Desenvolvimento Da Personalidade

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Síntese traduzida e adaptada por Annamaria Rangel de: KOLB, Laurence

Psiquiatria clínica moderna, México, La prensa medica mexicana, 1976, p.53-74.

Desenvolvimento da personalidade

Desde o momento em que óvulo e espermatozóide se fundem até que


alcança a maturação, cada organismo passa por um processo de desenvolvimento
de sua estrutura biológica. Em qualquer momento desse processo, fatores nocivos
podem limitar o crescimento do organismo, produzir deformações ou impedir o
funcionamento de um órgão ou de todo o ser vivo. Sabe-se também que o
crescimento pode ser limitado pela falta de estimulação apropriada. Em outras
palavras, a falta de experiências durante períodos críticos de maturação impede o
florescimento completo de um sistema ou de um órgão.
Cada pessoa, portanto, tem uma estrutura anatômica cuja conformação
ainda que geral, segundo um modelo da espécie, é única em alguns detalhes. São
essa estrutura e seu funcionamento fisiológico que determinam e limitam o
desenvolvimento da personalidade. O crescimento do sistema nervoso central
estabelece os limites do temperamento e da inteligência. Considera-se que as
variações temperamentais, ou seja, as capacidades para uma gama de respostas
ativas ante o ambiente, influem sobre a influência que exerce ou não uma
mudança no ambiente, e talvez ao mesmo tempo se modificam devido a essa
mudança. Essa propriedade especial do sistema nervoso, ou seja, a capacidade
de gravar, armazenar e integrar as experiências do organismo e assim produzir as
respostas de conduta mais efetivas para a adaptação, possibilita a evolução da
personalidade. Assim, conforme passa o tempo, graças a uma série prolongada
de experiências sociais, se desenvolvem atitudes, crenças, desejos, valores e
pautas de adaptação mais ou menos perduráveis e constantes, que dão ao
indivíduo a qualidade de ser único.
A personalidade pode ser definida como esse particular conjunto formado
pelos modelos de conduta e tendências relativamente permanentes, que são
característicos de um indivíduo.
A personalidade se desenvolve a partir de um complicado entrelaçamento
de fatores genéticos, ambientais, sociais e emocionais. No seu desenvolvimento
há normalmente uma progressão até a maturidade e cada etapa se desenvolve
como uma conseqüência lógica da etapa prévia: trata-se de um crescimento que
emerge através de diferentes etapas, cada um da quais tem suas necessidades e
problemas particulares. Se persistirem restos de uma etapa anterior nas etapas
subseqüentes, pode haver deformações da personalidade e iniciar-se uma
enfermidade psicológica.

ESTRUTURA DA PERSONALIDADE

É conveniente pensar que a personalidade tem partes ou divisões que


exercem funções específicas, isto é, que tem uma estrutura. Este conceito facilita
a idéia de dinâmica no funcionamento da personalidade. Sem dúvida, não
devemos pensar que estas partes são realidades concretas ou entidades que
atuam por si mesmas, mas que são grupos de forças e de funções. De modo
geral, segue-se o conceito de estrutura de personalidade proposto por Freud, que
postulou três segmentos:

O ID
O id é o nome coletivo que seu usa para nomear os impulsos biológicos
primitivos. Representa a parte inata da personalidade. São funções do id os
impulsos coercitivos que satisfazem as necessidades de ar, alimento, água e
outras substâncias nutritivas, a necessidade de manter a temperatura corporal e a
integridade física, bem como a necessidade de procriar. Incluem-se no id a
tendência à agressão, à raiva e a sexualidade. Junto com estes impulsos
instintivos primitivos se encontram os estados aversivos produtores da dor, aflição
ou raiva e as necessidades intensas que nas etapas posteriores da vida
chamaremos de fome, sede, e sufocação. Se as funções do id se alteram ou se
desenvolvem mal, os derivados do id podem emergir até a consciência em forma
de fantasias ou podem expressar-se violentamente em forma de conduta efetiva.

O EGO
O ego ou a parte do ser que avalia a realidade, é a parte ou função da
personalidade que estabelece uma relação com o mundo em que vivemos. O ego,
na realidade, é um grupo de funções, mas para facilitar sua conceituação
usaremos uma metáfora. O ego se relaciona com o meio ambiente por meio da
percepção consciente, o pensamento, o sentimento e a ação; portanto, é a porção
da personalidade que controla o indivíduo de maneira consciente. Contém os
aspectos da personalidade que formam avaliações, juízos, soluções, defesas.
Podemos ver o ego como a agência integradora e executora da personalidade, já
que se encarrega de funções tão importantes como a percepção, a memória, a
avaliação e comprovação da realidade, e a síntese da experiência e é o
intermediário entre o mundo interior e exterior. Suas funções são relacionar-se de
maneira racional com as solicitações da realidade, adaptar a conduta ao meio
ambiente e manter harmonia entre as necessidades urgentes do id e as
exigências e aspirações do superego.
Para que a personalidade se desenvolva de maneira normal, o ego deve
ser capaz de modificar tanto os impulsos coercitivos (impositivos) do id, como as
demandas do superego, e assim conseguir uma conduta aceitável sem sacrificar
ao extremo as satisfações das necessidades instintivas e emocionais nem os
ideais éticos. O ego serve de mediador entre o id e o superego. Os impulsos
coercitivos do id exigem satisfação imediata; por isto se diz que estão regidos pelo
princípio do prazer. Ao contrário, as funções do ego são guiadas pelo princípio da
realidade O ego dirige a energia instintiva até canais que, mais tarde,
proporcionam o máximo de prazer e satisfação. Seus processos têm lugar
principalmente (ainda que não por completo) no nível consciente. Integra os
impulsos de maneira construtiva e assim assegura o domínio sobre eles. Diz-se
que o ego é forte e são se, por meio do controle consciente, maneja de forma
adequada as causas internas e externas de stress e se, por meio da razão e da
prudência, se põe em contato racionalmente com as necessidades da realidade e
da sociedade.
O indivíduo com um ego bem desenvolvido e maduro mostra flexibilidade
para manejar as diversas causas de stress da vida, sem recorrer a defesas
inflexíveis e repetitivas típicas dos sintomas neuróticos ou psicóticos, ou aos
defeitos de caráter.
O desenvolvimento do ego ocorre graças a uma série de transações entre a
criança e seus pais e também com outras pessoas que influem em sua evolução.
A finalidade das funções do ego é produzir adaptação psicossocial, não obstante,
esta adaptação também requer que evolua uma série de atitudes interpessoais
que estabelecem para o indivíduo uma certa consistência em suas relações com
os outros; por meio destas atitudes a pessoa acostuma a perceber os outros e
funcionar de acordo com eles. Além disso, os outros indivíduos esperam que a
pessoa responda socialmente de uma maneira determinada, e isto constitui a
identidade do ego para dita pessoa.
Erikson postula a existência de crises psicossociais específicas em cada
etapa de interação. A solução de cada crise estabelece as etapas posteriores em
sua evolução. Cheia ou isenta de conflitos conforme sua resolução. Durante a fase
de lactação se estabelecem as bases para a confiança ou desconfiança com os
demais. Durante o início da infância são fincadas as bases para a autonomia ou
para a vergonha e dúvida. Nas fases posteriores da infância inicia a produção ou a
inferioridade; na adolescência as crises de formação ou divisão da identidade.
Também as fases da vida adulta implicam crises especiais. O adulto jovem
deve elaborar a questão da intimidade ou isolamento; o adulto maior, a questão da
procriação ou absorção em si mesmo; e o adulto maduro a questão da integridade
versus desesperança.
O requisito primário do processo transacional para o desenvolvimento da
personalidade é aprender atitudes aceitáveis e satisfatórias e ações que controlem
e modulem os afetos humanos. Os estados afetivos complexos do homem são a
conseqüência do longo e continuado processo de socialização, que lhe permite
desenvolver-se e diferenciar-se de maneira progressiva. Reconhecemos os afetos
sintônicos de interesse, entusiasmo e alegria; bem como os distônicos e aversivos
que motivam estados de aflição, medo vergonha, culpa, asco, ira, desprezo,
tristeza.
Estes afetos, que às vezes produzem motivação e às vezes conflito, com o
passar do tempo se estabelecem dentro da personalidade como características do
estado de ânimo predominante.
A força equilibradora do ego permite que aflorem no indivíduo qualidades
como responsabilidade, perseverança, empatia, simpatia, bom humor, capacidade
de julgar, flexibilidade e autoconfiança. Os traços complexos se encontram nas
pessoas criativas e construtivas, ainda que freqüentemente tais traços possam ser
oprimidos por graves defesas patológicas do ego.

O SUPEREGO
O terceiro segmento hipotético da estrutura da personalidade é o superego,
ou seja, a parte que se conceitua como a que observa e avalia o funcionamento
do id, comparando-lhe com um modelo ideal, um ideal que deriva das normas de
conduta que se percebem durante anos nos pais, nos professores e outros
indivíduos importantes para a criança. O eu ideal, ou seja, a imagem internalizada
do que alguém deseja chegar a ser e para a qual convergem os esforços do eu,
dá uma direção para as aspirações e as exigências de êxito dentro de cada
personalidade.
O conceito de superego teve sua origem na análise que Freud fez das
idéias delirantes de ser vigiado. Concebeu então uma porção “observadora” da
personalidade.
Por volta dos 4 a 6 anos de idade a criança desenvolve uma sensação de
limitação em suas ações, quando se rende à força superior dos pais. Aceita o que
eles dizem como absolutos e como se devessem a eles uma obediência total. A
criança é incapaz de julgar seus próprios atos ou os de outras pessoas em termos
de seu significado social; só julga se estão bem ou mal. Somente quando a
criança chega a comparar suas perspectivas com as de outras crianças e adultos
durante o jogo, a ação e o pensamento, quando desenvolve as perspectivas
diferenciais que lhe permitem um realismo moral menos ligado a seus pais e mais
aberto e cooperador. As crianças pequenas respondem só com o moralismo
estreito e rígido de seus lares, especialmente quando se sentem inseguros.
Conforme descobrem novas imagens da moralidade no jogo com seus
semelhantes, com adultos diferentes de seus pais, os valores morais absolutos
iniciais das figuras materna e paterna dão passo a uma apreciação mais ampla e
mais realista da moralidade nos valores e objetivos sociais e gerais.
O superego deriva em especial da identificação com os pais e seus
substitutos, ou seja, com figuras de autoridade que podem castigar ou
recompensar. As proibições e as obrigações são internalizadas e se incorporam à
estrutura psicológica inconsciente da criança. Mais tarde, os mandatos e as
proibições de outras autoridades e das influências culturais são absorvidos e
formam parte do superego, que atua como um censor. O superego atua como o
supervisor do ego e das tendências interiores inconscientes; portanto, é a parte
repressora da personalidade.
Se o princípio do adestramento foi intensamente punitivo, se a criança foi
envergonhada e se estes dados nocivos não foram compensados por outras
experiências posteriores que ampliem a visão (p. ex. quando a criança simula ser
outro tipo de pessoa no jogo com outras crianças), o superego conterá elementos
irracionais e ainda sádicos. Pode ameaçar e castigar e assim tratar de manter sua
autoridade quando o ego tendo a aceitar impulsos que provém da parte reprimida
do id. O superego castiga criando angústia e produzindo remorso e sentimento de
culpa. Se o superego é severo e inflexível, o medo de que dele resulta conduzirá a
uma personalidade rígida, inibida, infeliz, angustiada e até neurótica. De modo
alternativo o superego facilita satisfações prazenteiras quando julga que o
funcionamento do ego inclui esforços para alcançar ideais e objetivos e os
alcança. Assim, a satisfação se origina num aumento no respeito de si mesmo na
integridade pessoal, no orgulho de ter se esforçado ou ter conseguido algo na
convicção de que se comportou de forma correta.

EQUILÍBRIO DOS SEGMENTOS


Na pessoa bem adaptada, a conduta satisfaz de forma simultânea e com
êxito as exigências do id, do ego e do superego. Por outro lado, a conduta do
neurótico, do psicótico e do indivíduo com personalidade patológica, com
desajustes sociais graves e repetidos, pode ser concebida como o resultado de
um transtorno nas engrenagens dinâmicas e nos equilíbrios do id, ego e superego.

PERÍODO DE LACTAÇÃO
O nascimento implica uma mudança muito importante no funcionamento
fisiológico do feto; se estabelece a respiração, cessa o fluxo sangüíneo umbilical e
as comunicações intercardíacas, e inicia a circulação pulmonar. Ao terminar a
nutrição transplacentária, começa a ingestão de alimentos, que requer o que
lactante forme uma relação com a mãe ou com um substituto materno. A
superfície corporal e seus receptores sensoriais que são muito ativos, se
encontram subitamente expostos a uma grande variedade de estímulos e os
mecanismos homeostáticos do sistema nervoso central têm que estabelecer os
meios para proteger o lactante que cresce da excitação excessiva e também
assegurar um equilíbrio de água, alimento, oxigenação e regulação da
temperatura. O período de mudança fisiológica e adaptação ao meio extrauterino
se caracteriza por uma regulação irregular e inconstante das funções corporais e
dura de dois a oito semanas depois do nascimento.
Quando o recém nascido está acordado, mostra-se alerta e ativo, ou chora,
ou se mantém inativo. Quando está acordado e chora, envia o sinal que
estabelece e mantém a relação que necessita com sua mãe, e que lhe
proporciona não somente nutrição quando recebe o peito, mas também todos os
contatos corporais que estimulam de maneira especial os sistemas cinestésicos e
táteis. Estabelece-se assim uma nova relação biológica extrauterina entre o
lactente e sua mãe.
Quando o recém nascido está acordado e alerta, durante certos períodos
inicia o contato com elementos do meio externo diferentes da mãe, graças ao
funcionamento inicial dos órgãos que percebem a distância: olhos e ouvidos.
O grau de respostas varia muito de uma criança a outra, o que indica
predisposições temperamentais inclusive no estado neonatal. Estas
predisposições, por sua vez, influem na interação com a mãe e na capacidade dos
bebês de lidar com o stress.
DEPENDÊNCIA DA MÃE
As relações de objeto, ou seja, as relações com outras pessoas, iniciam
com os primeiros cuidados para a satisfação das necessidades de alimento e calor
do bebê. As primeiras interações implicam mais do que satisfazer necessidades
fisiológicas básicas, já que a criança é estimulada pelo jogo da mãe, pelas
carícias, e pelas tentativas da mãe quando tenta receber algumas respostas, por
meio de gestos faciais ou signos verbais. Por volta dos 3 ou 4 meses, o bebê
responde de forma diferente a diversas pessoas, está em contato com aqueles de
quem depende sua vida.
Nas primeiras semanas de vida as respostas aos incômodos imediatos do
bebê dominam sua conduta. Exige, por meio do choro, ajuda imediata para aliviar
suas tensões. Também nessa etapa notam-se as primeiras indicações de sorriso,
especialmente antes de receber alimentos ou durante o sono. Em pouco tempo
essa resposta pode ser provocada por sons agudos. Na terceira semana já
aparece um sorriso amplo, o que provoca na pessoa que cuida do bebê um
esforço para que este se repita. Assim se reforça a resposta do sorriso e se
identifica ainda mais relação materno infantil gratificadora, estimulante e
alimentadora. Chorar e sorrir são as primeiras indicações de que o bebê apresenta
os afetos de aversão e alegria ou prazer.
Pode-se descrever o bebê como um indivíduo regido pelo “princípio do
prazer”, incapaz de postergar suas exigências. Somente após vários anos poderá
começar a se reger pelo “princípio da realidade”. Em conseqüência, pode-se
aplicar o nome de infantil à persistência, na vida posterior, de estados emocionais
que se caracterizam por dependência e atitudes que exigem de maneira urgente
satisfações imediatas, sem responsabilidade nem consideração ante outras
pessoas, com etapas de raiva quando não se satisfaz a necessidade em questão.
Se os primeiros cuidados são cálidos e permanentes, estabelecem a base
para um prolongado sentido de satisfação, segurança e confiança nos demais.
Caso não existam ,estabelecem-se as raízes para a desconfiança e insegurança.

ETAPA ORAL
Em termos psicanalíticos, o período de lactação é chamado de etapa oral e
é concebido como um lapso que progride de uma fase essencialmente “receptiva”
a outra “agressiva”. Antes de nascer o feto é alimentado através da corrente
sangüínea materna e nunca experimentou o prazer compensador que se obtém ao
satisfazer uma necessidade instintiva. Entretanto, com o nascimento surge uma
necessidade biológica de alimento, a qual recebe satisfação ao mamar. O fato de
mamar não só alivia ao incômodo da fome, como também faz com que, ao surgir
outras tensões mais complexas, o bebê recorra ao substituto mais disponível,
sugar o polegar. Segundo isto, a boca se torna a parte do corpo na qual se
centram os interesses, as sensações e as atividades, e através da qual se obtém
satisfações. A segunda fase (entre os 8 e 18 meses de idade) da etapa oral é
aquela na qual o prazer de morder se junta ao de mamar; é o período em que
surgem os impulsos agressivos.
AUTOEROTISMO. É concebível que a satisfação oral que se obtém na
lactação pode ser a primeira manifestação primitiva do que, através de muitas
etapas subseqüentes de desenvolvimento, chegará a ser a sexualidade adulta.
Nesta etapa, sem dúvida, a busca de prazer se relaciona com a boca e não
contém uma relação clara com os genitais, como no adulto. Diz-se que a boca é
uma zona erógina pela potencialidade que tem para dar prazer nesta etapa do
desenvolvimento psicossexual e que são autoeróticas as satisfações que se
obtém nessas zonas.
Quando os cuidados psicológicos de quem se ocupa da criança são muito
escassos ou inconsistentes, pode-se estimular o autoerotismo em forma de
sucção excessiva e prolongada do polegar, constipação ou masturbação
excessiva e precoce. Por outro lado, as satisfações emocionais sólidas e normais
diminuem o período autoerótico de desenvolvimento e estimulam uma sublimação
natural dos impulsos instintivos, o que constitui um progresso saudável nas etapas
sucessivas.
INTERAÇÃO ELIMINATIVA: Também nesta fase, de habilidade motora
cada vez maior, a interação entre criança e mãe se centraliza no esforço para que
ela aprenda a controlar suas atividades de eliminação: a bexiga e o intestino são
os centros da interação.
A forma como isto é tratado determina o desenvolvimento de certos traços
de personalidade posteriores. Se o controlo é tentado antes da maturação
fisiológica e se a criança é castigada por seus fracassos, haverá ira e medo para o
progenitor que a controla. Talvez responda com medo para a figura materna ou
paterna e gradualmente desenvolva uma mania de limpeza, ordem em tudo,
submissão e pontualidade, traços que às vezes recebem o nome de caráter anal.
É neste período que começam a se delinear a capacidade para controlar-se
a si mesmo, para ter independência pessoal e para ter uma sensação de
autonomia e orgulho. Junto surgem os afetos aprendidos de vergonha e nojo, que
se incorporam em resposta às atitudes dos pais para as funções excretoras da
criança.
Ao usar o termo sexualidade infantil Freud nunca atribuiu aos bebês e às
crianças o complicado modelo de sexualidade adulta, mas apenas se trata de uma
primeira expressão de um desenvolvimento ordenado do aspecto psicossexual.
As primeiras manifestações da agressão também ocorrem nesta etapa. O
bebê não é um receptor passivo do leite da mãe. Ao contrário, este é obtido por
meio de uma atividade cujo vigor surpreende. Segundo este ponto de vista, a
agressão faz sua primeira aparição nos traços da personalidade infantil na forma
de energia, aplicação e determinação e é de natureza construtiva.
PERSONALIDADE ORAL: Se o indivíduo continua centrando seu interesse
na boca, ainda quando já tenha ultrapassado em muito esta idade, se diz que tem
uma personalidade oral. Suas características são egocentrismo, exigências,
facilidade para tomar satisfações sem dar nada em troca, e preocupação com
atividades da boca, e satisfações e fantasias de ingestão e alimentação.
CONCEITO CORPORAL: Com o decorrer do tempo a criança não só
desenvolve percepções corporais que se modificam gradualmente e se estendem
ao longo do desenvolvimento, até chegar a coincidir com a estrutura corporal real,
mas também adota, para consigo mesma as atitudes de outras pessoas em
relação ao seu corpo e suas partes. Talvez desenvolva um conceito corporal
satisfatório ou chegue a considerar seu corpo e suas partes como desagradáveis,
sujas, vergonhosas ou asquerosas, através do qual reflete a interação que
estabeleceu com as figuras paternas e mais tarde com outras pessoas
significativas. É útil para o professor distinguir entre percepções corporais e
conceitos corporais. Em teoria, ambos se incluem no termo imagem corporal, que
é de uso comum e designa a percepção que alguém tem de seu corpo. O eu
corporal contém as percepções, os conceitos e os afetos que se relacionam com o
corpo. O conceito que a criança forma de seu próprio constituirá uma estrutura
nuclear em sua personalidade posterior e, em grande parte, determinará sua
capacidade de adaptar-se com êxito ao stress de enfermidades, traumatismos e
mudanças físicas.
MOBILIDADE: Conforme se desenvolve, o foco da atenção materna
gradualmente muda; além de proporcionar alimento a mãe começa a ajudar o
bebê a desenvolver suas capacidade para mover-se que vai amadurecendo;
também o ajuda a manipular objetos com suas mãos e mais tarde a caminhar e a
falar. A mobilidade parece surgir como um impulso coercitivo autônomo. A
sistematização da atividade motora e o domínio cada vez mais intrincado de
diversos atos e jogos, são em si mesmos fonte de satisfação e produzem
sentimentos prazerosos. De forma similar, a restrição da atividade motora produz
conflito e faz com que desperte a ira. Através de suas atividades motoras, a
criança expressa sua necessidade urgente e impulsiva de atuar, necessidade que
mais tarde deverá ser controlada para que ela possa participar de maneira efetiva
na sociedade. A atividade expressa agressão e sexualidade, e serve como meio
de comunicação quando consiste em atos que se imitam, gestos e posturas; está
associada a uma gama de estados afetivos que incluem regozijo, ira, angústia,
depressão.
A mobilidade também pe um meio pelo qual a criança adquire competência
a segurança. As ações exitosas também ajudam ao estabelecimento de conceitos
da autonomia, iniciativa e eficiência de si próprio.
No adulto, padrões de mobilidade anormal aparecem como sintomas de um
transtorno da personalidade; por exemplo os tics e outras atividades compulsivas,
as inibições motoras do histérico, a gesticulação e as posturas do esquizofrênico.

PERÍODO DA INFÂNCIA

Para fazer um estudo e análise descritiva é útil dividir o crescimento em


vários períodos. No entanto, estas divisões são arbitrárias e é preciso ter presente
que as etapas da maturação se fundem uma na outra de maneira gradual; não há
divisões reais. Consideraremos que a infância começa com a capacidade de falar,
entre o final do primeiro ano e durante o segundo. Ao mesmo tempo ocorrem os
processos da maturação relacionados com o aumento na mobilidade da criança, e
também em sua capacidade para eliminar e controlar as excreções, e ao mesmo
tempo há uma grande mudança em suas relações interpessoais.
Visto que as primeiras experiências da criança ocorreram no seio da
família, suas percepções e interpretações dessas experiências determinarão suas
atitudes e avaliações em relação a experiências posteriores, inclusive adultas, que
contenham algumas semelhanças aparentes. Esta transferência de uma atitude
derivada de uma relação pessoal familiar para outras pessoas no mundo externo
exercerá influências favoráveis ou desfavoráveis sobre as relações do indivíduo
com os demais e sobre suas capacidade para alcanças seus objetivos sociais
finais. As atitudes persistentes de ressentimento e hostilidade, quando chegam a
formar parte da estrutura da personalidade podem formar, em anos posteriores, as
respostas repetitivas do neurótico e o foco em torno do qual se constituem
formações reativas que paralisam o indivíduo.
No desenvolvimento da personalidade um fator determinante de grande
importância é a modelagem inconsciente da criança que se desenvolve, tomando
como base os pais, que se denomina identificação. A criança se identifica com os
aspectos que percebe da conduta do progenitor, incluindo os que lhe produzem
tensão ou prazer, as partes corporais cuja importância se exagera, as ações e as
capacidades que, nas fantasias cada vez maiores da criança, provavelmente
conferem ao progenitor a força e o poder que ela deseja para si mesma. Se os
pais são pessoas emocionalmente maduras, o processo adaptativo da
identificação produz um crescimento sadio.
A capacidade cada vez maior da criança de cuidar de si mesma lhe permite
agora uma maior relação com outras pessoas (pais, irmãos, amigos, colegas de
creche). Com o aumento dos contatos sociais aparece a necessidade de
compartilhar e, nas experiências com os outros, se desenvolvem emoções como
os ciúmes, a raiva, a inveja e a culpa. A maior atividade proporciona à criança
oportunidade de exercitar suas tendências exploradoras, sua curiosidade e sua
iniciativa para resolver problemas simples. Começam a apreciar as diferenças
entre os sexos e se estabelecem os fundamentos da identificação sexual final.
Esses contatos com outras pessoas resultam em brigas, rivalidades
competitivas que primeiro estimulam sonhos que satisfazem desejos e fantasias
de força avassaladora e grandes satisfações, ou mais tarde provocam medo às
represálias, feridas e ataques provenientes dos outros.
Junto com a iniciativa e o desejo de esforçar-se e junto ao surgimento das
emoções de ciúmes, raiva e ira, emerge também o superego, ou seja, a
consciência.
Para a escola psicanalítica, este período representa a etapa fálica.
Chamou-se a atenção para a teoria de que ao redor de um ano de idade a fonte
do prazer muda da região oral para a anal. De forma similar, al redor dos três anos
de idade aparece outra etapa no desenvolvimento do interesse prazeroso, com
uma mudança da região anal para a região genital, Esta fase vai até cerca dos 7
anos. Quando aparece, a criança se interessa na diferença que há entre os sexos
e nota o tamanho e a presença ou ausência do órgão fálico. Há uma
predominância de sensações genitais e a masturbação pode se tornar uma fonte
de prazer psicossexual. O interesse não é sexual no sentido adulto do termo. O
que acontece é que o menino se dá conta de que seu pênis é importante e lhe dá
uma atenção narcisista. A menina se dá conta que não tem pênis e crê que o
tinha, mas que o perdeu. Sente por isto inferioridade e ciúmes. Diz-se que as
etapas oral, anal e fálicas do desenvolvimento da libido são etapas pré-genitais.
COMPLEXO DE ÉDIPO: Durante a etapa fálica e de maneira contínua até o
quinto ou sexto ano de idade, existe um período de atração para o progenitor do
sexo oposto, acompanhado de ciúmes, rivalidade e hostilidade para o progenitor
do mesmo sexo. Freud deu o nome de complexo de Édipo à situação que surge
entre o pai, a mãe e a criança. Diferentes antropólogos rechaçam a universalidade
do complexo de Édipo. Entretanto, em geral se aceita que dito complexo é um
traço psicológico basicamente correto de nossa própria cultura.
Alguns sugerem que a reação de Édipo está determinada pela conduta dos
pais, não pela da criança. Certamente, é freqüente que os pais sejam mais
severos com seus filhos e mais indulgentes com suas filhas. O psiquiatra observa
de maneira constante que as mães freqüentemente invertem essa relação. Em
qualquer dos casos, a conseqüência natural é a rivalidade e a hostilidade que se
associam com a reação de Édipo. Outros vêm o período de Édipo como um termo
metafórico apropriado e expressivo, que designa a fase de desenvolvimento da
personalidade na qual a criança sente a expressa hostilidade contra um dos pais,
por causa das frustrações que experimentou.
No estado normal, esta relação potencialmente patogênica, se resolve
pelos mecanismos de identificação, por meio dos quais o menino se identifica com
seu pai e incorpora as metas e as normas do pai ao seu próprio modelo de
conduta. De forma similar, a menina se identifica com sua mãe, avança para uma
maturidade emocional normal e encontra compensação e segurança num papel
feminino.
Com freqüência se aceita, partindo da observação clínica, que quando o
complexo de Édipo se resolve de maneira inadequada, o indivíduo pode introjetar
algumas das características do progenitor do sexo oposto; como resultado disto
há um impedimento do desenvolvimento de relações “normais” com pessoas do
sexo oposto. Como exemplos freqüentes pode-se citar: filho adulto que vive com
uma mãe viúva e é indiferente às mulheres de sua idade, ou o jovem que se
enamora de uma mulher muito mais velha que lhe parece, em algum aspecto à
sua mãe.
PERÍODO DE CONTATOS SOCIAIS
Em nossa cultura ocidental, a última parte da infância, ou seja o período
dos 6 ou 7 anos até os 12, é o lapso no qual a criança estabelece contato social
com pessoas fora da família. A influência dos professores como figuras
autoritárias fora do lar, dos companheiros de jogos maiores e menores de idade, e
de outras parentes e amigos, proporciona oportunidades importantes para novas
identificações e distinções que aquietam, modificam ou intensificam as pautas de
reação e de conduta que se estabeleceram em família, e também proporcionam
oportunidades para que a criança adquira novas habilidades e novas formas de
funcionar na sociedade. A criança está ansiosa para fazer coisas e tem a
oportunidade de aprender hábitos de dedicação. No entanto, se não consegue
adquirir as pautas comuns, e, portanto, não se mantém ao nível de seus
semelhantes na escola e no jogo, se instale nele um sentimento de inferioridade.
Seus jogos o permitem de sentir o prazer de dominar uma tarefa e às vezes o do
prestígio que acompanha o êxito. Através do jogo social, a criança tem a
oportunidade de aprender a dominar sua alegria ante o triunfo e sua frustração e
raiva ante o fracasso. O jogo em grupos permite o desenvolvimento gradual e a
satisfação na companhia de outros indivíduos e no fato de compartilhar os
problemas. Esta fase trás consigo outras pautas de comportamento em grupo, ou
seja, molestar os outros, desdenhar, ostracismo. Se o jovem sofre a conseqüência
das ações de seu grupo é possível que suas respostas aprofundem as reações da
personalidade já existentes durante as frustrações do lar.
Nesta etapa da vida da criança, a curiosidade sexual é limitada. Este
período é conhecido como período de latência no desenvolvimento psicossexual,
segundo a escola psicanalítica. Ainda que os interesses e as atividades sexuais
não desapareçam, não há mudanças psicossexuais tão importantes e notáveis
como nos períodos precedentes e seguintes. Sem dúvida a criança se identifica
mais com o progenitor do mesmo sexo e se inicia uma diferenciação maior entre
os traços femininos e masculinos. Portanto, nesta etapa é importante que haja
uma associação estreita satisfatória com o progenitor ou alguma outra pessoa do
mesmo sexo, com quem a criança possa se identificar ao estabelecer sua
masculinidade ou feminilidade. É notável como neste período a criança adquire
adestramento no que respeita a costumes e atitudes da sociedade. Há um
desenvolvimento progressivo do ego como resultado do crescimento, por um lado,
e da educação e da experiência de outro. É um período durante o qual se formam
os ideais. A criança está exposta a pressões sociais mais complicadas; as
oportunidades ambientais também têm um papel importante na direção que
tomam os interesses e as capacidades do indivíduo. Na última parte do período de
latência, uma das motivações que adquirem mais força é o desejo de ser
importante. Neste período deve-se conseguir o controle interior dos impulsos
agressivos-destrutivos.

PERÍODO DA ADOLESCÊNCIA

Quando aumentam as relações de grupo, o jovem freqüentemente


desenvolve um interesse intenso por outro, habitualmente de seu mesmo sexo.
Este interesse se estende ao grau de levar em conta os sentimentos e as
sensibilidades do amigo. Representa os primeiros esforços em direção aos
contatos íntimos que ocorrem na idade adulta. O interesse no amigo inclui
satisfazer seus desejos e emocionar-se e interessar-se por seus êxitos e
fracassos. Quando os grupos de jovens se juntam, começam a aprender os papéis
de líder ou de seguidor. Essas interações sociais proporcionam satisfação e
segurança ao jovem que está crescendo.
A adolescência em si aparece com a puberdade, com seu rápido
desenvolvimento fisiológico dos órgãos sexuais. A maturação das capacidades
sexual e reprodutiva estimula os interesses e as atividades genitais e
heterossexuais na etapa genital do desenvolvimento psicossexual. A sexualidade
já não está difusa em todo o corpo como nas fases pré-genitais do
desenvolvimento da personalidade, mas se circunscreve aos órgãos genitais. A
área sexual é só um aspecto da personalidade em que há um impulso para a
maturação.
O adolescente se preocupa agora com sua aparência ante os outros e ante
si mesmo. Está em busca da identidade pessoal, de um sentido para si. Posto que
se encontra em meio caminho entra a independência pessoal e o continuar da
dependência dos pais, empreende muitos atos de conduta emancipadora; entre
estas, o esforço para estabelecer uma identidade sexual leva o jovem a buscar
reforço com homens ou jovens maiores que idealiza; a jovem, por seu lado,
encontra fontes similares para sua feminilidade cada vez maior. As atitudes
excessivamente agressivas ou competitivas, as poses exibicionistas ou o tomar
parte em atos cínicos e antissociais, talvez representem estas lutas para conseguir
uma independência masculina em relação à autoridade do lar. Neste momento o
indivíduo habitualmente começa a buscar membros do sexo oposto; começa a
cortejar como uma preparação para a intimidade e casamento, e estes novos
interesses do adolescente eliminam as amizades mais juvenis e fazem que o
indivíduo volte a viver experiências de separação que ocorreram em seus
primeiros anos, e também a tristeza, os ciúmes e o ódio que se originaram no
complexo de Édipo. Junto com seu impulso coercitivo sexual, o adolescente
desenvolve uma vida de fantasias, na qual se cumprem todos os seus desejos,
mas ao mesmo tempo está em conflito entre estes e as proibições familiares e
sociais.
Em certo momento o adolescente tem que se comprometer e escolher uma
relação íntima com outra pessoa; tem que decidir qual será sua ocupação e ao
mesmo tempo tem que manter impulsos competitivos persistentes e enérgicos. Se
o adolescente não se compromete na área interpessoal, se expõe a uma
sensação de isolamento ou então ocupa todo seu tempo com uma multiplicidade
de relações sexuais de tipo diverso, ou se liga a outros de uma maneira que anula
sua própria individualidade. Talvez trate de manter a ilusão de que segue sendo
jovem e recuse a crer que o passar do tempo afetará suas decisões ou sua
capacidade para encontrar oportunidades produtivas, que o permitam adquirir
determinadas habilidades, Talvez desenvolva medo à atividade competitiva e se
sinta incomodado ante à menor competência. Alguns adolescentes escolhem uma
identidade negativa, que se fundamenta na fascinação e na suposta força das
figuras mais indesejáveis e perigosas que lhe aparecem como modelos para que
se identifique.
Posto que as crises às quais o adolescente está exposto são tão variadas e
tão intensas, não surpreende que os transtornos da personalidade sejam comuns
neste período.

IDADE ADULTA E MATURIDADE

Ainda que legalmente se reconheça a idade adulta cronológica como um


sinal de maturidade, isto não é garantia de crescimento emocional do indivíduo. O
adulto maduro é uma pessoa que já desenvolveu uma identidade pessoal clara,
que se mostra na capacidade para estabelecer uma relação íntima, satisfatória e
amorosa com outra pessoa, igualmente madura, e com capacidade de assumir por
si mesmo a responsabilidade de educar aos filhos e ajudar em seu
desenvolvimento. O indivíduo maduro é capaz de assumir responsabilidades
pessoais quando é necessário e também de aceitar as decisões de outras
pessoas com autoridade competente a respeito do bem-estar geral; persegue de
forma independente seus próprios objetivos, reconhece suas limitações e está
disposto a buscar conselho de outros quando necessita; é capaz de manter e
desfrutar suas relações pessoais com outros, e com uma tolerância compreensiva
aceita em certo grau as deficiências dos demais. O adulto sadio se encontra
absorto e satisfeito nos êxitos que se relacionam com sua família, e sua vocação e
seus passatempos e não em atos de autoritarismo pessoal. Funciona bem no lar e
no trabalho já que desenvolve relações satisfatórias com outros e se encontra em
geral livre de sintomas de enfermidade.
PROBLEMAS DA MATURIDADE
Geralmente giram em torno da escolha da vocação e da pessoa com a qual
irá se casar, seguido de progressos na vocação que implicam em posição de
autoridade e mais tarde com separação e morte.

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