Monografia Corrigida

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 70

SEMINÁRIO TEOLÓGICO PRESBITERIANO

REV. DENOEL NICODEMOS ELLER

HILQUIAS DE ASSIS UHL

COMUNHÃO DOS SANTOS:


A NECESSIDADE DE FAZER PARTE DA IGREJA DE CRISTO

BELO HORIZONTE
2019
HILQUIAS DE ASSIS UHL

COMUNHÃO DOS SANTOS:


A NECESSIDADE DE FAZER PARTE DA IGREJA DE CRISTO

Monografia apresentada ao Seminário Teológico


Presbiteriano Rev. Denoel Nicodemos Eller em
cumprimento às exigências da matéria de
Monografia II e de conclusão do Curso Livre de
Teologia.

BELO HORIZONTE
2019
HILQUIAS DE ASSIS UHL

COMUNHÃO DOS SANTOS: a necessidade de fazer parte da igreja de Cristo

Orientador:____________________________________________________
Nome: Prof. Rev. José da Silva Lapa
Instituição: Seminário Teológico Presbiteriano Rev. Denoel Nicodemos Eller

Examinador:____________________________________________________
Nome: Prof. Rev. Cleverson Gilvan de Oliveira Moreira
Instituição: Seminário Teológico Presbiteriano Rev. Denoel Nicodemos Eller

Examinador:____________________________________________________
Nome: Prof. Rev. Renê Alves Stofel
Instituição: Seminário Teológico Presbiteriano Rev. Denoel Nicodemos Eller

Belo Horizonte, ____/____/_____


AGRADEÇO a Deus, por todo cuidado, amor e providência nesses
quatro anos de formação, tudo é dele, tudo é por ele;
Ao STPRDNE, seu corpo docente e discente, a cada um dos
funcionários desta casa e principalmente àqueles a quem eu tenho o
privilégio de chamar de amigos aqui;
Ao meu orientador Rev. José Lapa da Silva, por ser mais do que um
professor e, de fato, ter o interesse de pastorear as nossas vidas nessa
jornada de ensino;
À minha família, meus pais, Ezequias e Inês, perseverando comigo pela
segunda vez, meus irmãos e cunhados por todo cuidado e carinho nesse
período do seminário, à Rebeca e Misael, meus sobrinhos, por me
permitirem amar;
À Primeira Igreja Presbiteriana de Jacaraípe por não ter me
abandonado nesses quatro anos e ao Presbitério Centro Capixaba –
PRCC, por ter aprovado minha candidatura e me mantido aqui nesse
período;
Ao meu tutor Rev. Carlos Magno da Silva, sem quem eu jamais teria
prosseguido nessa trajetória turbulenta, obrigado por nunca ter me
enganado a respeito das dificuldades aqui;
À Igreja Presbiteriana de Ribeirão das Neves (especialmente,
Congregação Presbiteriana Ebenézer em Esmeraldas) por terem me
adotado como parte de vocês e por terem chegado comigo até o final;
À Igreja Presbiteriana União que estará para sempre marcada na
minha história;
Aos amigos do 304b (versão 2018) e do 303b (versão 2019), vocês
foram meu sustento. Obrigado por me suportarem com todos os
significados disso.
Epígrafe
“Necessitamos um do outro, para sermos nós mesmos.” Agostinho

“Nenhum homem é uma ilha, completo em si próprio; cada ser humano


é uma parte do continente, uma parte de um todo.” John Donne

“E acredito que se tenho tantos amigos, é porque descobri que existe


uma coisa mais importante que ter um amigo: ser um.” Estevão
Queiroga
RESUMO

UHL, Hilquias de Assis. Comunhão dos Santos: a necessidade de ir à igreja. 2019. 52 f.


Trabalho de Conclusão de Curso (Curso Livre de Teologia) – Seminário Teológico
Presbiteriano Rev. Denoel Nicodemos Eller.

A Confissão de Fé de Westminster defende em seu capítulo XXVI que os santos têm comunhão
com Cristo e gozam de suas bençãos em virtude dessa comunhão. Também afirma que os santos
estão unidos uns aos outros em amor e, portanto, devem servir uns aos outros para a mútua
edificação do corpo de Cristo. Olhando para a história da igreja percebe-se que ainda que a
igreja católica arrogue para si o título de igreja do Senhor Jesus Cristo, esta não apresenta as
marcas de uma verdadeira igreja de Cristo e possui um entendimento errôneo de algumas das
características essenciais de si mesma. Com o movimento da Reforma Protestante, a igreja
passou a ser intitulada também “communio sanctorum” – comunhão dos santos. A reunião dos
santos é biblicamente recomendada tanto no Antigo Testamento quanto no Novo Testamento.
Deus criou o seu povo para sua glória, e esse deveria se reunir para o mútuo crescimento de
seus participantes. No AT o registro bíblico mostra que o Senhor se alegrava com a reunião das
tribos tendo inclusive estabelecido em sua lei que o seu povo se apresentasse diante dele. No
NT a igreja primitiva em Jerusalém, bem como, as demais igrejas plantadas por Paulo e outros
evangelistas receberam diversas recomendações a manterem a unidade do corpo de Cristo.
Assim, fica evidente que existe a necessidade de que o povo de Deus se reúna para cultuar a
ele. É importante observar que na pós-modernidade há uma dificuldade por parte das pessoas
de se relacionarem com outras por conta dos pilares que fundamentam e sustentam o
pensamento de tal era: a pluralização, a privatização e a secularização. Com isso, movimentos
de adaptação da igreja ao pensamento pós-moderno têm surgido. Dentre esses, destacam-se: o
movimento da igreja emergente (que visa gerar uma igreja que não é limitada de forma alguma
por uma estrutura organizacional estabelecida) e o movimento dos desigrejados (que defende
não haver necessidade de vínculo com uma igreja). Analisando teoricamente tais movimentos
fica claro que diversos equívocos são cometidos partindo do pressuposto de que tais se declaram
cristãos. Conclui-se, assim, que os santos precisam vincular-se a uma verdadeira igreja de
Cristo, e servir a tal igreja com dons proporcionados pelo Espírito Santo.

Palavras-chave: Comunhão; Comunhão dos Santos; Koinonia; Igreja.


ABSTRACT

UHL, Hilquias de Assis. Comunhão dos Santos: a necessidade de fazer parte da igreja de Cristo.
2019. 52 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso Livre de Teologia) – Seminário Teológico
Presbiteriano Rev. Denoel Nicodemos Eller.

The Westminster Confession of Faith argues in its chapter XXVI that the saints have
communion with Christ and get from his blessings because of that communion. It also states
that the saints are united to each other in love and, therefore, must serve each other to the mutual
embodiment of the body of Christ. Looking at the history of the church it is realized that even
that the Catholic Church to itself the title of Church of the Lord Jesus Christ, it does not show
the marks of a truly church of Christ and it has a wrong understanding of some of its essential
characteristics. With the Protestant Reformation movement, the church also received the title
“communio sanctorum” – communion of saints. The reunion of the saints is biblically
recommended both in the Old Testament and in the New Testament. God has created his people
to his glory, and they should reunite to the mutual development of their participants. In the Old
Testament the biblical register shows that the Lord rejoice with the reunion of the tribes even
stablishing in his law that his people presented themselves before him. In the New Testament
the primitive church, as well as, the other churches planted by Paul and other evangelists
received innumerous recommendations to maintain the unity of the body of Christ. Thus, it is
noticed that there is a need that the people of God reunite to worship him. It is important to
notice that in the postmodernity there is a difficulty by people of relating with other because of
the pillars that have funded and sustain the thinking of that age: the pluralization, the
privatization and the secularization. With those, movements of adaptation of the church to the
postmodern thinking have appeared. Among those, the emergent church movement (which aims
to create a church that is not limited by any organized stablished structure) and the desigrejados
movement (which advocate the unnecessariness of bonding to a church) stand out. Theoretically
analyzing both movements, it leads to see that many misunderstandings are committed
considering that the movements are christian movement. Thus, the conclusion is that the saints
need to bond to a truly church of Christ and serve that church with the gifts conceded by the
Holy Spirit.

Palavras-chave: Communion; Communion of Saints; Koinonia; Church.


Portuguese term to refer to people who are Christians but do not belong to any church and do not see it as needed.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO 1 – A DOUTRINA DA COMUNHÃO DOS SANTOS 12

1.1 COMUNHÃO VERTICAL 14

1.2 COMUNHÃO HORIZONTAL 17

1.2.1 A fiel pregação da palavra 20

1.2.2 A correta ministração dos sacramentos 21

1.2.3 O exercício da disciplina do faltoso 23

CAPÍTULO 2 – A DOUTRINA DA COMUNHÃO DOS SANTOS E A NATUREZA DA

IGREJA 26

2.1 MATER FIDELIUM 26

2.1.1 A unidade 28

2.1.2 A santidade 29

2.1.3 A catolicidade 31

2.2 COMMUNIO SANCTORUM 33

CAPÍTULO 3 – FUNDAMENTAÇÃO BÍBLICO-REFORMADA DA DOUTRINA DA

COMUNHÃO DOS SANTOS 36

3.1 A COMUNHÃO DOS SANTOS NO AT 37

3.2 A COMUNHÃO DOS SANTOS NO NT 42

CAPÍTULO 4 – A DOUTRINA DA COMUNHÃO DOS SANTOS E ALGUNS

EMBATES DA PÓS-MODERNIDADE 49

4.1 A IGREJA EMERGENTE E OS DESIGREJADOS 51


4.2 A COMUNIDADE DA FÉ E A EDIFICAÇÃO DO CORPO 56

CONCLUSÃO 64

REFERÊNCIAS 66
9

INTRODUÇÃO

Escrever sobre a igreja é uma tarefa que abre um campo muito grande de
pesquisa, por isso queremos dedicar nossa reflexão a tratar da necessidade de vínculo à igreja
visível. Faz-se necessário considerar que muitos cristãos são (em sua maioria) apenas
frequentadores de igreja, sem nunca aprofundar-se em entender a natureza e a importância da
existência da igreja de Cristo. Quando leva-se em consideração o contexto da igreja atual, em
que muitas correntes apoiam a não necessidade de que os cristãos se reúnam e tornem-se
membros de uma igreja local, a justificativa desse trabalho encontra-se na necessidade de trazer
à memória alguns aspectos sobre a doutrina da comunhão dos santos e a vitalidade da mesma
para o desenvolvimento do corpo de Cristo, correlacionando-a com a doutrina da igreja. O
embasamento desse trabalho está nos símbolos de fé de Westminster e em obras teológicas
sistemáticas de perspectiva reformada.
O ponto de partida é a afirmação que a Confissão de Fé de Westminster faz em
seu capítulo XXVI, seção II, ao dizer que

Os santos são, pela profissão de fé, obrigados a manter uma santa sociedade e
comunhão no culto de Deus e na realização de outros serviços espirituais que
contribuem para a sua mútua edificação, bem como a socorrer uns aos outros em
coisas materiais, segundo as suas várias habilidades e necessidades”1.

Assim, acredita-se haver a necessidade de que os santos mantenham-se


vinculados à alguma expressão da igreja visível de Cristo, isto é, à alguma igreja local. Não é
parte do objetivo desse trabalho abordar qualquer tipo de denominação ou instituição religiosa,
conquanto sejam abordados de maneira objetiva movimentos evangélicos da pós-modernidade
que opõem-se de alguma maneira, ou, em algum momento a necessidade de vínculo do membro
do corpo de Cristo com uma igreja local. Para isso, precisa-se considerar que existem igrejas
que apresentam as verdadeiras marcas de uma igreja de Cristo, marcas essas que dentro da
perspectiva reformada podem ser resumidas em: fiel pregação da palavra, correta administração
dos sacramentos e exercício de disciplina. Tais marcas apontam diretamente para a necessidade

1
Assembleia de Westminster. Confissão de Fé de Westminster. 17. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p.203.
(a ser referida nas demais notas como CFW).
10

de unidade do corpo de Cristo. Elas não acontecem de forma isolada, não acontecem onde não
há comunidade de fé reunida, não acontecem onde não há comunhão entre os membros. Neste
sentido, essas marcas pressupõem a coletividade do cristianismo.
A igreja é este local onde pessoas diferentes reúnem-se com um mesmo objetivo
(Ef. 4). Veith afirma que “na igreja, algo maravilhoso e profundo acontece. Pessoas de todas as
faixas etárias, todas as profissões e classes sociais se juntam [...] para se unirem em adoração
ao seu Deus [...]. Na igreja, uma variedade infinita de seres humanos [...] está unida em Cristo”2.
A adoração coletiva é um pressuposto lógico da função da igreja, como povo eleito de Deus, e
isto pode ser facilmente visualizado no AT em todos os movimentos que o Senhor promove
reunindo seu povo diante de si. No NT não acontece de maneira diferente. Com o surgimento
da igreja e por causa das reuniões nas sinagogas aqueles que creem em Jesus devem ajuntar-se
para prestar culto ao seu Deus. Prestar seu serviço de adoração como um só povo diante de seu
Deus era o que o Senhor exigia de Israel e o faz a todos os seus escolhidos.
Olhando para a história da igreja e seu desenvolvimento é perceptível que o
conceito de igreja sofreu mudanças dentro do contexto cristão, ao mesmo tempo em que
também mudavam, por exemplo, o seu formato de culto, a inserção de novos membros no corpo
de Cristo, dentre outras coisas. Surgiram novos formatos de igreja bem como novas formas de
se cultuar a Deus, inclusive através do culto de um único indivíduo. Faz-se necessário o
apontamento de que esse mandamento bíblico de comunhão vem sendo negligenciado por
muitos “cristãos” atualmente. Os novos formatos e modelos de igreja têm sido aceitos e se
desenvolvem significativamente, os conhecidos “desigrejados” – cristãos que não acreditam ser
necessário vincular-se a nenhuma igreja reconhecida e denominacional – podem ser citados
como exemplo disso.
De acordo com uma pesquisa realizada pelo IBGE – Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística divulgada em 2010, o número de pessoas que se declaram crentes (de
perspectiva cristã) sem vínculo com igrejas passava de 4 milhões3. No corpo do trabalho
utilizaremos também informações divulgadas na revista Ultimato em Nov. de 2018 que diz que
esse número ultrapassa a casa dos 10 milhões. Essa nova categoria de cristãos que não
pertencem a qualquer denominação já é considerada como a categoria de evangélicos que mais
cresce. Várias hipóteses podem ser levantadas a respeito da causa primaria desse crescimento,

2
VEITH, JR., Gene Edward. De todo o entendimento: pensando como cristão num mundo pós-moderno.
Tradução de Sachudeo Persuad. São Paulo: Cultura Cristã, 2006.
3
Revista Teologia Brasileira (Online). Nilismo eclesiástico: uma análise do movimento dos desigrejados.
Publicado em 17 jun. 2014. Disponível em: https://teologiabrasileira.com.br/teologia-brasileira-29-2014/. Acesso
em: 21 jul. 2019.
11

entre elas estão: o engano de que se pode abrir mão de doutrinas essenciais; a insaciável busca
por uma experiência religiosa sobrenatural; a negociação de verdades imutáveis do
cristianismo; o liberalismo teológico e filosófico; a apostasia de quem nunca se firmou na
verdade.
Por isso, torna-se importante, à luz da palavra de Deus, da história da igreja e
das confissões, averiguar se há ou não a necessidade de que os eleitos de Deus Pai para salvação
em Jesus Cristo, seu Filho, façam parte de uma comunidade cristã – igreja. Assim, este trabalho
tem como objetivo pesquisar sobre a necessidade de vínculo a uma comunidade evangélica por
parte dos eleitos de Deus visando à edificação do corpo de Cristo. De uma forma geral, visa
também apontar como a teologia reformada enxerga e defende a necessidade de que os eleitos
de Deus tenham comunhão uns com os outros de maneira que desenvolvam o corpo de Cristo:
a Igreja. Dentre os objetivos específicos deste trabalho destacam-se: a) apresentar uma pesquisa
a respeito da doutrina da comunhão dos santos; b) relacionar a doutrina da comunhão dos santos
à natureza da igreja; c) considerar o que a bíblia diz em ambos os testamentos a respeito da
comunhão dos eleitos de Deus; e, d) responder a correntes que não consideram a doutrina da
comunhão dos santos, no sentido horizontal, como essencial ao crescimento e desenvolvimento
do cristão.
A clareza do texto confessional, supracitado, conduz ao entendimento que os
eleitos de Deus mantêm obrigatoriamente uma “santa sociedade e comunhão no culto de Deus”
objetivando em tudo a edificação da igreja, corpo de Cristo, de forma plena. E, é exatamente
através dessa comunhão que os santos têm com Cristo comunhão nas suas graças. A
metodologia utilizada para alcançar os objetivos propostos será uma pesquisa bibliográfica
dialogando com as Escrituras, com a CFW, e, com teólogos reformados, utilizando notas de
rodapé para referenciar autores e explicar termos específicos.
12

CAPÍTULO 1 – A DOUTRINA DA COMUNHÃO DOS SANTOS

Tratar sobre a comunhão dos santos passa, primeiramente, por uma definição
epistemológica. O núcleo dessa frase é a palavra comunhão. Para Hodge4, comunhão significa
“um intercâmbio mútuo de ofícios entre as partes, a qual emana de um princípio comum em
que se acham unidas. A natureza e o grau da comunhão dependerão da natureza e da intimidade
da união da qual ela procede”5. Daí, entende-se que o termo comunhão tem a ver com união de
princípios, correlação, compartilhar.
Quanto a conotação do adjetivo “santos”, referido na doutrina que lida com essa
união de princípios, é imprescindível que seja considerado o que as Escrituras afirmam a
respeito dessa santidade. Santos são aqueles que são/foram “separados” por Deus como seu
povo, isso fica claro desde o momento em que o Senhor separa Israel como sua nação especial,
ele diz a Moisés:

Agora, pois, se diligentemente ouvirdes a minha voz e guardardes a minha aliança,


então, sereis a minha propriedade peculiar dentre todos os povos; porque toda a terra
é minha; vós me sereis reino de sacerdotes e nação santa. São estas as palavras que
falarás aos filhos de Israel. (Ex. 19.5-6)6

Esse fato também é ecoado por Pedro em sua primeira carta (Cf. 1Pe. 2.9-10) e
por Paulo que defende a eleição dos santos desde antes da fundação do mundo: “assim como
nos escolheu, nele, antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante
ele;” (Ef. 1.4)7. Horton8 diz que “tudo o que está em Cristo é santo como ele é, porque ele é a
sua santificação (1Co 1.30-31)”9, tendo anteriormente afirmado que a santidade da igreja é

4
Archibald Alexander Hodge (1823-1886) foi um ministro e teólogo presbiteriano, ocupou a cadeira de Teologia
Didática e Exegética no Princeton Theological Seminary até a sua morte em 1886.
5
HODGE, Alexander A. Confissão de Fé de Westminster comentada por A. A. Hodge. 3. ed. Tradução de
Valter Graciano Martins. São Paulo: Os Puritanos, 2010, p.436.
6
BÍBLIA Sagrada. Traduzida por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2. ed. Barueri:
Sociedade Bíblia do Brasil, 2011, p.78. (grifo nosso).
7
BÍBLIA, 2011, p.1885.
8
Michael Horton é autor de diversos livros, professor de Teologia Sistemática e de Apologética no Westminster
Seminary – California, e pastor auxiliar da Christ United Reformed Church, Califórnia.
9
HORTON, Michael. Doutrinas da fé cristã. Traduzido por João Paulo Thomaz de Aquino. São Paulo: Cultura
Cristã, 2016, p.911.
13

derivada do fato de que ela é composta por aqueles que são chamados para serem santos,
escolhidos, redimidos, justificados e no processo de serem santificados pelo seu Espírito10.
Calvino11 coloca a santidade da igreja em relação a sua peregrinação aqui nesta
terra, ele diz que “assim é santa a Igreja: visto que avança diariamente, ainda não é perfeita,
está fazendo progresso diariamente, contudo ainda não chegou à meta de santidade [...]”12.
Portanto, os santos são os eleitos por Deus para a salvação, aqueles que obtém os benefícios
alcançados por Cristo em seu sacrifício, e, consequentemente, pertencentes à Igreja de Cristo,
que está em peregrinação aqui na terra e que dia após dia em sua luta contra a carne, o mundo
e o diabo busca a santificação sem a qual ninguém verá o Senhor (Cf. Hb. 12.14).
Calvino também afirma que a expressão comunhão dos santos “embora fosse
ordinariamente omitida pelos antigos13, contudo não pode ser negligenciada, uma vez que
exprime excelentemente a natureza da Igreja”14. Ele explica dizendo que os santos que foram
agregados à sociedade de Cristo devem agir sob a norma de que todas as graças, dons, bênçãos,
recebidos da parte de Deus precisam ser por eles compartilhados entre si. O reformador
continua: “no próprio termo comunhão há muito de consolação, porque, enquanto foi
estabelecido que a nós pertence tudo quanto o Senhor doa aos seus e a nossos membros, assim
nossa esperança se confirma com os bens que eles possuem”15.
Enquanto Matos16 define comunhão dos santos como “o vínculo de convicções
compartilhadas, solidariedade e amor que caracteriza os verdadeiros cristãos”17, outra definição
possível é a retirada do devocionário Cada Dia de Agosto de 2009, que diz o seguinte: “a
comunhão cristã [comunhão dos santos] é vida compartilhada e comunicada no plano espiritual,
onde experimentamos a presença e o poder de Cristo”18. Assim, não se pode negar que a
comunhão dos santos está definitivamente subordinada à obra de Cristo. Essa afirmação não
está longe do que é apresentado a respeito desta doutrina pela CFW. Todavia, a afirmação da
comunhão com relação a obra de Cristo aponta para apenas um dos aspectos dessa doutrina,

10
HORTON, 2016, p.911.
11
João Calvino (1509-1564) foi um teólogo francês, precursor do pensamento reformado principalmente na Suíça,
conhecido como aquele de quem originou-se o calvinismo – sistema doutrinário de teologia.
12
CALVINO, João. As Institutas. Tradução de Waldir Carvalho Luz. 2.ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v.4,
p.42.
13
Quando e como essa expressão apareceu no cenário teológico será abordado no segundo capítulo.
14
CALVINO, 2006, p.27.
15
Ibid, p.28.
16
Alderi Souza de Matos é um professor, teólogo, historiador, pastor, escritor e apresentador televisivo
presbiteriano brasileiro, que é atualmente o historiador oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil.
17
MATOS, Alderi Souza de. Creio na Comunhão dos Santos, na santa igreja. Disponível em:
http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/326/creio-na-comunhao-dos-santos-a-relevancia-primordial-da-
igreja/comun%E3o. Acessado em: 01 de abr. 2019.
18
CADA DIA, Volume 29, nº 08, agosto de 2009. Campinas: LPC Comunicações. Devocional do dia 13 de agosto.
14

aquele que diz respeito a união dos eleitos com Cristo e será abordado nessa primeira sessão do
capítulo, e em seguida, na segunda sessão, será apresentado como essa união com Cristo afeta,
influencia e promove a união dos eleitos de uns com os outros.

1.1 COMUNHÃO VERTICAL

O capítulo XXVI é o capítulo da CFW que aborda a comunhão dos santos, e, em


sua primeira seção, diz que:

Todos os santos que, pelo Espírito de Deus e pela fé, estão unidos a Jesus Cristo, seu
Cabeça, têm comunhão com Ele nas suas graças, nos seus sofrimentos, na sua morte,
na sua ressurreição e na sua glória, e, estando unidos uns aos outros no amor,
participam dos mesmos dons e graças19.

Veja que a comunhão dos santos diz respeito àquilo que os eleitos desfrutam em
Cristo, por meio de Cristo, através de Cristo e para Cristo. A doutrina refere-se aos santos que
estão unidos a Jesus Cristo. Essa comunhão com Cristo une os “santos” à cabeça do corpo de
maneira que eles participam dos mesmos dons e graças de Cristo. Essa comunhão que os santos
têm com Cristo é conhecida como “união mística” e “é efetuada pelo Espírito Santo de maneira
misteriosa e sobrenatural”20, razão pela qual recebe essa denominação de acordo com
Berkhof21.
Berkhof também afirma que a teologia reformada lida com a união mística
subjetivamente, dizendo respeito à “união federal de Cristo e os que lhe pertencem no conselho
da redenção, [...] e da união efetuada objetivamente na encarnação e na obra redentora de
Cristo”22. Isto é, objetivamente, os santos alcançaram na cruz de Cristo aquilo que já lhes havia
sido concedido subjetivamente desde a eternidade. Isso é importante para a proposta deste
trabalho, pois significa que

19
Assembleia de Westminster. Confissão de Fé de Westminster. 17. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p.202
(grifo nosso).
20
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Tradução de Odayr Olivetti. 4. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012,
p.413.
21
O Dr. Louis Berkhof (1873-1957) nascido na Holanda, imigrou para os Estados Unidos e tornou-se um dos mais
notáveis teólogos do século XX. Foi presidente e professor do Calvin Theological Seminary, em Michigan.
22
BERKHOF, 2012, p.413.
15

[...] idealmente, este corpo, que é a Igreja, já estava formado na aliança da redenção,
e isto em união com Cristo, e esta união possibilitou que todas as bênçãos merecidas
por Cristo pudessem ser passadas, de maneira orgânica, para aqueles que ele
representou [...]. A Igreja toda estava incluída nele como Cabeça23.

A igreja unida a Cristo goza das bênçãos alcançadas por ele, por seu mérito, porque é com ele
um só corpo. E de que maneira essas bênçãos são derramadas sobre a Igreja? A teologia
reformada crê que isso aconteça através da pessoa do Espírito Santo conforme será mostrado a
seguir.
Horton diz que o Espírito começa a “distribuir os bens [de Cristo quando os
cristãos são] declarados objetivamente como herdeiros justos do reino [e assim,] recebem
imediatamente os benefícios subjetivos de seu enxerto vital na Videira que dá vida”24. O
Espírito Santo é o responsável pela união dos eleitos com Cristo, afinal de contas “o Espírito
Santo é o elo pelo qual Cristo nos vincula efetivamente a si”25. Ele é aquele que “vence a
distância entre [os eleitos] e o Salvador ressurreto, fazendo efetiva [a] união sacramental”26.
Assim, o Espírito Santo também será o responsável pela união dos cristãos um ao outro através
da união dos mesmos com Cristo. A comunhão dos eleitos uns com os outros só pode ser
produzida mediante a ação do Espírito na igreja que faz com que ela frutifique o que, de fato,
produz o desenvolvimento de todo o corpo (Cf. Rm. 12.3-21; Gl. 5.22-26). “Visto que todas as
obras externas de Deus são feitas pelo Pai, no Filho, por meio do Espírito”27, no que tange a
comunhão dos santos não poderia ser de outra maneira. Por isso, Horton também afirma que
“todos aqueles que são justificados estão unidos a Cristo e se tornam produtores de frutos”28.
Em concordância, Costa29 afirma que “a unidade da Igreja existe porque a Igreja
é o Corpo de Cristo; portanto, ela está fundamentada em Cristo que a criou, a alimenta e dirige
(Rm 12.5; Ef 1.23; Cl 1.24). Portanto, a unidade cristã passa necessariamente pela união
mística: estamos unidos definitivamente a Cristo”30. Thompson31 também comenta esse fato e
diz que “a igreja [...] trata-se de pessoas que foram primeiro chamadas à comunhão com Cristo

23
BERKHOF, 2012, p.414.
24
HORTON, 2016, p.622.
25
CALVINO, João. As Institutas. Tradução de Waldir Carvalho Luz. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v.3,
p.20.
26
HORTON, Michael S. Um Caminho Melhor. Tradução de Wadislau Martins Gomes. São Paulo: Cultura Cristã,
2007, p.136.
27
HORTON, 2016, p.627.
28
Ibid.
29
Hermisten Maia Pereira da Costa é pastor presbiteriano, teólogo calvinista e escritor. Foi coordenador do
Departamento de Teologia Sistemática no Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição.
30
COSTA, Hermisten Maia Pereira da. Eu Creio: no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São José dos Campos:
Fiel, 2014, p.504.
31
James Thompson foi instrutor no Centro de Estudos Bíblicos da Universidade do Texas, EUA. Diplomou-se no
Seminário Teológico de Nova York e recebeu o doutorado em 1974, especializando-se em NT.
16

Jesus e depois passaram a congregar-se”32 – e ele conclui esse raciocínio afirmando que os
cristãos, então, pertencem uns aos outros porque primeiro pertencem a Cristo33. A comunhão
dos santos está intrinsicamente ligada à união mística dos cristãos com Cristo, enquanto seu
Salvador. Assim, a comunhão entre os santos reunidos na igreja de Cristo só é possível por
causa de Cristo, que é a cabeça do corpo, e porque o corpo está devidamente ligado a ele, que
o criou, o sustenta e o governa perfeitamente através de seu Santo Espírito. Por isso, Berkhof
diz que em virtude desta união promovida através do Espírito Santo, os crentes têm comunhão
com Cristo34, isto é, a comunhão vertical.
Horton coloca que “essa união com Cristo é muito mais rica do que qualquer
noção de vida cristã como uma imitação de Cristo”35, isto é, não se trata apenas de os cristãos
imitarem seu mestre naquilo que ele fez – ser como ele, – porém, está mais relacionada ao fato
de receberem os donativos oriundos de sua obra sacrificial na cruz – desfrutar do que ele já fez.
Todavia, uma breve ressalva precisa ser feita aqui porque a própria CFW, na
seção III do capítulo XXVI, aponta que “esta comunhão que os santos têm com Cristo não os
torna, de modo algum, participantes da substância da sua Divindade, nem iguais a Cristo em
qualquer respeito; afirmar uma ou outra coisa, é ímpio e blasfemo”36. De acordo com Horton,
esse é um erro cometido pelas “teologias contemporâneas para as quais a união com Cristo se
torna outro modo para fundir a essência do cristão (ou da igreja) com a divindade” 37. Por isso,
ele vai ser tão enfático ao ressaltar essa distinção. Ele afirma que os cristãos enquanto igreja
não são “um Cristo (methexis), mas um em Cristo (koinonia), e isso é, em última análise, o
resultado da escolha de Deus em vez da nossa”38. É relevante que esta distinção seja feita porque
está incluído neste trabalho também o aspecto da comunhão, presente no texto de Efésios em
que Paulo almeja que toda a Igreja alcance a perfeita varonilidade, a medida da estatura da
plenitude de Cristo (Ef. 4.13)39. A igreja não é Cristo, entretanto, goza de bênçãos especiais
através dele, conquanto mantenha a devida união fraterna entre os membros do corpo.
Horton diz que “os efeitos da nossa união com Cristo são a justificação, a
santificação e a glorificação. Além da comunhão do cristão individual com Cristo, essa união

32
THOMPSON, James. Nossa Vida Juntos: um olhar para a fraternidade cristã. Tradução de Neyd Siqueira. São
Paulo: Vida Cristã, 1983, p.43.
33
THOMPSON, 1983, p.43.
34
BERKHOF, 2012, p.417.
35
HORTON, 2016, p.622.
36
WESTMINSTER, 2001, p.204.
37
HORTON, 2016, p.894.
38
Ibid.
39
BÍBLIA, 2011, p.1187.
17

estabelece uma koinonia celestial (i.e., escatológica) entre os cristãos”40. A união dos eleitos
com Cristo estabelece a união de uns com os outros como irmãos, membros do mesmo corpo,
o corpo de Cristo.

1.2 COMUNHÃO HORIZONTAL

O segundo aspecto da comunhão dos santos também pode ser visto na seção I
que a CFW traz em seu capítulo XXVI. Observe:

Todos os santos que, pelo Espírito de Deus e pela fé, estão unidos a Jesus Cristo, seu
Cabeça, têm comunhão com Ele nas suas graças, nos seus sofrimentos, na sua morte,
na sua ressurreição e na sua glória, e, estando unidos uns aos outros no amor,
participam dos mesmos dons e graças41.

O elemento de destaque para o estudo deste trabalho é a qualificação que é


colocada apontando o fato de que os santos unidos a Cristo participam de seus dons e graças
enquanto estão unidos uns aos outros no amor.
De que maneira a expressão unidos [...] no amor poderia ser considerada? Há
um entendimento errôneo da doutrina da comunhão dos santos pelo romanismo. Embora estes
afirmem que “o termo ‘comunhão dos santos’ tem, pois, dois significados intimamente
interligados: ‘comunhão nas coisas santas (sancta)’ e ‘comunhão entre as pessoas santas
(sancti)’ [...] ”.42 No que diz respeito a comunhão que os santos em vida têm com os que já
morreram, o catecismo da igreja romana afirma que “pelo fato dos habitantes do céu estarem
unidos mais intimamente com Cristo, consolidam com mais firmeza [a] santidade de toda a
Igreja. Eles não deixam de interceder por nós ao Pai, apresentando os méritos que alcançaram
na terra”.43 Com tal posição não é possível manter concordância, porque não há qualquer
respaldo bíblico para que se creia que os eleitos que já foram colhidos pelo Senhor intercedam
pelos demais eleitos que ficaram aqui na terra. E, segundo, porque a Bíblia ensina de maneira
inquestionável que não há nada que os eleitos tenham alcançado por seus próprios méritos e
que as graças que são derramadas sobre eles, o são por causa do Filho perfeito de Deus, Cristo

40
HORTON, 2016, p.648.
41
WESTMINSTER, 2001, p.202 (grifo nosso).
42
Confederação Nacional dos Bispos do Brasil. Catecismo da Igreja Católica. São Paulo: Edições Loiola, 1999,
p.269.
43
Catecismo da Igreja Católica, p.270.
18

Jesus, que deu sua vida por muitos. Isso é o que Paulo afirma em sua carta aos Colossenses:
“agora, porém, vos reconciliou no corpo da sua carne, mediante a sua morte, para apresentar-
vos perante ele santos, inculpáveis e irrepreensíveis,”44, mostrando que o que os cristãos
desfrutam em morte é apenas alcançado por meio de Cristo. Inclusive, o entendimento errôneo
que os romanistas têm desta doutrina é uma das justificativas utilizadas pela ICAR quanto a
oração aos mortos, e das missas de sétimo dia, conforme afirma o catecismo: “veneramos a
memória dos habitantes do céu [...] ainda mais para corroborar a união de toda a Igreja no
Espírito”45.
O próprio texto confessional traz luz ao entendimento da expressão unidos em
amor. Na seção II do capítulo XXVI, a CFW afirma que “os santos são, pela profissão de fé,
obrigados a manter uma santa sociedade e comunhão no culto de Deus e na realização de outros
serviços espirituais que contribuem para a sua mútua edificação [...]”46. Há uma obrigação por
parte dos santos, separados por Deus desde a eternidade como seu povo especial, de
participarem do corpo visível de Cristo, a Igreja, enquanto trabalham em conjunto para a
edificação desse corpo. Essa união de amor é uma união que promove o serviço que gera
crescimento mútuo, isto é, edificação do corpo de Cristo.
Berkhof, comentando a respeito das características da união que os santos
mantém com Cristo, afirma que uma delas consiste no fato de que tal união pode ser considerada
orgânica47, e ao explicar de que maneira Cristo e os crentes formam um corpo, ele diz que:
“cada parte do corpo serve a cada uma das outras partes e por estas é servido, e juntas são
subservientes ao todo numa união que é indissolúvel”48. Ou seja, a união dos santos com Cristo
os torna automaticamente unidos ao seu corpo (a Igreja), e assim, uns aos outros. Essa união
como destaca Berkhof é uma união de serviço.
O apóstolo Paulo trata da questão da edificação do corpo em sua carta aos
efésios, no capítulo 4. A expressão que ele utiliza lá é similar a confessional, ele diz que o corpo
“efetua o seu próprio aumento para a edificação de si mesmo em amor”49 (Ef. 4.16). Calvino, a
respeito disso, traz um apontamento interessante ao falar sobre o capítulo 4 da carta em questão.
Ele afirma que há pelo menos três considerações importantíssimas a serem feitas a respeito
disso, sendo elas:

44
BÍBLIA, 2011, p.1195.
45
Catecismo da Igreja Católica, p.269.
46
WESTMINSTER, 2008, p.203.
47
BERKHOF, 2012, p.415.
48
Ibid.
49
BÍBLIA, 2011, p.1187.
19

Toda a vida ou saúde que se difunde através dos membros emana da Cabeça; de sorte
que os membros são apenas assistentes. A segunda consiste em que, mediante
distribuição, a limitada contribuição de cada um demanda comunicação entre si. A
terceira consiste em que, sem o amor mútuo, o corpo não pode desfrutar de saúde. E
assim ele [Paulo] diz que, através dos membros, como que através de condutores, da
Cabeça flui tudo quanto é necessário para a nutrição do corpo. 50

Note que a afirmação de Calvino está colocada sob a base de que o corpo
depende de Cristo o seu cabeça, contudo, está também presente a ideia de que os membros
desse corpo são interligados e dependentes uns dos outros. Apenas quando há comunicação de
graças entre esses membros é que há edificação (saúde) do corpo. Isso só é possível conquanto
os membros entendam que cada um deve colaborar fazendo a sua parte em amor uns para com
os outros. O amor uns aos outros traz serviço mútuo que gera o crescimento e a saúde do corpo.
Dever51 tem se tornado uma referência no que diz respeito a ideia de “igreja
saudável”. Sendo que em sua obra mais conhecida, “9 marcas de uma igreja saudável”, ele traz
a memória de seus leitores que alguns pensadores no movimento da reforma haviam pensado
em algumas marcas principais que distinguiam a igreja de Cristo. Pode-se observar isso no texto
da confissão Belga que traz essa afirmação ao dizer que a verdadeira igreja “mantém a pura
pregação do Evangelho, a pura administração dos sacramentos como Cristo os instituiu e o
exercício da disciplina eclesiástica para castigar pecados”52. Dever utiliza-se disso, ele cita
Clowney53 para apresentar um resumo das principais marcas de uma igreja saudável, sendo
elas: “a pregação da Palavra, a observação adequada dos sacramentos e o fiel exercício da
disciplina eclesiástica”.54 Calvino enquanto professa crer apenas nas duas primeiras marcas,
contudo, acredita que a disciplina esteja inserida na administração dos sacramentos conforme
será elucidado quando tal marca for comentada.
É interessante observar como cada uma dessas marcas está diretamente
relacionada a comunhão dos membros do corpo de Cristo um com o outro, a comunhão
horizontal.

50
CALVINO, João. Gálatas – Efésios – Filipenses – Colossenses. Tradução de Valter Graciano Martins, 2.
reimpr. São José dos Campos: Fiel, 2018, p.306. (grifo nosso)
51
Mark Dever é pastor da Igreja Batista Central de Capitol Hill (EUA), Mestre em Divindade pelo Gordon Conwell
Theological Seminary e em Teologia pelo Southern Baptist Theological Seminary, Ph.D em História Eclesiástica
na Universidade de Cambridge.
52
DE BRÉS, Guido. e URSINUS, Zacarias. Confissão Belga e Catecismo de Heidelberg. Tradução Missão
Reformada no Brasil. 2.ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2005, p.27.
53
Edmund P. Clowney é professor emérito de teologia prática e ex-presidente do Westminster Theological
Seminary, na Filadélfia.
54
CLOWNEY apud DEVER, Mark. Nove Marcas de Uma Igreja Saudável. São José dos Campos: Editora Fiel,
2007, p.24.
20

1.2.1 A fiel pregação da Palavra

A primeira marca é a fiel pregação da Palavra. Calvino diz que “onde quer que
vemos a Palavra de Deus ser sinceramente pregada e ouvida [...] aí de modo algum há de
contestar-se que está presente uma igreja de Deus”55. Concordando com a vigência desta como
uma marca distintiva da verdadeira igreja de Deus. E, não apenas isso, Dever, especialmente,
dá ênfase a essa marca quando vai separar as marcas de uma igreja saudável. Ele diz que essa
“é [a marca] mais importante de todas as marcas, porque se você desenvolvê-la corretamente,
todas as outras a seguirão”56, o que ele explica dizendo que quando se estabelece a prioridade
da Palavra, se está colocando no seu devido lugar o aspecto mais importante e singular da vida
da igreja57.
A fonte da fiel pregação da Palavra não pode ser outra, senão as Sagradas
Escrituras, conforme afirma Elwell58 citando Wright59, “estamos resolutos, pela graça de Deus
e com a sua ajuda, a permanecermos exclusivamente na Palavra de Deus, no santo evangelho
contido nos livros bíblicos [...]. Somente essa Palavra deve ser pregada, e nada que seja
contrário a ela. É a única verdade”60. Somente a Palavra de Deus deve ser exposta aos cristãos
para que estes sejam edificados através dela. Toda doutrina cristã está baseada nela, por isso,
essa marca torna-se essencial a reunião do povo de Deus.
É interessante a distinção dessa marca sobre as outras porque, de fato, a palavra
de Deus precisa ser o princípio, aquilo que vai orientar todas as demais coisas. Outro fato que
chama a atenção quanto a essa marca pode ser visto nas palavras de Dever de que “ele [Jesus]
cria um povo diferente, pessoas que mostram em si mesmas a vida de Deus, à medida que
ouvem sua Palavra e, por sua graça, respondem a ela”61. O que está sendo pontuado aqui por

55
CALVINO, 2006, v.4, p.34.
56
DEVER, 2007, p.40.
57
Ibid.
58
Walter Elwell é professor emérito do Wheaton College, onde atuou por quase trinta anos como professor de
Bíblia e Teologia. Atualmente, é consultor da Evangelical Christian Publishers Association e da Evangelical Book
Club.
59
David F. Wright foi um historiador nascido na Inglaterra, que lecionou por quase meio século no New College
da Universidade de Edimburgo.
60
ELWELL, Walter A. (org.). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã. São Paulo: Vida Nova, 1990,
v. 3, p.194.
61
DEVER, 2007, p.49.
21

Dever é que através da proclamação da palavra de Deus há mudança de vida, há possibilidade


de salvação, por isso essa é a principal marca, que precisa ter maior evidência na vida da igreja,
e que é, claramente, um dos serviços com o qual os membros do corpo servem uns aos outros.
A respeito da pregação fiel do Evangelho no contexto da comunidade da fé
Bonhoeffer62 afirma que

“o cristão precisa do cristão que lhe diga a palavra de Deus, e necessita dele
constantemente, quando a incerteza e o desânimo o assediam, pois não poderá ajudar
a si mesmo sem burlar a verdade. Necessita do irmão como portador e proclamador
da Palavra salvífica de Deus”63.

Isto é, para que a palavra de Deus seja fielmente exposta e confronte nosso
coração pecador precisamos que ela também seja proclamada a nós por outros irmãos,
comungantes do corpo de Cristo conosco.
Os símbolos de fé adotados pela IPB – Igreja Presbiteriana do Brasil – também
tratam especificamente da pregação da palavra de Deus. Na pergunta 70, o Breve Catecismo,
aponta para a responsabilidade da igreja na pregação da palavra como meio deixado por Jesus
para que os eleitos sejam alcançados. “Como a Palavra se torna eficaz para a salvação? R. O
Espírito de Deus torna a leitura, especialmente a pregação da Palavra, meios eficazes para
convencer e converter os pecadores, para os edificar em santidade e conforto, por meio da fé
para a salvação”.64 O meio eficaz dos pecadores serem convertidos é a pregação da palavra. E
não apenas isso, mas também de que eles sejam edificados, fortalecidos em santidade. Essa
palavra é proclamada a um determinado membro do corpo por outro membro do corpo que
tenha sido habilitado pelo Espírito Santo para ensiná-la (Cf. Ef. 4.7-16).

1.2.2 A correta ministração dos sacramentos

A segunda marca distintiva da verdadeira igreja no texto da Confissão Belga é a


pura administração dos sacramentos, será considerada aqui a afirmação da CFW de que “há
apenas dois sacramentos ordenados por Cristo, nosso Senhor, no Evangelho: O Batismo e a

62
Dietrich Bonhoeffer (1906-1945) estudou teologia em Tübingen e Berlim, em 1927. Foi diretor do Seminário
Teológico da Igreja Confessante, em Finkenwalde, e professor na Universidade de Berlim.
63
BONHOEFFER, Dietrich. Vida em Comunhão. 7. ed. São Leopoldo: Sinodal, 1997, p.14.
64
WESTMINSTER, O Breve Catecismo de Westminster. São Paulo: Cultura Cristã, 1995, p.70. (grifo nosso)
22

Ceia do Senhor”65. Cristo deixou esses dois sacramentos e conforme afirma o Catecismo Maior
de Westminster na resposta à pergunta 176 “os sacramentos do batismo e da Ceia do Senhor
concordam [...] em ser Cristo e os seus benefícios a parte espiritual de ambos, [...] e em que eles
devem permanecer na igreja de Cristo até a sua segunda vinda”66.
Isto é, os sacramentos precisam ser administrados pela igreja, ou “na” igreja –
entendida aqui como onde se reúnem os santos, membros do corpo de Cristo, do qual nos
tornamos parte através do batismo (Cf. Mt 18.19). Calvino também deixa isso claro quando
afirma que “o batismo é o sinal de iniciação pelo qual somos recebidos à sociedade da Igreja
para que, enxertados em Cristo, sejamos contados entre os filhos de Deus”67. A respeito do
Batismo, Dever afirma que “quando uma pessoa é batizada, está assumindo o compromisso
responsável de seguir a Cristo - e grande parte desse compromisso envolve amar outros crentes
[...] é um compromisso que você assume, porque fazer isso é parte de seguir a Jesus”68. Assim,
vê-se como o sacramento do batismo é um compromisso assumido por um dos eleitos de Cristo
junto a outros membros do corpo de Cristo, apontando assim para a comunhão horizontal,
contudo o próprio Dever faz a ressalva de que isso é parte do que significa seguir a Jesus, ou
seja, é derivado da comunhão do cristão com ele.
Packer69 comentando a respeito do pedobatismo diz que “se as crianças
compartilham o status da aliança com seus pais, é apropriado – sendo as demais coisas iguais –
dar-lhes o sinal desse status e de seu lugar na comunidade da aliança, sendo inapropriado para
a Igreja impedi-lo”70. Ele afirma que a Igreja não deve impedir o sinal (batismo) sobre as
crianças, de tal forma que, essas crianças também fazem parte e desfrutam de alguns dos
benefícios da comunhão dos santos, Packer continua dizendo que as crianças batizadas “serão
então preparadas para viver para o Senhor e levadas ao ponto de professarem publicamente sua
fé, por sua própria decisão [...]. Depois disso, elas desfrutarão pleno status comungante [...]”71.
Thompson afirma, a respeito dos sacramentos, que “no batismo, o cristão passa
a participar do destino de Jesus – na sua morte e ressurreição (Rm 6.5). Na Ceia do Senhor ele
se torna o amigo íntimo de Cristo, e assim “participa” de sua morte a nosso favor, pois é nela

65
WESTMINSTER, 2001, p.209.
66
BEEKE, Joel; e FERGUNSON, Sinclair. Harmonia das Confissões Reformadas. São Paulo: Cultura Cristã,
2006, p.211.
67
CALVINO, 2006, v.4, p.293.
68
DEVER, Mark e DUNLOP, Jamie. A Comunidade Cativante: onde o poder de Deus torna uma igreja atraente.
Tradução de Francisco Wellington Ferreira. São José dos Campos, SP: Fiel, 2016, p.72.
69
Dr. James Innell Packer é professor de Teologia no Regent College em Vancouver, British Columbia, Canadá e
ministro ordenado da Igreja Anglicana.
70
PACKER, James Innell. Teologia Concisa. Tradução de Rubens Castilho. São Paulo: Cultura Cristã, 2014,
p.183.
71
PACKER, 2014, p.183.
23

que partilhamos dessa morte e dos benefícios da salvação”72. Horton comentando a exortação
que Paulo traz aos coríntios a respeito da ceia do Senhor, afirma que ela não apenas é “um
sacramento que significa e sela a união do crente com Cristo, que oferece o corpo e o sangue
de Cristo”, mas que também é um sacramento “que testifica e, de fato, fortalece a unidade do
corpo de Cristo”73. Horton está afirmando exatamente o que está sendo proposto aqui, a santa
ceia conquanto seja um elemento que aponta para a união dos eleitos com Cristo, também o faz
com relação à união dos eleitos uns com os outros, sendo ela, o elemento que de fato fortalece
essa unidade.
Observa-se aqui que os eleitos são unidos uns ao outros por causa de sua união
com Cristo, que é confirmada nos sacramentos como apontado por Thompson e pelo CMW na
pergunta 177 que diz que eles foram instituídos “para ser sinal e selo da nossa regeneração e
união com Cristo”74. Todavia, Thompson também diz que “a Ceia do Senhor representa mais
do que uma comunhão vertical com Deus. Ela dá também ocasião para que os irmãos se
lembrem do relacionamento íntimo com seus irmãos e irmãs”75, mostrando assim a relevância
da comunhão dos santos na correta administração dos sacramentos que é uma das marcas da
igreja verdadeira.

1.2.3 O exercício da disciplina do faltoso

E a terceira marca, o exercício da disciplina do faltoso, também aponta para a


doutrina da comunhão dos santos. Essa marca foi acrescentada no mesmo período em que
Calvino apresentara as duas primeiras marcas como sendo as marcas de uma igreja verdadeira,
e ele também diz que é amplamente reconhecido que o exercício da disciplina correta esteja
implícito na segunda marca – a correta ministração dos sacramentos76.
O exercício da disciplina do faltoso é, dentre as marcas da verdadeira igreja, o
que necessariamente está mais vinculado ao laço da comunhão dos santos. Basta refletir acerca
do texto de Mateus 18, onde um irmão deve procurar o outro, ou mesmo as cartas nas Escrituras
em que, inúmeras vezes, seus autores usam a expressão “exortai-vos” (Cf. 1Ts. 5.11, Hb. 3.13).

72
THOMPSON, 1983, p.67.
73
HORTON, 2007, p.139.
74
BEEKE, e FERGUNSON, 2006, p.211.
75
THOMPSON, 1983, p.66.
76
DEVER, 2007, p.23.
24

Bonhoeffer afirma que “a base na qual cristãos podem falar uns com os outros é que cada qual
sabe que o irmão é pecador e, que, apesar de toda sua dignidade humana, está perdido e
abandonado se não for socorrido”77. Todos os membros do corpo precisam uns dos outros para
o crescimento efetivo de todo o corpo de Cristo. “Falamos uns aos outros em vistas ao auxílio
de que ambos precisamos. Admoestamo-nos mutuamente a prosseguir no caminho que Cristo
nos ordena. Advertimos uns aos outros sobre a desobediência que é nossa perdição” 78. Isso
deixa muito claro que a disciplina é algo que faz parte da comunhão que os santos têm uns com
os outros.
McArthur Jr79. afirma que “outro benefício de se manter um relacionamento
próximo a uma igreja local é que ela fornece um ambiente para a prestação de contas – prestação
de contas visando a disciplina, arrependimento e restauração”80. A verdadeira igreja é uma
igreja onde há pregação fiel das escrituras (onde um dos membros proclama a verdade do
evangelho aos outros); onde há correta ministração dos sacramentos (onde os membros gozam
através da união com Cristo comunhão com os demais membros do corpo); e, onde há o
exercício da disciplina do faltoso (onde o corpo é aperfeiçoado pelo auxílio de toda junta [Cf.
Ef. 4.16]).
Assim, considerando que “a igreja é o corpo de Cristo, o ajuntamento local de
cristãos comprometidos com Cristo e uns com os outros”81, um resumo que deixa clara a
proposta que está sendo colocada aqui pode ser vista no Catecismo de Heidelberg quando
pergunta e responde o seguinte:

O que você crê sobre a comunhão dos santos? R. Primeiro creio que todos os crentes,
juntos e cada um em particular, como membros de Cristo, têm comunhão com Ele e
participam de todos os Seus tesouros e dons (1). Segundo: creio que cada um têm o
dever de usar seus dons com disposição e alegria para o benefício e o bem-estar dos
outros membros (2). (1) Rm 8.32; 1Co 6.17; 12.4-7, 12, 13; 1Jo 1.3. (2) 1Co 12.20-
27; 13.1-7; Fp 2.4-8).82

77
BONHOEFFER, 1997, p.92.
78
Ibid, p.92-93
79
John Fullerton MacArthur, Jr. é um ministro e escritor evangélico norte-americano. Tem servido desde 1969
como pastor e professor na Igreja evangélica "Grace Community Church" na Califórnia. É o presidente do The
Master's University e ainda do The Master's Seminary, na Califórnia.
80
MACARTHUR, Jhon F, Jr. e MACK, Wayne A. Introdução ao Aconselhamento Bíblico: um guia básico dos
princípios e prática do aconselhamento. Tradução de Enrico Paquini, Lauro Pasquini, Eros Pasquini. São Paulo:
Hagnos, 2004, p.175.
81
DEVER, 2007, p.164.
82
BEEKE, Joel; e FERGUNSON, 2006, p.194.
25

A divisão da resposta em duas partes é importante porque quando se fala de


comunhão dos santos necessariamente precisa-se considerar tanto o aspecto vertical (comunhão
da igreja com Cristo), quanto o horizontal (comunhão da igreja entre si – “uns com os outros”).
26

CAPÍTULO 2 – A DOUTRINA DA COMUNHÃO DOS SANTOS E A NATUREZA DA


IGREJA

É possível chegar neste momento ao entendimento de que a doutrina da


comunhão dos santos está completamente associada a doutrina da igreja. Berkhof diz que “a
doutrina da aplicação dos méritos de Cristo [comunhão com ele] leva naturalmente à doutrina
da igreja, pois esta consiste dos que são partícipes de Cristo e das bênçãos da salvação que nele
há”83. Da mesma forma Calvino afirma nas institutas que após ter apresentado os méritos
alcançados pela obra de Cristo, “a metodologia do ensino impõe que tratemos agora da
Igreja”84. Isto quer dizer que entendendo a obra de Cristo e a maneira como os santos são unidos
a ele pelo seu Espírito Santo, faz-se necessário considerar o papel da igreja nesse
relacionamento.
Esse apontamento já foi estabelecido com a associação das marcas da verdadeira
igreja, no primeiro capítulo, à doutrina da comunhão dos santos. Será que o mesmo é possível
quanto aos aspectos da igreja? O objetivo deste capítulo é promover o diálogo entre os aspectos
(características da natureza) da igreja e a doutrina da união plena dos santos com o seu cabeça
– Cristo e uns com os outros enquanto membros dele. O ponto de partida é, então, considerar
algumas das afirmações credo-confessionais a respeito da igreja.

2.1 MATER FIDELIUM

A Igreja, que é considerada pelos romanistas a mater fidelium (mãe dos fiéis), é
a esposa de Cristo conforme é afirmado por Paulo na analogia que ele propõe a respeito do
relacionamento entre marido e mulher em Efésios capítulo 5. Calvino era um dos que utilizava-
se desse termo, dizendo que a igreja é “[..] o meio de ingressarmos a vida, sendo nós concebidos

83
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Tradução de Odayr Olivetti. 4. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012,
p.509.
84
CALVINO, João. As Institutas. Tradução de Waldir Carvalho Luz. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v.
4, p.25.
27

no seu ventre, que ela nos dá a luz, nos nutre e seus seios, nos guarda e o governo nos
retenha(...)”85. Confessionalmente, é afirmado a respeito da igreja de Cristo que “fora dela não
há possibilidade ordinária de salvação”86, mostrando a exclusividade do papel dela na existência
e propagação do evangelho. Essa afirmação já contribuí muito para o nosso entendimento da
exclusividade que a igreja possuí. Trata-se de algo extremamente especial e nada ordinário.
Clowney coloca essa ideia da seguinte maneira:

Já que a salvação está somente em Cristo, há um sentido no qual não há salvação fora
da igreja de Cristo, pois aquele que o Espírito une a Cristo são unidos a todos os outros
que estão em Cristo. Quando ele faz com que Deus seja nosso Pai, ele nos torna irmãos
e irmãs na família de Deus. Todos os que conhecem a salvação de Deus conhecem-na
como membros do corpo de Cristo.87

Os eleitos recebem a salvação que somente está em Cristo, e na igreja enquanto


seu povo, e assim aqueles se tornam irmãos e irmãs na família de Deus (Cf. Ef. 2.19-20). Essa
salvação não pode ser tirada de forma alguma, e é especial demais. “As boas-novas da vinda de
Cristo incluem as boas-novas daquilo que ele veio fazer: unir seus filhos a si mesmo e uns aos
outros como seu corpo, o novo povo de Deus”.88 Nesse sentido, a igreja é então a mãe que reúne
os filhos de Deus, os herdeiros das mesmas bençãos de Cristo. Ao mesmo tempo em que
também é a noiva, a esposa que será entregue ao Filho finalmente para as bodas do cordeiro.
A igreja ser a esposa de Cristo não é, contudo, a única analogia proposta pelo
apóstolo Paulo nas escrituras, ele também afirma que a igreja é o corpo de Cristo (Cf. 1Co. 12).
É principalmente utilizando-se dessas analogias que a CFW define igreja. No capítulo XXV,
na primeira seção, encontra-se:

A Igreja Católica ou Universal, que é invisível, consta do número total dos eleitos que
já foram, dos que agora são e dos que ainda serão reunidos em um só corpo sob Cristo,
seu cabeça; ela é a esposa, o corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todas as
coisas.89

Defendendo o senhorio de Cristo sobre esta igreja, a CFW ainda reafirma na


sexta seção do mesmo capítulo que “não há outro Cabeça da Igreja senão o Senhor Jesus
Cristo”90. Há uma relação de serviço, de dedicação ao senhorio de Cristo que está balizada nos

85
CALVINO, 2006, v. 4, p.28.
86
Assembleia de Westminster. Confissão de Fé de Westminster. 17. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p.196.
87
CLOWNEY, Edmund. A Igreja – Série Teologia Cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p.52.
88
CLOWNEY, 2007, p.15.
89
WESTMINSTER, 2001, p.196. (grifo nosso).
90
Ibid, p.201.
28

laços afetivos da união mística, afinal, “Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela”
(Cf. Ef. 5.23). Bavinck91 também caminha nessa direção e afirma que “a essência característica
da igreja é que ela é o povo de Deus, a realização do amor eletivo de Deus”92. Assim como
Cristo amou a igreja, Deus o pai também ama os seus filhos eleitos (Cf. Jo. 3.16). Há uma
relação de amor (afeto) entre o pai e essa igreja. Essa relação de afeto é evidenciada na natureza
da igreja, em seus aspectos, dentre os quais podemos citar a unidade, a santidade e a
catolicidade.

2.1.1 A unidade

Do ponto de vista romano, “a unidade desta Igreja se manifesta em sua


imponente organização mundial”93, a ICAR. Do ponto de vista protestante, porém, “a unidade
da Igreja não é primariamente de caráter externo, mas, sim, de caráter interno e espiritual. Este
corpo é dirigido por uma Cabeça, Jesus Cristo, [...] esta unidade implica que todos os que
pertencem à Igreja [...] são solidamente interligados pelo comum laço do amor”94. Observe que
a unidade da igreja (comunhão horizontal) está, novamente, baseada na união mística
(comunhão vertical) com Cristo, que une os membros do corpo dele mesmo uns aos outros em
amor.
Nesse aspecto da igreja é que Berkhof baseia sua distinção entre igreja como
organismo e como instituição. Ele diz que “a Igreja como organismo é o coetus fidelium, a união
ou comunhão dos fiéis, unidos pelo vínculo do Espírito, enquanto a Igreja como instituição é a
mater fidelium, a mãe dos fiéis”95. O devocional Cada Dia também transmite essa ideia de
organismo quando trata do assunto igreja, ele diz que “nenhuma organização ou instituição é
como a igreja. [...] O termo comum no Novo Testamento é Corpo de Cristo. Esta expressão
indica a interdependência estreita, as profundas relações íntimas, as quais Deus criou e designou
para os membros da Igreja”96. Quando propõe-se tratar a respeito de unidade essas profundas

91
Herman Bavinck (1854-1921) tornou-se sucessor de Abraham Kuyper na cadeira de Teologia Sistemática da
Universidade Livre da Holanda, em 1902. Sua dogmática é obra de referência para a teologia.
92
BAVINCK, H. Dogmática reformada – Espírito Santo, Igreja e nova criação. Tradução de Vagner Barbosa.
São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p.278.
93
BERKHOF, 2012, p.525.
94
Ibid.
95
Ibid, p.521.
96
CADA DIA, Volume 29, nº08, agosto de 2009. Campinas, SP: LPC Comunicações. Devocional do dia 14 de
agosto.
29

relações íntimas são comuns ao discurso, tais quais foram preparadas por Deus para os membros
de sua amada igreja. Karl Adam, citado por Bonhoeffer em sua obra, defende que

O divino é materializado, é encarnado na comunidade, e precisamente e apenas na


medida em que é uma comunidade, [...] Assim, a igreja possui o Espírito de Cristo,
não como um grupo de pessoas, nem como uma soma de personalidades espirituais,
mas como a unidade compacta dos fiéis, como uma comunidade que transcende as
personalidades individuais [...] os muitos como um.97

A defesa de Adam consiste na ideia de que a igreja é essa unidade compacta dos
fiéis, ela é a verdadeira comunidade que transcende as barreiras das personalidades individuais.
Isto significa que ainda que haja distinção entre os membros do corpo de Cristo, o indivíduo
somente é importante na medida em que está vinculado ao corpo como um todo. Ele é parte do
todo. Sua distinção só é elementar no sentido em que se ajusta ao corpo como um todo. A
unidade é um dos principais aspectos da igreja. A igreja é a representante “do número total dos
eleitos que já foram, dos que agora são e dos que ainda serão reunidos em um só corpo sob
Cristo, seu cabeça”98. Calvino atesta exatamente essa ideia, para ele

[...] todos os eleitos de Deus foram de tal modo ligados em Cristo, que, da mesma
forma que dependem de uma Cabeça única, assim subsistem em um corpo único,
ligando-se entre si por esta relação pela qual são unidos os membros de um mesmo
corpo, na verdade feitos um, visto que vivem, a um tempo, em uma só fé, esperança,
amor, no mesmo Espírito de Deus, chamados não somente à mesma herança da vida
eterna, mas também à participação de um só Deus e Cristo.99

A unidade da igreja é apresentada na ideia de que a igreja professa a mesma fé,


esperança e amor no mesmo Espírito de Deus. Esta igreja é una à semelhança do relacionamento
perfeito de unidade entre o Pai e o Filho (Cf. Jo. 17.20-23).

2.1.2 A santidade

Quanto ao aspecto da santidade da igreja, Berkhof afirma que “a concepção


católica romana da santidade da Igreja também é primariamente de caráter externo. Não é a

97
ADAM, Karl. The spirit of catholicism. Tradução de Dom Justin McCann. Nova York: Crossroad, reimpr.
1977, p.31-32 (grifo nosso).
98
WESTMINSTER, 2008, p.196.
99
CALVINO, v.4, 2006, p.27.
30

santidade interna dos membros da Igreja pela obra santificadora do Espírito Santo, mas a
santidade cerimonial exterior é que é posta em primeiro plano”100. Isso quer dizer que a igreja
é considerada santa não por aquilo que Cristo fez por ela, porém, por sua própria estrutura e
existência, a Igreja é santa acima de tudo, e esse mérito está apenas nela mesma. Enquanto o
pensamento reformado entende que “a Igreja é absolutamente santa num sentido objetivo, isto
é, como ela é considerada em Jesus Cristo. Em virtude da justificação mediatária de Cristo, a
igreja é tida por santa perante Deus”101. A igreja só é considerada santa diante de Deus porque
Cristo, seu cabeça, aquele que a justificou é o mesmo que a santifica, aplica sua santidade a ela.
Ainda a respeito da santidade da igreja Berkhof afirma que a Igreja é santa “no
sentido de que é separada do mundo na sua consagração a Deus, e também no sentido ético de
colimar e em princípio realizar um santo relacionamento com Cristo”102. Ou seja, o caráter
externo da santidade da Igreja baseia-se no fato de que esta deve procurar cada vez mais estar
em um relacionamento de santidade com o seu marido, Cristo. A igreja governada pelo senhor
Jesus Cristo segue em busca da santificação sem a qual ninguém verá a Deus (Cf. Hb. 12.14).
Todavia, ainda faz-se necessário ressaltar que “só Deus sabe realmente quais
são, de fato, santos e eleitos seus”103 dentro da igreja visível. A igreja é composta desses santos
e eleitos e, também, de pecadores condenados. A CFW afirma isso na quinta seção do capítulo
XXV, quando diz que “as igrejas mais puras debaixo do céu estão sujeitas à mistura e ao
erro”104. Por isso Calvino afirma que considerando que a igreja sempre estará sujeita a
imperfeições humanas, sendo composta por pecadores, não se pode esperar perfeição plena na
vida da Igreja terrena”105. Ele também cita Agostinho que dizia que “muitas são as ovelhas do
lado de fora, muitos são os lobos do lado de dentro”106, ressalvando que Deus conhece ambos,
os santos, distintamente daqueles que sofrerão o juízo de Deus, “hão de perseverar até o fim
[Mt 24.13], o que é, afinal, o clímax da salvação”107. A santidade é um dos aspectos da igreja
do senhor Jesus Cristo, sua noiva. Essa característica é principalmente entendida pelo aspecto
da união com Cristo da qual gozam os eleitos nele desde a eternidade, entretanto, também é
evidenciada em uma vida de pureza e separação do mundo pela igreja de Deus.

100
BERKHOF, 2012, p.527.
101
Ibid.
102
Ibid, p.528.
103
CALVINO, 2006, v. 4, p.34.
104
WESTMINSTER, 2001, p.199.
105
CALVINO, 2006, v. 4, p.38.
106
Ibid, p.34.
107
Ibid.
31

2.1.3 A catolicidade

Quanto ao aspecto da catolicidade, a ICAR entende que apenas ela tem o direito
de chamar-se católica. “Como o faz com os outros atributos da Igreja, ela o aplica à organização
visível”108. Novamente a ideia protestante aplica o atributo da catolicidade à Igreja invisível,
que de acordo com Berkhof “pode ser chamada católica num sentido muito mais verdadeiro
que quaisquer organizações existentes, a Igreja Católica Romana inclusive”.109 O aspecto da
catolicidade diz respeito a igreja, esposa de Cristo, estar espalhada por todos os cantos da terra.
Horton explica o termo da seguinte maneira: “Católico significa universal, mas no seu uso atual
a palavra tem um significado mais rico, especialmente como um termo que resume a comunhão
dos redimidos como um corpo”110. Todos aqueles que foram chamados por Cristo Jesus, fazem
parte da família de Deus, do corpo de Cristo, da Igreja católica, afinal, “sempre que a Palavra e
o Espírito – “um só Senhor, uma só fé, um só batismo” (Ef 4.5) – quebram os paradigmas desta
era e reconstituem um novo povo, ali há uma parte da igreja católica”111.
É exatamente o que é encontrado no pensamento de Calvino. Em suas Institutas
ele afirma que “por isso se chama Igreja católica ou universal: que não é possível achar duas
ou três, sem que Cristo seja dividido, o que não se pode fazer”112. Onde quer que haja eleitos
do senhor Jesus ali está parte do seu corpo, ali está parte de sua igreja, pois Cristo não pode ser
dividido. Novamente essa união com ele leva os santos eleitos a serem unidos uns aos outros,
“na verdade feitos um”. O aspecto da catolicidade da igreja depende também da união mística
com Cristo e da união uns com outros como resultado da primeira.
“Nós devemos crer na igreja universal, isto é, a igreja criação de Deus, não
simplesmente uma instituição humana”.113 Essa declaração é uma afirmação categórica, de um
organismo, que não nasceu por meio humano, mas foi gerada pelo Senhor da Igreja, o seu
Cabeça, nosso Redentor. A igreja se torna universal, não por causa de um aspecto oriundo dela,
mas por causa de sua relação com o Senhor Jesus e com aquilo que ele a chamou e condicionou
a ser. Diante disso podemos concluir, afirmando que a igreja é um só organismo em sua

108
BERKHOF, 2012, p.528.
109
Ibid.
110
HORTON, Michael. Doutrinas da fé cristã. Tradução de João Paulo Thomaz de Aquino. São Paulo: Cultura
Cristã, 2016, p.888-889.
111
HORTON, 2016, p.889.
112
CALVINO, 2006, v. 4, p.27.
113
CLOWNEY, Edmund. A Igreja – Série Teologia Cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 67.
32

catolicidade e que sua extensão é todo o mundo, sua tarefa abrange todos os povos. De acordo
com Wayne Grudem, a igreja tem um ministério em relação ao mundo, pelo aspecto de sua
catolicidade, sua missão não está restrita a um bairro, cidade ou país, ela é global, sua extensão
geográfica é todas as nações.114
A pergunta 62 do CMW responde que a igreja visível “é a sociedade composta
de todos quantos, em todos os tempos e lugares no mundo, professam a verdadeira religião,
juntamente com seus filhos”.115 E quanto a outra face da igreja? E quanto a igreja invisível? A
pergunta e resposta que o CMW traz estão dispostas da seguinte maneira: “O que é igreja
invisível? R. Igreja invisível é o número completo dos eleitos que foram e que serão reunidos
em um corpo sob Cristo, o Cabeça”.116 Isso claramente aponta para a catolicidade da igreja já
que a igreja reúne em Cristo todos quantos, em todas as eras e lugares no mundo professam a
fé no salvador. E, assim, é católica a igreja.
O Credo Niceno afirma crer “em uma santa igreja universal e apostólica”117.
Porém, quanto a esse quarto atributo da igreja a afirmação de McGrath118 é essencial, ele diz
que para os reformadores “embora indícios de continuidade histórica com a igreja apostólica
fossem bem-vindos, o mais importante era a continuidade com o ensino apostólico”119. Isto é,
“não há referência à necessidade de qualquer continuidade histórica ou institucional com os
apóstolos, ou com qualquer concepção institucionalizada de igreja – ou de modo mais notável,
com a igreja medieval”. Esse posicionamento foi contra o pensamento da ICAR que defendia e
ainda defende que o Papa goza da mesma autoridade que o apóstolo Pedro, que seria, no
entendimento católico, o fundador da igreja. A ideia protestante é a de que a apostolicidade da
igreja é expressa na fidelidade ao ensino apostólico e não na continuidade do ofício.

114
GRUDEM. Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2001, p.727.
115
Assembleia de Westminster. O Catecismo Maior de Westminster. São Paulo: Cultura Cristã, 2002. p.67.
116
WESTMINSTER, 2002, p.69.
117
BÍBLIA de Estudo Herança Reformada. Barueri: Cultura Cristã, 2018, p.1936.
118
Alister E. McGrath é historiador e teólogo nascido em Belfast, Irlanda do Norte. Professor da Oxford University
e escreveu diversos livros, incluindo A vida de João Calvino.
119
MCGRATH, Alister E. O Pensamento da Reforma. Tradução de Jonathan Hack. São Paulo: Cultura Cristã,
2014, p.166.
33

2.2 COMMUNIO SANCTORUM

A natureza da igreja, como já apontada em seus aspectos, é constituída


essencialmente dos membros que compõem-na conforme Bavinck afirma: “a palavra ‘igreja’
[...] é aplicada ao povo de Deus em termos dos crentes, que constituem seu elemento essencial
e determinam sua natureza”120. Berkhof começa a falar sobre a natureza da igreja dizendo que
“os cristãos primitivos falavam da igreja como a communio sanctorum e assim, sem contudo
terem pensado na matéria completamente, já deram expressão a essência da Igreja” 121. Dever
também afirma que o tema da igreja se tornou um centro de debate amplo, formal, teológico
apenas no período que compreende a Reforma. Antes do século deste movimento, a igreja era
mais aceita do que debatida122.
Com o assunto da verdadeira igreja em debate, surgiram as colocações sobre as
marcas da verdadeira igreja, as concepções sobre os aspectos que definem a igreja, e pouco a
pouco a doutrina da Igreja foi surgindo. A medida em que defende a concepção protestante do
aspecto da santidade da igreja, Berkhof afirma que “os protestantes consideram a Igreja como
subjetivamente santa, isto é, como realmente santa no princípio interior da sua vida, e destinada
à santidade perfeita. Daí, ela de fato pode ser denominada comunidade dos santos”123. Veja que
não é possível de maneira alguma desassociar comunhão dos santos da essência da igreja, esse
termo em si, é uma conclusão lógica a partir do aspecto da sua santidade como afirmado por
Berkhof.
A questão da comunhão dos santos – como definição da essência da igreja
verdadeira do Senhor Jesus Cristo vai ser trazida à tona “no fim do século 2, como resultado do
surgimento de heresias [...] quanto a verdadeira Igreja se lhes impôs e os levou a fixar a atenção
em certas características da Igreja como instituição externa”124. Nesse período é possível
verificar, por exemplo, que apesar de dar mais ênfase a pecaminosidade dos cristãos e a um
“corpo misto” (corpus permixtum), dizendo que “a igreja não pode ser uma congregação de
santos neste mundo”, Agostinho também defendia que “a igreja é santa e tornada santa por

120
BAVINCK, 2012, p.277.
121
BERKHOF, 2012, p.517.
122
DEVER, 2007, p.22.
123
BERKHOF, 2012, p.527.
124
Ibid, p.517.
34

Cristo – uma santidade que será aperfeiçoada e finalmente cumprida no Juízo Final”125.
Mostrando que há uma clara relação entre o aspecto da santidade da igreja e a definição da
mesma.
Nesse período de discussões sobre a verdadeira igreja, “a concepção da Igreja
como organização externa com o tempo foi ganhando proeminência. Foi dada crescente ênfase
à sua organização hierárquica, e nesta foi posto o selo definitivo com a instituição do
papado”126. A ICAR, então, arrogava para si o título de igreja verdadeira, o que também fazia
a Igreja Ortodoxa Grega. Assim, os romanistas definem igreja como “a congregação de todos
os fiéis que, sendo batizados professam a mesma fé, participam dos mesmos sacramentos e são
governados por seus legítimos pastores, sob um chefe visível na terra”127, o papa.
Dever afirma que: “antes do século XVI, a igreja era mais aceita do que
discutida. Era considerada um meio de graça, uma realidade que existia como a pressuposição
do restante da teologia”128. Nesse cenário de afirmação da verdadeira igreja é que o movimento
da Reforma ganha vital importância. Berkhof defende que a Reforma foi uma reação contra o
externalismo de Roma em geral, e em particular, também contra a sua concepção externa da
Igreja129. Ele a responsabiliza por trazer ao primeiro plano a verdade de que a essência da igreja
se encontra na communio sanctorum. Lutero, Calvino e outros reformadores entendiam a igreja
“simplesmente” como a comunidade dos santos, a comunidade daqueles que creem e são
santificados em Jesus Cristo, daqueles que a medida em que são/estão ligados a Ele, tem nele a
sua Cabeça. De acordo com McGrath em seu estudo sobre as doutrinas e o pensamento
reformado, a partir do momento em que se tornou claro que os grupos evangélicos seriam
excluídos permanentemente da igreja católica, a questão da verdadeira identidade da igreja
adquiriu importância crucial, já que todos queriam ser parte dela130.
Fica muito claro que o que estava em jogo era a essência, a veracidade da igreja.
Enquanto a ICAR depositou suas fichas em suas características externas, sua estrutura e
organização hierárquica, no papa, na sua “apostolicidade”, etc., o pensamento reformado traz
como resposta a isso a concepção de que a verdadeira igreja de Cristo é a sua noiva, espalhada
por toda a terra, essa igreja reúne todos os santos, eleitos por Deus de todos os lugares. Costa
também afirma que “na Reforma Protestante do Século XVI, a Igreja foi compreendida dentro

125
MCGRATH, Alister E. O Pensamento da Reforma. Tradução de Jonathan Hack. São Paulo: Cultura Cristã,
2014, p.170-171.
126
BERKHOF, 2012, p.527.
127
BERKHOF, 2012, p.527.
128
DEVER, Mark. Nove Marcas de Uma Igreja Saudável. São José dos Campos: Editora Fiel, 2007, p.22.
129
BERKHOF, 2012, p.518.
130
MCGRATH, 2014, p.172.
35

da perspectiva de “povo de Deus”, não simplesmente como um edifício ou uma organização


institucional, mas sim, como povo de Deus que se reúne para adorar”131.
Por isso, Berkhof afirma que “a Igreja como existe no plano de Deus [...] foi
entendida no sentido de que consiste do corpo completo dos eleitos, os quais, no transcorrer do
tempo, são chamados para a vida eterna. Mas a Igreja, como existe na terra, foi considerada
como a comunidade dos santos”132. Costa concorda e expande essa ideia dizendo que: “A Igreja
não precisa necessariamente manter em todos os tempos e lugares a mesma forma de
organização. Sem dúvida a organização é muito importante, todavia, ela deve estar a serviço do
Evangelho com vistas ao estabelecimento da comunhão cristã (Vd. At 6.1-7)”133. Ele está
afirmando que mais importante do que a igreja manter sua estrutura organizacional, é que ela
mantenha sua unidade orgânica, que ela mantenha a comunhão dos santos.
Ambas a igreja invisível (Igreja como Deus a vê) e a igreja visível (Igreja como
o homem a vê)134 partilham da mesma essência, não se trata de duas igrejas, mas de apenas uma
a verdadeira e única comunidade dos santos.

A igreja forma uma unidade espiritual da qual Cristo é o Chefe divino. É animada por
um Espírito, o Espírito de Cristo; professa uma fé, compartilha uma esperança e serve
a um só Rei. É a cidadela da verdade e agência de Deus para comunicar aos crentes
todas as bênçãos espirituais. Como corpo de Cristo, está destinada a refletir a glória
de Deus como esta se vê manifestada na obra da redenção.135

A igreja chefiada por Cristo e motivada (ou movida) pelo Espírito dele (Cf. At.
17.28) reflete perfeitamente a glória de Deus, e o faz na medida em que reúne os eleitos de
Deus em seus cultos e encontros para adorá-lo. Bavinck afirma em sua dogmática que “como
todos nós somos portadores da imagem de Deus, nossa relação com Deus flui para outros seres
humanos. A religião não pode ser puramente individual e privada”136. Há a necessidade de que
ela seja partilhada em relacionamento humano, o culto é para a comunidade, para o povo de
Deus, o culto é público, é popular. Isso é o que se aprende quando busca-se o entendimento
correto do que a palavra de Deus ensina sobre as reuniões do povo de Deus.

131
COSTA, Hermisten Maia Pereira da. Eu Creio: no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São José dos Campos:
Fiel, 2014, p.490.
132
BERKHOF, 2012, p.519.
133
COSTA, 2014, p.500.
134
PACKER, J. I.; FERGUNSON, Sinclair. Novo Dicionário de Teologia. São Paulo: Hagnos, 2011, p.2006.
135
BERKHOF, 2012, p.519.
136
BAVINCK, 2012. p.277.
36

CAPÍTULO 3 – FUNDAMENTAÇÃO BÍBLICO-REFORMADA DA DOUTRINA DA


COMUNHÃO DOS SANTOS

O que a Bíblia diz a respeito da comunhão dos santos? Essa pergunta guiará a
proposta deste capítulo. Thompson afirma que “a Bíblia nos lembra repetidamente que nosso
cristianismo não tem significação se vivermos isolados”137. Alguns termos podem ser
apresentados para iniciar esta discussão. No AT, encontra-se o verbo habär e, de acordo com o
Dicionário Internacional de Teologia do AT, “a ideia principal de habär no AT é “ajuntar” ou
“unir” duas ou mais coisas”138. Ele também explica que esse verbo com o sentido de ajuntar é
utilizado com quatro referências específicas: a) objetos ajuntados (como as cortinas do
tabernáculo); b) homens que se juntavam em atividades políticas e militares; c) homens unidos
de maneira geral como seres viventes; e, d) homens de Judá que se juntaram aos desobedientes
homens de Israel compartilhando de sua idolatria139. Com exceção da referência a unidade
enquanto seres viventes, as demais referências aparecem com um aspecto que pode ser
imediatamente associado à vida religiosa.
Assim, é perceptível que a Igreja criada por Deus já havia começado a ser
reunida no AT. O processo de desenvolvimento do corpo de Cristo, tanto no AT quanto no NT,
é apontado principalmente porque os irmãos “tinham comunhão uns com os outros, partiam o
pão, uniam os corações em oração e louvor a Deus”140, isto é, cultuavam a Deus em unidade.
No NT, o termo importante para nós é conhecido: koinonia. Thompson afirma que

[...] o termo grego koinonia descreve a comunhão firme entre Deus e seus filhos
através de todos os séculos. Ele também caracteriza o relacionamento íntimo que
deve ser cultivado e mantido entre o povo de Deus. A ênfase da palavra se concentra
na partilha de um relacionamento comum, Participamos juntos da família de Deus,
sua comunidade atual.141

137
THOMPSON, James. Nossa Vida Juntos: um olhar para a fraternidade cristã. Tradução de Neyd Siqueira. São
Paulo: Vida Cristã, 1983, p.15.
138
HARRIS, Laird (org.). Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento. Tradução de Márcio
Loureiro Redondo, Luiz Alberto T. Sayão, Carlos Osvaldo C. Pinto. São Paulo: Vida Nova, 1998, p.421.
139
HARRIS, 1998, p.421.
140
GETZ, Gene A. Igreja forma e essência: o corpo de Cristo pelos ângulos das escrituras, da história e da cultura.
Tradução de Márcio Loureiro Redondo. São Paulo: Vida Nova, 2007, p.93.
141
THOMPSON, 1983, p.14.
37

De acordo com o Léxico Grego Analítico, esse termo pode significar


“companhia, sociedade, parceria, participação, comunhão, ajuda, socorro, contribuição para
ajuda”142 e tem sua raiz em koinos (comum, que pertence igualmente a muitos). Ambos os
termos estão associados com o que tem sido discutido aqui, a comunhão dos santos expressa na
unidade da comunidade - a igreja, especialmente no NT. Isso é interessante porque mostra que
quando uma pessoa se junta a outrem inevitavelmente está compartilhando hábitos e
cosmovisão (que afeta a conduta), por isso, Thompson afirma que “o Novo Testamento indica
que a comunhão (koinonia) abrange muito mais do que a participação nos benefícios da
salvação. A comunhão envolve também o que fazemos juntos, como parceiros (koinonoi) numa
tarefa comum. [Lc 5.10; 2Co 8.23; Fm 17]”143.
Dentro da teologia bíblica, existem diversos textos que elucidam o
entendimento, especialmente no que tange a comunhão horizontal desfrutada pelos santos a
partir da comunhão vertical e sua expressão na ekklesia. De maneira suscinta este trabalho
observará algumas contribuições a respeito desses textos.

3.1 A COMUNHÃO DOS SANTOS NO AT

Peterson144 declara que a “[...] criação não estava completa até haver
comunidade, Adão precisando de Eva antes que a humanidade fosse completada. Deus nunca
opera com indivíduos em isolamento, mas sempre com pessoas em comunidade”145. Ainda que
não seja possível identificar a igreja ali, já havia uma certa reunião de santos que apontaria para
ela. É possível entender que Horton concorde com isso quando diz que a unidade da igreja não
pode ser localizada na experiência pessoal (individual), nem mesmo na igreja enquanto ofício
histórico (defesa da ICAR), para ele a unidade da igreja surge de sua origem canônica, visto
que o cânon (mesmo antes de sua escrituração formal) criou e ainda cria a igreja 146. Tendo
anteriormente afirmado, quanto ao tema da aliança presente em toda a escritura, que: “desde o

142
MOULTON, Harold K. Léxico Grego Analítico. Tradução de Everton Aleva de Oliveira e Davi Miguel
Manço. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p.248.
143
THOMPSON, 1983, p.49.
144
Eugene Hoiland Peterson era um pastor, estudioso, teólogo, escritor e poeta americano. Escreveu mais de 30
livros, tornou-se conhecido pela tradução da bíblia A Mensagem.
145
PETERSON, Eugene. Uma longa obediência na mesma direção. Tradução de Helen Hope Gordon Silva. São
Paulo: Cultura Cristã, 2005, p.132
146
HORTON, Michael. Doutrinas da fé cristã. Tradução de João Paulo Thomaz de Aquino. São Paulo: Cultura
Cristã, 2016, p.890.
38

princípio, o objetivo é levar criaturas à comunhão (koinonia) com Deus e umas com as outras,
que seja tão próxima quanto humanamente possível daquela comunhão que há entre o Pai, o
Filho e o Espírito”.147
A defesa dele é a de que a Igreja sempre fez parte do plano de Deus, sendo ele
mesmo seu criador. Dever concorda com isso e diz que “Deus ama sua igreja! Ela é a glória de
Deus tornada visível neste mundo e a peça central do seu plano redentor”148, entendendo-a aqui
como corpo de Cristo, corpo do redentor. Tendo Cristo como seu cabeça, a igreja de todos os
tempos cumpre seu propósito de reunir a Ele todos os eleitos. Desde o princípio, desde a criação
e a gênesis, a igreja era parte do plano de Deus, a comunhão fazia parte de seu plano criacional
– “Não é bom que o homem esteja só”149 (Cf. Gn. 2.18).
Berkhof em sua sistemática diz, a respeito da igreja, que

No período patriarcal as famílias dos crentes constituíam as congregações religiosas;


a Igreja era mais bem representada nos lares piedosos, onde os pais serviam de
sacerdotes. Não havia culto regular, embora Gn 4.26 pareça implicar uma invocação
pública do nome do Senhor.150

Não se pode, de maneira alguma, entender Igreja reunida apenas no período


neotestamentário. Afinal de contas, “a igreja é uma entidade sem paralelos. Mesmo em sua
manifestação local, ela é muito mais que uma organização”151. Desde o início ainda que não o
culto não fosse institucionalizado, a adoração a Deus já fazia parte da instrução na família, Caim
e Abel apresentaram sua oferta ao Senhor (Gn. 4). Bavinck diz que “quando Adão caiu e se
escondeu de Deus, o próprio Deus o procurou e chamou, anunciou-lhe a promessa do evangelho
e, assim, começou sua igreja”152.
Seguindo a narrativa bíblica, em Gn. 12 o Senhor chama a Abrão e diz a este
que faria dele e de sua descendência uma nação exclusiva, que seria extremamente abençoada
por ele e se tornaria abençoadora de todos os povos da terra (Gn. 12.3). Longman153 e

147
HORTON, 2016, p.620.
148
DEVER, Mark e DUNLOP, Jamie. A Comunidade Cativante: onde o poder de Deus torna uma igreja atraente.
Tradução de Francisco Wellington Ferreira. São José dos Campos: Fiel, 2016, p.172.
149
BÍBLIA. Traduzida por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2. ed. Barueri: Sociedade
Bíblia do Brasil, 2011, p.4.
150
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Campinas: LPC Publicações, 1994, p.523.
151
GETZ, 2007, p.173.
152
BAVINCK, H. Dogmática reformada – Espírito Santo, Igreja e nova criação. Traduzido por Vagner Barbosa.
São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p.337.
153
LONGMAN III, Tremper. Como Ler Gênesis. Tradução de Márcio Loureiro Redondo. São Paulo: Vida Nova,
2009.
39

Mesquita154 colocam o texto de Gn. 12 em paralelo com o texto da criação. É uma nova criação,
“um novo princípio”. Longman ainda afirma que essa “jornada da fé” percorrida por Abraão é
uma jornada marcada pela adoração, afinal, “em cada local ele erige um altar”155. Existe uma
continuidade entre o que foi iniciado por Deus, preservar um povo para si mesmo, separando-
o para ser exclusivamente seu e orientando a vida deles para que eles o adorem e prestem culto
a Ele, o único e verdadeiro Deus. Abraão, Isaque e Jacó, os patriarcas, deram assim origem a
nação de Israel, o povo chamado pelo nome do Senhor. Por isso, Bavinck afirma que: “a igreja
é criação de Deus. Desde o início da história humana pecaminosa - Adão, Abrão, Israel, a igreja
terrena - todos são religiosa e civilmente organizados pelo tabernáculo e o altar, sacrifício e
sacerdócio”156. Berkhof também afirma que essa nação historicamente representa a igreja do
Senhor, ele diz: “no período Mosaico e no êxodo, o povo de Israel não só se organizou como
nação, mas também se constituiu Igreja de Deus”.157
Nesse período da história de Israel já vemos o Senhor exortando o seu povo sobre
a importância de serem um só, e de manter sua unidade. Primeiramente o Senhor institui as
festas anuais, e determina que “três vezes no ano, todo homem entre ti [Israel] aparecerá perante
o Senhor Deus, Deus de Israel”158 (Ex. 34.23, Dt. 16.16). Obrigatoriamente Israel estaria
reunido para cultuar ao Senhor. Em seguida, o Senhor estabelece que as 12 tribos se
organizaram sob 4 estandartes, o estandarte de Judá, o de Rúben, o de Efraim, e o de Dã (Cf.
Nm. 2). Esses estandartes se moveriam juntamente com o tabernáculo mostrando que era a
presença de Deus que guiava o povo, bem como, que o Senhor habitava em meio a unidade das
tribos. O zelo do Senhor, quanto a unidade das tribos, também é mostrado quando os filhos de
Gade, Rúben e metade da tribo de Manassés decidem que sua herança seria ao oriente, antes da
travessia do Jordão. O trato só foi firmado mediante a garantia de que eles conduziriam seus
irmãos cada um à sua herança, e então, retornariam para a sua própria herança (Cf. Nm. 32).
A unidade das tribos também era valorizada no período monárquico da história
de Israel. Por exemplo, a respeito do Salmo 133, um salmo de Davi, Calvino diz que Davi
“exorta a todos, individualmente, a se esforçarem na manutenção da paz”159. Outro aspecto que
a ser considerado no primeiro versículo desse salmo é o tipo de união que se está sendo

154
MESQUITA, Antônio Neves. Estudo no Livro de Gênesis. 3. ed. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista,
1970.
155
LONGMAN III, 2009.
156
BAVINCK, 2012, p.330.
157
BERKHOF, 1994. p.524.
158
BÍBLIA, 2011, p.97.
159
CALVINO, João. Salmos Volume 4: Série Comentários Bíblicos. Tradução de Valter Graciano Martins. São
Paulo: Editora Fiel, 2009, p.436.
40

proposta. “A cláusula, viverem unidos os irmãos (lit. “quando os irmãos habitam também
juntos”), tem um paralelo quase idêntico em Dt 25:5, onde meramente se refere a uma família
extensa que habita perto”160. Kidner161 afirma que “este conceito, no entanto, é demasiadamente
estreito [...]. Decerto, o salmo está cantando, conforme o modo da maioria das versões entendê-
lo, o viver à altura deste ideal, dando profundidade e realidade à palavra que se enfatiza:
“unidos”.162 Calvino ainda afirma que “Davi sugere que a vida do homem não teria vitalidade,
seria inútil, miserável, se não fosse sustentada pela harmonia fraternal”163 Meister concorda
com ele e comenta “o termo "irmãos" (‫ )אַ ִ֣חים‬do verso 1 só pode se referir ao povo de Israel
como um todo, ou mais provavelmente, como veremos nas figuras de linguagem dos versos 2
e 3, à unidade das doze tribos de Israel”164. Por isso, ele também diz que:

Davi tinha consciência da importância da unidade nacional das tribos de Israel. O


povo não poderia ser abençoado na divisão por dois motivos simples: sem um rei não
haveria vitória e paz, e sem um sacerdote que ministrasse a todo o povo eles não teriam
condições de se aproximar de Deus. O papel do reino é de fundamental importância:
"O reino davídico serve dentro da esfera do próprio reinado de Deus." 165

Ou seja, trata-se, não apenas de uma recomendação à união, porém, à uma


exortação, uma ordem para que os israelitas de todas as tribos se mantivessem unidos, juntos,
buscando a paz que só era possível quando eles se uniam. A afirmação de Peterson encaixa-se
de maneira apropriada aqui, ele diz que:

O salmo 133 apresenta o que estamos buscando: “Como é maravilhoso, como é lindo,
quando os irmãos e irmãs combinam bem!” O salmo põe num cântico o que é dito e
demonstrado através da Bíblia e da igreja: a comunidade é essencial. A Bíblia
desconhece o cristão solitário. As pessoas de fé são sempre membros de uma
comunidade.166

160
KIDNER, Derek. Salmos 73-150: introdução e comentário. Tradução de Gordon Chown. São Paulo: Vida
Nova, 1980, p.461.
161
Frank Derek Kidner (1913-2008) foi um erudito do Antigo Testamento e ministro ordenado na Igreja da
Inglaterra. Ele foi o autor de vários comentários bíblicos.
162
KIDNER, 1980, p.462.
163
CALVINO, João. Salmos Volume 4: Série Comentários Bíblicos. Tradução de Valter Graciano Martins. São
Paulo: Editora Fiel, 2009, p.439.
164
MEISTER, Mauro. Em Monergismo. Salmo 133: Interpretando o Texto Numa Perspectiva Bíblico-Teológica.
Disponível em: < http://www.monergismo.com/textos/at/salmo133.htm>. Acesso em: 22 de jul. 2019.
165
MEISTER, Online.
166
PETERSON, 2005, p.132.
41

Salomão certamente também aprendera essa lição com seu pai. Garofalo167,
expondo Eclesiastes na igreja onde pastoreia, diz que “todo tipo de relacionamento é afetado
pela queda”168. Ele afirma de que essa ideia de que podemos andar sozinhos é um efeito da
queda. Para ele, Salomão está dizendo que “a vida é melhor vivida em conjunto [...] A vida é
melhor vivida com gente ao seu lado, nós não fomos feitos para viver isolados, [e que sem
dúvida,] há melhor fruto do trabalho quando não trabalhamos sozinhos”169. Uma importante
distinção que ele faz é que Salomão não está falando apenas de casamento, mas de
relacionamentos em geral170. Por isso, a importância de os santos caminharem (ou marcharem,
usando um termo comum de Israel) juntos como povo de Deus.
A relação entre a religião e a política (ou o estado) em Israel somente sofreu
alterações no período pós-exílico. Bavinck afirma que enquanto “no Antigo Testamento, a
comunidade da aliança era tanto uma comunidade nacional quanto uma comunidade religiosa,
governada por uma só lei”, e que, depois do exílio, “o Judaísmo se tornou apenas uma
comunidade religiosa reunida para adoração no templo e, o que é mais importante,
especialmente na Diáspora, na sinagoga”.171
O Antigo Testamento, de maneira clara, incentiva a interpretação da formação
de uma comunidade, um povo, uma nação. Formação esta que, não acontece apenas
conceitualmente, mas, se desdobra em contornos históricos, isto é, o povo de Deus organizado,
visando ser um reino ou nação sacerdotal. Deus não chama apenas um homem, um único
indivíduo isolado para percorrer uma jornada consigo. Na narrativa bíblica, Deus está em
constante processo de formação de um povo, uma comunidade172. Horton afirma o surgimento
da igreja através da palavra de Deus e faz colocações interessantes sobre a vida em comunidade,
ele diz que:

Segundo as Escrituras, [...] a igreja é a criação da Palavra. Como a primeira criação,


a nova criação surge da atividade de Deus, não de suas próprias possibilidades
inerentes. Além disso, o evangelho é um tipo particular de Palavra: as boas-novas. E
ele cria sua própria comunidade, transformando estranhos em uma família. Muito
maior do que qualquer afinidade natural, o evento de Cristo – e a comunicação deste

167
Emilio Garofalo Neto é ministro presbiteriano e pastor da Igreja Presbiteriana Semear em Brasília, DF.
Completou seu Ph.D no Reformed Theological Seminary, nos EUA. É professor de teologia sistemática no
Seminário Presbiteriano de Brasília e professor visitante em teologia pastoral no CPAJ.
168
GAROFALO Neto, Emílio. Contentamento e Simplicidade. Sermões. IPB Semear (website). Disponível em
<www.ipsemear.org/?powerpress_pinw=533-podcast>. Acesso em: 20 de mai. 2019.
169
GAROFALO, Online.
170
Ibid.
171
BAVINCK, 2012, p.277.
172
CAMPOS, Idauro. Desigrejados: teoria, história e contradições do niilismo eclesiástico. 7. ed. Rio de Janeiro:
bvbooks, 2017, p.139.
42

evento – molda uma nova comunidade no Espírito, que é diferente de qualquer círculo
de amigos, que nós naturalmente escolheríamos para nós mesmos. 173

A nova comunidade formada pelo Espírito é “diferente de qualquer círculo de


amigos”, isto está claramente estabelecido na escolha de Jesus dos seus 12 discípulos e mesmo
na inserção de Paulo como que um “nascido fora do tempo” (Cf. 1Co. 15.8). Há uma distinção
visível na formação da comunidade neotestamentária. Todavia, a igreja de Cristo, formada por
sua palavra transforma esses indivíduos distintos em uma só família, um só povo, Israel do
Senhor.

3.2 A COMUNHÃO DOS SANTOS NO NT

Falar de comunhão e igreja no período neotestamentário é uma tarefa tanto fácil


quanto difícil, no aspecto de que há muito que se possa dizer. Todavia, de forma objetiva este
trabalho apenas apresentará as colocações mais essenciais que dizem respeito a comunhão dos
santos na era inicial do cristianismo. Berkhof diz que:

A Igreja do Novo Testamento e a da Antiga Dispensação são essencialmente uma só.


[...] Contudo, diversas mudanças importantes resultaram da obra realizada por Jesus
Cristo. A Igreja foi separada da vida nacional de Israel e obteve uma organização
independente. Em conexão com isto, os limites nacionais da Igreja foram eliminados.
O que até essa época tinha sido uma Igreja nacional, então assumiu caráter universal.
E a fim de realizar o ideal de extensão mundial, teve que se tornar uma Igreja
missionária, levando o Evangelho da salvação a todas as nações do mundo.174

Os discípulos de Jesus foram comissionados para romperem a barreira do


nacionalismo, a igreja agora não era mais constituída por Israel, “mas a todos quantos o
receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que crêem no seu
nome;”175 (Jo. 1.12). Todos quantos recebem a Cristo pela fé se tornam família de Deus, igreja
do Senhor (Cf. Ef. 2.19-22). A igreja reunida por Jesus Cristo agora deve cumprir a missão a
qual Israel falhou em cumprir, isto é, a de tornar a glória de Deus conhecida entre todas as
nações da terra – todas as nações seriam abençoadas na família de Abraão (Gn. 12). Isso só se
tornou possível por causa de Jesus Cristo, o servo perfeito que, diferente de Israel, foi obediente,

173
HORTON, Michael. Cristianismo sem Cristo. Cambuci: Cultura Cristã, 2010, p.177.
174
BERKHOF, 1994, p.524.
175
BÍBLIA, 2011, p.1064.
43

e por causa de tudo o que ele fez, toda a sua obra. Assim nasceu a ekklesia neotestamentária,
na proclamação de quem Jesus era e de tudo o que ele realizara.

A igreja cristã no início, geralmente se reunia nas sinagogas, mas logo se tornou
designada pela palavra (ekklesia). Depois da ascensão, a comunidade dos crentes em
Cristo se tornou a igreja, uma assembleia religiosa independente que age no lugar de
Israel como o novo povo de Deus. Começando em Jerusalém, a igreja se espalhou
pela Ásia Menor, embora o Novo Testamento continue a falar de todas as igrejas da
Judeia, Galileia e Samaria e das regiões missionárias no singular, como ekklesia. A
palavra sublinha a unidade orgânica básica de congregações individuais e reuniões
locais de crentes no corpo universal de Cristo. A ekklesia é o povo eleito de Deus. 176

Reconhecer os gentios como povo eleito de Deus não foi assim tão simples para
os judeus cristãos, por isso, é possível encontrar diversas exortações nas cartas de Paulo às
igrejas gentílicas sobre a inclusão destes na aliança firmada entre Deus e seu povo eleito.
Declarações como a encontrada em Gálatas 3.28: “Dessarte, não pode haver judeu nem grego;
nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo
Jesus.”177 Ou Efésios 2.14: “Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos [gentios e judeus] fez
um; e tendo derribado a parede da separação que estava no meio, a inimizade,” 178 são alguns
dos exemplos disso.
Essa unidade sempre foi algo que Cristo demandou de sua igreja. Dever e
Dunlop afirmam que “[...] nas epístolas do Novo Testamento, esse tema permanece central. É
a unidade na igreja que faz os céus contemplarem-na (Ef 3.10). É o amor entre os irmãos que
evidencia quem são os filhos de Deus (1Jo 3.10)179”. E, também dizem que “o amor que
caracterizará os crentes como seguidores de Jesus é o mesmo tipo de amor sacrificial [...] que
Jesus mostrou para conosco. É um amor que tem a profundidade da cruz; é um amor que tem a
extensão que alcança o céu e a terra”180. O embasamento dos autores está nas palavras do
próprio Senhor Jesus Cristo em Jo. 13.35: “Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos:
se tiverdes amor uns aos outros”181. O amor é o dom supremo apontando por Paulo em sua
primeira carta a igreja em Corinto. Esse amor é requerido dos santos que fazem parte do corpo
de Cristo, assim a sua igreja deve ser unida: através do amor. Dever e Dunlop também levam
em consideração esse dom e sua expressão na comunidade da fé, eles dizem que a afeição dos
cristãos uns pelos outros é derivada, não é algo que surge naturalmente deles, mas que é uma

176
BAVINCK, 2012, p.277.
177
BÍBLIA, 2011, p.1182.
178
Ibid.
179
DEVER, M. e DUNLOP, J., 2016, p.265, (grifo nosso).
180
Ibid, p.49.
181
BÍBLIA, 2011, p.1085.
44

consequência do amor de Cristo. Esse amor é um resultado de sua adoração a Deus – um Deus
que salvou pessoas de muitas “comunidades” diferentes deste mundo, para torná-las sua
família182. Por isso, os dois grandes mandamentos são amar a Deus sobre todas as coisas e ao
próximo como a si mesmo.
Horton também que diz que “[...] é suficientemente evidente na oração sumo-
sacerdotal de Jesus em João 17, [que] a unidade do povo de Cristo é encontrada em sua união
com ele, que é, também, por meio dele, uma comunhão com a Trindade. E essa é uma unidade
na verdade”183. Na oração sacerdotal de Jesus, ele roga ao pai que, aqueles que o pai lhe deu,
sejam um como ele o pai o são (Cf. Jo. 17.21). Isso demonstra o desejo do Senhor Jesus Cristo
de que seu povo seja unido. Por isso, ele comissiona todos os seus seguidores a fazerem outros
discípulos, inserindo-os (batizando-os) na família da fé, na família de Deus (Cf. Mt. 28.18-20).
Jesus unido ao Pai em amor, roga a este pelo amor que ambos desfrutam um com o outro que o
seu povo eleito também possa desfrutar desse mesmo amor. Isto foi dito por ele em momentos
que antecederam sua morte quando estava reunido apenas com os mais próximos e não com
toda a multidão que o vinha seguindo. Havia uma relação de intimidade, eles comiam juntos.
“Esse é o dado bíblico, e aquele com o qual precisamos começar. Jesus trabalhou com doze
discípulos e viveu com eles em comunidade”184.
Obedecendo esse comissionamento os apóstolos revestidos de poder do alto, isto
é, cheios do Espírito (Cf. At. 1.8), proclamam a obra sacrificial de Cristo a todos e como
resultado, “acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos” (At. 2.47b). Assim,
começava a ser moldada a igreja mais próxima do entendimento que é conhecido hoje a respeito
dela. DeYoung185 diz que “a partir de Atos, [...] sabemos que os primeiros cristãos se dedicavam
ao ensino dos apóstolos em suas reuniões (2:42) e seus cultos envolviam longas pregações
(20:9)”186. Dixhoorn187 afirma algo parecido dizendo que “o padrão do Novo Testamento é
claro: quando as pessoas eram unidas a Cristo elas eram unidas à igreja dele. As pessoas se
dedicavam ao melhor ensino, à comunhão, ao partir do pão, à oração, ao auxílio aos

182
DEVER e DUNLOP, 2016, p.39.
183
HORTON, 2016, p.875.
184
PETERSON, 2005, p.132.
185
Kevin DeYoung é Mestre em Divindade pelo Gordon-Conwell Theological Seminary, pastor titular da Christ
Covenant Church na Carolina do Norte, presidente de The Gospel Coalition e professor assistente no Reformed
Theological Seminary.
186
DEYOUNG, Kevin e KLUCK, Ted. Por que amamos a Igreja. Traduzido por Emirson Justino. São Paulo:
Mundo Cristão, 2010, p.127.
187
Chad B. Van Dixhoorn, teólogo e historiador nascido no Canadá, é professor de História da Igreja e PhD pela
Cambridge University, tem obras publicadas sobre a Assembléia de Westminster: 1643-1652.
45

necessitados e à adoração a Deus (At 2.42-47)188”. Com base no registro que Lucas faz em At.
2.42, ele coloca a atenção no quanto aqueles cristãos foram movidos pelo poder do evangelho
se dedicando “ao melhor ensino, à comunhão, ao partir do pão, à oração, ao auxílio aos
necessitados e à adoração a Deus”.

Essa era uma realidade significativa na igreja primitiva. Muito se fala sobre métodos
de evangelização daquela igreja, que é de fato importante, contudo, podemos
perceber a importância da comunhão para o êxito daquela obra, ninguém permanece
onde o ambiente não é agradável ou numa igreja onde encontra a discórdia no lugar
da comunhão (Fp.2:14-15).189

Thompson concorda com isso afirmando que “[...] a primeira igreja levava
realmente a sério a sua confraternização, jamais considerando a mesma como uma parte
opcional da vida cristã. [...] Qualquer ligação pessoal com Deus, isolada de um relacionamento
vital com a igreja, perderia todo sentido”190. A igreja existe e se desenvolve como comunidade,
pressupondo, é claro, a existência de comunhão entre aqueles que nela se reúnem, que são
unidos a ela.
Isso não significa de maneira alguma que esta nova igreja estava isenta de
conflitos, pelo contrário, o registro que Lucas faz em At. 6 mostra que logo no começo surgiu
um problema que poderia ter dividido a igreja ali, porém, aquela igreja liderada pelos apóstolos
lidou com a questão de maneira sábia não tomando eles a frente do problema, mas, convocando
a igreja a eleger homens que solucionariam aquela demanda. Dever comenta que “quase todo
cristão na terra foi chamado para aquela reunião. Isso mostra como as viúvas são importantes;
mostra como a unidade é importante”191. Unidade esta que, desejada por Cristo para o seu corpo,
deve ser mantida por sua igreja, como Dever mesmo completa seu comentário a respeito da
passagem em questão: “[...] proteger a unidade é, em última análise, responsabilidade da
igreja”. Thompson também afirma que “[...] Paulo teve a necessidade de lembrar muitas vezes
as igrejas novas que a fé bíblica é vivida em comunidade. Toda vez que o individualismo
procurou quebrar a comunhão, Paulo parece ter chamado a atenção de seus leitores no sentido
de que Deus desejava a “comunhão””192.

188
DIXHOORN, Chad Van. Guia de Estudos da Confissão de Fé de Westminster. Traduzido por Edmilson
Francisco Ribeiro. São Paulo: Cultura Cristã, 2017, p.349.
189
Edições Cristãs Rhêmata. Revista. Ano XXV – Nº51. Eis a noiva! Editor Rev. Marcelo Batista Dias. Ipatinga-
MG: Presbitério Leste Vale do Aço. p.87.
190
THOMPSON, 1983, p.15.
191
DEVER, M. e DUNLOP, J., 2016, p.218.
192
THOMPSON, 1983, p.16.
46

Para Dever e Dunlop “o Novo Testamento parte da premissa de que [...] cristãos
devem considerar-se responsáveis uns pelos outros (Mt. 18.15-20). Todos os cristãos devem
encorajar uns aos outros na fé (Hb. 10.23-25). E todos os cristãos devem amar profunda e
sacrificialmente (Rm. 12.1-3)”193. Não se deve nunca desconsiderar a responsabilidade humana
quando se trata da ação da igreja em cumprir sua tarefa. Pois, o apóstolo Paulo afirma que
somos cooperadores de Deus (1Co. 3.9). Assim como, “em 1 Coríntios 14, Paulo deixa claro
que a igreja se reúne, principalmente, para edificar os crentes. Tudo que fazemos deve almejar
o glorificar a Deus para edificarmos uns aos outros”194. Dixhoorn também caminha nessa
direção, ele diz:

Quando uma pessoa é trazida a Cristo o trabalho da igreja não está feito; ele só
começou. Enquanto os cristãos forem imaturos, eles irão se satisfazer com o vazio
do mundo em vez da plenitude de Cristo; enquanto vermos membros sacudindo com
toda onda de erro que vem em nossa direção, enquanto essas condições existirem,
temos capacitação a fazer, um ministério na ordem do dia, um corpo para edificar.
Na verdade, algo que fica claro nesses versos é que os dons da igreja não são
concedidos apenas para causa dos ministros, e não para os membros, mas para todos.
Paulo pressupõe a missão da igreja em Efésios 4. Os santos precisam estar reunidos
para que possam ser aperfeiçoados195.

Horton também comenta a passagem de Efésios 4 dizendo que “o foco aqui é


restrito à obra de trazer unidade e maturidade ao corpo por meio da sã doutrina”196 e, por isso,
“Cristo deu apóstolos, profetas, evangelistas e pastores e mestres para o ministério da Palavra
que leva todo o corpo à unidade, maturidade e plenitude em verdade”. Conquanto, ele mesmo
ressalta que “isso não significa dizer que o corpo está completo nesses ofícios apenas e por
meios deles, porque há outros dons mencionados em outros lugares (esp. Rm 12 e 1Co 12)”.
Que é exatamente onde Thompson coloca sua ênfase ao comentar Ef. 4. Ele diz que “a unidade
prevista em Efésios 4, porém, não pode ser encontrada em nenhum desses tipos, pois na igreja
ela é mantida pelos cristãos, individualmente”197. “Em Efésios 4.16 a igreja é um corpo ‘bem
ajustado e consolidado, pelo auxílio de toda junta, segundo a justa cooperação de cada parte,
...’ A unidade da igreja [...] é criada quando cada um se dedica à edificação do corpo de Cristo”,
assim “todo cristão exerce um papel importante na edificação da igreja” 198.

193
DEVER, M. e DUNLOP, J., 2016, p.229.
194
Ibid, p.270.
195
DIXHOORN, 2017, p.350.
196
HORTON, 2016, p.930.
197
THOMPSON, 1983, p.103.
198
Ibid, p.104.
47

Essa analogia da igreja como corpo de Cristo é um elemento muito importante


no NT no que diz respeito a comunhão dos santos, afinal de contas, “não somos apenas
batizados em Cristo; somos batizados em seu corpo (1 Co 12.13). A comunhão com Cristo
exige comunhão com o seu corpo”199. A respeito dessa analogia Horton afirma: “[...] nas poucas
passagens que diretamente invocam a analogia do corpo de Cristo (Ef 4, Rm 12, 1Co 12), somos
lembrados que cada membro tem o seu papel no corpo, e não que cada membro é todo o corpo
ou que cada membro é assimilado ao todo”200. Thompson ainda assevera: “as reflexões dele [de
Paulo] devem fazer impacto em nosso comportamento como cristãos. Nossa comunidade não
foi só criada por Cristo, mas também não existe relação com Ele se não formos membros do
seu corpo, a igreja!”201. Ele também diz que “o corpo não pode funcionar sem as inter-relações
de todas as suas partes. Nenhum dos ligamentos do corpo é dispensável, por menor que seja,
como Paulo faz lembrar aos Coríntios (I Co 12.18)”202, por isso, ele termina dizendo que “a
comunhão é real apenas quando cada um de nós, como partes de um corpo, contribui para que
o ministério se mantenha ativo”203. Fica muito claro em todas essas colocações o mesmo ideal
de serviço que deve estar presente no corpo, apresentado aqui no primeiro capítulo quando
tratou da comunhão horizontal. Cada um dos membros do corpo de Cristo foi habilitado pelo
seu Espírito Santo a exercer um papel de contribuição para a edificação do corpo. Por isso há
diversas listas de dons no NT.
Azevedo comenta a respeito dessas listas de dons e diz que:

Uma leitura aberta de Romanos 12.6-8, 1Coríntios 12.7-11, Efésios 4.11 e 1Coríntios
12.27-31, associada com outros textos, autoriza-nos a pensar que os dons espirituais
são de quatro tipos: motivacionais (que nos motivam em nossos ministérios como um
estilo de vida), manifestacionais (habilidades sobrenaturais dadas pelo Espírito Santo
para uma ação que supere os limites da razão), funcionais (que requerem preparo
específico e tempo prioritário para o seu exercício) e voluntários (que não são
indispensáveis, como o martírio). São sempre dons para os outros, dons para a
edificação.204

Essas categorias de dons apresentadas por ele mostram que os dons são sempre
comunitários, são sempre para os outros. Nisto consiste a exortação de Paulo aos cristãos
corintos, quando após desenvolver seu argumento quanto ao dom de línguas ele conclui:
“Assim, também vós, visto que desejais dons espirituais, procurai progredir, para a edificação

199
THOMPSON, 1983, p.46.
200
HORTON, 2016, p.876.
201
THOMPSON, 1983, p.46.
202
Ibid, p.104.
203
Ibid, p.46.
204
AZEVEDO, Israel Belo de. Gente cansada de igreja. Rio de Janeiro: Habacuc, 2003, p.64.
48

da igreja.”205 (1Co 14.12). Isto é, todos os dons com os quais o Espírito Santo habilita os cristãos
são, definitivamente, para o crescimento/edificação da igreja, da comunidade e não para o
crescimento do cristão em particular, de forma individualizada.
Comentando o texto de Hebreus, Dever e Dunlop concluem o raciocínio a
respeito do que o Novo Testamento ensina sobre a igreja e comunhão dos santos. Eles dizem:

Devemos guardar “firme a confissão da esperança, sem vacilar” (Hb 10.23),


enquanto “estimulamos uns aos outros ao amor e às boas obras” (v.24), o que é a
razão pela qual nunca devemos negligenciar o ato de nos congregar (v.25). A igreja
local é o mecanismo de Deus para proteger um evangelho não adulterado. Por isso,
Paulo pôde chamar a igreja de “coluna e baluarte da verdade” (1Tm 3.15). 206

205
BÍBLIA, 2011, p.1164.
206
DEVER, M. e DUNLOP, J., 2016, p.54.
49

CAPÍTULO 4 – A DOUTRINA DA COMUNHÃO DOS SANTOS E ALGUNS


EMBATES DA PÓS-MODERNIDADE

O presente capítulo se concentra na aplicação da doutrina da comunhão dos


santos no contexto de pensamento social atual: a pós-modernidade207. Amorese208 aborda o
assunto da modernidade e suas influências sob uma cosmovisão cristã em sua obra Icabode. Em
um dos capítulos o autor lida com as diversas crises (crise de autoridade, doutrinária, de
solenidade e reverência, etc.), as quais a igreja moderna tem de enfrentar e então ele encerra
com a crise comunitária. “A crise comunitária é uma síntese de todas as outras crises, é
resultante de todos os ataques sofridos na modernidade”209. Por isso, à medida que uma
sociedade se moderniza, sua igreja tem de fazer mais esforço para ser comunidade. A
modernidade em si já está contra a proposta de comunidade, contra a ideia de um círculo de
relacionamentos e crescimento mútuo através da obediência ao ensinamento bíblico de
instrução, perdão, suporte e amor uns pelos outros (Cf. Cl. 3.12-17). Por que isso acontece?
Amorese defende que o pensamento moderno está baseado em três principais pilares:
pluralização, privatização e secularização.
A ideologia por trás da pluralização é a de que não há absolutos, não há apenas
uma opção correta, cada um poderá escolher o que julgar melhor para si mesmo, assim, existe
uma ideia de que todos podem saber tudo. A privatização é o que vem extremamente conectada
a pluralização. Amorese utiliza-se da expressão “dá licença” para exemplificá-la. Ela diz
respeito ao fato de que cada um é livre para fazer suas escolhas, viver a sua vida, sem que
ninguém de fora possa opinar na forma como tal pessoa escolheu viver, “a vida é minha, dá
licença?”. Ele diz que talvez, por isso, à medida que se desenvolve o mundo privado se torna
um mundo de solidão. O último pilar, ou a última perna de sustentação da modernidade,
segundo Amorese é a secularização que pode ser apontada como um resultado das duas demais.
Se cada indivíduo pode escolher o que é melhor para si (pluralização), e nenhum outro indivíduo

207
Terry Eagleaton, filósofo britânico, define pós modernidade como uma linha de pensamento que questiona as
noções clássicas da verdade, razão, identidade e objetividade, a ideia de progresso ou emancipação universal, os
sistemas únicos, as grandes narrativas ou fundamentos definitivos de explicação.
208
Rubem Martins Amorese formou-se em comunicação social e literatura francesa. Mestre em comunicação pela
Universidade de Brasília, e autor de Louvor, Adoração e Liturgia e Meta-História, dentre outros.
209
AMORESE, Rubem Martins. Icabode: da mente de Cristo à consciência moderna. Viçosa: Ultimato, 1998,
p.142-143.
50

deve (ou pode) opinar nisso, com a religião não será diferente210. É a mesma ideia que Ted
Kluck211 apresenta juntamente com DeYoung quando diz que “[...] ‘Ninguém vai me dizer o
que fazer’ bem podia ser o lema da minha geração. Então, pela lógica, é difícil fazer alguém
sentar-se no banco da igreja e ouvir alguém ensinando”.212 Há uma rebeldia natural na geração
atual de seguir aquilo que a tradição propõe.
Horton também comenta o assunto, para ele o homem pós-moderno é rodeado
“por uma cultura de consumo de quase infinitas escolhas”, de maneira que ele pode ser tudo o
que quiser ser. E isso, de acordo com ele, nos conduz ao pensamento da negação da existência
de “[...] Deus como o Criador dos “eus” e como Redentor daqueles mesmos “eus” que
constantemente reinventam a si mesmos em seres distorcidos e de maneira auto-enganosa”213.
A conclusão a que Amorese chega é a de que “a religião da modernidade tende a ser uma
religião sem compromisso com um Deus transcendente (embora, muitas vezes, muito
compromissada com o grupo), apoiada numa bondade nunca bem definida e sem distinção entre
o bem e o mal (imoralidade) [...]”214. Por isso, Osmer215 afirma que “a igreja falhou em
providenciar para as pessoas os recursos intelectuais e espirituais necessários para a vida no
mundo pós-moderno”216.
Essa ideologia presente na sociedade atual conduziu ao surgimento de
movimentos contra a ideia da comunidade de igreja que vinha sendo mantida tradicionalmente,
dentre eles, talvez o que tenha maior destaque hoje seja o movimento dos desigrejados. Além
dele faz-se importante discutir também a respeito da igreja emergente que vem ganhando força
em nossos dias. A compreensão acerca desses movimentos conduzirá inevitavelmente a afirmar
a necessidade de vínculo a uma igreja local e frequência em seus cultos por parte dos membros
do corpo de Cristo.

210
Os conceitos apresentados são todos retirados do pensamento de Amorese e podem ser encontrados em
AMORESE, Rubem Martins. Icabode: da mente de Cristo à consciência moderna. Viçosa: Ultimato, 1998.
211
Ted Kluck é autor de vários livros sobre temas diferentes, dentre eles a Igreja emergente. Seu trabalho apareceu
em ESPN The Magazine e Christianity Today.
212
DEYOUNG, Kevin e KLUCK, Ted. Por que não somos emergentes. Traduzido por Fernando Kerr. São Paulo:
Cultura Cristã, 2018, p.58.
213
HORTON, Michael S. Um Caminho Melhor. Tradução de Wadislau Martins Gomes. São Paulo: Cultura
Cristã, 2007, p.57.
214
AMORESE, 1998, p.69-70.
215
Richard é professor de Missão e Evangelismo do Princeton Theological Seminary, Mestre em divindade pela
Universidade Yale.
216
OSMER, Richard R. The case for cathecism. Christian Century (23-30 de Abril de 1997), p.408.
51

4.1 A IGREJA EMERGENTE E OS DESIGREJADOS

DeYoung diz que tentar definir igreja emergente é como “tentar pregar
gelatina”,217 entretanto, acaba chegando à conclusão que o movimento emergente pode ser lido
como uma “conversa”, um eterno debate que aceita as mais diversificadas colocações onde o
tema principal está sempre sendo moldado a partir de “novos elementos” que vão sendo
inseridos na conversa a medida em que ela avança. Nessa conversa os líderes do movimento
emergente podem ser considerados como interlocutores, eles é quem estão ditando o “rumo”
que ela vai tomar. DeYoung e Kluck afirmam que “um dos seus críticos descreveu a igreja
emergente como um movimento de protesto – protesto contra o evangelicalismo tradicional,
protesto contra o modernismo e protesto contra as megaigrejas que querem agradar aqueles que
estão à procura de espiritualidade”218. Isto quer dizer que a igreja emergente surge como uma
“resposta” a igreja em seu modelo tradicional de culto, com uma grande aceitação pelo novo e
a defesa de que precisamos sempre nos adequar ao que melhor serve a comunidade. Nesse
modelo não há qualquer preocupação de que a igreja apresente as verdadeiras marcas de uma
igreja saudável, de participação por parte do membro dos sacramentos porque Deus recebe a
adoração de todas as formas.
DeYoung e Kluck citam D. A. Carson afirmando que a tolerância hoje é mais
uma recusa de dizer que alguém está errado219. Não há qualquer valor absoluto, tudo é válido,
tudo é aceitável, tudo pode e até deve ser mudado. Pós-moderno, não? Esse entendimento se
deve ao fato de que “a Bíblia assumiu um papel diferente nas comunidades emergentes. A Bíblia
não é mais a voz de Deus vinda do céu e certamente não é a fundação”220. Gonçalves221
concorda com isso em seu artigo e afirma que “as igrejas emergentes estão mais preocupadas
com o ouvinte do que com a mensagem em si, e em seu desejo de pregar um evangelho que
seja “aceitável” ao homem pós-moderno, acabam por negligenciar os pressupostos básicos do
cristianismo”222. Por isso, “a tarefa da teologia, no modelo emergente, é expressar crenças e
valores comunitários, para estabelecer a “rede de significados” e a “matriz de significados”

217
DEYOUNG e KLUCK, 2018, p.18.
218
Ibid, p.19.
219
Ibid, p.87.
220
Ibid, p.66.
221
Leonardo Gonçalves descreve a si mesmo em seu website “Púlpito Cristão” como missionário e blogueiro
residente em Piura.
222
GONÇALVES, Leonardo. Igreja emergente: o que é isso? In: Púlpito Cristão (website). Disponível em:
<http://pulpitocristao.com/2010/07/igreja-emergente-o-que-e-isso.html>. Acesso em 22 de jul. 2019.
52

dessa comunidade particular”223. Nesse modelo a espiritualidade é emocionante, é uma aventura


e a religião (ou ter um vínculo religioso) não. “A igreja emergente é orgânica em vez de linear,
vivencial em vez de orientada para o espectador. Eles têm reuniões de adoração em vez de
cultos”,224 buscando ser atrativa para a sua clientela. O objetivo é encher os templos e ser uma
igreja adaptada a sociedade ao seu redor, uma igreja que ao invés de ser sal da terra e luz do
mundo (distinta), se encaixa nele.
DeYoung e Kluck propõem uma lista de coisas que a igreja emergente tem a
dizer a respeito da igreja tradicional. Basicamente o pensamento da igreja emergente é que o
cristianismo evangélico atual não se importa com os pobres; favorece a política de direita;
promovem um tipo de salvação “dentro ou fora”; é falso e com uma experiência de adoração
inautêntica; além de os cristãos serem pouco criativos e artisticamente limitados225. “Para os
emergentes, o cristianismo é uma história da qual se extrai uma ética, mais do que uma
proposição de redenção de vida”.226 Para eles o reino de Deus é algo muito próximo de um
plano de paz mundial. “Isto é, os líderes emergentes estão querendo o céu na terra antes do
retorno de Jesus trazendo um novo céu e uma nova terra. Os líderes emergentes nos desafiam a
imaginar um mundo sem pobreza, guerra e injustiça”.227 Existem diversos elementos que
desqualificam o movimento emergente como igreja de Cristo, entretanto, “acreditamos que os
cristãos emergentes também amem a igreja e Jesus. Aquilo de que discordamos é a forma e a
substância desse amor”,228 afirmam os autores.

[...] o movimento emergente vê a si mesmo como a forma das coisas que virão, em
relação às mudanças culturais, e que a maioria das pessoas no movimento o vê como
uma reação, seja à igreja tradicional com suas proposições e ensinamentos, seja à
igreja sensível aos que estão buscando espiritualidade, com sua superficialidade
orientada para o entretenimento.

Por isso, esse movimento “tornou-se um porto seguro para pessoas que foram
magoadas ou que pensam ter sido magoadas pelas igrejas evangélicas tradicionais”229. O que é
exatamente uma das razões que mais fundamenta o movimento dos desigrejados, que não é

223
DEYOUNG e KLUCK, 2018, p.73.
224
Ibid, p.138.
225
Ibid, p.90.
226
Ibid, p.127.
227
Ibid, p.166.
228
Ibid, p.22.
229
Ibid, p.204.
53

nada novo dentro da igreja. Bomilcar230 os define como “pessoas descrentes quanto às reais
possibilidades de ser igreja”231.
Campos232 diz que “em 2010, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
registrou no censo o contingente de quatro milhões de brasileiros que se declararam aos agentes
censitários como evangélicos sem vínculos institucionais”233 e os define como “cristãos que
não congregavam ou não assistiam em nenhuma comunidade eclesial”234. Em um artigo mais
recente para a Revista Ultimato de Nov. de 2018, Gomes escreve sobre o que ela chama de
“desigrejismo” e afirma que “cresce o número daqueles que intencionalmente não se ligam a
uma igreja ou que deixaram igrejas que frequentavam. Estima-se que sejam quase 10
milhões”.235 Isso aponta diretamente para a força que esse movimento ganhou e tem ganhado
em nossa sociedade.
Há de se considerar que “este grupo não é homogêneo”.236 Campos os classifica
em pelo menos dois tipos: basicamente a massa de desigrejados está polarizada entre os
decepcionados com a liderança – cristãos que foram enganados por promessas vazias que nunca
se cumpriram, se surpreenderam com desvio de caráter de suas lideranças, sofreram algum tipo
de abuso espiritual ou acepção com base em suas condições sociais e econômicas – e os críticos
do modus operandi da instituição,237 ou como ele mesmo se refere em sua entrevista à Gomes,
críticos do sistema – aqueles que defendem que a igreja contemporânea com seus templos,
hierarquias, liturgia, etc. não possuem base bíblica e tampouco foram planejadas pelo Senhor
Jesus.
Botelho238 também entrevistado por Gomes, afirma as seguintes razões para que
alguém tenha se tornado desigrejado239. Ele afirma que fazemos parte de uma geração
desacreditada de qualquer tipo de instituição; que isso se deve à um fenômeno pós-

230
Nelson Bomilcar é músico, compositor, pastor e escritor. Estudou teologia na Faculdade Batista de São Paulo,
na Universidade Metodista de São Paulo e no Regent College em Vancouver, Canadá.
231
BOMILCAR, Nelson. Os sem-igreja: buscando caminhos de esperança na experiência comunitária. São Paulo:
Mundo Cristão, 2012, p.15.
232
Idauro Campos Júnior é Ministro Congregacional, Bacharel em Teologia com pós-graduação em Teologia
Contemporânea. Com especialização em História da Igreja e mestrado em Ciências da Religião.
233
CAMPOS, Idauro. Desigrejados: teoria, história e contradições do niilismo eclesiástico. 7. ed. Rio de Janeiro:
bvbooks, 2017, p.19.
234
CAMPOS, 2017, p.19.
235
GOMES, Ariane et al. Desigrejismo: anomalia ou opção?. In: Revista Ultimato. Ano LI. Nº 374.
Novembro/Dezembro 2018, p.42-46.
236
GOMES, 2018, p.42-46.
237
CAMPOS, 2017, p.30.
238
Marcos Botelho é fundador do JV na estrada e do ministério Terra de Palhaços, pastor da Igreja Presbiteriana
de Alphaville, São Paulo.
239
É importante diferenciar o desigrejado do “desviado”. O desigrejado deixa a sua congregação mas mantêm sua
confissão dogmática e reconhecem a necessidade de uma vida piedosa, o desviado não.
54

neopentecostais onde milhares de pessoas se decepcionaram com a teologia da prosperidade240


deixam as suas igrejas e não se encaixam em outras; e, por último, o crescimento numérico da
igreja que pode acabar esfriando os relacionamentos dentro da mesma fazendo com que a
pessoa não julgue mais necessário o ato de congregar.241
Lopes242 (citado por Idauro Campos como um dos primeiros a levantar a
discussão a respeito dos desigrejados) propõe alguns argumentos básicos dos desigrejados:

1) Cristo não deixou qualquer forma de igreja organizada e institucional.


2) Já nos primeiros séculos os cristãos se afastaram dos ensinos de Jesus, organizando-
se como uma instituição, a Igreja, criando estruturas, inventando ofícios para
substituir os carismas, elaborando hierarquias para proteger e defender a própria
instituição, e de tal maneira se organizaram que acabaram deixando Deus de fora.
Com a influência da filosofia grega na teologia e a oficialização do cristianismo por
Constantino, a igreja corrompeu-se completamente.
3) Apesar da Reforma ter se levantado contra esta corrupção, os protestantes e
evangélicos acabaram caindo nos mesmíssimos erros, ao criarem denominações
organizadas, sistemas interligados de hierarquia e processos de manutenção do
sistema, como a disciplina e a exclusão dos dissidentes, e ao elaborarem confissões
de fé, catecismos e declarações de fé, que engessaram a mensagem de Jesus e
impediram o livre pensamento teológico.
4) A igreja verdadeira não tem templos, cultos regulares aos domingos, tesouraria,
hierarquia, ofícios, ofertas, dízimos, clero oficial, confissões de fé, rol de membros,
propriedades, escolas, seminários.
5) De acordo com Jesus, onde estiverem dois ou três que crêem nele, ali está a igreja,
pois Cristo está com eles, conforme prometeu em Mateus 18. Assim, se dois ou três
amigos cristãos se encontrarem no Frans Café numa sexta a noite para falar sobre as
lições espirituais do filme O Livro de Eli, por exemplo, ali é a igreja, não sendo
necessário absolutamente mais nada do tipo ir à igreja no domingo ou pertencer a uma
igreja organizada.
6) A igreja, como organização humana, tem falhado e caído em muitos erros, pecados
e escândalos, e prestado um desserviço ao Evangelho. Precisamos sair dela para
podermos encontrar a Deus.243

Lopes também diz que é possível concordar parcialmente com tais argumentos.
“[...] eles estão certos quanto ao fato de que muitos evangélicos confundem a igreja organizada
com a igreja de Cristo e têm lutado com unhas e dentes para defender sua denominação e sua
igreja, mesmo quando estas não representam genuinamente os valores da Igreja de Cristo”.244
A igreja, de fato, não precisa de templos para que exerça de maneira bíblica a vontade de Cristo,
seu Senhor, tendo sobrevivido dentro da história durante vários anos sem esta estrutura.

240
Resumidamente trata-se da crença religiosa de que a benção financeira é o desejo de Deus para os seus filhos,
os cristãos, e que a fé no Deus que pode dar mais e as contribuições financeiras para os ministérios irão com certeza
aumentar as riquezas dos fiéis.
241
GOMES, 2018, p.42-46.
242
Augustus Nicodemos Lopes é pastor e teólogo presbiteriano, Chanceler da Universidade Presbiteriana
Mackenzie, professor de Exegese, Bíblia e Pregação Expositiva no CPAJ.
243
LOPES, Augustus N. In IPB (website). Informativo. Os Desigrejados. Publicado em 08 de Out. de 2013.
Disponível em <https://www.ipb.org.br/informativo/os-desigrejados-1495>. Acessado em 28 de Jun. de 2019.
244
LOPES, 2013, Online.
55

Todavia, Lopes vai chegar à conclusão de que a briga deles é contra “qualquer coisa que
imponha limites ou restrições à sua maneira de pensar e agir”,245 eles não querem que a igreja
determine sua maneira de ser cristãos, querem ser cristãos que fazem o que querem, querem
experimentar tudo na vida sem qualquer tipo de correção ou disciplina. “Esse tipo de atitude
anti-instituição, antidisciplina, anti-regras, anti-autoridade, antilimites de todo tipo se encaixa
perfeitamente na mentalidade secular e revolucionária de nosso tempo, que entra nas igrejas
travestida de cristianismo”.246
Lopes responde aos argumentos dos desigrejados, mostrando que a igreja foi
instituída pelo próprio Cristo. Jesus não era contra a instituição, nem contra o estabelecimento
de regras disciplinares, de exortação e correção do irmão faltoso (Mt. 18). Ele diz que:

É curioso que a passagem predileta dos desigrejados – “onde estiverem dois ou três
reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mt 18.20) – foi proferida por Jesus
no contexto da igreja organizada. Estes dois ou três que ele menciona são os dois ou
três que vão tentar ganhar o irmão faltoso e reconduzi-lo à comunhão da igreja (Mt
18.16). Ou seja, são os dois ou três que estão agindo para preservar a pureza da igreja
como corpo, e não dois ou três que se separam dos demais e resolvem fazer sua própria
igrejinha informal ou seguir carreira solo como cristãos.247

Cristo é o Senhor da igreja, o cabeça (no sentido de governo) e a cabeça (no


sentido orgânico), ele é o noivo que virá para finalmente encontrar-se com sua noiva e tomá-la
para si. Para Moreira, “o fenômeno dos desigrejados é o efeito colateral de uma igreja que
desconhece a Bíblia em sua riqueza e profundidade”.248 Os desigrejados não entendem o que
Cristo fez ao enviar os seus discípulos a batizarem em seu nome na grande comissão, não
entendem a necessidade da reunião do povo de Deus para o desenvolvimento do corpo de
Cristo. “Os desigrejados querem Cristo, mas não querem sua igreja. Querem o noivo, mas
rejeitam sua noiva. Mas, aquilo que Deus ajuntou, não o separe o homem. Não podemos ter um
sem o outro”.249 Por isso, a conclusão de Moreira é a seguinte: “os crentes, naturalmente,
amarão mais a Igreja quando amarem mais o Senhor dela”250.
Um argumento comum do movimento dos desigrejados (também da igreja
emergente) é ser igreja como a igreja primitiva. Campos dedica uma crítica a esse argumento
afirmando que eles não levam em consideração que a mesma foi uma comunidade histórica

245
Ibid, Online.
246
LOPES, 2013, Online.
247
Ibid.
248
GOMES, 2018, p.42-46.
249
LOPES, 2013, Online.
250
GOMES, 2018, p.42-46.
56

única. “O movimento erra ao não avaliar de forma precisa equívocos que a Igreja Primitiva
cometera em sua extraordinária fase incipiente”.251 Para Campos, a igreja almejada pelos
desigrejados e emergentes não passa de um mito, a própria igreja primitiva tinha necessidades
e problemas e exigia dos apóstolos muito zelo, pastoreio e exercício de disciplina (Cf. At. 5).
Ele conclui dizendo que cada geração possui sua responsabilidade. “Não é necessário, portanto,
destruir templos, negligenciar a liturgia, caricaturar ministros do Evangelho, descontextualizar-
se e retornar ao século I para ser uma igreja bíblica e relevante no século XXI”252. Já foram
apresentadas neste trabalho as marcas que distinguem a verdadeira igreja de Cristo na terra e
aspectos da sua natureza que são relevantes para a comunhão dos santos. A igreja emergente e
os desigrejados ignoram essas marcas, no caso dos desigrejados muitos acreditam não encontrá-
las em nenhuma comunidade visível e por isso optam por não congregar, o que vai contra o
entendimento da doutrina da comunhão dos santos.

4.2 A COMUNIDADE DE FÉ E A EDIFICAÇÃO DO CORPO

Campos afirma que “não é difícil compreender a relação de deterioração do


senso de pertencimento na pós-modernidade”253, ou, colocando em outras palavras hoje é mais
difícil que as pessoas entendam que pertencem a determinada comunidade da fé, é mais difícil
que elas se sintam parte dessa comunidade e queiram de alguma forma envolver-se para ver
essa comunidade se desenvolvendo. “E, quanto ao pertencimento, é descartável, pois não há
pertencimento comunitário em uma sociedade individualizada e privatizada, como se verifica
na pós-modernidade”254. De Young e Kluck, ao fazerem sua avaliação dessa nova maneira de
nos relacionarmos na pós-modernidade, afirmam que isso está presente em nossas igrejas
também:

Hoje em dia valorizamos os relacionamentos porque temos tão poucos que sejam
duradouros, queremos ser ouvidos porque tão poucos nos escutam, queremos nos
conectar porque somos tão sozinhos, e pensamos que somos superiores a cada geração
anterior (que ainda é um lugar onde a ideia iluminista de progresso ainda não foi
vencida). São essas e muitas outras atitudes que provavelmente levaremos para a

251
CAMPOS, 2017, p.171.
252
Ibid, p.175.
253
CAMPOS, 2017, p.178.
254
Ibid, p.177.
57

igreja. Elas constituem o lugar em que estamos e do qual avaliaremos qualquer


igreja.255

Não há uma maneira de se ignorar a influência que essas correntes exercem em


no comportamento humano, e, acreditar na neutralidade das relações não é logicamente
possível. A igreja é um lugar onde as relações acontecem continuamente, e com certeza sofrerão
com as influências da pós-modernidade. O que Horton coloca a respeito do culto na pós-
modernidade é o seguinte: “todo mundo tem de ser excêntrico, e cada empreitada bem-sucedida,
incluindo a da igreja, tem de atender às excentricidades de cada pessoa (ou nova geração)”. E
ele ironiza perguntando “por que haveríamos nós, pós-modernos, de esperar que pensemos e
cultuemos da mesma maneira que os pré-modernos?”.256 É claro que o que ele quer apontar
com seu comentário é que hoje em dia a igreja (instituição) vive “inovando” para agradar
aqueles que têm adentrado suas portas, sem, contudo, conseguir satisfazer a ninguém. Isto é,
existem diversos desafios a ideia do “ser igreja” enquanto comunidade na pós-modernidade,
existem questionamentos sendo levados a respeito da necessidade de congregar. Assim,
Barbosa diz que o desafio que está diante da igreja na atualidade é o “de preservar o propósito
original de aliança de Deus com seu povo, de conseguir simplesmente ser igreja”257.
Por isso, este trabalho também continuará a falar sobre os conceitos em torno da
doutrina da igreja e da comunhão dos santos, considerando agora seu aspecto visível. Franklin
Ferreira258 orienta a observação da obra do Espírito que reúne e congrega seu povo em uma
Igreja visível, para isso, ele apresenta a seguinte afirmação: “o Espírito Santo, que aplica as
graças alcançadas por Cristo na cruz aos que creem, ajunta esses eleitos e reúne-os numa santa
comunhão, levando-os a fazer parte de uma igreja local”.259 Esse é para Sauter o processo de
formação da igreja de Cristo. Ele diz que: “essa transformação por meio do Espírito de Deus de
modo nenhum conduz ao isolamento e à retração para a vida privada [...] Os seres humanos são
postos diante de Deus e sua comunidade (não apenas seu destino) é assim constituída”260.
Na Confissão de Fé de New Hampshire, a igreja visível é definida da seguinte
forma:

255
DEYOUNG e KLUCK, 2018, p.10.
256
HORTON, Michael S. Um Caminho Melhor. Tradução de Wadislau Martins Gomes. São Paulo: Cultura
Cristã, 2007, p.56.
257
AMORESE, 1998, p.11.
258
Franklin Ferreira é bacharel em Teologia pela Universidade Mackenzie e mestre em Teologia pelo Seminário
Batista do Sul (RJ). Diretor do Seminário Martin Bucer.
259
FERREIRA, Franklin. Teologia Cristã. São Paulo: Vida Nova, 2011, p.183.
260
SAUTER, Gerhard. What Dare we Hope? Reconsidering Eschatology. Harrisburg: Trinity Press International,
1999, p.208.
58

Uma igreja visível de Cristo é uma congregação de crentes batizados, associados por
aliança na fé e na comunhão do evangelho, observando as ordenanças de Cristo e
governados por suas leis, exercendo os dons, direitos e privilégios investidos neles
pela Palavra de Cristo.261

A visibilidade da igreja de Cristo está inteiramente conectada a igreja como


instituição, conquanto não seja possível eliminar de maneira alguma o elemento orgânico do
corpo de Cristo (espalhado nos quatro cantos da terra) que também é tornado visível nessa
instituição. É a reunião numa santa comunhão ou a associação por aliança na fé e na comunhão
do evangelho (para usar os termos dos conceitos aqui apresentados) que faz a igreja ser igreja.
Machado, no prefácio do livro de Bomilcar, diz que “a experiência em comunidade é uma das
grandes evidências da nossa humanidade. Ao viver em grupo, em meio a interações e vínculos
fortes, descobertas acontecem, o amadurecimento é inevitável e nos revelamos e conhecemos
melhor”.262 Isso não é em nada diferente do que a bíblia ensina a respeito da igreja e que
Bomilcar resume da seguinte maneira: “a igreja é edifício, rebanho, família de Deus; pedras
que vivem na linguagem do apóstolo Pedro, o corpo vivo de Cristo segundo o apóstolo Paulo,
expressão visível de Jesus, e que é (ou deveria ser) sal e luz, povo em comunidade e serviço”.263
A ideia de serviço cristão é essencial para o desenvolvimento da comunidade da fé e
aperfeiçoamento do corpo de Cristo.
DeYoung e Kluck também manifestam seu apoio ao serviço cristão dentro de
uma igreja genuína (verdadeira). Eles narram um exemplo do funeral de um cristão chamado
Joe em seu livro e falam sobre autenticidade, eles dizem que “ser autêntico é levar as cargas
uns dos outros. Autênticas são as pessoas que vão a um funeral em roupas de trabalho”.264
Pessoas que param suas vidas, mudam suas rotinas para estarem em comunhão com o corpo em
momentos de necessidade, para investirem em relacionamentos, essas pessoas autênticas é que
compõem o corpo de Cristo vivendo em comunhão umas com as outras.
Thompson diz que “os cristãos que compõem o corpo não são simples
espectadores das obras realizadas, nem devem fazer apenas o papel de benfeitores financeiros.
Como partes do corpo, eles devem empenhar-se ativamente na obra cristã”.265 O que está sendo
levantado aqui é que este ideal de serviço oriundo da natureza do redentor (Cf. Fp. 2.5), de
Cristo como cabeça do corpo. Não se trata de um serviço que exista “superficialmente” no corpo

261
DEVER, Mark. Evangelho e Evangelização. São Paulo: Fiel, 2015, p.31.
262
BOMILCAR, 2012, p.11.
263
Ibid, p.27.
264
HORTON, 2007, p.123.
265
THOMPSON, James. Nossa Vida Juntos: um olhar para a fraternidade cristã. Tradução de Neyd Siqueira. São
Paulo: Vida Cristã, 1983, p.46.
59

de Cristo, porém, é um serviço no qual há completo envolvimento entre os membros do corpo.


“Juntos, partilhando as responsabilidades, funcionamos como o corpo de Cristo. A não ser que
participemos desta tarefa, a comunhão é destruída, pois vários membros do corpo de Cristo, da
mesma forma que as partes do corpo humano, são interdependentes”.266 Por isso, Bavinck
tratando a respeito da igreja e da razão pela qual o Espírito Santo distribui dons entre a mesma,
diz que “os dons do Espírito Santo são distribuídos aos crentes para benefício de outros” 267. E
para ele, isto é o que faz com que a igreja seja capaz de cumprir a sua missão evangelizadora
sobre a terra. Há de forma tácita no pensamento de Bavinck a organização da Igreja para um
ideal de serviço. A vida em comunidade, no que diz respeito aos eleitos, existe para que estes
sirvam uns aos outros, é para isso que são habilitados pelo Espírito Santo.
A Confissão Belga também afirma no artigo 28 a respeito do dever dos salvos
com relação a igreja. Ela diz que “cada um deve se juntar e reunir a ela, mantendo a unidade da
igreja, [...] curvando-se diante de Jesus Cristo e servindo para a edificação dos irmãos, conforme
os dons que Deus concedeu a todos como membros do mesmo corpo”268 (Cf. 1Co 12.7, 27; Ef.
4.16). Nesse texto confessional há mais uma vez o ideal de serviço para a edificação do corpo
de Cristo. Não há possibilidade alguma de negação de que a comunhão dos santos é manifestada
no serviço prestado por cada cristão aos demais membros do corpo em virtude das graças e
dons que usufrui em união com o mestre, Cristo Jesus, cabeça do corpo. Por isso, Thompson
afirma que:

Nós iremos sem dúvida ter uma vida muito mais saudável como igreja quando
encontrarmos serviço para cada um dos membros. Só quando permitimos que cada
um tenha a sua tarefa é que mostramos aceitá-los realmente como partes vitais da
comunidade.269

A comunhão dos santos proporciona o serviço mútuo entre os membros do corpo


de Cristo de maneira que o corpo seja edificado. Por isso, para Mendes270 a igreja é o “lugar
daqueles que são capazes de lavar os pés uns dos outros, socorrer, aliviar. Lugar de irmãos que
servem exaustivamente para que a igreja seja conhecida pelo amor”271. O que está totalmente

266
Ibid, p.46.
267
BAVINCK, H. Dogmática reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p.278.
268
DE BRÉS, Guido. e URSINUS, Zacarias. Confissão Belga e Catecismo de Heidelberg. Tradução de Missão
Reformada no Brasil. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2005, p.26. (grifo nosso).
269
THOMPSON, 1983, p.51.
270
Naamã Mendes é pastor da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil em Maringá- PR e professor na
Universidade Centro Universitario em Maringá (UNICESUMAR). Durante 11 anos foi pastor da Christ The King
Presbyterian Church (Cambridge, MA-EUA).
271
MENDES, Naamã. Igreja lugar de vida. Belo Horizonte: Editora Betânia, 1992, p.50.
60

de acordo com o que Jesus garante aos seus discípulos em João 13.35 (mesmo contexto do lava
pés): “Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros”272.
Bem como com afirmações do apóstolo Paulo em cada uma de suas cartas às igrejas (Cf. Rm.
12; Ef. 4; Fp. 2, dentre outras). Assim Mendes encerra dizendo que “a vida de Cristo está onde
houver gente pronta para servir”.273 Ele acrescenta que a igreja existe como sinal do reino
através de seu serviço cristão mútuo, os membros do corpo de Cristo vivem para servir e não
para serem servidos. Isso é o que verdadeiramente promove vida, não há nada além disso. Veja
o que ele diz: “a vida de Cristo em nós provoca um resultado surpreendente, inteiramente
diferente de qualquer outra associação de pessoas. A igreja tem características próprias que
determinam que ela é a Igreja de Cristo, povo de Deus, corpo de Cristo, sinal visível do reino
de Deus na terra!”274.
MacArthur Jr. escreve um artigo sobre a unidade do corpo de Cristo baseado em
Efésios capítulo 2 onde comenta sobre a afirmação do apóstolo Paulo de que Cristo derrubou a
parede de separação entre judeus e gentios (Cf. Ef. 2.14). Ele inicia seu artigo afirmando
comentando o relacionamento dos cristãos (dos santos) como corpo de Cristo, ele diz:

Somos o Corpo de Cristo; com isto, Deus está querendo indicar que somos um
organismo que cresce, funciona, reage, está ativo e em movimento, respondendo ao
comando de Sua cabeça que é Cristo. Não somos, fundamentalmente, uma
organização, mas um organismo: somos um Corpo. Cada um de nós tem parte ativa
neste Corpo e todos nós dependemos uns dos outros.275

É interessante que o elemento principal dessa analogia é o fato de que os santos


são unidos uns aos outros por causa de Cristo que é o seu (sua) cabeça e que os une de forma
plena uns aos outros como família de Deus, exatamente o que é afirmado pela doutrina da
comunhão dos santos. “Esta unidade no Corpo de Cristo, produz crentes em cujas vidas o amor
supera todas as diferenças, e que se amam mutuamente porque amam a Deus. Homens que
constituem uma unidade porque estão juntos na presença de Deus”.276 Homens e mulheres que
se reúnem para servir a Deus servindo uns aos outros.

Não é maravilhoso o fato que não somos uma organização, mas uma família? Fomos
naturalizados, recebemos uma "dádiva divina, e fomos adotados sobrenaturalmente

272
Bíblia Sagrada. Traduzida por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2. ed. Barueri – SP:
Sociedade Bíblia do Brasil, 2011, p.1085.
273
MENDES, 1992, p.50.
274
Ibid, p.54.
275
MACARTHUR JR., Jhon. A unidade do corpo. In: Monergismo (Website). Disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/igreja/unidade_corpo_macarthur.htm>. Acessado em: 28 de jun. 2019.
276
MACARTHUR JR., Online.
61

na família de Deus, em relacionamento pleno. Judeus e gentios, ambos com a mesma


fé preciosa. Aí Paulo introduz uma nova metáfora: não somos apenas concidadãos,
nem apenas da mesma família, mas também somos um edifício, um templo dedicado
ao Senhor.277

Somos também uma igreja, a igreja do Senhor Jesus Cristo. Bomilcar afirma que
“Jesus, Senhor da Igreja, continua presente na instituição divino-humana, continua nos
convidando para a experiência comunitária de ser sinal do reino (ou igreja do reino)”278.
Beeke e Jones colocam em sua obra sobre a teologia puritana que “em primeiro
lugar, os crentes devem adorar a Deus. Em segundo, os crentes devem fazê-lo com os meios
que ele mesmo designou”279. A igreja é um dos meios designados por Deus para a sua adoração.
Cairns afirma a respeito disso que

A igreja sempre existiu em dois níveis. Um deles é o organismo eterno, invisível,


bíblico, que é consolidado em um corpo pelo Espírito Santo. O outro nível é o da
organização temporal, histórica, visível, humana. O primeiro é o fim, o segundo os
meios.280

A organização histórica da igreja, a igreja visível, é um dos meios designados


por Deus para que o seu povo o adore. Sendo a adoração ao verdadeiro Deus a finalidade de
todas as coisas criadas, há ainda que ser considerado o aspecto do cumprimento da missão por
parte da Igreja. Bavinck diz que a existência da igreja está vinculada ao benefício de outros, o
Espírito Santo dota a igreja de dons para que homens e mulheres sejam chamados para a fé em
cristo, para cumprimento da missão do povo de Deus.281 A igreja é chamada para reunir todos
os eleitos de Deus com o objetivo de congregar, unir o corpo de Cristo. O cumprimento da
missão redunda em louvor ao Senhor, o cumprimento da missão se dá através do meio que é a
igreja.
A igreja visível é o meio através do qual o Senhor Jesus Cristo reúne os seus
santos também para a edificação e aperfeiçoamento do seu corpo. Azevedo afirma que “a igreja
é o projeto de Jesus para manter as pessoas ligadas no alvo da vida, que é crescer em direção à
perfeição, ter a mente de Cristo, pensar nas coisas que são de cima e ter a estatura de Jesus
Cristo”282. Alcançar o que o apóstolo Paulo chama a igreja em Éfeso a alcançar (Cf. Ef. 4).

277
Ibid.
278
BOMILCAR, 2012, p.33.
279
BEEKE, Joel R. e JONES, Mark. Teologia Puritana: doutrina para vida. Tradução de Márcio Loureiro
Redondo. São Paulo: Vida Nova, 2016, p.943.
280
CAIRNS, E. O Cristianismo através dos Séculos. 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1995, p.64.
281
BAVINCK, 2012. p.278.
282
AZEVEDO, Israel Belo de. Gente cansada de igreja. Rio de Janeiro: Habacuc, 2003, p.40.
62

Assim, o poder da igreja é o poder do Senhor da igreja, os santos são a igreja de Cristo
representando e compondo o próprio corpo de Cristo na terra, naturalmente ela é a comunidade
dos que se amam, a partir da fé em Jesus. O amor na comunidade é consequência da fé em Jesus
Cristo. Um lugar cheio de pessoas que tenham interesse por outras pessoas, que amam e cuidam
na mesma medida de Cristo283.
Por isso, há a necessidade de que os cristãos congreguem conforme a Bíblia nos
orienta na carta aos Hebreus, capítulo 10, versículo 25: “Não deixemos de congregar-nos como
é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se
aproxima”284. Olyott285 comenta toda a carta aos Hebreus e a respeito dos versículos 24 e 25 do
capítulo 10 diz chegou o momento de os cristãos exortarem uns aos outros, ou nas palavras dele
“despertar a consciência uns dos outros” quanto ao compromisso cristão. A recomendação aos
hebreus é de que um esforço seja feito para que o amor uns pelos outros aumente e isso seja
parte da vivência cristã comum. Isso não aconteceria se os irmãos se afastassem da comunhão
uns com os outros. E ele termina dizendo que “é impossível viver a vida cristã sozinhos”. O
máximo possível devemos aproveitar as oportunidades de nos reunirmos e nos encorajarmos286.
Thompson concorda e propõe que “o autor aos hebreus escreve uma “palavra de
exortação” para encorajar o povo a não abandonar a fé (Hb 13.33). Ele está profundamente
preocupado com o assunto da fraternidade”287. Ele desenvolve seu raciocínio dizendo que toda
a carta aos hebreus está direcionada a manter a igreja unida e que para que eles tenham
perseverança e fé nessa jornada a presença física de outros cristãos é necessária. Por fim,
Thompson diz que “não participar da assembleia é perder uma oportunidade para o crescimento
de toda a igreja”288. Está claro que é uma determinação da Palavra de Deus que os cristãos
tenham comunhão uns com os outros. Azevedo também diz que “sem uma congregação que
compareça aos seus cultos, uma igreja não consegue vitalidade, porque membros de igreja que
não se ajuntam para ouvir seu Deus não dão prioridade ao Senhor que dizem servir, não levam
a sério o Senhor em quem dizem crer”289. Não há como confiar em uma igreja que não se reúne
para crescer junta alimentada pela palavra de Deus. Igreja é comunidade. O verdadeiro cristão,

283
AZEVEDO, 2003, p.57-59.
284
BÍBLIA, 2011, p.1223.
285
Stuart Olyott nasceu no Paquistão, em 1942. Pastoreou igrejas em Londres, Liverpool e Lausanne. Atualmente,
é o Diretor Pastoral do Movimento Evangélico do País de Gales.
286
OLYOTT, Stuart. A Carta aos Hebreus Bem Explicadinha. Traduzido por Elizabeth Gomes. São Paulo:
Cultura Cristã, 2012, p.95.
287
THOMPSON, 1983, p.107.
288
Ibid, p.115.
289
AZEVEDO, 2003, p.64-65.
63

o santo, sabe que é igreja onde estiver, todavia, se estiver sozinho, então ele será fraco. A
comunidade é uma providência de Deus para o seu crescimento.
Assim, as palavras de Peterson encaixam-se de maneira significativa para o
encerramento deste trabalho:

Quer queiramos ou não, no momento que confessamos Jesus Cristo como nosso
Senhor e Salvador, isto é, da hora em que nos tornamos um cristão, somos ao mesmo
tempo um membro da igreja cristã – mesmo não permitindo que nosso nome seja
posto num rol de igreja, mesmo se recusamos nos identificar com um determinado
grupo e compartilhar responsabilidades com eles, mesmo se nos ausentamos do culto
de uma congregação. Nossa posição de membro da igreja é um corolário de nossa fé
em Cristo. Somos tão incapazes de ser um cristão e não ter nada com a igreja como
ser uma pessoa e não estar em uma família. Ser membro da igreja é um fato espiritual
básica para aqueles que confessam Cristo como Senhor. (...) Somos uma família em
Cristo. Quando nos tornamos cristãos, estamos entre irmãos e irmãs na fé. Nenhum
cristão é filho único.290

290
PETERSON, Eugene. Uma longa obediência na mesma direção. Tradução Helen Hope Gordon Silva. São
Paulo: Cultura Cristã, 2005, p.131.
64

CONCLUSÃO

A doutrina da comunhão dos santos afirma que os santos são unidos à Cristo
Jesus mediante o poder único, verdadeiro e sobrenatural de seu Espírito Santo. Através dessa
união mística os santos participam das graças, dos sofrimentos, da ressurreição e da glória de
Cristo. Essa união à cabeça do corpo, Cristo, une obrigatoriamente os santos uns aos outros
enquanto membros do corpo. Essa união uns aos outros também é marcada pela presença do
Espírito Santo na vida dos eleitos que os fortalece e edifica na comunhão uns com os outros.
Esta é, de acordo com o próprio Senhor Jesus Cristo, uma das formas pelas quais seus discípulos
seriam conhecidos como seus seguidores ao redor do mundo: a manifestação do amor deles uns
pelos outros.
O problema em questão desenvolvido neste trabalho era se há a necessidade de
vínculo à uma comunidade evangélica por parte dos eleitos de Deus. Assim após apresentar a
doutrina da comunhão dos santos em suas aplicações, isto é, a comunhão dos santos com Cristo
e uns com os outros; observar a intrínseca relação entre o desenvolvimento da doutrina da igreja
em suas características essenciais e a comunhão dos santos uns com os outros; considerar a
argumentação dos autores bíblicos quanto a necessidade de tratamento mútuo dos santos que
fazem parte do corpo de Cristo para que este seja edificado (cresça); e avaliar alguns dos
principais argumentos de correntes pós-modernas que defendem não ser necessário que os
eleitos de Deus mantenham-se em determinadas comunidades evangélicas, conclui-se que o
corpo de Cristo deve ser desenvolvido até alcançar também a maturidade. Todos os eleitos que
passam pelo novo nascimento e recebem o batismo em nome da trindade e que tem parte na
mesa da comunhão com o corpo e o sangue de Cristo são considerados parte desse corpo de
Cristo, que pode estar espalhado pelos quatro cantos da terra, contudo, reúne-se em partes de
forma organizacional em comunidades genuinamente cristãs.
Por isso, entende-se que os santos que desfrutam de uma plena e verdadeira
união com Cristo, procurarão unir-se da mesma maneira com demais membros do corpo de
Cristo em tais comunidades genuínas. A forma objetiva de estabelecimento de tal vínculo pode
diferir de comunidade para comunidade, contudo, o santo unido plenamente ao corpo de Cristo
presta-se a uma relação de serviço com tal comunidade. Não há dentro da literatura bíblica, de
forma alguma, a possibilidade de que um cristão não sirva ao corpo de Cristo com os dons
65

doados por Cristo através de seu Espírito Santo. Cristo deu tais dons para a manutenção de seu
corpo, para o desenvolvimento de si mesmo. Portanto, qualquer eleito que faça parte de uma
comunidade evangélica genuína não é, em hipótese alguma, um mero frequentador, porém, um
membro ativo e participante que contribuí com as demandas da comunidade. Serve aos demais
membros do corpo de Cristo para a edificação deste, servindo a comunidade (igreja) com a qual
encontra-se vinculado.
Diversas são as passagens bíblicas neotestamentárias que apontam nessa direção.
Todavia, a aliança de Deus com o homem no Jardim do Edén já prefigurava uma vida de
comunidade (“não é bom que o homem esteja só”); a aliança de Deus com Abrão prefigurava
uma vida de comunidade e família: Deus promete a ele um descendente, Deus promete fazer de
sua descendência uma nação numerosa; a aliança de Deus com Davi prefigurava uma vida de
comunidade e reino: Deus estabelece aliança com sua casa garantindo-lhe sempre um herdeiro
que se sentasse no trono. Por fim, a aliança eterna do Pai com o Filho prefigurava milhares
como sua herança, procedentes de todas as tribos, povos, línguas e nações. Esse corpo
multifacetado de Cristo compõe a sua noiva, sua igreja que deve se ataviar, se preparar a cada
dia para o encontro final com seu amado. Essa preparação acontece no corpo, a medida em que
os seus membros crescem juntos e rumam em direção a unidade da fé, a medida da estatura de
Cristo.
Conclui-se, portanto, que não há justificativa, qualquer que seja, para que uma
pessoa verdadeiramente cristã seja “desigrejada”. Esta condição é incompatível com a vida
cristã. A situação de um crente sem igreja seria tão anômala quanto um corpo sem cabeça. “Não
pode existir “chamado” fora da Igreja de Cristo, porque quem está realmente no Salvador, esse,
obrigatoriamente, integra-se na comunhão dos redimidos”291. Cristo não depende da igreja, mas
cada um dos crentes depende inteiramente de Cristo e assim, dos demais membros do corpo.

291
HODGE, A. A. A Confissão de Fé de Westminster Comentada. 2. ed. Tradução por Valter Graciano Martins.
São Paulo: Os Puritanos, 1999.
66

REFERÊNCIAS

ADAM, Karl. The spirit of catholicism. Trad. Dom Justin McCann, OSB; Nova York:
Crossroad, 1924; reimpr., 1977.

AMORESE, Rubem Martins. Icabode: da mente de Cristo à consciência moderna. Viçosa:


Ultimato, 1998. 224p.

Assembleia de Westminster. A Confissão de Fé de Westminster. 17. ed. São Paulo: Cultura


Cristã, 2001.

Assembleia de Westminster. O Breve Catecismo de Westminster. 4. ed. São Paulo: Cultura


Cristã, 1995.

Assembleia de Westminster. O Catecismo Maior de Westminster. 15. ed. São Paulo: Cultura
Cristã, 2002.

AZEVEDO, Israel Belo de. Gente cansada de igreja. Rio de Janeiro: Habacuc, 2003.

BAVINCK, Herman. Dogmática reformada: Espírito Santo, Igreja e nova criação. Traduzido
por Vagner Barbosa. São Paulo: Cultura Cristã, 2012. 880p.

BEEKE, Joel R. e FERGUNSON, Sinclair. Harmonia das Confissões Reformadas. São


Paulo: Cultura Cristã, 2006. 256p.

BEEKE, Joel R. e JONES, Mark. Teologia Puritana: doutrina para vida. Tradução de Márcio
Loureiro Redondo. São Paulo: Vida Nova, 2016. 1504p.

BERKHOF, Louis (1873-1957). Teologia Sistemática. Traduzido por Odayr Olivetti. 4.ed.
São Paulo: Cultura Cristã, 2012.

BÍBLIA de Estudo Herança Reformada. Barueri: Cultura Cristã, 2018, 2240p.

Bíblia Sagrada. Traduzida por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2.ed.
Barueri – SP: Sociedade Bíblia do Brasil, 2011.

BOMILCAR, Nelson. Os sem-igreja: buscando caminhos de esperança na experiência


comunitária. São Paulo: Mundo Cristão, 2012.

BONHOEFFER, Dietrich. Vida em Comunhão. 7. ed. São Leopoldo: Sinodal, 1997.

CADA DIA, Igreja. Volume 29, nº08, agosto de 2009. Campinas, SP: LPC Comunicações.

CALVINO, João (1509-1564). As Institutas. Tradução Waldir Carvalho Luz. v.3. 2.ed. São
Paulo: Cultura Cristã, 2006. 464p.

CALVINO, João (1509-1564). As Institutas. Tradução Waldir Carvalho Luz. v.4. 2.ed. São
Paulo: Cultura Cristã, 2006. 544p.

CALVINO, João. Gálatas – Efésios – Filipenses – Colossenses. Tradução: Valter Graciano


Martins, 2. reimpr. São José dos Campos, SP: Fiel, 2018. 590p.
67

CALVINO, João. Salmos Volume 4: Série Comentários Bíblicos. Tradução: Valter Graciano
Martins. São Paulo: Editora Fiel, 2009. 607p.

CAMPOS, Idauro. Desigrejados: teoria, história e contradições do niilismo eclesiástico. 7. ed.


Rio de Janeiro: bvbooks, 2017.

CAIRNS, E. O Cristianismo através dos Séculos. 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1995.

CLOWNEY. Edmund. A Igreja: série teologia cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2007.
Confederação Nacional de Bispos do Brasil. Catecismo da Igreja Católica. Novíssima Edição
de Acordo Com o Texto original em Latim. São Paulo: Edições Loiola, 1999.

COSTA, Hermisten Maia Pereira da. Eu Creio: no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São José
dos Campos, SP: Fiel, 2014. 608p.

DE BRÉS, Guido. e URSINUS, Zacarias. Confissão Belga e Catecismo de Heidelberg.


Tradução Missão Reformada no Brasil. 2.ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2005. 80p.

DEVER, Mark. Evangelho e Evangelização. São Paulo: Fiel, 2015.

DEVER, Mark. Nove Marcas de Uma Igreja Saudável. São José dos Campos – SP: Editora
Fiel, 2007.

DEVER, Mark e DUNLOP, Jamie. A Comunidade Cativante: onde o poder de Deus torna
uma igreja atraente. Tradução de Francisco Wellington Ferreira. São José dos Campos, SP: Fiel,
2016.

DEYOUNG, Kevin e KLUCK, Ted. Por que amamos a Igreja. Traduzido por Emirson
Justino. São Paulo: Mundo Cristão, 2010.

DEYOUNG, Kevin e KLUCK, Ted. Por que não somos emergentes. Traduzido por Fernando
Kerr. São Paulo: Cultura Cristã, 2018. 224p.

Edições Cristãs Rhêmata. Revista. Ano XXV – Nº51. Eis a noiva! Editor Rev. Marcelo Batista
Dias. Ipatinga-MG: Presbitério Leste Vale do Aço.

ELWELL, Walter A. (org.). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã. v.3. São


Paulo: Vida Nova, 1990.

FERREIRA, Franklin. Teologia Cristã. São Paulo, Vida Nova, 2011.

GAROFALO, Emílio Neto. In: IPB Semear (website). Contentamento e Simplicidade.


Sermões. Disponível em <www.ipsemear.org/?powerpress_pinw=533-podcast>. Acessado em
20 de Mai. de 2019.

GETZ, Gene A. Igreja forma e essência: o corpo de Cristo pelos ângulos das escrituras, da
história e da cultura. Tradução de Márcio Loureiro Redondo. São Paulo: Vida Nova, 2007.

GOMES, Ariane et al. Desigrejismo: anomalia ou opção?. In: Revista Ultimato. Ano LI. Nº
374. Novembro/Dezembro 2018. p.42-46.
68

GONÇALVES, Leonardo. Igreja emergente: o que é isso? In: Púlpito Cristão (website).
Disponível em: <http://pulpitocristao.com/2010/07/igreja-emergente-o-que-e-isso.html>.
Acessado em 22 de Jul. de 2019.

GRUDEM. Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2001.

HARRIS, Laird (org.). Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento.


Tradução Márcio Loureiro Redondo, Luiz Alberto T. Sayão, Carlos Osvaldo C. Pinto. São
Paulo: Vida Nova, 1998.

HODGE, Alexander A. Confissão de Fé de Westminster comentada por A. A. Hodge. 3.ed.


Tradução de Valter Graciano Martins. São Paulo: Os Puritanos, 2010.

HORTON, Michael S. Um Caminho Melhor. Tradução de Wadislau Martins Gomes. São


Paulo: Cultura Cristã, 2007. 288p.

HORTON, Michael. Cristianismo sem Cristo. Tradução Neuza Batista. São Paulo: Cultura
Cristã, 2010. 208p.

HORTON, Michael. Doutrinas da fé cristã. Traduzido por João Paulo Thomaz de Aquino.
São Paulo: Cultura Cristã, 2016. 1104p.

KIDNER, Derek. Salmos 73-150: introdução e comentário. Tradução Gordon Chown. São
Paulo: Vida Nova, 1980.

LONGMAN III, Tremper. Como Ler Gênesis. Tradução Márcio Loureiro Redondo. São
Paulo: Vida Nova, 2009.

LOPES, Augustus N. In IPB (website). Informativo. Os Desigrejados. Publicado em 08 de


Out. de 2013. Disponível em <https://www.ipb.org.br/informativo/os-desigrejados-1495>.
Acessado em 28 de Jun. de 2019.

MATOS, Alderi Souza de. Creio na Comunhão dos Santos, na santa igreja. Disponível em:
http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/326/creio-na-comunhao-dos-santos-a-relevancia-
primordial-da-igreja/comun%E3o. Acessado em 01 de Abr. de 2019.

MACARTHUR JR., John F. In: Monergismo (website). A unidade do corpo. Disponível em


< http://www.monergismo.com/textos/igreja/unidade_corpo_macarthur.htm>. Acessado em 28
de Jun. de 2019.

MACARTHUR JR., Jhon F. e MACK, Wayne A. Introdução ao Aconselhamento Bíblico:


um guia básico dos princípios e prática do aconselhamento. Tradução de Enrico Paquini, Lauro
Pasquini, Eros Pasquini. São Paulo: Hagnos, 2004.

MCGRATH, Alister E. O Pensamento da Reforma. Traduzido por Jonathan Hack. São Paulo:
Cultura Cristã, 2014. 352p.

MEISTER, Mauro. Em Monergismo. Salmo 133: Interpretando o Texto Numa Perspectiva


Bíblico-Teológica. Disponível em: < http://www.monergismo.com/textos/at/salmo133.htm>.
Acessado em: <22 de Jul. de 2019.

MENDES, Naamã. Igreja lugar de vida. Belo Horizonte: Editora Betânia, 1992.
69

MESQUITA, Antônio Neves. Estudo no Livro de Gênesis. 3ª ed. Rio de Janeiro: Casa
Publicadora Batista, 1970.

MOULTON, Harold K. Léxico Grego Analítico. Tradução Everton Aleva de Oliveira e Davi
Miguel Manço. São Paulo: Cultura Cristã, 2007.

OLYOTT, Stuart. A Carta aos Hebreus Bem Explicadinha. Traduzido por Elizabeth Gomes.
São Paulo: Cultura Cristã, 2012. 144 p.

OSMER, Richard R. The case for cathecism. Christian Century Magazine (23-30 de Abril de
1997).

PACKER, James Innell. Teologia Concisa. Tradução de Rubens Castilho. São Paulo: Cultura
Cristã, 2014. 224p.

PETERSON, Eugene. Uma longa obediência na mesma direção. Tradução Helen Hope
Gordon Silva. São Paulo: Cultura Cristã, 2005. 160p.

Revista Teologia Brasileira (Online). Nilismo eclesiástico: uma análise do movimento dos
desigrejados. Publicado em 17 jun. 2014. Disponível em:
https://teologiabrasileira.com.br/teologia-brasileira-29-2014/. Acesso em 21 jul. 2019.

SAUTER, Gerhard. What Dare we Hope? Reconsidering Eschatology. Harrisburg, Pa.:


Trinity Press International, 1999.

THOMPSON, James. Nossa Vida Juntos: um olhar para a fraternidade cristã. Tradução de
Neyd Siqueira. São Paulo: Vida Cristã, 1983.

VEITH, JR., Gene Edward. De Todo o Entendimento: pensando como cristão num mundo
pós-moderno. Tradução de Sachudeo Persuad. São Paulo: Cultura Cristã, 2006.

Você também pode gostar