12 Maio Sermão

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FICHA DE AVALIAÇÃO 1

GRUPO I
A. Lê o seguinte texto.

Enfim, que havemos de pregar hoje aos peixes? Nunca pior auditório. Ao menos têm os peixes duas
boas qualidades de ouvintes: ouvem, e não falam. Uma só cousa pudera desconsolar ao Pregador,
que é serem gente os peixes, que se não há de converter. Mas esta dor é tão ordinária que já pelo
costume quase se não sente. Por esta causa não falarei hoje em Céu, nem Inferno; e assim será
5 menos triste este Sermão, do que os meus parecem aos homens, pelos encaminhar sempre à
lembrança destes dois fins.
Vos estis sal terrae. Haveis de saber, irmãos peixes, que o sal, filho do mar como vós, tem duas
propriedades, as quais em vós mesmos se experimentam: conservar o são, e preservá-lo, para que
se não corrompa. Estas mesmas propriedades tinham as pregações do vosso Pregador Santo
1 António, como também as devem ter as de todos os Pregadores. Uma é louvar o bem, outra
0 repreender o mal: louvar o bem para o conservar, e repreender o mal, para preservar dele. Nem
cuideis, que isto pertence só aos homens, porque também nos peixes tem seu lugar. Assim o diz o
grande Doutor da Igreja São Basílio: Non carpere solum, reprehendereque possumus pisoes, sed
sunt in illis, et quae prosequenda sunt imitatione. Não só há que notar, diz o Santo, e que repreender
nos peixes, senão também que imitar, e louvar. Quando Cristo comparou a sua Igreja à rede de
1 pescar, Sagenae missae in mare, diz que os pescadores recolheram os peixes bons, e lançaram fora
5 os maus: Colegerunt bonos in vasa, malos autem foras miserunt. E onde há bons, e maus, há que
louvar, e que repreender. Suposto isto, para que procedamos com clareza, dividirei, peixes, o vosso
Sermão em dois pontos: no primeiro louvar-vos-ei as vossas virtudes, no segundo repreender-vos-ei
os vossos vícios. E desta maneira satisfaremos às obrigações do sal, que melhor vos está ouvi-Ias
vivos, que experimentá-las depois de mortos. (…)
2 Começando pois pelos vossos louvores, irmãos peixes, bem vos pudera eu dizer, que entre todas as
0 criaturas viventes, e sensitivas, vós fostes as primeiras que Deus criou. (…)
Padre António Vieira, Sermões, II (Obras Escolhidas, vol. XI), 2.ª ed., Lisboa: Sá da Costa,
1997.
[“Sermão de Santo António aos Peixes”, cap. II, pp. 161-166.]

Educação literária
1. Contextualiza o excerto transcrito na estrutura interna da obra a que pertence, justificando.
2. Padre António Vieira critica, de forma indireta, os seres humanos. Indica, explicitando, o referente
utilizado pelo pregador para atingir os criticados.
3. O pregador apresenta neste excerto a divisão do sermão. Mostra como procedeu a essa divisão.
4. Tendo em conta a técnica discursiva de Padre António Vieira, retira do segundo parágrafo um exemplo de
uma antítese e explicita o seu valor expressivo.
B. Lê o seguinte texto.

Par Deus, infançom1, queredes perder


a terra2, pois nom temedes el-rei!
Ca já britades seu degred', e sei
que lho faremos mui cedo3 saber:
5 ca4 vos mandarom a capa, de pram5,
trager dous anos, e provar-vos-am
que vo-la virom três anos trager.

E provar-vos-á, das carnes, quem quer,


que duas carnes vos mandam comer,
10 e nom queredes vós d'ũa cozer;
e no degredo nom há já mester6;
nem já da capa nom hei a falar:
ca bem três anos a vimos andar
no vosso col'e de vossa molher.

15 E fará el-rei corte este mês,


e manda[rá]m-vos, infançom, chamar;
e vós querredes7 a capa levar
e provarám-vos, pero que vos pês8,
da vossa capa e vosso guarda-cós9,
20 em cas10 d'el-rei, vos provaremos nós,
que ham quatr'anos e passa[m] per três11.

Joam Garcia de Guilhade,


http://cantigas.fcsh.unl.pt/cantiga.asp?cdcant=1526&pv=sim
(consultado em 29 de dezembro de 2015).

1
infanção, cavaleiro nobre.
2
perder a terra que o rei lhe tinha dado.
3
em breve.
4
porque.
5
de pram: certamente, realmente.
6
no decreto (real) não há já necessidade desses rigores (de se comer apenas um prato de carne ou mesmo nenhum,
como é dito no verso anterior).
7
querereis.
8
ainda que vos pese.
9
sobreveste.
10
casa.
11
a capa e o guarda-cós pareciam ter três anos, mas tinham na verdade quatro.

5. Indica o assunto desta composição poética.


6. Classifica a composição poética e insere-a no contexto literário a que pertence, justificando.
GRUPO II

O Sermão de Santo António (aos Peixes): pela defesa da liberdade dos indígenas

Três dias antes de se embarcar ocultamente para o reino, Vieira pregava,


em S. Luís do Maranhão (1654), o Sermão de Santo António (aos Peixes). Em
causa estava ainda a defesa dos Índios do Brasil. A lei que regulava as
liberdades e restrições desse povo revelava-se inútil enquanto não fosse
5 evitada a intervenção civil na sua cristianização. (…)
O Índio era, nessa época, a vítima apetecida dos colonos que o sujeitavam
impiedosamente a um regime de escravidão semelhante ao do negro.
Considerados escravos por direito de conquista, proporcionavam os naturais
uma mão de obra excecionalmente barata e irresistível à cobiça dos
10 governadores. A defesa da liberdade do indígena empreendida pela
Companhia de Jesus constituía um evidente obstáculo aos desígnios do
branco ambicioso e cruel, empenhado apenas em avolumar os rendimentos
com o metal reluzente à custa do sacrifício e, muitas vezes, da vida de vítimas
indefesas, “peças” indispensáveis de uma máquina produtora de riqueza. (…)
15 O autor procura, pois, obter a assinatura de todos os principais da cidade
de S. Luís para uma representação ao Rei. A reação dos colonos não tardou a
fazer-se sentir. Como resposta, Vieira constrói este sermão, onde ataca e
condena a ação destes, contrária à sua política missionária. Todo o texto é
uma alegoria amplamente demonstrativa do poder imaginativo e satírico do
20 pregador.
Maria das Graças Moreira de Sá, “Introdução” in Sermões Escolhidos – Padre António Vieira,
Lisboa: Biblioteca Ulisseia de Autores Portugueses (2.ª edição), 1984, p. 7 (adaptado).

Leitura / Gramática

1. Para responderes a cada um dos itens de 1.1. a 1.5., seleciona a única opção que permite obter uma
afirmação correta.
1.1. Na frase “A lei que regulava as liberdades e restrições desse povo revelava-se inútil enquanto não
fosse evitada a intervenção civil na sua cristianização” (ll. 3-4), os vocábulos sublinhados mantêm entre si uma
relação semântica de

A. hierarquia. C. oposição.
B. inclusão. D. equivalência.
1.2. O uso do advérbio “impiedosamente” (l. 8) visa
A. destacar o modo como era praticada a ação dos colonos.
B. comparar a exploração dos índios à dos negros.
C. realçar o valor do sermão de Padre António Vieira.
D. salientar a forma como era exercida a oposição à escravatura.

1.3. A frase “A reação dos colonos não tardou a fazer-se sentir.” (l. 16-17) significa que os colonizadores se
insurgiram

A. violentamente. C. rapidamente.
B. repetidamente. D. pacificamente.
1.4. Em “Como resposta, Vieira constrói este sermão, onde ataca e condena a ação destes, contrária à sua
política missionária.” (17-18), “destes” remete para
A. “todos os principais da cidade de S. Luís”. (l. 15-16). C. “dos colonos”. (l. 17).
B. “resposta”. (l. 17). D. “poder imaginativo e satírico do pregador”. (ll. 19-20).
1.5. Identifica os processos fonológicos presentes na evolução da palavra TOTUM para “todo”:

A. síncope e sonorização. C. apócope e metátese.


B. apócope e palatalização. D. apócope e sonorização.
2. Responde de forma correta aos itens apresentados.
2.1. Divide e classifica as orações da frase “A lei que regulava as liberdades e restrições desse povo revelava-se inútil
enquanto não fosse evitada a intervenção civil na sua cristianização.” (ll. 3-5).
2.2. Atenta nas frases que a seguir se indicam. Reescreve-as, estabelecendo entre elas um valor de concessão.
a) Os homens são os destinatários das críticas do pregador.
b) As reprimendas são apresentadas no sermão de modo metafórico.
2.3. Indica a função sintática da expressão sublinhada em “A reação dos colonos não tardou a fazer-se sentir” (ll. 16-17).

GRUPO III
Escrita
A palavra de Vieira incomoda os que vivem longe do caminho …

Constrói um texto de opinião bem estruturado, de 180 a 210 palavras, explicitando a atualidade desta afirmação na
crítica aos defeitos mais destruidores do ser humano, nomeadamente, a ambição desmedida, a arrogância e o
exibicionismo.

1. O excerto transcrito é a parte inicial do capítulo II do “Sermão de Santo António aos Peixes”, do Padre António Vieira, e insere-se na exposição,
constituindo o louvor dos peixes em geral, como se verifica em “Começando, pois, pelos vossos louvores”(l. 22.) O pregador destaca as virtudes dos
peixes, sem nomear algum.
2. O pregador utiliza os peixes como estratégia discursiva, retirada de Santo António, para poder criticar ironicamente os homens, já que estes “se não
aproveitam”. O auditório humano continua, assim, a ser visado nas fortes críticas do orador, quer por contraste com os louvores que vai fazer aos peixes,
quer por semelhança, através das críticas. Enfim, a alegoria encontrada vai permitir ao orador expor, de forma concreta, os defeitos humanos.
3. Neste excerto, o pregador apresenta de forma evidente a organização do seu sermão. De facto, começa por antecipar a forma como vai estruturar o
seu raciocínio, referindo que as pregações têm duas propriedades: “Uma é louvar o bem, outra repreender o mal (l.10)”. De seguida, querendo proceder
com clareza, explicita aos peixes que o seu sermão apresentará duas partes distintas: “(…) dividirei, peixes, o vosso sermão em dois pontos: no primeiro
louvar-vos-ei as vossas atitudes, no segundo repreender-vos-ei os vossos vícios.” (ll. 18-20). Conclui-se que o pregador aplicará as duas propriedades do
sal ao seu sermão.
4. Vieira emprega com frequência diversos recursos expressivos. Na verdade, este excerto privilegia a antítese, pois está ao serviço da intencionalidade
do Padre António Vieira, que era contrapor virtudes e vícios para, finalmente criticar os homens. Assim, este recurso expressivo aparece ora em “(…)
louvar o bem (…) repreender o mal” (ll. 9-10), ora em “E onde há bons e maus” (l.17), como forma de valorizar a contradição entre os vícios e as virtudes
que vai enumerar.
5. Esta cantiga contém uma sátira plena de ironia a um infanção pelintra. Este teria transgredido um dos decretos reais que estabelecia regras para os
trajes e a alimentação, mas por defeito “ca vos mandaram a capa, de pram, trager dous anos, e provar-vos-am / que vo-la virom três anos trager” (vv. 5-7)
e “que duas carnes vosmandam comer, / e nom queredes vós d’ ũa cozer;” (vv. 9-10). Assim, se critica a pelintrice do infanção.~
6. Esta composição insere-se na lírica trovadoresca e é uma cantiga de escárnio, pois critica-se um infanção, de forma velada: “Par Deus, infançom (…)
E provar-vos-á, das carnes, quem quer,/que duas crnes vos mandam comer,/e nom queredes vós d’ ũa cozer;” (vv.1 e 8-10).
GRUPO II

Item Versão 1 Versão 2 Pontuação


1.1 C 5
1.2 A 5
1.3 C 5
1.4 C 5
1.5 D 5
A lei revelava-se inútil – oração subordinante;
que regulava as liberdades e restrições desse
povo – oração subordinada adjetiva relativa
2.1 restritiva; 10
enquanto não fosse evitada a intervenção civil na
sua cristianização – oração subordinada
adverbial temporal.
Embora os homens sejam os destinatários das
críticas do pregador, as reprimendas são
apresentadas no sermão de modo metafórico.
2.2 ou 8
Apesar de os homens serem os destinatários das
críticas do pregador, as reprimendas são
apresentadas no sermão de modo metafórico.
2.3 Complemento do nome. 7

GRUPO III
Tópicos de resposta
• A palavra de Vieira incomoda os que têm atitudes erradas e que não têm limites para as suas ações;
• Estes não gostam de ser repreendidos porque não se preocupam com os que os rodeiam, mas apenas consigo mesmos;
• Os defeitos do ser humano podem ser destruidores quer das relações com os outros, quer do próprio percurso do indivíduo;
• A falta de humildade, a soberba, a altivez conduzem o ser humano ao abismo;
• O ser humano não consegue perpetuar estes defeitos ao longo da sua vida, sem que venha a sofrer consequências negativas;
• (…)

TESTES 1

Grupo I

A.
Padre António Vieira, Sermões, II (Obras Escolhidas, vol. XI), 2.ª ed., Lisboa: Sá da Costa, 1997. [“Sermão de Santo António
aos Peixes”, cap. V, pp.193-194.]
1
personagem da mitologia grega que tentou voar com asas de cera, mas estas derreteram e Ícaro caiu no oceano e afogou-se.

1. Explica as consequências da ousadia dos “Voadores”.


5
2. Explicita o significado das frases de caráter proverbial presentes no início do segundo parágrafo
10
(ll. 21 e 22).
3. Justifica a apóstrofe final a Santo António, tendo em atenção a globalidade deste Sermão.
15 4. Identifica o recurso expressivo presente na frase “mas porque quis ser borboleta das ondas” (Ll.
20 19-20) e explica o seu valor expressivo.

25
B.
5. Explicita, num texto de 80 a 100 palavras, exemplificando, o modo como se concretiza, neste excerto
30 do Sermão de Santo António aos Peixes, a alegoria de intuitos críticos.

Grupo II

Obra completa do grande jesuíta a caminho

O forte investimento oficial e académico nas celebrações de dois centenários vieirianos ocorridos
no espaço de uma década consagraram a figura do Padre António Vieira (1608-1697) como uma figura
das maiores de todos os tempos no âmbito da História das culturas portuguesa e brasileira. O terceiro
centenário da sua morte, ocorrido em 1997, e o quarto centenário do seu nascimento, celebrado em 2008,
com direito a homenagens oficiais na Assembleia da República e em palcos de outros órgãos públicos,
repararam a injustiça da relativa secundarização da sua obra genial na História portuguesa, pelo menos
até à primeira metade do século XX. (…)
Passado o tempo da controvérsia que gerou uma corrente antivieiriana na cultura portuguesa –
versão especializada da corrente antijesuítica, tendo por representantes máximos da crítica a Vieira o
marquês de Pombal, que o apelidava de bruxo delirante, e Teófilo Braga, que desqualificou os seus
sermões assemelhando-os a discursos taquigrafados1 dos deputados dos parlamentos da monarquia
constitucional −, hoje em dia estudiosos e homens de cultura em geral aplaudem quase unanimemente o
génio deste pregador jesuíta e o contributo inovador da sua obra para a língua e para o pensamento
português e europeu mais avançado.
No entanto, ainda resta um trabalho basilar ou preliminar para colocar à disposição dos
investigadores e homens de cultura em geral toda a obra de Vieira: publicar a sua obra completa e traduzi-
la para as grandes línguas de circulação internacional. (…)
A situação é gritante no caso da volumosa obra de Vieira dada a importância desta, que marcou
uma etapa decisiva de aperfeiçoamento da língua portuguesa e da sua capacidade de dizer um pensamento
complexo de forma esteticamente brilhante. Não foi por acaso que Fernando Pessoa proclamou Vieira
«Imperador da Língua Portuguesa» na Mensagem, atribuindo, no Livro do Desassossego, à influência da
leitura dos seus sermões a decisão de escolher a língua de Camões para dar cidadania à sua genial criação
poética em detrimento da língua de Shakespeare. (…)
Por isso, a Universidade de Lisboa está agora empenhada em promover e angariar mecenas para
financiar um projeto de preparação, verdadeiramente colossal mas urgente, da edição anotada da obra do
Padre António Vieira em 30 volumes. (…)
Esperamos que este grande projeto de edição de um dos mais valiosos tesouros da literatura
35 portuguesa encontre mecenas que percebam a importância de uma aventura desta natureza para a
promoção da língua e cultura portuguesas em Portugal e no mundo, com atenção estratégica ao novo
centro nevrálgico que constituem hoje as potências do Extremo Oriente, onde a língua portuguesa está a
conhecer um renovado interesse em termos de aprendizagem.

Andreas Farmhouse, “Obra completa do grande jesuíta a caminho”, Ler, outubro de 2011, pp. 34-35.
Leitura / Gramática
1. Para responderes a cada um dos itens de 1.1. a 1.5., seleciona a única opção que permite obter uma
afirmação correta
1.1. O texto apresenta características específicas do género

1
Escritos por meio de carateres convencionados, para maior rapidez; estenografados.
A. apreciação crítica. C. artigo de opinião.
B. discurso político. D. artigo de divulgação científica.

1.2. O jornalista lamenta


A. a desconsideração da obra do Padre António Vieira.
B. a falta de homenagens ao Padre António Vieira.
C. a genialidade da obra vieiriana.
D. o forte investimento nas celebrações de dois centenários vieirianos.

1.3. O jornalista aplaude


A. a compilação dos sermões do Padre C. as potências emergentes do Oriente.
António Vieira. D. a procura de patronos para a publicação e
B. a promoção da língua portuguesa a tradução da obra completa vieiriana.
setecentista no Oriente.
1.4. Os conectores “No entanto” (l.17) e “Por isso” (l.27) contribuem para
A. a coesão frásica. C. a coesão lexical.
B. a coesão interfrásica. D. a coesão referencial.

1.5. O referente do vocábulo sublinhado em “sua genial criação poética”


(l.25) é
A. “Vieira”. C. “Mensagem”.
B. “Fernando Pessoa”. D. “Camões”.
2. Responde de forma correta aos itens apresentados.
2.1. Indica a função sintática da oração “que o apelidava de bruxo delirante” (l.11).
2.2. Na frase “Passado o tempo da controvérsia que gerou uma corrente
antivieiriana na cultura portuguesa” (l.9), identifica a função sintática do
pronome relativo.
2.3. Classifica a oração “onde a língua portuguesa está a conhecer um renovado
interesse em termos de aprendizagem” (ll. 30-31).

Grupo III
Escrita
Segundo o Padre António Vieira, a terra encontra-se corrompida, ou porque “o sal não
salga” ou porque “a terra se não deixa salgar”.
A partir do sentido desta metáfora, elabora um texto de opinião sobre a corrupção da
sociedade atual (180 a 210 palavras).
Para fundamentares o teu ponto de vista, recorre a dois argumentos, ilustrando cada
um deles com um exemplo concreto e significativo.

1. Os “Voadores”, porque têm maiores barbatanas do que os outros peixes, tentam voar, mas a tentativa
de entrar no ar, elemento que não é o seu, leva-os ao fogo, à morte. De facto, a sua ousadia, presunção e
excessiva vaidade têm como consequência a sua destruição (“Todas as velas para eles são redes como
peixe, e todas as cordas laços como ave.” ll. 16-17).
2. Os dois aforismos (“Quem quer mais do que lhe convém perde o que quer e o que tem” e “Quem
pode nadar e quer voar, tempo virá que não voe nem nade”) constituem máximas de vida, alertando para o
facto de a ambição, o capricho e a vaidade poderem originar a desgraça, a perdição e, inclusivamente, a
morte.
3. Padre António Vieira estabelece um paralelo entre a ação de Santo António e as atitudes dos homens
seus contemporâneos, enaltecendo as virtudes do primeiro (“Oh Alma de António, que só vós tivestes
asas, e voastes sem perigo, porque soubestes voar para baixo, e não para cima”) e criticando os vícios e
defeitos dos segundos. A bondade e a humildade de Santo António contrastavam com a ambição e a
desumanidade que os colonos do Maranhão exerciam sobre os índios.
4. Esta metáfora destaca o facto de os Voadores quererem mais do que aquilo que são e, por
isso, a sua presunção levou-os à morte quando estavam livres do fogo. Ao contrário da
borboleta, não têm capacidade de se metamorfosear e, por isso, não se renovam.
5. O conceito de alegoria associa-se ao Sermão de Santo António aos Peixes, pois Padre António Vieira
toma os peixes como metáfora dos vícios dos homens.
Efetivamente, a repreensão aos peixes deve ser entendida como uma crítica direta aos homens, que
são, durante o discurso, equiparados àqueles por causa da sua atitude (“Eis aqui Voadores do mar, o que
sucede aos da terra, para que cada um se contente com o seu elemento.” ll. 29-30)
Quando fala aos peixes, na verdade é aos homens que se dirige, e assim, com a repreensão
daqueles, o pregador destaca defeitos que abundam nos seres humanos.
GRUPO II …………………………………………………………………………………………………………………. 50 pontos

1.1 C 1.2 A 1.3 D 1.4 B 1.5 A

2.1 Modificador de nome apositivo. 9

2.2 Sujeito. 9

2.3 Oração subordinada adjetiva relativa explicativa. 7

Tópicos sugeridos:
• A corrupção é um fenómeno social, político e económico que tem estado presente na sociedade ao longo de
várias épocas, existindo exemplos deste fenómeno em todos os países do mundo;
• a ambição desmedida dos homens poderá ser um dos fatores conducentes aos atos de corrupção.
• atualmente, a corrupção está presente em diversas áreas da sociedade, desde a banca, às grandes empresas,
à política e à justiça.
• a corrupção desvirtua as instituições democráticas, retira legitimidade aos processos políticos, de decisão e
ligados à justiça, criando instabilidade e desconfiança nas sociedades.
• na sociedade portuguesa da atualidade, têm vindo a público diversos casos de corrupção que envolvem altas
personalidades da nação, que conduzem, frequentemente, à abertura de inquéritos judiciais, julgamentos e,
consequentemente, a condenações.

GRUPO I (100 PONTOS)

A
Lê o texto a seguir transcrito. Em caso de necessidade, consulta o vocabulário
apresentado.
Mas nem por isso vos negarei que também cá se deixam pescar os homens pelo mesmo engano,
menos honrada e mais ignorantemente. Quem pesca as vidas a todos os homens do Maranhão, e com
quê? Um homem do mar com uns retalhos de pano. Vem um mestre de navio de Portugal com quatro
varreduras das lojas, com quatro panos e quatro sedas, que já se lhe passou a era e não têm gasto. E que
faz? Isca com aqueles trapos aos moradores da nossa terra; dá-lhes uma sacadela e dá-lhes outra, com
5 que cada vez lhes sobe mais o preço; e os bonitos, ou os que o querem parecer, todos esfaimados aos
trapos, e ali ficam engasgados e presos, com dívidas de um ano para outro ano, e de uma safra para
outra safra, e lá vai a vida. Isto não é encarecimento. Todos a trabalhar toda a vida, ou na roça 1, ou na
cana, ou no engenho2, ou no tabacal; e este trabalho de toda a vida, quem o leva? Não o levam os co-
ches, nem as liteiras, nem os cavalos, nem os escudeiros, nem os pajens, nem os lacaios, nem as tape-
10 çarias, nem as pinturas, nem as baixelas3, nem as joias; pois em que se vai e despende toda a vida? No
triste farrapo com que saem à rua, e para isso se matam todo o ano.
Não é isto, meus peixes, grande loucura dos homens com que vos escusais? Claro está que sim;
nem vós o podeis negar. Pois se é grande loucura esperdiçar a vida por dois retalhos de pano quem tem
obrigação de se vestir, vós, a quem Deus vestiu do pé até à cabeça, ou de peles de tão vistosas e apro-
priadas cores, ou de escamas prateadas e douradas, vestidos que nunca se rompem, nem gastam com
15 o tempo, nem se variam ou podem variar com as modas; não é maior ignorância e maior cegueira
deixarde-vos enganar ou deixarde-vos tomar pelo beiço com duas tirinhas de pano? Vede o vosso
Santo António, que pouco o pôde enganar o mundo com essas vaidades. Sendo moço e nobre, deixou
as galas de que aquela idade tanto se preza, trocou-as por uma loba 4 de sarja e uma correia de cónego
regrante; e depois que se viu assim vestido, parecendo-lhe que ainda era muito custosa aquela morta-
lha, trocou a sarja pelo burel e a correia pela corda.
20
VIEIRA, Padre António (2015). Sermão de Santo António. Porto: Porto Editora [pp. 41-44]

1. roça: terreno cultivado para produção agrícola. 2. engenho: fábrica de açúcar e aguardente de cana. 3. baixelas: conjuntos de objetos próprios ao
serviço de mesas aparatosas. 4. loba: batina eclesiástica.

Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
1. Identifica as críticas feitas aos homens no excerto. (20
pontos)

2. Interpreta a alusão a Santo António neste momento do sermão. (20


pontos)

3. Transcreve um exemplo de gradação e comenta a sua expressividade. (20


pontos)

B
Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
4. Explica a função da alegoria no Sermão de Santo António. (20
pontos)

5. Explicita o sentido da seguinte afirmação, de Margarida Vieira Mendes: (20 pontos)

“A linguagem não está lá [nos textos oratórios de Vieira] para transportar as ideias, está lá para
as tornar visíveis […].”

G R U P O II (50 PONTOS)

Lê o texto seguinte.
Um passo na direção da paz entre árabes e judeus
Yitzhak Rabin
[Casa Branca, Washington – 13 de setembro de 1993]
Senhor Presidente dos Estados Unidos,
Excelências, senhoras e senhores:
Esta assinatura da declaração de princípios israelo-palestiniana que hoje aqui tem
5 lugar não é muito fácil – nem para mim, como soldado na guerra de Israel, nem para o
povo de Israel nem para o povo judeu na diáspora, que nos observa neste momento
com uma grande esperança mesclada de apreensão. Não é certamente fácil para as fa-
mílias das vítimas da violência e do terror da guerra, cuja dor nunca será mitigada, nem
para os muitos milhares de pessoas que defenderam as nossas vidas sozinhos e até sa-
crificaram as suas vidas pelas nossas. Para eles, esta cerimónia chegou demasiado
10
tarde.
Hoje, na véspera de uma oportunidade – uma oportunidade para a paz e, talvez,
para o fim da violência e da guerra –, recordamos cada um deles com um amor eterno.
Viemos de Jerusalém, a antiga e eterna capital do povo judeu. Viemos de uma terra an-
gustiada e sofredora. Viemos de um povo, um lar, uma família que não conheceu um
único ano, um único mês, em que mães não tenham chorado pelos filhos. Viemos para
15
tentar pôr fim às hostilidades para que os nossos filhos e os filhos dos nossos filhos não
sintam o doloroso custo da guerra: a violência e o terror. Viemos para proteger as suas
vidas e para aliviar a alma e as dolorosas memórias do passado – para esperar e rezar
pela paz.
Deixai-me dizer-vos, Palestinianos, que estamos destinados a viver juntos no
20 mesmo solo, na mesma terra. Nós, os soldados que chegaram das batalhas manchados
de sangue; nós, que vimos os nossos familiares e amigos serem mortos à nossa frente;
nós, que assistimos aos seus funerais e não conseguimos olhar os seus pais nos olhos;
nós, que viemos de uma terra onde os pais enterram os filhos; nós, que lutámos contra
vós, os Palestinianos – hoje dizemo-vos, em voz alta e clara: basta de sangue e lágrimas.
Basta!
25 Não temos desejo de vingança. Não guardamos ódio contra vós. Tal como vós,
somos pessoas – pessoas que querem construir um lar. Plantar uma árvore. Amar – viver
ao vosso lado. Com dignidade. Com empatia. Como seres humanos. Como homens li-
vres. Hoje, damos uma oportunidade à paz – e dizemo-vos repetidamente: Basta! […]
MATA, Manuel (2011). 50 Grandes Discursos da História.
Lisboa: Edições Sílabo [pp. 229-230]
30
Yitzhak Rabin (1922-1995): general e político israelita; primeiro-ministro de Israel (1974-1977, 1992-1995).

1. Para responderes a cada um dos itens de 1.1. a 1.7., seleciona a opção


correta.
Escreve, na folha de respostas, o número de cada item e a letra que identifica a opção
escolhida.
1.1. Este texto tem um carácter predominantemente (5
pontos)
a. expositivo.
b. persuasivo.
c. apreciativo.
d. informativo.
1.2. O discurso é perpassado (5
pontos)
a. por um tom de revolta e de sofrimento.
b. pelo apelo à vingança e à luta armada.
c. pela exortação à paz e à liberdade.
d. pela crítica aos Palestinianos.
1.3. Na linha 9, o particípio “mitigada” tem o sentido de (5
pontos)
a. intensificada.
b. esclarecida.
c. destruída.
d. atenuada.
1.4. Com a afirmação “Para eles, esta cerimónia chegou demasiado tarde.” (ll. 11-12), Yitzhak
Rabin censura (5
pontos)
a. as consequências da guerra.
b. a hora e o local em que se realiza a cerimónia.
c. a inércia do governo americano.
d. a diáspora do povo judeu.
1.5. Nas linhas 13 e 14, os travessões são usados para delimitar (5
pontos)
a. o discurso direto.
b. o esclarecimento de um aspeto introduzido anteriormente.
c. uma opinião pessoal irónica.
d. uma expressão utilizada com um sentido diferente do habitual.
1.6. O recurso expressivo que se destaca entre as linhas 14 e 20 é (5
pontos)
a. a anáfora.
b. a antítese.
c. a apóstrofe.
d. a enumeração.
1.7. O constituinte frásico “os Palestinianos” (l. 27) desempenha a função de modificador apositivo
de (5
pontos)
a. “os filhos” (l. 26).
b. “nós” (l. 26).
c. “vós” (l. 27).
d. “sangue e lágrimas” (l. 27).

2. Responde ao item apresentado. (15


pontos)
2.1. Identifica, na frase seguinte, as expressões que têm valor deítico.

“Deixai-me dizer-vos, Palestinianos, que estamos destinados a viver juntos no mesmo solo, na
mesma terra.” (ll. 22-23)

G R U P O III (50 PONTOS)

Através do Sermão de Santo António, Padre António Vieira pretendeu atuar sobre uma
determinada realidade social, tecendo duras críticas aos colonos do Maranhão.
Parece-te que as críticas de Vieira permanecem atuais?
Redige um texto de opinião sobre este assunto, respeitando as marcas específicas deste
género textual (explicitação de um ponto de vista; clareza e pertinência da perspetiva
adotada, dos argumentos desenvolvidos e dos respetivos exemplos; discurso valorativo:
juízo de valor explícito ou implícito).

Observações:
1. Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em branco, mesmo
quando esta integre elementos ligados por hífen (ex.: /dir-se-ia/). Qualquer número conta como uma única palavra,
independentemente dos algarismos que o constituam (ex.: /2015/).
2. Relativamente ao desvio dos limites de extensão indicados – um mínimo de duzentas e um máximo de trezentas
palavras –, há que atender ao seguinte:
• um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial (até 5 pontos) do texto produzido;
• um texto com extensão inferior a oitenta palavras é classificado com zero pontos.
Unidade 1 Padre António Vieira, Sermão de Santo António
Cotação, cenários de resposta e critérios de classificação
G R U P O III (50 PONTOS)

Critérios específicos
Item Cotação Cenário de resposta
de classificação
1. 20 pontos • Críticas aos homens: • Aspetos de conteúdo –
· deixam-se enganar facilmente, de forma desonrada e 12 pontos.
ingénua, pela vaidade – desperdiçam a vida “por retalhos • Aspetos de estruturação
de pano”; do discurso e correção
· são gananciosos/ambiciosos; linguística:
· não têm consciência de que os bens terrenos são · estruturação do
efémeros. discurso – 4 pontos;
· correção linguística –
2. 20 pontos • Recurso a Santo António como contraexemplo (ao 4 pontos.
contrário dos restantes homens, Santo António não se
deixou dominar pela vaidade nem pelos bens terrenos,
optando por uma vida dedicada a Deus).
3. 20 pontos • “Não o levam os coches, nem as liteiras, nem os cavalos,
nem os escudeiros, nem os pajens, nem os lacaios, nem
as tapeçarias, nem as pinturas, nem as baixelas, nem as
joias” (ll. 9-11).
• Gradação crescente que reflete a ostentação e a vaidade
crescente (meios de transporte < criados < objetos de
valor, que simbolizam o luxo).
4. 20 pontos • Alegoria:
· Vieira prega aos colonos (destinatário real do sermão),
fingindo pregar aos peixes;
· Vieira denuncia e critica os vícios dos homens através
das características dos peixes.
5. 20 pontos • Linguagem que reflete o discurso imagético de Vieira,
através da alegoria (Vieira prega aos homens, fingindo
pregar aos peixes), da comparação
(ex.: entre os vícios dos homens e as virtudes e os vícios
dos peixes; entre Santo António e os homens) e da
metáfora.

G R U P O II (50 PONTOS)

Item Cotação Cenário de resposta


1.1. 5 pontos b.
1.2. 5 pontos c.
1.3. 5 pontos d.
1.4. 5 pontos a.
1.5. 5 pontos b.
1.6. 5 pontos a.
1.7. 5 pontos c.
• Deíticos pessoais – “Deixai”, “me”, “vos”, “estamos”
2.1. 15 pontos
• Deítico temporal – “estamos” (momento da enunciação)

G R U P O III (50 PONTOS)

Cenário de resposta Critérios específicos de classificação

• Possível tópico a abordar: atualidade do sermão • Aspetos de conteúdo – 30 pontos.


· Sermão de Santo António: antropofagia social, • Aspetos de estruturação do discurso e correção
vaidade, arrogância, parasitismo, ambição, traição… linguística:
· atualidade: ambição desmedida, exploração social, · estruturação temática e discursiva – 10 pontos;
sede de poder, tráfico de influências, lavagem de · correção linguística – 10 pontos.
dinheiro, ostentação de bens terrenos, culto da
aparência…
Agrupamento de Escolas
Teste de Avaliação Português
11.º Ano de Escolaridade Turma ___
Nome do/a aluno/a: ______________________________________________
N.º _____

Professor/a: __________________

GRUPO I
A

Apresenta as tuas respostas de forma bem estruturada.


Lê, atentamente, o texto seguinte.

Nesta viagem, de que fiz menção, e em todas as que passei a Linha Equinocial, vi
debaixo dela o que muitas vezes tinha visto e notado nos homens, e me admirou
que se houvesse estendido esta ronha e pegado também aos peixes. Pegadores se
chamam estes de que agora falo, e com grande propriedade, porque, sendo
pequenos, não só se chegam a outros maiores, mas de tal sorte se lhes pegam aos
costados que jamais os desferram. De alguns animais de menos força e indústria se
conta que vão seguindo de longe aos Leões na caça, para se sustentarem do que a
eles sobeja. O mesmo fazem estes Pegadores, tão seguros ao perto como aqueles
ao longe; porque o peixe grande não pode dobrar a cabeça, nem voltar a boca sobre
os que traz às costas, e assim lhes sustenta o peso e mais a fome. Este modo de
vida, mais astuto que generoso, se acaso se passou e pegou de um elemento a
outro, sem dúvida que o aprenderam os peixes do alto, depois que os nossos
Portugueses o navegaram; porque não parte Vice-Rei ou Governador para as
Conquistas que não vá rodeado de Pegadores, os quais se arrimam a eles, para que
cá lhes matem a fome, de que lá não tinham remédio. Os menos ignorantes,
desenganados da experiência, despegam-se e buscam a vida por outra via; mas os
que se deixam estar pegados à mercê à mercê e fortuna dos maiores, vem-lhes a
suceder no fim o que aos Pegadores do mar.
Rodeia a nau o Tubarão nas calmarias da Linha com os seus Pegadores às
costas, tão cerzidos com a pele que mais parecem remendos ou manchas naturais,
que os hóspedes ou companheiros. Lançam-lhe um anzol de cadeia com a ração de
quatro Soldados, arremessa-se furiosamente à presa, engole tudo de um bocado, e
fica preso. Corre meia campanha a alá-lo acima, bate fortemente o convés com os
últimos arrancos; enfim, morre o tubarão, e com ele os Pegadores. (…)
Considerai, Pegadores vivos, como morreram os outros que se pegaram àquele
peixe grande, e porquê. O Tubarão morreu porque comeu, e eles morreram pelo que
não comeram. Pode haver maior ignorância que morrer pela fome e boca alheia?

Padre António Vieira. Sermões (apresentação crítica, seleção, notas e sugestões para análise literária
de Margarida Vieira Mendes, coleção Textos Literários, dirigida por Maria Alzira Seixo.
Editorial Comunicação – Seara Nova. 1982.

1. Localiza o excerto transcrito na estrutura do sermão, segundo o plano traçado por


Padre António Vieira, no capítulo II, justificando a tua resposta.

2. Explica como, no primeiro parágrafo, se verifica a inversão da alegoria que serviu


de base à elaboração deste sermão.

3. Demonstra que a caracterização dos Pegadores é feita, essencialmente, pelo


confronto com outros seres.

B
Lê o texto seguinte.

“Toma um homem do mar um anzol, ata-lhe um pedaço de pano cortado e aberto


em duas ou três pontas, lança-o por um cabo delgado até tocar na água, e em o
vendo o peixe, arremete cego a ele e fica preso e boqueando, até que, assim
suspenso no ar, ou lançado no convés, acaba de morrer. Pode haver maior
ignorância e mais rematada cegueira que esta? Enganados por um retalho de pano,
perder a vida? Dir-me-eis que o mesmo fazem os homens. Não vo-lo nego. […] A
vaidade entre os vícios é o pescador mais astuto e que mais facilmente engana os
homens. E que faz a vaidade? Põe por isco na ponta desses piques, desses chuços
e dessas espadas dois retalhos de pano, […]; e os homens, por chegarem a passar
esse retalho de pano ao peito, não reparam em tragar e engolir o ferro. E depois
disso que sucede? O mesmo que a vós. O que engoliu o ferro, ou ali ou noutra
ocasião, ficou morto; e os mesmos retalhos tornaram outra vez ao anzol para pescar
outros. Por este exemplo vos concedo, peixes, que os homens fazem o mesmo que
vós, posto que me parece que não foi este o fundamento da vossa resposta ou
escusa, porque cá no Maranhão, ainda que se derrame tanto sangue, não há
exércitos, nem esta ambição de Hábitos.”
Mas nem por isso vos negarei que também cá se deixam pescar os homens pelo
mesmo engano, menos honrada e mais ignoradamente. (…) Vem um Mestre de
Navio de Portugal com quatro varreduras¹ das lojas, com quatro panos e quatro
sedas, que já se lhes passou a era e não têm gasto; e que faz? Isca com aqueles
trapos aos moradores da nossa terra: dá-lhes uma sacadela e dá-lhes outra, com
que cada vez lhes sobe mais o preço; e os Bonitos, ou os que querem parecer,
todos esfaimados aos trapos, e ali ficam engasgados e presos, com dívidas de um
ano para o outro ano, e de uma safra para outra safra, e lá vai a vida. […] pois em
que se vai e despende toda a vida? No triste farrapo com que saem à rua, e para
isso se matam todo o ano.

Padre António Vieira. Sermões (apresentação crítica, seleção, notas e sugestões para análise literária
de Margarida Vieira Mendes, coleção Textos Literários, dirigida por Maria Alzira Seixo.
Editorial Comunicação – Seara Nova. 1982.

Glossário:
1. varreduras: restos.

4. Esclarece o sentido da metáfora presente na frase “A vaidade entre os vícios é o


pescador mais astuto,” relacionando-a com os objetivos do sermão.

5. Procede ao levantamento do campo lexical de “pano” e deduz da intencionalidade


do orador.

GRUPO II

Nas respostas da escolha múltipla, seleciona a opção correta. Escreve, na folha de


respostas, o número do item e a letra que identifica a opção escolhida.

Lê o texto seguinte.

MENOS DO QUE NÓS


Uma obra magnífica sobre o fenómeno do racismo que faz a síntese de oito
séculos de discriminação
Nesta Numa grande síntese histórica, é forçoso que alguns aspetos sejam
reduzidos a uma expressão nuclear. Francisco Bethencourt define racismo assim:
“Preconceito quanto à descendência étnica combinado com ação discriminatória.” É
uma definição clara e funcional, que visa servir os fins de uma obra de abrangência
larga, mas obviamente não esgota o assunto. O racismo tem aspetos psicológicos
complexos, por exemplo. Não é deles que se trata aqui nem poderiam ser
aprofundados neste contexto. Mas devemos tê-los em conta, até para não
perdermos de vista aquilo que ainda hoje está em causa no dia a dia, em Portugal e
noutros países. Quantas vezes ouvimos observações racistas feitas de um modo tão
casual, tão inocente, que na maior parte das vezes nem lhes respondemos.
Tentamos pensar que é porque não vale a pena, mas ficamos um pouco mais
desiludidos com os outros e sobretudo connosco. Mesmo a esse nível, “Racismos”
ajuda. Ao contar o progresso do racismo “Das Cruzadas ao Século XX – num foco
europeu, mas com extensões a África e Ásia –, mostra como os preconceitos são
ativados por objetivos práticos. O racismo não é inato. Relacional por natureza, varia
de feição conforme as circunstâncias em que surge. “Não existe um racismo
cumulativo e linear,” explica Bethencourt. “As conjunturas específicas de crise
económica ou política revelaram-se cruciais para explicar a mobilização de
preconceitos e sua transformação em ações políticas ao serviço de interesses
sociais específicos”. O modo como parte da Europa vê os refugiados do Médio
Oriente tem antecedentes. Na Idade Média, o preconceito era intensificado pela
proximidade entre comunidades, mudando as atitudes com o tempo. Durante o
período da expansão oceânica, além de servir como argumento para a expulsão em
bloco dessas comunidades, justificou a exploração e o extermínio das populações
indígenas. As sociedades coloniais tendiam a ser altamente estratificadas. Ainda
hoje sobrevivem vestígios dessa herança, não raro com efeitos trágicos.
Como sabemos, a biologia moderna destruiu a ideia de raça, ao constatar que
entre indivíduos com a mesma cor de pele existe mais variedade genética do que
entre grupos com cores distintas.
Mas isso é uma descoberta recente, e de qualquer modo a cor é apenas um dos
fatores relevantes. Na Idade Média, diz Bethencourt, “a competição e a guerra
constante desempenharam um papel importante na criação de um ódio perene entre
povos de religiões diferentes, especialmente entre cristãos e muçulmanos.” Já
quanto aos ciganos, que tendiam a adotar a religião das zonas onde viviam, o
preconceito tinha a ver com o modo de vida. […]
Luís M. Faria. In E, A Revista do Expresso, 14/11/2015.
Seleciona a opção que te permite obter uma afirmação correta.

1. O artigo supracitado, quanto ao género, é uma apreciação crítica, porque


apresenta
(A) marcas de subjetividade, juntamente com vários tipos de argumentos.
(B) descrições pormenorizadas de vivências do emissor.
(C) uma síntese da obra e um discurso persuasivo.
(D) o ponto de vista do emissor e uma linguagem valorativa.

2. Segundo o autor deste artigo, racismo é um preconceito baseado


(A) na religião e na genética, apenas.
(B) na genética, na mobilidade e no modo de vida das pessoas.
(C) numa diversidade e complexidade de fatores.
(D) na descendência étnica e na guerra.
3. No quotidiano, qualquer indivíduo pode ser vítima de atitudes racistas
(A) inofensivas e, por isso, aceitáveis.
(B) ingénuas, mas indesculpáveis.
(C) preocupantes e intoleráveis.
(D) pontuais, mas dececionantes.

4. No tempo das descobertas, o racismo foi responsável pela


(A) autonomia dos povos nativos.
(B) expulsão de estrangeiros de Portugal.
(C) exploração desumana e indiscriminada dos povos descobertos.
(D) abolição de classes nas sociedades coloniais.

5. O constituinte “por objetivos práticos” exerce a função sintática de


(A) complemento agente da passiva.
(B) complemento oblíquo.
(C) predicativo do complemento direto.
(D) predicativo do sujeito.

6. No segundo parágrafo, os segmentos “Na Idade Média”, “Durante o período da


expansão oceânica” e “Ainda hoje” configuram um mecanismo de coesão
(A) interfrásica.
(B) temporal.
(C) lexical.
(D) frásica.

7. No contexto em que ocorre, o vocábulo “Já” é equivalente a


(A) outrora.
(B) porém.
(C) agora.
(D) ainda.

8. Classifica a oração “que alguns aspetos sejam reduzidos a uma expressão


nuclear”.

9. Transcreve da seguinte frase “Não é deles que se trata aqui nem poderiam ser
aprofundados neste contexto” a conjunção coordenativa copulativa.

10. Indica o referente de “los” em “Mas devemos tê-los em conta”.


GRUPO III

Da mobilidade se fez o mundo que conhecemos


As migrações estão na génese das sociedades como as sabemos hoje,
reconstruídas. Porque são parte da natureza humana que busca a sobrevivência,
seja da fome, seja da perseguição”.
Ivete Carneiro. Da mobilidade se fez o mundo que conhecemos.
In Jornal de Notícias, 28/11/2015.

Num texto bem estruturado, com um mínimo de duzentas e um máximo de duzentas


e cinquenta palavras, apresenta a tua opinião sobre a importância, para países
como Portugal, dos movimentos migratórios que se verificam na atualidade.

FIM

CENÁRIOS DE RESPOSTA
Grupo I
A
1. Padre António Vieira, no capítulo II, apresenta o plano do seu sermão, afirmando que este será
dividido em dois pontos: no primeiro, louvará as virtudes dos peixes (em geral e, de seguida, em
particular), no segundo, repreenderá os vícios (em geral e, depois, em particular). O excerto transcrito
situa-se, assim, nas repreensões, em particular, uma vez que é feita uma crítica aos Pegadores.
2. De facto, o sermão foi elaborado com base numa alegoria, dado que o Orador se dirige aos peixes,
apontando os seus vícios e as suas virtudes, mas, na verdade, estes são a representação dos seres
humanos.
No primeiro parágrafo do excerto, Padre António Vieira refere o oportunismo de alguns portugueses
que vivem à custa dos mais poderosos, criticando, essencialmente, os “mais ignorantes” pela sua
cegueira e incapacidade de se autonomizarem, advertindo, de seguida, os peixes para que não
corram os mesmos riscos, que os conduzirão à morte.
3. Os Pegadores são peixes “pequenos”, mas chegam-se a outros “maiores”, para deles se
alimentarem e sobreviverem, daí o seu parasitismo e oportunismo. Afirma-se também que existem
“outros animais” com o mesmo modo de vida, mas fazem- no “de longe”, contrariamente aos
Pegadores que “se pegam aos costados dos maiores,” por isso de mais “perto”, tornando este modo
de vida mais condenável. A caracterização é ainda feita no confronto com o ser humano, como já foi
referido na resposta à questão anterior. A ignorância destes peixes é salientada com a morte do
Tubarão que “morreu porque comeu”, enquanto os peixes morreram sem comer.
B
4. Nesta frase, a vaidade é identificada com um “pescador astuto”, o que quer dizer que os homens
são muito facilmente vítimas da vaidade, que os leva à perdição.
A afirmação está em consonância com alguns dos objetivos do sermão, a saber: criticar para
moralizar (denunciar a vaidade e os seus efeitos nocivos, com vista à sua correção); persuadir o real
auditório e deleitá-lo, utilizando uma linguagem simbólica e convincente (uso da metáfora,
expressividade do adjetivo “astuto”).
5. O vocábulo “pano” é referido no texto através das palavras “retalho”, “varredura,” ”trapos” e
“farrapo”. A seleção destes vocábulos mostra bem o quão condenável é a atitude daqueles que se
deixam seduzir por motivos tão mesquinhos e banais, como “um retalho de pano”. Os três últimos
elementos remetem mesmo para a humilhação e pequenez do ser humano, nas suas escolhas.
Grupo II
1. (D); 2. (C); 3. (D); 4. (C); 5. (A); 6. (B); 7. (B).
8. Oração subordinada substantiva completiva.
9. “nem”
10. O referente de “los” é “aspetos psicológicos complexos.”

Grupo III
Resposta pessoal.
Sugestão
Introdução
– Breve referência aos principais movimentos migratórios da atualidade e às principais causas da
mobilidade.
Desenvolvimento
– Principais causas da mobilidade.
– Importância das causas da mobilidade na transformação das sociedades: em Portugal verificam-se
dois tipos de movimentos, com consequências diferentes: por um lado, o êxodo de jovens com
formação superior, com razões e consequências negativas; por outro, a chegada de migrantes,
fugidos à guerra, às perseguições políticas e religiosas, etc. com consequências positivas, entre
outras, o rejuvenescimento da população, o povoamento, sobretudo de zonas do interior, a
diversidade cultural, a partilha de experiências e o desenvolvimento de relações de solidariedade.
Conclusão
– Pluriculturalismo, rejuvenescimento e espírito de solidariedade como fatores determinantes de
renovação e enriquecimento das sociedades.

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