Luto Na Contemporaniedade

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v.13, n.1.

2018

AS EXPERIÊNCIAS DE PERDAS E LUTO NA CONTEMPORANEIDADE: UM ESTUDO


BIBLIOGRÁFICO

EXPERIENCES OF LOSS AND GRIEF IN CONTEMPORARY: A BIBLIOGRAPHIC STUDY

Silvana Maria Pereira1, Eliana Ferrante Pires2

RESUMO
O objetivo deste trabalho é compreender experiências e a vivência do luto diante de morte concreta,
ou seja, a morte de um ente querido, e a vivência do luto diante de perdas consideradas como morte
simbólica, tais como separação, perda de emprego, divórcio, perdas frente à velhice, assim como
outras perdas significativas que exigem do indivíduo uma readaptação de vida. O processo de luto é
um trabalho psíquico de elaboração de perdas através do qual o indivíduo reorganiza sua vida,
sendo um processo gradual e de aceitação do que se perdeu. A ressignificação das relações,
atividades e papéis em relação a busca do equilíbrio perdido, é etapa posterior a experiência do luto
a qual poderá ser sentida como vivência de crescimento e ajustamento da personalidade.

Palavras-chave: Morte. Perda. Luto.

ABSTRACT
The objective of this work is to understand experience and the experience of mourning before
concrete death, that is, the death of a loved one, and the experience of mourning before losses
regarded as symbolic death, such as separation, job loss, divorce, losses against to old age, as well
as other significant loss of the individual one requiring redeployment of life. The grieving process is a
psychic work of drafting losses whereby the individual reorganizes his life, being a gradual process
and acceptance of what was lost. The redefinition of relationships, activities and roles in their quest
for the lost balance, it is later stage will experience the grief which can be felt as a growth experience
and adjustment of personality.

Keywords: Death. Loss. Mourning.

1 Psicóloga pela Universidade de Guarulhos (2013). Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em
Psicologia Clínica. Exerceu Monitoria na Disciplina Avaliação Psicológica. Estratégia, Técnicas e Instrumentos
no Curso de Psicologia, referente aos Testes de Bateria Fatorial de Personalidade - BFP, AC- Atenção
Concentrada, PMK- Psicodiagnóstico Miocinético e Palográfico.
2 Psicóloga, professora universitária da UNG, psicanalista atuando em consultório particular e empresária de

ensino.

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INTRODUÇÃO concreta. Nesta representação de morte estão


envolvidas duas pessoas: uma que é perdida

O presente trabalho se propõe mostrar e a outra que lamenta essa falta, um pedaço

diferentes vivências do luto, diante de perdas de si que se foi. E o outro é em parte

reais ou simbólicas, e quais mecanismos de internalizado nas memórias e lembranças.

defesa são acionados em cada vivência Segundo Caruso (1982 apud KOVACS, 2008)

descrita. outro tipo de morte, a separação, que ele

Na vida experimentamos a todo o momento a relaciona com a fenomenologia da morte,

experiência de perder, abandonar e desistir. sendo uma das experiências mais dolorosas

Esta condição permanente é inerente a vida e para o ser humano. A separação, processo

mesmo assim é dolorosa e o processo de que todos nós viveremos, e que vivenciar a

lamentação é difícil e lento, apesar do separação personifica a presença da morte

rompimento de uma relação, a perda de um em vida, a morte psíquica na vida humana.

emprego, da morte de pessoas significativas e Separar ou partir é morrer um pouco. A

entre outros tipos de perdas, existe um fim separação pode ser em muitos casos pior do

para isto como existe um fim para todas as que a própria, morte, porque significa uma

coisas que amamos. Portanto o enlutar-se é capitulação diante da morte ainda em vida, por

um processo de mudança de esquemas que outro. A separação pode ser a saída menos

todos nós experimentamos. dolorosa em alguns casos, porque evita o

O luto é um processo de elaboração e confronto com a morte.

resolução de alguma perda real ou simbólica, As perdas consideradas como

pelo qual todos os seres humanos passam em “pequenas mortes”, como por exemplo, a fase

vários momentos da vida, com maior ou do desenvolvimento, da infância para a

menor sucesso. A elaboração e finalização do adolescência, vida adulta e velhice, mudanças

luto permite a pessoa encontrar novos rumos, de casa, de emprego, o matrimônio e o

e a não elaboração pode significar nascimento do filho também são mortes

complicações médicas e psicológicas. simbólicas, onde uma pessoa perde algo

A partir da posição de Kovács (2008) conhecido, como o papel de solteiro e o de

a perda é um dos processos mais filho, e vive o desconhecido de ser conjugue

desorganizadores da vida humana, não ou pai. Estas situações despertam angústia,

somente de pessoas, mas qualquer processo medo e solidão trazendo sempre alguma

que envolve mudança de vida, denominada analogia com a morte, carregando em si

como pequenas mortes, pelo fato de implicar sentimento de dor e tristeza e uma certa

no desaparecimento de uma condição antiga e desestruturação egóica, onde a elaboração se

conhecida, e a obrigatória passagem para faz necessária.

uma condição nova e desconhecida. Este estudo poderá criar condições de

Kovács (2008) afirma que a morte reflexão sobre ações preventivas onde se

como perda nos fala em primeiro lugar de um busca a elaboração do luto diante de perdas

vínculo que se rompe de forma irreversível, da morte concreta e da morte simbólica.

sobretudo quando ocorre a perda real e

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LUTO E MELANCOLIA EM FREUD menos a diminuição da autoestima, porque um


luto profundo frente à perda de alguém

Para os sucessores de Freud, como provoca a mesma perda de interesse pelo

Melanie Klein, Winnicott, Hanna Segal, mundo externo, a mesma perda de

Aberasteury e outros conservam os termos capacidade de reinvestir em um novo objeto

freudianos acrescidos de contribuições e de amor, e o mesmo afastamento de toda e

considerações de Melanie Klein (1934) esses qualquer atividade que não esteja envolvida

autores descrevem os processos de luto pela ao objeto perdido.

perda do primeiro objeto, o seio faz parte da E que essa inibição do ego é

estruturação do psiquismo e o grau de expressão de uma exclusiva devoção ao luto,

elaboração dessa perda atingido pelo devoção que nada deixa a outros propósitos

indivíduo, é que vai determinar no futuro, sua ou interesses.

postura diante das mortes simbólicas, isso O trabalho do luto consiste em um

determina se irá ou não desenvolver quadros teste de realidade revelando que o objeto

patológicos (OLIVEIRA, 2001). amado não existe mais, passando a exigir que

Porém, tomaremos por principais as toda a libido seja retirada de suas ligações

ideias contidas em Luto e Melancolia (1917) com aquele objeto, essa exigência provoca

que segundo Freud (1917) o luto de modo uma oposição compreensível, em que as

geral, é a reação á perda de um ente querido, pessoas nunca abandonam de bom grado a

a perda de alguma abstração que ocupou o posição libidinal, nem mesmo quando já existe

lugar de um ente querido, como o país, a um substituto.

liberdade ou o ideal de alguém, e que em Os desinvestimentos são realizados

algumas pessoas, as mesmas influências pouco a pouco, onde a existência do objeto

produzem melancolia em vez de luto, perdido, e cada uma das lembranças e

percebendo que essas pessoas tem uma expectativas em que a libido está vinculada

predisposição patológica. E que embora o luto tornam-se muito investida, e o

envolva grave afastamento daquilo que desinvestimento se realiza em cada uma

constitui atitude normal para com a vida, delas, sendo uma fase penosa e difícil para o

jamais é visto como uma condição patológica indivíduo, e quando o trabalho do luto se

sendo submetido a tratamentos médicos conclui o ego fica outra vez livre e desinibido.

espera-se que o luto seja superado após um Na melancolia é considerada a reação

determinado período, sendo necessário e à perda de um objeto amado, onde possui

importante vivenciar esse luto. causas diferentes, reconhecendo uma perda

Na melancolia ocorre um profundo de objeto de natureza mais ideal, e que objeto

desânimo, a perda do interesse pelo mundo talvez não tenha morrido, mas tenha sido

externo, a perda da capacidade de amar, a perdido como objeto de amor, verifica-se que

inibição de toda e qualquer atividade, e uma a perda ocorreu, mas não se percebe o que foi

diminuição dos sentimentos de autoestima a perdido, o paciente não pode conscientemente

ponto de se autorecriminar, sendo que esses perceber o que perdeu, consciente no sentido

mesmos traços são encontrados no luto, de que perdeu alguém, mas não sabe o que

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perdeu nesse alguém, estando à melancolia da perda e ressignificação de relações,


ligada a uma perda objetal retirada da atividades e papéis, na busca de um novo.
consciência, ao contrário do luto no qual nada Segundo Parkes (2009) reconhecer
está inconsciente em relação a perda. que o luto é um processo de mudança pelo
No luto a inibição e a perda de qual as pessoas passam e por sugerir uma
interesse são explicadas pelo trabalho do luto maneira de explicá-lo, a reação ao luto inclui
no qual o ego é absorvido. No melancólico muito mais que apenas o pesar, a perda de
não se observa o que o está absorvendo um ser amado, geralmente coloca a pessoa
completamente, a diminuição da autoestima em contato com:
na melancolia resulta num empobrecimento do  Ameaças à segurança;
ego. Porque no luto, é o mundo que se torna  Mudanças importantes na vida/ na
pobre e vazio. família;
 Podendo ou não estar associada a:
DESCREVENDO O LUTO  Lembranças terríveis de eventos
aterrorizantes;
O luto é uma reação à perda de um  Culpa pela morte, dirigida a outras
ente querido, onde ocorrem reações anormais pessoas;
sem que tenham caráter patológico, onde  Vergonha e / ou culpa por sua
ocorre um profundo desânimo, cessação de negligência ou cumplicidade.
interesse pelo mundo externo, perda da Nenhum desses aspectos faz parte do
capacidade de amar, inibição de atividades luto, embora eles possam complicá-los e
externas, porque a restrição do ego fica causar problemas duradouros. Os
vinculada a esta perda, e o trabalho do luto componentes essenciais do luto são a
vem mostrar que o objeto perdido não existe experiência da perda e uma reação de anseio
mais. intenso pelo objeto perdido (ansiedade e
A retirada da libido com o objeto separação), se não ocorrer esses
envolve o desinvestimento dessa energia que componentes, não se pode dizer que a pessoa
está vinculada ao objeto perdido, esse esteja realmente em processo de luto
desinvestimento pode ser lento e doloroso, (PARKES, 2009).
porque a pessoa sente que a perda não “O luto de uma forma ou de outra, está
ocorreu e quando termina o luto o ego na vida de todos nós e nos atinge em
permanece livre e desinibido para novas aspectos pessoais e relacionais no âmbito da
possibilidades de vínculo (FREUD, 1974). família, e considerando-se os diferentes
Kovács (2008) considera que uma momentos de seu ciclo de vida, o impacto
perda é significativa quando ocorre o causado pela morte de alguém” (FRANCO,
rompimento de um vínculo anteriormente 2011, p.101).
existente e define-se o luto como o trabalho
psíquico de elaboração desta perda através CONTEXTOS HISTÓRICOS DO LUTO
do qual o indivíduo reorganiza sua vida. Este
processo é um percurso gradual de aceitação

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Freud (1917 apud FRANCO, 2010) O cenário da Segunda Guerra Mundial


quando Freud publicou Luto e Melancolia, a que novas visões sobre o luto apareceram que
partir de suas observações clínicas durante a em 1941, Kardiner publicou Traumatic
Primeira Guerra Mundial, ele comparou pesar Neuroses of war, obra que fala sobre o
e melancolia e considerou que o luto como sofrimento de pessoas expostas
causa de depressão tende a se manifestar em continuamente a riscos de vida, como
relações ambivalentes. consequências para a saúde como um todo.
E como suas análises foram feitas Lindemamm (1944 apud FRANCO,
naquele período histórico, ele teve 2010) descreveu uma situação de luto agudo,
possibilidade de identificar muitos sintomas com sua definição de luto normal, destacando
psiquiátricos ou transtornos pós-traumáticos, e os efeitos indesejáveis da repressão do luto,
sua obra teve uma referência fundamental foi ele quem primeiro falou do luto
para o estudo do luto. antecipatório, a partir das experiências das
Segundo Bromberg (2008) mostra esposas dos soldados convocados par ao
como houve uma evolução sobre o conceito campo de batalha.
luto, onde as primeiras visões mostravam o Parkes (2009) Trauma é um golpe e um Luto é
luto como um fenômeno tendo uma causa de uma perda, algumas teorias e práticas,
doença física ou mental, e nos dias atuais o desenvolveram-se em torno desses dois
luto é definido como um processo normal e conceitos, onde se tem psicólogos que
esperado em consequência do rompimento de trabalham com veteranos de guerra, vítimas
um vínculo. de abuso e outras pessoas que enfrentam o
Segundo Parkes (2001 apud estresse, violência ou ameaças a vida.
BROMBERG, 2008) em sua revisão teórica Outros terapeutas, assistentes sociais
sobre o estudo do luto, relata que nos séculos e outros profissionais que trabalham com o
XVII e XVIII, o luto era considerado causa de luto e divórcio e buscam entender as
morte, e eram prescritas medicações para o necessidades das pessoas separadas ou
chamado luto patológico. Em 1835, Benjamim enlutadas, foi verificado sobreposições desses
Rush, médico americano, receitava ópio para campos, portanto o isolamento não é bem
enlutados, onde considerava que pessoas que visto para nenhum dos lados, ficando obvia
morriam de problemas cardíacos, tinha como quando o luto é acompanhado por violência ou
causa o que ele chamou de coração partido. outro tipo de trauma.
Franco (2010) coloca que essas Parkes (2009) existem diferenças
primeiras visões a respeito do luto tiveram muito importantes entre as reações
grande influência na ênfase colocada nos psicológicas entre o trauma e o luto, fazendo
aspectos emocionais e fisiológicos, porque até uma relação com as perdas traumáticas como
tempos recentes não se enxergavam outros mortes súbitas, inesperadas, mortes que não
fatores envolvidos como, componentes permitem a recuperação do corpo intacto, são
sociais, culturais e espirituais na totalidade do fatores que contribuem para um luto
fenômeno e ter contribuído, em grande parte, complicado.
para sua patologização.

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A fase de entorpecimento, descrença Segundo Franco (2010) até as últimas


e fracasso em integrar a morte traumática ao décadas do século XX, os estudos sobre o
seu mundo, são defesas usadas contra os luto falavam em uma necessidade de
sentimentos de desamparo e insegurança, desligamento emocional da pessoa falecida,
indivíduos traumatizados experimentam dando ênfase na expressão dos sentimentos.
intensa ansiedade, hipervigilância e reações Parkes (1965 apud FRANCO, 2010)
de espanto, que são desencadeadas pela relata que por muito tempo o luto foi associado
lembrança da perda. E reações semelhantes a doença mental, em um dos primeiros
foram encontradas em pessoa que sofreram estudos de Parkes (1965) com pacientes
um estresse traumático. psiquiátricos enlutados, desenvolvendo uma
pesquisa sobre o assunto. E Shmale (1958

ESTUDOS SOBRE O LUTO NA apud FRANCO, 2010) pesquisou uma clara

ATUALIDADE aproximação do luto com a depressão.


Além disso, outros autores se interessam em
pesquisar os resultados do luto, e as
Franco (2010) relata as razões para o
intervenções por outras perspectivas, falava-
estudo do luto, que vão desde a necessidade
se sobre a anatomia do luto, tendo uma
de construir conhecimento com base no que
referência familiar com o pensamento médico,
se sabe sobre ele, considerando os desafios
discutindo ainda um estudo detalhado sobre a
que emergem nesse campo, até a
teoria do apego, para obter explicações sobre
preocupação com aquele que poderá se
as diferenças nas respostas do luto.
beneficiar dele, e que o estudo sobre o luto
Franco (2010) relata que alguns
deve proporcionar uma visão de futuro, para o
pesquisadores, estudam o luto a partir de uma
mundo atual.
perspectiva de construção de significado, e
Segundo Franco (2010) o tema luto é
outros que trabalham com a possibilidade de
inesgotável devido a constantes atualizações,
manter vínculos contínuos, em oposição a
principalmente se for estudado por aqueles
necessidade de desligamento da pessoa
que são sensíveis às demandas do mundo em
falecida, sendo necessária sua função para
que vivem, tendo uma boa fundamentação
um luto saudável.
teórica, mas que o pesquisador seja flexível
Sendo visto como uma mudança de
para se deixar desafiar por novas indagações
paradigma, de um padrão genérico, normativo
sem deixar de ser ético, principalmente
da medicalização da subjetividade.
quando se tratar de pesquisa e intervenção
Segundo Franco (2010) o luto pode
com seres humanos.
ser entendido por diversos olhares, como os
Franco (2010) diz que o aumento da
da psiquiatria, da psicanálise, da psicologia,
violência ou de mortes em massas são
sociologia, antropologia, etologia, e entende-
geradores de tipos traumáticos de lutos, tendo
se que estudar o luto parte necessariamente
uma necessidade de mais estudos nessa
de um posicionamento diante da realidade,
área, devido ao aumento na demanda de
pois é o fenômeno que se trata: formar e
cuidados e de distúrbios psiquiátricos
romper vínculos na atualidade.
decorrentes dos traumas.

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Os temas que são de interesse dos Sabe-se que a expressão de


pesquisadores contemporâneos sentimentos na ocasião da perda é
correspondem às condições de vida na fundamental para o desenvolvimento do
atualidade, como por exemplo: o processo de luto, no entanto, as
envelhecimento da população, aumento das manifestações diante da perda e do luto
situações de mortes em massa, seja por sofreram alterações no decorrer dos tempos,
acidente ou terrorismo que são geradoras de cada cultura apresenta algumas prescrições
experiências de difícil elaboração pelos de como a morte deve ser enfrentada e quais
enlutados, causados pela incerteza (por não os comportamentos e rituais que devem ser
se identificar ou reconhecer o corpo), fato que cumpridos pelos enlutados (KOVÁCS 2008,
impede a realização dos rituais como enterro, p.150).
velório rituais da tradição cultural (FRANCO, Segundo Cassorla (1991 apud
2010). KOVÁCS, 2008) para se elaborar o luto vai
Essa experiência de luto não fica depender dos mais variados fatores, como
restrito só aos familiares que sofreram a fatores socioculturais que dificulta a
perda, ocorre também uma experiência de luto elaboração, como por exemplo, a negação da
na comunidade também com intensos morte, a falta de rituais que ajudem na
sentimentos de raiva, horror, choque. Os focos elaboração, ou em casos mais sérios do luto
de interesses no estudo do luto têm sido patológico onde uma perda reativa situações
ampliados para incluir questões sobre extremamente primitivas, que devem ser
distinção entre o luto considerado normal e o trabalhadas com muito mais profundidade.
luto complicado. Segundo Raimbault (1979 apud
KOVÁCS, 2008) é preciso que seja feito um
Compreender a importância da elaboração trabalho de desidentificação e desinvestimento
do luto de energia para que o processo de luto possa
ocorrer, e que permita a introjeção do objeto

Segundo Bowlby (1985 apud perdido na forma de lembranças e boas

KOVÁCS, 2008) o que se define como luto recordações, como palavras e atos, e

saudável são a aceitação e a modificação do investindo a energia em outro objeto. O

mundo externo, ligado a uma perda definitiva processo de luto estará finalizado quando

do outro, e a consequente modificação do existe a presença da pessoa perdida

mundo interno e representacional, internamente em paz, e assim abrindo espaço

reorganizando os vínculos que para outras relações.

permaneceram. Segundo Viorst (2005) para o fim da

Segundo Kovács (2008) a elaboração lamentação em decorrência do luto, vai

de uma perda nos fornece muitos elementos depender como a pessoa sentiu essa perda,

importantes para o processo de da faixa etária de quem se foi, e o quanto

desenvolvimento humano, podendo ser estávamos preparados para aquela situação,

chamada de morte consciente ou morte vivida. sendo entendida pelas fases frente às perdas

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como um processo onde fica sendo possível


compreender o que estamos vivenciando. Consequências frente um luto mal
Segundo Viorst (2005, p. 270) assim talvez a elaborado
única escolha seja a do que fazer com nossos
mortos, morrer quando eles morrem continuar Segundo Kovács (2008) a
vivendo como incapacitado, ou forjar, com a humanidade condena a expressão de dor e
dor e as lembranças, novas adaptações. tristeza relacionando a sinal de fraqueza, ou o
Através do nosso lamento reconhecemos a afastamento de crianças do cenário da morte,
dor, sentimos a dor, guardamos dentro de nós. como se a morte não existisse, e com essas
Com nosso lamento chegamos a aceitar as atitudes ocorrem sérias consequências do
dificuldades que a perda pode criar, e então ponto de vista psicopatológico, sabendo que
começamos a chegar ao fim do luto. muitas doenças estão relacionadas a um
A importância de um trabalho processo de luto mal elaborado.
psicoterapêutico, para auxiliar na elaboração Parkes (1998) observa- em nossa
do luto, facilitando na expressão de sociedade a dificuldade em aceitar que as
sentimentos que surgem diante de perdas, é pessoas precisem viver o tempo do luto, e
de relevante valor, dentro de ambiente quando forçados a vivê-los, encontramo-nos
acolhedor e facilitador. em situação difícil, porque o luto é entendido
Segundo Franco (2010) existe como uma fraqueza, um mau hábito
algumas diferenças entre as culturas, a repreensível, e não como uma necessidade
respeito de como e quando o luto deve ser psicológica.
expresso, sentido comunicado entendido, a A crescente desconsideração pelo luto
cultura ocidental tende a valorizar a expressão formal significa que as pessoas enlutadas
emocional do luto, levando em conta a recebem pouco apoio da sociedade, e de suas
perspectiva de gênero. próprias famílias. Casar-se com o irmão mais
Que levam alguns estudiosos velho do marido, um costume judeu, pode não
superficiais pensarem que o homem não vive ter resolvido o problema do luto, mas deve ter
o que seria chamado de luto saudável, por atendido as necessidades básicas da viúva
conta de não expressarem suas emoções, como solidão, esvaziamento do papel social,
mas esquecem-se de que as tradições em si quebra da segurança frente às
exigem que os homens sejam mais operativos responsabilidades sentimentos que surgem
e menos intuitivos. como consequência à privação.
E essas diferenças culturais presentes Uma das manifestações do luto mal
na vivência do luto ficam claro como a elaborado é o chamado de reações de
sociologia e a antropologia nos ajudam a aniversário onde perto de algum fato ou data
compreender a amplitude desse tema. que associe a perda de um ente querido,
Portanto para avaliar o que é permitido e desencadeia diversas reações de conflitos
normal para cada cultura, é necessário como ansiedades, tristezas, ideias ou
subjetivar a experiência do luto que é por sua tentativas de suicídio, infartos, gastrites,
vez multideterminada (FRANCO,2010, p.31) . conflitos na área social. Passada a data, se

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não ocorrerem complicações graves, tudo Importante lembrar que todos os povos da
volta ao normal, mas em situações graves terra, ainda hoje dão destino aos seus
podem ocorrer surtos psicóticos ou doenças cadáveres, realizando rituais que marcam a
que podem levar a morte. realidade da morte e o término do luto, sendo
Segundo Kovács (2008) quando um dos traços comuns a todas as culturas, e
ocorre um processo de identificação com o conclui que há importância dos rituais de cada
morto, a pessoa enlutada se percebe fazendo cultura na elaboração do luto que ajudam o
as mesmas coisas que a pessoa fazia ou homem a aceitar a morte,
gostava, e se esses comportamentos forem Atualmente os rituais de morte
compulsivamente repetidos, poderão se tornar (extrema unção velório na casa da família,
patológicos. procissão fúnebre e manifestações) foram
Durante a elaboração do luto também ocorrem substituídos por organizações funerárias, em
distúrbios alimentares e também no sono, que o ambiente é neutro e higiênico, pelos
além de quadros somáticos e de doenças cortejos fúnebres rápidos e discretos, pelo
graves depois do luto podendo levar a uma autocontrole do indivíduo enlutado, que não
depressão reativa. pode expressar verdadeiramente suas
emoções.
Rituais e sua importância na elaboração do O homem tenta excluir a morte do
luto processo de desenvolvimento, ou seja, do
ciclo da vida, abolindo os rituais de luto como

Segundo Cabral e Nick (1990) ritos a cremação do corpo que dispensa o ritual do

são cerimônias a serem desempenhados velório e do enterro, ficando assim os

regularmente e revestidos de um significado familiares sem meios de expressar o luto e o

especial, religioso ou outro, colocando como pesar, que são tão necessários nestas

exemplo os rituais de iniciação em sociedades circunstâncias.

primitivas e sociedades secretas. Oliveira (2001) diz que embora os

E no caso de rituais para elaboração costumes sociais variem de cultura para

do luto seriam os velórios, cerimônias cultura, a reação humana diante da perda de

fúnebres, o enterro, visitas aos cemitérios, o um ente querido provoca intensa perturbação

dia de finados. entre os enlutados, e devido a isso a cultura

Oliveira (2001) o luto pode ser elaborou os rituais cuja função é propiciar

entendido por suas dimensões psicológicas, expressão de sofrimento, fornecendo a

espirituais, culturais, políticas, sociais, ocasião à manifestação da solidariedade entre

incluindo os rituais que podem ser entendidos os membros da comunidade, reforçando o

como uma etapa de enfrentamento de valor espírito grupal.

para o enlutado, ou seja, os rituais são meios “Numa perspectiva histórica, a

do homem elaborar a morte, a separação vida reflexão sobre tais produções mostra-nos a

e morte, sendo uma forma de comunicar a dor importância dos rituais, da religião, da filosofia

e tristeza pelo ente querido. e, contemporaneamente, da ciência, como

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recursos utilizados pelo homem para lidar com mesmo ter valor psicológico em ajudá-los a
o medo da morte. ” (OLIVEIRA, 2001, p. 27) expressar a sua dor (PARKES, 1998).
“A celebração da morte e os rituais de Não basta recomendar só o ritual, é
luto são processos culturais que ajudam o necessário acreditar nele, tomar cuidado para
homem a viver a dor da perda. Quando essas que não passe a impressão de enlutado bem-
práticas deixam de ocorrer, podem surgir sucedido, visto pela sociedade como aquele
distúrbios graves, e é em vista disso que os que mostra o controle adequado de suas
psicólogos e psicanalistas vem estudando emoções em todas as ocasiões. Porque
esse tema. ” (OLIVEIRA, 2001, p.42). nessas circunstâncias o velório, o enterro
Segundo Kovács (2010) os rituais torna-se uma experiência penosa, vivida com
ajudam a elaborar perdas de forma sentimentos ambivalentes.
construtivas, principalmente a participação das Parkes (1998) diz que término dos
crianças, porque ela é membro dessa família, rituais associados ao destino a ser dado ao
o contexto social ajuda na aquisição de corpo, ocorre um período de enlutamento que
significados, ajudando as crianças a se dá reconhecimento social ao fato das pessoas
despedirem do falecido, tendo seus afetadas pela perda estarem em estado de
sentimentos reconhecidos. afastamento depressivo.
Os rituais oferecem conforto e Na cultura ocidental usam-se coisas
suporte, porque em uma sociedade que que simbolizem o luto, como uma faixa de
interdita a morte, existe a crença de que esses tecido preto no braço, ou uma roupa de cor
eventos poderiam causar sofrimento a criança, escura, indicando que essas pessoas devem
e que nessas cerimônias as emoções podem ser tratadas de forma diferente pelos os
ser expressas, acolhidas e compartilhadas e a outros, não se espera que essas pessoas
criança se sente parte da família. participem de festas, como elas não se
Segundo Parkes (1998) o funeral é sentem no clima de participar.
geralmente considerado o último presente Segundo Gorer (1965 apud
dado ao falecido, e muitos que comparecem PARKES,1998) esses costumes da roupa
para apresentar seus respeitos estão tratando escura vêm mudando, sendo usado apenas
o falecido como se ele ainda estivesse vivo, pelos pobres, velhos, e pelos despreparados.
pronto para partir em uma viagem.
O autor fala sobre os aspectos Efeitos do luto sobre a Saúde
negativos do funeral que seria a dor que
sentem em velar o corpo, e como os aspectos Segundo Parkes (1998) questiona
positivos: que seria o não se sentir só, ter com sobre os efeitos que o luto tem sobre a saúde,
quem apoiar, como a presença dos amigos, e verificou que muitas doenças físicas e
que o apoio social é visto positivamente. mentais têm sido atribuídas a experiência de
Crenças e rituais que oferecem uma perda, ou seja, baseado nas informações que
explicação para a morte e apoio social para a a doença surge em seguida de uma perda.
expressão do pesar, deveriam reduzir a Considera que as perdas ocorrem na vida de
confusão sentida pelos recém-enlutados, e até todos nós, é possível que se esteja frente a

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uma associação casual. Uma das melhores sintomas psicológicos, que eram por conta do
pesquisas a respeito dos efeitos luto.
psicossomáticos da perda foi realizada no
Strong Memorial Hospital em Rochester, nos AS PERDAS
Estados Unidos, onde um grupo de psiquiatras
elaborou a teoria de que sentimentos de Segundo Cassorla (1991 apud
desamparo e desesperança que acompanham KOVÁCS, 2008) considera que a morte está
o luto, e que são responsáveis pelas doenças presente em nossas vidas e das mais variadas
físicas. maneiras e que a morte física será última, mas
Parkes (1998) pesquisou um grupo de teremos as mortes parciais ou totais na área
mulheres que fez exame Papanicolau, e que somática, mental e social.
apresentou a presença de células estranhas e Segundo Kovács (2008) são várias
sem saber se era câncer ou não, fez experiências de morte em vida, o
entrevistas individuais, perguntaram a cada desenvolvimento futuro representa perda,
mulher quais eram os sentimentos sobre morte e sacrifício de formas anteriores, onde
perdas recentes, e quando encontrava existia angústia diante do novo, e que a
evidências de haver tanto sentimentos de velhice é um momento de profundas
desamparo e desesperança, ele predizia que separações, onde ocorre a despedida do
aquela mulher poderia ter um diagnóstico de trabalho, dos familiares, do seu corpo e
câncer, em 71 % dos casos, ele provou estar pertences, e também da própria vida.
correto. E que as perdas e sua elaboração são
Grande número de perdas foram também presentes no nosso cotidiano, já que são
relatados por pessoas com outras queixas de necessárias para o desenvolvimento humano.
saúde, por meio de revisão da literatura, foi Várias perdas por mortes, separações
apontado câncer, distúrbios cardiovasculares, amorosas, assim como outras perdas
doença de Cushin, Lúpus eritematoso consideradas como pequenas mortes
disseminado, colite ulcerativa, mesmo sendo simbólicas, como mudança de emprego, de
resultados não conclusivos, não podem ser casa, casamento, nascimento de um filho,
ignorados (PARKES, 1998). onde se perde algo conhecido para viver o
Em estudos retrospectivos deste tipo, desconhecido, como no papel de solteiro para
o pesquisador começa com uma pessoa que papel de casado, despertam angústia, medo,
está doente, ou sob suspeita de estar doente, solidão, e que se relacionam com a morte
e tenta descobrir se sofreu uma perda antes concreta, apresentando aspectos psicológicos
do aparecimento da doença. de dor, tristeza e sofrimento, sendo saudável
Parkes (1998) coloca achados de se fazer uma elaboração dessas perdas.
evidências que pessoas recém-enlutadas Morrer muitas vezes significa que
consultam seu médico com mais frequência, o durante o processo vital, passamos por várias
clinico geral, do que faziam antes do luto, e o mortes: fases do desenvolvimento,
aumento das consultas ocorreram por separações, doenças e a psicose. Algumas
ansiedade, depressão, insônia e outros dessas situações são universais, como as

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fases do desenvolvimento e as separações; tentam nos consolar. Raiva por que a pessoa
outras não, como as psicoses e as doenças; nos abandonou, e sentimento de culpa
mas nenhuma delas ocorrer à morte concreta fazendo parte do processo de dor e perdas
e a pessoa sobrevivem muitas vezes mais do sofridas.
que sobrevive (KOVÁCS, 2011). Segundo a autora, raiva, culpa,
Kovács (2011) a pessoa se reorganiza idealização são tentativas de reparação, nos
e ressignifica a vida como em algumas mostrando que houve a perda da pessoa, mas
doenças e perdas, ocorrendo uma evolução que essa perda não pode ser negada.
no desenvolvimento, morrer várias vezes, mas
não definitivamente, e continuarmos a viver os Aspectos psicológicos diante das mortes
significados adquiridos. simbólicas

Aspectos psicológicos diante da morte Kovács (2011) fala da presença da


concreta morte na vida, principalmente das
experiências que nos faz pensar na morte,
Kovács (2011) na situação de luto por mesmo que não tenha ocorrido
morte houve a perda concreta de alguém que concretamente, traz muitas associações com
se foi, o alguém que ficou sente que um a morte, como dor, ruptura, interrupção,
pedaço de si morreu. Na separação há desconhecido, tristeza.
semelhanças marcantes como processo de E outros exemplos mais claros e
luto, mas concretamente, nenhuma morte evidentes: separações, doenças, situações-
ocorreu. limite, com muita dor e sofrimento, e outras
As primeiras fases do processo frente menos evidentes porque vem acompanhada
às perdas de qualquer ordem é o choque, a de festas e homenagens, sendo observado
apatia, sensação de descrença, onde nos como pequenas mortes como: fim de uma
questionamos “isto não pode estar situação, adolescência, viagens, entrada na
acontecendo”, choramos ou lamentamos em universidade, casamento, nascimento de um
voz alta, ou ficamos em silêncio alternados filho.
com períodos de inconformidade frente à Tanto as experiências mais dolorosas
situação. ou mais festivas envolvem perdas, medo,
Segundo Viorst (2005) a percepção de tristeza pelo que está sendo deixado,
que a pessoa não existe mais no tempo ou no principalmente nas coisas novas, o
espaço fica sendo irreal, onde a aceitação não desconhecido.
é com tanta facilidade. Depois da primeira Algumas situações dolorosas, onde
fase de dor, vem à fase mais longa, e muito sofremos muito, momentos percebidos como
sofrimento psíquico, onde choramos e sem saída, quando parece que só a morte
lamentamos, e ocorrem mudanças bruscas de daria um jeito, podem ocorrer reviravoltas,
temperamento e de regressão. Ficamos mais transformações, e da morte emerge uma nova
frágeis e carentes, envolvidos, e com muita vida com mais vigor (KOVÁCS, 2011).
raiva da pessoa morta e dos outros que

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A importância dos vínculos primários permanente vai estar com a pessoa que não
frente á elaboração das perdas está mais viva, abrindo espaço para reações
patológicas, tais como, negação, distorção e
Segundo Bowlby (1985 apud adiamento do luto, onde o impacto da perda
KOVÁCS, 2008) a mãe exerce uma das pode ser diminuído quando são formados
maiores funções de objeto de vínculo, vínculos substitutos.
proporcionando uma base de segurança que Viorst (2005) relata que nos primeiros
permite ao indivíduo explorar o meio, e anos de vida, as primeiras perdas são vividas
mesmo que ameaçado, ele não somente se como mortes, onde a criança tem a
afasta do estímulo ameaçador, como também experiência de ser abandonada e
se protege no objeto de vínculo. Com a perda desamparada. Tem sentimentos que não é
desse objeto, não há mais a base segura onde digna de ser amada com reações de
se refugiar diante do perigo, o que faz o bebê desamparo, culpa, e fúria sentindo uma
sentir uma sensação aterrorizante, sendo a tristeza insuportável, podendo não ter
razão pela qual o sofrimento é uma reação recursos internos ou externos, para resolver
universal a separação de uma figura de esses sentimentos.
vínculo. Segundo Viorst (2005) perdas vividas
Sendo assim o processo de luto se na infância nos acompanham durante toda
apresenta como uma forma de ansiedade e de nossa vida, onde uma criança lamenta a morte
separação explicando os sintomas de um ente querido, mas não compreende a
aparentemente encontrados no luto normal e dimensão da perda, e não resolve as perdas
patológico, a necessidade de encontrar a da infância. Durante este período, pode
pessoa perdida, a sensação de ter presença desenvolver o enfrentamento com o apoio de
da pessoa morta e até mesmo a raiva sentida adultos que permitam a expressão de
por essa pessoa, os sentimentos ambivalentes sentimentos.
acerca da perda refletem a tentativa de manter De acordo com Viorst (2005) toda
o vínculo. perda vivida na infância pode acarretar
Dependendo da qualidade do vínculo dificuldades futuras frente às perdas e
estabelecido primariamente, isto determinará separações. Porém crianças que foram
os vínculos futuros e os recursos disponíveis poupadas de perdas importantes no decorrer
para o enfrentamento e elaboração de do crescimento, também não elaboravam as
rompimentos e perdas, ou seja, quando o perdas de forma saudável porque não
vínculo é rompido, os recursos que o indivíduo compreendem o que está acontecendo, ou
dispõe para elaborar o luto devem ser seja, não é poupando as crianças dos
buscados na qualidade do vínculo acontecimentos de perdas que elas não vão
anteriormente existente (BOWLBY, 1985 apud sentir ou perceber o que está acontecendo,
KOVÁCS, 2008). sendo de extrema importância comunicá-las
No luto patológico, a pessoa dos acontecimentos, para que elas possam
encontrará dificuldades de vinculação a vivenciar, e elaborar as perdas sem
pessoas, atividades, porque o vínculo

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dificuldades ou complicações futuras, Segundo Bowlby (1990) o bebê


decorrentes de um luto mal elaborado. durante os primeiros meses de vida aprende a
discriminar a figura materna, desenvolvendo

Teoria do Apego um grande prazer em estar na companhia da


mãe, a criança fica aflita quando a mãe está

Segundo Bowlby (1990) o apego é ausente, mesmo separações momentâneas

definido como qualquer forma de faz a criança sentir a ausência.

comportamento que resulta que uma pessoa Os primeiros anos da infância o

alcance ou mantenha a proximidade com comportamento de apego, que caracteriza os

algum outro indivíduo diferenciado ou seres humanos do berço a sepultura, incluindo

preferido, onde é considerado mais capacitado o choro, o chamar que inclui os cuidados, o

para ajudá-lo a lidar com o mundo, como apego, e os protestos se a criança fica

exemplo: o bebê que sorrir, chorar, fazer sozinha ou na companhia de estranhos.

contato visual, buscar aconchego e agarrar-se Devido a mudança na idade estes

ao outro, sendo comportamentos que comportamentos vão diminuindo

compõem o repertorio do apego. gradativamente.

O vínculo de apego manifesta-se O bebê ao nascer depende da mãe

principalmente pela busca de proximidade em para sobreviver e conforme cresce, adquire

relação ao cuidador primordial e pelo protesto independência, o apego, portanto constroem-

diante da separação. Sem a formação desses se com confiança, segurança e amor. Apego

vínculos, a criança poderia se distanciar inicia com a mãe nas fases iniciais do

demasiadamente dos adultos, ao explorar o desenvolvimento, com o passar dos anos,

mundo, ela fica exposta a inúmeros perigos, diminuem os laços de dependência, pois a

portanto os comportamentos de apego são criança vai explorar outros ambientes, tendo

complementares aos comportamentos contato com a família, vizinho, escolas, sendo

exploratórios, pois permitem as crianças de extrema importância que o a criança

experimentar o mundo em condições mais desenvolva o desapego.

seguras. Para ocorrer a capacidade de criar

Apego uma ligação afetiva ou um laço projetos de vida, saber desapegar lentamente

afetivo, comportamentos de apego são termos é necessário, e também para evitar o

que vai designar a intensidade da relação com sofrimento maior, quando acontecer à perda

a figura perdida. ou separação do objeto de amor. O desapego

O autor se refere ao apego como um com amor possibilita a aceitação da perda.

comportamento instintivo, decorrente da busca Os padrões de comportamento de

constante de segurança, proteção, apego manifestados por indivíduos vão

sobrevivência da espécie, apego definido depender, em parte, das experiências que

como prender-se, apegar a algo ou alguém, teve com figuras parentais nos primeiros

não devendo ser confundido com meses de vida.

dependência. (BOWLBY,1990).

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MÉTODO perdas, com grandes complicações frente a


elaboração do luto.

A pesquisa foi realizada através de um É a partir do apego com figuras

levantamento bibliográfico dos fundamentos e parentais que nos proporcionaram proteção e

conceitos referentes ao luto, conceitos de segurança, essa proximidade e todo esse

perdas, morte e suas vivências, onde serão cuidado possibilita a formação de vínculos

utilizados capítulos de livros de alguns autores afetivos importantes no decorrer da nossa

habitualmente usados como referência teórica vida.

por profissionais da área da psicologia como Se na infância não ocorrer essa

Kovács, Freud, Franco, Bowlby, Parkes, entre condição de base segura, de proteção, os

outros. O método de pesquisa será qualitativo, vínculos estabelecidos ficam fragilizados.

onde os recortes servirão para possíveis Quando ocorrer o rompimento desses

identificações frente às perdas por morte vínculos no futuro causarão sentimentos

concreta ou perdas por morte simbólica. intensos e ambivalentes de dor, raiva, tristeza,

Pretende-se com este estudo, contribuir para saudade e culpa, e muitas das vezes uma luta

maior compreensão e ajuda no aspecto contra o destino, numa tentativa de reviver

emocional, que foi psicologicamente momentos felizes que lhe foram tirados.

implicado. Tal como a morte concreta, ou a perda


de pessoas significativas, ocorrem mortes
simbólicas como, por exemplo, rompimento de
Considerações finais
uma relação, adolescência, perdas na velhice,
perdas por doenças entre outras perdas.
A partir da pesquisa bibliográfica
Todas elas se referem a experiências
sobre as experiências das perdas e do luto, foi
dolorosas que causam um forte impacto na
possível observar a importante influência do
vida, sendo necessário elaborar o luto diante
vínculo primário saudável e seguro entre a
de tais perdas. Elaborar a perda é vivenciar o
figura parental e o bebê. E que a partir
acontecimento, permitindo a pessoa encontrar
de um apego seguro, onde os pais respondem
novos significados para a vida, se reorganizar
de forma adequada ás responsabilidades e
psiquicamente a partir das mudanças
necessidades de segurança do bebê,
ocorridas.
fornecendo oportunidade de explorar o mundo
Essas mudanças causam solidão,
sem medos, dando condições de tolerar
angústia, perde-se algo conhecido, ficando
frustrações e suportar breves separações sem
frente ao desconhecido, ao novo, gerando
muito sofrimento, tendo reflexo no modo em
estresse, desequilíbrio emocional e
que as pessoas enfrentam as perdas.
psicológico. Porém algumas perdas são
Crianças que tiveram uma infância de
necessárias e fazem parte do
separações, rejeições, desenvolvendo apegos
desenvolvimento humano.
inseguros, tendo dificuldades nas fases do
Os tempos de mudança são tempos
desenvolvimento até chegar na vida adulta,
de oportunidades. O confronto com algo
terão dificuldades no enfrentamento das
desconhecido, nos permite adquirir autonomia

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e confiança para nos aproximarmos de algo com a fantasia que a pessoa perdida vai
novo, sem medos que nos rondam, e que voltar, além do sentimento de culpa.
efeitos de certas transições na vida é muito Os fatores socioculturais também
mais benéfico do que prejudicial, onde influenciam e dificultam a elaboração do luto,
trabalho do luto se torna necessário para tais como negar que a morte existe, falta de
facilitar a aceitação da perda e da mudança. rituais de passagem, falta de rituais funerários,
A elaboração do luto colabora para A expressão do luto, os sentimentos e a forma
que a pessoa se permita chorar, viver a de comunicação vai depender da cultura em
perda sem culpa ou julgamentos, expressar que a pessoa vive.
suas emoções e sentimentos. É período em Muitas vezes a sociedade dificulta o
que o enlutado se fecha em seu mundo processo de luto, quando vê a pessoa como
interior, o interesse pelo mundo diminui, fraca ao expressar seus sentimentos, e não
causando desânimo, muita tristeza, onde nada como necessidade psicológica e necessária
mais parece ter sentindo, como se as energias de viver a dor da perda. A imagem que deve
fossem junto com a pessoa perdida. prevalecer é “ ser forte”, o que muitas vezes
O trabalho do luto tem como objetivo resulta no recebimento de pouco apoio social,
frente a morte concreta mostrar que o objeto da família e amigos.
perdido não existe mais, e que esses As consequências futuras serão
sentimentos vividos seriam uma forma de doenças relacionadas a luto mal elaborado,
tentar manter o vínculo. como tais ansiedades, tristezas, tentativas de
Em determinados casos há ocorrência suicídios.
do luto complicado, patológico, tanto em A pessoa frente ao luto complicado se
crianças como em adultos, que nos mostra a vê impossibilitado de voltar as atividades
elaboração não saudável. Essas experiências rotineiras, sendo muitas vezes necessário a
se referem aos vínculos primários ajuda de profissionais especializados em luto.
fragilizados e inseguros, como também ao tipo Uma das principais observações encontradas
de morte que ocorreu, como no caso de no luto patológicos, foram a dificuldade de se
mortes traumáticas, mortes repentinas, separar da pessoa que se foi, dificuldades de
assassinatos e acidentes. se vincular com outras pessoas e outras
Cheguei a ter dúvidas sobre a atividades. O vínculo permanece com a
presença de crianças nos funerais, ou até que pessoa que se foi, não se permitindo a novos
ponto elas poderiam ter a compreensão a vínculos, abrindo espaço para reações
respeito das perdas. Porém foi possível ver o patológicas como negação e distorção da
quanto é necessário que os adultos não realidade, ou adiamento e inibição do luto.
escondam a ocorrência de morte das crianças, A dor do luto faz parte nossas vidas,
para que haja possibilidade de elaborar o sendo o preço que pagamos pelo o amor que
luto. As crianças percebem e sentem que algo temos a pessoas importantes. Ignorar esse
aconteceu, reagindo negativa e fator é fingir que a morte existe, é cegar-se
agressivamente, sem entender o ocorrido, ou emocionalmente, de maneira a ficarmos

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despreparados para lidar com as perdas que mesmos. Não permitir entrar em contato com
ocorrem em nossas vidas. o sofrimento, chorando escondido e em
Muitas vezes achamos que as silêncio, como se sentissem envergonhadas,
pessoas que amamos são imortais, e temos a só agrava ainda mais o estado de luto
sensação de que não vamos aguentar perdê- Apesar do sofrimento devido às
las, muitas vezes as pessoas preferem morrer perdas por mortes, segundo a literatura existe
junto do que suportar a dor. possibilidade de transformação, ou seja, de
Tive a oportunidade de ver a analogia renascer para uma nova vida, eliminando a
entre a morte concreta e a morte simbólica condição de “nunca mais”, ou de que “acabou
como exemplo: a perda frente a separação de tudo”, e que “não vale a pena viver”.
casais, sendo um dos eventos mais dolorosos Eu percebi ao fazer esse trabalho, que
para o ser humano, sendo considerado como em alguns momentos ia ser difícil me deparar
a presença de morte em vida, porque separar, com algo que queremos evitar, como falar de
partir é morrer um pouco. A separação morte e perdas, pois é assunto doloroso. Mas
associada à morte concreta traz um a vontade de entender esse tema foi muito
sentimento de “nunca mais”, ocorrendo muitas mais forte, me intrigava ver como prestar
vezes tentativas de suicídios diante de ajuda a pessoas enlutadas, o que falar frente
separações como maneira de aliviar a dor. aquele momento? Fui vendo o quanto é
A importância do apoio e ajudar aos inesgotável no sentido ter muitas coisas a
enlutados, no momento da perda e como pesquisar e entender, sendo uma área na qual
ajudar a entendê-las e ajudar a modificar o pretendo me especializar.
seu mundo, dando lhes novos significados. As Para mim esse trabalho mobilizou aspectos
primeiras fontes de apoio são os familiares, pessoais e profissionais. Ao entrar em contato
amigos e profissionais da Saúde. Sempre com emoções, com fragilidades e angústias,
respeitando o tempo do enlutado e não as no sentido de me sensibilizar e me emocionar
forças a entender a realidade, onde em partes a cada página que eu escrevia, enriqueceu
ela perceba que ocorreu a mudança, mas sobremaneira meu campo de experiências.
prefere ignorar como uma defesa para se
proteger. REFERÊNCIAS
O enlutado vive uma tarefa pela frente
de não apressar o luto e nem de evitá-lo, onde BOWLBY, John. Formação e Rompimentos
a terapia ajuda tanto na expressão de dos Laços Afetivos. 2 ed. São Paulo: Martins
Fontes, 1990.
sentimentos, quando ajuda as pessoas que
não conseguem sair do luto, necessitando de BROMBERG, Maria Helena Pereira Franco.
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apoio, sendo uma base segura e acolhedora e Reinaldo Ayer de. Cuidado Paliativo. São
que oferece proteção. Paulo. Cremesp. Conselho Regional de
Medicina do Estado de São Paulo, 2008.
A maioria das pessoas desconhece p.559 -573.
esse assunto, ou preferem nem saber,
CABRAL. Álvaro, NICK EVA. Dicionário
julgando-se fortes para sobreviver, não tendo Técnico de Psicologia. 13 ed. São Paulo:
consciência do grande mal que fazem a si Cultrix, 1990.

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