1 FILOSOFIA - DA - DIFERENÇA - 01 - Problema - Do - SER - e - Do - DEVIR
1 FILOSOFIA - DA - DIFERENÇA - 01 - Problema - Do - SER - e - Do - DEVIR
1 FILOSOFIA - DA - DIFERENÇA - 01 - Problema - Do - SER - e - Do - DEVIR
Observação:
O conflito entre as formulações de Heráclito e de Parmênides não foi resolvido/superado
a contento pelos demais filósofos pré-socráticos que lhes sucederam, cabendo a Platão e
a Aristóteles, posteriormente, o desafio de tentarem encontrar uma maneira de a filosofia
conseguir pensar o que Parmênides considerava como “não-ser” (a diferença, o devir e o
múltiplo), ou seja, essas três coisas que entram em choque com os princípios
parmenidianos de identidade e de não-contradição.
Platão não teve sucesso nesse desafio, mas Aristóteles tornou possível pensar a diferença
submetendo-a ao conceito de identidade. Com isso produziu-se uma diferença
domesticada, uma diferença esvaziada de sua alteridade radical e de sua
intempestividade, em suma, uma diferença identitária.
Com isso, se deu também origem ao que o filósofo Gilles Deleuze chama de
representação clássica, um modelo ou imagem de pensamento, ou uma forma de pensar
fundamentados no conceito de identidade, na recognição/reconhecimento e na repetição
do mesmo, do igual, do semelhante. Dessa forma, pensar se torna representar, e isso só é
possível com o auxílio do conceito de identidade.
Com Sócrates, Platão, mas, sobretudo, com Aristóteles e, depois, com o Cristianismo (uma
espécie de “platonismo aplicado ao povo”, como dizia Nietzsche), o pensamento já não
tem mais como tarefa afirmar a vida (como no tempo dos pré-socráticos); ele, desde
então, passou a policiar e a julgar a vida (fundamentando-se, para tanto, em valores
supostamente eternos, superiores, imutáveis, abstratos, universais e transcendentes: o
Bem, a Verdade, a Justiça, o Belo etc.).
Ocorre, assim, uma racionalização e uma moralização do pensamento e da vida, sintomas
de uma enfermidade sociocultural e histórica que Nietzsche chamou de niilismo. Tudo
isso implica uma desvalorização do sensível, do mutável, do material, do devir, do
múltiplo, da diferença e do efêmero, concebendo-os como coisas que “não são”, ou,
quando muito, como coisas que apenas “quase são”, podendo ser pensados tão
somente com o concurso do conceito de identidade.
O desafio que se nos apresenta, a nós contemporâneos, é o de pensar de uma forma
diferente a diferença; é tentar resistir e/ou escapar dessa forma tradicional de se
exercer o pensamento, típica da representação clássica, pensando, doravante, as
relações entre as diferenças sem a mediação do conceito de identidade. Esse é o
propósito das chamadas filosofias da diferença, dentre as quais a criada por Gilles
Deleuze talvez seja a mais potente e promissora.
Sylvio Gadelha
Fortaleza, 27 de fevereiro de 2015.