próprios locutores podem até mesmo des-conhecer mas que está
o produto enquanto tal para fazer aparecer o processo. Com lá com sua eficácia. Entre as inúmeras possibilidades de
ISSo, já estamos nos colocando teoricamente em guarda, do ponto formulação, os sujeitos dizem x e não y, significando,
de vista dos efeitos do discurso, e produzindo um recorte que produzindo-se em processos de identificação que aparecem
vai como se estivessem referidos a sentidos que ali estão, enquanto
organizando o corpus.
produtos da relação evidente de palavras e coisas. Mas, como
Nosso ponto de partida é o de que a análise de discurso visa dissemos, as palavras refletem sentidos de discursos já
compreender como um objeto simbólico produz sentidos. A realizados, imaginados ou possíveis. E desse modo que a história
transformaçãoda superíície lingüística em um objeto discursivo se faz presente na língua.
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sentidos e os sujeitos se movem entre
Fatos vividos reclamam importante dessa materialidade, funcionando como unidade de
entre 0 acaso e a necessidade
o real da língua e o da história, de
o
análise. Unidade que se estabelece, pela historicidade, como
interpretação. De seu lado
jogo e a regra, produzindo gestos as unidade de sentido em relação à situação
o analista encontra,
no texto, pistas dos gestos de
na historicidade. Pelo seu trabalha
Dessa maneira, o texto não é definido pela sua extensão: ele
interpretação, que se tecem pode ter desde uma só letra até muitas frases, enunciados,
constrói, considerando os
de análise, pelo dispositivo que páginas etc. Uma letra "°", escrita em uma porta, ao lado de
ele pode explicitar o modo de constituicã
processos discursivos, outra coma letra "A", indicando-nos os banheiros masculino e
dos sujeitos e de produção dos sentidos. Passa da superfície
feminino, é um texto pois é uma unidade de sentido naquela
lingüística (corpus bruto, textos) para o objeto discursivo e deste situação. E isso refere, em nossa memória, o fato de que em
sto resulta, para o analista com seu
para o processo discursivo. nossa sociedade, em nossa história, a distinção masculino/
da ideologia. Em outras
dispositivo, em mostrar o trabalho feminino é significativa e é praticada socialmente até para
é trabalhando essas etapas da análise que ele observa
palavras, distinguir ugares próprios (e impróprios...). Por isso esse "O"
os efeitos da língua na ideologia e a materialização desta na tem seu sentido: tem sua historicidade, resulta em um trabalho
língua. Ou, o que, do ponto de vista do analista, é o mesmo: é de interpretação. Do mesmo modo, "Vote Sem Medo" tem seus
assim que ele apreende a historicidade do texto.
sentidos, dos quais apontamos alguns. Mas um texto pode se,
Destaca-se aí a textualização do político, entendido também, todo um livro, que faz sentido na situação literária,
discursivamente: a simbolização das relações de poder apresentando-se como um romance, por exemplo. Portanto não
presentes no texto. é a extensão que delimita o que é um texto. Como dissemos, é
o fato de, ao ser referido à discursividade, constituir uma unidade
Textualidade e Discursividade em relação à situação.
Quando falamos em historicidade, não pensamos a história Ser escrito ou oral também não muda a definição do texto.
refletida no texto mas tratamos da historicidade do texto em Como a materialidade conta, certamente um texto escrito e um
sua materialidade. O que chamamos historicidade é o
oral significam de modo específico particular a suas
acontecimento do texto como discurs0, o trabalho dos sentidos propriedades materiais. Mas ambos são textos.
nele, Sem dúvida, há uma ligação entre a história externa e a Se o texto é unidade de análise, só pode sê-lo porque
historicidade do texto (trama de sentidos nele) mas essa ligação representa uma contrapartida à unidade teórica, o discurso,
não é direta, nem automática, nem funciona como uma relação definido como efeito de sentidos entre locutores. O texto é texto
de causa-e-efeito. porque significa. Então, para a análise de discurso, o que
interessa não é a organização lingüística do texto, mas como o
Não vemos nos textos os "conteúdos" da história. Eles são
texto organiza a relação da língua com a história no trabalho
tomados como discursos, em cuja materialidade está inscrita a significante do sujeito em sua relação com o mundo. E dessa
relação com a evidência empírica e o
exterioridade. Entre a
natureza sua unidade: linguístico-histórica.
cálculo formal exato, trabalhamos, na Análise de Discurs0, em
uma região menos visível, menos óbvia e menos demonstrável, Consideramos o texto não apenas como um "dado" linguístico
mas igualmente relevante, que é a da materialidade histórica da (com suas marcas, organização etc) mas como "fato" discursivo,
linguagem. O texto, referido à discursividade, é o vestígio mais
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trazendo a memória para a consideração dos elementos mesmo textos ainda não
escritos ou ditos
Por outro lado,
submetidos à análise. São os fatos que nos permitem chegar à esse conjunto de textos que compõem
memória da língua: desse modo podemos compreender como o poderão vir a compor
universitário. Daí que D. Maingueneau
o discurso
o que é é
texto funciona, enquanto objeto simbólico. Foucault (1969), dirá que o discurso
(1984), retomando histórica
Como os textos são fatos de linguagem por excelência, os uma dispersão de textos cujo modo de inscrição
estudos que não tratam da textualidade não alcançam a relacão como um espaço de regularidades
permite definir Dizer
enunciativo-discursivas.
com a memória da língua. enunciativas, diríamos
"discurso universitário näo é
tanto enviar a um conjunto de
Paracompreender como se propðe a análise de discurso -o
textos efetivos mas a
um conjunto virtual, a dos textos
leitor deve-se relacionar com os diferentes processos de de uma
passíveis de serem produzidos conforme as coerções
significação que acontecem em um texto. Esses processos, por um texto como o "Vote
discursiva. De tal nmodo que
sua vez, säão função da sua historicidade. Compreender como formação
Sem Medo" afixado no campus na época das eleições para
um texto funciona, como ele produz sentidos, é compreende-lo reitor faz parte do discurso universitário e deve levar isto
enquanto objeto linguístico-histórico, é explicitar como ele outros enunciados que se
em conta. Assim também
realiza a discursividade que o constitui.
produzirem nas mesmas condições histórico-ideológicas
Os textos individualizam - como unidade - um conjunto de também fazem parte desse discurso e se constituem
relações significativas. Eles são assim unidades complexas, relativamente às coerções da formação em que se inscre vem.
constituem um todo que resulta de uma articulação de natureza
O discurso, porprincípio, não se fecha. E um processo em
linguístico-histórica. Todo texto é heterogêneo: quanto à natureza curso. Ele não é um conjunto de textos mas uma prática. E
nesse
dos diferentes materiais simbólicos (imagem, som, grafia etc); sentido que consideramos o discurso no conjunto das práticas
quanto à natureza das linguagens (oral, escrita, científica, literária, que constituem a sociedade na história, com a diferença de que
narrativa, descrição etc); quanto às posições do sujeito. Além disso, a práica discursiva se especifica por ser uma prática simbólica.
podemos considerar essas diferenças em função das formações
Um sujeito não produz só um discurso; um discurso não é
discursivas: em um texto não encontramos apenas uma formação 1gual a um texto.
discursiva, pois ele pode ser atravessado por várias formações
discursivas que nele se organizam em função de uma dominante. Como vimos acima, na dispersão de textos que constituem
um discurso, a relação com as formações discursivas é
Segundo o que pensamos, o discurso é dispersão de
uma
fundamental, por isso, no procedimento de análise, devemos
textos e o texto é uma dispersão do sujeito.O sujeito se subjetiva procurar remeter os textos ao discurso e esclarecer as relações
de maneiras diferentes ao longo de um texto. Há pontos de
deste com as formações discursivas pensando, por sua vez, as
subjetivação ao longo de toda a textualidade. O discurso relações destas coma ideologia. Este é o percurso que constitui
universitário, por exemplo, se constitui de uma dispersão de
as diferentes etapas da análise, passando-se da superfície
textos: os de professores, de alunos, de funcionários, de
administradores, textos burocráticos, científicos, pedagógicos
lingüística ao processo discursivo. Correspondentemente,
passamos pela análise dos esquecimentos e chegamos mais perto
etc. Toda essa textualidade faz parte do discurso universitário. do real dos sentidos na observação das posições dos
Inclusive os das eleições de cargos de direção, reitoria et sujeitos.
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Podemos então concluir que a análise do discurso não está do texto se dá, de um lado, empiricamente, porque são
interessada no texto em si como objeto final de sua explicação, constituídos de materiais tangíveis, e, de outro, no trabalho de
mas como unidade que Ihe permite ter acessO ao discurso. O
trabalho do analista é percorrer a via pela qual a ordem do
arquivo porque eles permanecem (são acondicionados) como
parte da memória institucionalizada. Feita a análise, no entanto,
discurso se materializa na estruturação do texto (e a da língua na o analista prescinde dos textos. Uma vez aúngido o processo
ideologia). Isso corresponde a saber como o discurso se textualiza. discursivo este é que dá ao analista as indicações de que ele
O texto, como dissemos, é a unidade de análise afetada pelas necessita para compreender a produção dos sentidos. Os textos
deixam de ser seus objetos.
condições de produção e é também o lugar da relação com a
representação da linguagem: som, letra, espaço, dimensão Autor e Sujeito: O Imaginário e O Real
direcionada, tamanho. Mas é também, e sobretudo, espaço
significante: lugar de jogo de sentidos, de trabalho da linguagem, As distinções que estamos propondo estabelecem uma relação
de funcionamento da discursividade. Como todo objeto entre texto e discurso que tem uma sua contraparte na que
simbólico, ele é objeto de interpretação. O analista tem de fazemos entre autor e sujeito. QO sujeito, diríamos, está para o
compreender como ele produz sentidos, o que implica em saber discurso assim comoo autor estáá para o texto. Se a relação do
tanto como ele pode ser lido, quanto como os sentidos estão sujeito como texto é a da dispersão, no entanto a autoria implica
nele. Na análise de discurso, não se toma o texto como ponto em disciplina, organização, unidade.
de partida absoluto (dadas as relações de sentidos) nem de Assim como definimos o discurso como efeito de sentido entre
chegada. Um texto é só uma peça de linguagem de um processo locutores e consideramos, na sua contrapartida, o texto, como sendo
discursivo bem mais abrangente e é assim que deve ser
uma unidade que podemos, empiricamente, representar como tendo
considerado. Ele é um exemplar do discurso. começo, meio e fim, uma superficie lingüística fechada nela mesma,
Feita a análise, não é sobre o texto que falará o analista mas assim também consideramos o sujeito como resultando da
sobre o discurso. Uma vez atingido oprocesso discursivo que é interpelação do indivíduo pela ideologia, mas o autor, no entanto,
responsável pelo modo como o texto significa, o texto ou textos é representação de unidade e delimita-se na prática social como
particulares analisados desaparecem como referências uma função específica do sujeito.
específicas para dar lugar à compreensão de todo um processo Como diz Vignaux (1979), o discurso nãotemcomo função constituir
discursivo do qual eles - e outros que nem conhecemos - são
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têm também função
entre real e imaginário. O que temos, em termos de real do
noções têm
um papel multiplicador mas
temos a unidade, a completude, a coerência, o claroe distinto, como unidade e origem de suas significações,
a não do discurso,
coerência.
contradição, na instância do imaginário. Eporessa articulação necessária fulcro de sua
sempre presente entre o real e o imaginário que o discurso funciona da autoria não vale para
Mas para Foucault (ibid) princípio
e o
c o m o as conversas,
Etambém dessa natureza a distinção (relação necessária) entre discurso tudo nem de forma
constante: há discursos,
e texto, sujeito e autor. de quem os assine
receitas, decretos, contratos, que precisam
Trata-se de considerar a unidade (imaginária) na dispersão (real): de mas, segundo Foucault, não de autores.
essa noção de modo a
considerar,
um lado, a dispersão dos textos e do sujeto; de outro, a unidade do Em meu trabalho desloquei
discursoea identidade do autor. Assim, mesmo se o próprio do discurso unidade do texto é efeito
à diferença de Foucault, que a própria
autoria. Dessa maneira,
e do sujeito é sua incomplet1de, sua dispersão, e que um texto seja discursivo que deriva do princípio da
heterogêneo pois pode ser afetado por distintas formações discursivas, o princípio da
atribuímos um alcance maior e que especifica
colocando-o
diferentes posições do sujeito, ele é regido pela força do imaginário da autoria necessário para qualquer discurso,
como
unidade, estabelecendo-se uma relação de dominância de uma formação na origem da
textualidade. Em outras palavras: um texto pode
discursiva com as outras, na sua constituição. Esse é mais um efeito até não ter um autor específico mas, pela função-autor,
sempre
discursivo regidopelo imaginário, oque lhe dá umadireção ideológica, uma autoria a ele.
se imputa
uma ancoragem política.
Retomamos então Foucault (idem): o princípio do autor limita
tem a
do discurso pelo jogo de uma identidade que
acaso
Função-Autor o
a
forma da individualidade e do eu. E assim que pensamos
Podemos então dizer que a autoria é
função do sujeito.
uma
autoria como uma função discursiva: se o locutor se representa
A função-autor, que é uma função discursiva do sujeito, como eu no discurso e o enunciador é a perspectiva que esse eu
estabelece-se ao lado de outras funções, estas enunciativas, que assume, a função discursiva autor é a função que esse eu
assume
O que é a função-autor discursiva tal como a concebemos? exigências de coerência, não contradiço, responsabilidade etc.
Para responder vamos fazer um contorno por Foucault (1971). Sendo a autoria a função mais afetada pelo contato com o
social e com as coerções, ela está mais submetida às regras das
Segundo Foucault (idem), há processos internos de controle instituições e nela são mais visíveis os procedimentos
do discurso que se dão a título de princípios de classificação,
disciplinares. Se o sujeito é opaco eo discurso não é transparente,
de ordenação, de distribuição, visando domesticar a dimensão
no entanto o texto deve ser coerente, não-contraditório e seu
de acontecimento e de acaso do discurso. Normatizando-o,
autor deve ser visível, colocando-se na origem de seu dizer. E
diríamos. Tal controle pode ser observado em noções como as
do autor que se exige: coerência, respeito às normas
de comentário, de disciplina, e, justamente, na de autor. Essas
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estabelecidas, explicitação, clareza, conhecimento das regras a relação com a interpretação é diferente nas diferentes épocas,
textuais, originalidade, relevância e, entre outras coisas, unidade, assim como também é diferente o modo de constituição do
não-contradição, progressão e duração de seu discurso, ou sujeito nos modos como ele se individualiza (se identifica) na
melhor, de seu texto. relação com as diferentes instituições, em diferentes formações
sociais, tomadas na história. Trabalham aí as diferentes formas
Essas exigências têm uma finalidade: elas procuram tornar o sujeito
visível (enquanto autor) com suas intenções, objetivos, direção do confronto do político com o simbólico.
argumentativa. Um sujeito visível é calculável, identificável, controlável. A Análise: Dispositivo e Procedimentos
Como autor, o sujeito ao mesmo tempo em que reconhece uma
exterioridade à qual ele deve se referir, ele também se remete a sua Os procedimentos da Análise de Discurso têm a noção de
interioridade, construindo desse modo sua identidade como autor. funcionamento como central, levando o analista a compreendê-lo pela
Trabalhando a articulação interioridade/exterioridade, ele "aprende" a observação dos processos e mecanismos de constituição de sentidos e
assumir o papel de autor e aquilo que ele implica. A esse processo, de sujeitos, lançando mão da paráfrase e da metáfora como elementos
certo grau de operacionalização dos conceitos.
chamei (E. Orlandi, 1988) assunção da autoria. Segundo ela, o autor é que permitem um
o sujeito que, tendo o domínio de certos mecanismos discursivos, Vamos aqui retomar o que já referimos no item Uma Questão
representa, pela linguagem, esse papel na ordem em que está inscrito, de Método, a saber, que a análise se faz por etapas que
na posição em que se consütui, assumindo a responsabilidade pelo que
correspondem à tomada em consideração de propriedades do
diz, como diz etc. discurso referidas a seu funcionamento, e vamos cotejar as etapas
Não basta falar para ser autor. A assunção da autoria implica uma com os procedimentos que dão forma ao dispositivo.
inserção do sujeito na cultura, uma posição dele no contexto histórico- Estas etapas de análise têm, como seu correlato, o percurso
social. Aprender a se representar como autor é assumir, diante das que nos faz passar do texto ao discurso, no contato com o corpus,
instâncias institucionais, esse papel social na sua relação com a o material empírico.
linguagem: constituir-see mostrar-se autor (E. Orlandi, 1988).
Elas estão assim dispostas em sua correlação:
O sujeito precisa passar da mulliplicidade de representações
possíveis para a organização dessa dispersão num todo coerente, Etapa: Passagemda Superficie Lingüística Texto
para o
apresentando-se conmo autor, responsável pela unidade e (Discurso)
2 Etapa: Passagem do Objeto Discursivo Fomação Discursiva
coerência do que diz.
para o
Essa representação do sujeito, ou melhor, essa sua função, 3 Etapa: Processo Discursivo Fomação Ideológica
tem seu pólo correspondente que é o leitor. De tal modo isso é
assim que cobra-se do leitor um modo de leitura especificado Na primeira etapa, o analista, no contato com o texto, procura
ver nele sua discursividade e incidindo um primeiro lance de anáise
pois ele está, comoo autor, afetado pela sua inserção no social - de natureza lingüístico enunciativa-constrói um objeto discursivo
e na história. O leitor tem sua identidade configurada enquanto
em que já está considerado o esquecimento número 2 (da instância
tal pelo lugar social em que se define "sua" leitura, pela qual,
aliás ele é considerado responsável. Isso varia segundo a forma da enunciação), desfazendo assim a ilusão de que aquilo que foi
dito só poderia sê-lo daquela maneira. Desnaturaliza-se a relação
histórica, tal como para a autoria: não se é autor (ou leitor) do
mesmo modo na ldade Média e hoje. Entre outras coisas, porque palavra-coisa.
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fundamental o trabalho com
Nesse momento da análise é A metáfora é constitutiva do processo mesmo de
as sinonímia, relação do dizer e não-dizer etc.
paráfrases, produção.desentido.c.daconstituigão do sujeito. Falamos
para que
analista ele comece a
Esta etapa prepara o dametáfora não vista-comodesviomas como
discursivas que
vislumbrar a configuração das formaçðes transferencia. Na representação abaixo podemos observar
discursiva em questão. O que
estão dominando a prática o trabalho produzido pelo deslize (a deriva), pelo efeito
ao longo do dizer se
ele faz é tornar visível o fato de que metafórico, lugar da interpretação e da historicidade
relacionandoo que foi dito
formam famílias parafrásticas a. b, c. d
com o quenão foi dito, com o que poderia ser dito etc.
Estes outros dizeres aí observados d o as delimitações das
formações discursivas que intervêm, fazendo as palavras
e, b, c, d
significarem de maneira x ou y.
a constituição dos
rege essas relações. Aí é que ele atinge
efeitos de sentidos
processos discursivos responsáveis pelos e, f,g, h
produzidos naquele material simbólico, de cuja formulação o
analista partiu. Ao longo de todo o procedimento analítico, Nessa representação, o ponto de partida (a. b, c, d) e o ponto
ao lado do mecanismo parafrástico, cabe ao analista observar de chegada (e, f. g. h), através dos deslizamentos de sentidos
o que chamamos efeitos metafóricos. efeitos metafóricos - que se deram de próximo em próximo,
são totalmente diferentes. Mas essa diferença é sustentada em
definição do efeito metafórico permite-nos, pondo em
A
um mesmo ponto que desliza de próximo em próximo, o que
relação discurso e língua, objetivar, na análise, o modo de nos leva a dizer que há um mesmo nessa diferença.
articulação entre estrutura e acontecimento. O efeito metafórico,
nos diz M. Pecheux (1969), é o fenômeno semântico produzido O processo de produção de sentidos está necessariamente
por uma substituição contextual, lembrando que este sujeito ao deslize, havendo sempre um "outro" possível que o
deslizamento de sentido entre x e y é constitutivo tanto do sentido constitui. Como dissemos, o deslize de a para e faz parte do
designado por x como por y. sentido de a e de e. Tanto o diferente como o mesmo são
Como esse efeito é característico das línguas (naturais), por produção da história, são afetados pelo efeito metafórico.
oposição aos códigos e às línguas artificiais, podemos dizer que Na representação dessa figura, vemos aí a historicidade
não hå lingua sem esses deslizes, logo não há língua que nao representada pelos deslizes produzidos nas relações de paráfrase
ofereça lugar à interpretação. Em outras palavras, a interpretaçao que instalam o dizer na articulação de diferentes formações
é constitutiva da própria língua. E onde está a interpretação está discursivas, submetendo-os à metáfora (transferências), aos
a relação da deslocamentos: possíveis "outros". Falanmos a mesma língua
língua com a história para significar.
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diferente. DzemoS as mesmas palavras mas elas Diseurso, envolve também a ideologia. Essa duplicidade.
mas falanmos
diferente. As palavras remetem a discursos trabalhado como a questão ideológica
podem signiticar esse equivoco e
sentidos das formaçoes diseursivas, regiões relação material do discurso à
que derivam seus
fundamental, pensando a
do interdiscurso que. por sua Vez, representam no discurso as lingua e a da ideologia a inconsciente.
fornmações ideológicas. E nesse lugar, em que lingua e história se ligam pelo
interdiscurso significa justamente
equívoco, lugar dos deslizes de sentidos como efeito
a
Como dissemos, o
multiplicidade de discursos
do discurso
relação
com uma
metafórico, que se define o trabalho ideológico, o trabalho
ou seja. ele é um conjunto nào
discernivel, não representáve da interpretação. Como esse efeito que constitui os sentidos
sustentam a possibilidade mesma do dizer.
de discursos que constitui também s sujeitos, podemos dizer que a metáfora
sua memória. Representa
assim a alteridade por excelência está na base de constituição dos sentidos e dos sujeitos.
historicidade.
(o Outro). a Estas características dos mecanismos discursivos, esses
Desse modo é que temos dito que a historicidade deve
efeitos e articulações devem estar presentes no modo como o
ser compreendida em análise de discurso como aquilo que
analista constrói seu dispositivo de modo a que o deslocamento
sejam os mesmos e também que
faz com que os sentidos
produzido pelo dispositivo em seu olhar leitor trabalhe a
eles se transformem.
interpretação enquanto exposição do sujeito à historicidade (ao
O efeito metafórico, o deslize - próprio da ordem do
equívoco, à ideologia) na sua relação com o simbólico.
simbólico - é lugar da interpretag0, da ideologia, da Nas condições de produção desse dispositivo deve ainda
historicidade. Essa é a relação entre a língua e o discurso: a entrar a questão feita pelo analista pois ela é que o orienta
língua é pensada "como sistema sintático intrínsecamente na construção do fato que ele vai analisar, determinando
passível de jogo e a discursivdade como inscrição de efeitos assim as características do material simbólico que ele
lingüísticos materiais na história" como diz M. Pêcheux submeterá à sua observação.
(1980). Efeitos materiais na história, deslizes, paráfrase,
metáfora. Eis um conjunto de noções que sustentam a No exemplo analisado teríamos
possibilidade da análise. Num retorno contínuo do objeto de Vote Sem Medo
análise para a teoria, num movimento constante de descriço
e interpretação, o analista tece as intrincadas relações do
discurso, da língua, do sujeito, dos sentidos, articulando Vote Com Coragem
ideologia e inconsciente. Onde podemos observar os deslizes ( sem >com; medo
Este modo de conceber o deslize, o efeito metafórico, coragem) tendo como condição de produção o canpus e como
como parte do funcionamento discursivo, liga-se à questão do analista: sendo as posições em jogo autodenominadas
maneira de se coneeber a ideologia. Pensando-se a de esquerda, de que posição (política acadêmica, partidária)
interpretação, esse efeito aponta-nos para o "discurso material (real) estão falando esses sujeitos? Que efeitos de
duplo e uno". Essa duplicidade faz referir um discurso a sentidos são aí produzidos, que propriedades estão sendo
um discurso outro para que ele faça sentido; na constituídas (atribuídas) para os eleitores?
Psicanálise, isso envolve o inconsciente, na Análise de
80 8
O Dito e o Não Dito
uma formulação. Em outras palavras, o interdiscurso determina
Se maneiras de ler, inauguradas pelo dispositiva
as novas o intradiscurso: o dizer (presentificado) se sustenta na memória
teórico da análise de discurso0, nos indicam que o dizer tem (ausência) discursiva.
relação com o no dizer, isto deve ser acolhido
análise. Vale lembrar que háoutra forma de se trabalhar o
metodologicamente e praticado na não-dito na análise
de discurso. Trata-se do silêncio (E. Orlandi,
O não-dizer tem sido objeto de reflexão de alguns
1993).Este pode ser
pensado como a respiração da significação, lugar de recuo necessário
lingüistas dos quais tomo como exemplar o trabalho
para que se possa significar, para que o sentido faça sentido. o silêncio
desenvolvido por O. Ducrot (1972). Distinguindo, na origem como horizonte, como iminência de sentido. Esta é uma das
formas de
de sua reflexão, como diferentes formas de não-dizer silêncio, a que chamamos silêncio fundador: silêncio que indica
(implícito), o pressuposto e o subentendido, este autor vai queeo
sentido pode sempre ser outro. Mas há outras formas de silêncio
que
separar aquilo que deriva propriamente da instância da atravessam as palavras, que "talam" por elas, que as calam.
linguagem (pressuposto) daquilo que se dá em contexto
Desse modo distinguimos o silêncio fundador
(subentendido). Se digo "Deixei de fumar" o pressuposto é (que, como dissemos,
faz com que o dizer signifique) e o silenciamento ou
que eu fumava antes, ou seja, não posso dizer que "deixei de política do silêncio
que, por sua vez, se divide em: silêncio constitutivo, pois uma
fumar" se não fumava antes. O posto (o dito) traz consigo palavra
apaga outras palavras (para dizer é preciso não-dizer: se digo "semm
necessariamente esse pressuposto (nao dito mas presente). medo" não digo "com coragem'") e o silêncio local,
Mas o motivo, por exemplo, fica como subentendido. Pode- que é a censura,
aquilo que é proibido dizer em uma certa conjuntura (ééo que faz com
se pensar que é porque me fazia mal. Pode ser também que que o sujeito não digao que poderia dizer: numa ditadura não se diz a
não seja essa razão. O subentendido depende do contexto. palavra ditadura não porque não se saiba mas porque não se pode dize-
Não pode ser asseverado como necessariamente ligado ao lo). As relações de poder em uma sociedade como a nossa
dito. Essa teoria a da semântica
-
argumentativa
produzem
sempre a censura, de tal modo que há sempre silêncio
desenvolveu-se aprofundando
certas noções, modificando as palavras.
acompanhando
Daí que, na anáise, devemos observar o que não estásendo
outras, mas manténmo fato de que o nã0-dito é subsidiário ao dito, o que não pode ser dito, etc. Em nosso exemplo, cabe
dito. De alguma forma, o complementa, acrescenta-se. que Vote Sem Medo silencia, o que ele não deixa dizer?
perguntar: o
De todo modo, sabe-se
por aí que, ao longo do dizer, hátoda Essas reflexões podem levar à
seguinte questão: se o não
uma margem de não-ditos que também significam. dizer significa, então o analista
pode tomar tudo o que não foi
dito como relativo ao dito em análise? Não há limite
Na análise de
discurso, há noções que encampam o não-dizer: para isso?
Esta é uma questão de método:
a noção de interdiscurso, a de ideologia, a de formação partimos do dizer, de suas
discursiva. Consideramos que há sempre no dizer um não-dizer condições e da relação com a memória, com o saber discursivo
necessário. Quando se diz "x", o não-dito "y" para delinearmos as margens do não-dito que faz os contornos
permanece como do dito
significativamente. Não é tudo que não foi dito, é só o
uma relação de sentido informa dizer de "x". Isto é, uma
que o
não dito relevante
formação discursiva para aquela situação significativa.
pressupõe uma outra: "terra" significa pela
sua
diferença com "Terra", "com coragem" significa pela sua Não é pois uma questão de tudo ou nada, nem de critério
relação com "sem medo" etc. Além disso, o que já foi dito mas positivo. Há recortes que mostram o não-dizer
que constitui o
já foi esquecido tem um efeito sobre o dizer que se atualiza em processo discursivo em questão em cada uma de nossas análises.
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que e preciso que a teoria
Mas isso significa lambem eo
igualmente o sentido do que édito. As palavras se acompanha
nao-dizer estamos falando, de con
método cxplicitem
de que
de silêncio e são elas mesnmas atravessadas de silêncio. Isso
sao OS procedilnentos para sua análise da observação do analista.
e quais
o consideramos tem que fazer parte
indicadores das dilerenças entre, por exemplo, uma
Esses são os
não dizer desenrola-se
uma posIçao enunciativa e uma posicão Entre o dizer e o todo um espaço de
posição pragmática, falando em interpretação n qual o sujeito E preciso dar
se move.
mesmo não-dizer que estamos
discursiva. Não é do visibilidade a esse espaço através da análise baseada nos
teorias. E a m a n e i r a de analisar o não-dito. em
Certamente o fato de um discurso ser político, estabelece um determinações ideológicas. Não se deve
histórico-sociais e
seu regime e validade e cabe ao analista detectar essa ordem, assim tomar, por exemplo, o lúdico no sentido do brinquedo
e não se deve
esse regime. Mas ele não o faz pela classificação a priori - mas do jogo de linguagem (polissemia)
b. discurso polêmico: aquele em que a polissemia é Por outro lado, não há nunca um discurso puramente
controlada, o referente é disputado pelos interlocutores,
autoritário, lúdico ou polêmico. O que há são misturas,
e estes se mantênm em presença, numa relação tensa de discurso tem
articulações de modo que podemos dizer que um
disputa pelos sentidos; um funcionamento dominante autoritário,
ou tende para o
evitarem
C. discurso lúdico: aquele em que a polissemia está aberta, o autoritário (para a paráfrase) etc. Aliás, um modo de se
relação aos modos de
referente está presente como tal, sendo que os interlocutores se essas categorizações é dizer, em
expöem aos efeitos dessa presença inteiramente não regulando funcionamento discursivo que apontei acima, que o discurso
Sua relação com os sentidos. em análise tende para a paráfrase, ou para
amonossemia (quando
e se divide
E interessante fazer algumas autoritário), tende para a polissemia (quando lúdico)
observações
a uma tipologia entre polissemia e paráfrase (quando polêmico).
Assim se evitam
Como esta que propomos. Primeiramente, ela obedece o
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as etiquetas definidor que são interpretadas mais pela
carga ideologica que palavras como "autoritário" carreoanforte Onde dor de cabeça, doença na cabeça e caboco se substituem.
que pela sua remissão a um funcionamento discursivo.
do
Temos ainda em posição parafrástica: choro de noite/fico
agoniado/me perturba. E, numa posição sintética exemplar:
Resta dizer há relações de múltiplas
que minha cabegachora (para de chorar), em
que dói e chora se
discursos e isso tambén ferentes
e
naturezas entre diferentes substituem flagrantemente quase como atos falhos.
é
de análise: relações de exclusao, de inclusão, de objeto
sustentacão Ha uma sobreposição dos discursos religioso e terapêutico
mútua, de oposição, migraçao de elementos de um discurs0 em que o sujeito se significa, significando a "doença mental"
para outro, etc.
de distintas maneiras, em diferentes modos de subjetivar-se.
Há casos em que esta relação e
flagrante, sendo bastante visível Por essa sobreposiç o, dor de cabeça, doença mental, caboco,
como nesse texto produzido por um doente mental, afetado por demônio, se equivalem.
dois discursos, o do terapeuta e o da igreja (Os
exemplos foram A sobreposição nO Significa que são iguais os sentidos de
coletados por Ana Elisa Bastos
Figueiredo, na realização de seu "minha cabeça dór" /"minha cabeçachora". Há aí deslizamentos
doutorado A
"
Doença Mental e as Religiões Pentecostais" - efeitos metafóricos muito significativos (que cabe ao
realizada no IPUB, na UFRJ): Eu tenho muita dor de
*"
noite eu não
cabeça; de terapeuta interpretar, com oS recursosteóricos disponíveis em
durmo; eu choro,
sonho que minha mãe tinha
eu seu domínio de conhecimento). Do mesmo modo, em* a Pomba
morrido ontem (..) eu choro de noite; eu fico agoniado; eu sonho Gira baixa, eu caio"/"a gente chora na Igreja; é o Espírito Santo",
com lemanjá (..) Eu tenho uma
doença na cabeça; a cabeça me Pomba Gira e Espírito Santo se substituem num sincretismo
dói; eu choro. A Igreja me ajuda; minha cabeça pára de religioso em que novamente duas variedades de discurso, no
chorar.(.)
Quando eu tô lá esses caboco não me perturba; eu tenho fé em caso, religioso, se relacionam mutuamente.
Deus. (...) Eu quero também tomar meu remédio
pra mim ficá Como dissemos, no texto que apresentamos como exemplo, as
bom.". Ou na desse outro, vivendo as mesmas
condições: Eu
"
porque
pressuposição com a Lingüisticaehistórico com as Ciências Não atravessamos o texto para extrair, atrás dele, um
se interessa pelo social e pelo conteúdo. Paramos em sua materialidade discursiva para
tem de mostrar os meios pelos quais se
Sociais, ela também compreender como os sentidos
-
e os sujeitos -
nele se
analítica.
demarca delas em sua prática constituem e a seus interlocutores, como efeitos de sentidos
Diferencia-se da Lingüística, porque não trabalha com as filiados a redes de significação. Eaisso que referimos quando
discursivas Análise Lingüística e Análise de Conteúdo
(formais) mas c o m propriedades na na
marcas dizemos que
å história para significar produtos na Análise de Discurso com os
(materiais) que referem língua trabalha
a com e
se
Em uma palavra, a análise de (dos sujeitos e dos sentidos).
(relação língua-exterioridade). processos de constituição
formas materiais quereúnem forma-
discurso trabalha com as Discurso
e-conteúdo. As marcas formais,
em si, não interessam Enunciação, Pragmática, Argumentação,
Ihe interessa é o modo como e um trånsito constante entre esses
diretamente ao analista. O que Há uma proximidade
no discurso. O que eles têm em comum é que
elas estão no texto, como elas se "encarnam campos de conhecimento.
interesse do analista pela forma-material que lhe os fatos de linguagem por eles
tratados referem a linguagem
Daí o
discursivas. Uma marca como
ao seu exterior. A Pragmática
tem sido considerada de modo
permite chegar às propriedades
ao analista enquanto propriedade, por muitas incluindo enunciação, a
a
a negação só interessa
vezes
mais amplo
tal como podemos
exemplo, do discurso político polêmico, Não é de X argumentação e o discurso. Ora, é preciso distinguirem-se aí
Do ponto de vista dos fatos,
"
que
observar no exemplo de Courtine (1975) Os fatos e os métodos e teorias.
mostra a anterioridade de um
há muito em comum, na medida em que todos
esses campos,
vem a violência é de Y", que
vem a violência". de
discurso que afirmaria "E de X que pelo modo como consideram a linguagem, distinguem-se há
imanente. No entanto,
Pensando-se que X é o Socialismo e Y o Capitalismo, uma abordagem lingüística
investimento nas relações de diferenças bastante nítidas entre eles. A
maneira como
podemoS antever o forte um sujeito
de quem afinal, vem a violência?
sentidos aí estabelecidas: Concebem o sujeito (na enunciação, o sujeito é
sustentam uma ou outra é o sujeito psico-
Quais as posições-sujeitos que origem de si; na argumentação o sujeito
O sujeito é
interpretação (X ou Y)? SOCial; na Análise de Discurso, como vimos,
linguístico-histórico, constituído pelo esquecimento pela
e
Conteúdo,
Por outro lado, à diferença da Análise de
Sociais, 1deologia) e o modo como definem o exterior (na pragmática
instrumento tradicional de análise de textos das Ciências
como um O exterioré o fora e não o interdiscurso) marcam as diferenças
nao é pelo conteúdo que chegamos à compreensão de com suas
""contido" num teóricas, de distintos procedimentos analític0s,
objeto simbólico produz sentidos. O conteúdo Conseqüências práticas diversificadas.
de VIStd
Texto serViria apenas como ilustração de algum ponto
91
Em suma, penso que o que raz a direrença é a própria ção
de língua trabalhada
na analise de discursO-como um sistem.
falhas -e o da ideologia com0 constitutiva tanto o
suieito a
CONCLUSÃO
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