Teste 11º Ano Sermão Rémora
Teste 11º Ano Sermão Rémora
Teste 11º Ano Sermão Rémora
«Ah moradores do Maranhão, quanto eu vos pudera agora dizer neste caso! Abri, abri estas
entranhas; vede, vede este coração. Mas ah sim, que me não lembrava! Eu não vos prego a
vós, prego aos peixes.
Passando dos da Escritura aos da história natural, quem haverá que não louve e admire muito
a virtude tão celebrada da Rémora? No dia de um santo menor, os peixes menores devem
preferir aos outros. Quem haverá, digo, que não admire a virtude daquele peixezinho tão
pequeno no corpo e tão grande na força e no poder, que, não sendo maior de um palmo, se se
pega ao leme de uma Nau da Índia, apesar das velas e dos ventos, e de seu próprio peso e
grandeza, a prende e amarra mais que as mesmas âncoras, sem se poder mover, nem ir por
diante? Oh se houvera uma Rémora na terra, que tivesse tanta força como a do mar, que
menos perigos haveria na vida e que menos naufrágios no Mundo!
Se alguma Rémora houve na terra, foi a língua de Santo António, na qual, como na Rémora, se
verifica o verso de São Gregório Nazianzeno:
Lingua quidem parva est, sed viribus omnia vincit. O Apóstolo Santiago, naquela sua
eloquentíssima Epístola, compara a língua ao leme da nau e ao freio do cavalo. Uma e outra
comparação juntas declaram maravilhosamente a virtude da Rémora, a qual, pegada ao leme
da nau, é freio da nau e leme do leme. E tal foi a virtude e força da língua de Santo António. O
leme da natureza humana é o alvedrio, o Piloto é a razão: mas quão poucas vezes obedecem à
razão os ímpetos precipitados do alvedrio? Neste leme, porém, tão desobediente e rebelde,
mostrou a língua de António quanta força tinha, como Rémora, para domar a fúria das paixões
humanas. Quantos, correndo fortuna na Nau Soberba, com as velas inchadas do vento e da
mesma soberba (que também é vento), se iam desfazer nos baixos, que já rebentavam por
proa, se a língua de António, como Rémora, não tivesse mão no leme, até que as velas se
amainassem, como mandava a razão, e cessasse a tempestade de fora e a de dentro?
Quantos, embarcados na Nau Vingança, com a artilharia abocada e os bota fogos acesos, corria
enfumados a dar-se batalha, onde se queimariam ou deitariam a pique se a Rémora da língua
de António lhes dão detivesse a fúria, até que, composta a ira e ódio, com bandeiras de paz se
salvassem amigavelmente? Quantos, navegando na Nau Cobiça, sobrecarregada até às gáveas
e aberta com o peso por todas as costuras, incapaz de fugir, nem se defender, dariam nas
mãos dos corsários com perda do que levavam e do que iam buscar, se a língua de António os
não fizesse parar, como Rémora, até que, aliviados da carga injusta, escapassem do perigo e
tomassem porto? Quantos, na Nau Sensualidade, que sempre navega com cerração[2], sem sol
de dia, nem estrelas de noite, enganados do canto das sereias e deixando-se levar da corrente,
se iriam perder cegamente, ou em Sila, ou em Caríbdis, onde não aparecesse navio nem
navegante, se Rémora da língua de António os não contivesse, até que esclarecesse a luz e se
pusessem em via.
Esta é a língua, peixes, do vosso grande pregador, que também foi Rémora vossa, enquanto o
ouvistes; e porque agora está muda (posto que ainda se conserva inteira[3]) se veem e choram
na terra tantos naufrágios.»
Questões:
5. Explicite o sentido metafórico da “tempestade” das paixões humanas (as naus) que a
7.Neste Sermão, Vieira utiliza a rémora para simbolizar… (assinale a única correta):
7.1.
«Mas ah sim, que me não lembrava! Eu não vos prego a vós, prego aos peixes.»
8.
Num breve texto (cerca de 80 140 palavras), explique por que motivo no “Sermão de Santo
António aos Peixes” o orador decide pregar aos peixes (e não aos homens) e o que
representam, na generalidade, as criaturas marinhas. Aluda ao texto do sermão para
fundamentar a sua resposta