Tese - Micaela Lopes

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TESE - VERSÃO

FINAL - O Regime de Transparência Fiscal.docx


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Micaela Andreia Monteiro Lopes

A TRANSPARÊNCIA FISCAL
CONTRIBUTO PARA A COMPREENSÃO DO ARTIGO 6.º DO CIRC

Dissertação apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra


no âmbito do 2.º Ciclo de Estudos em Direito (conducente ao grau de Mestre),
na Área de Especialização em Ciências Jurídico-Políticas com Menção em Direito Fiscal
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Orientador: Professor Doutor José Casalta Nabais

Coimbra, 2016
Micaela Andreia Monteiro Lopes

A TRANSPARÊNCIA FISCAL
CONTRIBUTO PARA A COMPREENSÃO DO ARTIGO 6.º DO CIRC

FISCAL TRANSPARENCY
CONTRIBUTION FOR CIRC'S 6TH ARTICLE COMPREHENSION

Dissertação apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, no


âmbito do 2.º Ciclo de Estudos em Direito (conducente ao grau de Mestre), na Área de
Especialização em Ciências Jurídico-Políticas com Menção em Direito Fiscal

Orientação: Professor Doutor José Casalta Nabais

Coimbra, 2016
Deus quer,
o Homem sonha,
a obra nasce

(Fernando Pessoa)
AGRADECIMENTOS

A Deus.
À memória da minha avó Hortência e da Dona Idalina.
Aos meus pais, Francisco e Madalena.
Ao meu pai, a quem reconheço todo o esforço e que muito me ajudou nesta etapa. Pelas
palavras que fizeram de mim uma pessoa exigente, determinada e capaz de lutar pelos seus
sonhos. Um obrigada não basta.
Em especial à minha mãe, pela guerreira que é, por nunca baixar os braços perante as
contrariedades e enfrentar a vida com um sorriso no rosto. Por ser a minha confidente, a
melhor amiga, e, acima de tudo, pelo amor incondicional que me dá.
Ao Tico. O meu bebé e fiel companheiro das longas horas de estudo, que trouxe alegria à
minha vida e me enche de amor a cada ronronar.
Ao Luís, pelo carinho, dedicação e paciência. Por ter estado do meu lado e pela força com
que me ajudou a enfrentar as adversidades.
À Dona Adelaide, à Rita e à Francisca. A verdadeira família com que Coimbra me
presenteou. As conversas depois do jantar, as sábias palavras, os conselhos e a ânimo
permanecerão para sempre meu coração. A vocês devo ter chegado aqui e, apesar destas
palavras não serem suficientes para agradecer todo o amor, fica a certeza que vos levo
comigo para a vida.
À Vanessa, por ter sido mais que minha madrinha, uma verdadeira amiga que esteve sempre
presente e a quem estarei permanentemente grata.
À Carina, à Sara Almeida e à Sara Campos, por acompanharem de perto esta luta, mostrando-
nos que há ainda pessoas, verdadeiramente, boas no Mundo.
À Nélia, à Tânia, à Carolina, à Inês, à Mélanie e à Luci. Ao Pedro, ao João e ao Ricardo. Às
afilhadas, netas e bisnetas. Às Rosas Negras e às Fénix. À amizade, às memórias, aos cafés
e aos sorrisos que me roubaram. Por me terem dado muito mais do que eu merecia e do
aquilo que vos fui capaz de oferecer. Por terem feito destes anos, os mais felizes da minha
vida. A vós, um grande F-R-A!

i
Ao meu patrono Senhor Dr. José Albuquerque Ferreira e sua esposa Senhora Dr.ª. Inês Cepa.
Muito reconheço e agradeço os ensinamentos, a humanidade e a compreensão que desde o
primeiro dia tiveram para comigo.
À Senhora Professora Irene Santos, pela sensibilidade, pela alegria e encorajamento. Uma
verdadeira inspiração e força da natureza. Um muito obrigado não chega por toda a
amabilidade e generosidade com que me ajudou no meu percurso escolar.
Ao Senhor Doutor David Magalhães. O exponente máximo do ensino. Que em muito
contribui para que este sonho se concretizasse. Pela motivação, alegria e interesse que desde
as aulas de Direito Romano manifestou, incentivando-me a trabalhar e a querer chegar mais
longe. À sua bondade, prontidão, atenção e delicadeza, um sincero, e eterno, bem-haja.
Ao meu orientador, Senhor Doutor José Casalta Nabais. A grandiosidade profissional,
humanamente, inalcançável. Um ser exemplar, fadado com um enorme coração. Jamais
esquecerei todo o incentivo, a disponibilidade e a presença que desde sempre demonstrou
ter para comigo e para com este projeto. Resta apenas o meu mais genuíno agradecimento
por ter aceite em me acompanhar neste percurso e por, acima de tudo, nele ter acreditado.
Senhor Doutor, foi uma honra.
Às Fundações Rangel de Sampaio e Francisco Salgado Zenha.

ii
RESUMO

A descida progressiva da taxa nominal do IRC e o consequente aumento do


diferencial relativamente às taxas do IRS tem conduzido a uma excessiva e desenfreada
constituição de sociedades, em substituição do exercício das atividades em nome individual.
A transparência fiscal é um instrumento na procura da verdade e da responsabilidade, por
meio do qual se retira o véu da personalidade jurídica às entidades por ele abrangidas,
visualizando-se apenas a figura dos respetivos sócios ou membros. Com efeito, a lei como
que vê através dessa entidade, dando-se voz aos opositores da tributação da sociedade que
defendiam que deveria transferir-se a tributação para a pessoa dos seus sócios. O regime de
transparência fiscal está consagrado no artigo 6º do Código do Imposto sobre as Pessoas
Coletivas e foi instituído em Portugal, em 1989, mas era já aplicado há muito noutros países
para as denominadas sociedades de pessoas (partnerships). É caracterizado pela
desconsideração, para efeitos de tributação em imposto sobre o rendimento das pessoas
coletivas, da personalidade jurídica de determinados entes coletivos, tributando-se o
respetivo rendimento diretamente na pessoa dos seus sócios ou membros,
independentemente de ocorrer distribuição de lucros. Com o intuito de assegurar a
neutralidade fiscal, eliminar a dupla tributação económica e combater a evasão e fraude
fiscais, a sua estatuição sempre gerou controvérsias, essencialmente quanto às entidades por
si abrangidas – as flow-through, pass-through ou fiscally-transparent entities -,
operacionalidade prática e determinação dos resultados que devem ser imputados aos seus
sócios. O nosso ordenamento jurídico-tributário não tem sido objeto de profundas
alterações, enaltecendo-se, porém, a última, em 2014, que ocorreu com a Reforma do CIRC
e que veio a alargar o seu âmbito subjetivo. Certos que, perante as questões controvertidas
que reclamam uma reflexão mais cuidada, as posições doutrinais e a jurisprudência
produzida, há ainda um longo caminho a percorrer.

Palavras-chave: regime de transparência fiscal; princípio da neutralidade fiscal; dupla


tributação; evasão fiscal; desconsideração da personalidade jurídica; personalidade coletiva;
sociedades transparentes; grupos transparentes; sociedades de profissionais.

iii
ABSTRACT

The progressive decrease in the IRC’s nominal rate and the consequent differential
increase regarding the IRS rates have led to an excessive and uncontrolled foundation of
societies, which replaced the practice of individual based activities. Fiscal transparency is a
tool used in the pursuit of the truth and responsibility, through which the legal personality
of the entities is unveiled, allowing only the inspection of the respective partners or
individual members. Indeed, it is as if the law saw through that entity, granting voice to the
societies’ taxation opponents that argue that the taxation should be transferred to its partners’
legal personality. The fiscal transparency regime is established in Article 6 of the Taxation
Code of Income and Gains of Collective People and it was approved in Portugal in 1989,
although it was applied in other countries before this to the so-called partnerships. This
regime is characterized by the disregard of the legal personality of certain collective entities
for purposes of collective people’s income taxation, taxing the respective income directly to
the entity of its partners or members independently of there being a profit distribution. With
the objective of tax neutrality insurance, double taxation elimination and fight against tax
evasion and fraud, this establishment always generated controversy, mainly as to the entities
covered (the so called flow-through, pass-through or fiscally-transparent entities), the
practical operability and the results determination that should be allocated to its members.
Our legal taxation system has not been subjected to profound changes, nevertheless the last
one in 2014, brought the CIRC reform and the extension of its subjective range. Given that
the controversial issues call for a more careful reflection, doctrinal positions and produced
jurisprudence, certainly there is still a long way to go.

Keywords: fiscal transparency regime; principle of fiscal neutrality; double taxation; tax
evasion; disregard of legal entity; collective personality; transparent societies; transparent
groups; professional societies.

iv
SIGLAS E ABREVIATURAS

Ac(s). Acórdão(s)

ACE Agrupamentos Complementares de Empresas

AEIE Agrupamentos Europeus de Interesse Económico

Al(s). Alínea(s)

Art(s). Artigo(s)

AT Autoridade Tributária e Aduaneira

BGH Bundesgerichtshof

BMJ Bill Moyers Journal

CC Código Civil

CDT Convenções para evitar a dupla tributação internacional

CEE Comunidade Económica Europeia

CEJ Centro de Estudos Judiciários

CFC Controlled Foreign Company

Cfr. Confronte

CGD Caixa Geral de Depósitos

CIMI Código do Imposto Municipal sobre Imóveis

CIMIT Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis

CIRC Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas

CIRE Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas

v
CIRS Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares

CIS Código do Imposto do Selo

CN Código do Notariado

Cód. Código

Coord. Coordenação

CPC Código de Processo Civil

CPPT Código de Procedimento e de Processo Tributário

CRCSPSS Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança


Social

CRP Constituição da República Portuguesa

CSC Código das Sociedades Comerciais

CT Código do Trabalho

CTF Ciência e Técnica Fiscal

CTJ Cadernos de Justiça Tributária

DGCI Direção Geral dos Impostos

DL Decreto-Lei

DR Diário da República

Dr(ª). Doutor(a)

DSIRC Direção Geral de IRC

Ed. Edição

EIRL Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada

vi
EOA Estatuto da Ordem dos Advogados

EUA Estados Unidos da América

FDUC Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra

GIE Groupement d’Intérêt Économique

IASB International Accounting Standards Board

IBFD International Bureau of Fiscal Documentation

IES Informação Empresarial Simplificada

IFA International Fiscal Association

IMI Imposto Municipal sobre Imóveis

IMT Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis

IRC Imposto sobre Rendimento das Pessoas Coletivas

IRPF Impuesto sobre la Renta de las Personas Físicas

IRS Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares

IS Imposto do Selo

IS Impuesto sobre la Renta de las Sociedades

IVA Imposto sobre o Valor Acrescentado

L Lei

LEO Lei do Orçamento do Estado

LIS Ley del Impuesto sobre Sociedades

LGT Lei Geral Tributária

MOE Membro dos Órgãos Estatutários

vii
N.º Número

NJW Neue Juristische Wochenschrift

Ob. cit. Obra citada

OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico

P. Página

PP. Páginas

Proc. Processo

RDS Revista de Direito das Sociedades

Reg. Regulamento

RETGS Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades

RG Reichsgericht

RLJ Revista de Legislação e Jurisprudência

RMMG Retribuição Mínima Mensal Garantida

ROA Revista da Ordem dos Advogados

ROC Revisores Oficiais de Contas

RTF Regime de Transparência Fiscal

SGPS Sociedades Gestoras de Participações Sociais

SNC Sistema de Normalização Contabilística

Ss. Seguintes

STA Supremo Tribunal Administrativo

STJ Supremo Tribunal de Justiça

viii
T. Tomo

TC Tribunal Constitucional

TCA Tribunal Central Administrativo

TOC Técnicos Oficiais de Contas

TRC Tribunal da Relação de Coimbra

TRL Tribunal da Relação de Lisboa

TRP Tribunal da Relação do Porto

TS Tribunal Supremo

V. Vide

V.g. Vide gratia

Vol. Volume

ix
ÍNDICE

Agradecimentos ...................................................................................................................... i

Resumo .................................................................................................................................iii

Abstract ................................................................................................................................. iv

Siglas e abreviaturas .............................................................................................................. v

Introdução .............................................................................................................................. 1

CAPÍTULO I

A TRANSPARÊNCIA FISCAL E A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE ... 3

1 – As manifestações da desconsideração da personalidade jurídica ................................ 6

2 – A desconsideração no direito fiscal.............................................................................. 9

2.1 – A transparência fiscal internacional ...................................................................... 9

2.2 – O regime de transparência fiscal ......................................................................... 11

CAPÍTULO II

AS ENTIDADES TRANSPARENTES

1 – As sociedades transparentes ...................................................................................... 14

1.1 – As sociedades civis .............................................................................................. 14

1.2 – As sociedades de profissionais ............................................................................ 17

1.2.1 – As sociedades de pessoas e as sociedades de capitais .................................. 17

1.2.2 – As sociedades de profissionais para efeitos fiscais ....................................... 22

1.2.3 – A subalínea 2), da alínea a) do n.º 4 do artigo 6º do circ .............................. 26

1.3 – As sociedades de simples administração de bens ................................................ 31

2 – Os grupos transparentes ............................................................................................. 33

2.1 – Os agrupamentos complementares de empresas ................................................. 35

x
2.2 – Os agrupamentos europeus de interesse económico ........................................... 38

2.3 – A sua inserção no artigo 6º do circ ...................................................................... 40

CAPÍTULO III

AS FINALIDADES DA TRANSPARÊNCIA

1 – A neutralidade fiscal ................................................................................................. 44

2 – A luta contra a evasão fiscal....................................................................................... 47

2.1 – A personalidade coletiva ..................................................................................... 49

2.2 – A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica ................................... 53

3 - A eliminação da dupla tributação ............................................................................... 62

3.1 – O imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas e sobre as pessoas


singulares ...................................................................................................................... 66

CAPÍTULO IV

O REGIME JURÍDICO

1 – Não incidência ou isenção? ........................................................................................ 73

2 – Os resultados a imputar aos sócios............................................................................. 76

2.1 – Nas sociedades transparentes .............................................................................. 76

2.2 – Nos grupos transparentes ..................................................................................... 78

2.3 – A impugnação da matéria coletável .................................................................... 79

2.4 – A partilha de resultados ....................................................................................... 80

3 – A tributação na esfera das entidades transparentes .................................................... 83

4 – As obrigações contabilísticas e fiscais ....................................................................... 88

4.1 – A organização da contabilidade........................................................................... 88

4.2 – As obrigações acessórias ..................................................................................... 92

4.3 – A retenção na fonte .............................................................................................. 93

xi
4.4 – Os pagamentos por conta..................................................................................... 95

5 – O regime contributivo das sociedades de profissionais ............................................. 95

6 – A tributação dos sócios ou membros não residentes ................................................ 100

CAPÍTULO V

REFLEXÃO SOBRE A TRANSPARÊNCIA

1 - Confronto do regime de transparência com a não transparência .............................. 102

2 – Quanto às sociedades de simples administração de bens ......................................... 117

3 – Conclusão ................................................................................................................. 122

Bibliografia ........................................................................................................................ 129

Jurisprudência .................................................................................................................... 137

Anexos ............................................................................................................................... 141

Anexo I – Tabela de atividades do artigo 151.º do CIRS ................................................ 1451

Anexo II – Circular n.º 8 de 16 de fevereiro de 1990 da DSIRC ................................... 1465

Anexo III – Ofício-Circulado n.º 20132/2008 de 14 de abril de 2008 da DSIRC ............. 146

xii
INTRODUÇÃO

Os cidadãos recorrem às estruturas criadas pelo Estado para verem satisfeitas parte
das suas necessidades primárias, o que o leva a procurar receitas nos impostos para fazer
face a tais solicitações e, ao mesmo tempo, cumprir o desígnio constitucional do artigo 103º,
n.º 1: uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza. O setor empresarial desempenha
um papel importantíssimo para que este objetivo seja atingido, mas, quando o intuitos
personae do sócio assume maior importância que a estrutura societária, o Estado entende
que a deve desconsiderar, e imputar os efeitos fiscais àqueles que são, na verdade, os
verdadeiros responsáveis pela prossecução do objeto social: os sócios.
Surge, assim, o regime de transparência fiscal, aplicado a certas entidades coletivas,
mas cujos efeitos se refletem, essencialmente, na esfera jurídica dos sócios. A sua
consagração, e aplicação, têm sido alvo de controvérsia, essencialmente, em relação às
entidades abrangidas, alimentada pela não conveniente justificação, por parte do legislador,
da sua opção, que faz, somente, uma breve referência à sua fundamentação doutrinária. As
questões jurídico-doutrinais que suscita são de tal ordem controversas que, em Espanha, no
ano de 2003, este regime foi eliminado. Contudo, existindo vozes nesse sentido, solução
semelhante ainda está longe de ser estatuída em Portugal.
Foram precisamente tais fatores que nos motivaram a estudar este regime, apesar de
estarmos cientes dos obstáculos que se adivinhavam, reflexo da constante metamorfose que
envolve todo o Direito fiscal e, não obstante a transparência não ter sofrido profundas
alterações, desde a sua implementação, vimo-nos a braços com a escassez de estudos
referentes ao mesmo.
Deste modo, e porque a metodologia de investigação assim o aconselha, esta
dissertação estará dividida em cinco Capítulos. Começaremos por verificar que ao artigo 6.º
do CIRC subjaz os ideais da doutrina da desconsideração da personalidade jurídica, e, de
seguida, analisaremos, detalhadamente, cada entidade transparente, adiantando, desde já,
que são as sociedades de profissionais as que merecem a nossa mais profunda atenção.
No Capítulo III, referente aos objetivos da transparência, explicaremos o princípio
da neutralidade fiscal, tendo, sempre, como plano de fundo, a Constituição da República
Portuguesa. Estudaremos, com mais atenção, a personificação das pessoas coletivas e os

1
problemas que lhe estão associados, necessária para que possamos compreender, com
precisão, a doutrina da desconsideração. Quanto à eliminação da dupla tributação
económica, abordaremos a questão, que assombra todos os sistemas fiscais: a sociedade é
detentora de capacidade contributiva?
Posteriormente, examinaremos o regime jurídico, não esquecendo, nem a forma de
determinação da matéria coletável, nem as obrigações, tanto a nível contabilístico, como
fiscal. Terminaremos com uma profunda reflexão sobre a transparência, elaborando, sempre
que necessário, uma análise crítica, apoiada na doutrina e jurisprudência, já que estamos
cientes que a complexidade do tema assim o exige.

2
CAPÍTULO I
A TRANSPARÊNCIA FISCAL E A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE

O Direito Fiscal assume uma importância cada vez mais acentuada no planeamento
da vida dos contribuintes, quer estes sejam pessoas singulares, quer sejam pessoas coletivas.
Quanto às últimas, tem-se verificado, ao longo dos anos, que reclamam um esforço fiscal
mais baixo, alimentando a tendência que se tem vindo a verificar na excessiva criação de
sociedades com o exclusivo, ou principal, objetivo de poupança fiscal. O Estado português
é (ainda) um Estado Social ao serviço dos seus cidadãos, e procura proporcionar-lhes uma
vida condigna, em igualdade de condições e oportunidades. O Estado moderno apresenta-se
por toda a parte como um Estado Fiscal, que tem por suporte financeiro determinante a figura
dos impostos e cujo nível de fiscalidade é reclamado pelo Estado Social recortado na
Constituição1.
Visto constituir um dos mais genuínos suportes financeiros para a realização dos
princípios estruturais do Estado de Direito, o Estado Fiscal não poderá a ele contrapor-se.
No entanto, se perspetivado a partir dos cidadãos, o Estado Fiscal é concretizado no princípio
da livre disponibilidade económica dos indivíduos e das suas organizações empresarias2.
Assim, os impostos são a contraprestação aceitável para que vivamos numa sociedade
estruturada pelo princípio da liberdade que se encontra manifestado na consagração
constitucional dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos indivíduos e da
sociedade. Essa liberdade, refletida na liberdade de gestão fiscal, adquire grande
importância no setor empresarial, reconhecendo ao sujeito passivo a possibilidade de
planificar a sua vida de uma forma livre, atribuindo-lhe o direito de optar pela solução menos
onerosa e mais adequada à sua organização e funcionamento com o intuito de reduzir o
montante de imposto a pagar. A verdade é que a lei fundamental não impõe a necessidade
de forma de pessoa coletiva para o exercício de qualquer atividade económica ou social, o

1
CASALTA NABAIS, José, Direito Fiscal, 9ª ed., Almedina, Coimbra, 2016, p. 135.
2
Sobre o princípio da livre disponibilidade económica v. CASALTA NABAIS, José, ob. Cit., p. 136;
CASALTA NABAIS, José, O Dever Fundamental de Pagar Impostos, 4ª Reimpressão, Almedina, Coimbra,
2015, pp. 681-686 e CASALTA NABAIS, José, Introdução ao Direito Fiscal das Empresas, Almedina,
Coimbra, 2013, p. 48. V. SILVA, Suzana M. C. L. T.. 2011. «Sustentabilidade e solidariedade em tempos de
crise», in Sustentabilidade Fiscal em Tempos de Crise, coord. José Casalta Nabais, Suzana Tavares da Silva,
Coimbra, Almedina, 2011.

3
que demonstra que vigora, entre nós, o princípio da liberdade de configuração jurídica. Aos
indivíduos, enquanto agentes económicos e sociais, é-lhes reconhecida a liberdade de
organização ou estruturação na forma jurídica mais adequada à prossecução dos seus
interesses. Isto significa que a decisão de constituição de pessoas coletivas é, em última ratio,
algo que só aos indivíduos diz respeito.
Assim, a personificação das sociedades comerciais mostra-se essencial para a
prossecução do escopo lucrativo e do objeto social, constituindo um expediente legal que
permite torná-las numa entidade detentora de património próprio, distinta dos seus sócios.
Se estivermos perante uma sociedade cuja responsabilidade é limitada, será ela que
responderá perante os seus credores com o seu património, ficando os sócios libertos dessa
responsabilidade, para quem as obrigações da sociedade são obrigações de outrem. É esta
perfeita autonomia patrimonial que lhe permite a limitação do risco económico3 da atividade
que desenvolvem, oferecendo segurança ao investimento. A personalidade jurídica é, tanto
para as pessoas físicas como coletivas, um conceito jurídico, uma realidade situada no
mundo jurídico, uma criação do espírito humano no campo do Direito, em ordem à realização
de fins jurídicos. Para os entes coletivos é essencialmente um mecanismo técnico-jurídico,
justificado pela ideia de, com maior comodidade e eficiência, organizar a realização dos
interesses coletivos e duradouros, exprimindo, assim, uma técnica organizatória julgada
vantajosa4.
Encontrar-se-ão os seus credores numa posição de risco?
Não, os mecanismos de publicidade legal permitem, a quem contrata com as pessoas
coletivas, conhecer a importância e valor do seu capital, e avaliar, assim, qual a sua
capacidade de resposta patrimonial perante as responsabilidades assumidas. No entanto, bem
sabemos que o cidadão é capaz dos meios mais ardilosos e engenhosos para se subsumir a
determinada consequência ou requisito legal por o considerar entrave à prossecução do fim
que visa atingir. É aqui que se confronta o legalmente permitido e as situações que, por
violarem preceitos ou princípios jurídicos, o Direito deve combater. Não raras vezes, o
indivíduo, conscientemente ou não, transpõe essa fronteira, cabendo ao ordenamento
jurídico a consagração dos instrumentos mais eficazes na dissuasão e sancionamento

3
A responsabilidade limitada constitui uma vantagem importantíssima, pois mantém o património dos
instituidores, sócios ou membros, livre e protegido dos credores da pessoa coletiva.
4
MOTA PINTO, Carlos Alberto da Teoria Geral do Direito Civil, 4ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2012.
pp. 140-144.

4
daqueles que o praticam. É o que acontece quando a personalidade jurídica das sociedades
(denominada por personalidade coletiva), erigida pelo Direito como forma de incentivar o
desenvolvimento de atividades económicas, criando empregos e fomentando o
desenvolvimento económico e social, é mobilizada de modo ilícito e abusivo, contrariando
normas ou princípios gerais, a ética dos negócios e a boa-fé, daí resultando prejuízos para
terceiros. Quando a personalidade jurídica é desvirtualizada e a autonomia, que a ela é
inerente, utilizada para propósitos distintos aos que o legislador pretendia atingir, cumpre ao
Direito encontrar a solução que melhor se coadune ao combate a tal situação.
A fim de fazer face a estes comportamentos fraudulentos e ao abuso da pessoa
coletiva por parte daqueles que compõem as sociedades – que se encontram escudados pelos
privilégios por ela conferidos, designadamente a separação de patrimónios e a limitação da
responsabilidade –, consubstanciados no desrespeito pelo princípio da separação entre a
pessoa coletiva e os seus membros, há muito que era reclamado um eficaz mecanismo capaz
de superar as implicações emergentes da personalidade jurídica. Surge, então, no Direito
comercial um movimento doutrinário e jurisprudencial, no sentido de desconsiderar a
personalidade coletiva, denominado pela doutrina americana to lift the corporate, pela alemã
de durchgriff e pela francesa de transparence e, entre nós, apelidada de desconsideração da
personalidade jurídica5.
O abuso do instituto da personalidade coletiva traduz um caso de abuso de direito,
ou de exercício inadmissível de posições jurídicas por meio de um ente coletivo, e o
comportamento que suscita a desconsideração caracteriza-se por atentar contra a confiança
legítima – venire contra factum proprium, suppressio ou surrectio –, ou por defrontar a regra
da primazia da materialidade subjacente – tu quoque ou exercício desequilibrado. Levantar
o véu societário, por se verificar e demonstrar que houve um abuso da possibilidade de
escolha das formas societárias, tem em vista chegar à pessoa do sócio, de forma a
responsabilizá-lo perante os lesados pela sua atuação, não reconhecendo a forma jurídica
criada e, consequentemente, imputando-lhe condutas que, se não fosse o superamento della
personalità giuridica, seriam atribuídas apenas à sociedade.

5
SALDANHA SANCHES, José, «Sociedades transparentes: alguns problemas do seu regime», Fisco, nº 17,
fevereiro de 1990, p. 35-36.

5
1 – AS MANIFESTAÇÕES DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE
JURÍDICA

No nosso ordenamento jurídico, a doutrina da desconsideração da personalidade


jurídica tem reflexos não só no Direito comercial, como também no Direito fiscal e até no
Direito laboral. Não obstante os interesses que visa proteger serem distintos para cada uma
das áreas em questão, alguns exemplos nos cumpre, brevemente, enunciar.
No âmbito do Direito comercial, o problema surgiu no seio da lógica do crescente
agrupamento das sociedades comerciais, onde é mais complexo e ocorre com maior
intensidade. Levantar a personalidade nos grupos das sociedades, de modo a surpreender a
realidade material subjacente, equivale a distribuir a responsabilidade em obediência a
critérios diferentes daqueles que resultariam do seu regime. Assim, esta doutrina surgiu a
posteriori com o intuito de resolver problemas reais inerentes à personalidade coletiva. A
doutrina procede a uma constelação6 de casos concretos, na qual esta se manifesta: a
confusão de esferas patrimoniais; a subcapitalização; e o atentado a terceiros e o abuso de
personalidade.
A primeira verifica-se quando a separação entre o património da sociedade e dos
sócios não seja clara devido à não observância de certas regras societárias, ou por
decorrências objetivas. Esta situação é mais patente nas sociedades unipessoais e, na
Alemanha, devido à inexistência de tutela legal, os princípios gerais e a teoria do
levantamento da personalidade jurídica eram mobilizados para solucionar o problema7. De
facto, podemos ainda distinguir duas situações8: a mistura de sujeitos de responsabilidade e
a mistura de massas patrimoniais. A mistura de sujeitos de responsabilidade – por exemplo,
através do desrespeito pelas formalidades societárias, ou pela existência de uma unidade de
posse das quotas ou da identidade dos membros de duas ou mais administrações – é passível

6
Classificação com menor caráter descritivo, Cfr. SCHMIDT, Karsten, Gesellschaftsrecht, 3ª ed. § 9 e
KÜBER, Friedrich, Gesellschaftsrecht , 5ª ed. (1999), § 23 (311).
7
Tomemos em consideração a seguinte jurisprudência: RG 8 de julho de 1957, RGHZ 25 (1958), 115-124
(117) que defende que não deveriam ser admitidas diferenças jurídicas entre a sociedade e os sócios; RG 13 de
novembro de 1973, RGHZ 61 (1974), RG 12 de novembro de 1975, RGHZ 65 (1976), e OLG Düsseldorf, de
1 de maio de 1989, GmbHR 1990, no sentido de que, quando existisse somente um único sócio, a diferença
entre os patrimónios poderia ser ignorada, denominando-se, estes casos, por responsabilidade por levantamento
da personalidade coletiva. Também RG 13 de abril de 1994, RGHZ 125 (1995), nos quais se determinou as
condições para que o sócio gerente viesse a ser responsável pela mistura dos patrimónios.
8
CORDEIRO, Pedro, A desconsideração da personalidade jurídica das sociedades comerciais, 3ª ed., Lisboa,
Universidade Lusíada Editora, 2008, p. 70.

6
de gerar danos aos credores sociais, sendo dever dos sócios primar pela capacidade de
destrinça de identidade dos sujeitos de responsabilidade. A mistura material de patrimónios
deve, também, produzir a perda da responsabilidade limitada de quem a provoca, pois a
fronteira existente entre a autonomia patrimonial da sociedade e a dos sócios torna-se fluída,
não devendo, por isso, ser respeitada.
Estaremos perante um caso de subcapitalização, quando a sociedade for constituída
com capital insuficiente. Esta é aferida em função do próprio objeto societário ou da sua
atuação, surgindo, deste modo, como tecnicamente abusiva9. Caso a subcapitalização se
verifique no momento da constituição da sociedade, será uma subcapitalização originária,
se for em momento ulterior, dir-se-á superveniente. A subcapitalização também poderá ser
nominal ou material. Nominal, quando a sociedade tem a possibilidade de recorrer a capitais
alheios, através de empréstimos efetuados pelos sócios que se apresentam, posteriormente,
como credores. Por sua vez, será material, quando houver uma efetiva insuficiência de
fundos próprios ou alheios, sendo que, para efeitos de desconsideração, só esta releva. A sua
finalidade poderá ser o prejuízo dos credores sociais, a provocação ou o retardamento de
falências, sendo a culpa in contraendo e a responsabilidade delitual10 utilizadas pela
jurisprudência para a resolução destas situações11.
O artigo 501º do CSC estipula o seguinte: a sociedade diretora é responsável pelas
obrigações da sociedade subordinada, constituídas antes ou depois da celebração do
contrato de subordinação, até ao termo deste. Nos termos do artigo 491º do mesmo Código,
aquele preceito aplica-se mesmo aos grupos constituídos por domínio total e, nos casos em
que uma sociedade é controlada por outra, através de contrato de subordinação ou de
domínio total, a sociedade dominante responde, pura e simplesmente, pelas dívidas da
subordinada, independentemente da sua fonte. O legislador não coloca em questão a
personalidade coletiva, mas, considera que as razões que justificam a separação de
patrimónios não se encontram presentes. Como a sociedade dominante podia encaminhar as

9
Também no ramo do Direito bancário e no Direito dos seguros, novos casos de desconsideração vão
emergindo, essencialmente por exigências de supervisão. Também no ramo do Direito bancário e no Direito
dos seguros, novos casos de desconsideração vão emergindo, essencialmente por exigências de supervisão. V.
CORDEIRO, António Menezes, O Levantamento da Personalidade Jurídica no Direito Civil e Comercial,
Coimbra, Almedina, 2000, p. 118.
10
A este respeito v. RGH 27.10.1982, NJW 1983, 676-678 e RGH 01.031993, NJW 1994, 2149-2152.
11
No ordenamento-jurídico alemão, o recurso ao § 826 do BGB mostra-se eficiente para justificar a
responsabilidade dos sócios pela subcapitalização, na medida em que tal atuação se consubstanciaria num
atentado aos bons costumes.

7
suas dívidas para a sociedade dominada, poria em causa a segurança dos credores e a
confiança societária, sendo que, só relativamente à responsabilidade por dívidas, se procede
à desconsideração.
Mais. O artigo 83º, n.ºs 1 e 3 do supramencionado Código determina que, quando o
sócio, por si, ou por acordo parassocial, tem legitimidade para designar administradores e o
faz, responde para com o designado de forma solidária, nos termos da culpa in eligendo, o
que nos demonstra que a personalidade coletiva é protegida de forma a garantir a tutela de
terceiros. Também o artigo 84º determina que, se uma sociedade reduzida a um único sócio
for declarada falida, este responde ilimitadamente pelas obrigações sociais contraídas no
período posterior à concentração das quotas ou das ações, contanto que se prove que, nesse
período, não foram observados os preceitos da lei que estabelecem a afetação do património
da sociedade ao cumprimento das respetivas obrigações. O mesmo se aplica ao período de
duração da referida concentração, caso a falência ocorra depois de ter sido reconstituída a
pluralidade de sócios.
No Direito laboral, a desconsideração da personalidade manifesta-se no n.º 1 do
artigo 143º do Código do Trabalho que afirma que, a cessação do contrato de trabalho a
termo, por motivo não imputável ao trabalhador, impede a sua nova afetação com o mesmo
empregador ou sociedade que com este se encontre em relação de domínio ou de grupo, ou
mantenha estruturas organizativas comuns. O contrato de trabalho a termo resolutivo só
pode ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa, e pelo período
estritamente necessário à satisfação dessa necessidade12. Assim, o artigo 143º, combate o
abuso da personalidade jurídica, por parte da entidade entregadora que, sob a veste de
empresa distinta, se dotava de uma série de artimanhas jurídicas, e contornava o artigo 140º,
realizando, de forma consecutiva, contratos de trabalho precários com o mesmo
trabalhador13.

12
Cfr. art. 140º do CT.
13
O STJ e o TR de Lisboa já se pronunciaram neste sentido nos acórdãos de 28.11.2012 (Proc. n.º
229/08.3TTBGC.P1.S1 e relator Dr. Pinto Hespanhol) e de 09.12.2008 (Proc. 5829/2008-4 e relatora Dr.ª.
Maria João Rombra), respetivamente.

8
2 – A DESCONSIDERAÇÃO NO DIREITO FISCAL

Motivada pelo planeamento fiscal ilegítimo, a desconsideração da personalidade


jurídica também ecoa no âmbito do Direito fiscal. Apontamos como sua manifestação o
regime de transparência fiscal que se desdobra no regime das controlled foreign company
ou transparência fiscal internacional, previsto no artigo 66º do Código do Imposto sobre o
Rendimento das Pessoas Coletivas, e no regime de transparência fiscal, estatuído no artigo
6º, o qual merecerá a nossa profunda atenção ao longo deste estudo.

2.1 – A transparência fiscal internacional

Por meio da eliminação das dificuldades a nível de deslocação de pessoas, bens e


capitais, a União Europeia em muito contribui para a deslocalização das empresas para
Estados com mais baixa carga fiscal14, conduzindo a uma feroz concorrência, não só entre
elas, como também entre os próprios Estados. É neste contexto que surge o regime das
controlled foreign company15. Sob a epígrafe imputação de rendimentos de entidades não
residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado, estatui o artigo 66º do CIRC que os
lucros ou rendimentos obtidos por entidades não residentes em território português e
submetidos a um regime fiscal claramente mais favorável são imputados aos sujeitos
passivos de IRC residentes em território português que detenham, direta ou indiretamente,
mesmo que através de mandatário, fiduciário ou interposta pessoa, pelo menos 25 % das
partes de capital, dos direitos de voto ou dos direitos sobre os rendimentos ou os elementos
patrimoniais dessas entidades.
Trata-se de uma medida antiabusiva (embora essa qualificação seja discutível) que
consiste na imputação aos sócios residentes em território português, na proporção da
respetiva participação no capital social, e independentemente da sua distribuição, dos lucros
obtidos após a dedução do imposto sobre os lucros que, sobre os sócios, tenha recaído por
sociedades residentes fora desse território e aí submetidas a um regime fiscal, claramente,

14
FREITAS PEREIRA, M. H., Fiscalidade, 3ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, p. 20.
15
Cfr. Portaria n.º 150/2004 de 13 de fevereiro relativa à imputação de lucros de sociedades residentes em
países com regime fiscal privilegiado.

9
mais vantajoso. O seu objetivo é combater a evasão fiscal, dificultando a deslocalização de
lucros do Estado de residência e para espaços jurisdicionais com taxas de tributação mais
diminutas, tributando-se, desta maneira, rendimentos que, de outra forma, nunca seriam
tributados. Concretiza uma abrangência do valor dos rendimentos recebidos de entidades
residentes em países com regimes fiscais privilegiados, configurando-se tais regimes
(verdadeiros) paraísos fiscais ou (meros) regimes fiscais preferenciais 16. Segundo o n.º 5,
quando o território da residência da entidade em questão constar de lista aprovada por
portaria do membro do governo responsável pela área das fianças, e aí se encontre isenta ou
não sujeita a imposto sobre o rendimento (ou análogo ao IRC), ou, ainda, quando a taxa de
imposto que lhe seja aplicável for inferior a 60% da taxa de IRC, estaremos perante um
regime fiscal privilegiado17. São abrangidas as sociedades cuja atividade principal consiste
na realização de operações bancárias, de seguros de bens ou pessoas situadas fora do
território português, de operações relativas a partes sociais e outros valores mobiliários e de
locação de bens imóveis situados fora do território da residência. São excetuadas as
sociedades residentes fora do território português, cujos lucros provenham em, pelo menos,
75% do exercício de uma atividade agrícola ou industrial, no território onde estão
estabelecidas, ou comercial e de prestações de serviços, desde que não esteja dirigida,
predominantemente, ao mercado do território em que se situa18. No exercício posterior em
que haja efetiva distribuição de lucros já imputados anteriormente, são estes deduzidos à
base tributável, havendo lugar a crédito de imposto por dupla tributação internacional, se
for caso disso19. À tributação das sociedades residentes subjaz uma tributação de base
mundial, na qual os lucros de atividades desenvolvidas no país, ou no exterior, é sujeito a
tributação no país de residência.
Assim, o CFC é aplicado inicialmente aos rendimentos passivos, a fim de evitar a
retenção de lucros nos Estados com regimes fiscais privilegiados onde as subsidiárias estão
domiciliadas, desconsiderando-se a personalidade jurídica das sociedades cuja constituição

16
CASALTA NABAIS, José, Direito..., ob. cit., pp. 531-532.
17
Cfr. Portaria 292/2011, de 8 de novembro.
18
Cfr. Art. 66º, n. º 6, al. a) do CIRC.
19
CASALTA NABAIS, José, ob. cit., p. 532. e MORAIS, Rui Duarte, «O art. 60.º do CIRC e as Legislações
CFC», Imputação de lucros de sociedades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado,
Universidade Católica, Lisboa, 2005. Também o ac. do STA de 11.05.2016 (Proc. n.º 0351/14 e relatora Dr.ª.
Dulce Neto).

10
tenha sido inspirada predominantemente por razões de ordem fiscal. (Este tema não se
encontra desenvolvido no presente trabalho, por não se enquadrar no seu objeto de estudo).

2.2 – O regime de transparência fiscal

O regime de transparência fiscal surgiu em Portugal na reforma fiscal da década de


80, pelo Decreto-Lei nº 442-B/88, que estatuiu o Código do Imposto sobre o Rendimento
das Pessoas Coletivas. Inicialmente consagrado no artigo 5º, encontra-se hoje previsto no
artigo 6º do referenciado Código, cujo nº 1 consagra o seguinte: é imputada aos sócios,
integrando-se, nos termos da legislação que for aplicável, no seu rendimento tributável para
efeitos de IRS ou IRC, consoante o caso, a matéria coletável, determinada nos termos deste
Código, das sociedades a seguir indicadas, com sede ou direção efetiva em território
português, ainda que não tenha havido distribuição de lucros: a) sociedades civis não
constituídas sob forma comercial; b) sociedades de profissionais; e, c) sociedades de
simples administração de bens, cuja maioria do capital social pertença, direta ou
indiretamente, durante mais de 183 dias do exercício social, a um grupo familiar, ou cujo
capital social pertença, em qualquer dia do exercício social, a um número de sócios não
superior a cinco e nenhum deles seja pessoa coletiva de direito público.
Relativamente à transparência fiscal objeto de análise deste trabalho, não há qualquer
atribuição de poderes à Administração por meio de cláusulas gerais, nem este regime tem
qualquer caráter sancionatório20. Por regra, serão sujeitos passivos de relações jurídico-
tributárias os detentores de personalidade jurídica, só assim não o sendo quando a lei estatui
o contrário. É o que acontece quando a lei considera como sujeitos tributários entidades
desprovidas de personalidade jurídica, nos termos do n.º 1 do artigo 2º do CIRC21, ou, em

20
Ao contrário do que se verificava em Espanha em que o caráter sancionatório foi introduzido pela Ley
25/1995, de 20 de julho.
21
Este preceito estatui o seguinte: As sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, as cooperativas, as
empresas públicas e as demais pessoas coletivas de direito público ou privado, com sede ou direção efetiva
em território português; As entidades desprovidas de personalidade jurídica, com sede ou direção efetiva em
território português, cujos rendimentos não sejam tributáveis em imposto sobre o rendimento das pessoas
singulares (IRS) ou em IRC diretamente na titularidade de pessoas singulares ou coletivas; As entidades, com
ou sem personalidade jurídica, que não tenham sede nem direção efetiva em território português e cujos
rendimentos nele obtidos não estejam sujeitos a IRS; as heranças jacentes, as pessoas coletivas em relação às
quais seja declarada a invalidade, as associações e sociedades civis sem personalidade jurídica e as
sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, anteriormente ao registo definitivo.

11
sentido oposto, quando não considera sujeitos passivos entidades detentoras de
personalidade. A transparência no nosso ordenamento jurídico é um regime de
enquadramento total e obrigatório, na medida em que, às entidades a si sujeitas – entidades
transparentes –, não lhes é facultada a possibilidade de por ele optarem22.
Quando as sociedades e agrupamentos reúnam determinados requisitos, o lucro
tributável é apurado em relação a si, nos termos do IRC, sendo depois imputado aos
respetivos sócios singulares em sede de IRS como rendimentos da categoria B, ou tributado
em IRC, se forem pessoas coletivas23, desconsiderando-se, desta forma, a sua personalidade
jurídica. Feita essa imputação, segundo a sua participação social ou regra previamente
estabelecida, o rendimento é englobado no restante rendimento dos sócios e aí tributado,
tornando-se estes os verdadeiros sujeitos passivos e, por isso, os únicos devedores do
imposto24. O véu da personalidade jurídica das entidades por este preceito abrangidas é
retirado, visualizando-se apenas a figura dos seus sócios ou membros25. Como que se vê26
através dela – daí a designação de transparência –, de modo a que nos abstraiamos da sua
personalidade e da sua capacidade tributária, atingindo-se aqueles que a constituem,
imputando-lhes a matéria coletável das respetivas entidades e responsabilizando-os
diretamente pelo pagamento do imposto devido27.
Assim, parte-se do pressuposto que, quando a figura e individualidade dos sócios é
predominante, a sociedade deve ser desconsiderada como sujeito autónomo para efeitos de
tributação do rendimento, uma vez que todas as atividades produtivas de rendimento
desenvolvidas pela sociedade transparente serão consideradas como se tivessem sido

22
CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., p. 248.
23
CASALTA NABAIS, José, O dever fundamental de pagar impostos, ob. cit., p. 502.
24
SERRÃO, Miguel, «Transparência Fiscal – imputação a sócios ou membros não residentes», CTF, n.º 427,
maio-julho de 2011, p. 393.
25
Vide, CORREIA VALE, Maria de Lourdes/FREITAS PEREIRA, Manuel H. de «Não aplicação do regime
da transparência fiscal às sociedades gestoras de participações sociais (SGPS)», CTF, n.º 354, abril-junho de
1989, p. 275.
26
O verbo ver é também utilizado por FARIA COSTA, José de, FARIA COSTA, José de. (4 de novembro de
2014). Transparência Fiscal - Qual a sua importância no quadro contemporâneo de uma Economia e de uma
Sociedade em Crise?. Obtido em 8 de setembro de 2016, disponível em
http://josedefariacosta.webs.com/Conferencia_transparencia_fiscal.pdf.
27
O artigo 5º, n.º 2, al. h) do CIRS desconsidera como facto tributário a distribuição dos lucros efetuada pelas
entidades transparentes aos respetivos sócios ou membros. A este respeito v. Código do IRC comentado e
anotado, DGCI, Lisboa, 1990, p. 94.

12
praticadas diretamente pelos seus sócios28, sendo, por isso, denominadas no Direito anglo
saxónico por flow-through, pass-through ou fiscally-transparent entities.
A verdade é que a distribuição das organizações da atividade económica pelo regime
das empresas singulares e pelo regime das empresas coletivas está dependente da forma
jurídica que lhe é atribuída, consoante o seu suporte seja a pessoa coletiva, ou caso o
empresário atue individualmente. A distribuição da tributação das empresas entre IRS e IRC
é muito artificial, já que não está consagrado um regime unitário da tributação das pessoas
coletivas, nem há liberdade de opção por parte das estruturas empresariais, por um desses
regimes29. A artificialidade da divisão é passível de ser verificada na medida em que o IRC
não tributa apenas entidades empresariais, mas também entidades que não se apresentam
como pessoas coletivas, encontrando-se também sujeitas a este imposto entidades às quais
não é reconhecida personalidade jurídica, porém, nem todas as empresas coletivas são
tributadas em IRC. É neste último caso que o regime de transparência fiscal se enquadra.
Como efeito, é nítido que a existência autónoma de um imposto sobre os rendimentos das
sociedades, coexistindo com um imposto sobre o rendimento das pessoas físicas é o
epicentro de toda a problemática jurídica inerente à transparência fiscal e que nos conduz à
questão: a tributação deverá recair sobre a sociedade ou sobre os respetivos sócios? Existe
uma corrente doutrinária que defende que as sociedades são meras figuras jurídicas fictícias
e, na realidade, é unicamente sobre os sócios que, direta ou indiretamente, deveria recair a
tributação. Não obstante, outra, afirma que as sociedades são entidades distintas dos sócios
que as constituem, têm personalidade jurídica e capacidade contributiva próprias e que, por
isso, são elas que suportam o imposto sobre os seus lucros, independentemente do destino
que lhes é atribuído30. Certo é que o artigo 6º veio, não só, dar voz aos opositores da
tributação da sociedade, como, também, estatuir um regime dotado de inúmeras
controvérsias e divergências, estando longe, no que à tributação do rendimento diz respeito,
de se consubstanciar num preceito harmonioso, unânime e apaziguador.

28
OKUMA, A. d. (2009). Normas anti-elisivas domésticas e internacionais no direito tributário internacional.
Tese de Doutorado em Direito . Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2009. p. 152.
29
Vide CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., p. 125.
30
A este respeito as obras: FREITAS PEREIRA, M. H., Fiscalidade, 3ª ed., Coimbra, Almedina, 2009 e
XAVIER DE BASTO, José, O imposto sobre as sociedades e o imposto pessoal de rendimento - separação ou
integração? Coimbra, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1980.

13
CAPÍTULO II
AS ENTIDADES TRANSPARENTES

1 - AS SOCIEDADES TRANSPARENTES

1.1 – As sociedades civis

As sociedades civis não constituídas sob forma comercial não se regem pelo Código
das Sociedades Comerciais, mas sim pelo Código Civil, encontrando-se definidas, no seu
artigo 980º, como aquelas em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens
e serviços para o exercício em comum de certa atividade económica, que não seja de mera
fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa atividade, isto é, têm,
exclusivamente, por objeto a prática de atos não comerciais. Todavia, uma questão há muito
assombra estas sociedades: serão elas detentoras de personalidade jurídica?
Ora, o conceito de pessoa coletiva abrange as associações, as fundações e as
sociedades. Distinção essa efetuada pelo Código Civil de 1966 no artigo 157º ao referir que
as disposições do Capítulo II seriam aplicáveis às associações que não tenham por fim o
lucro económico dos associados, às fundações de interesse social, e ainda às sociedades,
quando a analogia das situações o justifique. No que às sociedades diz respeito, podemos
estar perante sociedades comerciais, sociedades civis constituídas sob a forma comercial e
sociedades civis não constituídas sob a forma comercial (só estas se encontram abrangidas
pela transparência). O CIRC considera, no artigo 2º, n.º 1, al. a), que as sociedades
comerciais, e as civis, sob forma comercial, são sujeitos passivos de IRC, nada referindo
quanto às meras sociedades civis. É a al. b) que coloca o foco na existência de personalidade
jurídica, consagrando como sujeitos passivos, as entidades dela desprovidas, com sede ou
direção efetiva em território português, cujos rendimentos não sejam tributáveis em IRS, ou
em IRC, diretamente na titularidade de pessoas singulares ou coletivas. Completa no n.º 2
do referido preceito, que aí se incluem as heranças jacentes, as pessoas coletivas em relação
às quais seja declarada a invalidade, as associações e sociedades civis sem personalidade
jurídica e as sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, anteriormente ao registo

14
definitivo. Contudo, as sociedades civis não constituídas sob forma comercial só no artigo
6.º, ao estarem submetidas ao regime de transparência, é que são, ipsis verbis, mencionadas.
As sociedades que se constituem sob forma comercial, ficam sujeitas às disposições
do Código das Sociedades Comerciais, como determina o artigo 1º do CSC: quando tenham
por objeto a prática de atos de comércio e adotem o tipo de sociedade em nome coletivo, de
sociedade por quotas, de sociedade anonima, de sociedade em comandita simples ou de
sociedade em comandita por ações31. Às sociedades civis constituídas sob forma comercial,
indubitavelmente, é-lhes reconhecida personalidade jurídica, em razão de lhes ser aplicável
o artigo 5º do CSC – as sociedades gozam de personalidade jurídica e existem como tais a
partir da data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem – por força do artigo
1º, n.º 4 – as sociedades que tenham exclusivamente por objeto a prática de atos não
comerciais podem adotar um dos tipos referidos no n.º 2, sendo-lhes, nesse caso, aplicável
a presente lei – da mesma legislação. Contudo, determinar se as meras sociedades civis são
ou não detentoras de personalidade jurídica desde há muito que tem dividido a doutrina,
continuando a ser, mesmo depois do Código Civil, uma vexata quaestio. Para Carlos Alberto
da Mota Pinto32, somente as sociedades comerciais, e, as civis, constituídas sob forma
comercial, serão pessoas jurídicas, defendendo que as sociedades civis não têm
personalidade. Afirma, ainda, que não existe no nosso ordenamento qualquer norma
semelhante ao artigo 158º do CC, ou ao artigo 5º do CSC, que lhes atribua personalidade
jurídica. A favor desta posição, podemos mobilizar os argumentos, a partir do regime
consagrado para a forma da cessão de quotas33 e para a forma exigida para a sua
constituição34, como também o regime fiscal da entrada de sócios para as sociedades civis.
Na verdade, a separação patrimonial entre a sociedade e os sócios não é um
argumento em favor da existência de personalidade, o que se verifica nos casos em esta não
é atribuída, como ocorre em relação ao património comum conjugal e às associações não
personificadas. O CIRE, na al. d) do artigo 2º, previu que as sociedades civis pudessem ser
sujeitos passivos da declaração de insolvência, todavia, o critério para tal passou a ser o da
autonomia patrimonial e não o da existência ou não de personalidade jurídica. Por vezes, é
até a própria lei que resolve, expressamente, determinados problemas para os quais poderia

31
Cfr. Art. 1º, n. º 2 do CSC.
32
MOTA PINTO, Carlos Alberto da, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2012,
p. 296.
33
Cfr. Art. 995º, n. º 2 do CSC.
34
Cfr. Art. 80º, n.º 2, al. e) do CN.

15
constituir questão prévia o problema da personalidade jurídica das sociedades civis.
Tomemos como exemplo o artigo 6º, al. c) do CPC, que atribui às sociedades civis
suscetibilidade de serem parte em juízo, mesmo que não tenham personalidade jurídica, ou
os artigos 1000º e 2033º do CC, sobre a compensação na relação das sociedades com
terceiros, e a atribuição de capacidade testamentária passiva, respetivamente. Também em
diversos diplomas avulsos, a lei tem vindo a regular algumas sociedades civis,
reconhecendo-lhes personalidade jurídica, tais como o artigo 94º do DL n.º 487/99, de 16 de
novembro, e o artigo 3º do DL n.º 229/2004 segundo, o qual as sociedades de advogados
adquirem personalidade, a partir do momento do seu registo. Face à necessidade que o
legislador teve em lhes atribuir, de forma expressa e clara, personalidade jurídica, poder-
nos-ia levar a supor que essa personalidade não lhes é inata.
Perante a ausência de consenso, facilmente se compreende a opção legislativas de
inserir as sociedades civis no âmbito da transparência. Certo é que aparecem aqui mais
relacionadas com as sociedades de pessoas do que com as sociedades de capital, algo que é
realçado por se excluir deste regime as sociedades civis constituídas sob forma comercial.
Ao contrário destas35, relativamente às quais o legislador fiscal não teve quaisquer dúvidas
sobre a existência de personalidade jurídica e a consequente sujeição a IRC, as sociedades
civis não constituídas sob forma comercial foram, aqui, aditadas com o intuito de se atingir
um apaziguamento fiscal, por via da prevenção de lacunas. A transparência fiscal,
propugnando uma tributação do rendimento obtido pela sociedade na esfera do respetivo
sócio, é o que melhor se coaduna com a natureza jurídica das sociedades nas quais não existe
diferenciação nítida entre o ente coletivo e o sócio, mas tão-somente uma situação de
comunhão de interesses relativamente aos rendimentos obtidos e ao exercício de uma
determinada atividade económica. Acaso assim não se considerasse, seriam as mesmas tidas
por situações de contitularidade.
Note-se que, nos termos do n.º 1 do artigo 72º do CIRC, a transformação de
sociedades, mesmo quando ocorra dissolução da anterior, não implica alteração do regime
fiscal que vinha sendo aplicado, nem determina, por si só, quaisquer consequências em
matéria de IRC. No entanto, o n.º 2 adita uma exceção, pois, se estivermos perante uma

35
As sociedades comerciais adquirem a qualidade de comerciantes a partir do momento em que adquirem
personalidade jurídica, não sendo necessário que pratiquem, primeiro, quaisquer atos de comércio
compreendidos no seu objeto. Cfr. Art. 5º do CSC e, a este respeito, a obra: COUTINHO DE ABREU, Jorge
Manuel, Curso de Direito Comercial - Das Sociedades, Vol. I, 5ª ed., Almedina, Coimbra, 2015, p. 118.

16
transformação de sociedade civil não constituída sob forma comercial numa sociedade
comercial - sob qualquer um dos tipos previstos no CSC -, ao lucro tributável
correspondente ao período decorrido desde o início do período de tributação em que se
verificou a transformação até à data desta é aplicável o regime previsto no n.º 1 do artigo
6.º do CIRC36. Desta forma, no exercício em que ocorre a transformação, deve determinar-
se, separadamente, o lucro correspondente ao período anterior e posterior a esta, podendo os
prejuízos anteriores à transformação, apurados nos termos do CIRC, serem deduzidos aos
lucros tributáveis da sociedade resultante da transformação, até ao fim do período, referido
no n.º 1 do artigo 52º, contado do exercício a que os mesmos se reportam. A data de aquisição
das partes sociais, resultantes da transformação, será a data de aquisição das partes sociais
que lhes deram origem.

1.2 – As sociedades de profissionais

Entre nós, a problemática das sociedades de profissionais não tem sido encarada no
seu conjunto, inexistindo um quadro legal ou princípios orientadores gerais, e intervindo-se
no seu domínio só de forma casuística e em relação a profissões específicas. A reforma do
CIRC, publicada no início do ano transato, não trouxe alterações ao funcionamento do
regime de transparência, mas, ao alargar aquilo que entende por sociedades de profissionais,
introduziu uma modificação significativa no seu âmbito de aplicação,

1.2.1 – As sociedades de pessoas e as sociedades de capitais

Reclama-se, primeiramente, uma sucinta reflexão sobre as profissões liberais, já que


são elas que estão, essencialmente, na base deste tipo societário. As profissões liberais
correspondem, fundamentalmente, a atividades de índole intelectual, não dotadas de
natureza comercial ou industrial, exercidas com autonomia, e suscetíveis de serem sujeitas
a uma disciplina e controlo próprios37. A necessidade de existência de autonomia exclui o

36
Redação da Declaração de Retificação n.º 18/2014 de 13 de março.
37
A natureza primordialmente intelectual conduz à exclusão das atividades de carácter manual ou desportivo
e das atividades artísticas. As primeiras, porque a componente intelectual se situa num plano abaixo da

17
trabalho subordinado – incluído a função pública –, encontrando-se condicionadas à forma
livre e independente como são exercidas. Por serem atividades nas quais releva a natureza
intelectual, é compreensível que o respetivo exercício seja sujeito a uma série de
condicionalismos académicos, profissionais e até deontológicos. É isto que justifica o facto
de muitas das profissões liberais estarem abrangidas por regulamentação própria, cujo
intuito é dignificar a profissão, e salvaguardar as legítimas expectativas dos cidadãos que a
elas recorrem38.
O associativismo profissional, como movimento complexo que surgiu após a
segunda guerra mundial, foi impulsionado pelo rápido desenvolvimento não só da indústria,
como também das trocas internacionais, conduzindo a uma maior abertura e mobilidade
social. O tradicional profissional, outrora organizado individual e artesanalmente, estava
incapaz de responder às necessidades que se apresentavam e as estruturas profissionais
fechadas e inflexíveis não se encontravam à altura de darem resposta às pretensões da
sociedade nem de se adaptarem às modificações e atualizações da era moderna. Reclamava-
se então, não só uma nova mentalidade, mas também uma diferente e mais dinâmica
organização profissional. A eliminação do profissional individual nunca fora um objetivo,
mas o movimento associativo não se alicerçava em bases frágeis, nem se enfraqueceria
diante dos obstáculos tradicionais, legais ou sociopolíticos que se impunham. Quando
falamos em obstáculo tradicional referimo-nos à incindibilidade entre a natureza da atividade
intelectual e o exercício individual da profissão, vincada pelo intuitos personae, pela
recíproca confiança com o cliente e pelo espírito não lucrativo com que deve ser encarada.
Uma das características que definem um profissional liberal é a independência e a liberdade
com que exerce a sua profissão, estando somente sujeito as lex artis do seu ofício. Não é
uma atividade mecanizada, o seu exercício impõe a eleição entre diversas alternativas, o qual
deverá ser efetuado de forma livre39, que justifica, também, a admissibilidade de

componente física e, as últimas, porque são revestidas, principalmente, de natureza intuitiva, imaginativa e
inventiva – e não tanto pela componente racional ou reflexiva, características ímpares das atividades
intelectuais. Para mais desenvolvimentos, COUTO GONÇALVES, Luís, «Sociedades Profissionais», Scientia
Ivridica, n.º 39, janeiro-dezembro de 1991, p. 158.
38
Por exemplo, o Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela L n.º 145/2015, de 9 de setembro, e a L
n.º 139/2015 de 7 de setembro que transformou a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas em Ordem dos
Contabilistas Certificados, alterando o respetivo Estatuto.
39
Esta independência achava-se comprometida caso o profissional tomasse as suas decisões em grupo, vendo-
se obrigado a levar a cabo atos com os quais não concorda. Defendia-se que, ao ser a atividade exercida por
um conjunto de profissionais, estaria a tornar-se tais atividades fungíveis, conduzindo a uma rutura da mesma,
provocando, consequentemente, a perda de confiança do cliente. V. SUÁREZ, Cármen Herrero «El ejercicio

18
responsabilidade pessoal do profissional pelas dívidas sociais40. O segundo obstáculo surgiu
devido às disposições de índole restritiva de algumas legislações sobre a possibilidade de
constituição de sociedades profissionais e, finalmente, o último aponta para o perigo de uma
legitimação de monopólios ou oligopólios profissionais41. Contudo, tais dificuldades são
abafadas pelas vantagens que advêm do exercício associado. A melhor e maior
especialização profissional conduz a uma racionalização de trabalho o que, ao tornar mais
fácil o enriquecimento técnico e científico de cada profissional, satisfaz com mais eficiência
as necessidades daqueles que dos seus serviços se servem. O acréscimo das receitas
resultantes da melhoria dos serviços prestados e da maior facilidade de aquisição de meios
necessários para levar a cabo a profissão, reflete-se numa maior rentabilidade profissional.
Também não é defensível a existência de uma relação de confiança com o ente societário –
intuitos societatis - pois, em qualquer caso, a atividade será sempre prestada por um
profissional concreto – que até pode ser escolhido, se assim se estabelecer no contrato, pelo
próprio cliente – conservando-se, deste modo, a estreita relação pessoal entre eles. O
profissional que exerce a sua atividade, no âmbito societário, seja como contratado, seja
como sócio, mantém a sua independência e discricionariedade técnica na realização do
serviço42, visto a sua dependência não estar no modo como exerce a profissão, mas sim no
que faz.
Surgem, desta forma, as denominadas sociedades de pessoas, por contraposição às
sociedades de capitais e, apesar de no nosso ordenamento-jurídico não fazerem parte dos
tipos legais de sociedades, a doutrina distingue-as. Naquelas, a transmissão das participações
sociais é dificultada, a firma deverá conter o nome dos sócios, e estes estarão obrigados ao
dever de não concorrência em relação à própria sociedade, exceto acordo diverso. Como é
possível constatar, tais características são semelhantes ao regime das sociedades comerciais
em nome coletivo. Por inspiração da doutrina consolidada em França e em Itália, Couto
Gonçalves define-as, em sentido estrito e próprio, como aquelas cujo objeto exclusivo é a
prestação de uma determinada atividade profissional liberal, exercida em comum por todos
os sócios, devidamente habilitados a exercê-la, com vista à obtenção e repartição de lucros

colectivo de la actividad profesional: la ley española de sociedades profesionales de 2007», Direito das
Sociedades em Revista, A. 2, Vol. 3, (2010), p. 182.
40
Cfr. Art. 213º, n.º 10, al. a) do EOA admite a existência de sociedades de responsabilidade ilimitada.
41
V. COUTO GONÇALVES, Luís, «Sociedades …», ob. cit., pp. 160-161.
42
A independência é, não raras vezes, garantida mediante as imposições estatuídas nas regulamentações
regedoras do exercício da profissão. Cfr. artigos 54º, 73º, 81º, 89º, 99º do EOA.

19
resultantes dessa atividade. Esta deveria estar afeta ao exercício em comum de uma
específica profissão e não ao exercício de uma atividade plural da qual a atividade
profissional consubstanciaria um mero elemento, não devendo, por isso, revestir natureza
comercial ou industrial, no qual o exercício seja passível de controlo. Deste modo, podemos
proceder à distinção de sociedades profissionais próprias, nas quais os sócios teriam igual
formação profissional e as sociedades profissionais mistas, que detêm sócios profissionais
habilitados e não habilitados43. Por sua vez, nas sociedades de capitais, as contribuições dos
sócios ganham relevância, determinando-se que a não responsabilização dos sócios pelas
dívidas sociais, a fácil transmissão das participações sociais e o seu não envolvimento nas
decisões da sociedade sejam as características que melhor as definem. Estamos, aqui, perante
os principais traços das sociedades anónimas.
Entre nós, só no passado ano de 2015 é que foi aprovada a Lei n.º 53/2015, de 11 de
junho, que veio estabelecer o regime jurídico da constituição e funcionamento das
sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais,
reconhecendo-lhes expressamente a detenção de personalidade jurídica44. Esta lei aplica-se
às sociedades de profissionais e entidades equiparadas, estabelecidas em território nacional
e que tenham por objeto principal o exercício em comum - ou seja, prestem serviços
profissionais, através de uma pessoa coletiva - de atividades profissionais organizadas numa
única associação pública profissional45. O seu âmbito de aplicação abrange, também, as
sociedades de revisores oficiais de contas e demais sociedades de profissionais regidas pelo
Direito da União Europeia46. Podem ser constituídas sob forma de sociedades civis, ou
assumir qualquer outra forma jurídica societária admissível, segundo a lei comercial. Não
podem constituir-se enquanto sociedades anónimas europeias, mas as sociedades
unipessoais por quotas estarão abrangidas por esta legislação. Determina-se que o objeto

43
Podemos proceder também à distinção de sociedades de trabalho de tipo liberal (afastando-se as sociedades
de trabalho de tipo liberal comercial, industrial ou outro) e as sociedades de trabalho simples ou não
profissionais, nas quais a profissão liberal é exercida sem concurso a nenhum profissional habilitado. COUTO
GONÇALVES, Luís Manuel, Ob. Cit., p. 163-165.
44
Cfr. n.º 1, do art. 5º da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho que determina: as sociedades de profissionais gozam
de personalidade jurídica, sendo esta adquirida a partir da data do registo definitivo do contrato de sociedade
no registo nacional de pessoas coletivas ou no registo comercial, consoante o que ao caso seja aplicável. V.
TERRÍVEl, Rita, «O levantamento da personalidade coletiva nos grupos de sociedades», RDS, n. º 4, ano IV
de 2012, pp. 935-1007.
45
Entendendo-se por exercício em comum de atividades profissionais organizadas, a prestação de serviços
profissionais através de pessoa coletiva constituída nos termos da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho.
46
No entanto, encontram-se excluídas as pessoas coletivas que, não sendo sociedades de profissionais ou
entidades equiparadas, prestem serviços profissionais através de profissionais seus sócios, administradores,
gerentes ou seus colaboradores. Cfr. Art. 2º da mesma legislação.

20
principal das sociedades de profissionais consiste no exercício em comum de atividades
profissionais organizadas numa única associação pública profissional e, relativamente aos
sócios, estipula o artigo 8º, que as sociedades de profissionais, com exceção das que se
constituam enquanto sociedades unipessoais por quotas, dispõem obrigatoriamente de pelo
menos dois sócios profissionais, podendo igualmente dispor, caso o contrato de sociedade
não o proíba, de sócios não profissionais. Podem ser sócios profissionais, nos termos do n.º
2 do artigo 8º, as pessoas singulares independentemente da modalidade de estabelecimento
em causa; as sociedades de profissionais cujo objeto principal consista no exercício em
comum de atividades profissionais organizadas na associação pública profissional a que se
encontra sujeita a sociedade participada; e, as organizações associativas de profissionais
equiparados a profissionais sujeitos à associação pública profissional a que a sociedade
participada se encontra sujeita, constituídas noutro Estado membro da União Europeia ou
do Espaço Económico Europeu para o exercício da atividade profissional em causa, cujo
capital e direitos de voto caiba maioritariamente aos profissionais em causa. É permitido a
tais entidades a possibilidade de serem sócias não profissionais de outras sociedades de
profissionais, ficando-lhes, nesse caso, vedado o exercício da atividade profissional objeto
principal daquela. Contudo, só podem ser sócios profissionais de uma única sociedade de
profissionais, e apenas quando não participem noutra organização associativa de
profissionais, constituída noutro Estado membro, para o exercício da atividade profissional
em causa, enquanto profissionais equiparados aos que caracterizam a sociedade em que
participam47.
Cabe-nos referenciar, sem grandes desenvolvimentos por que não é esse o cerne do
nosso trabalho, que o ponto que tem gerado mais controvérsia será a intransmissibilidade
das participações que serão extintas, no caso de morte do respetivo titular. Suponhamos uma
sociedade de advogados, da qual era sócio um advogado que veio a falecer. Que direitos
terão os seus herdeiros (quiçá descendentes), que não sejam profissionais dessa atividade,
relativamente àquela participação societária? Ora, entende-se por capital profissional a parte
do capital social representado pelas participações sociais dos sócios profissionais. As
entradas em indústria não são computadas na formação do capital social e presumem-se
iguais, salvo estipulação em contrário do contrato de sociedade48. As participações de capital

47
Cfr. Art. 4º e 8º, n.º 4 e n.º 9 dessa Lei.
48
Cfr. Art. 3º, al. a), 11º, n.º 2 e 34º da Lei nº 53/2015, de 11 de junho.

21
profissional extinguir-se-ão por morte ou extinção do titular. Neste caso, deve a sociedade,
no prazo máximo de 30 dias, adquirir, amortizar ou fazer adquirir a participação em causa
por sócio profissional ou por não sócio que cumpra os requisitos correspondentemente
aplicáveis. Porém, por via de requerimento de herdeiro que cumpra o disposto no n.º 2 do
artigo 8.º – ou seja, que esteja intimamente relacionado com a atividade em questão – pode
a sociedade consentir que lhe sejam transmitidas as participações de capital profissional. No
caso deste não cumprir os pressupostos do artigo 8º, a contrario, não lhe será possível herdar
o capital profissional? É uma questão para a qual ainda não existe resposta, mas que, dora
em diante, dará aso a vários litígios (em nosso entendimento), cumprindo aos tribunais e à
doutrina a aptidão para solucionarem os problemas daqui emergentes.

1.2.2 – As sociedades de profissionais para efeitos fiscais

Feita a reflexão sobre as sociedades profissionais, estamos em condições de adiantar


que são estas o cerne do regime de transparência fiscal, e aquelas que mais questões nos
colocam. O que o legislador entende por sociedade profissional para efeitos fiscais é um
tanto distinto da definição que a doutrina nos transmite. Na subalínea 1) da alínea a) do n.º
4 do artigo 6º do CIRC, é definida sociedade de profissionais como aquela que é constituída
para o exercício de uma das atividades profissionais especificamente previstas na lista de
atividades a que se refere o artigo 151.º do Código do IRS, na qual todos os sócios pessoas
singulares sejam profissionais dessa atividade49.
A razão da inclusão das sociedades de profissionais neste regime, como teremos
oportunidade de verificar detalhadamente no Capítulo referente à desconsideração da
personalidade jurídica, reside no facto de, na prática, ser comum verificar-se que os
profissionais dessas atividades só em termos formais a exercem em nome da sociedade. Na
realidade acabaram por exercer a atividade em nome próprio, sendo a sociedade encarada
somente numa filosofia de partilha de custos e de espaço, continuando a primar-se por uma
forte individualidade de cada um, ao invés de uma verdadeira personalização e
constitucionalização societária, como deveria acontecer. Na delimitação do conceito fiscal
de sociedades de profissionais, o legislador socorreu-se essencialmente de critérios de ordem

49
A Portaria nº 1011/2001, de 21 de agosto de 2001, terá aprovado a referida tabela de atividades do art. 151º
do CIRS no seu anexo I. Foi objeto de alteração por parte do artigo 32º, n.º 4 da Lei 109-B/2001, de 27 de
dezembro que aprovou a LEO para o ano de 2002.

22
funcional, o que coloca dificuldades aquando da sua caracterização jurídica. O legislador
desinteressa-se totalmente pela forma jurídica adotada pelas sociedades de profissionais,
sendo a sujeição à transparência determinada em razão da verificação dos requisitos
enunciados no n.º 4 do artigo 6º, e, caso os pressupostos da al. a) sejam preenchidos, nada
impede que as sociedades unipessoais também estejam incluídas no âmbito subjetivo da
transparência50.
Da leitura do preceito legal resulta que o objeto da sociedade tem de ser
obrigatoriamente o exercício de uma atividade profissional estatuída previamente no CIRS.
Analisando atentamente a lista de atividades previstas na Portaria nº 1011/2001, de 21 de
agosto de 200151, constatamos que as sociedades com tais objetos, nas quais os sócios são
os profissionais que exercem a atividade em nome da sociedade, não obedecem a uma lógica
comum de sociedade. Ou seja, é bastante percetível que o desenvolvimento do objeto social
se encontra excessivamente dependente da pessoa e da individualidade do sócio.
Sobre este problema Jorge Magalhães Correia52 distingue sociedades de
profissionais e sociedades profissionais. As primeiras seriam aquelas cujos profissionais são
os sócios. Será, a título de exemplo, o caso das típicas sociedades de advogados, de técnicos
oficiais de contas ou de arquitetos e, quando o regime de transparência foi consagrado, era a
estas que se pretendia referir. Por sua vez, as sociedades profissionais poderiam ser definidas
como aquelas em que os sócios se encontrariam vinculados à sociedade por uma simples
relação de emprego. Quanto a estas, damos o exemplo da sociedade constituída tendo em
vista a representação comercial, na qual os sócios trabalham para a sociedade como agentes
comerciais, sendo somente meros intermediários desta.
Nos casos em que entre o objeto da sociedade e a atividade por si levada a cabo não
se identifiquem, cumpre-se saber se o que releva para efeitos fiscais é o objeto declarado no
pacto social ou o objeto efetivamente perseguido pela sociedade. Para isso, socorrer-nos-
emos do requisito do “primado” da substância sobre a forma (substance over form).

50
Cfr. art. 270º-A a 270º-G do CSC.
51
Estas profissões exigem uma habilitação superior e, normalmente, a inscrição numa Ordem ou Câmara. Em
geral, estão nesta lista compreendidas as denominadas profissões liberais, como atividades independentes de
caráter científico, literário, artístico, educativo ou pedagógico, bem como as atividades independentes de
médicos, advogados, engenheiros, arquitetos, dentistas ou contabilistas. Cit. VALENTE, Nuno. (21 de março
de 2014). Transparência Fiscal. Obtido em 1 de julho de 2016, de Vida Económica, disponível em:
http://www.occ.pt/fotos/editor2/vidaeconomica21m.pdf.
52
MAGALHÃES CORREIA, Jorge, «Transparência Fiscal das Sociedades de Profissionais», Fisco, n.º 7, pp.
3-7.

23
Afloramentos de tal princípio podem ser encontrados, por exemplo, nos artigos 10.º, 38.º e
39.º, bem como no artigo 11º, n.º 2, todos da LGT53 e no § 30 da EC. Corolário do princípio
da justiça54, tem como finalidade permitir a relevância das meras situações de facto,
independentemente do respetivo enquadramento na restante ordem jurídica55, isto é, as
operações de uma entidade devem ser contabilizadas atendendo à sua substância e à
realidade financeira e não apenas à sua forma legal, abrindo-se, desta forma, uma brecha no
princípio da unidade do sistema jurídico56. Uma sociedade, ainda que não se tenha
constituído para o exercício de uma atividade profissional poderá cair no regime de
transparência por, na prática, a exercer. A qualificação centra-se na dimensão dinâmica da
atividade societária, pois o legislador, quando delineou o conceito de sociedade de
profissionais, preocupou-se com a igualdade entre os profissionais que agiam em nome
próprio, mas que interpunham uma sociedade entre a atividade e o sujeito ativo da obrigação
tributária. Assim, as operações financeiras devem ser contabilizadas, atendendo à sua
substancia e não apenas à sua forma legal, pelo que o essencial é que a sociedade desenvolva,
efetivamente, essa atividade. Para efeitos fiscais não releva nem que não se tenha constituído
sob a forma jurídica prevista, nem que o seu funcionamento viole os princípios
deontológicos que a regulam, se a configuração real couber no conceito do artigo 6º, essa
sociedade será considerada uma sociedade de profissionais e estará abrangida pela
transparência fiscal.
Quanto à necessidade de que todos os sócios pessoas singulares sejam profissionais
dessa atividade57, várias questões aqui emergem na qualificação para efeitos fiscais de uma
sociedade com sociedade de profissionais.

53
Neste sentido o ac. do STA de 29 de fevereiro de 2012 (Proc. n.º 0441/11 e relator Dr. Casimiro Gonçalves).
54
Cfr. art. 55° da LGT e o ac. do TCA Norte de 4 de março de 2011 (Proc. n.º 00515/08.2BEPNF e relator Dr.
José Luís Paulo Escudeiro).
55
SALDANHA SANCHES, José, Manual de Direito Fiscal, 3ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 145.
56
São, na verdade, os atos substantivos ou negócios jurídicos a maior base de constituição do objeto dos tipos
de incidência real., refere MARTINS, António Carvalho, Simulação - Na Lei Geral Tributária e Pressuposto
do Tributo - em Contexto de Fraude, Evasão e Planeamento Fiscal, Coimbra, Coimbra Editora, 2006, cit., p.
19. O Direito Privado constitui uma infraestrutura da superstrutura de Direito fiscal. V. LEITE de CAMPOS,
Diogo, Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Lisboa, Vislis Editores, 1999, p. 29).
57
A possibilidade de uma profissão liberal ser exercida em comum tem sido alvo de algumas controvérsias
doutrinais. A noção de exercício em comum deverá ser uma noção flexível, aberta às especificidades resultantes
das diferenças estruturais e funcionais existentes entre os vários tipos de sociedades. No plano estrutural, não
será igual o exercício em comum numa sociedade por quotas, de estrutura fechada e com poucos sócios, ou
numa sociedade anónima, com elevado número de sócios minoritários dispersos e desligados da atividade
societária. Também não será o mesmo, no plano funcional, o exercício em comum de uma sociedade com
objeto estritamente comercial ou profissional. Não obstante, é possível verificar um denominador em comum
e que consiste no facto de cada sócio estar interessado num determinado resultado só atingível pela contribuição

24
Mobilizando a norma interpretativa estatuída no artigo 6º, n.º 4, al. a) subalínea 1),
constatamos que a lei fiscal admite que nem todos os sócios sejam pessoas singulares. A
expressão todos os sócios pessoas singulares parece fazer entender que, dentro da mesma
sociedade de profissionais, poderão haver sócios que não sejam pessoas singulares. Algo
que, de algum modo, coloca em questão o conceito que temos destas sociedades, nas quais
se procuram conciliar a vertente societária, com o carácter intelectual da atividade exercida,
relacionando-se a independência de quem a exerce com a natureza pessoal das relações entre
o profissional e o cliente que a ele recorre. Na versão original do CIRC, aquando da entrada
em vigor deste regime, as sociedades de profissionais apenas permitiam sócios pessoas
singulares, pois a al. a) do n.º 4 assim o consagrava: (...) em que todos os sócios sejam
profissionais dessa atividade. Com as alterações efetuadas, posteriormente, tentou-se
eliminar as questões que pudessem surgir dessa redação, acabando o legislador por remeter,
para legislação especial que, eventualmente, regule as sociedades profissionais de
determinada atividade, a responsabilidade de vedar, ou não, a entrada de pessoas coletivas
como sócios. É o que acontece nas sociedades de advogados, onde não é permitida a entrada
de sócios pessoas coletivas58. Por sua vez, Magalhães Correia defendia que deveriam ser
constituídas por sócios de indústria, não excluído, tal facto, a qualificação societária e que,
por isso, não poderiam configurar-se segundo os tipos sociais que vedassem a participação
de sócios de indústria, o que limitaria a forma societária à sociedade em nome coletivo e à
sociedade civil59.
Pensamos que o legislador pretende que não se permita a existência de sociedades
profissionais unicamente constituídas por pessoas coletivas, mas ambicionou que a sua
entrada fosse admissível, com o intuito de, por exemplo, fortificar o capital social. No
entanto, consideramos de alguma incongruência que da letra da lei possa resultar que uma
pessoa coletiva possa fazer parte de uma sociedade profissional exclusivamente por razões
de capital, mas que o mesmo não seja permitido a uma pessoa singular, à qual ser-lhe-ia
exigida a profissionalidade, em consonância com a atividade objeto da sociedade. Fazendo

de todos os demais, ainda que essa contribuição seja apenas indireta, respeitante à condução da atividade em
causa, ou, pelo menos, na supervisão ou controlo da mesma.
58
V. EOA que determina que as sociedades de advogados terão de ser obrigatoriamente sociedades civis e
apenas podem ter sócios advogados inscritos na respetiva Ordem, o que nos denota que estarão,
obrigatoriamente, sujeitas ao regime de transparência fiscal.
59
Neste sentido, v. COUTO GONÇALVES, Luís Manuel, ob. cit., p. 165. e MAGALHÃES CORREIA, Jorge,
ob. cit.

25
uma interpretação teleológica da norma, da sua história e das exigências dos novos tempos,
somos defensores de uma interpretação mais sensata. Devia entender-se que a maioria das
participações necessitaria de ser fruto do trabalho dos sócios pessoas singulares,
obrigatoriamente profissionais dessa atividade. Mas, admitir-se-ia uma participação de
capital de pessoa coletivas que nunca poderia conferir, todavia, por respeito à denominação
do tipo de sociedade, mais direitos que a totalidade de participações dos sócios pessoas
singulares.
Bastará ao sócio deter o título profissional? Não60. De facto, a exigência de título
profissional é justificada pela preocupação de descaracterização da sociedade e, ainda, pela
necessidade de garantia de que todos os profissionais reúnam as condições exigíveis para a
prática da profissão, sendo, portanto, necessário que o sócio a exerça, realmente61. Na
prática, é de elevada dificuldade comprovar tais situações, pelo que será suficiente a
obtenção de título profissional, recaindo, apesar disso, nas sociedades o ónus da prova
quanto ao efetivo exercício, por parte do sócio, da atividade objeto da sociedade. Ademais,
não resulta do espírito da lei que seja necessário que todos os sócios exerçam a mesma
profissão ou tenham as mesmas habilitações académicas. Basta que estejam habilitados a
realizar a atividade que constitui o objeto social, que terá de constar da tabela anexa ao CIRS,
e que participem na sociedade na qualidade de profissionais desta.

1.2.3 – A subalínea 2), da alínea a) do n.º 4 do artigo 6º do CIRC

A reforma do Código do IRC em 2014 acrescentou uma nova definição de sociedades


de profissionais, mais completa e que deixa de se reconduzir, obrigatoriamente, à referida
exigência de identidade da profissão dos sócios. Esta alteração colocou termo a algumas
questões suscitadas anteriormente, e incorporou certas sociedades de profissionais não
englobadas pelo preceito anterior.

60
Só aos profissionais dessa atividade teriam de ser detentores do mesmo grau de habilitações exigido para o
exercício da profissão em questão, seria dada a possibilidade de assumirem o estatuto de sócios. Em Espanha,
não significaria que devessem ter todos a mesma formação ou título profissional, mobilizando-se o exemplo
de uma sociedade de consulting da qual fazem parte uma vasta gama de profissionais e que, nem por isso, se
lhe negava a aplicabilidade deste regime. Vide. LINARES Angel Luis, «El Regimen de la Tranparencia
Fiscal», Revista Española de Financiación y Contabilidad, n.º 12, 1983, pp. 485-506.
61
Neste sentido veja-se COUTO GONÇALVES, Luís, «Sociedades …», ob. cit. p. 169.

26
Hoje, por imposição do artigo 6º, n.º 4, al. a) subalínea 2), será também considerada
como sociedade de profissionais a sociedade cujos rendimentos provenham, em mais de
75%, do exercício conjunto ou isolado de atividades profissionais especificamente previstas
na lista constante do artigo 151º do Código do IRS, desde que, cumulativamente, durante
mais de 183 dias do período de tributação, o número de sócios não seja superior a 5, nenhum
deles seja pessoa coletiva de direito público e, pelo menos, 75% do capital social seja detido
por profissionais que exercem as referidas atividades, total ou parcialmente, através da
sociedade.
A alteração foi justificada pelo facto do anterior conceito se prestar a
comportamentos de substituição, e com a necessidade de adaptação às orientações da Lei n.º
2/2013, de 10 de janeiro, que aprovou o regime jurídico da criação, organização e
funcionamento das associações públicas profissionais, pelo que qualquer interpretação a este
artigo deve ser articulada com o que esta dispõe. Com efeito, existem restrições que constam
no regime jurídico das associações públicas profissionais que não constam no CIRC e vice-
versa, sendo, os seus limites, também diferentes. É exigido pela Lei que um dos gerentes ou
administradores seja membro de associação pública profissional ou, se a inscrição for
facultativa, seja detentor dos requisitos de acesso à profissão. No âmbito da lei fiscal, esta
condicionante não existe62. O seu artigo 27º, n.º 1, ao prever que podem ser constituídas
sociedades de profissionais que tenham por objeto principal o exercício de profissões
organizadas numa única associação pública profissional, em conjunto ou em separado com
o exercício de outras profissões ou atividades, não impõe limitação ao número de sócios.
Esta definição não foi, no entanto, diretamente vazada na redação da subalínea 2) da alínea
a) do n.º 4 do artigo 6º. Ao manter-se a subalínea 1), o legislador continua a consentir a
existência de um número de sócios superior a cinco, impondo-se, neste caso, que a respetiva
sociedade se destine ao exercício unidisciplinar por todos os sócios e que a atividade
profissional esteja prevista na lista constante do artigo 151º CIRS.
A Lei nº 2/2013 estipula na alínea a) do n.º 2 do artigo 27º que a maioria do capital
social, com direito de voto, deverá pertencer aos profissionais em causa estabelecidos em
território nacional. Diferentemente, o CIRC exige que, no mínimo, 75% do capital social

62
Art. 27º, n.º 3 vem dispor que estas entidades podem ter gerentes, administradores ou sócios que não possuam
as habilitações profissionais necessárias ao exercício dessas profissões.

27
pertença aos profissionais que exerçam a respetiva atividade, total ou parcialmente, por meio
da sociedade.
Como tivemos oportunidade de constatar, anteriormente, o objeto da sociedade
deveria ser exclusivamente uma atividade profissional63. A lei exigia que a sociedade tivesse
uma atividade profissional, e apenas essa, e que todos os sócios, pessoas singulares, fossem
profissionais dessa atividade, sendo omissa, quanto ao facto do objeto da sociedade poder
conter outra atividade que não profissional. Determina a Lei nº 2/2013 que as sociedades de
profissionais devem ter por objeto principal o exercício de profissões organizadas numa
única associação pública profissional, em conjunto ou não com o exercício de outras
profissões ou atividades, desde que seja observado o regime de incompatibilidades e
impedimentos aplicável. Contudo, consagra o CIRC que os rendimentos provenientes do
exercício conjunto ou isolado de atividades profissionais especificamente previstas na lista,
correspondam a mais de 75% do total da sociedade. É flagrante que estamos perante
conceitos não coincidentes, havendo sociedades de profissionais que o são para efeitos de
sujeição à transparência fiscal, mas já não para efeitos civis, e sociedades de profissionais
que não o são para efeitos de aplicação da transparência, mas que obedecem aos requisitos
da Lei n.º 2/2013.
Parecia-nos que só poderia existir uma atividade no objeto social, e não múltiplas,
pois a lei utilizou sempre a forma singular da palavra atividade. A inclusão de um sócio que
não reunisse as condições seria bastante para que a sociedade ficasse abrangida pelo regime
geral de IRC. Ora, era desta brecha legislativa que as sociedades de profissionais se
recorriam para estarem sujeitas a um regime fiscal mais favorável. Aquelas que outrora não
configurariam como sociedades de profissionais, para efeitos de transparência fiscal,
porque, por exemplo, um dos sócios não era profissional da atividade, ou porque a sociedade
exercia mais do que uma atividade profissional, passaram a estar, agora, por ele, abrangidas.
Assim, se o intuito é afastar a aplicação do regime de transparência fiscal em sociedades
multidisciplinares, será necessário que esta tenha mais do que cinco sócios, ou que mais de
25% do capital social seja detido por não profissionais.

63
As sociedades de mediadores de seguros geraram grande polémica devido à não existência de consenso
quanto à abrangência ou não destas pelo regime de transparência fiscal. A discussão baseou-se no facto de, na
lista de atividades do C IRS, não constar especificamente a atividade de mediador ou de mediador de seguros.
Contudo, o art. 151º refere a atividade de comissionista, o que conduziu a AT a considerar, na sua essência,
um mediador de seguros como comissionista, enquadrando-as, assim, como sociedades de profissionais e,
consequentemente, na transparência.

28
Esta subalínea permite a existência de sociedades de profissionais que se dedicam ao
exercício unidisciplinar ou pluridisciplinar das atividades preceituadas na lista do artigo
151º do CIRC, suspendendo-se a exigência da identidade das profissões, as novas sociedades
de profissionais passam a poder integrar participações não maioritárias de outras profissões,
bem como de meros investidores, podendo mesmo integrar participações de outras
sociedades. Assim sendo, não só podem exercer mais do que uma atividade profissional,
como podem ter rendimentos provenientes de outras atividades, e os sócios não têm de ser
todos profissionais das atividades profissionais exercidas pela sociedade64. Por primazia ao
princípio da especialização dos períodos de tributação, o requisito relativo à exigência
mínima da proveniência dos rendimentos relativo a todo o período de tributação, somente
poderá ser verificado no final.
Antes da reforma do CIRC, o artigo 6º não exigia qualquer requisito temporal, quanto
à detenção de uma participação social para a fixação do conceito de sociedades de
profissionais, mas a expressão em qualquer período de tributação causou muitas incertezas.
Bastará que os pressupostos se verifiquem num dia do período de tributação ou devem
verificar-se em todos os dias desse período?
Gramaticalmente, qualquer é um pronome indefinido, que significa um entre muitos,
sem escolha, alguma coisa indeterminada, daí que fizesse mais sentido que o preceito se
refira a todos os dias de tributação, significando que, seja qual for o dia em que vá aferir da
existência dos pressupostos, eles devem estar presentes65. Inicialmente, foi interpretada no
sentido de que seria suficiente que num só dia do período o sócio (ou sócios) que não fosse
profissional de uma atividade da lista não detivesse mais de 25% para a sociedade ficar
automaticamente abrangida pelo regime de transparência. Presentemente, esta dúvida
encontra-se totalmente esclarecida pela AT, tendo o legislador procedido à substituição no

64
MARTINS, Maria da Graça, O regime da transparência fiscal no Anteprojeto da Reforma do IRC. Obtido
em 26 de maio de 2016, de Vida Económica, disponível em
http://www.srslegal.pt/xms/files/NOTICIAS_IMPRENSA/23-08-
2013_O_regime_da_transparencia_fiscal_no_Anteprojecto_de_Reforma_do_IRC_Vida_Económica.pdf
65
O legislador não introduziu nenhum regime transitório nesta matéria, também não estaria no seu espírito
outra intenção. Por outro lado, como podemos verificar, a AT sempre acolheu esta interpretação: exige-se, pois,
nesta parte do preceito, a existência de uma participação maioritária do capital social durante todos os dias
do exercício social, por um número de sócios igual ou inferior a 5, os quais deverão ser pessoas singulares ou
coletivas de direito privado. Basta, portanto, que a sociedade venha a deter num dia qualquer do exercício um
número superior de sócios ou que um deles venha a ser uma pessoa coletiva pública para se aplicar ao ano
inteiro o regime normal de tributação e já não o regime especial de transparência. V. DIREÇÃO GERAL
DAS CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS, Código do IRC - Comentado e Anotado, Direção Geral das
Contribuições e Impostos, Lisboa, 1990.

29
preceito normativo da expressão em qualquer período de tributação por durante mais de
183 dias do período de tributação66. O facto gerador do imposto, salvo os casos previsto no
artigo 72º do CIRC, considera-se verificado no último dia do período de tributação, tal como
consta no artigo 8º, nº 9 desse Código. É também esse o momento para aferir do
enquadramento das citadas sociedades submetidas à subalínea 1) da alínea a) do nº 4 do
artigo 6º do CIRC. É de referir que, caso os pressupostos do artigo 6º, n.º 4, al. a) sejam
preenchidos, nada impede que as sociedades unipessoais podem estar também incluídas no
âmbito subjetivo da transparência.
Por último, se o capital estiver dividido em ações ao portador simples (não
registadas), torna-se inviável a sua sujeição ao regime de transparência fiscal, uma vez que
a existência, nestes casos, de uma dispersão do capital, impossibilita a identificação dos
respetivos sócios e, logo, a imputação da matéria coletável apurada pela sociedade, tal como
é propugnado por este regime.
A tributação em sede de IRS encontra-se em níveis estratosféricos e a passagem para
o regime de transparência fiscal poderá implicar para muitos profissionais liberais um
adicional esforço fiscal. Ao constatarmos que este regime abrange a maioria – senão mesmo
a totalidade - das sociedades de profissionais, somos levados a crer que o legislador parece
lançar sobre este tipo societário uma suspeita que, comparativamente com as restantes
sociedades comerciais, não deixa de ser um pouco injusta. Na medida em que se aceita que
são constituídas somente com a finalidade de tornar menos gravosa a carga fiscal, estar-se-
á a negligenciar inúmeras vantagens que a organização societária pode trazer e que foi,
somente, por uma qualquer estratégia concorrencial que levou algumas profissões a
regulamentarem o seu exercício em sociedade67.

66
Em Espanha, o exercício deveria estar vinculado direta, ou indiretamente, com a atividade profissional
desenvolvida pela sociedade, bastando que tal se verificasse em qualquer dia do período impositivo, tal como
estatui o artigo 360.1.b) do IRPF. V. CUELLAR SERRANO, Maria, La Tributación de la Renta Obtenida por
las Sociedades Profissionales, Madrid, Editorial Colex, 1999, p. 67.
67
Para melhor nos esclarecermos, atentemos ao seguinte exemplo: uma sociedade veterinária, com 5 sócios,
todos veterinários, todos a exercer na sociedade, 100% dos rendimentos provêm da prestação de cuidados
médicos veterinários, fica claramente abrangida pelo regime, ainda que se admita a entrada de novo sócio
veterinário. Se passar a vender produtos e medicamentos para animais, passando isso a representar 40% do
total dos rendimentos, a sociedade será excluída da transparência. Já após a alteração societária que possibilitou
a venda de bens, e independentemente da repartição dos rendimentos pelas atividades, é admitido nesta
sociedade outro sócio não veterinário que passa a deter 30%. A sociedade fica novamente excluída deste
regime. Mas, ao invés de ser admitido novo sócio não veterinário, se um dos sócios se reformar, deixar de
exercer a sua atividade profissional através da sociedade e fosse detentor de uma participação superior a 25%,
a sociedade fica mais uma vez excluída do regime.

30
1.3 - As sociedades de simples administração de bens

O artigo 6º, n.º 1, al. c) estatui que também se encontram abrangidas pela
transparência as sociedades de simples administração de bens68, cuja maioria do capital
social pertença, direta ou indiretamente, durante mais de 183 dias do exercício social, a um
grupo familiar, ou cujo capital social pertença, em qualquer dia do exercício social, a um
número de sócios não superior a cinco e nenhum deles seja pessoa coletiva de direito
público. Considerando a al. c) do n.º 2, para estes efeitos, a sociedade que limita a sua
atividade à administração de bens ou valores mantidos como reserva ou para fruição ou à
compra de prédios para a habitação dos seus sócios, bem como aquela que conjuntamente
exerça outras atividades e cujos rendimentos relativos a esses bens, valores ou prédios
atinjam, na média dos últimos três anos, mais de 50 % da média, durante o mesmo período,
da totalidade dos seus rendimentos. A lei não exige que haja exclusividade do exercício
dessa atividade, basta que a sociedade tenha como atividade dominante a administração de
bens, sendo possível que tenha por objeto outras atividades para além das especificadas.
Deste modo, será considerada como sociedade de simples de administração de bens e estará
sujeita à transparência fiscal69 aquela que conjuntamente exerça outras atividades e cujos
proveitos relativos a esses bens, valores ou prédios atinjam, na média dos últimos três anos,
mais de 50% da média da média durante o mesmo período, da totalidade dos seus proveitos,
será considerada.
Sob o ponto de vista fiscal, nada obsta à constituição de uma sociedade destinada a
exercer a atividade de compra, venda e arrendamento de imóveis, com sede ou direção
efetiva em território português, mas para que esteja abrangida por este regime, é necessário
a verificação do critério temporal: a maioria do capital social pertença direta ou
indiretamente, por mais de 183 dias do exercício social, a um grupo familiar. Deverá
considerar-se grupo familiar aquele que é constituído por pessoas unidas por vínculo
conjugal ou de adoção e, bem assim, de parentesco ou afinidade na linha reta ou colateral

68
Não obstante o regime estabelecido na alínea c) do nº 1 do artigo 6 º do CIRC, os lucros das sociedades de
simples administração de bens, nas condições aí mencionadas, obtidos anteriormente à data da entrada em
vigor do mesmo Código, que venham a ser posteriormente colocados à disposição dos respetivos sócios, serão
considerados rendimentos de aplicação de capitais e sujeitos a tributação em IRS ou IRC, nos termos gerais.
69
Cfr. Art. 6º, n. º 4, al. b) do CIRC.

31
ate ao 4º grau inclusive70. O casamento, o parentesco, a afinidade e a adoção, definidas nos
artigos 1577º a 1586º do Código Civil, são, para estes efeitos, fontes de relações jurídicas
familiares, pelo que, a sociedade estará sob esse domínio quando o grupo familiar for
detentor da maioria do capital social, não se exigindo, contudo, que esteja sob seu controlo
a totalidade das participações sociais.
Não obstante, várias questões aqui se colocam.
Primeiramente, torna-se necessário saber se o legislador fala do princípio da maioria
do capital social, adotando um critério de percentagem de controlo ou um critério de
percentagens de participação. Será critério de percentagem de controlo se bastar ao grupo
familiar controlar as decisões da sociedade, independentemente de deter ou não a maioria do
capital social. Será critério de percentagem de participação caso se fale em maioria no
sentido de possuir a maioria de capital. Será esta a situação estatuída no nosso código, visto
a lei utilizar a expressão cuja maioria do capital lhe pertença. Neste sentido defende-se que
a maioria do capital social das sociedades de simples administração de bens deve ser
auferida justamente em função da regra da percentagem de participação no respetivo
capital social71. Então, não será suficiente que um grupo familiar controle a sociedade, ele
terá, efetivamente, de possuir mais de metade do capital social dessa sociedade. Além da
hipótese de um grupo familiar deter diretamente em seu nome uma participação superior a
50% capital social da sociedade, temos também a possibilidade dessa participação ser
indireta. Ou seja, se for obtida por meio da participação noutras sociedades que, por sua vez,
participam na sociedade de simples administração de bens. Mas o legislador não adotou
qualquer fórmula para a determinação ou cálculo das participações que formam a maioria
do capital social, sendo necessário a mobilização dos normativos comerciais. O artigo 486º
do CSC dispõe: considera-se que duas sociedades estão em relação de domínio quando uma
delas, dita dominante, pode exercer, diretamente ou por sociedades ou pessoas que
preencham os requisitos indicados no artigo 483.º, n.º 2, sobre a outra, dita dependente,
uma influência dominante. Presume-se que uma sociedade é dependente de uma outra se
esta, direta ou indiretamente: a) detém uma participação majoritária no capital; b) dispõe
de mais de metade dos votos; c) tem a possibilidade de designar mais de metade dos
membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização. Somos remetidos para o

70
Cfr. art. 6º, n. º 4, al. c) do CIRC.
V. CELESTE CARDONA, Maria, «Regime de Transparência Fiscal: Viacentro – Administração de Centros
71

Comerciais, S.A.», Fisco, n.º 17, fevereiro de 1990, pp. 47-48.

32
artigo 483º, n.º 2: à titularidade de quotas ou ações por uma sociedade equipara-se, para
efeito do montante referido no número anterior, a titularidade de quotas ou ações por uma
outra sociedade que dela seja dependente, direta ou indiretamente, ou com ela esteja em
relação de grupo, e de ações de que uma pessoa seja titular por conta de qualquer dessas
sociedades. Então, o grupo familiar dominará, indiretamente, metade do capital social da
sociedade de simples administração de bens se for possuidor de mais de metade do capital
social de outra sociedade. Sociedade esta que, por sua vez, deterá mais de 50% do capital
social da sociedade de administração de bens. Assim, e cumprindo as regras do Direito
comercial, considera-se que o grupo familiar é titular da maioria do capital social da
sociedade de simples administração de bens e, por via disso, encontra-se preenchido o
pressuposto da alínea c) do n.º 1 do artigo 6º CIRC.

2 – OS GRUPOS TRANSPARENTES

Aquando da entrada em vigor do CIRC, muitas dúvidas existiram quanto à


consideração das Sociedades Gestoras de Participações Sociais como sociedades
transparentes. O seu quadro legal, estabelecido pelo DL n.º 495/88, de 30 de dezembro e
retificado pela Declaração de Retificação n.º 49/89, de 28 de fevereiro, teve como intuito
proporcionar um quadro jurídico que permitisse reunir, numa sociedade, as suas
participações sociais, incentivando à criação de grupos económicos, de forma a tornarem as
empresas portuguesas capazes de enfrentar a forte concorrência externa, que se iria sentir
com a abolição das fronteiras, no interior do mercado europeu. Para isso, era necessário criar
um instrumento mais flexível e eficiente, que permitisse a gestão centralizada e especializada
de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades
económicas. As denominações sociedade de controlo72 e holding foram afastadas e a
designação que lhes foi atribuída (SGPS) reflete com fidelidade o objeto societário. Em
consequência da Lei n.º 98/88, de 17 de agosto, o regime fiscal, que o DL adotou para as
SGPS, teve em vista a concessão de benefícios, sem os quais tais sociedades teriam

72
Expressão utilizada no DL n.º 271/72, de 2 de agosto, implicando uma ideia de domínio que não se conciliava
com os requisitos gerais de domínio de uma sociedade por outra. Cfr. Art. 486º do CSC.

33
viabilidade duvidosa ou pouco interesse público, consagrando-se no seu preâmbulo que as
participações não são mera aplicação de capitais, assumindo antes uma presença e
intervenção ativas como sócias das sociedades participadas. Às SGPS é-lhes ainda
permitida a prestação de serviços técnicos de administração e gestão às suas participadas,
bem como a concessão de financiamentos (dentro de determinados condicionalismos),
apresentando, desde modo, vantagens fiscais fundamentais para o desenvolvimento de
operações necessárias à expansão dos grupos económicos.
Porque não são as SGPS consideradas sociedades de simples administração de bens?
Nas sociedades de simples administração de bens atende-se, para recortar o
respetivo âmbito de incidência, ao facto de, no aspeto para aqui relevante que é a participação
noutras sociedades, a manutenção dos respetivos bens ou valores como reserva ou fruição.
Como bem sabemos, não é este o objetivo das SGPS. Quer pelos requisitos a que devem
obedecer, quer pelas operações que lhes estão vedadas73, foi intenção do legislador que
assumissem características especiais, assentes na finalidade visada pela titularidade das
participações sociais - que não é a mera reserva ou fruição74 -, mas sim o exercício conjunto
das atividades económicas que formam o objeto social das sociedades participadas pelas
SGPS. Além disso, o regime fiscal das SGPS é composto pelos artigos 47º (correção
monetária das mais-valias e das menos-valias) e 51º (eliminação da dupla tributação
económica de lucros e reservas distribuídos), ambos do CIRC. O artigo 51º visa o combate
à tributação sucessiva em IRC dos lucos já tributados em sede desse imposto, quando o
destinatário os recebe diretamente de sociedades que detenham uma participação naquela
que o gerou. Este preceito não tem aplicabilidade, quando em questão estão entidades
transparentes, pois estas não são tributadas em IRC, não se verificando, também, a
existência de dupla tributação. Caso contrário, a matéria coletável - ou os lucros e prejuízos
- a imputar aos sócios veria já deduzidos dos valores correspondentes aos lucros distribuídos
por outras entidades em que tivesse participação a entidade abrangida pela transparência, de
modo dissemelhante ao que acontecia se estas não existissem e os respetivos sócios
participassem diretamente na sociedade em que a entidade transparente tem participação, o

73
Cfr. artigo 5º do DL n.º 271/72, de 2 de agosto.
74
Enquadram-se na figura geral das holdings, sendo sociedades constituídas com o objetivo de intervir na
gestão e controlar as participadas, exercendo os direitos sociais inerentes às respetivas participações, de modo
a receber os lucros (ou dividendos) a que tinham direito, bem como os rendimentos resultantes de eventuais
alienações dessas participações sociais. V. CORREIA VALE, Maria de Lourdes / FREITAS PEREIRA,
Manuel H. de, ob. cit., p. 42.

34
que não se coaduna com os objetivos da transparência. A eliminação da dupla tributação
económica dos lucros, que lhes são distribuídos pelas sociedades participadas, é
independentemente do montante das participações e do prazo em que estas tenham
permanecido na sua titularidade. Deste jeito, não encontraríamos qualquer razão justificativa
para a aplicação desta medida a todas as SGPS, se algumas delas preenchessem os requisitos
da transparência fiscal, e aí fossem incluídas75.
Em suma, mesmo que as SGPS sejam controladas por um grupo familiar ou por um
número reduzido de sócios, hoje é pacífico que não estão sujeitas à transparência fiscal, por
um lado, não se enquadram na definição que é dada no n.º 3 do art. 6º, por outro, ao não se
aplicar o art. 51º às entidades transparentes, alicerça mais ainda a sua não sujeição à
transparência fiscal.

2.1 – Os agrupamentos complementares de empresas

As empresas representam uma parcela muito importante do nosso sistema produtivo


e desempenham um papel de relevo no desenvolvimento da economia, o que impôs a pronta
regulamentação da lei dentro do espírito de uma rápida aceleração da economia nacional. A
maior competitividade nos mercados e a dinâmica empresarial conduziram ao nascimento
de novas figuras jurídicas que possuíssem personalidade jurídica, mas que permitissem uma
maior capacidade de resposta e representação que a sociedade não tinha, tais como os
agrupamentos complementares de empresa que são um instrumento de política económica,
bastante divulgado noutros países e, entre nós, contava já com várias tentativas de realização,
contudo, careciam de devido suporte jurídico. Corria o ano de 1973 quando foram
instituídos, no nosso ordenamento jurídico, pela Lei nº 4/73, de 4 de junho e
complementados pelo DL n.º 430/73, de 25 de agosto. Estes diplomas refletem o já
consagrado pela Ordenança n.º 67-821 em 1967, no ordenamento jurídico francês, quanto

75
Solução que resultava já do anterior artigo 45º, n.º 3 do CIRC, mas que ficou mais sólida aquando da entrada
em vigor do DL n.º 495/88 que estabeleceu, de forma integrada, o regime jurídico, incluindo o fiscal, das
SGPS's. Cfr. art. 7º do DL (ora revogado pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro) que consagrava o
seguinte: às SGPS é aplicável o disposto no n.º 1 do artigo 45º do CIRC, sem dependência dos requisitos aí
exigidos quanto à percentagem de participação e ao prazo em que esta tenha permanecido na sua titularidade
(n.º 1). E às mais-valias e menos-valias obtidas pelas SGPS, mediante a venda ou troca das quotas ou ações
de que sejam titulares, é aplicável o disposto no artigo 44º do CIRC, sempre que o respetivo valor de realização
seja reinvestido, total ou parcialmente, na aquisição de outras quotas, ações ou títulos emitidos pelo Estado,
no prazo aí fixado (n.º 2).

35
aos denominado Groupement d’Intérêt Économique. O legislador entendeu como tais as
pessoas singulares ou coletivas e as sociedades que se agrupam, sem prejuízo da sua
personalidade jurídica, com o objetivo de melhorarem as condições de exercício ou os
resultados das atividades económicas dos seus membros.
A maioria das disposições do DL n.° 430/73 tem natureza supletiva, pretendendo, as
que têm caráter imperativo, a justificação dos amplos benefícios fiscais que são concedidos
a estas entidades, a fim de não se tornarem mecanismos mobilizados para fraudar o interesse
nacional e a justiça tributária. Estipula o n° 1, Base II, da Lei n° 4/73 e artigo 1º do DL n.°
430/73 que o fim principal destas entidades não será a realização e a partilha de lucros, que
só será permitido a título meramente acessório, e quando tal for expressamente autorizada
pelo respetivo contrato constitutivo. A sua atividade não tem em si própria um escopo
lucrativo, destina-se, antes, a alcançar uma melhoria das condições de exercício ou de
resultado das atividades agrupadas e são-lhes aplicados, subsidiariamente, os artigos do
CSC, especialmente os artigos 175º a 196º referentes às sociedades em nome coletivo.
O DL permite que no contrato constitutivo apenas se estipulem as participações e as
contribuições das empresas agrupadas, não existindo capital social do agrupamento, pois não
existe qualquer obrigatoriedade legal de capital próprio. A atividade pode ser exercida em
nome e por conta própria do ACE, contudo, o interesse dos seus membros deverá estar
sempre subjacente ao desenvolvimento daquela. Tal encontra justificação no objetivo
principal do ACE que é a melhoria das condições de exercício da atividade económica dos
membros, em especial o aproveitamento de sinergias entre empresas. Assim, não faria
qualquer sentido que a atividade deste nunca poderá ser autónoma da dos seus membros.
A liberdade de atuação das referidas entidades é limitada, no tocante à aquisição de
imóveis, pois esta só lhes será permitida, quando o destino do mesmo for à instalação da
sede, delegação ou serviço próprio do ACE. Também lhes está vedada a participação ou o
exercício de cargos sociais em sociedades civis, sociedades comerciais ou noutros ACE. A
regra é a da subsidiariedade dos membros quanto à responsabilidade pelas dívidas do
agrupamento, no entanto, o contrário poderá ser estipulado no contrato celebrado entre o
agrupamento e o respetivo credor, passando essa responsabilidade a ser solidária. Na prática,
os ACE têm sido constituídos, maioritariamente, pelas empresas do setor da construção civil
e obras públicas para levarem a cabo empreitadas em cooperação, uma vez que a sua
concretização seria difícil ou impossível, quando feita individualmente, por cada membro

36
do ACE, devido à falta de meios financeiros, humanos e técnicos. As empresas agrupadas
em momento algum perdem a sua personalidade jurídica, mas o ACE só com a inscrição do
seu ato constitutivo no registo comercial é que a adquire, passando, a partir desse momento,
a ser sujeito de direitos e obrigações. As sociedades ou associações já constituídas com
objetivos análogos aos dos ACE podem transformar-se nestes, desde que respeitem as
disposições sem prejuízo da sua personalidade.
Tanto económica como juridicamente, o ACE é dissemelhante do grupo societário.
Sem embargo de partilharem entre si determinados objetivos - tal como a busca de obtenção
de economias em escala -, o ACE pretende fundamentalmente ser um instrumento de
cooperação entre várias empresas providas de autonomia entre si. O mesmo não se verifica
num grupo societário que se caracteriza por ser um instrumento de subordinação de várias
entidades economicamente dependentes. O ACE abrange setores limitados de atividade
económica, representa uma forma de cooperação interempresarial, e cada membro atua de
forma livre e independente dos restantes, quanto à tomada de decisões e ações económicas.
O grupo societário, por sua vez, tem subjacente o nascimento de uma empresa
plurissocietária e, face à consequente submissão a uma direção económica unitária e comum
e que se expande pelos setores de atividade dos respetivos membros, a autonomia tão
característica dos ACE não se vislumbra.
Juridicamente também são distintos.
O nascimento de um ACE76 origina um grupo interempresarial com personalidade
jurídica própria que não se confunde com a das entidades que o constituem, diferentemente
do grupo que é destituído de qualquer individualidade jurídica. Realcemos as diferenças
entre eles, ao nível do nascimento, da organização interna e externa, da responsabilidade.
Quanto à organização, o ACE possui uma estrutura organizativa formal, semelhante ao de
uma sociedade comercial, e os seus membros podem ser sociedades, outras pessoas coletivas
e até pessoas singulares. Pode também ser titular de direitos e obrigações próprias no tráfico
jurídico. No grupo, os membros que o compõem terão de ser necessariamente sociedades e
a sua estrutura é, normalmente, meramente informal, assente em laços financeiros,
contratuais ou pessoais e não tem qualquer autonomia patrimonial ativa ou passiva. Ao nível
da responsabilidade, o ACE pode ser demandado pelos credores pelas suas dívidas própria,

76
V. Diretrizes Contabilísticas n. º 24 e 28, de 16.12.1998 e de 06.06.2001, sobre o objetivo e conteúdo dos
ACE, e sobre as diferenças de base contabilística e fiscal entre estes e os AEIE, respetivamente.

37
respondendo os seus membros subsidiariamente perante este e solidariamente, entre si,
diferentemente do grupo que, ao não possuir passivo próprio, os seus membros não
respondem, em princípio, pelas dívidas dos restantes.

2.2 – Os agrupamentos europeus de interesse económico

O desenvolvimento harmonioso das atividades económicas, bem como a sua


expansão contínua e equilibrada encontram-se intrinsecamente conexionados com o bom
funcionamento do mercado comum, que se deseja capaz de oferecer condições análogas às
de um mercado nacional. Não só a realização deste mercado único, como também o reforço
da sua unidade, tornam indispensável a criação, no interesse das pessoas singulares,
sociedades e outras entidades jurídicas, de um quadro jurídico que facilite a adaptação das
atividades às condições económicas da União Europeia, permitindo-lhes cooperar sem
condicionantes fronteiriças.
Assim, perante a necessidade de organizar a cooperação entre entidades que, em
diferentes países membros, desenvolvem atividades relacionadas com a agricultura, a
indústria, o comércio ou os serviços 77, reclamava-se a criação de um instrumento jurídico,
dotado de capacidade e personalidade jurídicas e adequado a nível comunitário sob a forma
de um Agrupamento Europeu de Interesse Económico. Inspirados também nos GIE, a sua
criação veio a acontecer por via do Regulamento (CEE) n.º 2137/85 do Conselho, de 25 de
julho de 1985. No nosso ordenamento jurídico, só após 5 anos é que foram colocados em
execução pela entrada em vigor do DL nº 148/90, de 9 de maio. Supletivamente deve ainda
atender-se ao regime jurídico regulador dos ACE, atrás referido, cujos objetivos são
coincidentes, diferindo apenas o espaço geográfico económico e fiscal, daí que se possa dizer
que o AEIE se assemelha a um ACE europeu78.
Os AEIE podem ser distinguidos das sociedades pelo objetivo que prosseguem.
Pretendem somente facilitar ou desenvolver a atividade económica dos seus membros,

77
PITA, M. A., «O Agrupamento Europeu de Interesse Económico (Um meio de integração das empresas
portuguesas na CEE)», Fisco, n.º 15, 1989, pp. 6-8.
78
Conforme GUIMARÃES, J. F. (abril de 2008). Transparência Fiscal. Obtido em 1 de julho de 2016, de
Revista Eletrónica INFOCONTAB, n.º 30, de abril de 2008, disponível em:
http://www.infocontab.com.pt/download/revinfocontab/2008/30/230.pdf.

38
proporcionando-lhes a melhoria dos seus próprios resultados79, não sendo o objetivo realizar
lucros para si próprio. Caso o AEIE origine lucros, determina o artigo 40º do Regulamento
que serão considerados como lucros dos membros e repartidos entre eles na proporção
prevista no contrato (…) ou, se este for omisso, em partes iguais, pelo que os lucros ou
perdas resultantes da atividade do agrupamento só serão tributáveis a nível dos seus
membros80. Ora, é o próprio Regulamento que indicia a aplicação do regime de tributação
dos AEIE, segundo as regras da transparência fiscal. Refletindo o imperativo comunitário,
bem se compreende que o legislador fiscal tenha subordinado tais entidades a este regime.
Para efeito de tributação em IRC, as regras de apuramento dos resultados são bastante
semelhantes às que regem os ACE, estando o AEIE apenas limitado pelo facto de cada
membro ser tributado, de acordo com o regime fiscal do país onde está localizada a sua sede.
Consequentemente, face ao seu carácter auxiliar, a atividade do agrupamento deve ser
complementar à atividade económica dos seus membros, não se substituindo a esta,
semelhantemente ao que acontece com os ACE. Nesta medida, será vedado ao agrupamento
o exercício por si próprio, em relação a terceiros, de uma profissão liberal, devendo a noção
de atividade económica ser interpretada no sentido mais lato.
Um agrupamento, para que possa ser considerado AEIE, deve ser composto por, pelo
menos, duas sociedades ou outras entidades jurídicas ou por duas pessoas singulares que
tenham a sua administração central ou exerçam a sua atividade principal em Estados-
membros diferentes. O regulamento exige que o registo dos AEIE seja efetuado no Estado
onde a sua sede se situa, remetendo, no entanto, para a competência dos Estados-membros a
decisão de considerarem os AEIE inscritos no seu território como entes dotados ou não de
personalidade jurídica81. Entre nós, o AEIE com sede em Portugal, só adquire personalidade
jurídica com a inscrição definitiva da sua constituição no registo comercial e esclarece que
o contrato de AEIE deve constar de documento escrito82. Quando à responsabilidade dos
membros do AEIE, esta é ilimitada e solidariamente pelas dívidas do agrupamento,
independentemente da sua natureza e igualmente como acontece com os ACE83.

79
Cfr. Art. 3º, n.º 1 do Regulamento (CEE) nº 2137/85.
80
Cfr. Art. 21º, n.º 1 e art. 40º do Regulamento. No mesmo sentido, Conforme MARTINS, J. M., «O
Agrupamento Europeu de Interesse Económico», Fisco, n.º 19, abril de 1990, pp. 20-26.
81
Cfr. Artigos 4º, nºs 1 e 2, 6º e 1º, nº 3, do Regulamento, respetivamente.
82
Cfr. Art. 1º do DL nº 148/90
83
Cfr. Art. 24º, n.º 1 do Regulamento.

39
2.3 – A sua inserção no artigo 6º do CIRC

Não podemos estudar este regime sem defendermos que talvez houvesse maior
coerência sistemática, se a inserção dos agrupamentos não ocorresse no artigo 6º, mas junto
ao artigo 69º, normativo responsável pelo tratamento fiscal dos grupos societários.
Vejamos.
A nível fiscal, a independência e autonomia dos membros que compõem os
agrupamentos e a subordinação das sociedades que integram os grupos, mantêm-se. Ao
agrupamento, ao ser imposta a sujeição à transparência e, em virtude disso, ser
desconsiderado, e os lucros e os prejuízos serem imputados àqueles que dele fazem parte,
denota-nos (e bem) que a singularidade de cada membro é preservada, mesmo no plano
jurídico-tributário. Contrariamente, o legislador encara os grupos como uma unidade
económica84, elevando-a a objeto autónomo de imputação de normas jurídicas tributárias,
subtraindo a individualidade dos entes societários e não havendo, por isso, quanto a estes,
transparência fiscal, mas sim um problema de incidência.
O regime especial de tributação dos grupos de sociedades resultou da Lei n.º 30-
G/200085, que procedeu a uma reforma desta matéria, eliminando o anterior regime de
tributação pelo lucro consolidado, e encontram-se, hoje, previstos nos artigo 69º a 71º CIRC.
Determina o artigo 70º que, relativamente a cada um dos períodos de tributação abrangidos
pela aplicação do regime especial, o lucro tributável do grupo é calculado pela sociedade
dominante, através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados
nas declarações periódicas individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo,
corrigido, sendo caso disso, do efeito da aplicação da opção prevista no n.º 5 do artigo 67.º.
Nas declarações periódicas individuais não há um verdadeiro apuramento da coleta, mas não
é isso que se passa relativamente ao lucro tributável que é apurado, para cada sociedade, na
sua declaração individual. Assim, para as sociedades que integram o perímetro do grupo
abrangido pelo RETGS, a derrama deverá ser calculada e indicada individualmente, por cada

84
A família é, para efeitos fiscais, considerada também uma unidade fiscal. Porém, esta questão em nada se
confunde com as discussões relativas ao princípio da capacidade contributiva do agregado, pois, apesar desta
residir no titular dos rendimentos, tributação deste, para não se consubstanciar numa discriminação dos
indivíduos que da família fazem parte, deve ter em consideração os encargos desta. Algo que é passível de
obter por via de uma tributação conjunta. CASALTA NABAIS, José, O Dever …, ob. cit., p. 487.
85
V. também o DL n.º 414/87, de 31 de dezembro.

40
uma das sociedades na sua declaração86. Procede-se ao somatório das derramas87,
competindo o respetivo pagamento à sociedade dominante88. Isto é, a derrama deverá incidir
sobre o lucro tributável do grupo e não sobre o lucro individual de cada uma das
sociedades89. Fiscalmente, reconheceu-se que os grupos societários seriam uma realidade
jurídico-tributária autónoma, suplantando, a este nível, a sua organização jurídica-formal.
Não obstante, a individualidade jurídica dos respetivos elementos integrantes é o próprio
grupo como um todo - e não as sociedades individuais que o integram-, que passa a constituir
o ponto de referência fundamental no cômputo da matéria tributável e na determinação de
certos direitos e obrigações fiscais.
Diferentemente, quanto à tributação dos agrupamentos, verifica-se que é a
individualidade, de cada membro que o integra, que releva para efeitos fiscais. Este
reconhecimento do grupo, como unidade tributária sui generis, possui inúmeras vantagens,
tais como: a redução da carga fiscal global suportada pelo conjunto das sociedades agrupadas
originadas pela compensabilidade dos lucros e prejuízos fiscais entre as sociedades ou até a
eliminação dos lucros distribuídos no seio do grupo. O diferimento do pagamento de imposto
das mais-valias geradas pelas transações intragrupo e a dispensa da retenção na fonte,
relativamente a determinados fluxos intragrupos, assim como a eliminação da dupla
tributação económica e o aproveitamento de isenções fiscais, compõem o leque dos
privilégios que lhe são reconhecidos.
O artigo 69º, que podemos encarar como sendo um normativo geral, define o
conjunto de pressupostos materiais e formais relevantes para a sociedade beneficiar da
possibilidade de acesso a este regime unitário de tributação. Podemos salientar a necessidade
de todas as sociedades, que integram o perímetro do grupo consolidante, terem a sua sede
estatutária e efetiva em Portugal, a exigência de que a totalidade dos rendimentos das
sociedades agrupadas estar sujeito ao regime geral de tributação em IRC à taxa nominal mais
elevada e a imposição de que todas as sociedades agrupadas serem sociedades anónimas, por
quotas ou em comandita por ações90. A natureza jurídica da relação de coligação

86
Se houver necessidade, o Anexo A será preenchido, também de forma individual.
87
Cujo valor será indicado no campo 364 do Quadro 10 da correspondente declaração do grupo.
88
Como consta do Oficio-Circulado de 14.04.2008 e em consonância com o despacho de 13.03.2008, do
substituto legal do Diretor-geral.
89
V. ac. do STA de 04.12.2013 (Proc. n.º 01004/13),
no sentido que o artigo 14.º, n.º 8, da Lei das Finanças Locais, na redação que lhe foi dada pelo artº 57º da
LEO/2012 ( n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro), se consubstancia numa norma inovadora e não interpretativa.
90
Cfr. Art. 69º, n.º 3, al a), n.º 4, al. g) do CIRC.

41
intersocietária é caracterizada pela sociedade dominante deter, nas sociedades integrantes do
grupo, uma participação igual ou superior a 75% do capital destas, desde que lhe confira
mais de 50% do direito de voto. A ratio legis é a vontade em circunscrever o acesso a este
especial regime de tributação aos grupos de sociedades dotados de uma unidade financeira
e económica muito intensa. Todavia, acaba por circunscrever o que se considera por grupo
a algo que não é um setor vincado na realidade, condicionando a adoção a determinadas
formas jurídicas para que destas vantagens possam beneficiar, o que põe em causa o
princípio da neutralidade fiscal, orientador de todo o processamento legislativo.
Note-se que a relação de domínio, tão característica dos grupos de sociedades, não
se verifica perante o credor fiscal. Qualquer uma das sociedades que o compõem encontra-
se numa posição de solidariedade, quanto ao pagamento do imposto, apesar de este incumbir
à sociedade dominante91. Assim, sem prejuízo do direito de regresso pela parte do imposto
que a cada uma delas respeite, são responsáveis, de per si, pelo cumprimento da inteira
prestação, não lhe sendo lícito opor o benefício da divisão, nem se vendo liberada da
respetiva obrigação através do chamamento à demanda das restantes sociedades
codevedoras, máxime da sociedade dominante92.
Para além do regime especial de tributação, existia o mecanismo da eliminação da
dupla tributação económica, que a LOE/2012 suprimiu, ao fazer desaparecer o n.º 2 do art.
70º. Logo, o apuramento do lucro tributável é efetuado, a partir do resultado individual de
cada sociedade, não permitindo a eliminação dos resultados decorrentes das transações entre
as empresas que constituem o grupo. Assim, já não se parte do resultado líquido consolidado
nem, a dupla tributação económica é alvo de correção, o que põe em causa o préstimo deste
regime. Sobre a dedução de prejuízos, para além das regras gerais do preceito 47º do CIRC,
aplicam-se também as enunciadas no artigo 71º relativas ao regime especifico da dedução
de prejuízos.
Enfim, não obstante as diferenças de tratamento fiscal entre os agrupamentos e os
grupos, ambos têm em comum a finalidade primordial que é o combate à dupla tributação
económica. Este propósito é de tal forma fundamental para a transparência fiscal que o
próprio preâmbulo do CIRC o consagrou, expressamente, como um intento a atingir por
aplicação do referido regime. O combate à dupla tributação económica é, em ambos os

91
Cfr. Art. 1º do CIRC.
92
Cfr. Art. 512º, nº 1 e art. 518º, ambos do CC.

42
casos, o primeiro objetivo que o legislador se propôs a cumprir. Não achamos, ao contrário
do que se verifica para as restantes entidades transparentes que, tanto para os grupos, como
para os agrupamentos, fossem razões de neutralidade ou evasão fiscal que, essencialmente,
estivessem subjacentes à intenção legislativa. Além disso, a desconsideração da
personalidade que se verifica quanto aos agrupamentos é interessante: nestes, a tributação
que seria efetuada no seio do agrupamento, em IRC, passa a ocorrer na esfera jurídica dos
seus membros, pessoas coletivas, também eles tributados em IRC. O mesmo se passa
relativamente aos grupos, não obstante tal ocorrer em sentido oposto. Ou seja, nos grupos de
sociedades, a tributação em IRC não é efetuada nas sociedades que o constituem, mas antes
na sociedade dominante, também, em IRC. O objeto de tributação desloca-se das sociedades
dominadas para a sociedade dominante, enquanto que nos agrupamentos, passa do
agrupamento para os membros. Assim, carece de justificação que os preceitos reguladores
dos agrupamentos e dos grupos não se encontrem, pelo menos, inseridos no mesmo Capítulo.

43
CAPÍTULO III
AS FINALIDADES DA TRANSPARÊNCIA

1 - A NEUTRALIDADE FISCAL

A neutralidade fiscal é o principal objetivo de qualquer Estado Fiscal, mas não


poderíamos falar dela sem fazermos referência a duas liberdades que lhe permanecem
intrinsecamente associadas, e das quais os indivíduos são detentores: a liberdade de gestão
fiscal e a liberdade de configuração jurídica.
A liberdade de gestão fiscal, por ser imprescindível ao funcionamento da economia
de mercado, constitui uma liberdade estruturante do Estado Fiscal. Assume grande
importância em sede das liberdades económicas de trabalho e de profissão, mas
essencialmente, na liberdade de iniciativa económica e de empresa, na qual se expressa –
contempladas nos artigos 60º, 80º, al. c) e 86º da CRP –, pois os impostos constituem
amputações materiais do normal conteúdo destes direitos. Em sentido amplo, exige que aos
sujeitos e às empresas seja concedida uma vasta possibilidade de decisão que lhes permita
planificarem a sua vida económica sem que as necessidades financeiras estaduais sejam um
entrave a essa liberdade de decisão. Com especial evidência, no setor empresarial, a
liberdade de gestão fiscal, reflete-se no direito em escolher a via menos onerosa e mais
adequada à sua organização e funcionamento, com o objetivo de reduzir o montante de
imposto a pagar (tax planing). Contudo, esta liberdade careceria de qualquer efeito prático
se, aos indivíduos, não fosse também atribuída a liberdade da configuração jurídica – outro
pilar do Estado Fiscal – relativamente à forma e organização empresarial que se lhes mostre
mais adequada à prossecução dos seus interesses. A aliança (inata) existente entre estas
liberdades constitui uma importante manifestação da liberdade de disposição económica dos
indivíduos, cujo exercício anda, frequentemente, associado ao planeamento fiscal que essa
liberdade integra.
Quando vista pelo lado estadual, a liberdade de gestão fiscal concretiza-se no
princípio da neutralidade fiscal, cuja importância em sede de liberdade económica mereceu
consagração constitucional no artigo 81º. Este preceito, referente ao princípio da
concorrência, estatui na alínea f), que incumbe, prioritariamente, ao Estado, no âmbito

44
económica e social, assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir
a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização
monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do
interesse geral. No Estado recairá a obrigação de não provocar (nem obstar a que outros
provoquem) distorções na concorrência entre as empresas, cabendo-lhe, assegurar o eficaz
desempenho dos mercados, reprimindo não só os abusos de posição dominante, como
também, preventivamente, o impedimento nas operações de criação das formas de
organização monopolistas – e outras práticas – lesivas do interesse geral e que a possam por
em causa93. Constitui-se, assim, a principal componente de uma economia de mercado e a
base dos mecanismos de defesa da concorrência, que são um dos princípios essenciais da
ordem jurídica comunitária. Apesar de o fazer de forma implícita, esta alínea designa uma
garantia institucional de ordem económica, na medida em que se refere a todas as empresas,
nas quais se incluem as empresas públicas, torna-se num antídoto contra as organizações
monopolistas, enaltecendo, desta forma, o princípio fundamental da Constituição
económica: a subordinação do poder económico ao poder político.
Assim, a neutralidade fiscal implica que a forma jurídica dos entes sujeitos a
imposto94 jamais poderá condicionar a sua tributação95. A CRP consagra uma estrita
neutralidade do Direito fiscal, face à liberdade de configuração jurídica da atividade
empresarial e das suas organizações96: o n.º 1 do artigo 104º da CRP estatui que o imposto
sobre o rendimento pessoal deverá ser único, progressivo e não negativamente
discriminatório da família, mas o n.º 2, não exige que o imposto sobre os rendimentos
empresariais seja dotado de tais características, apenas a tributação das empresas incide
fundamentalmente sobre o seu rendimento real97. Para rendimentos idênticos deve verificar-
se uma tributação idêntica, ou seja, o rendimento de um indivíduo deve ser tributado,
uniformemente, em relação a rendimentos iguais auferidos por outros contribuintes,
independentemente da forma organizativa que cada um aparenta ter98.

93
V. CANOTILHO, J.J. Gomes / MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa - Anotada, Vol. I,
Coimbra, Coimbra Editora, 2014, p. 969 – 970.
94
V. Código do IRC - Comentado e Anotado, Direção Geral das Contribuições e Impostos, Lisboa, 1990, p. 95
e RIBEIRO, José, Lei Geral Tributária – Comentada e Anotada, Lisboa, Quid Juris, 2003.
95
WILLIAMS, David, Trends in International Taxation, IBFD, IFA, 1991.
96
CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., p. 174.
97
Tomemos em consideração que a contraposição ocorre entre o imposto sobre o rendimento pessoal e a
tributação das empresas, e não entre o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e o imposto sobre
o rendimento das pessoas coletivas.
98
TEIXEIRA, Gloria, Manual de Direito Fiscal, 3ª ed., Coimbra, Almedina, 2015, pp. 51-52

45
A verdade é que a expansão e a intensificação da tributação nas nações mais
desenvolvidas, decorrentes do intervencionismo que pauta o Estado Social, aliadas à
existência de outros países que, com vista à atração de investimento estrangeiro, proclamam
uma reduzida (ou nula) tributação, vem colocando o problema da sustentabilidade do Estado
Social. Esta crise deriva da feroz concorrência que se estabelece entre as empresas numa
economia global, obrigando-as a serem altamente competitivas na sua gestão, incluindo no
plano fiscal, o que, consequentemente, se repercute numa concorrência fiscal – fatal – entre
Estados. A ponderação, por parte dos contribuintes, dos efeitos das operações efetuadas de
modo a frustrarem as intenções do legislador fiscal, tem conduzido à criação de obstáculos
legais, nomeadamente à estatuição de regimes antiabusivos, no qual defendemos que se
integra o regime de transparência fiscal, e cujo intuito reside na inibição das manipulações
negociais quando estas tenham, como único e principal objetivo, ultrapassar normas que
visam obter uma distribuição equitativa e economicamente eficiente dos encargos
tributários99. Os indivíduos poderão, assim, optar livremente pela forma e organização da
empresa, preferindo uma empresa em nome individual ao invés de societária e, só a eles cabe
decidir se optarão por um auto ou heterofinanciamento ou se recorrerão a suprimentos. O
mesmo se passará quanto à sede, à política de gestão de défices e de reintegrações e
amortizações.
Compreende-se, agora, que a tributação neutral seja um dos objetivos que a
transparência fiscal visa atingir, quer o sócio exerça a sua atividade a título individual, quer
exerça a atividade por meio da sociedade. Esta exigência tem maior reflexo nas sociedades
de pessoas, devido ao caráter pessoalíssimo da atividade desenvolvida pelo sócio que assume
grande importância na prossecução do objeto social, diversamente do que acontece com as
sociedades de capitais. Questões que têm vindo a suscitar grande interesse após a alteração
dos requisitos de enquadramento pela Lei da Reforma Fiscal do IRC, porque, de facto,
tributar a matéria coletável em IRS ou IRC, não é fiscalmente indiferente.

99
V. SALDANHA SANCHES, José, Limites ao Planeamento Fiscal: Substância e Forma no Direito Fiscal
Português, Comunitário e Internacional, Coimbra Editora, Coimbra, 2006, p. 167.

46
2 - A LUTA CONTRA A EVASÃO FISCAL

Acabamos de ver que a liberdade de gestão fiscal reconhece ao sujeito passivo a


possibilidade de livremente planificar a sua vida, sendo-lhe reconhecido o direito de optar
pela solução menos onerosa com o intuito de diminuir a carga tributária. Não obstante, é
notório que este planeamento deverá ocorrer dentro do quadro jurídico existente – e por isso,
se diz planeamento intra-legem ou planeamento fiscal – e não através de meios artificiosos,
fraudulentos ou abusadores das formas jurídicas100.
Contudo, nem sempre é isso que se passa na prática, e, não raras vezes, a poupança
fiscal visada pelo contribuinte é feita por via de atos ilícitos, infringindo-se a legislação,
omitindo-se comportamentos, que ela prevê como obrigatórios, ou adotando-se condutas
contrárias às legalmente previstas. Isto é evasão fiscal e, opostamente ao planeamento fiscal
e a algumas formas de elisão fiscal - aproveitamento dos negócios jurídicos não previstos na
lei ou por meio de operações contabilísticas mais favoráveis -, mesmo que nem sempre possa
ser considerada uma infração fiscal em sentido estrito, é uma infração à lei e, por isso, não é
permitida.
O combate à evasão e fraude fiscais, é uma matéria que muito tem dividido a
doutrina. Existem autores que consideram a interposição de sociedades para o exercício de
determinadas atividades como uma forma de evasão legal, comparando-a a uma forma de
elisão fiscal por não se encontrar presente a ilicitude dos meios empregues para a obtenção
do benefício, não constituindo assim, um pressuposto de fraude fiscal101. Há também quem
defenda que este tipo de comportamento não deva ser sancionado, face à liberdade de gestão
fiscal e ao princípio de que, quando os contribuintes têm vários meios legais para chegar ao
mesmo resultado, têm a faculdade de escolher o menos oneroso102. No entanto, quando, entre
a fonte de rendimento e o seu recetor, pessoa física, ou entre um elemento patrimonial e o
seu titular, é interposta uma sociedade com o verdadeiro propósito de fraude fiscal ou
subtração à incidência de determinado imposto, o nosso sentido de justiça não nos permite
aceitar tais situações. É clara a frequência da criação de sociedades para que a sua

100
CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit.,
101
Neste sentido FALCON Y TELLA, Ramon, Analisis de la transparência tributaria, Madrid, Instituto de
Estudios Fiscales, 1984.
102
Neste sentido ROSIER, Camile, La Lutte Contre la Fraude Fiscale, Vol. VI, Bulletin for International
Fiscal, Documentation, 1952.

47
personalização tributária sirva tão-só para afastar das pessoas dos seus sócios a tributação
do seu rendimento, algo que acontece pela transferência dessa tributação para o rendimento
da sociedade, em moldes mais vantajosos103. A sua finalidade é tão-só iludir determinada
tributação, nomeadamente, contornar o caráter progressivo do imposto sobre o rendimento
das pessoas singulares por meio de uma sociedade que armazena os lucros, não os
distribuindo aos sócios ou, se o faz, é em escassa quantidade. Estas sociedades são
denominadas no ordenamento jurídico espanhol de sociedades interpuestas104 e assentam na
intencionalidade de evasão fiscal, mas a cuja determinação, na prática, mostra ser bastante
difícil (senão mesmo impossível), carecendo o ordenamento jurídico-tributário de critérios
que permitam instrumentalizar o conceito com precisão e com um mínimo de rigor105,
reclamando-se uma consagração legal que atue de forma preventiva.
Investigar denúncias, assegurar fiscalizações, combater a fraude e a evasão fiscais
são atividades essenciais na busca da verdadeira situação tributária dos sujeitos passivos,
pelo que a AT tem o dever e a competência para procurar a verdade material, sancionando
os comportamentos dos sujeitos passivos que a comprometam106. Assim, foi não só a evasão
fiscal, mediante a interposição de uma pessoa coletiva107, como também a não distribuição
de lucros e a constituição de reservas, as razões que levaram à estatuição do regime de
transparência – do jeito que temos vindo a defender – como antiabusivo, sendo o artigo 6º,
neste sentido, uma medida antiabuso108.

103
A este respeito, Sá Gomes fala da teoria doutrinal americana – disregard doctrine – desenvolvida como
forma de luta contra os casos em que se destinam à pessoa jurídica fins incompatíveis com os que presidiam,
formalmente, à sua constituição, desvirtuando, desta forma, os princípios jurídicos que regulam a vida
societária, nomeadamente, o princípio da boa-fé. V. SÁ GOMES, Nuno, Manual de Direito Fiscal, Vol. I, 12ª
ed., Rei dos Livros, Lisboa, 2003, p. 142.
104
Como são denominadas no ordenamento-jurídico espanhol. V. ROMERO, Enrique Corona, «El Regimen
de la Tranparencia Fiscal em la Imposicion Directa», Revista Española de Financiación y Contabilidad, Vol.
III, n.º 25, julio-septiembre de 1978, p. 53. V. ac. do TS, n.º ROJ STS 201/2013, STS 2952/2014 e STS
4304/2015.
105
«Sistema Tributário Español», Ministério de Hacienda, Madrid, junio de 1976, pp. 162-165.
106
V. FARIA COSTA, José de Ob. Cit., p. 8.
107
Neste sentido HENSEL, Albert, Diritto Tributario, Giuffré, Milán, 1956 e TABOADA, Carlos Palao, «El
fraude a la Ley en Derecho tributário», R.D.F.H.P., nº 63, maio-junho de 1996.
108
Note-se que há autores que defendem que somente existe o planeamento fiscal, no qual se integram os
negócios jurídicos lícitos com objetivo de diminuir a carga fiscal, e a evasão fiscal em sentido estrito que abarca
os negócios jurídicos ilícitos e as práticas de elisão fiscal que são fundamento para a aplicação de normas
antiabusivas. Se assim o entendermos, a transparência fiscal teria como fim o combate à evasão fiscal em
sentido estrito. V. SÁ GOMES, Nuno, Manual de Direito Fiscal, Vol. II, Lisboa, Rei dos Livros, 2000, p. 141
e ss.

48
2.1 - A personalidade coletiva

Para melhor entendermos a problemática aqui em apreço, cumpre saber-se o que são
pessoas coletivas, expressão que utilizamos em sentido lato, de modo a abrangermos as
sociedades comerciais. É manifesto que a sua existência resulta de interesses humanos,
duradouros e de caráter comum ou coletivo, mas cuja consecução exige o concurso de meios
e atividades de várias pessoas. Na definição dada por Carlos Alberto da Mota Pinto109, são
coletividades de pessoas ou complexos patrimoniais organizados em vista de um fim comum
ou coletivo a que o ordenamento jurídico atribui a qualidade de sujeitos de direito. A
sociedade comercial surge, então, como um instrumento legítimo de destaque patrimonial
para a exploração de determinados fins económicos, e a subjacente personalidade coletiva e
a limitação da responsabilidade dos sócios faz com que represente um instrumento de
viabilização da atividade prosseguida, também ela económica.
Mas o que é a personalidade coletiva? A personalidade jurídica pode ser definida
como a suscetibilidade de ser titular de direitos e obrigações. É reconhecida pelo Direito, no
artigo 66º do CC, a todas as pessoas singulares - seres humanos nascidos completamente e
com vida - e, verificados certos requisitos, é também atribuída às pessoas coletivas, sendo,
neste caso, conhecida como personalidade coletiva, e traduz-se na possibilidade de
consignar centro de imputação de normas jurídicas que não coincidam com seres humanos
ou pessoas singulares110. Trata-se de um mecanismo técnico-jurídico, justificada pela ideia
de, com maior comodidade e eficiência, organizar a realização dos interesses coletivos
duradouros, é um conceito jurídico, uma realidade situada no mundo jurídico que traduz
juridicamente um fenómeno empírico 111.
Ao longo dos anos, o conceito personalidade coletiva nem sempre foi unânime. As
Ordenações careciam de um tratamento eficaz para as pessoas coletivas, que foram objeto
de um tratamento sistemático, por parte dos juristas liberais que as denominaram de
corporações ou pessoas moraes. Muito devido a Puffendorf e à sua consagração no ABGR

109
Para maiores desenvolvimentos, v. MOTA PINTO, Carlos Alberto da, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª ed.,
Coimbra Editora, Coimbra, 2012, p. 138 e ss.
110
CORDEIRO, António Menezes, O Levantamento da Personalidade Jurídica no Direito Civil e Comercial,
Coimbra, Almedina, 2000, p. 9.
111
MOTA PINTO, Carlos Alberto da, Teoria Geral do Direito Civil, ob. cit., p. 139.

49
austríaco, esta expressão preconizou-se, acabando por ser acolhida pelo Código de Seabra112.
Savigny, ao considerar que a expressão significaria a imoralidade da pessoa singular,
preferia o termo pessoa jurídica, adotado também por Heise e presente, atualmente, em
vários sistemas jurídicos, nomeadamente, na Alemanha e em Itália.
Apesar dos Ius Romano não proceder à elaboração do conceito, os canonistas e
comentadores foram precursores e referiam-se à mesma como universitas. Os humanistas
prolongaram a sua eficiência e o pensamento de Domat que considerava que as comunidades
legitimamente constituídas, funcionam como pessoas, e a sua união, que torna comuns, a
todos os que as compõem, os seus interesses, os seus direitos e os seus privilégios, faz que
elas sejam consideradas como um todo, foi retomado por Pothier. Contudo, o Código de
Napoleão, focado no papel central do cidadão como ser individual, não ofereceu um lugar
condigno à pessoa coletiva. Somente com o racionalismo e com Kant que, ao defender que
a personalidade ética nada mais seria do que a liberdade de uma natureza racional de leis
morais, de onde resultaria que uma pessoa não está submetida a nenhumas leis senão
àquelas que a própria se dá113, proporcionou-nos um dado basilar na construção do conceito
de personalidade coletiva. No nosso ordenamento, a introdução da expressão personalidade
jurídica deve-se a Guilherme Moreira que, na pré-edição das suas Instituições de Direito
Civil em 1902, contrapunha pessoas jurídicas ou moraes às pessoas physicas. Após várias
alterações, em 1907, este autor referia-se já a pessoas singulares e pessoas coletivas,
afastando as designações como pessoas jurídicas, moraes, sociaes, fictícias e abstratas114.
Mas foi com a revista de Legislação e Jurisprudência, em 1908, que a denominação
personalidade coletiva se vulgarizou.
A pessoa coletiva, enquanto provida de personalidade jurídica, é uma criação do
Direito, instrumento de que se serve para a proteção de certos interesses, posto que lhe
corresponda um qualquer substrato material115. A afirmação da personalidade será a
consideração de que o ente pode autodeterminar-se no leque de direitos de que seja titular,
agindo no campo das suas adstrições, estando, o modo de exercício, dependente de outros
normativos, aplicabilidade postula e deriva da personalidade. É ela que possibilita imputar

112
Art. 32º e seguintes. Expressão também adotada por COELHO DA ROCHA, M. A., Instituições de Direito
Civil Portuguêz, 8ª ed. Coimbra, Imprensa da Universidade, 1917, § 55 ss.
113
Kant, Eileitung in die Metaphysik der Sitten, Vol. 6º, ed. Academia Prussiana das Ciências, 1907, p. 223.
114
MOREIRA, Guilhermo, Instituições de Direito Civil Português, Vol. I, Coimbra, Universidade de Coimbra,
1903, p. 84 e, a mesma obra do ano 1907, pp. 153-158.
115
MOTA PINTO, Carlos Alberto da, Teoria Geral do Direito Civil, cit., p. 144.

50
condutas humanas a seres abstratos, tendo sido erigida com propósitos legítimos, como o
incentivo ao desenvolvimento de atividades económicas e sociais, e a criação de emprego.
Permite, também, exonerar de responsabilidade os agentes e visíveis das pessoas coletivas,
sendo os danos por eles provocados imputados à própria pessoa coletiva. E, apenas por leis
específicas é possível limitar-lhes a capacidade, pois o princípio da especialidade não a
restringe, diz-nos, antes, que todos os direitos e obrigações, salvo algumas exceções, são
acessíveis às sociedades e estas, como entidades abstratas que são, para prossecução do seu
fim e do seu objeto, agem através de representantes orgânicos, que são os titulares dos seus
órgãos.
Todavia, a personalidade coletiva dependente da existência de autonomia
patrimonial. Pode existir autonomia patrimonial sem existir personalidade jurídica, mas
jamais poderá existir personalidade sem autonomia patrimonial. A autonomia patrimonial é
pressuposto de personalidade jurídica116, não se identifica com ela, nem a implica
forçosamente, são conceitos distintos. A mesma pessoa pode ser titular de vários
patrimónios, isto é, dentro de uma mesma esfera patrimonial podem formar-se núcleos
independentes, massas de bens adstritas a um destino próprio e por isso, separadas do
património geral. No conceito mais corrente, podemos definir autonomia patrimonial como
o comportamento de certa massa de bens quanto à responsabilidade pelas dívidas assumidas
na sua administração ou exploração, sendo que, na sua modalidade mais perfeita, assume
um duplo fenómeno: a insensibilidade dos bens, não só a outras dividas não relacionadas
com o fim especial a que estes se encontram afetados, como também às obrigações de
qualquer outro património. Mesmo nesta situação extrema de separação do património, a
autonomia patrimonial e a personalidade jurídica não se confundem, pois esta não exige a
forma perfeita daquela. Deste modo, a personificação permite torná-las uma entidade
jurídica separada dos seus sócios, possuidora de bens, separados, também eles, do
património daqueles, dado que, em princípio, a responsabilidade patrimonial das pessoas
coletivas limita-se ao património destas. Estamos perante, portanto, uma esfera jurídica

116
Se a sociedade não tiver bens que respondam com autonomia pelas dívidas da atividade por si levada a
cabo e houver antes aquilo que designamos por bens da sociedade estiver afetado indistintamente com o
restante património dos sócios ao cumprimento das obrigações assumidas no desenvolvimento das operações
sociais, não poderemos considerar a sociedade dotada de capacidade para se vincular a si mesma. Pelo que
a capacidade para a sociedade se obrigar supõe a existência de algo, pelo menos em potência, que possa
obrigar-se. Assim, a hipótese de capacidade jurídica puramente ativa será impensável. A este respeito vide a
obra FERRER CORREIA, A., Estudos Vários De Direito, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1982, p. 547
e ss.

51
própria, autónoma em relação ao conjunto de direitos e deveres encabeçados, pessoalmente,
pelos seus membros ou serventuários117. Com efeito, a pessoa coletiva é um sujeito de direito
apenas pensado (fictício), cuja personalidade jurídica é obtida artificialmente e que, nas
relações patrimoniais, é tratado como se fosse uma pessoa física118.
Porém, não raras vezes, e à semelhança do que acontece com outros institutos
jurídicos, a personalidade coletiva é usada de modo ilícito e abusivo, contrariando não só
normativos e princípios gerais, mas também violando a ética dos negócios e a boa-fé,
resultando daí prejuízos para terceiros. Na verdade, o seu uso imoderado é possível em
resultado da natureza fictícia da mesma, mas não se poderá tolerar que, a seu abrigo, se
provoquem danos. Em termos práticos, a autodeterminação da pessoa coletiva é sempre
relativa. De facto, esta nunca é alheia à vontade dos seus membros, balizada que está pelos
estatutos e pelas decisões dos órgãos de administração. No fim de contas, o património da
sociedade está ao serviço dos sócios e não da sociedade. Quando o princípio da separação
dos bens da sociedade e dos seus sócios e o princípio da limitação da responsabilidade,
proporcionados pela sociedade, são utilizados de forma abusiva pelos sócios para a
prossecução de fins ilícitos (ou duvidosos), verifica-se um desvio à função para a qual a
sociedade fora criada. Esta situação, bastante comum, urge ser corrigida, pois a atividade
que serve de objeto à sociedade não exigia a sua criação, é uma mera ficção jurídica que tem
pouca (ou nenhuma) correspondência com a sua vida real e económica.
As implicações emergentes da personalidade jurídica que, atuando como um véu
permite comportamentos oportunistas por parte de sócios que se sentem protegidos pelos
privilégios por si conferidos – a separação de patrimónios e a limitação da responsabilidade
– reclamam uma solução eficaz. Ora, é nestas circunstâncias que o Direito permite o
levantamento da personalidade, de modo a surpreender os verdadeiros responsáveis por
determinados atos ou efeitos. Assim, foi como forma de luta contra os casos em que, para
atingir fins contrários aos princípios jurídicos – nomeadamente a diminuição, ou até fuga
tributária –, se destinam à pessoa jurídica fins incompatíveis com os que presidiram,
formalmente, à sua constituição que se estatuiu o regime de transparência fiscal. A
transparência, ao levantar o véu societário pretende chegar à pessoa do sócio, tornando

117
MOTA PINTO, Carlos Alberto da, Teoria Geral do Direito Civil, ob. cit., p. 138.
118
CORDEIRO, António Menezes, O Levantamento da Personalidade ..., ob. cit., p. 49.

52
ineficaz a criação dessa sociedade, já que, para efeitos tributários, será como se ela não
existisse.

2.2 - A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica

A ordem jurídica oferece-nos a possibilidade de gerirmos os nossos interesses,


diretamente, ou através de uma pessoa coletiva, mas a esta oportunidade de atuarmos através
de um ente coletivo, são impostos limites. Sempre que estivermos perante uma pessoa
coletiva, com ou sem substrato, o Direito positivo passa a regular as situações a ela inerentes,
funcionando como um ente autónomo, capaz de levar a cabo condutas singulares por meio
de estatuições normativas justificadas na personalidade coletiva que detêm. É precisamente
neste contexto que, por exigência do sistema, emerge na doutrina portuguesa a teoria da
desconsideração da personalidade jurídica119, ou, nas palavras de Mota Pinto120
desnudamento ou desvelamento – ato de desvelar –, cujo intuito é suplantar a barreira legal
imposta pela sociedade comercial de forma a manter íntegros os valores que inspiraram a
sua criação, permitindo, em determinadas situações, passar do modo coletivo ao modo
singular, ignorando a presença formal de uma pessoa coletiva.
Cada vez mais considerada, a doutrina da desconsideração da personalidade
jurídica tem sido desenvolvida através de decisões judiciais desde o seu aparecimento no
início do século XX nos Estados Unidos da América121. Neste sentido, os tribunais norte-
americanos não têm dúvidas em desconsiderar a personalidade coletiva e,
consequentemente, responsabilizar os respetivos membros. Isto é, invocando, sob inspiração

119
Expressão utilizada também no Brasil. António Menezes Cordeiro prefere a designação de “levantamento
da personalidade coletiva – Cfr. CORDEIRO, António Menezes, O Levantamento da Personalidade ..., ob.
cit., p. 102 e ss. TELLES, Inocêncio Galvão, «Venda a descendentes e o problema da superação da
personalidade jurídica das sociedades», ROA III, 1979, p. 513-562, preconiza a expressão “superação da
personalidade jurídica”. Parece, no entanto, ter-se vulgarizado, entre nós, a expressão “desconsideração da
personalidade jurídica” - Cfr. ASCENSÃO, José de Oliveira, Lições de Direito Comercial, Vol. I – Parte Geral,
Lisboa, Sociedades Comerciais, 1986, p. 47., Ou CORDEIRO, Pedro, A desconsideração da personalidade ...,
ob. cit., ou, mais recentemente, RIBEIRO, Maria de Fátima, A Tutela dos Credores…, ob. cit. Já no Direito
anglo-saxónico aplicam-se expressões como disregard of corporatness ou disregard of legal entity ou piercing
the corporate veil. No Direito germânico, usa-se a expressão durchgriff bei juristischer personen, ou apenas
durchgriff. No Direito italiano e francês superamento della personalitá giuridica e transparence,
respetivamente.
120
MOTA PINTO, Carlos Alberto da, Teoria Geral do Direito Civil, ob. cit., p. 141.
121
Tomemos como exemplo o caso Deep Rock em que o Supremo Tribunal daquele país, em 1939, entendeu
apenas permitir a uma sociedade-mãe obter o reembolso de créditos concedidos a uma sua sociedade filha, em
processo de falência desta, depois de pagas integralmente as dívidas dos restantes credores.

53
da equity e do realismo jurídico americano, certos padrões sociais como a consciência
popular dominante, as realidades da vida, a força ou o poder dos factos ou as exigências da
vida económica. Esta posição doutrinária tem feito curso nos modernos países industriais,
particularmente europeus122, nos quais o problema surgiu devido ao êxito das sociedades por
quotas que, por permitirem a democratização da responsabilidade limitada, levaram à
emersão de questões inerentes à tutela dos credores sociais quando, sem publicidade, fossem
ignorados determinados postulados do seu funcionamento123. Um dos maiores problemas
atinentes à responsabilidade limitada estava associado à sociedade unipessoal por quotas,
tendo sido discutido no Reichsgericht124, onde se decidiu que, apesar da reunião numa só
pessoa das participações sociais, a sociedade mantém uma personalidade jurídica própria.
Posteriormente, em 1920125, o Reichsgericht, ao entender que podia ser responsabilizado o
único sócio, impulsionou, na Europa, a doutrina da desconsideração da personalidade. Não
obstante, só em 1955, Serick lhe apôs o nome com a publicação do livro intitulado
Rechtsform und Realität Juristischer Personen – Forma jurídica e realidade das pessoas
coletivas. Nesta obra, Serick – que se tornou numa referência obrigatória a propósito desta
doutrina – concluía que o juiz devia abster-se da estrita separação entre os membros e a
sociedade, quando houvesse abuso da pessoa coletiva, ou seja, sempre que, com recurso a
essa entidade, a lei fosse contornada, se violassem deveres contratuais ou se prejudicassem
fraudulentamente terceiros126. A boa-fé assumia, deste modo, um papel primordial ao
defender-se que a pessoa coletiva não deveria ser mobilizada para frustrar o escopo de uma
norma ou de um negócio.
Apesar de no nosso ordenamento jurídico não existir como instituto autónomo, as
primeiras referências ocorreram por via doutrinária e devem-se a Ferrer Correia127 que, já
em 1948, mencionava a necessidade de ultrapassar a separação imposta pela pessoa coletiva
entre patrimónios economicamente unidos. Porém, foi Lamartine Corrêa de Oliveira128 quem

122
SÁ GOMES, Nuno, Manual de Direito Fiscal, Vol. I, 12ª ed. (6ª reimpressão), Lisboa, Rei dos Livros,
2003, p. 141. e DUARTE, Diogo Pereira, Aspetos do levantamento da personalidade coletiva nas sociedades
em relação de domínio, Coimbra, Almedina, 2007, pp. 34-45.
123
CORDEIRO, Pedro, A desconsideração da personalidade ..., ob. cit., p. 104.
124
Tomemos em consideração os seguintes acórdãos: RG 27 de outubro de 1914, RGZ 85 (1915), 380-384
(382), RG 4 de junho de 1915, RGZ 87 (1916), 18-26 (25), RG 21 de janeiro de 1918, RGZ 92 (1918), 77-87
(84).
125
Veja-se o ac. RG 22 de junho de 1920, RGZ 99 (1920), 232-235 (234).
126
SERICK, Rolf, Rechtsform und Realität juristischer Personen, Mohr, 1980, cit. p. 203
127
FERRER CORREIA, A., Sociedades Fictícias e Unipessoais, Coimbra, Livraria Atlântida, 1948, p. 325.
128
CARVALHO, Orlando de, Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra, Coimbra Editora, 2012, p. 46.

54
aprofundou a matéria e propôs a designação desconsideração da personalidade coletiva,
adotada também por Oliveira Ascensão129, Pereira de Almeida e Pedro Cordeiro. Menezes
Cordeiro130 e Galvão Telles131 preferiram apelidar o fenómeno por levantamento da
personalidade coletiva, e Carvalho Fernandes por superação da personalidade coletiva. Por
sua vez, e apesar de a sua referência não ser totalmente explicita132, Coutinho de Abreu133
define-a como a derrogação ou a não observância da autonomia jurídico-subjetiva (ou
patrimonial) das sociedades em face dos respetivos sócios. A receção pela jurisprudência
portuguesa não foi fácil, mas podemos fazer referência ao acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça 6 de janeiro de 1976134 e o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13 de maio
de 1993135, pioneiros na sua adoção.
Cumpre-nos, neste momento, referenciar as três teorias que estão na base desta
doutrina: a teoria subjetiva, a teoria objetiva e a teoria de aplicação de normas – e, por fim,
a teoria negativista. A primeira, defendida por Serick, determinava o afastamento da
autonomia da pessoa coletiva, quando se verificasse um abuso na sua forma jurídica, para se
atingirem fins não permitidos, por se encontrarem fora dos limites sistemáticas da sua
função. Para isso, considerar-se-ia a situação objetivamente e a intencionalidade do agente,
exigindo-se um abuso consciente da pessoa coletiva136, não bastando, em principio, a não
obtenção do escopo objetivo de uma norma ou negocio. Seria muito difícil negar o
levantamento nos casos em que, consciente e abusivamente, o indivíduo manipula a
personalidade coletiva só para prejuízo de outrem, surgindo a subjetividade como um
episodio natural dentro da evolução geral da ideia de levantamento: jogam-se, tão-só, os
pressupostos da responsabilidade civil137. No entanto, esta teoria não recebe acolhimento,

129
V. ASCENSÃO, José de Oliveira, Lições…, ob. cit., p. 479, Direito comercial, Vol. IV – Sociedades
Comerciais, Coimbra, Almedina, 1993, p. 57 e Direito Civil - Teoria Geral, Vol. I, Coimbra, Coimbra Editora,
1997, pp. 277-279, admitindo, nesta última, a expressão superação.
130
Para uma análise mais aprofundada, v. CORDEIRO, Menezes, Da Boa-fé no Direito Civil, 6ª reimpressão,
Coimbra, Almedina, 2015, p. 1232.
131
GALVÃO TELLES, Inocêncio, «Venda a descendentes e o problema da superação da personalidade jurídica
das sociedades», ROA, 1979, 513-562.
132
V. Do abuso de direito – Ensaio de um critério em direito civil e nas deliberações sociais, Almedina,
Coimbra, 1983, este autor não denomina o instituto.
133
ABREU, Jorge Manuel Coutinho de, Curso de Direito Comercial, Vol. II …cit., p. 176.
134
Relator Oliveira Carvalho, BMJ, n. º 253, 1976, pp. 150-155.
135
Relator Fernando de Magalhães, CJ XVIII (1995) 3, pp. 199-201.
136
SERICK, Rolf, ob. cit., p. 203. A exigência do abuso consciente é também sublinhada por MÖHRING e,
posteriormente, no comentário ao Aktiengesetz Kommentar por GODIN/WILHELMI, Aktiengesetz vom 6.,
Sept. Kommentar, 3. e por WILHELMI, Sylverter, Bd. 1, Berlim, 1971, An. 18 ao 1.º § (14).
137
CORDEIRO, António Menezes, O Levantamento da Personalidade ..., ob. cit., p. 126.

55
não só pela mobilização da pessoa coletiva para fins não queridos pelo Direito já se
considerar, por si, abusiva, como também o elemento subjetivo possui grande dificuldade
probatória. Além disso, requerer-se-á culpa, se se tratar de responsabilidade civil por atos
ilícitos ou pelo incumprimento das obrigações, mas não já se o que se pretender for fazer
responder o património do sócio em detrimento do da sociedade.
A teoria objetiva obteve múltiplas adesões. Nasceu jurisprudencialmente quando o
BGH entendeu que, perante o abuso intencional da pessoa coletiva, pode não ser difícil
suceder que se mantenha pura e simplesmente a realidade escondida pelo sujeito. A
jurisprudência não faz depender a penetração nas forças existentes por detrás da pessoa
coletiva de um abuso intencional da figura jurídica da pessoa coletiva138. Ao rejeitar o
elemento subjetivo, a intencionalidade do agente é abandonada, sendo necessário, para que
se proceda ao levantamento, a ponderação e a articulação dos institutos em presença, o que
exige a cuidada interpretação e estudo das regras em presença - daí estas orientações se
denominarem também institucionais. Quando, devido à sua intencionalidade, a norma fosse
afastada através da invocação da personalidade coletiva, esta deveria ser levantada.
Contudo, Karsten Schmidt considera que, por esta via, a desconsideração deixaria de ser
uma sanção para quem a manipulasse, sujeitando-se a perder autonomia institucional e
justificativa139.
Por sua vez, a teoria da aplicação de normas, apresentada em 1957 por Müller-
Freienfels, entendia que o levantamento se trataria de uma questão de aplicação de diversas
normas jurídicas, averiguando-se se, do seu escopo, pretender-se-ia a sua aplicação absoluta,
ou se visavam atingir a realidade subjacente à própria pessoa coletiva. O detrimento das
regras da personalidade seria uma consequência daí decorrente, ou seja, quando, por
exigência de uma norma concretamente prevalente não tivesse aplicação uma norma própria
da personalidade coletiva. Esta teoria é, na sua essência, objetiva e, segundo Günter
Weick140, num primeiro momento, deverá ponderar-se o escopo das normas em questão, a
boa-fé poderia intervir se a invocação da personalidade coletiva implicasse um venire contra
factum proprium.
A verdade é que a teoria subjetiva de Serick cobre as hipóteses da responsabilidade
civil, a teoria do escopo das normas, de Müller-Freienfels, está relacionada com a

138
BGH 30 de janeiro de 1956, BGHZ 20 (1956), 4-15 (13), 258-279 (271-272).
139
SCHMIDT, Karsten, ob. cit., pp. 229-300.
140
STAUDUNGER / WEICK, BGB, 13ª ed. Cit., Intr. 21 ss, Nr. 43/III.

56
interpretação integrada e melhorada de normas jurídicas e a teoria objetiva visa o abuso de
direito, pelo que estas refletem a progressão da mesma ideia, não se contradizendo, mas
completando-se.
As teorias negativistas, por o considerarem construído em proposições vagas e, por
isso, dotado de grande insegurança, negam a autonomia da desconsideração enquanto
instituto. Afirmam que se deveriam determinar os deveres que incidem sobre os membros
das pessoas coletivas, só se permitindo a responsabilização daqueles que da pessoa coletiva
fizessem parte em caso de falta de diligência. Como negativismo indireto temos a
recondução do levantamento à fraude à lei, que não tem autonomia, nem no nosso sistema
jurídico, nem no alemão.
Quando em causa estão grupos de sociedades, a desconsideração da personalidade
jurídica ganha relevância, pois, face ao seu crescimento e à relação mantida entre eles, o
legislador teve a necessidade de consagrar regimes específicos que implicam, por vezes, a
ignoração da presença formal de entes jurídicos distintos. Aqui é possível apontar duas
vertentes: a responsabilização dos sócios e administradores, por meio de ações
concretizadoras de um dever de lealdade, e a responsabilização patrimonial, por via da
presença de grupos de facto qualificados. Quanto à primeira, cumpre relembrarmos que a
boa-fé implica também um dever de lealdade que adquire especial significado no âmbito
societário, impondo-se independentemente, e em prejuízo da personalidade coletiva. Esta
não poderá ser entrave à lealdade existente entre os que compõem a sociedade, ou que com
ela interagem, seja através da confiança suscitada, de negócios jurídicos, ou das legítimas
expectativas que tenham para com ela. São esses vínculos os exigidos para um saudável
desempenho do sistema jurídico e que devem prevalecer, mesmo que, para isso, a
personalidade coletiva e a independência societária sejam postas em causa. Os conflitos de
interesses, originados ou não por uma sociedade, podem por em questão os princípios
basilares do sistema jurídico, consideram-se, deste modo, os grupos de sociedades como
qualificados, admitindo-se, em especial, a sua desconsideração como tal, por não atuarem
dentro dos parâmetros legais.
A Durchgriff, fazendo uso da nomenclatura alemã, é um instrumento que torna
ineficaz, em determinada situação fática, a personalidade jurídica da sociedade comercial e
que, por essa razão permite atribuir ao sócio condutas que seriam atribuídas apenas à
sociedade. Trata-se de uma operação pela qual a personalidade jurídica de um ente coletivo

57
é afastada, devendo entender-se por desconsideração o desrespeito pelo princípio da
separação entre a pessoa coletiva e os seus membros ou, dito de outro modo, desconsiderar
significa derrogar o princípio da separação entre a pessoa coletiva e aqueles que por detrás
dela atuam141. Tem como propósito o aperfeiçoamento do próprio instituto da
personalização da sociedade comercial, uma vez que determina a ineficácia episódica do seu
ato constitutivo, preservando a validade e a existência de todos os demais atos que não se
relacionam com o desvio à sua finalidade, protegendo, assim, a própria existência da
sociedade. O afastamento momentâneo da personalidade jurídica da sociedade, para alcançar
diretamente o sócio – o homem oculto – e o seu património, é alicerçada nas situações de
violação não aparente de normas jurídicas, nas quais, a pretexto da personalidade coletiva,
são descuradas normas de contabilidade, de separação de patrimónios, ou alienações de
dúbia clareza.
Como temos vindo a antecipar, estes problemas ocorrem com mais frequência nas
sociedades por quotas que, não raras vezes, agem, não como uma sociedade de capitais, mas
sim como que de uma verdadeira sociedade de pessoas se tratasse, onde o intuito personae
dos sócios assume tamanho relevo que toda a sua confiabilidade e crédito perante terceiros
se reflete no perfil pessoal daqueles que dela fazem parte. A sociedade clássica –
normalmente anónima – tem todo o interesse em se manter funcional, protegendo os seus
credores, trabalhadores e sócios, e se, em questão estiver uma sociedade anónima, cujo
capital social se encontra disperso, o controlo interno é eficaz, pois os seus administradores
encontram sempre obstáculos que os inibem de desvios sistemáticos e asseguram a
viabilidade do sistema. Algo que não se verifica numa sociedade por quotas, com um único
sócio ou dominante, especialmente se este for também gerente. A banalização deste tipo
societário que, na sua essência, são verdadeiras sociedades pessoais, levou ao aparecimento
das sociedades kamikazes142, cujo suicídio, ao serviço de terceiros, põe em causa os
princípios estruturantes do sistema societário. A prevenção do abuso deste tipo societário e
a conservação das suas atuações dentro dos parâmetros aceitáveis, de modo a
salvaguardarem-se os sócios minoritários e os credores sociais é algo que sempre se procurou
e que constituiu a – dupla – preocupação do BGH.

141
CORDEIRO, Pedro, A desconsideração da personalidade ..., ob. cit., p. 19.
142
CORDEIRO, António Menezes, O Levantamento da Personalidade ..., ob. cit., p. 150.

58
A desconsideração da personalidade jurídica da sociedade não acarreta a nulidade
dos atos societários que apenas são declarados ineficazes, mas a personalidade implica uma
clara independência jurídica dos entes coletivos e, devido ao facto de todos os operadores
económicos contarem com isso, só perante exigências ponderosas será possível, em termos
éticos, económicos e sociais, proceder ao seu levantamento. A invocação da doutrina só
poderá ocorrer quando a ordem jurídica não forneça uma solução específica para o problema
em causa e seja a própria, por imperativos de justiça, a reclamar essa invocação. É por essa
razão que se defende, na doutrina, que a desconsideração da personalidade coletiva tem
natureza subsidiária e é uma cláusula de reserva. Assim, devemos lidar com dois institutos:
o da própria personalidade coletiva, cuja natureza e entendimento assumem, no
levantamento, um papel incondicional, e o da boa-fé que exprime, perante cada caso
concreto, as exigências do sistema. Por conseguinte, o instituto da desconsideração da
personalidade encontra justificação dogmática no princípio da boa-fé e fundamento no
instituto do abuso de direito143.
No âmbito do Direito fiscal português, Nuno de Sá Gomes aceita a desconsideração
como forma de luta contra a evasão fiscal, especialmente quando, através da personalização
tributária, se pretende, exclusivamente, elidir a obrigação fiscal, defendendo, também, que
cabe à AT o dever de determinar o rendimento efetivo dos contribuintes que não
correspondam aos declarados. Como verificamos, é o facto de a personalidade coletiva ser
um mero mecanismo técnico-jurídico manuseado com finalidades afrontadoras dos
princípios tributários que se pode impor ao Direito fiscal o levantamento do véu da
personalidade coletiva e a consideração do respetivo substrato. É nítido que é a doutrina da
desconsideração que está na base da consagração do regime de transparência fiscal do artigo
6º do CIRC e, ao ser um meio de garantia do credor tributário, denota-nos que o legislador
considera que os rendimentos societários são resultado do intuito personae que caracteriza
a atividade. Por via da eliminação, para efeitos de tributação, da entidade coletiva, dá-se
primazia à personalidade jurídica do sócio, cujo mérito, talento e competência fazem dele o
verdadeiro impulsionador na conquista de riqueza – principalmente no que às sociedades de

143
O legislador, tendo em conta as diversas desfuncionalizações, regula-as nos artigos 84º, 243º a 245º, 501º e
502º do CSC, pelo que, a desconsideração enquanto instituto autónomo, resulta da descaracterização da
responsabilidade limitada, isto é, existe um abuso da autonomia patrimonial da sociedade com a invocação,
por parte daquele que o comete, da limitação da responsabilidade.

59
profissionais diz respeito –, convertendo-o no cerne societário e no real detentor da
capacidade contributiva.
Apesar da teoria da desconsideração ser, mobilizada no nosso ordenamento jurídico
pela jurisprudência como um instrumento a posterior, não são raras as vezes que são
consagrados preceitos normativos, como temos vindo a enunciar, cujos fundamentos são os
mesmos que estão na base desta teoria. Quando o legislador opta por ignorar a presença da
personalidade jurídica na estatuição normativa, podemos qualificar esses casos como
soluções desconsiderantes ou praeter legem. Tanto as soluções desconsiderantes como
aquelas que ambicionam sê-lo, são sempre alicerçadas no abuso da personalidade coletiva,
cabendo também, a esta doutrina, a missão de justificar, dogmaticamente, a aplicação de
soluções desconsiderantes. O que acontece, no que à transparência fiscal diz respeito, é que
é o legislador (e não o julgador) que, a priori, (e não a posteriori) desconsidera a
personalidade jurídica, a fim de, preventivamente, combater a evasão fiscal. O legislador
acha bastante a verificação de determinadas características, tais como, a existência de uma
sociedade civil não constituída sob forma comercial, uma sociedade profissional ou uma
sociedade de simples administração de bens – que cumpram determinados requisitos –, para
presumir que se esteja perante uma situação justificadora da mobilização da teoria da
desconsideração. Lançou-se mão deste instrumento e, não obstante o seu caráter limitado de
atuação como última ratio, fez-se com que o levantamento da personalidade, para efeitos
fiscais atuasse antecipadamente, sendo a personalidade jurídica do ente coletivo distanciada
antes mesmo deste ter praticado qualquer ato que se consubstanciasse numa conduta ilícita,
desonrosa da liberdade de gestão fiscal e de configuração juridica, ou da boa-fé,
concretizada no abuso de direito.
Se esta doutrina se justifica na proteção dos credores sociais, por maioria de razão,
poderá, também, ser mobilizada para proteger os credores tributários? Quando os
contribuintes não cumprirem os seus deveres tributários, no Estado recai um dever de facere,
devendo adotar medidas para assegurar a cobrança dos impostos, nomeadamente, a
possibilidade de desconsiderar a personalidade coletiva da entidade devedora. Todavia, esta
desconsideração a posteriori – diferentemente do que se passa na transparência –, não nos
parece viável. O artigo 103º, nº 2 da CRP, diz que os impostos são criados por lei, que
determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes, sendo
a competência – relativa–, no que tange aos elementos essenciais do imposto, da Assembleia

60
da República (art. 165º, nº 1, al. i)), com possibilidade de delegação no Governo, através de
autorização legislativa (reserva de lei formal, corolário do princípio da legalidade). O
conceito de incidência144, em sentido amplo, abrange o complexo de pressupostos do
nascimento da obrigação tributária e os seus elementos, designadamente, os sujeitos ativo e
passivo, a matéria coletável, as taxas e os benefícios fiscais. Em sentido restrito, cinge-se à
zona normativa na qual se preveem os factos, localizados no espaço e no tempo, de cuja
verificação depende o nascimento dessa obrigação (incidência real) e a definição do sujeito
passivo (incidência pessoal, aqui se incluindo os contribuintes, os substitutos e os
responsáveis). Pelo facto de a doutrina entender que a CRP emprega incidência em sentido
restrito, a disciplina da responsabilidade tributária integra a noção de incidência, pelo que
está sujeita ao princípio da legalidade fiscal. Situação reafirmada no artigo 8º, nº 2, al. b) da
LGT. A responsabilidade tributária, estatuída nos artigos 21º a 28º da LGT, indica quem
pode ser responsabilizado pelas dívidas fiscais do contribuinte originário, não incluindo aí
os sócios145, mesmo sendo os responsáveis pelo incumprimento das sociedades, através do
abuso da sua personalidade. Caso a responsabilidade dos sócios pelas dívidas fiscais da
sociedade estivesse prevista na LGT, por se tratar de dívidas fiscais de outrem, nos termos
do artigo 22º, n.º 4, adquiriria a natureza jurídica da responsabilidade tributária, ficando,
assim, enquadrada na noção de incidência pessoal. Logo, a desconsideração da
personalidade coletiva para responsabilizar o sócio pelas dívidas fiscais da sociedade não
pode ser aplicada sem previsão legal, porque a tal obsta o princípio da legalidade fiscal.
O credor tributário ficará sem proteção? Não, uma das hipóteses que apontamos é a
seguinte: a responsabilidade tributária dos gerentes abrange os gerentes de direito e de facto,
caso o credor tributário impute ao sócio condutas que o permitam considerar gerente de
facto, nada obsta a que possam ser alvo de tal responsabilidade, sendo o controlo da
sociedade que fundamentaria a imputação. Quando o sócio é gerente, a responsabilização
ocorrerá nessa qualidade. Se dispuserem de capacidade para controlar a sociedade,
determinando o modo do exercício desta - estaremos perante um gerente de facto146, ainda

144
V. MARTINEZ, Pedro Soares, Direito Fiscal…cit., p. 126 GOMES, Nuno Sá, Manual de Direito
Fiscal…cit., Vol. II, p. 57
145
Foquemo-nos principalmente nas sociedades por quotas, pois, no art. 21º, nº 2, prevê-se a responsabilidade
solidária dos sócios de responsabilidade ilimitada – Apesar de restrita aos casos de liquidação da sociedade ou
entidade sujeita ao mesmo regime de responsabilidade a que acresce a responsabilidade solidária e ilimitada
dos sócios das sociedades em geral, em caso de liquidação da sociedade, pelas dívidas fiscais ainda não
exigíveis à data da liquidação. Cfr. art. 147º, nº 2 do CSC e 18º da LGT.
146
V. RIBEIRO, Maria de Fátima, A Tutela…, ob. cit. p. 457 e ss.

61
que oculto -, permitindo-se a sua responsabilização, nos termos do artigo 24º, nº 1 da LGT.
Enquanto sócio, não poderá ser responsabilizando, só o sendo na qualidade de gerente – de
facto. Assim se solucionando os problemas que a doutrina da desconsideração pretende
resolver, mas sem a ela recorrer. Sem prévia previsão legal, a doutrina não poderá ser
mobilizada pelo credor tributário, havendo que aguardar a sua inclusão na figura da
responsabilidade tributária regulada na LGT.
Hoje, esta teoria tem posição no Direito e, independentemente da explicação
dogmática que se lhe aplique, não pomos em questão o seu mérito em encontrar as soluções
mais adequadas à prossecução dos princípios jurídicos, e à resolução dos mais variados
problemas, pelo que ignorá-la seria uma afronta aos valores basilares do júris, e um apoio
ao enfraquecimento de todo o ordenamento.

3 - A ELIMINAÇÃO DA DUPLA TRIBUTAÇÃO

A dupla tributação pode ser definida como a situação de concurso de normas em que
o mesmo facto tributário se integra na hipótese de incidência de duas normas tributárias
diferentes147. Tal situação implica não só a existência da identidade do facto tributário, como
também a pluralidade de normas tributárias. Como identidade do facto tributário exigir-se a
regra das quatro identidades, sendo necessária a verificação da identidade do sujeito, a
identidade do objeto, a identidade do período de tributação e, por último, a identidade do
imposto. Apesar de haver quem defenda que a primeira identidade não é exigível, bastando
a verificação das restantes, a posição que acolhe mais defensores é aquela que distingue
dupla tributação jurídica da dupla tributação económica (também designada por
sobreposição de impostos).
Na dupla tributação jurídica, o mesmo facto tributário cai sob a previsão de duas
normas diferentes de incidência fiscal na qual a identidade é total, verificando-se que o facto
tributário é idêntico, quanto ao sujeito, ao objeto, ao período tributário e ao imposto. Na
dupla tributação económica não há identidade do sujeito, existindo, assim, uma diversidade

147
os tribunais portugueses têm entendido que há violação da boa-fé quando a sociedade é utilizada pelos
sócios para contornar uma obrigação legal ou contratual, utilizando a sociedade para mascarar situações
ilegítimas. Também CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., pp. 218-226.

62
de sujeitos. A dupla tributação económica está, essencialmente, relacionada com a
organização dos fatores e a estruturação da produção, implicando a circulação dos
rendimentos por diversos sujeitos tributários, num mesmo período tributário. É o que
acontece na típica situação da tributação dos lucros distribuídos na qual determinado
rendimento é tributado em sede de IRC, como rendimento da sociedade e, em sede de IRS,
como rendimento do sócio. Porém, relativamente às identidades do sujeito e do imposto,
deve-se considerar que as mesmas ocorrem, se houver uma identidade substancial, ou seja,
e tomando como exemplo a identidade do imposto, o que é necessário é que dos aspetos
materiais e bases de cálculo ou outras características resulte uma analogia substancial.
A verdade é que, a igualdade fiscal, aferida pela capacidade contributiva, em
princípio, não obsta a existência de dupla tributação interna, quer seja jurídica, quer seja
económica. O legislador fiscal não está constitucionalmente impedido de estabelecer
situações de dupla tributação, pois não lhe poderá ser negada a ampla liberdade,
relativamente à configuração concreta do sistema fiscal. O que lhe é negado é que dessa
cumulação resulte uma tributação excessiva ou com caráter confiscatório. Também não
poderá estabelecer duplas tributações arbitrárias, submetendo a certa uma carga fiscal
determinados contribuintes e não outros com semelhante capacidade contributiva. A dupla
tributação apenas poderá ser contestável quando envolva a violação de princípios ou
disposições constitucionais e, especificamente, quanto à dupla tributação económica,
deveremos mobilizar a ideia de sistematicidade para se apurar se o legislador, ao
estabelecê-la, foi coerente consigo mesmo, conformando-se com o sistema jurídico por ele
adotado e respeitando assim a lógica material do sistema148.
Ora, o combate à dupla tributação económica é o terceiro objetivo que a
transparência fiscal se compromete cumprir, pois, após a sociedade, sujeito passivo de IRC,
ter liquidado o imposto devido, existindo lucros distribuíveis, é necessário aprovar as contas
e deliberar a respetiva distribuição aos sócios. Os lucros devem ser distribuídos, já que é
direito dos sócios quinhoar nos lucros149. Porém o n.º 1 do artigo 31.º do CSC vem impor
um limite formal a tal decisão, uma vez que determina que, salvo os casos de distribuição
antecipada de lucros e outros previstos na lei, nenhuma distribuição de bens sociais, pode
ser feita aos sócios sem ter sido objeto de deliberação destes. Nesta linha, avançam outros

148
CASALTA NABAIS, José, O Dever Fundamental de Pagar Impostos – Contributo para a Compreensão
do Estado Fiscal Contemporâneo, Almedina, Coimbra, 2012, pp. 511-603.
149
Cfr. 21º, n.º 1, al. a) do CSC.

63
preceitos cujo intuito é o de salvaguardar o princípio da intangibilidade do capital social, e,
por isso, constituem também limites, mas desta vez, materiais: não podem ser distribuídos
os lucros necessários para cobrir prejuízos ou para formar ou reconstituir reservas nem
enquanto as despesas de constituição, de investigação e de desenvolvimento não estiverem
completamente amortizadas150. Também não podem ser distribuídos aos sócios bens da
sociedade, quando a situação líquida desta for inferior à soma do capital e das reservas que
a lei ou o contrato não permitem distribuir aos sócios ou se torne inferior a esta soma em
consequência da distribuição. Caso estes obstáculos não se verifiquem e a sociedade sujeita
ao regime geral de tributação em IRC proceda à distribuição dos lucros, os mesmos, ao
ingressarem na esfera jurídica dos sócios, serão tributados como categoria E do IRS, como
rendimento de capitais, de acordo com o artigo 5º, n.º 1 do CIRS.
Assim, em resposta à questão de se saber se a dupla tributação económica deve ou
não ser eliminada, lembramos que o legislador institui no artigo 6º do CIRC um sistema de
supressão. Esta questão avulta se em causa estiverem sociedades nas quais o elemento
pessoal é dominante – como são as sociedades de profissionais –, particularmente, nas
sociedades em que existem sócios que respondem pessoal e ilimitadamente pelas dívidas
desta. Face à ampla liberdade existente, a atenuação ou eliminação da dupla tributação é,
fundamentalmente, uma opção política económica entre o favorecimento do
autofinanciamento das empresas, refreando a distribuição de dividendos, e a não
penalização do heterofinanciamento através do desenvolvimento e dinamização do mercado
financeiro que o sustenta151.
A particularidade da transparência fiscal é que a matéria coletável é determinada nos
termos do CIRC e, em seguida, imputada aos sócios, no seu rendimento tributável para
efeitos do IRS ou IRC, consoante sejam pessoas singulares ou coletivas. Assim, a dupla
tributação económica deixa de acontecer, na medida em que a situação de um rendimento
ser tributado num determinado momento em sede de IRC, a título de lucro e, noutro
momento, em sede de IRS, a título de dividendos, já não se verifica. Ao imputar-se todo o
rendimento da sociedade aos sócios por uma só vez e, a nesse nível ser tributado, deixa de
ter lugar qualquer tributação do rendimento como rendimento da sociedade152. Para Nuno de

150
Cfr. n.º 1 e 2 do artigo 33.º do CSC.
151
CASALTA NABAIS, José, O dever fundamental ..., ob. cit. p. 604.
152
Na versão original do CIRC eram três as alternativas para eliminar a dupla tributação: o regime de
transparência fiscal, a exclusão da base tributável do IRC de rendimentos já anteriormente tributados nesse
imposto, por meio da aplicação do anterior 45º CIRC e que excluía deste regime as entidades que, podendo

64
Sá Gomes, esta imputação conduz também à prevenção da evasão fiscal mediante a não
distribuição de lucros ou a constituição de reservas, pelo que a desconsideração da
personalidade jurídica destas entidades é, nestes termos, uma medida fiscal antiabuso153.
O legislador considera que o âmbito subjetivo deste instituto é fundamentado pela
capacidade económica que os respetivos sócios possuem, ao invés de essa detenção ocorrer
por parte da sociedade. A diferenciação económica entre a sociedade e os respetivos sócios
é ténue e, consequentemente, o mesmo acontece em relação à capacidade contributiva destes
e da respetiva sociedade. O valor que a sociedade possui não resulta fundamentalmente do
capital que nela foi investido, mas sim da pessoa dos seus sócios – o que se verifica com
mais intensidade nas sociedades de profissionais – que, não raras vezes, nelas exercem a sua
atividade profissional. Desta forma, o lucro será a remuneração do êxito da dedicação dos
sócios que nela investiram o seu trabalho e não o seu capital154.
O CIRC prevê, a par da transparência fiscal, outros mecanismos tendentes à
eliminação ou atenuação da dupla tributação económica dos lucros distribuídos,
nomeadamente, a exclusão da base tributável do IRC de rendimentos já tributados neste
imposto, previsto no artigo 45°; a tributação pelo lucro consolidado, estatuída no artigo 59º;
e o método do crédito de imposto, consagrado no artigo 72º. Relativamente ao último atua
por dedução à coleta, mas aos sócios de uma sociedade transparente será vedado o direito a
este crédito de imposto, relativamente aos lucros distribuídos pela sociedade, visto o próprio
regime eliminar totalmente a dupla tributação económica. Não obstante, caso a própria
sociedade transparente tenha recebido dividendos, provenientes da sua participação noutra
sociedade, os respetivos sócios poderão deduzir à sua coleta de IRS ou de IRC, consoante o
caso, o crédito de imposto correspondente à parte dos resultados imputado, relativamente
àqueles dividendos.

dele ser beneficiadas, estivessem abrangidas pela transparência fiscal e por último, o regime de tributação pelo
lucro consolidada previsto no artigo 59º CIRC que impedia a dupla tributação que pudesse acontecer em relação
às operações entre sociedades incluídas no âmbito de aplicação desse regime. Como mecanismo de atenuar a
dupla tributação, os artigos 71º, n.º 2, al. a) e 72º do CIRC e o artigo 80º, n.º 3 CIRS vigentes na época, que
previam que houvesse lugar a um crédito de imposto de 20% do IRS que tivesse recaído sobre o lucro
distribuído, sob forma de uma dedução à coleta do IRS ou do IRC que fosse apurada, quando na matéria colável
de um sujeito passivo fossem incluídos rendimentos correspondentes a lucros distribuídos por entidades com
sede ou direção efetiva em território português, sujeita a IRC e não isenta, nos casos não abrangidos pelo 45º,
n.º 1 CIRC. Sobre este tema: Maria de Lourdes CORREIA e VALE e Manuel H. de Freitas PEREIRA, ob. cit.
153
SÁ GOMES, Nuno, Manual de Direito Fiscal, Vol. II, ob. cit., p. 141.
154
MORAIS, Rui Duarte, Sobre o IRS, 3ª ed., Coimbra, Almedina, 2016, p. 205

65
Mas a transparência transporta-nos para questões que, no limite, põem em causa os
fundamentos do sistema fiscal: deverá haver lugar a uma tributação separada das sociedades
(e outras pessoas coletivas) porque são detentoras de capacidade contributiva autónoma ou,
por sua vez, tal característica é algo indissociável das pessoas singulares155? Faz sentido
atribuir à sociedade uma capacidade tributária separada dos sócios que a constituem, de
modo a justificar e legitimar um imposto sobre as sociedades independente do importo
pessoal do rendimento, ou seja, um absolute corporation income tax?
Não poderíamos estudar este regime sem sabermos como é legitimada a opção
legislativa de, perante as situações aí estatuídas no artigo sexto do CIRC, dar primazia à
capacidade contributiva dos respetivos sócios e sem averiguarmos quem é que é realmente
titular desta capacidade. Para isso, teremos de fazer referência à articulação no ordenamento
jurídico-tributário do imposto sobre o rendimento das pessoas físicas e do imposto sobre o
rendimento das coletivas e ao princípio da capacidade contributiva.

3.1 – O imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas e sobre as pessoas


singulares

O princípio da tipicidade e o princípio da legalidade são dois limites fundamentais


ao poder de imposição do legislador. O primeiro exige a verificação de lei formal do
parlamento e o segundo, de natureza material ou substancial, encontra-se vertido no
princípio da igualdade e da capacidade contributiva156. A igualdade fiscal possui uma
vertente de generalidade e numa vertente de uniformidade. Quanto à generalidade, significa
que sobre todos os cidadãos recai o dever fundamental de pagar impostos, demonstrando-
nos que a incidência tributária apresenta caráter fundamental e não discriminatório. A
uniformidade exige que semelhante dever seja aferido pelo mesmo critério157, implicando
igual imposto para os cidadãos com igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e
diferente imposto, em termos qualitativos ou quantitativos, para os que dispõem de diferente

155
XAVIER DE BASTO, José, O imposto sobre as sociedades e o imposto pessoal de rendimento - separação
ou integração, Coimbra, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1980, p. 353.
156
TAVARES, Tomás, «Da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o direito fiscal na
determinação do rendimento tributável das pessoas coletivas: algumas reflexões ao nível dos custos», CTF, n.
º 369, outubro-dezembro de 1999.
157
CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., ob. cit.

66
capacidade contributiva, na proporção desta diferença (igualdade vertical). Configurando o
princípio geral da igualdade como uma igualdade material, podemos afirmar que a
repartição da carga tributária entre os sujeitos passivos se rege por um mesmo critério que é
o da capacidade contributiva, capacidade económica158, capacidade de pagar ou ability to
pay. Um sistema fiscal justo exige que se tributem os rendimentos realmente auferidos pelos
contribuintes, caso contrário, afrontar-se-ia o princípio da igualdade tributária. A capacidade
contributiva não será determinada para as pessoas coletivas em iguais termos que é efetuado
para as pessoas singulares. Relativamente a estas, releva uma capacidade contributiva
subjetiva, em atenção às capacidades económicas do indivíduo e até ao seu agregado
familiar. Por sua vez, para as pessoas coletivas, vigora uma capacidade contributiva
objetiva, espelhada numa tributação proporcional, bastando-lhe uma realidade económica
(rendimento, património ou despesa), considerando, o n.º 2 do artigo 104º da CRP, que a
tributação deverá incidir sobre o seu lucro real (realmente verificado e anualmente variável).
Parece ser imperativo que os entes coletivos suportem uma determinada carga fiscal
pelos rendimentos gerados, desde logo, por duas razões: a partir da lógica do benefício, os
entes coletivos deveriam contribuir em função das utilidades facultadas pelo Estado, as quais
assumem feições diretas – ligadas imediatamente coma atividade societária, e indiretas –
vertidas na admissibilidade estadual de veste societária como forma de limitação da
responsabilidade; e em segundo, a autónoma personalidade jurídica societária resultaria a
imputação de uma esfera própria de direitos e deveres, correspondendo a capacidade
contributiva a uma das dimensões dessa personalidade. Porém, estes argumentos não
procedem.
A teoria do benefício poderia justificar um imposto baseado no tipo ou no nível de
produção de bens públicos que são consumidos pelas sociedades, mas nunca fundamentaria
um imposto sobre o lucro. Além de que, a capacidade fiscal é a capacidade de pagar
impostos, o que implica o sacrifício de os pagar. Ora, as sociedades não podem sentir
sacrifícios, só podem senti-los os indivíduos; só estes, portanto, são suscetíveis de
capacidade fiscal159. Dado o fenómeno da repercussão fiscal sobre as pessoas físicas

158
Sabemos também que capacidade contributiva significa capacidade económica, por obrigatória imposição
sobre manifestações de riqueza. Aliás, não esqueçamos que a designação capacidade económica é sempre a
utilizada no ordenamento jurídico espanhol, pelo que, defende-se a similitude de capacidade contributiva e
capacidade económica. V. TAVARES, Tomás, ob. cit.
159
TEIXEIRA RIBEIRO, José, «O Imposto de Rendimento das Pessoas Coletivas», BCE, Vol. XXXI, 1988,
p. 6.

67
(sócios), é o indivíduo que, em última ratio, sente o peso do sacrifício tributário conexo com
a redução da capacidade potencial e de consumo, e só ele usufrui dos benefícios decorrentes
dos serviços públicos160. Deverá ser o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares a
tomar-se como padrão, visto estas serem, para alguns, as únicas com capacidade contributiva
e que, por isso, devem ser consideradas as grandes protagonistas de qualquer sistema fiscal,
pensamento que em muito influenciou o surgimento da transparência fiscal, em diversos
países, para as sociedades de pessoas.
A capacidade contributiva autónoma das sociedades carece de prova de que os lucros
não nascem originalmente como lucros dos sócios. A capacidade de potenciação pode ser
relevante para fundamentar a discriminação entre os impostos, mas não justifica que as
sociedades sejam entidades separadas dos seus sócios. A capacidade tributária autónoma
poderá ser aferida, se tivermos em consideração a separação entre a propriedade e o controlo
da sociedade. Os poderes de administração das sociedades tendem a ser transferidos paras
os seus dirigentes, que decidem em função do interesse da empresa, e alheia aos interesses
dos acionistas (separate entity) – patente nas sociedades de grande dimensão, nas quais os
acionistas são encarados como simples credores ou obrigacionistas que têm direito a uma
remuneração, mas não são titulares de um poder de decisão genuíno. Esta separação poderia
demonstrar que os lucros não são originariamente propriedade dos sócios que não têm o
poder para deles dispor, funcionando as suas pretensões como limitações bastante elásticas
à capacidade de ação dos gestores que possuem grande liberdade na afetação dos lucros.
Deste modo, a propriedade e controlo numa sociedade por quotas como que se fundiam num
só, contrariamente ao que aconteceria numa sociedade anónima. Mas a transparência fiscal
vai mais longe, devido às especificidades das suas entidades, a tributação deverá transferir-
se para os seus sócios e, apesar da sua personalidade jurídica, esta não deveria ser tomada
em consideração, pois analisada economicamente, a sociedade encobre as verdadeiras
unidades produtoras da sua riqueza que são os sócios. Questão mais relevante – como temos
vindo a demonstrar – no que concerne às sociedades de profissionais.
Neste plano, mais questões afloram: o objeto tributário deverá ser o lucro na sua
totalidade ou apenas o distribuído aos sócios? O imposto sobre o rendimento das pessoas
coletivas e o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares são distintos e incidem sobre

160
COSCIANI, C., La Riforma Tributaria, Firenze, La Nuova Itália, 1950, p. 43.

68
rendimentos que pertencem a sujeitos diferentes? Ou são partes integrantes de um conjunto
que visam atingir os rendimentos pessoais?
Quanto à conceção dualista, as sociedades constituem verdadeiros centros autónomos
de imputação de rendimentos e não meros distribuidores de lucros. A tributação dos lucros
societários aparece alicerçada numa capacidade tributária inata à sociedade e, por incidirem
sobre sujeitos distintos com capacidades de pagar, também, distintas, os impostos não se
adicionam no seu impacto, o que não coloca qualquer problema de articulação entre eles. Já
não fará qualquer sentido falar-se em dupla tributação dos dividendos, pois os lucros da
sociedade, no momento em que são gerados no seu seio, ainda não pertencem aos sócios, a
não ser como mera ficção jurídica, sem qualquer suporte económico real. Todavia, a sua
inviabilidade decorrerá da imposição de tribulação, face à oneração fiscal dos lucros retidos,
na esfera dos sócios de uma decisão de investimento - renuncia ao consumo imediato. Além
disso, no sistema dualista, discriminar-se-ão as pequenas empresas que reservarão maiores
lucros devido à dificuldade de financiamento alternativo (emissões de ações e obrigações),
provocando uma artificial distorção das decisões de investimento e consumo, pelo que
somente a tributação empresarial global contribui para que o imposto sobre os rendimentos
societário seja um instrumento eficaz de política económica. Sempre que a carga fiscal sobre
a mais-valia potencial revista um montante superior ao do rendimento distribuído, esta
hipótese revestirá caráter confiscatório.
O Relatório Meade do ano 1978, por exemplo, advogava que as pessoas coletivas
deviam ser tributadas autonomamente por obterem benefícios diretos da atividade financeira
do Estado. Por sua vez, no Canadá, o Relatório Carter, de 1966, defendia-se que o sistema
fiscal ideal seria aquele que abdicasse, por completo, do imposto sobre as pessoas coletivas,
de tal forma que os rendimentos por elas gerados apenas sofreriam uma incidência tributária
com direitos nessas sociedades161. Considerava, porém, que o imposto sobre as sociedades
pudesse funcionar como uma espécie de retenção por conta do imposto pessoal, ou como
uma forma de assegurar que os Estados da fonte conservassem para si próprios uma parte
dos rendimentos de capital percebidos por cidadãos estrangeiros. Ora, o problema da dupla
tributação económica, somente fará sentido em face desta última explicação, a qual é
também aquela que, modernamente, a ciência fiscal prefere.

161
SANS GADEA, Eduardo, La reforma del impuesto sobre sociedades, in XXXVIII y XXXIX semanas de
Estudios de Derecho Financiero, 1994. P. 74 a 77.

69
De acordo com a segunda conceção, o imposto sobre as sociedades seria encarado
como um substitutivo de um suplemento de imposto, e alegadas razões de discriminação
qualitativa de rendimentos imporiam que incidisse sobre os rendimentos individuais. Seria
um mero expediente técnico de cobrança que reteria na fonte o suplemento do imposto que
se pretende que recaia sobre os sócios. Encontraria justificação na maior pressão fiscal sobre
os rendimentos individuais de fonte societária relativamente aos demais, incluindo nestes os
que têm origem em atividade produtiva organizada em moldes diversos da sociedade de
capitais. Mas a fundamentação do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, que
assenta na discriminação qualitativa dos rendimentos, não constitui uma perspetiva
aceitável162. Tal é, assim, que a crítica à dupla tributação dos dividendos é bastante frequente.
Se o imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas é justificado pela necessidade de
discriminar, contra os rendimentos individuais de fonte societária, a dupla tributação é um
efeito querido e não uma distorção a requerer correção163. Não obstante, ela continua a ser
encarada como um desvio à correta aplicação dos princípios da equidade fiscal, cuja
atenuação é procurada. Cosciani164 reconhece que a tese que julga inoportuna a dupla
tributação acolhe um consenso difuso, o que explica a diversidade de soluções existentes
perante os inúmeros apoiantes do sistema clássico que a aceitava. Este autor afirma que a
discriminação contra os rendimentos de origem em lucros societários não é violador de
qualquer princípio de equidade fiscal, invocando argumentos de eficácia económica e
motivos de técnica fiscal, tais como a necessidade de integração de lacunas deixadas, a fim
de justificar o sistema clássico. Afirma, também, que uma separação do imposto sobre os
lucros das sociedades do imposto pessoal do rendimento não será possível num sistema
jurídico fiscal, alicerçado no princípio da capacidade contributiva. No entanto, poucos são

162
Cfr. TEIXEIRA RIBEIRO, José, «O Imposto…», ob. cit., p. 275 e «O Sistema Fiscal na Constituição de
1976», BCE, Vol. XXII, 1979, diz que a discriminação a favor dos rendimentos do trabalho se impõe face à
CRP que determina uma tributação mais leve da transmissão por herança dos frutos do trabalho do que da
transmissão por herança dos frutos de capital, não se compreendendo que fosse beneficiada a transmissão por
morte dos frutos do trabalho e não o dessa a sua aquisição em vida.
163
A designação dupla tributação dos dividendos não é a mais correta na medida em que não se trata de dupla
tributação em sentido técnico, a qual ocorre quando a mesma matéria coletável é atingida duas vezes pelo
mesmo imposto, o que não é o caso, a não ser que o preceptor do dividendo seja ele próprio a sociedade de
capitais em que o mesmo rendimento suportaria o mesmo imposto mais do que uma vez. Além disso, o encargo
fiscal sobre os dividendos não é duplo do que aquele que incide sobre os demais rendimentos é apenas superior,
tratando-se apenas de uma sobretributação dos dividendos que é medida pela diferença entre a taxa efetiva
incidente sobre os dividendos e a taxa marginal do imposto pessoal aplicável ao sócio que os recebe.
164
COSCIANI, C., ob. cit.

70
os países que retiram todas as consequências da teoria da integração, embora alguns se
aproximem bastante do seu modelo, como é o caso do Canadá, do México ou da Alemanha.
Todavia, o recorde do modelo tributário em apreço, traz consigo problemas de
tributação das empresas detidas por não residentes (com a impossibilidade de incidência
sobre os rendimentos originados no território) e de tributação das mais-valias potenciais.
Além de que a generalidade dos contribuintes não compreenderia a não tributação dos entes
coletivos que aparecem como geradoras de volumosos lucros, dominando vários setores
económicos, pois os indivíduos sentir-se-iam legitimados à evasão fiscal, dada a
discrepância – na sua ótica – entre os sacríficos ficais impostos aos diversos sujeitos passivos
em função da riqueza obtida.
A tributação do rendimento real cria um invisível, mas real sistema de tensão entre
os agentes económicos, tendendo à promoção da realidade e à idónea e pacifica perceção
dos outros tributos, nomeadamente do imposto sobre o rendimento, das pessoas singulares.
Perante a importância da tributação do rendimento que se apresenta como o indicador mais
perfeito165 da capacidade contributiva, não é possível conceber um sistema que prescinda
da tributação desta forma de riqueza ou que lhe atributa um caráter indireto ou residual166.
O imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas167 centra-se na atividade económica
global dos sujeitos, com a abrangência sobre a universalidade das operações de contração de
custos e de obtenção de proveitos no seio da organização.
Ao não se aceitar a necessidade de discriminação qualitativa, o IRC deixa de poder
ser um mecanismo de cobrança dos impostos sobre o rendimento da sociedade que permite
que seja cobrado um suplemento do imposto sobre os lucros que afluem os sócios. Mas não
é possível, sem quebra do princípio da progressividade, proceder à substituição integral do
imposto sobre as sociedades, pela tributação dos sócios. Somente poderemos justificar uma
taxa progressiva sobre os rendimentos societários, quando o imposto seja concebido como
autónomo, e fundamentado na capacidade contributiva da sociedade168.

165
O princípio da capacidade contributiva não oferece qualquer resposta sobre a vigência e peso relativo de
cada um dos impostos que compõem o sistema fiscal. V. TAVARES, Tomás, ob. cit.
166
O IRC e o IVA centram-se na atividade económica global dos sujeitos, com a abrangência sobre a
universalidade das operações de contração de custos e de obtenção de proveitos no seio da organização.
TAVARES, Tomás, ob. cit.
167
O mesmo em relação ao IVA.
168
Países que mantêm taxas progressivas do imposto sobre as sociedades: Luxemburgo e Suíça.

71
Relativamente à capacidade de produção de receitas, o imposto sobre as sociedades
foi pioneiro, e a imposição proporcional dos lucros mostra ser um mecanismo relevante na
acentuação da progressividade do sistema fiscal, conduzindo à redistribuição vertical do
rendimento, na medida em que as ações das grandes sociedades, principalmente das
sociedades anónimas, pertencem aos titulares de maiores rendimentos, concentrando-se os
dividendos nos escalões mais elevados do imposto pessoal, o que leva a que um imposto
proporcional sobre os lucros das sociedades tenha o efeito de um imposto pessoal
progressivo, reduzindo a concentração de rendimento. Ao absorver parte dos lucros desta,
impede-se que essa parte afetada aflua aos acionistas que, em virtude desta situação,
suportarão impostos pessoais menores dos que aqueles que sobre eles incidiriam se os lucros
tivessem entrado íntegros no seu património. Quanto mais proporcional for o imposto sobre
as sociedades, menor será a progressividade do imposto pessoal de rendimento. Deste modo,
a eliminação do imposto sobre as sociedades não se mostra aceitável, pois a concentração
do rendimento e da riqueza é algo que deverá ser atacado e a redução das desigualdades
económicas promovido. Por último, IRC será o único instrumento de que podemos lançar
mão para sujeitar a imposto os lucros das sociedades sediadas num determinado país, mas
que afluem aos patrimónios individuais de residentes no estrangeiro. E, mesmo que
defendamos que os princípios tributários não requeiram a tributação dos não residentes (visto
a justiça tributária ser justiça nacional), a tributação não pessoal dos não residentes em nada
a põe em causa. Portanto, não aproveitar a oportunidade de ir buscar receita por esta via,
seria um desperdício gratuito de matéria coletável que afrontava uma justa distribuição dos
encargos fiscais pelos residentes169.

169
Palavras de XAVIER DE BASTO, José, O imposto sobre..., ob. cit.

72
CAPÍTULO IV
O REGIME JURÍDICO

1 - NÃO INCIDÊNCIA OU ISENÇÃO?

Como já tivemos oportunidade de constatar, o artigo 2º CIRC considera como


sujeitos passivos entidades desprovidas de personalidade jurídica, mas, logo em seguida,
opta por desconsiderá-la para efeitos de aplicação do regime de transparência fiscal. Deste
modo, mostra-se imperativo averiguar se, ao artigo 6º, corresponde uma situação de não
incidência de IRC e, portanto, estamos perante um caso de exclusão tributária, ou se, por sua
vez, será uma situação de isenção subjetiva.
Analisando a questão sistematicamente, o facto deste preceito se encontrar inserido
no Capítulo I, referente à incidência do imposto sobre as pessoas coletivas, poderia levar-
nos a pensar que refletiria um caso de não incidência. Contudo, o artigo 12º, sob a epígrafe
sociedades e outras entidades abrangidas pelo regime de transparência fiscal, está
consagrado no Capítulo II, alusivo às isenções e determina que as sociedades e outras
entidades a que, nos termos do artigo 6.º, seja aplicável o regime de transparência fiscal
não são tributadas em IRC, salvo quanto às tributações autónomas. Apesar de este
normativo evitar afirmar, expressamente, que os sujeitos passivos em causa estão isentos,
preferindo a expressão não são tributados, tal inserção metódica poderá indiciar que estamos
perante uma isenção170.
Este problema tem levado a doutrina a dividir-se. Existem autores que defendem
existir uma não sujeição a IRC, enquanto outros afirmam que se trata de uma situação de
isenção. A verdade é que este normativo tem características de ambos os conceitos, sendo
difícil defini-lo, havendo até quem, como Nuno de Sá Gomes171, expressamente não tome
qualquer partido, limitando-se apenas a levantar a questão. Outros, como Correia e Vale &
Freitas Pereira172 defendem que as sociedades e outras entidades transparentes, ainda que
não tributadas em IRC, permanecem como sujeitos passivos desse imposto. Consideram que

170
V. CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., p. 501.
171
Porém, no SÁ GOMES, Nuno, Manual de..., ob. cit., p. 141, acaba por se referir a estas entidades como
sujeitos passivos de IRC.
172
V. CORREIA VALE, Maria de Lourdes/FREITAS PEREIRA, Manuel H., ob. cit.

73
isso constitui um elemento essencial do regime, pois são elas que apuram a base tributável
para efeitos de imputação aos sócios ou membros, tendo de cumprir, nos termos do n.º 9 do
artigo 117º do CIRC, um conjunto de obrigações declarativas, incluindo a de inscrição,
alteração ou cancelamento no registo de sujeitos passivos. Seriam, na classificação de
Antonini173, não sujeitos passivos diretos, mas sujeitos passivos instrumentais.
As normas de não incidência são delimitações negativas expressas da delimitação
positiva das normas de incidência. Têm conteúdo inovador e não meramente interpretativo
das normas positivas que delimitam e em que se integram, esclarecendo o que já resultava
implicitamente da filosofia que presidiu à tributação por efeito do princípio da tipicidade174.
Ao invés, as isenções fiscais não são delimitações negativas da incidência, mas sim são
situações não sujeitas a tributação. Preveem situações complexas, traduzidas por factos
impeditivos do nascimento da obrigação tributária. Encontram-se situadas no âmbito
genérico da incidência, constituindo exceções a esta que podem ser justificadas por razões
não tributárias que se sobrepõem ao interesse público da perceção do imposto. As normas
que formal e sistematicamente sejam exclusões tributárias por estarem consagradas no
Capítulo da incidência deverão ser consideradas normas de isenção, pois são abarcadas no
âmbito genérico desta, afastando a respetiva aplicação em casos excecionalmente previstos.
As isenções não devem ser confundidas com as situações de não incidência, pois para que
se verifique uma isenção tributária é indispensável uma situação de incidência, na qual a
isenção tem o efeito de afastar determinado sujeito (isenção subjetiva), ou um bem (isenção
objetiva)175. As isenções poderão ser de concessão automática, quando basta a verificação
do estatuído no respetivo preceito normativo que as consagra, ou dependentes de
reconhecimento176, quando é necessário um ato posterior de reconhecimento para que estas
operem.
Em tutela de que será uma situação isenção, Magalhães Correia177 entende que as
entidades transparentes são dotadas de características que, em abstrato, as permite serem
tributadas autonomamente em IRC, e situá-las no campo de incidência subjetiva do IRC.
Afirma que o artigo 12º está inserido no Capítulo referente às isenções e a exigência da

173
ANTONINI, Dovore tributário Interesse Fiscale e Dirittti Constituxzionale, Milano, 1996, pp, 13-16.
174
V. SÁ GOMES, Nuno, Manual de..., ob. cit., pp. 70 – 71.
175
Quanto a este tema veja-se também a obra de SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, 10ª Edição, Coimbra,
Almedina, 2000, p. 236.
176
Cfr. CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., 573-575.
177
MAGALHÃES CORREIA, Jorge, ob. cit., p. 5.

74
determinação da matéria coletável ser efetuada, nos termos do CIRC, deixaria de fazer
sentido, se não se tratasse de um caso de isenção.
Não obstante, não defendemos esta posição.
Da aplicação da transparência fiscal não resulta qualquer interpretação normativa do
estatuído no artigo 2º CIRC que delimite positivamente a incidência do IRC. Já que
legislador criou este regime de exceção, dotado de conteúdo inovador, poderia conduzir-nos
à consideração do artigo 6º, como uma norma de exclusão tributária, geradora de um caso
de não incidência. Klaus Tipke178 afirma que as sociedades de pessoas não têm o dever de
prestar nem no imposto sobre as pessoas singulares, nem no imposto sobre as pessoas
coletivas. Justifica que o lucro por si obtido é imputado aos sócios, e, então, tributado em
imposto de rendimento, se forem pessoas singulares, ou em imposto sobre as pessoas
coletivas, no caso de serem sociedades. Não se trata de um benefício fiscal (tal é a natureza
de uma isenção), mas de um elemento estruturante da configuração do nosso sistema de
tributação que, nestes casos, ultrapassando as consequências normais decorrentes da
personalidade jurídica, determina que a tributação do imposto aconteça na esfera dos
sócios179. A entidade transparente goza de capacidade jurídica, mas não é sujeito passivo da
obrigação tributária, não devido à falta de personalidade, mas sim por opção legislativa
aquando da delimitação da incidência.
Casalta Nabais180 e Saldanha Sanches afirmam que se trata de uma situação de não
sujeição. O último vai mais longe, e defende que, para as sociedades transparentes, a sua
não inclusão no número de empresas que têm uma divida fiscal de IRC deve-se a razões
puramente fiscais e estamos, por isso, perante um caso de não sujeição a IRC quanto à
obrigação principal - dívida de imposto - e de sujeição quanto às obrigações acessórias que
abrangem os deveres de cooperação181. A verdade é que o artigo 12º CIRC não deveria

178
K. Tike, Steuerrecht Ein Systematischer Grundiss, 10º ed., p. 149.
179
MORAIS, Rui Duarte, Apontamentos ao IRC, Coimbra, Almedina, 2009, p. 40.
180
Também estaremos perante uma situação de não sujeição no caso dos partidos políticos (art. 8º, n.º 1 da Lei
nº 56/98, de 18 de agosto), das entidades cuja atividade esteja sujeita ao imposto de jogo (artigo 7º). Neste
sentido, Cfr. CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., p. 573.
181
É esta a tese defendida por SALDANHA SANCHES, José, «Sociedades Transparentes: alguns problemas
do seu regime», Fisco, n.º 17 (1990), p. 36. Também o Dr. Casalta Nabais se refere a um caso de não sujeição,
v. CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., p. 535. No mesmo sentido v. GARCIA-LASTRA, Cármen,
«Regímen Fiscal de la Transparência Fiscal Interna, na obra colectiva», Manual del Impuesto sobre
Sociedades, Instituto de Estudios Fiscales, Madrid, 2003, pp. 813-850, onde afirma que, em Espanha, está
sujeita, e não isenta, ao IS.

75
constar no Capítulo relativo às isenções, mas sim junto ao artigo 6º CIRC182, pois trata-se de
uma sujeição instrumental e necessária para a definição do regime de transparência183.

2 – OS RESULTADOS A IMPUTAR AOS SÓCIOS

Os resultados a imputar aos sócios não serão os mesmos para todas as entidades
transparentes, o que nos leva a poder afirmar que estas se encontram divididas em duas
categorias: as sociedades transparentes e os grupos transparentes. A razão da distinção está
no facto de, enquanto no primeiro caso o que se imputa é a matéria coletável determinada
nos termos do CIRC, no segundo procede-se à imputação de lucros ou prejuízos apurados,
nos termos do mesmo Código.

2.1 – Nas sociedades transparentes

Tal como consta no n.º 1 do artigo 6º CIRC, para as sociedades transparentes, o


resultado a imputar aos sócios será a matéria coletável184 determinada nos termos do CIRC:
é imputada aos sócios, integrando-se, nos termos da legislação que for aplicável, no seu
rendimento tributável para efeitos de IRS ou IRC, consoante o caso, a matéria coletável,
determinada nos termos deste Código, das sociedades, com sede ou direção efetiva em
território português185. Assim, relativamente a estas, somente os valores positivos serão
imputados. Os prejuízos serão imputados de forma indireta por meio da sua dedução, no
âmbito da sociedade, aos lucros tributáveis nos exercícios seguintes186. A lei impede a

182
Algo já defendido por SALDANHA SANCHES, José, Limites ao ..., ob. cit., p. 36.
183
Vide, CORREIA VALE, Maria de Lourdes/FREITAS PEREIRA, Manuel H., ob. cit., p. 276, citando
ANTONINI, E. «Le società a base personale: transparenza fiscale del reddito», Il reddito d’impresa, II, 1974,
p. 89.
184
Cfr. art 15º, n. º 1, al. b) e n. º 2 CIRC.
185
Semelhante ao que acontecia em Espanha, em que as sociedades transparentes determinavam a sua base
tributável como qualquer outra sociedade. Cfr. art. 10.3 da Ley del Impuesto sobre las Sociedades.
186
A matéria coletável é inscrita na linha 709 do Quadro 07 da declaração modelo 22 e no campo G79 da IES,
cujo montante corresponde ao valor apurado no campo 311 do quadro 09. A tributação de uma sociedade
transparente e em IRC no regime geral distinguir-se-ão quanto ao quadro 10, constando nele apenas as
tributações autónomas a que aquela se encontra sujeita. A declaração anual (IES) deverá compreender o Anexo
G destinando ao cálculo do IRC que seria devido e à identificação dos sócios da sociedade transparente. Tanto
as deduções como as retenções na fonte serão imputadas de acordo com a percentagem de participação aplicada

76
transposição para os sócios dos rendimentos negativos, existindo imputação, somente, no
caso do montante da matéria coletável ser positiva187, não havendo, por isso, lugar a qualquer
retenção de imposto. Estes rendimentos estarão ainda sujeitos à taxa de solidariedade e à
sobretaxa extraordinária, de acordo com o artigo 68º-A e seguintes do CIRS, se a elas houver
lugar. No caso de os sócios serem pessoas coletivas, a matéria coletável que lhes é imputada
será tributada em sede de IRC, pela aplicação da taxa correspondente. O valor da matéria
coletável imputada deverá ser incluído na declaração de rendimentos, independentemente da
distribuição dos lucros, o que influencia, para os sócios pessoas singulares, o rendimento do
agregado familiar e, consequentemente, o valor de IRS a pagar, podendo mesmo resultar
numa subida de escalão188. Também poderá originar dificuldades, na medida em que podem
ter de pagar imposto por um rendimento que não receberam, por exemplo, pela maioria, em
assembleia geral, ter decidido não haver lugar a qualquer distribuição de lucros (ou uma
distribuição em montante inferior ao necessário para o pagamento do imposto)189.
Cumpre dizer-se que esta é uma imputação especial, feita nos termos do artigo 20º
CIRS a título de rendimento líquido da categoria B – Rendimentos empresariais e
profissionais –, integrando-se no procedimento de liquidação do IRS que se desenrola,
enquanto imposto de natureza pessoal, a seguir à etapa de determinação de rendimentos
líquidos da cada categoria190. A forma de determinação dos rendimentos da categoria B
encontra-se estatuído no artigo 28º CIRS, que consagra, no n.º 8, que tal pode ocorrer através
das regras do regime simplificado ou com base na contabilidade ou, em certos casos, na
categoria A. Contudo, tal não será possível, no caso da imputação prevista no artigo 20º, ou
seja, para os rendimentos imputados aos sócios que provenham de sociedades abrangidas
pela transparência. Assim, apesar dos rendimentos da categoria B poderem ser objeto de

sobre os valores constantes nos campos G02 a G06. O valor da matéria coletável a imputar deve indicar-se no
campo G79 e o montante deve corresponder ao valor apurado no Quadro 09 da declaração de rendimentos
Modelo 22.
187
Como afirma MAGALHÃES CORREIA, Jorge, ob. cit., p. 6.
188
Ac. do STA de 03.10.2001, rec. nº 026353, in Ap. DR, de 13.10.2003, pp. 2183 a 2188
O lucro tributável das empresas tem por base o lucro contabilístico, mas não se reconduz a este, pois tem em
conta também as variações patrimoniais não refletidas no lucro contabilístico. Tal significa que na
determinação do lucro tributável, o CIRC não segue o modelo da dependência total, em que haveria
coincidência do lucro contabilístico com o lucro fiscal, nem o modelo da autonomia segundo o qual o lucro
tributável seria apurado de maneira totalmente autónoma face ao apuramento do lucro contabilístico. É sim
adotado um modelo de dependência parcial do direito fiscal, face ao direito da contabilidade. A este respeito,
v. CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., p. 547.
189
MORAIS, Rui Duarte, Sobre …, ob. cit., p. 214.
190
O legislador entendeu que esse valor a ser tributado não é um rendimento efetivamente auferido, mas apenas
uma imputação para efeitos fiscais. CASALTA NABAIS, José, Introdução, ob. cit., p. 125.

77
diferentes formas de tributação, são, neste caso, considerados na sua totalidade. Portanto,
será esse o valor a tributar através da aplicação direta das taxas de IRS. Ao montante
imputado será vedada a possibilidade de efetuar quaisquer deduções específicas relativas à
categoria B.
A tributação das sociedades transparentes encontra-se partilhada por dois Códigos:
o CIRC e o CIRS. O primeiro regula a tributação enquanto rendimento empresarial gerado
numa empresa societária, e estabelecendo o segundo uma pessoalização da tributação desse
mesmo rendimento através da sua integração no rendimento global relevante em sede do
apuramento do IRS a pagar191. No que à transparência diz respeito, esta partilha não se
identifica com a atinente aos rendimentos empresariais ou profissionais em IRS, cuja
determinação, quando não abrangidos pelo regime simplificado, é efetuada segundo as
regras estabelecidas no CIRC, com as adaptações resultantes do CIRS (art. 32º CIRS). Pois,
nesta situação, o CIRS não só procede à personalização desses rendimentos, em sede da
determinação do IRS a pagar, como também na etapa anterior de determinação do lucro
tributável como rendimento liquido que será, posteriormente, objeto englobamento.

2.2 – Nos grupos transparentes

Quanto aos ACE e aos AEIE, com sede ou direção efetiva em território português,
que se constituam e funcionem nos termos legais, são também imputáveis diretamente aos
respetivos membros, integrando-se no seu rendimento tributável, aplicando-se-lhes o
estabelecido no n.º 2 do artigo 6º192. Respeitar-se-ão as regras do CIRC até ao momento de
imputação da matéria coletável. No entanto, aos membros que constituem estas entidades e,
apesar de o lucro não constituir o seu objetivo principal, é-lhes imputado o lucro tributável
ou o prejuízo fiscal do período, apurado, como já sabemos, também nos termos do CIRC193.
Porém, daqui em diante, algumas diferenças se assinalam: a operação de imputação é feita

191
CASALTA NABAIS, José, Introdução ao Direito Fiscal das Empresas, 2ª ed., Almedina, Coimbra, 2015.,
p. 126.
192
Os lucros tributáveis dos ACE e dos AEIE, se estiverem sujeitos a IRC, terão de constar na linha 709 do
quadro 07 da declaração modelo 22 e o campo G80 da IES deverá ser preenchido com o valor apurado nos
campos 777 ou 778 do quadro 07 da modelo 22, se o que estiver em causa for prejuízo ou lucro fiscal,
respetivamente.
193
No caso dos ACE, o lucro pode ser uma finalidade acessória, desde que expressamente autorizada pelo
contrato constitutivo.

78
mais cedo do que no caso das sociedades previstas no n.º 1 do artigo 6º, e a dedução de
eventuais prejuízos fiscais ou benefícios fiscais, verificados em anos anteriores, será aqui
efetuada ao nível do rendimento das entidades que compõem o agrupamento.
Nos períodos em que a grupo transparente obtenha um resultado negativo, ao ser
imputado esse valor aos respetivos membros, haverá um efeito direto sobre o seu resultado
fiscal desse período, uma vez que outros rendimentos, eventualmente obtidos, poderão ser,
desta forma, absorvidos. Ou seja, os resultados negativos também lhes são imputados,
permitindo-lhes que sejam consumidos por outros rendimentos que, eventualmente, tenham
tido. Imputar-se-á aos sócios o lucro tributável, se o houver, ou os prejuízos. Deste modo,
podemos afirmar que, comparativamente com sociedades do primeiro grupo, esta diferença
de tratamento é mais favorável para os membros que integram os ACE e os AEIE que obtêm
uma explícita vantagem ao nível da tributação.

2.3 – A impugnação da matéria coletável

Quando o ato a impugnar contiver efetivamente a apreciação da legalidade de um ato


de liquidação, a impugnação judicial é o meio processual adequado, daí não o podermos
deixar de salientar. Já vimos que o artigo 6º se traduz numa situação de não incidência e que
o pagamento do imposto como que é transferido para as pessoas dos respetivos sócios ou
membros, em sede de IRS ou IRC. Tratando-se de correções à matéria coletável, tal implica
que a AT promova as correspondentes notificações, àqueles, na liquidação efetuada,
cobrando-se ou anulando-se as diferenças apuradas, como resulta do art. 100º do CIRC. É
uma liquidação adicional, ou uma total ou parcial anulação em IRC ou IRS, que constitui
um ato corretivo, mas obrigatório para si. Algo que levou o Ofício-Circulado n.º 5/94, de 16
de fevereiro a esclarecer que a entidade transparente deverá ser notificada das correções de
natureza quantitativa suscetíveis de recurso hierárquico, nos termos do art. 112º CIRC
(atual art. 137º). O STA defende que a imputação de matéria coletável estabelecida nos nºs.
1 e 3 do art. 5º do CIRC (atuais n.ºs 1 e 3 doa art. 6º) e no art. 19º do CIRS se há-de
reconduzir, ainda assim, a uma presunção legal que, face ao disposto no art. 73º da LGT
deve ter-se por ilidível194. O TCA Sul veio já pronunciar-se, remetendo para os n. ºs 1 e 5 do

194
Ac. do STA de 29.02.2012 (Proc. n.º 0441/11) e do TCA Norte de 29.01.2015 (Proc. n.º 00022/01) que
afirma que da interpretação do n.º e 3 do art.º 84.º do CPT decorre que a decisão que fixe a matéria tributável,

79
artigo 137º que estipulam que os sujeitos passivos de IRC, os seus representantes e as
pessoas solidária ou subsidiariamente responsáveis pelo pagamento do imposto podem
reclamar ou impugnar a respetiva liquidação e que podem ainda reclamar e impugnar a
matéria coletável que for determinada e que não dê origem a liquidação de IRC, com os
fundamentos e nos termos estabelecidos para a reclamação e impugnação dos atos
tributários. O mesmo acórdão determina que não pode haver impugnação da matéria
coletável que tenha sido determinada, pois ela dá origem a IRC. Só seria admissível
impugnação judicial dessa matéria se ela não desse origem a liquidação de IRC ou de IRS.
Conclui que à sociedade abrangida pelo regime de transparência fiscal é vedada a
possibilidade de reclamar ou impugnar autonomamente a matéria coletável que foi
determinada e que deu origem à liquidação de IRC, só lhe assistindo, nesta situação,
recorrer hierarquicamente, em consonância com o n.º 2 do art. 112 do CIRC195.

2.4 – A partilha de resultados

É-nos dito pelo n.º 3, do artigo 6º, do CIRC que a imputação a que se referem os
números anteriores é feita aos sócios ou membros nos termos que resultarem do ato
constitutivo das entidades aí mencionadas ou, na falta de elementos, em partes iguais, na
mesma linha, o ponto 3 do preâmbulo deste Código, afirma, expressamente, que a
transparência fiscal se caracteriza pela imputação aos sócios da parte do lucro que lhes
corresponder.
Consideramos que a redação deste preceito, apesar de semelhante ao consagrado no
ordenamento-jurídico espanhol, não é propriamente satisfatória196. A mera referência ao ato
constitutivo e à repartição pelos sócios em partes iguais é insuficiente, podendo gerar
situações, em nosso entender, manifestamente injustas, em colisão até, com as finalidades
do regime.

com fundamento na sua errónea quantificação, cabe reclamação dirigida à comissão de revisão, a qual é
condição da impugnação judicial com fundamento em errónea quantificação da matéria tributável. Os
cônjuges dos sócios das sociedades profissionais, não sócios não têm de ser notificados para requerer a
matéria coletável apurada de IRC, nos termos do n.º 3 do art. 84º do CPT.
195
V. Acórdãos do TCA Sul de 14.12.2011 e de 08.11.2005 (Proc. n.º 2522/08 e 0069/05).
196
A Ley 40/1998, de 9 de diciembre, no art. 72º, relativamente às imputación de bases imponibles, alterou a
tributação dos sócios pessoas físicas, estabelecendo que a imputação ser-lhes-ia efetuada de acordo com o
estatuído nos estatutos sociais ou, caso estes não o determinassem, de acordo com a participação no capital
social. V. Ac. do TS, n.º ROJ STS 5486/2002, STS 2599/2002, STS 8462/2001 e ATS 11231/200.

80
Primeiro. Aquando da constituição da entidade transparente, os sócios ou membros
devem mencionar, no ato constitutivo, o critério de imputação a aplicar, uma vez que se nada
for dito, a medida residual será a imputação em partes iguais.
Segundo. O ato constitutivo pode não se encontrar atualizado sobre as reais
participações dos seus sócios, uma vez que a previsão de uma futura alienação de
participação não é de consagração obrigatória no mesmo, nem a efetiva alienação obriga a
uma alteração do contrato de sociedade197. Também aqui se procederá à repartição igualitária
do rendimento da sociedade, imputando a matéria coletável, aos sócios, em partes iguais e,
mais uma vez, estaremos perante uma injustiça198.
Em ambos os casos, se a imputação for efetuada de acordo com a segunda parte do
n.º 3, poderá acontecer que os sócios minoritários, com participações percentualmente
inferiores serão penalizados, na medida em que ser-lhes-á imputada a matéria coletável
dividida, em partes iguais, pelo numero de sócios, ou seja, acabarão por ser tributados por
um valor superior ao que efetivamente receberam. Por sua vez, os sócios maioritários sairão
beneficiados, pois, face às participações percentualmente mais elevadas, serão tributados por
um montante inferior aos rendimentos que efetivamente lhes coube, aquando da distribuição
dos lucros.
Em nosso entender, tal carece de justificação, pois, se tivermos em conta que a
transparência fiscal tem como um dos objetivos evitar a fuga à progressividade do IRS, a
defesa do princípio da capacidade contributiva é aqui posta em causa, pelo facto da
tributação dos sócios ocorrer de modo totalmente alheado à realidade e aos propósitos que o
regime pretende alcançar. Pela importância incontornável deste principio e do requisito do
“primado” da substância sobre a forma, não podemos ignorar o que acontece na realidade,
pelo que as propostas de correção do n.º 3 do artigo 6º CIRC seriam no sentido de imputar a
cada sócio o rendimento da sociedade, consoante a sua participação nos lucros. Tal seria
apurado através do ato constitutivo ou de outro elemento probatório por meio da consulta

197
Cfr. Art. 85º CSC.
198
O Ac. do STA de 15.06.2016 (Proc. 01508/13) afirma que se atendermos à letra do nº 3 do artigo 5º do
CIRC é manifesto que a deliberação da assembleia-geral para poder ser alternativa à distribuição em
proporção das quotas tinha de ter sido objeto de decisão inequívoca nesse sentido e que, sendo o sócio
participado na assembleia geral em que se procedeu à distribuição dos lucros e fixado o montante da quota
que lhe correspondia, se tal fixação for inferior à devida, é o mesmo responsável pelo atraso da liquidação
devendo por tal atraso ser condenado nos juros compensatórios devidos.

81
das participações sociais na Conservatória do Registo Comercial, visto o registo das
transmissões das participações sociais nas sociedades ser obrigatório199.
Poder-se-ia defender que mais justo seria que os lucros fossem distribuídos em
função da contribuição de cada sócio para a sua formação, independentemente da sua
participação societária. Principalmente nas sociedades de profissionais, devido à
importância da pessoa do sócio, o número de clientes para cada um será diferente,
contribuindo, por via disso, também de forma diversa para a formação dos resultados da
sociedade200. A distribuição de lucros em consideração com a performance e a faturação de
cada sócio – eat what you kill – desde há muito que vigora neste tipo de sociedades, com
mais ênfase na atividade conjunta de advocacia. Terá como pontos a seu favor, o incentivo
ao crescimento de faturação, pois, cada um somente receberá em função daquilo que faturar,
ficando a sociedade apenas com o ônus de gerir os gastos. E promoverá a contratação de
sócios, visto a sua entrada não afetar os lucros atribuídos aos restantes. Contudo, a sua
aplicabilidade prática, para além de se encontrar recheada de profundas e complexas
dificuldades, poderá pôr em causa princípios estruturantes de qualquer Estado de Direito.
Colocar-se-ão problemas no momento da avaliação do desempenho e da distribuição dos
lucros, levando à extrema competitividade profissional e à supressão do espírito solidário e
cooperativo necessário, também, no setor empresarial.
Note-se que, caso o critério de imputação seja proporcional aos custos suportados
para cada sócio, pode ser necessária, complementarmente, a implantação de um subsistema
contabilístico, nomeadamente, mapas extra-contabilísticos ou contabilidade analítica (de
custos), que sirvam de base a essa imputação201.
Por fim, em caso de liquidação de uma entidade transparente, havendo partilha dos
bens patrimoniais pelos sócios, para se determinar o resultado desta, considera-se, como
valor de realização daqueles, o respetivo valor de mercado202. Determina o n.º 5 do artigo

199
Artigo 3º, n.º 1, al. c) e e) do CIRC determina que, relativamente às sociedades comerciais e às civis sob
forma comercial, estão sujeitos a registo a transmissão de quotas de sociedades por quotas, bem como de partes
sociais de sócios comanditários de sociedades em comandita simples e a transmissão de partes sociais de
sociedades em nome coletivo, de partes sociais de sócios comanditados de sociedades em comandita simples.
200
Posição também defendida por VALENTE, M., «As sociedades de profissionais face à reforma da tributação
do rendimento», Revisores & Empresas, abril-junho de 2001 pp. 33-41. e MONTENEGRO, T. M., «O regime
de transparência fiscal», TOC, n.º 37, abril de 2003, pp. 38-45.
201
É vulgar o caso em que o ACE centralize os custos (custos comuns) que, posteriormente, são imputados
aos membros através de faturas emitidas pelo ACE, havendo necessidade de criar centros de custos e, por
conseguinte, uma contabilidade analítica.
202
Cfr. Art. 80º CIRC.

82
81º do CIRC que, aos sócios de sociedades abrangidas pelo regime de transparência fiscal,
ao valor que lhes for atribuído em virtude da partilha é ainda abatida a parte do resultado
de liquidação que, para efeitos de tributação, lhes tenha sido já imputada, assim como a
parte que lhes corresponder nos lucros retidos na sociedade nos períodos de tributação em
que esta tenha estado sujeita àquele regime.

3 – A TRIBUTAÇÃO NA ESFERA DAS ENTIDADES TRANSPARENTES

Por toda a controvérsia doutrinal e jurisprudência a si inerentes, falaremos, neste


ponto, sobre as tributações autónomas e sobre a derrama.
As tributações autónomas, previstas no artigo 88º CIRC203, foram criadas para
combater o abuso na mobilização de determinadas despesas para a esfera patrimonial da
sociedade que, devido à facilidade com que podem ser transpostas para a esfera pessoal dos
sócios, poderiam configurar rendimentos sobre os quais não incidia qualquer imposto. Ou
seja, tenta-se impedir que o sujeito passivo utilize, para fins não empresariais, bens que
geraram custos fiscalmente dedutíveis204. Têm como fim evitar que as sociedades, ou outros
sujeitos passivos de IRC, utilizem determinadas despesas para proceder à distribuição
camuflada de lucros205, essencialmente quanto a despesas com viaturas e despesas de
representação. O combate à evasão fiscal efetiva-se quando se dissuade as sociedades de
apresentá-las com muita regularidade e em grande montante, em virtude da sua realização
implicar um encargo adicional para quem nelas incorre, independentemente de a entidade
aferir lucro ou prejuízo fiscal. O seu pagamento será devido independentemente da
existência ou não de matéria coletável, pelo que tais despesas serão objeto de tributação de
forma autónoma. Devem ser consideradas imposto sobre certos tipos de despesa, não sendo
correto, em termos técnicos, considerarem-se imposto sobre o rendimento.

203
Cfr. Art. 73º do CIRS
204
MORAIS, Rui Duarte, Sobre..., ob. cit., p. 172.
205
MORAIS, Rui, Apontamentos..., ob. cit., p. 202 e ss. e VASQUES, Sérgio, Manual de Direito Fiscal,
Coimbra, Almedina, 2015.

83
Quanto às despesas não documentadas206, abrangidas também pelas tributações
autónomas, apesar de registadas na contabilidade, não existe documentação que permita
conhecer o seu fundamento ou respetivos beneficiários207. A finalidade é proceder-se à
penalização das entidades que levam a cabo este tipo de pagamentos a outras entidades que,
muito provavelmente, não declaram esses rendimentos.
Apesar da aplicação das tributações autónomas às entidades transparentes ter sido
uma questão que suscitou alguns problemas, hoje já se encontra resolvido208.
A anterior redação do artigo 12º CIRC referia-se apenas à não tributação, em IRC,
das entidades sujeitas ao regime de transparência fiscal, nada dizendo se, relativamente às
tributações autónomas, essa não incidência também se lhes aplicaria. Posteriormente, a Lei
nº 109-B/2001, de 27 dezembro209 alterou a redação deste normativo, passando a prever que
as sociedades e outras entidades a que, nos termos do artigo 6.º, seja aplicável o regime de
transparência fiscal não são tributadas em IRC, salvo quanto às tributações autónomas.
Desta forma, resolveu-se a questão de saber se, estando tais tributações intrinsecamente
ligadas ao regime do IRC e o artigo 6º corresponder a um caso de não incidência, também,
por isso, não seriam sujeitos passivos das taxas das tributações autónomas. Não obstante as
entidades transparentes não serem tributadas em IRC, o artigo décimo segundo impõem
uma exceção relativamente às tributações autónomas referentes a, por exemplo, despesas
não documentadas, despesas de representação e encargos relacionados com viaturas210.
O STA211 já se pronunciou sobre esta questão defendendo que, apesar das tributações
autónomas estarem consagradas em legislações relativas ao imposto sobre o rendimento -
tanto das pessoas singulares como das pessoas coletivas - não assumem caráter de tal
imposto e, mesmo não tributadas em IRC, as entidades transparentes estão, desde sempre,
sujeitas às tributações autónomas, não sendo a alteração ocorrida nessa norma

206
Anteriormente, designavam-se despesas confidenciais, só passando a ser despesas não documentadas com
a LOE para 2008. O que não parece que deva conduzir a qualquer alteração relativamente à distinção que vem
sendo feita doutrinal e jurisprudencialmente quanto a despesas não documentadas (confidenciais) e despesas
insuficientemente documentadas.
207
As despesas documentadas não se consideram gastos fiscais, sendo tributadas de forma autónoma a taxas
de 50% e de 70% se em causa estiverem entidades sujeitas a IRC, ou total ou parcialmente isentas de IRC,
respetivamente. A este respeito, Cfr. Artigo 88º, n.º 1 e 2 do CIRC e PORTUGAL, António, «Despesas
confidenciais», Fiscalidade, n.º 16, 2003, p. 138. e BANDEIRA, Rui, «As despesas confidenciais e
indocumentadas após a reforma fiscal», Fisco, n.º 6, 1989, p. 10.
208
SALDANHA SANCHES, José, Manual de Direito Fiscal, 3ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 406.
209
LOE para o ano 2002 e art. 12º CIRC: as sociedades e outras entidades a que, nos termos do artigo 6.º, seja
aplicável o regime de transparência fiscal não são tributadas em IRC, salvo quanto às tributações autónomas.
210
Cfr. art. 88º do CIRC referente às tributações autónomas.
211
Ac. do STA de 21.03.2012 (Proc. n.º 0830/11).

84
substancialmente retroativa. Afirma também que o artigo 12º do CIRC deve ser interpretado
como reportando-se apenas e na medida em que o regime de transparência fiscal
transpunha obrigações tributárias para os respetivos membros, o que de todo em todo
excluía as tributações autónomas atenta a sua natureza e finalidade. É justificável que assim
aconteça por razões de operacionalidade, dado que não seria correto imputar-se aos sócios
valores que estão sujeitos a tributações autónomas, para, posteriormente, essa tributação
autónoma ser efetuada ao nível desses sujeitos.
Assim, as sociedades transparentes terão de pagar o valor sobre que incide a referida
tributação, de acordo com as taxas estipuladas no artigo 88º do CIRC, seguindo os mesmos
critérios utilizados na imputação do rendimento aos sócios ou membros. Valor esse que será
deduzido ao montante que estes tiverem de pagar em sede do imposto pessoal, seja em IRS
ou IRC, e de acordo com as correções efetuadas pela direção geral dos impostos, nos termos
do artigo 100º do CIRC. Este normativo refere-se às liquidações corretivas no regime de
transparência fiscal e determina, que quando haja lugar a correções que determinem
alteração dos montantes imputados aos respetivos sócios ou membros, a Autoridade
Tributária e Aduaneira promove as correspondentes modificações na liquidação efetuada
àqueles, cobrando-se ou anulando-se em consequência as diferenças apuradas.
Quanto à derrama, até ao exercício do ano de 2006 inclusive, nenhuma questão se
levantava, já que esta incidia (até ao limite máximo de 10%) sobre a coleta de IRC e, uma
vez que nas entidades transparentes é a matéria coletável que é imputada aos sócios ou
membros, em IRS ou IRC, não se verifica a existência de coleta212. Corria o ano de 2007
quando a nova Lei das Finanças Locais213 alterou a forma de cálculo deste imposto, deixando
de incidir sobre a coleta, e passando a incidir sobre o lucro tributável dos sujeitos passivos,
com o limite de 1,5% sobre este, afirmando o artigo 14º que a derrama recairia sobre o lucro
tributável sujeito e não isento de IRC que corresponda à proporção do rendimento gerado
na (respetiva) área geográfica. Este artigo modificou profundamente o seu modo de cálculo,
levando a que possam existir sujeitos passivos sem coleta, mas sujeitos ao pagamento da
derrama214. Surgiram, então, dúvidas quanto à aplicação da derrama às entidades

212
Cfr. Art. 18º da Lei n.º 42/98, de 6 de agosto.
213
Lei nº 2/2007 de 15 de janeiro.
214
Por outro lado, sendo a derrama uma taxa proporcional, não tem em conta os vários regimes de redução de
taxa do IRC. Nestes termos, face ao regime anterior, são penalizados os rendimentos sujeitos a taxas de IRC
menores, já que em termos de derrama, passam a ser tributados por uma taxa igual a todos os sujeitos passivos
do município em causa.

85
transparentes, uma vez que estas entidades, apesar de não terem coleta, podem apresentar
lucro tributável.
No entanto, como já foi constatado, em consonância com o artigo 12º do CIRC, o
lucro tributável das sociedades abrangidas pela transparência fiscal não é passível de
tributação em IRC, pelo que, mesmo para quem considera um caso de isenção, não poderia
sobre elas incidir a derrama. Para os defensores da não incidência, o problema também não
se coloca, pois, a supramencionada lei referia sujeito e não isento. De igual forma determina
o artigo 87º-A do CIRC sob a epígrafe Derrama Estadual que esta incide sobre a parte do
lucro tributável (...) sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas
coletivas. Se dúvidas ainda restassem, neste sentido temos ainda o Ofício-Circulado n.º
20132/2008 de 14 de abril da DSIRC215 que diz que a derrama prevista no referido artigo
14º não abrange, na sua incidência objetiva, o lucro tributável das sociedades ou entidades
transparentes. E, do mesmo ano, o Despacho de 26 de março, referente ao Processo n.º
371/08216, conclui que as entidades abrangidas pelo regime de transparência fiscal
continuam a estar afastadas da incidência da derrama.
Para melhor compreendermos, foquemo-nos no que concerne aos Grupos de
Sociedades e ao RETGS. Dado que a derrama passou a ter como base o lucro tributável -
incidindo mais a montante do que anteriormente -, devem ser acolhidas as regras do CIRC
também até ao momento de determinação do lucro tributável, porque de seguida, se seguem
as regras próprias da derrama, isto é, a aplicação da taxa. De facto, no RETGS, não existindo
coleta respeitante a cada uma das sociedades, é necessária a determinação do lucro tributável
de cada uma delas, correspondendo ao que o artigo em questão estipula. Desse jeito, desde
que é determinado um lucro tributável, sujeito e não isento para efeitos de IRC, a liquidação
da derrama, passa a reger-se pelas regras próprias. Determina o artigo 70º CIRC que,
relativamente a cada um dos períodos de tributação abrangidos pela aplicação do regime
especial, o lucro tributável do grupo é calculado pela sociedade dominante, através da soma
algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações periódicas
individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo217. Tal significa que,

215
V. Anexo III. Disponível em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/AAFDD7A2-9A02-43B9-
A9B2-2B71D6F69E12/0/ofIcio-circulado_20132-dsirc.pdf
216
V. Informação Vinculativa, Processo 371/08, com despacho do Substituto Legal do Diretor-geral dos
Impostos em 26.03.2008.
217
Pode acontecer que determinado município onde está instalada uma das sociedades e que produziu lucro
tributável deixe de auferir a derrama se o grupo, no seu conjunto, apresentar prejuízo.

86
anteriormente, já foi calculado, para cada uma das sociedades, um lucro ou um prejuízo,
sendo esse o resultado que, nos termos do nº 1 do artigo 14º da Lei 2/2007, deve servir de
base ao apuramento da derrama, não tendo relevância, para este efeito, o lucro tributável do
grupo, que é posterior. Em tais declarações periódicas individuais não há um verdadeiro
apuramento de coleta, mas não é isso que se passa relativamente ao lucro tributável que é
apurado, para cada sociedade, na sua declaração individual. Assim, para as sociedades que
integram o perímetro do grupo abrangido pelo RETGS, a derrama deverá ser calculada e
indicada individualmente por cada uma das sociedades na sua declaração. Procede-se ao
somatório das derramas, competindo o respetivo pagamento à sociedade dominante. Isto é,
a derrama deverá incidir sobre o lucro tributável do grupo e não sobre o lucro individual de
cada uma das sociedades, só operando o RETGS, após o lucro tributável de cada elemento
do grupo estar apurado.
Tal como acontece na transparência fiscal, existe também aqui uma autonomia entre
IRC e a derrama que, não obstante a partilha de alguns elementos com o IRC, implica a não
consideração do RETGS para esses efeitos. No caso do RETGS, é inegável que cada uma
das sociedades é sujeito passivo de IRC, sendo igualmente incontestável que todas elas
geram rendimentos sujeitos a IRC, não sendo, em momento algum, consagrada qualquer
situação de não sujeição, de isenção, ou de exclusão de tributação para estas sociedades ou
para os seus rendimentos. Se a lei reguladora da derrama não estabelece a aplicação de um
regime especial - como o RETGS ou a transparência - esta não lhes poderá ser aplicável.
Não existe qualquer lacuna da lei, pois as regras do RETGS ou da transparência não são
convocadas e as do CIRC somente valem até à determinação do lucro tributável de cada
sociedade.
Os impostos estaduais têm por fundamento a existência de necessidades coletivas
gerais e destinam-se à criação e aplicação de meios de satisfação de tais necessidades,
devendo caber a todos os cidadãos o dever contributivo. Por seu turno, os impostos
municipais baseiam-se em necessidades exclusivamente locais, pelo que o dever
contributivo deverá caber aos cidadãos a que tais necessidades respeitem.
A verdade é que, através do RETGS, pretende-se, em sede de IRC, oferecer um igual
tratamento a uma realidade económica que vê os grupos de sociedades, em determinadas
condições, como uma única entidade, podendo ver diminuídas as contribuições que lhes
cabem na justa distribuição do dever tributário, mas contribuindo, ao mesmo tempo, com

87
outros valores coletivos qualificados pelo Estado como superiores. Deste modo, achamos
que os valores que motivam o RETGS e as finalidades da transparência fiscal não coincidem
com aqueles nos quais assenta deliberação do lançamento da derrama.

4 – AS OBRIGAÇÕES CONTABILÍSTICAS E FISCAIS

Apesar do artigo 6º se tratar de uma situação de não sujeição, as entidades


transparentes encontram-se submetidas a um conjunto de obrigações acessórias típicas deste
imposto, constituindo tais imposições um centro unitário de referência para a determinação
do rendimento a imputar a cada sócio ou membro218. Deste modo, estamos aptos para
abordarmos as diversas obrigações contabilísticas que sobre elas recaem.

4.1 – A organização da contabilidade

A fim de se proceder à determinação do lucro tributável, o artigo 17º, n.º 3 do CIRC


apela à organização da contabilidade de acordo com a normalização contabilística (e com
outras disposições legais). Face ao apuramento do lucro tributável das entidades
transparentes se efetuar de acordo com as regras desse código - como já sabemos -, estas
encontram-se abrangidas por tal normativo. Também o artigo 123º, n.º 1 do CIRC, relativo
às obrigações contabilísticas das empresas, afirma que as sociedades comerciais ou civis sob
forma comercial, as cooperativas, as empresas públicas e as demais entidades que exerçam,
a título principal, uma atividade comercial, industrial ou agrícola, com sede ou direção
efetiva em território português, bem como as entidades que, embora não tendo sede nem
direção efetiva naquele território, aí possuam estabelecimento estável, são obrigadas a
dispor de contabilidade organizada nos termos da lei que, além dos requisitos indicados no
n.º 3 do artigo 17.º, permita o controlo do lucro tributável. Da leitura conjunta dos dois
preceitos, podemos constatar que as entidades sujeitas à transparência são obrigadas a
possuir contabilidade organizada a fim de refletirem as operações por elas realizadas,

218
FALCON Y TELLA, Ramon, ob. cit., p. 148.

88
distinguindo-se as variações patrimoniais sujeitas ao regime geral do IRC das demais
operações.
As entidades transparentes, desde que não exerçam, a título principal, uma atividade
comercial, industrial ou agrícola e que não disponham de contabilidade organizada, têm a
possibilidade de optarem, de acordo com o artigo 124º do mesmo código, por um regime
simplificado de escrituração. Contudo, no que respeita ao regime simplificado de tributação,
estipula o n.º 1 do artigo 86º-A do CIRC que podem optar pelo regime simplificado de
determinação da matéria coletável, os sujeitos passivos residentes, não isentos nem sujeitos
a um regime especial de tributação, que exerçam a título principal uma atividade de
natureza comercial, industrial ou agrícola. Deste normativo conclui-se que se encontra
vedada, aos sujeitos passivos isentos ou sujeitos a um regime especial de tributação – como
é a transparência fiscal –, a possibilidade de serem abrangidos pelo regime simplificado. As
entidades transparentes veem-se, assim, proibidas em optar pelo referido regime, vindo o
ponto 2 da Circular n.º 6/2014 de 18 de março de 2014 da DSIRC reforçar esse impedimento:
o legislador excluiu do seu âmbito de aplicação subjetiva, designadamente, todos os sujeitos
passivos abrangidos pelo regime de transparência fiscal a que se refere o artigo 6º do CIRC.
Mas qual a razão desta exclusão?
O regime simplificado em IRC foi introduzido no nosso ordenamento jurídico pela
Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro219. A partir do período de 2009 foi suspenso220, mas,
devido à diminuída adesão evidenciada por parte do setor empresarial, acabou por ser
definitivamente revogado, no ano seguinte, com a LOE para 2010. Mais tarde, a Lei 2/2014,
de 16 de janeiro, responsável pela reforma do CIRC, reintroduziu-o no nosso ordenamento
fiscal. O regime simplificado em sede de IRC difere do seu homónimo em sede de IRS,
nomeadamente, quanto ao facto de, naquele ser necessária a expressa opção221 pelo regime
em questão, sob pena de se aplicar a tributação com base na contabilidade organizada
(opting in)222, pois este é um verdadeiro regime opcional e não um regime-regra que os
contribuintes podem afastar optando pelo regime geral de tributação223. Apesar de, na

219
Cfr. Decreto-Lei nº 198/2001, de 3 de julho.
220
Todavia, continuou-se a aplicar às empresas que dele estavam a beneficiar até ao termino do correspondente
período de três anos.
221
Cfr. Art. 86º-A do CIRC.
222
CASALTA NABAIS, José, Direito..., ob. cit., p. 147
223
FRANCO, Paula/SILVA, Amândio, (17 de janeiro de 2014). Regime de transparência fiscal aplicável às
sociedades de profissionais. Obtido em 2 de abril de 2016, de Ordem dos TOC, disponível em:
http://www.otoc.pt/fotos/editor2/ve_17janeiro.pdf

89
prática, a escolha empresarial pelo regime simplificado resultar, essencialmente, das
vantagens fiscais que dele se retiram, o legislador, para evitar que fosse utilizado com o
único objetivo de poupança fiscal, condicionou a sua sujeição a uma série de requisitos, cuja
verificação se impõe cumulativa224.
Distintamente do que se passa no regime geral, no regime simplificado, o rendimento
tributável resulta da aplicação de indicadores de base técnico-científica definidos para os
diversos setores da atividade económica e que variam em função da natureza dos
rendimentos225. É essa aplicação que origina, direta e automaticamente, a matéria coletável,
razão pela qual no regime simplificado não há lugar à dedução de prejuízos226 ou benefícios
fiscais227.
O n.º 2 do artigo 86º-B estatui que o montante apurado em cada período de tributação
não poderá ser inferior a 60% do valor anual da retribuição mínima mensal garantida. Para
o período de tributação do ano 2016, o valor mínimo da matéria coletável encontra-se nos
4.452,00€228. No entanto, no período de tributação do início da atividade e no período de
tributação seguinte, esse valor reduz-se em 50% e 25%, respetivamente. Aos sujeitos
passivos que tenham optado pelo regime simplificado, só lhe é permitido efetuar as deduções
à coleta nos casos de dupla tributação jurídica internacional, e relativamente às retenções
na fonte não suscetíveis de compensação ou reembolso229. Não há lugar à dedução do
pagamento especial por conta, em virtude dos sujeitos passivos a que seja aplicado o regime
simplificado de determinação da matéria coletável ficarem dispensados de efetuá-la230. O
mesmo se passa quanto ao pagamento da derrama municipal, uma vez que esta incide sobre
o lucro tributável. Ademais, de acordo com o n.º 15 do artigo 88º do mesmo Código, existem,
ainda, certas despesas que são excluídas de tributação autónoma, tributações essas que, como
já tivemos oportunidade de verificar, recaem sobre as entidades do art. 6º.

224
Cfr. art. 86-A, n.º 1 do CIRC.
225
A quantidade de coeficientes foi aumentada (o anterior regime continha somente dois coeficientes), “para
tentar abarcar expressa e individualmente os diversos tipos de rendimentos”. Além disso, as diferenças de
coeficientes entre o regime simplificado em IRS e IRC contribuem para a “fuga para o IRC da generalidade
das atividades empresariais”. V. FRANCO, Paula/SILVA, Amândio, cit., p. 164.
226
Decreto-Lei n.º 144/2014, de 30 de setembro, parágrafo 14: os prejuízos fiscais que tenham sido apurados
em períodos de tributação anteriores ao da aplicação do regime não podem ser deduzidos.
227
Estes ficam excluídos dedução à matéria coletável pelo n.º 8, do art. 90º do CIRC.
228
Valor obtido pelo seguinte cálculo: 530,00€ x 14 meses x 60%. Segundo o artigo 2º, do Decreto-Lei nº 254-
A/2015, de 31 de dezembro, o valor da retribuição mínima mensal garantida (RMMG), para 2016, é de 530,00€.
229
Cfr. 90º, n.º 8 CIRC.
230
Cfr. Art. 106º, nº 11, al. d), do CIRC.

90
Quanto ao regime simplificado em sede de tributação do imposto sobre o rendimento
das pessoas coletivas estamos esclarecidos que as entidades transparentes estão impedidas
de por ele optarem. E relativamente ao regime simplificado em sede de tributação do imposto
sobre o rendimento das pessoas singulares? Nada nos é dito expressamente, se igual destino
será o seu.
É-nos dito pelo n.º 1 do artigo 28º CIRS que a determinação dos rendimentos
empresariais e profissionais, salvo no caso da imputação prevista no artigo 20.º, faz-se:
com base na aplicação das regras decorrentes do regime simplificado; ou com base na
contabilidade. Podem optar pela determinação dos rendimentos. com base na contabilidade,
os sujeitos passivos cujo montante anual ilíquido de rendimentos da atividade no período de
tributação anterior, tenha sido igual ou inferior a 200.000€231. Existe uma percentagem dos
rendimentos obtidos que é considerada como sendo relativa a encargos próprios da atividade
e, consequentemente, está livre de impostos. Isto encontra justificação no facto de o sujeito
passivo se encontrar impedido de deduzir as despesas incorridas com o negócio, tais como
deslocações ou aquisições de bens ou serviços indispensáveis à prossecução da atividade232.
Os sujeitos passivos que obtenham rendimentos provenientes das atividades profissionais
previstas na tabela a que se refere o artigo 151º do CIRS 233, podem, após a aplicação dos
coeficientes previstos, deduzir os montantes comprovadamente suportados com
contribuições obrigatórias para regimes de proteção social, conexas com as atividades em
causa, na parte em que excedam 10 % dos rendimentos brutos, quando não tenham sido
deduzidas a outro título e, desde que, nesses períodos, o sujeito passivo não aufira
rendimentos das categorias A (rendimentos do trabalho dependente) ou H (pensões). De
acordo com o artigo 73º, n.º 8 do CIRS, determinados bens e despesas efetuadas, estão ainda
sujeitos a tributações autónomas234.

231
Também aqui, o apuramento do rendimento tributável do empresário em nome individual é efetuado pela
aplicação de um coeficiente ao valor total dos rendimentos obtidos. Além disso, no exercício de início de
atividade, o enquadramento no regime faz-se em conformidade com o valor anual de rendimentos estimado,
constante da declaração de início de atividade (art. 28º, nº 10 do CIRS), recaindo sobre o titular dos rendimentos
da categoria B que opte pelo RST, o dever de apresentar anualmente a declaração de rendimentos relativa ao
ano anterior (art. 57º do CIRS).
232
Nos períodos de tributação do início da atividade, os coeficientes das alíneas b), c) e f) (0,75, 0,35 e 0,10)
sofrem uma redução em 50% e no período seguinte à inicial, uma segunda redução em 25%, pelo que, quem
se encontra no inicio da atividade beneficia de uma diminuição do imposto a pagar.
233
Bem como os que obtenham rendimentos resultantes das vendas de mercadorias e produtos ou de prestações
de serviços efetuadas no âmbito de atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas.
234
Neste sentido, art. 73º do CIRS determina que as despesas não documentadas serão tributadas
autonomamente a uma taxa de 50% (nº 1) e, às importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas

91
Poderíamos afirmar que, caso fosse admitida esta última hipótese, como que
estaríamos perante uma dupla dedução de despesa? Parece-nos que sim, pela seguinte razão:
aquando da determinação da matéria coletável, determinadas despesas iriam ser objeto de
dedução, uma primeira vez, em sede societária e, seguidamente, já na esfera jurídica dos
sócios pessoas singulares, ao serem os coeficientes do regime simplificado aplicados às
mesmas despesas, estas despesas iriam ser objeto, em dois momentos distintos, de duas
deduções. O mesmo resulta da própria letra do artigo 20º do CIRS que, ao consagrar o
adjetivo liquido, exprime que a matéria coletável já foi objeto de dedução. Atenta nos
objetivos da transparência fiscal, também não existe qualquer indício que denote que fosse
desígnio do legislador admitir esta possibilidade.

4.2 – As obrigações acessórias

Cumpre-nos fazer uma pequena referência às obrigações acessórias a que estas


entidades estão sujeitas. Na medida em que o artigo 117º, n.º 9 CIRC afirma que não [a]
tributação em IRC das entidades abrangidas pelo regime de transparência fiscal nos termos
do artigo 6.º não as desobriga de apresentação ou envio das declarações referidas no n.º 1,
as entidades transparentes não são dispensadas da apresentação da declaração de inscrição,
de alteração ou de cessação, nos termos dos artigos 118.º e 119.º. O mesmo, também,
relativamente à declaração periódica de rendimentos235 e à declaração anual de informação
contabilística e fiscal236.
Especificamente para as sociedades de profissionais, a Circular 8, de 16 de fevereiro
de 1990 da DSIRC, veio esclarecer que estas sociedades, exercendo a título principal uma
atividade de prestação de serviços, estão adstritas ao cumprimento das respetivas
obrigações acessórias, designadamente, a dispor de contabilidade organizada e a
apresentar a declaração periódica de rendimentos.

singulares ou coletivas residentes fora do território português, e aí submetidas a um regime fiscal claramente
mais favorável, será aplicável uma taxa de 35% (nº 6).
235
Estatui o art. 117º, n.º 1, al. b) do CIRC que os sujeitos passivos de IRC, ou os seus representantes, são
obrigados a apresentar a declaração periódica de rendimentos, nos termos do artigo 120.º, pelo que, as
entidades transparentes encontram-se obrigadas a apresentar a declaração modelo 22, mesmo que a tributação
recaia sobre os seus sócios.
236
Cfr. art. 121º CIRC.

92
Destarte, decorre daqui uma dupla obrigação de declaração de rendimentos por parte
das entidades transparentes, recaindo neles não só a obrigação de declaração da sociedade
em sede de IRC, como também a obrigação da declaração de cada um dos sócios no quadro
da declaração de rendimentos, em sede de IRC ou IRS, relativamente ao correspondente
rendimento imputado237. O n.º 1 do artigo 130º impõe aos sujeitos passivos de IRC, com
exceção dos isentos nos termos do artigo 9.º, o dever de manterem um processo de
documentação fiscal. O facto de considerarmos que o artigo 6º espelha uma situação de não
sujeição (igual destino se considerássemos que seria isenção), poder-nos-ia levar a pensar
que este preceito não se aplica às entidades transparente. Porém, resulta da letra daquele
preceito que o processo de documentação fiscal deve estar constituído até ao termo do prazo
para entrega da declaração a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 117.º, e, como este
se aplica às entidades transparentes, mutatis mutandis, também estarão sujeitas às diretrizes
estipuladas no artigo 130º, nos termos que se lhes aplicarem.

4.3 – A retenção na fonte

Sobre as retenções na fonte, cumpre dizer que os entes abrangidos pela transparência
são objeto de retenção na fonte, já que têm obrigações formais inerentes à condição de
sujeitos passivo do respetivo imposto - ainda que não o sejam -, nomeadamente, em matéria
de deveres contabilísticos e declarativos, como acabámos de verificar. O IRC será objeto de
retenção na fonte, no caso de os rendimentos auferidos pela sociedade serem reconduzíveis
a um dos tipos de rendimentos previstos no artigo 94°, transferindo-se para a sociedade a
retenção que caberia aos sócios, pois o ónus de pagamento do imposto, no final, recai sobre
os sócios e não sobre o ente coletivo. Destina o n.º 4 do mesmo normativo que, sempre que
os rendimentos se enquadrem no âmbito do nº 1, aplicar-se-lhes-á a taxa de 25%, ou de
21,5% no caso de se tratar de remunerações auferidas na qualidade de membro de órgãos
estatutários de pessoas coletivas e outras entidades. Se dúvidas ainda restassem, a Circular
n.º 8238, relativamente às sociedades de profissionais, determinou que estão sujeitas às

237
CASALTA NABAIS, José, Direito…, ob. cit., p. 503.
238
V. Anexo II.

93
mesmas retenções na fonte que as restantes entidades residentes dado que os artigos 75º e
76.º do CIRC (atuais artigos 94º e 97º do CIRC) não estabelecem quaisquer restrições.
As deduções mencionadas nas alíneas a) a e) do n.º 2 do artigo 90º do CIRC, nas
quais se incluem as retenções na fonte, devem, para cumprimento do estabelecido no n.º 5
deste artigo, ser previamente quantificadas na sociedade de profissionais em impresso de
modelo oficial e, posteriormente, imputadas aos respetivos sócios, nos termos que resultarem
do ato constitutivo ou, na falta de elementos, em partes iguais. As importâncias referidas
serão deduzidas à coleta do IRS apurada com base na matéria coletável que tenha tido em
consideração a imputação prevista no artigo 6º do CIRC, a qual deve efetivar-se no ano em
que se inclua o fim do período de tributação da sociedade. Assim, aos sócios é oferecida a
possibilidade de deduzirem às respetivas coletas, na parte proporcional, as retenções
efetuadas à sociedade, como prevê o n.º 5, do artigo 90º239.
A já referida Circular impõe, ainda, que devem as entidades transparentes, nos
termos dos artigos 98º e seguintes do CIRS, proceder à retenção na fonte do IRS
relativamente aos rendimentos pagos ou postos à disposição dos seus sócios, com exceção
dos relativos a lucros ou adiantamentos por conta de lucros efetuados nos termos do Código
das Sociedades Comerciais, visto estes não revestirem a natureza de rendimentos de
capitais.
Em consequência, relativamente às remunerações auferidas por sociedades de
revisores oficiais de contas na qualidade de membros de órgãos estatutários de pessoas
coletivas, ainda que abrangidas pelo regime de transparência fiscal, há retenção na fonte de
IRC nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 94º do CIRC. Contudo, por força do artigo
97º, n.º 1, al. f) – que nos parece ter carácter excecional –, quando tiver natureza de imposto
por conta, não existe obrigação de efetuá-la240.

239
SALDANHA SANCHES, José, «Retenções na fonte no IRS: uma interpretação conforme a Constituição»,
Fisco, n. º 12/13, outubro de 1989, p. 14, afirma que para as profissões da lista anexa ao CIRS, a retenção vai
incidir sobre um rendimento tendencialmente líquido, adequando-se à realidade. Mas, no caso do profissional
se associar a outros e que não pode constituir sociedade, existem desigualdades: em relação a profissionais
semelhantes, que se forem industriais e comerciais não suportarão retenção e em relação aos que atuam através
de sociedades. Um centro de diagnostico clínico tem uma forte componente de capital fixo que o CIRS
reconhece amplamente no regime de amortizações e investimentos. Aqui, ainda que se imponha um regime
semelhante ao dos profissionais dependentes no que diz respeito à aproximação entre perceção de rendimento,
surgimento da divida fiscal, isso pode ser feito de forma mais adequada e incontroversa pelo regime dos
pagamentos por conta. No que respeita às sociedades de profissionais, as remunerações por elas auferidas na
qualidade de membros do órgão estatutários de pessoas coletivas nos termos do n.º 1 do art. 414. ° do CSC,
serão objeto de retenção na fonte atendendo ao disposto na al. d) do art. 94° do CIRC.
240
Note-se que estas nem sempre assumem a qualidade de membro de órgãos estatutários. Por exemplo, nas
sociedades por quotas obrigadas à nomeação de ROC, nos termos do art. 262º, n.º 2 do CSC, não é considerada

94
4.4 – Os pagamentos por conta

Como verificamos, o artigo 12º do CIRC estatui que as entidades transparentes não
são tributadas em sede de IRC, o que determina que estas se encontram desoneradas dos
pagamentos por conta, incumbindo tal obrigação aos sócios enquanto titulares de
rendimentos da categoria B241, de acordo com o artigo 102º CIRS. Porquanto, os pagamentos
por conta, constituindo um mecanismo em que se faculta o desdobramento do pagamento
do imposto em parcelas escalonadas no tempo, só poderão reportar-se ao imposto que é,
efetivamente, devido, ou seja, ao imposto sobre o rendimento das pessoas singulares.
Em virtude de a Circular ser anterior à publicação do DL n.º 44/98, de 3 de março,
que introduziu o pagamento especial por conta – hoje previsto no artigo 106º CIRC - e, por
isso, a nele não se referir, o mesmo se lhes aplica, pelas iguais razões que valem para o
pagamento especial por conta. Ademais, o Ofício-Circulado 82/98, de 18 de março242, à
pergunta – as sociedades de transparência fiscal ficam sujeitas a pagamento especial por
conta? – responde – não, já que não são tributadas em IRC.

5 – O REGIME CONTRIBUTIVO DAS SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS

Como já tivemos oportunidade de verificar, a integração de uma sociedade de


profissionais na transparência tem implicações ao nível dos impostos sobre o rendimento.
Quais serão, então, as consequências a nível contributivo?
O artigo 132º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de
Segurança Social estatui que sejam obrigatoriamente abrangidos pelo regime dos
trabalhadores independentes as pessoas singulares que exerçam atividade profissional sem
sujeição a contrato de trabalho ou a contrato legalmente equiparado, ou se obriguem a
prestar a outrem o resultado da sua atividade, e não se encontrem por essa atividade

órgão de fiscalização, apesar de exercer as funções de fiscalização previstas neste normativo e se encontre
sujeita ao regime de incompatibilidades estatuído para os membros do Conselho Fiscal (262, n.º 5).
241
V. Circular n. º 8.
242
Disponível em: http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/42BC0BD0-A2EC-4913-98AC-
67D73FFA17DA/0/oficio-circulado_82-98_de_18-03_direccao-geral_dos_impostos.pdf.

95
abrangidos pelo regime geral de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem.
Seguidamente, estabelece o artigo 133º, n.º 1, al. b) que se encontram abrangidos pelo regime
dos trabalhadores independentes os sócios ou membros das sociedades de profissionais
definidas na alínea a) do n.º 4 do artigo 6º do CIRC. Da análise aos referidos normativos,
podemos concluir que os membros das sociedades profissionais encontram-se abrangidos
pelo regime contributivo aplicável aos trabalhadores independentes, uma vez que exercem a
sua atividade profissional por meio da sociedade transparente.
Constata-se, na sequência da reforma do CIRC, o legislador não procedeu a qualquer
ajustamento ao CRCSPSS, a remissão efetuada pelo artigo 133º, n.º 1, al. b) para o n.º 4, do
artigo 6º do CIRC, conduziu ao alargamento do âmbito subjetivo do regime dos
trabalhadores independentes. Por conseguinte, cabem na previsão daquele preceito, não só
os sócios que exerçam a sua atividade profissional através da sociedade, bem como os sócios
profissionais e não profissionais das entidades transparentes previstas no artigo 6º, n.º 4, al.
a) subalínea 2) do CIRC.
Contudo, pensamos que o artigo 133º, n.º 1, al. b) somente tem aplicação para os
sócios profissionais. Este normativo remonta à redação do artigo 6º, n.º 1, al. b) do DL n.º
328/93, de 25 de setembro243, cuja remissão para o CIRC apenas abrangia as sociedades de
profissionais transparente constituídas só por sócios profissionais. É nítido que o legislador
pretendera sujeitar às contribuições para a Segurança Social aqueles que exerciam a sua
atividade profissional independente, quer por meio de uma sociedade, quer de forma
individual. Todavia, este preceito foi mobilizado para o CRCSPSS, não se procedendo a
alterações à sua redação, o que demonstra que o legislador não teve qualquer intenção de
alargar o seu âmbito subjetivo aos sócios não profissionais da subalínea 2) do CIRC. O artigo
133º, n.º 1, al. b) deverá ser interpretado em atenção à alínea a) do mesmo preceito, relativa
à incidência subjetiva aplicável a trabalhadores independentes próprio sensu. Ou melhor,
deverá ser compreendido como que de uma subalínea da alínea a) se tratasse244.
Assim, apenas os sócios profissionais das entidades abrangidas pelas subalíneas 1) e
2) do CIRC deverão ser submetidos ao regime contributivo dos trabalhadores independentes,
pelo que, em consideração ao elemento teleológico e histórico, o artigo 133º carece de uma

243
Procedeu à revisão do Regime de Segurança Social dos Trabalhadores Independentes, cujo artigo 6º, n.º 1,
al. b) consagra o seguinte: os sócios ou membros das sociedades de profissionais definidas na alínea a) do n.º
4 do artigo 5° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas.
244
V. ROCHA, Miguel Marques, «A Transparência Fiscal no Código Contributivo», CJT, n.º 07, janeiro-março
de 2015, p. 26.

96
interpretação corretiva. Ser-lhes-ão aplicáveis as regras destinadas à regulação da obrigação
contributiva e as respetivas obrigações acessórias referentes a trabalhadores independentes
estatuídas no artigo 132º e seguintes. Excetuam-se os advogados e os solicitadores que, por
via do artigo 139º, n.º 1, al. a) do CRCSPSS e em função da atividade que exercem,
encontram-se integrados no âmbito pessoal da respetiva Caixa de Providência (até na
hipótese dessa atividade ser desempenhada na qualidade de sócios ou membros das
sociedades contempladas na al. b) do artigo 133º). Quanto aos sócios não profissionais das
sociedades às quais a subalínea 2) se refere, estarão excluídos de efetuar as contribuições
para a Segurança Social no âmbito dos trabalhadores independes, não obstante se lhes aplicar
outro regime contributivo como analisaremos.
E na hipótese de o sócio desempenhar o cargo de gestão na sociedade de profissionais
na qual exerce a sua atividade? Será isso o pressuposto para que se lhe seja aplicado o
Regime dos Membros dos Órgãos Estatutários?
A redação do artigo 6º, al. d) do DL n.º 327/93, de 25 de setembro 245 é igual à
estatuída no atual artigo 63º, al. d) do CRCSPSS e consagra que se encontram excluídos do
regime aplicável aos MOE os sócios gerentes de sociedades constituídas exclusivamente por
profissionais incluídos na mesma rubrica da lista anexa ao CIRS e cujo fim social seja o
exercício daquela profissão. Para que esta exclusão ocorra, é necessário a verificação de três
requisitos: os sócios terão que desempenhar funções de gestão na sociedade na qual exerçam
a sua atividade; esta terá de ser constituída exclusivamente por profissionais integrados na
mesma rubrica, de acordo com o artigo 151º do CIRS 246; e, o seu objeto social terá de ser o
exercício dessa profissão.
O facto de o legislador não efetuar qualquer remissão para as sociedades de
profissionais do artigo 6º, leva-nos a concluir que a exclusão abrange somente os sócios
profissionais de sociedades transparentes, por referência exclusiva às situações
especialmente abrangidas pela anterior redação do artigo 6º, n.º 4 al. a) do CIRC247. Isto
conduz a que os sócios abrangidos pelo artigo 133º, n.º 1, al. b) do CRCSPSS, mesmo que
exerçam cargos de gerência, ao abrigo do artigo 6º, n.º 4, al. a) subalínea 1), estejam
excluídos do regime dos MOE.

245
Estabelecia e regulava o enquadramento dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas no
regime geral de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem antes da entrada em vigor do
CRCSPSS.
246
V. Portaria n.º 1011/2001, de 21 de agosto.
247
ROCHA, Miguel Marques, ob. cit., p. 27.

97
A contrário, os sócios profissionais abrangidos pela subalínea 2), perante a não
existência de remissão para o CIRC e à expressão os sócios gerentes de sociedades
constituídas exclusivamente por profissionais, não se encontram excluídos do regime
contributivo dos MOE. Parece que, relativamente a estes sócios profissionais, nada obsta a
que lhes seja aplicada, simultaneamente, o regime contributivo dos MOE e o regime
contributivo dos trabalhadores independentes. Porém, visto ser um tratamento desigual para
sócios profissionais cuja situação contributiva deverá ser idêntica, tal solução não será alheia
a críticas. De iure constituendo, o CRCSPSS deverá ser adaptado de maneira a que a
exclusão abranja de igual forma todos os sócios profissionais que integrem sociedades
transparentes exclusiva ou parcialmente constituídas por profissionais. Em relação aos
sócios não profissionais da subalínea 2), a sua situação é mais simples. Por estarem
excluídos do regime contributivo dos trabalhadores independentes, somente serão
abrangidos pelo MOE, se exercerem funções de gerência. Caso o sócio não profissional não
desempenhe essa função, não recairá sobre ele qualquer obrigação de efetuar contribuições
para a Segurança Social.
Não poderíamos terminar a análise do regime contributivo dos sócios sem,
analisarmos o âmbito de aplicação do Regime Contributivo das Entidades Contratantes às
sociedades de profissionais transparentes.
Consagra o artigo 140º, n.º 1 do CRCSPSS que as pessoas coletivas e as pessoas
singulares com atividade empresarial, independentemente da sua natureza e das finalidades
(cabendo aqui as sociedades de profissionais) que prossigam, que no mesmo ano civil
beneficiem de pelo menos 80 % do valor total da atividade de trabalhador independente,
são abrangidas pelo presente regime na qualidade de entidades contratantes. Estatuindo os
números 2 e 3 que a qualidade de entidade contratante é apurada apenas relativamente aos
trabalhadores independentes que se encontrem sujeitos ao cumprimento da obrigação de
contribuir e tenham um rendimento anual obtido com prestação de serviços igual ou
superior a seis vezes o valor do IAS248, considerando-se como prestados à mesma entidade
contratante os serviços prestados a empresas do mesmo agrupamento empresarial. O valor
dos serviços que foram prestados à entidade contratante pelo trabalhador independente no

248
Cerca de € 2.515,32.

98
ano civil a que respeitam constituirá base de incidência contributiva para efeitos de
determinação do montante de contribuições a cargo desta249.
Visto os sócios profissionais das sociedades transparentes se considerarem
independentes para efeitos contributivos, pensamos que não impede sobre a sociedade a
obrigação contributiva decorrente da aplicação do regime das entidades contratantes. Além
do mais, o CRCSPSS apenas estabelece uma assimilação contributiva dos sócios a
trabalhadores independentes, não sendo objetivo a integral aplicação do regime contributivo
a estes, como é o caso do regime das entidades contratantes, mas sim a sujeição a
contribuições para a Segurança Social daqueles que, por via das sociedades de profissionais,
exercem a sua atividade semelhantemente àqueles que o fazem de forma independente.
Considerando a natureza da transparência, e interpretando o âmbito do CRCSPSS
face a esta, poderá considerar-se que a sociedade e os seus sócios se apresentam como uma
só unidade. A sociedade é desconsiderada para efeitos da obrigação contributiva, incidindo
sobre os sócios o dever de suportar o pagamento das contribuições como se a sociedade não
existisse e, consequentemente, sem o seu enquadramento como entidade contratante. Esta
ideia pode ser justificada, se tivermos em consideração que a intenção legislativa subjacente
é a imposição da tributação na esfera dos sócios ou membros, parecendo-nos que, quanto ao
CRCSPSS, o seu propósito fora também a imposição contributiva aos sócios da sociedade
profissional transparente como se fossem eles próprios a prestar diretamente os seus serviços
ao cliente. Por fim, a finalidade do regime contributivo das entidades contratantes era o
combate aos falsos recibos verdes e os falsos prestadores de serviços, realidade bem
diferente do estamos a tratar250.
Deste modo, estamos em condições de concluir que o Regime Contributivo Dos
Trabalhadores Independentes aplicar-se-á somente aos sócios profissionais das sociedades
transparentes abrangidas pelo artigo 6º, n.º 4, al. a) subalíneas 1) e 2), sendo que, apenas os
que exercem funções de gestão nos termos da subalínea 1) se encontram excluídos do
Regime Contributivo dos MOE – apesar da correta aplicação do regime contributivo

249
A sua taxa contributiva será de 5%, reportando-se tais contribuições ao ano civil anterior, fixando-se o prazo
para o seu pagamento até ao vigésimo dia do mês seguinte ao da emissão do respetivo documento de cobrança.
Cfr. Art. 168º, n.º 7 e 155º, n.º 3 do CRCSPSS.
250
“(a) previsão da obrigação contributiva das pessoas coletivas e singulares com atividade empresarial que,
nos termos do artigo 140º, beneficiem da atividade de trabalhadores independentes, constitui uma medida de
combate aos “falsos prestadores de serviços”, Cfr. OLIVEIRA, Joana Tavares de / VALENTE, Rui, Código
Contributivo Anotado, Coimbra, Coimbra Editora, 2011, p. 124.

99
necessitar de uma correção legislativo. Por fim, entendemos que o Regime Contributivo das
Entidades Contratantes não se aplica às sociedades de profissionais, quando os seus sócios
se encontrem abrangidos pelo regime dos trabalhadores independentes.

6 – A TRIBUTAÇÃO DOS SÓCIOS OU MEMBROS NÃO RESIDENTES

A possibilidade de tributação em Portugal, dos sócios não residentes em território


português, quando fazem parte de uma entidade transparente, tem levantado algumas
questões. O disposto nas convenções de dupla tributação, seguindo o Modelo de Convenção
da OCDE, é que somente poderia ocorrer no caso de o não residente dispor de
estabelecimento estável em Portugal. Na ausência de uma disposição específica numa
determinada convenção de dupla tributação aplicável nestas circunstâncias, não é derrogada
a regra constante o n.º 9 do artigo 5º do CIRC que estipula que, para efeitos da imputação
prevista no artigo 6º, considera-se que os sócios ou membros das entidades nele referidas
que não tenham sede nem direção efetiva em território português obtêm esses rendimentos
através de estabelecimento estável nele situado.
Seria possível considerarmos que, visto a entidade sujeita à transparência exercer a
sua atividade através de uma instalação fixa em Portugal, um sócio ou membro não residente,
disporia por isso de um estabelecimento estável em território português?
Aceita-se que, quando uma entidade transparente exerce a sua atividade num
determinado Estado, através dum estabelecimento estável, também esse estabelecimento
estável é considerado como pertencente aos seus sócios ou membros, mesmo que não se
encontre à sua disposição251, somente assim não o será, se os Estados envolvidos
convencionarem em sentido contrário. Assim, a consideração da existência de
estabelecimento estável em território português a que se refere o nº 9 do artigo 5º do CIRC
aplica-se apenas para efeitos da imputação dos rendimentos às entidades transparentes

251
V. SERRÃO, Miguel, ob. cit. e VOGEL, Klaus, Klaus Vogel on Double Taxation Conventions, Kluwer Law
and Taxation Publishers, 1991 no sentido de que na ausência de disposições convencionais especiais, se a lei
interna de um Estado que tem de aplicar a CDT tratar a partnership como fiscalmente transparente, a parte do
sócio na empresa dessa partnership é, por sua vez, considerada uma empresa para efeitos do artº 7º do Modelo
de Convenção Fiscal da OCDE.

100
sujeitas ao artigo 6º do mesmo diploma. Consequentemente, as entidades transparentes não
estão obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal,
quando os rendimentos obtidos no território português sejam apenas os referidos no nº 9 do
artigo 5º do CIRC252.
Referentemente aos sócios ou membros não residentes, somos da opinião que o artigo
5.º, n.º 9 do Código do IRC consiste numa presunção de estabelecimento estável para efeitos
da imputação, necessita de ser repensado. É possível admitir-se que esta presunção seja
ilidida por força da aplicação da maioria das CDT celebradas, por Portugal, em
conformidade com as regras sobre estabelecimento estável nelas previstas. Não podemos
aceitar que destas resulte, necessariamente, que os sócios de uma entidade tratada como
transparente tenham um estabelecimento estável em Portugal, enquanto Estado da fonte.
Contudo, bem sabemos que deste afastamento pode resultar a não tributação dos sócios não
residentes daquelas entidades, em sede de IRS ou IRC. Consideramos ser adequado a
alteração do preceito no sentido de a consideração de estabelecimento estável operar, no
Direito interno português, ao nível da própria sociedade transparente, caso a mesma reúna
as características necessárias à respetiva qualificação, nos termos do artigo 5.º do Código do
IRC ou da CDT aplicável. Tal aconteceria por meio de um instrumento de substituição
tributária que permitisse ser a entidade transparente a entregar o imposto ao Estado, em
nome e por conta do sócio não residente, que ficaria dispensado de quaisquer obrigações
declarativas em Portugal.

252
Permite-se a apresentação da declaração modelo 22 de IRC, sem indicação de Técnico Oficial de Contas
que evidencie, em exclusivo, o preenchimento dos campos 205 e/ou 227 do Quadro 07. Isto é, os sujeitos
passivos não poderão preencher qualquer outro campo deste Quadro, na medida em que isso comprovaria a
obtenção de outros rendimentos não enquadrados no nº 9 do artigo 5º do CIRC. Informação vinculativa
correspondente ao Processo n.º : 2071/02, disponível em:
http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/B6FDB6A9-A73E-4EF1-868C-
7A882132F02A/0/circ_005_01.pdf.

101
CAPÍTULO V
REFLEXÃO SOBRE A TRANSPARÊNCIA

No universo dos sujeitos passivos do imposto sobre o rendimento das pessoas


coletivas, em 2013, somente a ínfima percentagem de 1,2% se encontra abrangida pela
transparência fiscal, à qual correspondem cerca de 5349 declarações de rendimentos253, que
se encontram muito aquém das 424 913 relativas ao Regime Geral. Se achamos estes valores
excessivamente baixos, lembramos que o número de declarações para os anos de 2011 e
2012 era, respetivamente, de 4727 e de 4829, que correspondiam, em ambos, a 1,1% das
mesmas. Em sede de IRS, apenas 0,09% do rendimento bruto tributado e 0,13% do valor de
IRS liquidado em Portugal resultam do regime de transparência fiscal. Qual a justificação
logística para a existência de tão reduzido número de entidades e uma tão diminuta matéria
coletável? Como estudámos, são as sociedades transparentes, mais concretamente as
sociedades de profissionais, aquelas que mais questões levantam no âmbito de aplicação do
regime de transparência fiscal, cuja consagração assenta, essencialmente, em razões de
combate à evasão tributária. Estamos, pois, em condições de, a fim de descobrirmos quais
as vantagens na fuga a este regime, procedermos ao imperativo confronto entre o modo com
se processa a tributação levada a cabo quando, se cai no âmbito da transparência fiscal e,
quando a mesma não exista.

1 - CONFRONTO DO REGIME DE TRANSPARÊNCIA COM A NÃO


TRANSPARÊNCIA

Caso não estivessem sujeitas a este regime do artigo 6º, as sociedades transparentes
seriam tributadas como qualquer outro sujeito passivo de IRC, o que, francamente, é uma
via muito mais apetecível, em comparação, até, com a tributação, em sede de impostos sobre
o rendimento das pessoas singulares. Por que razão o assim é? A maneira, bastante óbvia,

253
Os estudos efetuados pela AT têm por base o anexo D - referente à transparência fiscal - das declarações de
IRS, o mesmo anexo que é utilizado para a herança indivisa (Cfr. art. 19º CIRS).

102
de diminuir o imposto a pagar será através da redução de rendimentos, pois se os rendimentos
forem menores, a carga fiscal será, também ela, menor. Todavia, nos dias de hoje, pela via
do IRS, a realização de grandes poupanças fiscais mostra-se rodeada de sérias dificuldades,
pelo que o ideal parece ser o recurso à constituição de uma sociedade, cujas vantagens a si
inerentes compõem um mecanismo de fácil (e sedutor) planeamento fiscal. Sem necessidade
de offshores, nem de esquemas de grande engenharia financeira, basta uma sociedade
unipessoal para se poder usufruir das mais diversas regalias.
De acordo com o artigo 13º e seguintes do CIRS, são sujeitos passivos, tanto as
pessoas singulares residentes como as pessoas singulares não residentes. As primeiras
abarcam também as empresas individuais, o EIRL e os membros das entidades
transparentes, nos termos do artigo 6º CIRC. Têm domicílio em território nacional e serão
tributadas pela totalidade dos seus rendimentos, incluídos os obtidos fora de território
nacional, isto é, seguindo o princípio da universalidade ou do rendimento mundial (world
wide income principle). As pessoas singulares não residentes, como a própria denominação
indica, não têm domicílio em território português e serão apenas tributadas pelos
rendimentos obtidos em Portugal, ou seja, segundo o princípio da territorialidade, em sentido
estrito ou da fonte (source principle)254.
Face ao exposto, e tendo em consideração que as receitas orçamentadas na
LOE/2016255 relativamente ao IRS são de € 12.392.729.180, mais do dobro do que para o
IRC que são cerca de 5.192.630.769, é percetível que o IRS, para além de incidir sobre um
número bastante alargado de sujeitos passivos, arrecada a segunda maior receita (acima
somente o IVA no valor de € 15.312.318.320) para os cofres do Estado. Daí o interesse na
limitação do acesso à tributação segundo os preceitos do IRC.
A primeira vantagem de se estar abrangido pelo IRC reside logo na diferença das
operações contabilísticas destinadas ao apuramento da matéria coletável, mais
especificamente na dedutibilidade de custos que estas comportam, não ignorando as questões
que a distribuição dos lucros comporta.
A determinação do IRS comporta as seguintes operações: antes de mais, em relação
a cada categoria de rendimentos, procede-se à determinação do rendimento bruto, o qual, ao

254
Da sujeição a uma obrigação tributária limitada beneficiarão também os chamados residentes não habituais,
no quadro do regime especial de tributação em IRS. Para mais desenvolvimentos, v. CASALTA NABAIS,
José, Direito..., ob. cit., pp. 541 – 566.
255
Aprovado pela Lei n.º 7-A/2016 de 30 de março.

103
sofrer as deduções específicas de cada uma das categorias (25º e ss.), originará o rendimento
liquido para cada uma delas. Em seguida, somam-se os rendimentos líquidos apurados em
cada categoria. Esta soma corresponde ao englobamento ao qual se subtraem algumas perdas
(55º), determinando-se, desta forma, o rendimento global liquido256.
Neste momento, se em causa estiverem contribuintes casados e não separados
judicialmente de pessoas e bens ou unidos de facto, podem optar pela tributação conjunta.
Caso tenham optado, a taxa aplicável será a correspondente ao rendimento colável dividido
pela soma de dois com o produto de 0,3, pelo número de dependentes que integram o
agregado familiar e de descendentes. Se preferiram a não tributação conjunta, o apuramento
do quociente conjugal concretiza-se através da aplicação da taxa correspondente ao
rendimento coletável dividido pela soma de um com o produto de 0,15 (art. 69º).
Sobre o rendimento global líquido incidirá a taxa que lhe corresponder, originando a
coleta que, por sua vez, poderá sofrer as mais variadas deduções: por exemplo, deduções à
coleta por sujeitos passivos e dependentes (78º e 78º-A); despesas gerais familiares (78º-B);
despesas de saúde, de formação e educação (78º-C e 78º-D); encargos com imóveis (78º-E);
dedução pela exigência de fatura (78º-F); crédito de imposto por dupla tributação
internacional (81º); ou, pensões de alimentos, encargos com lares ou despesas relativas às
pessoas portadoras de deficiência (83º-A, 84º e 87º). Encontraremos, por fim, o imposto a
pagar.
Diferentemente, em IRC, o regime geral de tributação parte do lucro contabilístico
para determinar a matéria coletável. O lucro contabilístico (ou resultado liquido
contabilístico257) corresponde à diferença positiva entre os valores do património líquido
apurado, no fim, e no início do período de tributação (teoria do balanço258). Ou seja, aos

256
Coloca-se o problema de saber se entre nós vigora o princípio da intercomunicabilidade de custos das
diversas categorias de rendimento que parece decorrer do princípio da capacidade contributiva. Defendemos
que não, o que vigora é o contrário, isto é, o princípio da não comunicabilidade de custos, uma vez que o artigo
55º do CIRS nega, dentro da própria categoria B, essa intercomunicabilidade. No mesmo sentido, CASALTA
NABAIS, José, Direito..., ob. cit., p. 555, e SALGADO DE MATOS, André, Código do Imposto sobre o
Rendimento das Pessoas Singulares Anotado, Lisboa, Instituto Superior de Gestão, 1999, cit., p. 329 e ss.
257
Segundo CASALTA NABAIS, José, Direito..., o apuramento do lucro tributável a partir do lucro
contabilístico segue o modelo da dependência parcial entre a contabilidade e a fiscalidade. O lucro tributável
tem por base o resultado contabilístico procedendo a ajustamentos extra contabilísticos, por forma a respeitar
as normas fiscais.
258
Transitada da teoria da conta de exploração aplicada na vigência da Constituição Industrial para a teoria de
balanço. V. CASALTA NABAIS, José, Direito..., ob. cit., p. 578. e FREITAS PEREIRA, M. H., Fiscalidade,
ob. cit., p. 82 e ss.

104
proveitos e ganhos subtraem-se os custos e perdas (20º, 23º e 23º-A do CIRC). A este259
somam-se as variações patrimoniais positivas260 e descontam-se as negativas, ambas
verificadas no mesmo período e não referidas nesse resultado, determinadas com base na
contabilidade.
Chegaremos então ao lucro tributável que será ainda objeto de uma eventual
correção261 fiscal e de deduções, nomeadamente, dedução dos lucros já tributados para
eliminar a dupla tributação económica (51º, 51º-C e 51º-D) e dedução dos prejuízos (52º) e
dos benefícios fiscais (caso estes sejam passiveis de dedução ao lucro tributável – 15º, n.º 1,
al. a)). É deste modo que a matéria coletável é determinada. Sobre esta incidirá a taxa de
23% ou de 17% (87º). Operação que originará a coleta. Por sua vez, a coleta, sofrerá também
deduções, tais como o crédito de imposto para a eliminação da dupla tributação internacional
ou benefícios ficais (arts. 90º a 92º), o que resulta na coleta liquida. À coleta líquida deduzir-
se-á o pagamento especial por conta ou as retenções na fonte (93º a 98º). Será, por fim, neste
momento, que obteremos o imposto a pagar.
Até ao momento de aplicação da taxa, as entidades transparentes comportam-se
como qualquer sujeito passivo de IRC. Caso não estivessem abrangidas pela transparência,
era neste momento que se aplicaria a taxa de IRC, seguir-se-ia a liquidação em sentido estrito
e o pagamento do correspondente imposto. Todavia, apesar da matéria coletável
correspondente ao lucro da sociedade ser apurada, em conformidade com os normativos do
CIRC, a tributação ocorre em sede de tributação dos respetivos sócios.
Estamos no epicentro do problema: a abismal diferença das taxas gerais de IRC e
IRS!
Para o ano de 2016, a taxa de IRC é de 21%, mantendo a descida de dois pontos
percentuais verificada em 2015. Se em causa estiverem pequenas e médias empresas, a taxa
de IRC é ainda mais diminuta, atingindo os 17% aplicável aos primeiros € 15.000,00 de

259
Artigo 17º, n.º 1 do CIRC: O lucro tributável das pessoas coletivas e outras entidades mencionadas na
alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das
variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não refletidas naquele resultado,
determinados com base na contabilidade e, eventualmente, corrigidos nos termos deste Código.
260
Cfr. Art. 21º e 24º do CIRC que estatuem que concorrem para a formação do lucro tributável as variações
patrimoniais positivas e negativas não refletidas no resultado líquido do período de tributação.
261
O advérbio eventual mostra-se desnecessário, pois não acreditamos que haja alguma declaração periódica
de IRC de uma sociedade com atividade normal cujo lucro não tenha sido corrigido. Quando haja lugar a
correções que determinem alteração aos montantes imputados aos sócios, a AT promove as correspondentes
modificações na liquidação a estes efetuada, constituindo um ato corretivo de prática obrigatória. Cfr. Art. 58º
ao 62º CIRC referentes à determinação do lucro tributável por métodos indiretos. Como exemplos de correções
fiscais, os artigos 23º-A, 29º, 30º e 51º do CIRC.

105
matéria coletável, incidindo sobre o excedente a taxa de 23%. Por sua vez, no IRS, a taxa
vai dos 14,50%, mas pode atingir os 48 pontos percentuais para rendimentos superiores a
€80.000,00 que, marginalmente pode até ultrapassar os 50 pontos percentuais se lhe for
acrescentada a taxa adicional de solidariedade262. Como bem sabemos, os rendimentos que
entram na esfera pessoal são tributados através de IRS – que é um imposto progressivo -
com taxas crescentes. De modo simplista, diríamos que, relativamente ao IRS, quando mais
se aufere mais se paga. Não é, pois, uma matéria de somenos importância em termos de
tributação.
Não precisamos de ser especialistas financeiros para notarmos que é atribuída à
sociedade um leque muito mais vasto de deduções do que ao sujeito passivo de IRS, devido
à exigência constitucional da tributação pelo lucro real263, que impõe que o imposto incida
sobre o rendimento efetivamente obtido. Este, ao ser apurado com base na contabilidade do
sujeito passivo, coloca problemas sérios pela evasão fiscal que possibilita (e também de
constitucionalidade, mas que não nos cabe neste trabalho analisar). No setor contabilístico
vigora a máxima (naïf, confessemos) de que tudo o que gera proveito para a sociedade é um
custo que esta suportará, se não gerar proveito, não é custo, pelo que, quanto maior forem as
suas despesas, menos imposto a sociedade pagará. Ora, é precisamente aqui que os sócios
mais ardilosos, através da gestão do património pessoal e da dicotomia entre finanças
pessoais e finanças empresariais transmitem as despesas pertencentes ao foro privado para o
foro empresarial. Como? Através de bens passíveis de serem utilizados, simultaneamente, a
estes níveis, cujos custos (por exemplo, de aquisição) são dedutíveis ou amortizados pela
sociedade.
Tomemos como exemplo a compra de um telemóvel no valor de 500,00€. Se for a
empresa a adquirir o equipamento paga o seu preço que será tido em consideração como um
custo e, por isso, deduzido. Também deduzirá o IVA. Paga também as chamadas efetuadas
e, mais uma vez, tem a possibilidade de deduzir o IVA264. Vantagens essas negadas ao
particular, quando é este a fazê-lo com recurso aos rendimentos obtidos com a distribuição
de lucros. E se for um automóvel? A compra de automóveis através de empresas, na prática,
é bastante utilizada, pois, quando o adquire, o seu valor pode ser amortizado como um custo,

262
Cfr. Art. 86º-A do CIRS.
263
Cfr. 104º, n.º 2 CRP.
264
E se as chamadas efetuadas ocorrerem ao fim de semana? Ou se destinarem a assuntos pessoais?
Teoricamente, não serão passiveis de serem deduzidas. Mas, bem sabemos que na prática não é isso que
acontece e, a empresa, raramente, procederá a uma filtragem tão meticulosa.

106
se forem veículos comerciais também se poderá deduzir o IVA. Mais. A desvalorização do
bem e a sua manutenção estará a cargo da empresa, tal como todas as despesas associadas a
este. O que não acontece se o automóvel pertencer ao particular que se verá obrigado a
suportar todas as despesas a ele inerentes. Quando o particular compra determinado bem,
utiliza uma quantia pecuniária que já foi sujeita a imposto (IRS). O custo do bem é ainda
mais elevado, pois o rendimento que o particular teve necessidade de auferir para a compra
foi, também ele, mais elevado, demonstrando-nos que quando a utilização profissional se
mistura com a utilização particular, as vantagens são flagrantes!
Relativamente aos custos dedutíveis em IRC, necessitamos de saber que a lei aceita,
como ponto de partida, o conceito económico de custo, concretizado segundo as regras de
contabilidade e que a noção dos mesmos é-nos fornecida pelo n.º 1 do artigo 23º, do CIRC:
para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos
ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
No IRC vigora o principio do auto-apuramento do lucro tributável que se baseia nos registos
contabilísticos do sujeito passivo, apurados por meio de documentos justificativos265 e 266. O
custo terá então de ser comprovado. Terá também de se mostrar indispensável e ter ligação
aos proveitos267.
Porém, as situações da vida que originam um custo tornam impossível a sua
enumeração casuística, daí que o artigo 23º, seguindo a mesma técnica utilizada
relativamente aos proveitos, exemplifica custos fiscalmente dedutíveis, o que redunda numa
maior segurança para o sujeito passivo268. Foquemo-nos nalgumas situações em que a lei
prevê a dedutibilidade de despesa.

265
Esse documento, mesmo que imperfeito, é indispensável como suporte para cada lançamento contabilístico.
Cfr. 115º, n.º 2, al. a): Todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e
suscetíveis de serem apresentados sempre que necessário. Também o artigo 23º, n.º 3 “os gastos dedutíveis
nos termos dos números anteriores devem estar comprovados documentalmente, independentemente da
natureza ou suporte dos documentos utilizados para esse efeito”. A este respeito v. SALDANHA SANCHES,
José, «A Quantificação da Obrigação Tributária, Deveres de Cooperação, Auto-Avaliação e Avaliação
Administrativa», Lisboa: CCTF, 1995, p. 318.
266
Defendemos que ao sujeito passivo deva ser admitido vir provar a existência do custo através do recurso a
quaisquer meios admitidos em direito, pois a não aceitação baseada em razões puramente formais da
dedutibilidade de um custo que foi suportado conduz à tributação de um lucro que não existe e,
consequentemente, a um imposto a que não subjaz a correspondente capacidade contributiva. V. MORAIS,
Rui Duarte, Apontamentos..., ob. cit., p. 80.
267
Ligação os proveitos para CASALTA NABAIS, José, Direito..., ob. cit., p. 582, ou ser dotado de interesse
económico (intuito objetivo de transação) para MORAIS, Rui Duarte, Apontamentos..., ob. cit., pp. 86-87.
268
Seguindo os critérios da competência económica, os custos deverão ser contabilizados no exercício em que
ocorreu o seu facto gerador, cumprindo-se deste modo, o principio da especialização dos exercícios. É o que
se verifica, por exemplo, com as despesas com os subsídios de férias, indemnizações por despedimento ou as

107
Determinam as várias alíneas do n.º 2 do artigo 23º que são considerados gastos os
relativos à produção ou aquisição de quaisquer bens ou serviços, tais como matérias
utilizadas, mão-de-obra ou energia, assim como os referentes à distribuição e venda. O
mesmo sobre as despesas de natureza financeira, como juros de capitais alheios aplicados
na exploração, descontos, ágios ou transferências. Também as despesas de natureza
administrativa e as suportadas com análises, racionalização, investigação, consulta e
projetos de desenvolvimento, serão havidas como custos para efeitos fiscais. As perdas por
imparidade, reduções de justo valor em instrumentos financeiros ou reduções de justo valor
em ativos biológicos e as depreciações e amortizações, provisões, menos-valias realizadas
e indemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável são igualmente
passíveis de desconto. As imparidades e provisões também serão dedutíveis nos termos dos
artigos 28º a 28º-C, 39º e 40º do CIRC.
O valor das imposições de natureza fiscal suportadas pelas empresas é também
considerado no cálculo da matéria coletável do IRC. Assim, são dedutíveis os encargos
fiscais e parafiscais (art. 23º, n.º 2, al. f)), ou seja, tributos que oneram a própria sociedade,
nos quais esta é contribuinte269. São exemplos desta alínea os impostos incidentes sobre o
fator trabalho, tal como a contribuição para a segurança social, o IMI devido em razão de
imóveis que integram o ativo da sociedade ou o imposto selo. É-lhes ainda permitido
deduzirem as mais variadas taxas cujo pagamento a sociedade está obrigada em razão da sua
atividade, tal qual os impostos que oneram a aquisição de determinados bens, como sejam
direitos aduaneiros, os impostos sobre produtos petrolíferos ou o IMT. Nalguns destes casos,
o problema da dedutibilidade de tais impostos não reveste qualquer tipo de autonomia, pois
há quem considere que o seu valor é uma componente do preço pago pela aquisição do bem
ou serviço e já é, a esse título, contabilizado como custo. Relativamente ao IMT, o anterior
SISA, esta situação conduziria à sua consideração como custo, segundo o mecanismo das

gratificações de balanço, independentemente do seu pagamento ocorrer após o fim desse exercício. A
contabilização como custos noutro exercício que não aqueles em que aconteceu o respetivo facto gerador
apenas poderá acontecer quando, no exercício a que digam respeito, tais obrigações sejam imprevisíveis ou
desconhecidas. FREITAS PEREIRA, Manuel H. «A periodização do Lucro Tributável», CEF, 1988, p. 142.
269
O IVA, apesar do artigo 21º do CIVA estatuir excecionalmente as situações em que não é permitida a sua
dedução, é considerado custo e, por isso, a lei atribui à empresa o direito de dedução. V. Ac. do STA de
06.12.2000 (Proc. n.º 019003) que defende que o IVA oficiosamente liquidado não pode ser considerado um
custo fiscalmente dedutível. As entidades transparentes são sujeitos passivos de IVA nos termos do art. 2º do
CIVA, pelo que, terão de apresentar as respetivas declarações periódicas. Nos ACE dirigidos ao setor da
construção civil, por vezes, a atividade prolonga-se para além da data de conclusão da obra, sendo provável
que, aí, não origine proveitos, mas incorra em custos de garantia da obra a imputar aos membros, o que origina
a apresentação das declarações fiscais em sede de IVA e IRC, até ao momento da extinção do ACE.

108
amortizações. Solução unânime na jurisprudência, mas posto em causa pelo STJ, que
defende que o pagamento do IMT é autónomo, relativamente ao preço suportado pela
aquisição do imóvel e, por isso, deverá ser integralmente dedutível no exercício em que foi
suportado270.
Somente as despesas consagradas no artigo 23º podem ser deduzidas? Não. O artigo
24º equipara a custos as variações patrimoniais negativas não refletidas no resultado líquido
do período de tributação que, nas mesmas condições do primeiro, concorrem para a
formação do lucro tributável, excetuando-se, entre outras, as que não possam ser associadas
ao escopo da empresa271. O caso mais frequente é o das denominadas gratificações (podem
ser de balanço – gratificações por aplicação de resultados e decididas em assembleia-geral,
aquando da aprovação de contas – ou de outro, nomeadamente prémios de produtividade)
que são remunerações atribuídas aos membros dos órgãos sociais e trabalhadores a título de
participação nos resultados. O princípio da especialização determina que concorram
negativamente para a formação do luro tributável do exercício a que respeita o resultado que
as originou, ou seja o exercício anterior já encerrado272. Assim, a norma contabilística e de
relato financeiro n.º 28 que trata das matérias relacionadas com benefícios aos empregados,
estabelece que as gratificações devem ser consideradas gastos do próprio exercício a que
respeitam os lucros e, como tal, serem contabilizadas como gastos com o pessoal273.
E quanto à mensuração dos inventários274, às reintegrações e às amortizações?
Determina o artigo 26º CIRC que, para efeitos da determinação do lucro tributável, os

270
V. PORTUGAL, António Moura, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa,
Coimbra Editora, Coimbra, 2004 p. 313. e SALDANHA SANCHES, José, Manual..., ob. cit., p. 277.
271
Cfr. Art. 24º. al. a) devido ao principio da realização aplicável à consideração das mais e menos valias para
efeitos de tributação.
272
A norma NCRF n.º 28 esclarece que para ser considerada gasto desse exercício, a participação nos lucros
ou bónus deve resultar de uma obrigação legal ou construtiva e esta obrigação só pode ser reconhecida se puder
ser estimada com fiabilidade. Os prémios de produtividade e assiduidade, entre outros, são custos com o pessoal
desse mesmo exercício e, como tal, devem ser registados na conta 64 – Remunerações. Do ponto de vista fiscal,
como estas gratificações dizem respeito aos resultados do ano anterior à deliberação e como a respetiva
atribuição não se refletia nos resultados contabilísticos da empresa, a sua concorrência para a formação do
lucro tributável processa-se com a sua inclusão no quadro 07 da declaração modelo 22, no campo relativo às
variações patrimoniais negativas, sendo imprescindível que essas importâncias sejam pagas ou colocadas à
disposição até ao fim do exercício seguinte, nos termos do atual n.º 2 do artigo 24.º do CIRC.
273
As gratificações atribuídas aos gerentes entram na categoria A do IRS. Cfr. Artigo 46º, n.º 2, al. o) do
Código Contributivo da Segurança Social: as gratificações, pelo valor total atribuído, devidas por força do
contrato ou das normas que o regem, ainda que a sua atribuição esteja condicionada aos bons serviços dos
trabalhadores, bem como as que pela sua importância e caráter regular e permanente, devam, segundo os
usos, considerar-se como elemento integrante da remuneração.
274
Sobre o conceito mais aprofundado de ativo, remetemos para o ponto 2 deste Capítulo.

109
rendimentos e gastos dos inventários são os que resultam da aplicação dos critérios de
mensuração previstos na normalização contabilística em vigor275.
As depreciações e as amortizações de elementos do ativo não corrente são, de acordo
com o art. 29º, n.º 1, aceites como gastos. Em causa estão os bens que pertencem ao
imobilizado da empresa por se destinarem em aí permanecerem de forma inalterável e
duradoura - por mais de um exercício - não importando a sua natureza, mas sim a função
que desempenham na empresa.
Solução que pretende ser um instrumento de política e gestão fiscal276 é justificada
no entendimento de que a aquisição de um bem não implica para o adquirente uma perda,
mas antes uma alteração qualitativa do respetivo património. Contudo, esse bem entrará num
processo de deperecimento e, caso não fosse possível à empresa deduzir essas perdas,
sobreavaliar-se-iam o lucro distribuível, pelo que, antes de ser uma questão fiscal, as
amortizações são uma manifestação da verdade dos registos contabilísticos277. Deste modo,
as amortizações e as reintegrações são o processo contabilístico de destruir, racional e
sistematicamente o custo de um ativo que se deprecia pelos diferentes exercícios da sua vida
útil, dando voz à regra que preside o cálculo do lucro: aos proveitos de um exercício
deduzem-se os custos que, nesse exercício, se tornou necessário suportar para os obter. Os
bens, após estarem em funcionamento, terão de ser sujeitos a depreciação, que deverá ser
previsível, sistemática e irreversível. Se não se depreciarem, por não se verificar qualquer
perda ou custo, não originam amortizações ou, quando as originem, estão estas sujeitas a
condicionalismos278.

275
O principio da manutenção de critérios (art. 27º) determina que estes devem ser uniformemente seguidos
nos sucessivos períodos de tributação, admitindo-se que assim não seja quando a mudança seja justificada por
razões de natureza económica ou técnica e sejam aceites pela AT.
276
Aprovada pelo SNC e consagrada no CIRC tem expressão no DR n.º 25/2009, de 14 de setembro.
277
Manifestação da dependência parcial do direito fiscal face ao direto contabilístico. V. CASALTA NABAIS,
José, Direito..., ob. cit., p. 521. Note-se que o valor de tal depreciação corresponde, em cada exercício, a um
custo suportado pela empresa que, tanto a nível contabilístico como fiscal, é relevado pela quota de
amortização.
278
Compreendendo-se, por isso, que nem as meras flutuações de ordem económica que afetem os valores
patrimoniais não integrem esse deperecimento, nem os elementos de reduzido valor, como é o caso dos
agrafadores, por razões de simplicidade baseadas no principio contabilístico da materialidade ou da
importância relativa, permite-se que estes sejam considerados na totalidade num só exercício. Cfr. Artigo 33º
do CIRC: nos casos em que o custo unitário de aquisição ou produção de elementos do ativo sujeitos a
deperecimento não ultrapasse (euro) 1000 é aceite a sua dedução integral no período de tributação em que
seja reconhecido, exceto quando tais elementos façam parte integrante de um conjunto que deva ser
depreciado ou amortizado como um todo. Pondo em prática o principio contabilístico do custo histórico, as
quotas de amortização são calculadas com base no custo de aquisição do bem ou da sua produção e traduzem
o custo imputável à depreciação dos bens em razão da sua afetação ao processo produtivo num exercício. Em
contextos inflacionários, podem surgir regras especiais que permitem a reavaliação dos bens do ativo

110
Os métodos de reintegração consagrados na lei e sobre os quais não nos alongaremos,
são dois, o método da linha reta e o método das quotas decrescentes279.
Por se lhes aplicar ainda o CIRC, as sociedades transparentes beneficiarão também
destas deduções. Ainda assim, a nossa legislação consagra algumas especificidades.
Relativamente à dedução dos encargos relacionados com o número máximo de
veículos e o respetivo valor, as sociedades de profissionais sujeitas à transparência deverão
ter em consideração o limite de uma unidade por sócio, fixado pela Portaria nº 1041/2001,
de 28 de agosto280.
Aquando das correções fiscais, não há lugar a deduções para a eliminação da dupla
tributação económica de lucros ou reservas distribuídos, uma vez que o próprio regime
combate eficazmente esse efeito. Nesse sentido, um dos requisitos do artigo 51º, n.º 1, al. c)
do CIRC, respeitante à eliminação da dupla tributação económica de lucros e reservas
distribuídos é precisamente que o sujeito passivo não seja abrangido pelo regime de
transparência fiscal previsto no artigo 6º.
A solidariedade dos exercícios é atenuada através de certas regras de determinação
da matéria coletável, especialmente através do reporte de prejuízos, na medida em que a
periodização do lucro refletida em cada exercício ser independente dos restantes para efeitos
de tributação. Matéria que se encontra estatuída no n.º 1 do artigo 52º CIRC: aos prejuízos
fiscais apurados em determinado período de tributação são deduzidos aos lucros
tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos 12 períodos de tributação posteriores281. Note-

imobilizado, sendo as futuras quotas de amortização calculadas a partir desse valor, correspondendo de melhor
forma ao custo real suportado pela empresa.
279
Vale aqui o princípio contabilístico da uniformidade ou da permanência de métodos, segundo o qual, para
cada elemento do ativo imobilizado, deve se usado o mesmo método, desde a sua entrada em funcionamento
até à sua total reintegração ou amortização, transmissão ou utilização. Podem, no entanto, verificar-se
mudanças dos referidos métodos e na vida útil dos ativos sempre que as mesmas se justifiquem por razões de
natureza económica ou técnica e sejam aceites pela AT. Cfr. Art. 30º, 31º e 31º-A, n.º 2 CIRC. Ou método das
quotas constantes e método das quotas degressivas, respetivamente, para Rui Duarte Morais.
280
Cfr. art. 23º-A, n.º 9 CIRC sobre os encargos não dedutíveis para efeitos fiscais.
281
Com as alterações que lhe foram introduzidas pela L n.º 2/2014, de 16 de janeiro. Atualmente, o n.º 2 limita
a dedução dos prejuízos fiscais ao máximo correspondente a 70% do respetivo lucro tributável, penalizando,
ainda mais, as empresas. Note-se que anteriormente à L n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (OE/2012) que
estabeleceu, pela primeira vez, este tipo de limitação (75% do lucro tributável), não existia limite algum senão
o da própria coleta. Parece-nos ser uma medida bastante gravosa que em nada incentiva o surgimento de novas
empresas, na medida em que não nos podemos esquecer do agravamento das tributações autónomas caso
apresentem prejuízo fiscal no respetivo período de tributação, conforme dispõe o n.º 14, aditado ao artigo 88.º
do CIRC, pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (OE/2011). Em resposta ao princípio geral da total
identidade e exclusividade entre o reporte e a neutralidade fiscal – plasmado no artigo 75º, a transmissão de
prejuízos fiscais é estendida às operações de fusão, cisão, e entrada de ativos ao abrigo do regime especial da
neutralidade fiscal.

111
se que o n.º 7 restringe a dedução dos prejuízos fiscais à existência de lucros tributáveis.
Assim, ao lucro tributável podem ser abatidos os prejuízos fiscais que eventualmente tenham
existido num ou mais dos 12 períodos de tributação (doze anos) anteriores282, mas nunca
repercutido nos demais rendimentos dos sócios em sede de IRS ou IRC desse ano, ou de
anos posteriores. Essa dedução, efetuada em cada período de tributação, não pode exceder o
montante correspondente a 70% do respetivo lucro tributável, não ficando, porém,
prejudicada a dedução da parte desses prejuízos que não tenham sido deduzidos até ao final
do respetivo período de dedução283. Algo que impossibilita os sócios de diminuírem o
imposto a pagar por meio da absorção de outros rendimentos com os prejuízos
eventualmente obtidos em resultado da participação em sociedades sujeitas à transparência
fiscal284.
Na prática, o que se passa nas sociedades de profissionais é que os sócios faturam à
sociedade pelos serviços que lhe prestam, e esta, por sua vez, faz o mesmo quanto a serviços
efetuados a terceiros, esvaziando da esfera societária a matéria coletável apurada, e que seria
objeto de imputação, para efeitos de tributação em sede de IRS, desvirtuando, desta forma,
o regime.
Como acabamos de analisar, são inúmeras as deduções que os sujeitos passivos de
IRC podem lançar mão a fim de contornarem as imposições tributárias e atingirem uma
poupança fiscal que os sujeitos passivos de IRS jamais terão possibilidade de alcançar. No
extremo, é possível aos sócios descapitalizarem a empresa285, apresentando mais gastos do

282
Cfr. art. 52º, n.º 1 estatui que os prejuízos fiscais apurados em determinado período de tributação são
deduzidos aos lucros tributáveis de um ou mais dos 12 períodos de tributação posteriores.
283
Cfr. art. 52º, n.º 2 diz que a dedução a efetuar em cada um dos períodos de tributação não pode exceder o
montante correspondente a 70 % do respetivo lucro tributável, não ficando, porém, prejudicada a dedução da
parte desses prejuízos que não tenham sido deduzidos, nas mesmas condições e até ao final do respetivo
período de dedução.
284
No entanto, é possível a dedução de prejuízos fiscais antes de a sociedade ficar abrangida pela transparência,
sendo que, aos sócios das respetivas entidades, apenas se poderá imputar os resultados positivos, ou seja, apenas
se permite que os prejuízos sejam deduzidos unicamente nos lucros tributáveis da sociedade, vedando-se a
possibilidade dos sócios pessoas singulares, tributados em IRS, absorver os prejuízos obtidos em resultado da
participação nessa sociedade com outros rendimentos individuais dentro ou fora da mesma categoria, o que
seria financeiramente mais vantajoso. A este respeito, Cfr. Art. 52º CIRC, n.º 1, n.º 7.
285
Foi isto que aconteceu com a Caixa Geral de Depósitos que registou prejuízos de 171,5 milhões de euros em
2015 (menos 176,5 milhões do que em 2014). As provisões e imparidades reduziram-se em 233,1 milhões de
euros (-24,6%) totalizando 716,5 milhões. Situação que foi justificada pelo facto de as contas terem sido
prejudicados pela necessidade do banco de constituir provisões e imparidades, sendo obrigada a contabilizar
imparidades de 5000 milhões, relacionadas com operações problemáticas e mau crédito. Portugal negociou
com a Comissão Europeia uma recapitalização da CGD, porque o banco não apresenta rácios de solvabilidade
impostos pelas autoridades europeias. O processo de capitalização da Caixa é um processo que está a ser
debatido com as instituições europeias, quer com a Direção Geral da Concorrência, quer com o BCE e o
Mecanismo Único de Supervisão.

112
que proveitos e, como resultado, exibirem sucessivamente resultados negativos (não
obstante os inconvenientes que isso possa trazer, principalmente perante os credores
societários e a nível de crédito bancário, visto a empresa estar tecnicamente falida, pois - de
acordo com o critério do balanço ou do ativo patrimonial - a insolvência resulta do facto de
os bens do devedor serem insuficientes para cumprimento integral das suas obrigações
vencidas, ou seja, ausência da necessária liquidez em certo momento, ou em certos casos
porque o total das suas responsabilidades excede os bens de que pode dispor para as
satisfazer286).
Finalmente, chegamos ao momento da sociedade proceder à distribuição dos lucros.
No que concerne a esta matéria, relembramos que o lucro das sociedades, assim como
o rendimento global das demais pessoas coletivas está, por regra, sujeito a tributação em
IRC, pelo que é a assembleia-geral da sociedade, nos limites fixados pela lei, determinará,
se os lucros, já após a incidência do imposto, são retidos na própria sociedade ou são
distribuídos aos sócios. Se optarem pela segunda hipótese, os rendimentos que os sócios
receberem serão objeto de nova tributação em IRS, em sede de categoria E. Quando isso
acontece, somos conduzidos para um problema que muito assombra o Direito fiscal
moderno: a dupla tributação económica287. Situação que resulta da sujeição a dois impostos,
porque o mesmo rendimento é tributado no seio da sociedade em sede de IRC e,
posteriormente, por serem considerados rendimentos de capitais tributáveis em IRS, volta a
estar sujeito a novo imposto na esfera jurídica dos respetivos sócios.
O legislador considera que os rendimentos pertencentes à categoria E têm caráter
passivo, não implicando a sua obtenção custos ou uma real atividade do beneficiário. Por
isso, a lei, ao não prever qualquer dedução específica a estes rendimentos, faz com que o
rendimento tributável tenha inteira correspondência com o rendimento bruto288.
Como aos sócios não é desejável que o rendimento que lhes é distribuído faça parte
da categoria E, põem em prática uma lógica muito simples: se o lucro não lhes for
distribuído, não entra na sua esfera pessoal, ou seja, quando o resultado gerado no período é
reportado para o exercício seguinte, o sócio não paga IRS e, em fonte deste imposto, a

286
Cfr. Art. 3º, n. º 1 do CIRE.
287
V. Capítulo III deste trabalho.
288
Tanto os rendimentos de capitais como as mais-valias têm natureza passiva e resultam da titularidade de um
bem mobiliário que, por regra, é cedido temporariamente a outrem. O n.º 9 do art. 5º considera que a diferença
positiva entre a valor da cessão definitiva de um credito e o seu valor nominal também se integra nesta
categoria.

113
poupança é total. A não destruição dos lucros acarreta maiores vantagens do que o oposto,
por isso, este deve ficar retido na empresa (por exemplo, como reserva ou a fim de se
proceder a um reforço de capitais). Também pode ser investido, usado ou aplicado em
depósitos a prazo.
A distribuição dos lucros é o calcanhar de Aquiles da transparência!
Não seria correto afirmarmos que a distribuição de lucros é negada às sociedades
transparentes, o que acontece é que, independentemente dessa distribuição se efetivar, a
matéria coletável é imputada a cada um dos sócios, em conformidade com o disposto no
pacto social, se assim os sócios o haverem consagrado ou, se tal não acontecer, em partes
iguais. Será, depois, eventualmente, objeto de englobamento com outros rendimentos das
restantes categorias de que os sócios sejam titulares.
Por via desta imputação surgem dúvidas quanto à existência de uma eventual
obrigatoriedade de se efetuar a distribuição de lucros todos os anos. Não só esta obrigação
não existe como o valor apurado de acordo com estas regras não é o valor que vai ser
distribuído aos sócios. Tal como acontece no regime geral, não é o valor do lucro fiscal
apurado na esfera da sociedade que é suscetível de distribuição, mas sim o valor que for
apurado na contabilidade. A aplicação deste regime não altera em nada as regras relativas à
distribuição de lucros ou imputação de prejuízos que continuam a ser efetuadas em
conformidade com o regime jurídico da sociedade (conforme o previsto no pacto social e de
acordo com o que for deliberado pelos sócios, sobre os valores apurados na contabilidade).
O que é provável é a política da distribuição se alterar, já que os sócios vão ser tributados
mesmo que os lucros não lhes sejam distribuídos, pelo que a decisão de sujeitar uma
sociedade à transparência residirá, essencialmente, no destino pretendido para estes. Isto não
se apresenta como algo benéfico para a sociedade, pois condicionará o reinvestimento de
lucros e, imediatamente, travará o crescimento e a potenciação da sociedade. Em último e
mais gravoso caso, o pagamento de uma obrigação tributária sem recebimento efetivo de
lucros estará aliada ao não controlo da carga tributária por parte dos sócios.
Cumpre-se fazer uma reflexão em torno do preceito vigésimo do CIRS.
Este artigo foi objeto de alteações289, passando a dispor, no seu n.º 1, que constitui
rendimento dos sócios pessoas singulares das entidades referidas no artigo 6.º do Código
do IRC, o resultante da imputação efetuada nos termos e condições dele constante ou,

289
Redação da L n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro que entrou em vigor em 01.01.2009.

114
quando superior, as importâncias que, a título de adiantamento por conta de lucros, tenham
sido pagas ou colocadas à disposição durante o ano em causa. Neste caso, o resultado da
imputação efetuada nos anos subsequentes deve ser objeto dos necessários ajustamentos
destinados a eliminar qualquer duplicação de tributação dos rendimentos que possa vir a
ocorrer. Esta alteração à transparência é materialmente estranha, contraditória e violadora
do cerne deste regime. Decorre do artigo 6º que o seu núcleo é a imputação aos sócios da
matéria coletável determinada nos termos do CIRC, sendo a distribuição dos lucros,
independentemente da modalidade assumida, irrelevante do ponto de vista fiscal. Tal é
possível constatar pelo artigo 5º, n.º 2, al. h) CIRS ao afirmar que considera rendimento da
categoria E os lucros e reservas colocados à disposição dos associados ou titulares e
adiantamentos por conta de lucros, com exclusão daqueles a que se refere o artigo 20.º. O
desinteresse pelo destino dos lucros gerados nas sociedades transparentes permite legitimar
a manipulação da distribuição efetiva dos resultados de modo completamente
desproporcional à imputação legalmente prevista da matéria coletável, o que é violar do
princípio da capacidade contributiva.
Inovou-se em relação ao aspeto material do elemento objetivo de incidência, mas tal
metamorfose não foi acompanhada pelo CIRC, não parecendo existir justificação para tal
consagração. Carece de lógica a substituição de uma base tributável constituída pela matéria
coletável, por adiantamentos por conta de lucros, realidades totalmente dissemelhantes. Irá
tributar-se lucros distribuídos ao invés de matéria coletável, como haveria de ocorrer. Mas,
os lucros distribuídos são rendimentos de capitais, integrados na categoria E, onde
efetivamente deveriam ser tributados. Só a matéria coletável das sociedades sujeitas à
transparência se integra na categoria B como rendimento liquido. Nestes casos, a tributação
deveria ser efetuada como se a sociedade fosse um verdadeiro sujeito passivo de IRC,
desconsiderando-se o regime de transparência.
Mais se adita que a alteração efetuada é assimétrica e discriminatória na medida em
que, nalguns casos, se estivermos perante uma sociedade constituída por pessoas coletivas e
por pessoas singulares, a imputação sofrida pela pessoa singular será manifestamente
desproporcional à sofrida pela pessoa coletiva. Ao considerar-se o rendimento imputado
como um todo, sem fazer qualquer distinção quanto à sua fonte, inserindo-o numa única
categoria, cria-se um agravamento da tributação pessoal dos sócios pessoas singulares.
Certos rendimentos, se fossem diretamente imputados aos sócios, não passando pela

115
sociedade, seriam tributados noutras categorias e sujeitos a taxas liberatórias e taxas
especiais previstas nos artigos 71º e 72º CIRS, respetivamente, provavelmente, muito
inferiores à taxa progressiva de IRS que resultar do seu englobamento, atenta ao facto de
que todo o rendimento imputado pela sociedade ser considerado da categoria B. Para as
sociedades, as dificuldades operacionais são devastadoras, nomeadamente quanto àquilo que
se deverá entender por adiantamento de lucros. Não sabemos se serão as importâncias assim
qualificadas pela contabilidade da sociedade e objeto de lançamento ou também aquelas que
assim se presumem por força do artigo 6º, n.º 4 CIRS. Somos da opinião que, por não haver
qualquer distinção legal, existindo adiantamentos efetivos e adiantamentos presumidos, deve
ser considerado o somatório de ambos290.
Finalmente, quanto ao n.º 5 do artigo 20º CIRS cumpre-se saber como são efetuados
os ajustamentos conducentes à eliminação de alguma duplicação de tributação de
rendimentos que possa vir a ocorrer. Os destinatários deste preceito parecem ser as entidades
transparentes, o que implica que devem observar procedimentos específicos, cuja
capacidade de controlo por parte da administração da sociedade não está em condições de
acompanhar, pois não existe base legal que determine que a sociedade tenha de substituir a
matéria coletável por adiantamentos por conta de lucros na declaração modelo 22 nem que
tenha de declarar algo diferente no anexo G à declaração anual prevista no artigo 109º, n.º 1
CIRC. A recente alteração protagonizada ao artigo 20.º do Código do IRS, no sentido de
sujeitar a IRS os adiantamentos feitos aos sócios de sociedades transparentes por conta de
lucros, sempre que estes se revelem superiores ao resultado da imputação, agravou a
descaracterização da matéria coletável e a complexidade inerente ao regime, ainda que
motivada por uma preocupação compreensível com a evasão fiscal, não se compreendendo
como são tributados os adiantamentos por conta de lucros a sócios pessoas singulares de
sociedades de profissionais, diferentemente do que sucede nos sócios pessoas coletivas.

290
No entanto, se tiver sido aberto um procedimento contraditório nos termos do artigo 64º CPPT a fim de se
ilidir a presunção, tal não se poderá verificar sob pena de se perder o efeito útil.

116
2 – QUANTO ÀS SOCIEDADES DE SIMPLES ADMINISTRAÇÃO DE BENS

Criar uma sociedade comercial para desenvolver um negócio imobiliário como o


arrendamento ou a compra e venda de imóveis acarreta várias vantagens, pois estes, quando
tributados em sede de IRS, são fortemente taxados. Daí que a grande motivação na criação
societária para gerir o próprio património imobiliário resida na redução da carga fiscal 291,
todavia, quando detidas por o mesmo grupo familiar, frequentemente, a natureza das relações
pessoais entre eles interfere com a gestão dos negócios. O legislador, ao aqui incluir as
sociedades de simples administração de bens, primordialmente, o que pretendeu foi o
combate ao planeamento fiscal que, por via de uma sociedade cujo objeto é a aquisição de
bens imóveis, com o intuito de os revender, atingiam-se poupanças que o IMI (imposto
municipal sobre imóveis) e o IMT (imposto municipal sobre as transmissões onerosas de
imóveis) proporcionavam, apesar destas não deixarem de estar sujeitas a imposto selo292.
Na situação de ser um particular adquirir um imóvel, terá de liquidar o IMT e, durante
o tempo em que for propriedade sua, terá de liquidar também o IMI. Caso o venha a alienar,
o preço que por ele receber caberá na categoria G do IRS, visto constituir um incremento
patrimonial, mais especificamente uma mais-valia, em virtude da remissão do artigo 9º, n.º
1, al. a) CIRS para o 10º, n.º 1, al. a). Caso o venha a arrendar (ou subarrendar), recairá sobre
ele o dever declarar o valor das rendas recebidas (ou a diferença entre a renda recebida do
subarrendatário e paga ao senhorio), o que só acontecerá se tiver um contrato que comprove
o arrendamento e, tais rendimentos farão parte da categoria F293 (há a possibilidade de os
senhorios considerarem os rendimentos prediais como rendimentos empresariais, sendo a
forma de apurar o rendimento líquido a da categoria F, e não a da categoria B294). Para 2016,

291
Não obstante a necessidade de alvará para exercer a atividade, como o estipulado nos artigos 6º e 12º da Lei
n.º 41/2015, de 3 de junho, vulgarmente conhecida como lei dos alvarás, que revogou o Decreto-Lei n.º
12/2004, de 9 de janeiro.
292
Imposto de selo sobre a transação compra e venda, corresponde a uma taxa de 0,8% sobre o valor de
aquisição do imóvel, que consta na escritura. Cfr. Tabela Geral do Imposto do Selo.
293
Com a entrada em vigor da revisão do CIRS, foram introduzidas algumas alterações para os rendimentos
de categoria F, referentes às rendas recebidas. Os proprietários dispensados, que não tenham optado pela
emissão de recibos eletrónicos, devem entregar uma declaração, através do portal das Finanças, relativa às
rendas obtidas no ano anterior. Devem fazê-lo até 31 de janeiro do ano seguinte. A declaração será entregue
com a informação sobre os valores anuais recebidos, individualizados com a identificação do imóvel e o
número de contribuinte dos inquilinos. Para o efeito, devem preencher o modelo 44.
294
Com esta medida, a AT quer conhecer, a cada momento, os recibos passados, pelo que o senhorio terá de
emiti-los através do site das declarações eletrónicas. Os inquilinos deverão validar os recibos através do e-
fatura, contribuindo assim para o combate à evasão fiscal. Tal permitirá apurar, desde logo, os benefícios fiscais
(deduções à coleta) de que deverão ser beneficiários os inquilinos. Para que possam ser tributados desta forma,

117
foi alargado o campo das despesas elegíveis para os rendimentos prediais, passando a
deduzir-se todos os gastos indispensáveis à obtenção de rendimentos, excetuando-se os
encargos financeiros, artigos de decoração ou eletrodomésticos e mobiliário. Os
rendimentos prediais até € 10.000 anuais podem optar pela não retenção na fonte, por força
da junção dos artigos 101º-B, n.º 1, al. a) e n.º 2 do CIRS e 53º, n.º 1 do CIVA. Acima desse
montante, desde que o inquilino disponha de contabilidade organizada nos termos do artigo
101º, n.º 1, al. e) CIRS, é obrigatório reter à taxa de 25%.
Se, ao invés, em questão estiver uma sociedade, cujo o objeto social é
supramencionado, os imóveis adquiridos com esse propósito integram o ativo corrente (ou
circulante) da sociedade, o que justifica os benefícios por estes impostos atribuídos. Atente-
se que os ativos podem dividir-se em ativos correntes e ativos não correntes. Será um ativo
corrente quando satisfazem qualquer um dos seguintes critérios: ser realizado ou pretensão
de ser vendido ou consumido no decurso normal do ciclo operacional da entidade; estar
detido essencialmente para a finalidade de ser negociado; intenção de ser realizado num
período até doze meses após a data de balanço; ser caixa ou equivalente de caixa (a menos
que lhe seja limitada a troca ou uso para liquidar um passivo durante pelo menos doze meses,
após a data de balanço). Deste, fazem parte, entre outros, os inventários, os ativos biológicos
(consumo), os clientes, ativos não correntes detidos para venda ou os meios financeiros
líquidos. Por sua vez, os ativos não correntes serão aqueles que não satisfaçam a definição
de ativos correntes295 e a ele pertencem, não só os ativos tangíveis, biológicos e os fixos
tangíveis, como também os investimentos financeiros e as propriedades de investimento. Se
o objeto social for a venda de, por exemplo, automóveis ou imóveis, os veículos ou os
imóveis destinados à venda, integrarão ativo corrente, mas não já se forem para uso pessoal
da empresa296.

é preciso fazer a respetiva alteração, tendo os proprietários de entregar a declaração de início ou de alteração
de atividade (caso já tenham outra aberta e queiram alterar a situação). Todo o processo é tratado através do
portal das Finanças e terá efeitos práticos na declaração entregue em 2017.
295
V. Framework (for the preparation and presentation of financial statements) do IASB e CASALTA
NABAIS, José, Direito..., ob. cit., p. 583.
296
A inclusão de um bem no ativo imobilizado da empresa não é fiscalmente neutra na medida em que a mais-
valia obtida na venda de um bem que pretença ao imobilizado da empresa, os quais, por regra, são propriedade
do sujeito passivo, se encontra sujeita a um regime fiscal privilegiado. Também é possível que bens que sejam
da propriedade de outrem, integrem o ativo imobilizado da empresa por esta deles dispor como proprietária,
daí que será esta que procederá às respetivas amortizações. Por exemplo, os bens com reserva de propriedade
ou em regime de leasing (locação financeira).

118
Assim, o artigo 9º, n.º 1, alíneas d) e e) do CIMI atribuem um diferimento da
tributação de IMI, através da não sujeição temporária ao imposto dos terrenos destinados à
construção de edifícios para venda e aos prédios que integrem o ativo de empresas que
tenham por objeto a sua venda297. Estipula-se que só será devido a partir do 3.º ano seguinte,
inclusive, àquele em que um prédio tenha passado a figurar no inventário de uma empresa
que tenha por objeto a sua venda, ou do 4.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um
terreno para construção tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha
por objeto a construção de edifícios para venda298.
Por sua vez, o CIMT contempla várias isenções que se encontram consagradas nos
artigos 6º, 7º, 8º e 9º. Mantendo o mesmo espírito do Código do Sisa, o IMT preservou, no
artigo 7º, a isenção299 de imposto para aquisição de bens imóveis para revenda, entendendo-
se como esta a operação iniciada com a aquisição de um bem imóvel e a sua venda posterior,
sem que este tenha sofrido qualquer alteração de fundo. Contudo, não nos parece que isenção
seja o termo correto, defendemos que aqui se trata de uma exclusão tributária300. O bem
imóvel é, para efeitos de IMT, considerado como uma mercadoria transacionada como se de
um artigo comercial se tratasse301, tendo o valor que lhe é acrescentado total correspondência
com o valor da margem comercial (vulgarmente denominado por lucro) do agente
económico. O legislador tenciona que, quando à compra de um bem subjaz o intuito de o
revender, não deverá ser encarada como uma verdadeira aquisição na medida em que o atual
comprador não irá ser o futuro proprietário (nem usufrutuário) do bem em apresso e a sua
pretensão é tão só ser compensado. Além disso, os prédios adquiridos mantêm-se como
mercadorias no ativo permutável da empresa tributada pelo exercício da atividade de

297
Cfr. Ofício-Circulado n.º 40095, da Direção de Serviço do IMI, de 12.03.2009.
298
Redações da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro.
299
A lei estabelece um conjunto de pressupostos do regime de isenção em IMT dos prédios adquiridos para
revenda que constituem mecanismos preventivos da sua utilização abusiva e da prática de operações de fraude
fiscal. A isenção de tributação, tem carácter excecional, pois consubstancia -se na revogação dos princípios
gerais que norteiam à tributação, nomeadamente, os princípios da capacidade contributiva, e da igualdade
da tributação. Como refere SÁ GOMES, Nuno, «Caducidade de isenção de SISA», CTF, n. º 380, 1995, p.
488, o fundamento da isenção em causa está na circunstância de os prédios adquiridos se manterem, como
mercadorias, no ativo permutável da empresa tributada pelo exercício da atividade de aquisição de prédios
para revenda. A diferenciação de tratamento nas situações de revenda encontra justificação no
reconhecimento que só o caso da transmissão onerosa e definitiva está sujeita a IMT.
300
Ainda que o CIMT anotado a utilize. V. MARTINS BRÁS, Eduardo, SANTOS ROCHA,
António, Tributação do Património - IMI-IMT E Imposto do Selo (Anotados e Comentados), Almedina,
Coimbra, 2015. P. 394 e ss.
301
V. Ac. do TCAN de 12.12.2014 (Proc. n.º 00005/07.0BEMDL).

119
aquisição de prédios para revenda302, não se estando, deste modo, face a matérias-primas
compradas para a transformação em mercadorias303. Parece-nos até que existe uma
delimitação negativa da incidência do imposto, fazendo com que esta situação seja encarada
como uma espécie de transparência fiscal304.
Em razão dos imóveis serem contabilizados como ativo corrente e os rendimentos
serem tratados como ganhos, a sociedade será tributada em sede de imposto sobre o
rendimento das pessoas coletivas pelas mais-valias obtidas com a alienação dos imóveis.
Para o apuramento destas, ter-se-á em atenção a diferença entre o valor da transmissão do
imóvel (líquido dos encargos que lhe sejam inerentes) e o valor de aquisição deduzido das
depreciações e amortizações fiscalmente aceites, das perdas por imparidade e outras
correções de valor previstas na lei, e ainda dos valores reconhecidos como gasto fiscal305. A
fundamentação reside no facto de estas aquisições se destinarem a incorporar as
mercadorias – inventários – da empresa e deste modo se afastarem aos custos financeiros
inerentes ao imposto devido por tais aquisições. Se não se verificar a isenção, o imposto
pago, haveria de ser considerado custo da respetiva atividade306. Por este motivo, e visto
não se mostrar correto proceder-se à tributação da venda de elementos do ativo permutável
da empresa, a tributação não ocorrerá em sede de imposto de património307. A solução será
a mesma se for a sociedade a arrendar um imóvel, considerando-se que o valor que receberá
por esse negócio jurídico fará parte do seu lucro.
Para que se possa deste artigo beneficiar, terão de se verificar os seguintes requisitos:
apresentar a declaração prevista nos códigos de IRS e IRC que comprove que o objeto social
do sujeito passivo inclui a compra e venda de imóveis ou a sua revenda; incluir no texto da

302
Não sendo esta característica afetada pelo acabamento dos prédios adquiridos, ainda em construção, e pela
constituição posterior da propriedade horizontal. Como, aliás, acontece com a aquisição de prédios rústicos
adquiridos para revenda e posterior loteamento com venda por lotes, não obstante as numerosas obras que, em
geral, tal operação implica, desde a construção da rede viária ao saneamento básico. O mesmo é aplicável a
imóveis que, à data de aquisição, se encontravam arrendados a terceiros (neste caso, desde que a sociedade, ao
adquirir o imóvel, registe contabilisticamente a sua aquisição em inventários e não em investimentos, poderá
beneficiar da isenção).
303
Cfr. DL n.º 410/89, de 21 de novembro .
304
V. LEITE de CAMPOS, Diogo, ob. cit.
305
O valor de aquisição poderá ser atualizado mediante a aplicação de coeficientes de desvalorização
monetária, sempre que, à data de realização, tenham decorrido pelo menos 2 anos desde a aquisição. As mais-
valias fiscais serão apenas consideradas em 50% do respetivo quantitativo quando o valor de realização seja
integralmente reinvestido, até ao fim do segundo exercício seguinte ao da realização, conforme condições
previstas no CIRC.
306
MARTINS BRÁS, Eduardo, SANTOS ROCHA, António, Tributação ..., cit., p. 394.
307
Cfr. o art. 1º do Cód. Sisa e o ac. STA de 06.10.1999 (Rec. N.º 23.831).

120
escritura pública de compra e venda a indicação que os bens a transacionar têm o intuito
de revenda; contabilizar nos serviços de contabilidade a respetiva aquisição numa conta de
existências; e, apresentar uma declaração emitida pelo serviço de finanças indicando que o
sujeito passivo desenvolve essa atividade de forma regular (sendo que se considera que o
sujeito passivo exerce normal e habitualmente a atividade de comprador de prédios para
revenda quando adquire ou revende um imóvel com esta finalidade no ano anterior à data de
escritura).
Ainda assim, tal medida encontra-se delimitada, temporalmente, no artigo 11º,
caducando, se se verificar uma das três situações aí enunciadas: aos prédios adquiridos para
revenda não foram revendidos dentro do prazo de três anos; estes foram novamente para
revenda; ou, foi-lhes dado destino diferente308. Ao ser estipulada a caducidade, pretendeu-
se não só evitar o descontrolo da atribuição da isenção, como também uma delimitação do
planeamento fiscal dos contribuintes309. Quando a venda não se processa dentro do horizonte
temporal estipulado, a lei assume que o imóvel não se reveste com a mesma qualidade de
então, pelo que, nesse momento, a incidência do imposto passa a abarcar a referida aquisição.
Uma vez que a lei não isenta o comprador final do pagamento do IMT, tal situação cria um
custo adicional no contribuinte, o que desvirtua a lógica do imposto.
Na segunda situação, é necessário que o imóvel adquirido para futura revenda não
tenha sido igualmente comprado anteriormente com o mesmo intuito, o de revenda. Visa-se,
com isto, o combate às evasões fiscais e as transações faltosas nas quais os imóveis circulam
de ativo em ativo de empresas do mesmo grupo, entre empresas com relações especiais entre
si ou entre os sócios da mesma, a fim de ajustarem balanços e afastarem a liquidação do
imposto310. Algo bastante comum nas sociedades de simples administração de bens. A
verdade é que um investidor que revende o imóvel a outro, que também pretende a sua
revenda, é prejudicado. O legislador, não conseguindo controlar as aquisições de revenda
sobre revenda, anula esta possibilidade numa atividade económica que depende e assenta

308
Cfr. nº 5 do artigo 11.º do mesmo Código e n.º 6 do mesmo preceito quanto à isenção pela aquisição de
imóveis por instituições de crédito (quanto a estas a caducidade é de 5 anos).
309
Persiste a questão de saber se o prazo legalmente estabelecido é suficiente para a normal atividade dos
agentes económicos. Face às vicissitudes do mercado imobiliário e à presente conjuntura há quem defenda que
o prazo é manifestamente reduzido, pois, é possível que devido a inúmeros fatores, o imóvel não seja alienado
dentro do prazo limite.
310
V. Ac. do TCA Norte de 12.12.2014 (Proc. n.º 00005/07.0BEMDL) que defende que, tendo um prédio sido
comprado com destino a revenda e tendo sido novamente vendido à original compradora, para revenda não
beneficia da isenção prevista do art.º 7.º por força do n.º 5 do art.º 11.º do CIMT.

121
sobre a lógica de transparência fiscal. Parece-nos que, neste caso, a excessiva preocupação
legislativa no controlo da evasão fiscal não acautela o normal funcionamento do mercado
nem os legítimos interesses dos indivíduos de boa-fé.
Quanto à última hipótese de caducidade, é necessário averiguar o que se entende por
destino diferente. Este normativo reproduz o artigo 13.º-A do revogado CIMSISSD, que
determinava igual solução no n.º 1 do seu artigo 16º. A jurisprudência tem vindo a dilatar o
que se considera por destino diferente, já se tendo o STA pronunciado, que para efeitos de
caducidade da isenção de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis que
decorre da conjugação das normas contidas nos artigos 7º e 11º, n.º 5, do CIMT, não
importa se o imóvel adquirido é ou não revendido no preciso estado em que foi adquirido;
o que importa é que não haja uma metamorfose ou alteração substancial do bem adquirido
para revenda. A expressão para revenda não exige que o imóvel seja alienado tal como
existia no momento da aquisição, admitindo, antes, a possibilidade de realização de todas
as obras necessárias à ultimação dessa construção, por forma a acabá-lo, licenciá-lo para
o referido destino, constituir a propriedade horizontal e alienar as respetivas fações
autónomas311.

3 – CONCLUSÃO

A consagração do regime de transparência fiscal releva de opções de natureza


política, mas a divergência de opiniões, quanto à bondade da decisão em criar e manter este
regime de tributação especial confirma, que a transparência é uma das vias possíveis no
caminho da tributação, mas está longe de ser a única. Se é verdade que a sua vigência
permite, no que às sociedades de profissionais diz respeito, assegurar a igualdade de
tratamento fiscal entre os seus sócios, por um lado, e profissionais independentes titulares
de rendimentos da categoria B de IRS, por outro, também reputa pacífica a afirmação de
que, na sua ausência, não cairíamos, fatalmente, numa inevitável situação de arbitrária
desigualdade na tributação de tais sujeitos passivos312. Levantam-se vozes no sentido de que

311
Ac. do STA 2/2015, de 17.09.2014, proferido no Proc. n. º 1626/13, no seguimento dos acórdãos de
23.02.2000 e de 26.01.2005.
312
FARIA COSTA, José de, ob. cit., p. 6.

122
seria aceitável consagrar o regime de transparência para certas sociedades por quotas com
estrutura personalista313 e outras que, munidas dos argumentos que a transparência carece
de justificação e aos contribuintes deverão ser eliminados incómodos, defendem a sua
abolição do ordenamento jurídico-tributário314.
No ano de 1996, a Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal315, presidida
por Silva Lopes, advertiu que dada a diminuta perda de receita fiscal, e atendendo aos
objetivos de equidade, neutralidade fiscal, eliminação da dupla tributação e igualdade de
tratamento entre as sociedades de pessoas portuguesas e as estrangeiras, a transparência
fiscal deveria abranger também as sociedades em nome coletivo, bem como as sociedades
em comandita simples. A resposta à questão de saber se as sociedades de simples
administração de bens deveriam ser mantidas estaria dependente dos objetivos visados pelo
legislador ao aí inclui-las. Para a Comissão era patente que seriam, regra geral, criadas para
diminuir a carga fiscal, deduzindo-se custos que não seriam possíveis se a atividade fosse
exercida em nome individual. Não eram da opinião que fosse finalidade legislativa,
relativamente a estas, a eliminação da dupla tributação, nem a neutralidade na forma de
determinação da matéria coletável se comprovou. Por fim, focaram-se na necessidade de
uma maior e eficaz gestão fiscal na dedução de despesa, alertando que os objetivos do regime
não seriam cumpridos relativamente às sociedades transparentes enquanto a taxa de IRC
mais a derrama se situassem em níveis próximos da taxa marginal mais elevada do IRS, pelo
que a solução passaria por deixarem de estar sujeitas ao mesmo.
Ulteriormente, em 2009, o Grupo de Trabalho para o Estudo da Política Fiscal316,
coordenado por Carlos dos Santos e Ferreira Martins, entendeu que seria imprescindível a
existência do regime de transparência fiscal, apresentando um leque de propostas que
visavam torná-lo mais controlável e menos passível de abusos e manipulações. Propunham
a sua manutenção, tanto para os grupos transparentes como para as sociedades civis e a
correção do CIRC quanto à problemática do artigo 5.º, n.º 9. Porém, seria imperativo
repensar a sua aplicabilidade às sociedades de profissionais e às sociedades de simples

313
BARREIRA, Rui, «A Responsabilidade dos Gestores por Dividas Fiscais», Fisco, n.º 16, janeiro de 1990,
p. 69.
314
V. PINTO, J. A., «Justificar-se-á manter o regime de transparência fiscal?», Jornal de contabilidade
APOTEC, 387, junho de 2009. pp. 200-202.
315
Disponível em: http://purl.sgmf.pt/COL-MF-0028/1/COL-MF-0028_master/COL-MF-0028_pdf/14.pdf, p.
632.
316
Disponível em: http://www.fd.unl.pt/docentes_docs/ma/RCP_MA_12632.pdf.

123
administração de bens, pois consideravam que o regime se encontrava descaracterizado.
Estas, ou estariam sujeitas ao regime geral do IRC, ou criar-se-ia um regime optativo
acompanhado pela sua redefinição conceptual. Caso se encontrassem sujeitas ao regime
geral de IRC, a transparência fiscal deixar-se-ia de aplicar, respeitando-se a decisão de
distribuição dos lucros gerados ao nível da sociedade (tributação de duplo nível). Foi esta a
solução adotada em Espanha317. Por sua vez, a criação de um regime optativo318 implicaria
o aperfeiçoamento da definição legal destas sociedades, clarificando-se neste caso, também
a situação das sociedades unipessoais.
A verdade é que às diferentes formas adotadas para o exercício da atividade
profissional correspondem variadas cargas fiscais, condicionadas pelos métodos de
apuramento do rendimento e pelas taxas de tributação que lhes correspondem. Como é fácil
de constatar, a descida progressiva da taxa nominal do IRC, e o consequente aumento do
diferencial relativamente às taxas do IRS, conduzirá, em substituição do exercício das
atividades em nome individual, a um incremento da constituição de sociedades. Realidade
que é já evidente no nosso país, cujo campo empresarial é maioritariamente composto por
microempresas constituídas sob a forma de sociedades conjugais ou mesmo unipessoais, que
mais não são do que sociedades interpostas para diminuição da carga fiscal sobre o
rendimento das pessoas singulares. Ademais, atualmente, no que respeita às sociedades de
profissionais, muitas são verdadeiras sociedades de capitais, cujos elevados resultados que
vêm a auferir não seriam possíveis, se não tivessem subjacente uma estrutura societária.
Compostas por diversos especialistas dentro da mesma área de atuação, encontram-se cada
vez mais institucionalizadas e distantes do profissional individual, outrora comum em
diversas atividades.
Não podemos negar que a transparência fiscal suscita dificuldades de controlo e que
os seus pressupostos são facilmente manipuláveis, por não se mostrar possível verificá-los

317
Na configuração originária, o artigo 12º LIS admitia duas modalidades de transparência: a obrigatória e a
voluntaria que respondiam a finalidades e objetivos distintos. Estariam sujeitas à modalidade de transparência
obrigatória (ou necessária), por remissão do artigo 19.1 da Ley 61/1978317, de 27 de descimbre para o 12.2317
da Ley 44/1978, as sociedades de inversión mobiliaria, as sociedades de cartera317 e as sociedades de mera
tenencia de bienes, sempre que mais de metade do capital social pertença a um grupo familiar ou no máximo
a dez sócios e nenhum deles seja pessoa jurídica de Direito público. Também as entidades jurídicas constituídas
para o exercício de uma atividade profissional na qual os sócios fossem profissionais dessa mesma atividade.
As restantes sociedades, independentemente da forma ou atividade desenvolvida, estariam sujeitas à
transparência voluntária317, podendo optar por este regime se verificados certos requisitos. Contudo, face aos
resultados negativos que apresentou, foi suprimida, em 1985.
318
Foi a solução adotada nos EUA com os chamados check-the-box regulations (V. Treasury Regulations
Sections 301.7701-1 a 301.7701-3, disponíveis em www.irs.gov).

124
em termos automáticos. Pode até acontecer que a mesma entidade seja, num exercício,
sujeito passivo do regime de transparência, e noutro não, o que reclama, em nossa opinião,
o cruzamento de informação entre a declaração de rendimentos da entidade transparente (a
IES), e a declaração de rendimentos do respetivo sócio ou membro, o qual, na prática, não
se apresenta fácil.
Não obstante, a sua conceção legal como um regime não eletivo, acaba por se
caracterizar pelas efetivas opções dos contribuintes. Devido à última alteração efetuada,
bastantes questões surgem, mas a resposta tarda em chegar. A prova levada a cabo pela
autoridade tributária da verificação dos novos e densos requisitos aditados na subalínea 2)
do n.º 4 do art. 6º do CIRC mostra-se, ainda, mais difícil do que a anterior. Somos da opinião
que é imperativo saber que sociedades de profissionais se pretendem para o futuro, assim
como as implicações da alteração que refere que os requisitos cumulativos para a tributação
passam de um qualquer dia de tributação para durante mais de 183 dias do período de
tributação que colocaram novos problemas quanto à determinação da sua aplicação ao caso
da residência, à quantificação e ao controlo destas sociedades.
Continuemos. Ao abranger, por via da ampliação dos pressupostos normativos, as
sociedades de profissionais que anteriormente escapavam à sua aplicação, tornou-se mais
difícil a fuga. Todavia, a taxatividade dos mesmos, mostram-nos de forma (bastante) clara,
o caminho (demasiado acessível) a seguir para que na transparência não se caia. Querendo
o legislador abarcar no seu seio o maior número possível de sociedades de profissionais,
desvirtualizou o princípio original da sua tributação, parecendo não se lhes vislumbrar, a
nível fiscal, um futuro próspero.
Apenas as atividades profissionais, cujo respetivo estatuto determine que os sócios
das pessoas coletivas constituídas para seu o desempenho devam ser necessariamente
pessoas singulares se encontram, obrigatoriamente, abrangidas pelo art. 6º. Sendo a própria
norma que indicia ao contribuinte a forma de evasão, parece existir, entre nós, somente uma
sociedade que não pode escapar: a sociedade de advogados. Pois, o seu regime jurídico-
estatutário determina, de forma expressa, que todos os sócios têm de ser advogados319. As
restantes sociedades procurarão meios para não se sujeitarem à transparência, só

319
De acordo com o regime jurídico que se lhes aplica por imposição do DL n.º 229/2004, de 10 de dezembro
que consagrou que as sociedades de advogados são, obrigatoriamente, sociedades civis, cujos sócios terão de
ser advogados inscritos regularmente na respetiva Ordem.

125
permanecendo nela quem, por mera distração, não tiver saído e quem não puder fugir ou
quem retire dela alguma vantagem.
O mesmo se verifica nas sociedades de simples administração de bens, sendo que,
face à formulação legal do seu conceito, poderão ficar abrangidas realidades diversas
daquelas que o legislador pretendeu, e cuja não subordinação ao regime geral de tributação
carece de justificação (é o caso das sociedades de capitais que desenvolvem uma atividade
comercial com intuitos lucrativos).
Ainda sobre as sociedades de profissionais, em nossa opinião, e à semelhança do que
acontece em alguns países europeus, entre os quais se realça a Espanha, a França e o Reino
Unido, a questão seria ultrapassada com a classificação das sociedades em dois tipos:
sociedades de pessoas (às quais se aplicaria a transparência fiscal) e sociedades de capitais.
Nestes ordenamentos, nos quais vigora um regime de tributação especial aplicável às
sociedades transparentes, a distinção é efetuada em termos jurídicos, conduzindo à
simplificação e uniformização de todo o sistema normativo. Entre nós, tal categorização
seria prosseguida pela definição de critérios operacionais e de aplicação nos quais a distinção
pudesse ser baseada, bastando tão só que as sociedades de pessoas fossem, ab initio,
consideradas entidades transparentes, e tributadas nas pessoas dos sócios, e as sociedades
de capitais, tributadas pelo regime geral de IRC. Porém, em Espanha, a partir de 1 de janeiro
de 2003, a Ley 46/2002, de 18 de deciembre, procedeu à alteração das leis reguladoras do IS
e do rendimento dos não residentes, suprimiu, por razões de neutralidade, o regime, pois,
apesar de ter sido consagrado para combater a evasão fiscal, teve o efeito inverso e a sua
estatuição ofereceu um amplo campo de planificação fiscal320.
Estamos cientes das dificuldades, face à complexidade da questão e da própria
legislação, da concretização desta proposta, mas acreditamos que será possível, pelo menos,
definir os requisitos, estabelecer os parâmetros, e determinar as condições que permitam, de
forma suficientemente clara, classificar as sociedades em cada um dos grupos e incluí-las no
correspondente regime fiscal.
A consagração de um regime optativo também não seria desprovida de justificação
ou sentido. Em abono desta escolha milita a realidade multiforme das entidades sujeitas à

320
Eliminou-se o instituto para as entidades que levem a cabo atividades profissionais, artísticas ou desportivas.
Para as entidades de cartera ou de mera tenência de bens passou-se a aplicar o novo e especial regime das
sociedades patrimoniais. Quanto aos agrupamentos de interesse económico espanholas, AEIE e uniões
temporais de empresas, conservam o regime de transparência fiscal própria (mas a denominação transparência
foi suprimida).

126
transparência, muito diferentes no seu substrato financeiro e societário. Assim, se umas
radicam em elementos fiduciários, e meramente pessoais, outras são verdadeiras sociedades
de capitais, sendo por isso desprovido de sentido que o legislador presuma a tributação de
rendimentos quando estes podem nem sequer existir ou a sua distribuição não acontecer por
motivos respeitantes à própria estrutura da sociedade. Basta pensar que uma sociedade de
advogados pode integrar apenas dois sócios, como únicos profissionais, ou dezenas de sócios
e outros profissionais, servindo de suporte à atividade de centenas de advogados. Assim,
caberia somente aos sócios a solução que mais se lhes adequaria, determinando se
pretendiam que o lucro fosse tributado na sua esfera pessoal, em IRS, ou na esfera da
sociedade, nos termos gerais previstos no CIRC. Apesar da tributação, segundo o regime
geral de IRC de ser um objetivo para a maioria (quiçá todas) as sociedades de profissionais,
estaríamos a desvirtualizar os pressupostos nos quais assenta a transparência fiscal se tal lhes
fosse permitido, sem qualquer requisito ou supervisão.
A transparência terá interesse nos casos em que a sociedade não efetue muitos
investimentos e que, em virtude disso, apresenta uma despesa também ela diminuta,
coincidindo, quase na totalidade, os rendimentos da sociedade com os lucros distribuídos.
Por via do regime geral, a aplicação da taxa de IRC, em primeiro lugar, e da taxa do IRS que
sobre os lucros distribuídos, em segundo, a tributação acabaria por se mostrar superior à que
resulta do regime de transparência. Neste, pela tributação somente ocorrer na esfera pessoal,
as distorções no tratamento fiscal dos lucros distribuídos e retidos são evitadas e o princípio
da equidade é, deste modo, cumprido.
Além disso, se não existisse transparência fiscal, e a tributação segundo o regime
geral de IRC, fosse completamente negada, os sócios seriam tributados individualmente, em
sede de IRS, aquando da determinação da base tributável. Ser-lhes-ia, nos termos do artigo
33º do CIRS321, negada a possibilidade de dedução de determinadas despesas que, na
transparência, são admitidas, em virtude das entidades por si abrangidas se comportarem,
até ao apuramento da matéria coletável, como qualquer sujeito passivo de IRC, beneficiando,
assim, de um maior número de encargos subtraíveis para efeitos fiscais.

321
Cfr. Artigo 33º, n.º 1 CIRC: as remunerações dos titulares de rendimentos da categoria B, assim como
outras prestações a título de ajudas de custo, utilização de viatura própria ao serviço da atividade, subsídios
de refeição e outras prestações de natureza remuneratória, não são dedutíveis para efeitos de determinação
do rendimento da referida categoria.

127
Ao longo dos últimos anos, no que ao IRS diz respeito, assistimos a uma crescente
entrega de declarações de IRS com anexo D – referente à transparência fiscal -, o que reflete
um aumento da imputação da matéria coletável aos sócios das sociedades transparentes. Às
773 declarações constatadas em 2011, acresceram 223 no ano seguinte, perfazendo, em
2012, o total de 996. O aumento, apesar de mais lento, continuou a verificar-se e, em 2013,
foram apresentadas 1127 declarações. A taxa efetiva de tributação bruta aplicada em IRS à
transparência tem vindo a sofrer um acréscimo, sendo que em 2008 vigorava em torno dos
18% e em 2013 situava-se já nos 27,22%. Ascensão verificada também quanto ao
rendimento bruto liquidado que, em 2013, atingiu os 26 milhões de euros, sendo que, para o
mesmo ano, o valor de IRS liquidado, foi de 7 milhões de euros. Ainda que os mais recentes
dos estudos efetuados pela AT remontem ao ano de 2013, inclusive, não havendo registos
da influência da última alteração legislativa que alargou o conceito de sociedades de
profissionais, achamos que esta progressividade se manteve. A curto prazo, não se
encontram previstas quaisquer alterações ao regime322.
Devemos aplaudir o facto deste regime se alicerçar e mover em função dos fins que
se propõe atingir, em especial, o combate à evasão e a fraude fiscais conseguidas por meio
do abuso dos instrumentos (e das vantagens a si inerentes) que o Direito fornece, mas cujo
propósito é o desenvolvimento da economia e o bem-estar dos cidadãos, nomeadamente a
(facilidade na) constituição de sociedades. A dupla tributação de rendimentos, problema que
assombra as mais diversos ordenamentos tributários e objeto de inúmeras convenções, é aqui
eliminada na sua totalidade e a neutralidade fiscal é, por fim, atingida.
A pessoa do sócio como ser individual, inatamente, dotado de personalidade, e
capacidade jurídicas, não é abafada perante um ente coletivo, fadado ele, como bem
sabemos, de um vasto leque de direitos e deveres que, não raras vezes, concorrem com o
aquele que deve ser o centro de todo o sistema jurídico – o Homem. O regime de
transparência fiscal põe em foco que, mesmo numa sociedade, essencialmente, capitalista,
os ideais do Iluminismo ainda sobressaem, e a figura central e distinta do indivíduo, na
prossecução e no desenvolvimento de certas atividades, ganha nova consideração, perante o
escopo lucrativo pelo qual qualquer sociedade se gere.

322
Segundo Fernando Rocha Andrade na aula de encerramento do Curso de Pós-Graduação de Direito Fiscal
das Empresas, que decorreu na FDUC no dia 25.06.2016.

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 Ac. do STA, Proc. n. º 1626/13 2/2015, relatado por Dulce Nelo, de 17 de setembro de
2014, disponível em:

323
Todos os Acórdãos foram alvo de consulta entre Julho de 2015 e Julho de 2016.

137
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0257d6b004ba5ba?OpenDocument.
 Ac. do STA, Proc. n.º 01004/13, relatado por Valente Torrão, de 04 de dezembro de
2013, disponível em:
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0257c3e00364167?OpenDocument&ExpandSection=1.
 Ac. do STA, Proc. n.º 019003, relatado por Brandão de Pinho, de 06 de dezembro de
2000, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/4af923ffe896c38f80
256a38003db001?OpenDocument&ExpandSection=1&Highlight=0,019003#_Section
1.
 Ac. do STA, Proc. n.º 0351/14, relatado por Dulce Neto, de 11 de maio de 2016,
disponível em:
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/95665a5393ed00698
0257fb7005260ff?OpenDocument&Highlight=0,0351%2F14.
 Ac. do STA, Proc. n.º 0441/11, relatado por Casimiro Gonçalves, de 29 de janeiro de
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http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/c915b02e40330a7d8
02579c0004b9f75?OpenDocument&Highlight=0,0441%2F11.
 Ac. do STA, Proc. n.º 0830/11, relatado por Fernanda Maçãs, de 21 de março de 2012,
disponível em:
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0570c7d083a301ba8
02579de0031fbc9?OpenDocument&Highlight=0,0830%2F11.
 Ac. do STA, Rec. n. º 026353, relatado por Benjamim Rodrigues, de 03 de outubro de
2001, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3bb3e9fe79f9e8068
0256b3c004cc94f?OpenDocument&Highlight=0,026353.
 Ac. do STA, Rec. n. º 23.831, relatado por Brandão de Pinho, de 06 de outubro de 1999,
disponível em:
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/c0b31efba31391ca8
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138
 Ac. do STA, Recurso nº 018135, relatado por Mendes Pimentel, de 23 de fevereiro de
2000, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8fb8594d1eaa8fa88
02568fc003a1f52?OpenDocument&Highlight=0,018135#_Section1.
 Ac. do TCA Norte, Proc. n. º 00022/01, relatado por Paula Moura Teixeira, de 29 de
janeiro de 2015, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/2e8b6295852a89ee
80257e03003e3db8?OpenDocument.
 Ac. do TCA Norte, Proc. n.º 00005/07.0BEMDL, relatado por Paula Maura Teixeira,
de 12 de dezembro de 2014, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/3b66f689a5dc98a3
80257dcc0055de29?OpenDocument&Highlight=0,%C2%BA,00005%2F07.0BEMDL
.
 Ac. do TCA Norte, Proc. n.º 00515/08.2BEPNF, relatado por José Luís Paulo Escudeiro,
de 4 de março de 2011, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/f72d2426ffcee448
8025784f0051b37c?OpenDocument&Highlight=0,00515%2F08.2BEPNF.
 Ac. do TCA Sul, Proc. n. º 0069/05, relatado por Eugénio Sequeira, de 08 de novembro
de 2005, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/b7d97cb460acbff2
802570b3006bb544?OpenDocument.
 Ac. do TCA Sul, Proc. n. º 2522/08, relatado por Joaquim Condesso, de 14 de dezembro
de 2011, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/70e48c1cea9ab278
8025796d003f6f67?OpenDocument&Highlight=0,2522%2F08.
 Ac. do TS, n.º ROJ ATS 11231/2001, relatado por Francisco Jose Hernando Santiago,
disponível em:
http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS
&reference=865479&links=&optimize=20060323&publicinterface=true.
 Ac. do TS, n.º ROJ STS 201/2013, relatado por Ramon Trillo Torres, disponível em:

139
http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS
&reference=6624466&links=%22transparencia%20fiscal%22&optimize=20130208&
publicinterface=true.
 Ac. do TS, n.º ROJ STS 2599/2002, relatado por Pascul Sala Sanchez, disponível em:
http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS
&reference=3044361&links=&optimize=20031030&publicinterface=true.
 Ac. do TS, n.º ROJ STS 2952/2014, relatado por Emilio Frias Ponce, disponível em:
http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS
&reference=7133265&links=%22transparencia%20fiscal%22&optimize=20140724&
publicinterface=true.
 Ac. do TS, n.º ROJ STS 4304/2015, relatado por Manuel Martin Timon, disponível em:
http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS
&reference=7506342&links=&optimize=20151030&publicinterface=true.
 Ac. do TS, n.º ROJ STS 5486/2002, relatado por Jaime Rouanete Moscardo, disponível
em:
http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS
&reference=3044262&links=&optimize=20031030&publicinterface=true.
 Ac. do TS, n.º ROJ STS 8462/2001, relatado por Jaime Rouante Morscardo, disponível
em:
http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS
&reference=3043969&links=&optimize=20031030&publicinterface=true.

140
ANEXO I

Tabela de atividades do artigo 151.º do CIRS

1 - Arquitetos, engenheiros e técnicos similares:


1000 Agentes técnicos de engenharia e arquitetura;
1001 Arquitetos;
1002 Desenhadores;
1003 Engenheiros;
1004 Engenheiros técnicos;
1005 Geólogos;
1006 Topógrafos.
2 - Artistas plásticos e assimilados, atores e músicos:
2010 Artistas de teatro, bailado, cinema, rádio e televisão;
2011 Artistas de circo;
2019 Cantores;
2012 Escultores;
2013 Músicos;
2014 Pintores;
2015 Outros artistas.
3 - Artistas tauromáquicos:
3010 Toureiros;
3019 Outros artistas tauromáquicos.
4 - Economistas, contabilistas, atuários e técnicos similares:
4010 Atuários;
4011 Auditores;
4012 Consultores fiscais;
4013 Contabilistas;
4014 Economistas;
4015 Técnicos oficiais de contas;
4016 Técnicos similares.
5 - Enfermeiros, parteiras e outros técnicos paramédicos:

141
5010 Enfermeiros;
5012 Fisioterapeutas;
5013 Nutricionistas;
5014 Parteiras;
5015 Terapeutas da fala;
5016 Terapeutas ocupacionais324;
5019 Outros técnicos paramédicos.
6 - Juristas e solicitadores:
6010 Advogados;
6011 Jurisconsultos;
6012 Solicitadores.
7 - Médicos e dentistas:
7010 Dentistas;
7011 Médicos analistas;
7012 Médicos cirurgiões;
7013 Médicos de bordo em navios;
7014 Médicos de clínica geral;
7015 Médicos dentistas;
7016 Médicos estomatologistas;
7017 Médicos fisiatras;
7018 Médicos gastroenterologistas;
7019 Médicos oftalmologistas;
7020 Médicos ortopedistas;
7021 Médicos otorrinolaringologistas;
7022 Médicos pediatras;
7023 Médicos radiologistas;
7024 Médicos de outras especialidades.
8 - Professores e técnicos similares:
8010 Explicadores;
8011 Formadores;
8012 Professores.

324
Alteração pela Portaria 256/2004, de 9 de março.

142
9 - Profissionais dependentes de nomeação oficial:
9010 Revisores oficiais de contas;
9011 Notários325.
10 - Psicólogos e sociólogos:
1010 Psicólogos;
1011 Sociólogos.
11 - Químicos:
1110 Analistas.
12 - Sacerdotes:
1210 Sacerdotes de qualquer religião.
13 - Outras pessoas exercendo profissões liberais, técnicos e assimilados:
1310 Administradores de bens;
1311 Ajudantes familiares;
1312 Amas;
1313 Analistas de sistemas;
1314 Arqueólogos;
1315 Assistentes sociais;
1316 Astrólogos;
1317 Parapsicólogos;
1318 Biólogos;
1319 Comissionistas;
1320 Consultores;
1321 Dactilógrafos;
1322 Decoradores;
1323 Desportistas;
1324 Engomadores;
1325 Esteticistas, manicuras e pedicuras;
1326 Guias-intérpretes;
1327 Jornalistas e repórteres;
1328 Louvados;
1329 Massagistas;

325
Alteração pela Portaria 256/2004, de 9 de março.

143
1330 Mediadores imobiliários;
1331 Peritos-avaliadores;
1332 Programadores informáticos;
1333 Publicitários;
1334 Tradutores.
1335 Farmacêuticos326
1336 Designers327
14 - Veterinários:
1410 Veterinários.
15 - Outras atividades exclusivamente de prestação de serviços:
1519 Outros prestadores de serviços.

326
Alteração pela Portaria 256/2004, de 9 de março.
327
Aditada pelo art. 48º da Lei 53-A/2006, de 29 de dezembro.

144
ANEXO II

145
ANEXO III

146
147

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