O Desprezo Pelas Artes e Pelas Letras

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 19

Luís Vaz de

Camões
(século XVI)

(Desenho a pena, de Almada Negreiros)


Reflexão: A fragilidade da vida humana
(Canto I, ests.105,106)

Acontecimento motivador da reflexão:

Muito embora a decisão do consílio dos deuses


tenha sido apoiar os portugueses na sua viagem Camões na gruta de
até à Índia, Baco prepara-lhes várias ciladas ao Macau (pormenor),
Francisco Metrass
longo do percurso.
Todas estas traições culminam com a tentativa de
Baco de conduzir a armada de Gama à sua
destruição no porto de Quíloa. No entanto, Vénus,
com ventos contrários, afastou a armada e fê-la
continuar o caminho até Mombaça.
O recado que trazem é de amigos, Reflexão: A fragilidade
da vida humana
Mas debaixo o veneno vem coberto; (Canto I, ests.105,106)
Que os pensamentos eram de inimigos,
Segundo foi o engano descoberto.
Oh! grandes e gravíssimos perigos!
Oh! caminho de vida nunca certo:
Que aonde a gente põe sua esperança, Camões na gruta de
Tenha a vida tão pouca segurança! Macau (pormenor),
Francisco Metrass
No mar, tanta tormenta, e tanto dano,
Tantas vezes a morte apercebida!
Na terra, tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade avorrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida,
Que não se arme, e se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno?
O recado que trazem é de amigos,
Plano da Viagem
Mas debaixo o veneno vem coberto;
(acontecimento motivador da
Que os pensamentos eram de inimigos, reflexão do Poeta-ciladas de
Segundo foi o engano descoberto. Baco)
Oh! grandes e gravíssimos perigos!
Oh! caminho de vida nunca certo: Plano da REFLEXÃO DO POETA
Que aonde a gente põe sua esperança,
Tenha a vida tão pouca segurança!
Marcas discursivas – reforço do tom de desalento/angústia
• Antítese (vv.1/3; vv.2/4)
• Mas(v.2) – conjunção (valor adversativo)
• Metáfora (v.2)
• Interjeição/Anáfora (vv.5,6)
• Dupla adjetivação (v. 5)
• Superlativo absoluto sintético de grave (v.5)
• Pontuação expressiva – ponto de exclamação
• Campo lexical de insegurança ( engano; perigos….)
Sistematizando…(est.105)

Reflexão: A fragilidade da vida humana:

• O engano, o embuste – os perigos a que o


Camões na gruta de
homem está sujeito; Macau(pormenor),
Francisco Metrass
• Caráter trágico e universal da condição
humana: à maior esperança sucede o maior
perigo.

(a traição preparada em Quíloa propicia uma


reflexão de dimensões universais e intemporais –
“a gente põe”, v.7 - nome coletivo + Presente do
Indicativo)
No mar, tanta tormenta, e tanto dano, Desdobramento da ideia inicial (est.105)
Tantas vezes a morte apercebida! vv.1-4 (demonstração da extrema insegurança
Na terra, tanta guerra, tanto engano, vivida pelo homem)
Tanta necessidade avorrecida!
Reflexão final de caráter
Onde pode acolher-se um fraco humano, universal/dramático (em
Onde terá segura a curta vida, vv.5-8
suspenso – interrogação
Que não se arme, e se indigne o Céu sereno retórica)
Contra um bicho da terra tão pequeno?
Marcas discursivas – reforço do tom de desalento/angústia:
• Antítese (vv.1,3)
• Paralelismo anafórico/Anáfora (vv.1-6)
• Enumeração (vv.1-4)
• Personificação (v.7)
• Metáfora (v.8) – estratégia de Mitificação do Herói
• Interrogação retórica (vv.5-8)
• Campo lexical de perigo (p. ex. tormenta, dano…)
• Pontuação expressiva (exclamações/interrogação)
Sistematizando…(est.106)

Reflexão: A fragilidade da vida humana:

• O homem está cercado por múltiplos perigos:


terra/mar; Camões na gruta de
Macau(pormenor),
Francisco Metrass
• A insegurança vivida num mundo hostil que se
arma e indigna contra o homem;

• O combate desigual entre a pequenez humana


(ser terreno/fraco/mortal) contra um universo
bem mais poderoso (homem = joguete nas mãos
do universo).
Reflexão: O desprezo pelas artes e pelas letras(Canto V, ests.92-100)

Acontecimento motivador da reflexão:

Vasco da Gama termina a sua narrativa sobre o reinado de D.


Manuel ao rei de Melinde. Conta-lhe, ainda, todas as peripécias
pelas quais passaram entre Lisboa e Melinde: Camões na gruta de
Macau(pormenor),
 as perigosas/Cousas do mar e os fenómenos naturais (Fogo de Francisco Metrass
Santelmo;
Tromba Marítima)

 A pouca hospitalidade dos nativos;

 A passagem do Cabo das Tormentas (Adamastor);

 A doença (escorbuto)
Reflexão: O desprezo pelas artes e pelas letras(Canto V, ests.92-100)
Ideias principais…

Est.92:
• Introdução ao tema da reflexão:

 Quão doce é ouvir o elogio e a glória justa das


nossas façanhas quando as vemos apregoadas;
 O conhecimento de feitos sublimes alheios (por
meio da literatura) incita o homem à imitação ou
superação desses feitos – o exemplo é motor
impulsionador da ação do homem.
Reflexão: O desprezo pelas artes e pelas letras(Canto V, ests.92-100)
Ideias principais…
Ests.93-95: (demonstração da tese: argumentos/exemplos - heróis da Antiguidade
Clássica que conciliavam as armas com as letras VS o caso português – incultura)

• Alexandro Magno (imperador)– apreciava os versos de Homero mais do que os


feitos gloriosos de Aquiles (Ilíada) e por ele desejava ser cantado;

• Temístocles (político e general grego) – invejava


os feitos de Milcíades (general grego) quando os
ouvia celebrados em verso;

• Vasco da Gama superou os antigos em


heroicidade, mas esta heroicidade só será
imortalizada se for cantada pelos poetas;
Reflexão: O desprezo pelas artes e pelas letras(Canto V, ests.92-100)
Ideias principais…(cont.)

• Octávio Augusto (imperador romano), aquele Herói, apoiava os poetas – foi


protetor de Virgílio, A lira Mantuana, e, por essa razão, Eneias e Roma foram
imortalizados (Eneida);

• Os portugueses são bravos e destemidos,


mas falta-lhes a dimensão cultural e a
sensibilidade para apreciar e acarinhar a
arte/poesia (incultura desprezo pelas
artes/letras);

• Octávio compunha versos de grande qualidade


apesar das preocupações governativas.
Vai César, sojugando toda França, Reflexão: O desprezo
E as armas não lhe impedem a ciência; pelas artes e pelas
letras
Mas, numa mão a pena e noutra a lança, (Canto V, ests.92-100)
Igualava de Cícero a eloquência.
O que de Cipião se sabe e alcança,
É nas comédias grande experiência.
Lia Alexandro a Homero de maneira
Camões na gruta de
Que sempre se lhe sabe à cabeceira. (est.96) Macau (pormenor),
Francisco Metrass
Enfim, não houve forte Capitão
Que não fosse também douto e ciente,
Da Lácia, Grega, ou Bárbara nação,
Senão da Portuguesa tão-somente.
Sem vergonha o não digo, que a rezão
De algum não ser por versos excelente,
É não se ver prezado o verso e rima,
Porque quem não sabe arte, não na estima. (est.97)
Vai César, sojugando toda França, Ideal de herói
E as armas não lhe impedem a ciência; renascentista (proposta
Mas, numa mão a pena e noutra a lança, de um novo ideal de
Igualava de Cícero a eloquência. herói): herói que concilia as
O que de Cipião se sabe e alcança, armas e as letras
É nas comédias grande experiência.
Lia Alexandro a Homero de maneira
Que sempre se lhe sabe à cabeceira. (est.96) Camões na gruta de
Macau (pormenor),
Marcas discursivas (reforço da tese do Poeta): Francisco Metrass
 Verbo no gerúndio (v.1) – valor durativo e de simultaneidade
 Mas (v.3) – valor adversativo
 Comparação (v.4)
 Metonímia (vv.3,6) – armas, pena, lança, Homero
 Anástrofes (vv.4-8)
 Oração com valor consecutivo (vv.7,8)
Enfim, não houve forte Capitão
Que não fosse também douto e ciente, Considerações em
Da Lácia, Grega, ou Bárbara nação, tom conclusivo e
Senão da Portuguesa tão-somente. disfórico:
Sem vergonha o não digo, que a rezão  Os antigos VS os
De algum não ser por versos excelente, portugueses
É não se ver prezado o verso e rima,
Porque quem não sabe arte, não na estima. (est.97) Camões na gruta de
Macau (pormenor),
Francisco Metrass
Marcas discursivas (reforço da tese do Poeta):

 Enfim (v.1) – valor conclusivo


 Dupla adjetivação (v.2)
 Senão/ tão-somente (v.4) – valor de exclusão
 Anástrofe (v.5)
 Porque (v.8) – valor causal
Reflexão: O desprezo pelas artes e pelas letras(Canto V, ests.92-100)
Ideias principais…
Ests.98-100:
• Consequências do desprezo dado às artes e às letras:

 Não haverá poetas épicos nem serão os heróis cantados;


 A não imortalização das façanhas dos heróis (perda da memória coletiva = perda
do exemplo/incentivo a novos feitos);

• A perplexidade do Poeta perante o facto de os


portugueses serem ásperos, austeros, rudos, e
de engenho tão remisso e não se preocuparem
com esta sua condição (incultura).
Reflexão: O desprezo pelas artes e pelas letras(Canto V, ests.92-100)

Ideias principais…(cont.)

• Vasco da Gama deve agradecer às Musas o patriotismo


que faz com que cantem os seus feitos gloriosos
(movidas pelo amor e pelo gosto de louvar o peito ilustre
lusitano);

• Exortação final do Poeta:


 Necessidade de levar a cabo grandes feitos
não obstante a falta de quem os divulgue.
Reflexão: O desprezo pelas artes e pelas letras(Canto V, ests.92-100)

Sistematizando…

• Topos de influência clássica que ganha pertinência no


contexto do século XVI: Exortação – a conciliação das
armas e das letras; o reconhecimento do canto como
meio difusor e perpetuador da Fama.

A nova proposta de Herói

“Mas, numa mão a pena e noutra a lança,”


Plano das Reflexões do Poeta
78 Canto VII, ests. 78 - 87
Um ramo na mão tinha… Mas, ó cego!
Eu, que cometo insano e temerário,
Sem vós, ninfas do Tejo e do Mondego,
Por caminho tão árduo, longo e vário!
Vosso favor invoco, que navego
Por alto mar, com vento tão contrário,
Que se não me ajudais, hei grande medo,
Que o meu fraco batel se alague cedo.

79
Olhai que há tanto tempo, que cantando
O vosso Tejo e os vossos Lusitanos,
A fortuna me traz peregrinando,
Novos trabalhos vendo e novos danos;
Agora o mar, agora exp’rimentando
Os perigos Mavórcios inhumanos,
Qual Cânace, que à morte se condena,
Numa mão sempre a espada e n’outra a pena.
Plano das Reflexões do Poeta
Plano da Viagem Canto VII, ests. 78 - 87
Marcas discursivas
Um ramo na mão tinha… Mas, ó cego! • Invocação:
Eu, que cometo insano e temerário, Imagem que • apóstrofe;
evidencia a • predomínio da 2ª pessoa do
Sem vós, ninfas do Tejo e do Mondego,
plural;
Por caminho tão árduo, longo e vário! fragilidade do
• imperativo.
Vosso favor invoco, que navego poeta face às • Reflexão pessoal:
Por alto mar, com vento tão contrário, contrariedades • Predomínio da 1ª pessoa do
que tem de singular (pronomes,
Que [se não me ajudais], hei grande medo,
enfrentar determinantes, flexão verbal).
Que o meu fraco batel se alague cedo.

Olhai que há tanto tempo, que cantando


O vosso Tejo e os vossos Lusitanos,
A fortuna me traz peregrinando,
Novos trabalhos vendo e novos danos;
Agora o mar, agora exp’rimentando
Os perigos Mavórcios inhumanos,
Qual Cânace, que à morte se condena,
Numa mão sempre a espada e n’outra a pena.

Você também pode gostar