Exposicao Biblica Aos Colossenses SHEED
Exposicao Biblica Aos Colossenses SHEED
Exposicao Biblica Aos Colossenses SHEED
Russel Shedd
Vida Nova
APRESENTAÇÃO
"Afirmamos e cantamos as nossas crenças, sim; mais importante ainda, porém, é vivê-las. Sendo
Jesus Cristo o Senhor do universo, todos os aspectos de nossas vidas ficam sob o senhorio dele. Todas
as nossas atividades cotidianas, até mesmo os nossos atos mais comuns, tais como o comer e o beber,
devem manifestar seu senhorio. Será que Jesus é o Senhor dos seus estudos? E ele o guia da sua vida
cultural? Dos seus compromissos sociais?
Sem dúvida, o chamado mundo ocidental evidencia ainda em sua vida institucional e social as
marcas da sua herança cristã. Poderíamos mencionar a influência de pessoas e co munidades cristãs
que, pela submissão ao senhorio de Cristo na vida acadêmica, social e política, transformaram as coisas
de tal forma que hoje temos o que chamamos de mundo ocidental. Devemos admitir, porém, que há um
processo de deterioração dessa herança cristã, que tem feito com que o mundo ocidental se afaste cada
vez mais da influência cristã. Chegamos ao ponto em que manifestar o senhorio de Cristo em nossas
vidas, pela maneira como nos comportamos em nosso dia-a-dia com referência ao trabalho, ao dinheiro
ou ao nosso relacionamento social, é ir contra a correnteza.
É exatamente neste ponto que precisamos do discernimento baseado numa teologia bíblica, para
distinguirmos o decadente e o meramente acidental do sadio e cristão, em todas as áreas da vida." *
Dentre os livros do Novo Testamento, talvez seja Colossenses o que mais pode nos ajudar neste
sentido. E aqui o Dr. Shedd nos apresenta uma exposição completa, dando todo o destaque aos
aspectos desse andar no Senhor e de como viver, neste fim de século, sob a direção daquele que é o
Senhor do universo.
O presente trabalho foi uma decorrência natural dos preparativos que o Dr. Shedd fez para a
apresentação de suas palestras no "Congresso Geração 79 ", incumbido que fora de fazer uma exposição
bíblica de toda a carta aos Colossenses. Visando ajudar os participantes desse Congresso e ainda pos -
sibilitar que a mensagem de "Geração 79 " atinja todo o público evangélico brasileiro, surgiu a idéia de
publicar este livro.
O Dr. Shedd é bacharel em Teologia pelo Faith Seminary de Philadelphia, nos Estados Unidos.
Tem o mestrado pelo Wheaton College Graduate School e o doutorado pelo New College de Edimburgo,
Escócia. É o diretor das "Edições Vida Nova", tendo editado em português o "Novo Comentário da Bíblia"
e a "Bíblia Vida Nova". Além de pastor de uma igreja, o Dr. Shedd é professor de Novo Testamento na
Faculdade de Teologia Batista de São Paulo. Tem cooperado com a Aliança Bíblica Universitária em
muitas ocasiões, dando ex-posições bíblicas em acampamentos, cursos de férias e conferências.
Que o Senhor venha a utilizar este livro na vida de muitas pessoas, levando-as não somente a
aceitarem a Cristo como Senhor, mas também a cumprirem nas suas vidas a exortação do apóstolo
Paulo: ANDAI NELE!
Os Editores
INTRODUÇÃO
Exposição Bíblica de Colossenses 2
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Era por volta do ano 60 A. D. Em Roma, numa casa alugada, encontrava-se aquele que talvez
tenha sido o preso mais famoso de toda a História: Paulo, da cidade de Tarso. Com ele achava-se
alguém que saboreava as palavras do após-tolo com evidente satisfação, arriscando-se, de quando em
quando, a alguns palpites: Timóteo. Fora seu companheiro de longas e cansativas viagens e de ardentes
perseguições. Ali estava, também preso, o companheiro Aristarco, além do evangelista Marcos e de
Onésimo, o escravo foragido da casa de Filemom, de Colossos. Em Roma, nesta ocasião, encontrava-se
também Lucas, o médico amigo e companheiro de Paulo, autor do terceiro evangelho.
Paulo recebera, há pouco, a visita de Epafras, o evangelista que havia fundado três igrejas no
Vale do Lico, no interior da província romana chamada Ásia: Colossos, Laodicéia e Hierápolis. Epafras
expusera a Paulo à situação decorrente do surgimento de certas correntes teológicas que ameaçavam a
saúde espiritual desse novo centro de divulgação do Cristianismo.
Com Paulo achava-se ainda Tíquico, que fazia as funções de "secretário", escrevendo o que o
apóstolo dizia. E o que foi escrito é justamente o que mais tarde veio a ser co nhecido como a Epístola
aos Colossenses, inspirado livro que integrou o cânon do Novo Testamento!
Antecedentes
Uma curiosidade é que Paulo, mesmo estando sempre a orar pelos colossenses, nunca chegara
a visitar essa igreja, até então. Assim, não nos é difícil imaginar o cuidado com que ele ouviu o relato de
Epafras, procurando informar-se de todas aquelas idéias que os mestres heterodoxos estavam di-
vulgando naquela pequena cidade. Para nós, hoje, não é tão fácil entender o que realmente perturbava a
fé cristã daqueles que se tinham convertido durante o ministério de Paulo em Éfeso, na sua terceira
viagem missionária (A.D. 52-55), quando "todos os que moravam na Ásia ouviram a palavra do Se nhor,
tanto judeus como gregos". O Instituto Bíblico de Éfeso, fundado e dirigido por Paulo nas dependências
da escola de Tirano (At 19: 9), desempenhou um importante papel na preparação de obreiros, tais como
Epafras e Arquipo. Estes, evidentemente, eram os líderes da igreja de Colossos (Cl 4: 17) na ocasião em
que Paulo escreveu esta carta. Mas eles não se sentiam capazes de vencer de uma vez, naquele
confronto com as novas correntes teológicas, que traziam uma heresia sincretística. Meu amigo e antigo
professor, James Stewart, da cidade de Edimburgo, certa vez observou que toda a con trovérsia do Novo
Testamento pode ser reduzida à batalha da liberdade evangélica contra o legalismo dos judaizantes, de
um lado; e, do outro, à luta da verdade salvadora contra o gnosticismo. Paulo entendeu plenamente a
deficiência doutrinária dos gnósticos que menosprezavam a Cristo mas supervalorizavam os anjos; que
davam pouca atenção à moralidade e à ética, porém muita à especulação teosófica; que diminuíram o
papel da história mas exaltavam o misticismo.
No combate levantado na Epístola aos Colossenses, percebemos que a heresia era uma mistura
ou apanhado de elementos judaicos e gnósticos. "Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e
bebida, ou dia de festa, ou lua nova, ou sábado, porque tudo isso tem sido sombra das cousas que
haviam de vir" (Cl 2: 16,17). Esta frase faz-nos lembrar do judaísmo. "Culto aos anjos ", "visões",
"rudimentos do mundo" e proibições de tocar, manusear e provar (Cl 2:18-21) indicam uma forte
inclinação para o gnosticismo.
Logo após a invasão da cultura grega no Médio Oriente, em conseqüência da vitória de
Alexandre sobre os Persas, no quarto século antes de Cristo, a filosofia grega fez-se sentir tal como a
cultura ocidental permeia o mundo de nossos dias. O primeiro século caraterizou-se por um profundo
anseio pela salvação. Onde encontraria o homem aquela segurança reli giosa em face dos poderes
destrutivos que incessantemente ameaçavam a sua vida? Era uma época de experiência e fomentação
de movimentos antagônicos. Promessas cativantes emanavam das religiões orientais, cheias de
mistérios, fundadas num certo tipo de magia que induzia uma profunda experiência religiosa, descrita
como "união com o deus" da religião, fosse Ísis ou Cibele, Osiris ou Dionísio. Assim, uma religião se
confundia com outra. A busca de uma segurança, pretendida através da aceitação de várias formas de
adoração, convidava os pensadores a sugerir um Pan-Theos, um deus que incluiria todo e qualquer
deus, uma idéia não muito distante dos filósofos religiosos estóicos. Na iniciação de Lúcio no mistério de
Ísis, vê-se que Diana, Vênus, Astarte e Minerva eram todos nomes distintos de uma única deusa. O
estoicismo queria aliar a filosofia do ocidente à religião do oriente, como o espiritismo e o catolicismo se
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unem na fé popular brasileira. Possidônio nos fornece um exemplo interessante: era cientista, importante
platonista, mas também um místico e astrólogo e acreditava firmemente na união com um deus.
O Problema Fundamental
Depois de terem ouvido e crido no evangelho salvador, como foi que os colossenses se sentiram
atraídos por conceitos tão inferiores? Convém observar que o desafio surgiu da luta humana contra o
poder do mal e do azar. Como se pode-ria admitir a realidade de um Deus Criador, todo-poderoso,
onisciente e bom, que permitisse o sofrimento no seu universo? Os gnósticos propuseram a solução da
separação, quase infinita em distância, do Deus bom, de um lado; e do mun do material, de outro. O
homem, pelo conhecimento (gnosis, isto é, conhecimento esotérico) e acertada adoração, poderia
influenciar os poderes angelicais e demoníacos que dominavam o espaço entre Deus e o mundo. Com
muito sacrifício se propunha uma caminhada intelectual especulativa do nível material para o espiritual.
Os gnósticos não achavam necessário negar o poder de Cristo para salvar os homens do
pecado, mas criam que o sofrimento e a morte de Jesus mostravam inconfundivelmente que ele mesmo
fora vítima do azar, condenado a sofrer um caprichoso fatalismo do mundo material. Assim vieram apoiar
uma teologia que, por um lado, era ascética, de privação do material para se elevar e escapar; e que,
de outro, defendia a posição antinomianista, que consistia em comer, beber e esquecer-se nas orgias
sexuais, já que o ser humano estaria desesperadamente envolvido no mundo material (veja Ap 2: 14 e
a doutrina de Balaão).
A Reação de Paulo
Diante deste quadro, que lhe fora pintado por Epafras, Paulo não fica inerte. O apóstolo
desembainha a sua espada contra toda essa sutileza filosófica e escreve a carta aos Colossenses.
Como veremos, ele emprega quatro métodos em sua luta:
(1) Advertência: "Cuidado que ninguém vos venha a enredar com sua filosofia e vãs
sutilezas... " (2: 8). Não pode haver um casamento entre a verdade evangélica e as mentiras inventadas
por mentes não iluminadas pelo Espírito de Deus.
(2) Usa os termos chaves dos hereges contra as suas próprias doutrinas. Exemplos temos
em palavras tais como, "plenitude" (do grego: plerõma, que aparece dez vezes em Colossenses),
"conhecimento pleno" (grego:Epignõsis) e mistério (grego: mystérion).
(3) Dá à história o seu devido lugar, como percebemos nos pretéritos repetidos, ao destacar
o que realmente aconteceu nos eventos da morte, ressurreição e entronização de Jesus Cristo.
Exalta a Cristo, o Filho de Deus, que se tornou carne por nós, homens. Afirma que ele agora
preenche muito mais do que os gnósticos esperavam dos poderes angelicais; e enfatiza que Cristo, o
Senhor, está sobre todos esses poderes. Assim Jesus Cristo, o verdadeiro mediador, dá acesso ao
Deus único. Enquanto o gnosticismo colocou a matéria em oposição a Deus, a encarnação traz o Deus
transcendente para dentro da nossa humanidade. Não é a matéria, em oposição a Deus, o antagonismo
fundamental; mas ela é o meio pelo qual Deus se revela no Corpo de Cristo. Não é a matéria o
obstáculo ao progresso, mas o veículo pelo qual Deus nos salva por meio da cruz e do túmulo vazio.
Em síntese, Paulo nos mostra, em Colossenses, que é no senhorio de Jesus Cristo que jaz toda
a esperança da humanidade.
O primeiro credo da Igreja, Cristo é o Senhor, é o tema desta carta aos Colossenses. Paulo
destaca o fato de que o cristão não somente aceitou a Cristo como Senhor, num momento de sua vida,
mas deve viver sua vida nesta mesma condição, ou seja, sob o senhorio de Cristo.
"Ora, como recebestes a Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele. . . " (2: 6).
Vejamos a seguir como este tema é desenvolvido nesta belíssima obra de arte, escrita há
quase dois milênios, mas ainda atualíssima na sua abordagem da verdade libertadora do Evangelho.
1- O ESCRITOR, OS DESTINATÁRIOS E A SAUDAÇÃO INICIAL
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3 "Damos sempre graças a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, quando oramos por vós, 4
desde que ouvimos da vossa fé em Cristo Jesus, e do amor que tendes para com todos os santos; 5 por
causa da esperança que vos está preservada nos céus, da qual antes ouvistes pela palavra da verdade do
evangelho, 6 que chegou até vós; como também em todo o mundo está produzindo fruto e crescendo, tal
acontece entre vós, desde o dia em que ouvistes e entendestes a graça de Deus na verdade; 7 segundo
fostes instruídos por Epafras, nosso amado conservo, e, quanto a vós outros, fiel ministro de Cristo,8 o qual
também nos relatou do vosso amor no Espírito."
Fé e Amor
Apesar de nunca ter tido o privilégio de conhecê-los pessoalmente, Paulo amava os novos
convertidos que compunham a pequena comunidade cristã de Colossos. Esse amor, ele o expressava
dando constantemente graças por eles ao Pai de Jesus Cristo, e fazendo petições em favor daqueles que
criam no Senhor (Cf. 1:12; 2: 6; 3:15, 17).
O que motivou o apóstolo à oração foi a notícia da fé em Cristo, sinal do poder que operava nos
colossenses a convicção da verdade do evangelho, levando-os a se compro-meterem inteiramente com o
senhorio de Cristo. Uma fé que se restringe a apenas crença ou assentimento não pode reivindicar o direito
de ser chamada "fé", no sentido bíblico. A fé sem compromisso ou obediência não passa de uma ilusão.
A conseqüência inevitável de uma fé comprometida é o florescimento do amor fraternal para com
todos os santos (v. 4; veja também I Pe 1: 22). Dentro do único corpo de Cristo é impossível não haver
auxílio mútuo, mesmo quando os irmãos estão geograficamente separados (como era o caso de Paulo,
distante dos colossenses a mais de 1. 500 quilômetros). A única explicação para esse amor é a operação
do Espírito Santo, como o evidencia a frase "amor no Espírito" (v. 8).
A fé e o amor dos colossenses fundamentavam-se na esperança (v. 5) despertada nos corações
daqueles que eventualmente viriam a crer em Cristo. Essa esperança os fez voltarem os olhos dos seus
corações para o céu, onde estava o Senhor ressurreto, bem como para a herança de vida que abrangeria
todos os benefícios e alegrias incontaminados do Paraíso. Convém atentarmos para o fato de que a
esperança precede a fé e esta, o amor. Não nos devemos basear nisto para evangelizarmos os não-
cristãos desiludindo-os em relação a este mundo e incentivando-os a almejarem um mundo perfeito "onde
habita justiça"? (Cf. Rm 8: 24).
Esse trio de virtudes - fé, amor e esperança - que os colossenses compartilhavam, confirmou, para
Paulo, a operada graça do Espírito Santo nas suas vidas. Mas se indagássemos sobre a dinâmica dessa
intervenção de Deus, que trans-forma pecadores em santos, o apóstolo apontaria para o evangelho. A boa
nova refere-se àquilo que Deus fez historicamente em Cristo; o evangelho, de igual forma, pode ser deno-
minado "palavra da verdade". Essa mensagem original, anteriormente ouvida pelos colossenses por
intermédio de Epafras, tinha que ser contrastada com uma nova versão de "boas novas", distorcida por
astutas especulações humanas. Por isso Paulo os faz lembrar que a mensagem pura eles a ouviram antes
(2: 6; note a palavra "recebestes", no passado).
O Evangelho
Consideremos como o evangelho é descrito aqui:
Em primeiro lugar, é uma mensagem que consiste verdade. Logos, o termo escolhido por Paulo, e
que em português se traduz por palavra, diz respeito à lógica, razão e mensagem persuasiva por não ser
contraditória. É também o título atribuído por João a Jesus no seu evangelho (Jo 1: 1,14). Assim, o
evangelho resume-se essencialmente na verdade que nos revela quem é Jesus Cristo e o que ele fez por
nós em sua vida, morte, ressurreição e exaltação.
Segundo, percebe-se que esta mensagem de Deus universal em seu escopo: ". . . chegou até vós,
como também em todo o mundo está . . . " (v. 6). Tanto o gnosticismo como o judaísmo se restringiram,
necessariamente, a uns poucos indivíduos que estavam em condições de se encaixar no sistema. O
evangelho, por sua vez, oferece a todos, indistintamente, a sua maravilhosa salvação.
Terceiro, o evangelho tem a qualidade fundamental de vida. Por isso ele frutifica - e esta palavra
frisa o seu poder penetrante (Hb 4: 12) e transformador. O texto ainda adiciona que esse evangelho está
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crescendo, tanto entre os colossenses como em toda e qualquer parte do mundo. A ênfase é dada à
dinâmica extensiva do evangelho, estendendo-se em direção a todos, sem acepção de raça, língua, cultura
ou geografia. Como disse Crisóstomo: "O crescimento externo acompanha os passos da sua energia
interna." Essa energia espiritual existe em virtude do senhorio de Cristo, ativo em sua Igreja onde quer que
esta se encontre, na Ásia de então ou no Brasil de hoje.
Quarto, Paulo dá-nos a conhecer que o evangelho é nada menos que a graça de Deus em verdade
(v. 6b). Evidentemente, a graça se coloca em oposição às obras ou ordenanças (2: 14) promulgadas pelos
falsos mestres. Estes exigiam do homem mérito suficiente para obrigar Deus a salvá-los Mas a graça
declara justo o pecador, mesmo sem mérito algum, através da expiação dos seus pecados pelo sangue
remidor de Cristo (v. 14).
Quinto, notamos que o evangelho não funciona afastado do coração humano. Paulo emprega três
termos para mostrar a absoluta necessidade de que a mensagem penetre os ouvidos. (ouvistes, v. 6b) e o
entendimento (conhecestes, de "epignote", que fala de um conhecimento com convicção), vindo então o
discipulado (aprendestes, verbo cuja raiz é a mesma que a de ser discipulado). Sem o envolvimento da
mente e da vontade do homem, o evangelho não tem condições de crescer e frutificar. A comunicação de
tão valiosa mensagem, portanto, deve ser dada muita atenção.
Finalmente, o evangelho precisa de um portador, alguém que o comunique. Entre os colossenses,
era Epafras, "um dos vossos" (4: 12), quem exercia esse dom de evange lista (Ef 4: 11). As qualidades
deste obreiro, semeador do evangelho, não devem passar despercebidas: sendo um "escravo junto com
Paulo" (do grego sundoulos), entende-se que a sua motivação e energias foram colocadas A. plena dis -
posição do seu Senhor Jesus Cristo. Também é referido como amado, o que indica a amizade que o unia a
Paulo e seus companheiros. Epafras, diz Colossenses 4: 12, era um servo fiel (diakonos); isto destaca a
lealdade e fidelidade com que prestava a sua "diaconia" ou serviço, representando a igreja de Colossos
junto a Paulo, "esforçando-se sobremaneira,continuamente, por vós nas orações" (4: 12). A frase "fostes
instruídos" (1: 7) revela a qualidade de pastor-mestre que discipulou os cristãos, conforme o sugere o
original dessa expressão. Epafras também compartilhava a prisão com Paulo, segundo entendemos a partir
de Filemom 23.
O quadro inteiro nos dá a impressão de um jovem pastor, cheio de amor por Deus, por seus irmãos
e pelos perdidos do Vale do Lico, já que foi ele, provavelmente, quem fundou não só a igreja de Colossos
como também as de Laodicéia e Hierápolis (cidades localizadas no Vale e bem próximas umas das outras).
Oxalá fôssemos insistentes diante de Deus, pedindo-lhe levantar, nas igrejas brasileiras, muitos servos
como Epafras!
Em resumo, Paulo agradece incessantemente pelos irmãos colossenses, pela manifestação da fé,
amor e esperança que os caracterizavam. O evangelho é o meio usado por Deus para produzir o fruto, que
se expandia e tinha sucesso em todo lugar. Mas Deus não dispensa homens como Epafras, plenamente
dispostos a pregar, discipular e até mesmo sofrer por amor a Cristo.
maturidade em Cristo.
Ao analisarmos o pedido de Paulo, assim expresso: "... que transbordeis de pleno conhecimento da
vontade de Deus" (v. 9), concluímos que esta é a necessidade básica para todo crescimento espiritual.
Sem conhecer a vontade de Deus para nós (estando ela revelada na sua Palavra), como poderemos atingir
a "sabedoria e entendimento espiritual" que nos possibilitarão viver de maneira digna do nosso Senhor?
O termo transbordeis traduz a mesma palavra no pretérito (aoristo) que aparece no presente em
Efésios 5:18. Quando todo o espaço das nossas mentes for preenchido até transbordar com o
conhecimento da vontade do Senhor, já não teremos muito interesse em satisfazer egoisticamente a nossa
própria vontade. A voz passiva, no original, indica que não é outro senão o Espírito de Deus que grava a lei
de Deus no coração do crente, conforme prometido séculos antes em Ezequiel 11:19, 20 e 36:25-27. Tudo
parte deste princípio, dando Deus aos seus filhos uma gloriosa apreciação da sua vontade divina, bem
como a motivação para fazê-la. É bem mais do que um farisaísmo árido, que procura cumprir
legalisticamente as ordens de Deus. Não! Não! Seria uma reação da pessoa inteira (vontade, ambição e
intelecto) diante de Deus, que se revelou em Cristo encamado, vivendo este em plena submissão ao Pai.
Sabedoria e Entendimento (v. 9)
Os termos sabedoria e entendimento espiritual indicam as qualificações da vontade de Deus, ou os
critérios pelos quais distinguimos essa vontade das atraentes e convincentes "vontades" contrárias àquilo
que Deus quer.
Sabedoria fala de revelação divina, ao contrário de soluções intelectuais e humanas. Na literatura
sapiencial (Provérbios, Jó, Eclesiastes) refere-se ao relacionamento humano e 6 responsabilidade.
Entendimento espiritual (isto é, concedida pelo Espírito) diz-nos da aplicação pormenorizada da
revelação que Deus nos deu na sua Palavra e na vida de Cristo (I Co 1: 30). Convém lembrar a importância
que tem, para o cristão verdadeiro, o possuir a mente de Cristo (Fp 2:5ss).
As Conseqüências de se Conhecer A Vontade de Deus
O propósito de que o cristão transborde (v. 10) de pleno conhecimento da vontade de Deus é que
ele ande de maneira digna do Senhor. Modo digno traduz uma palavra relacionada com a balança.
Imaginemos as atitudes, palavras e ações de Deus colocadas num dos pratos de uma balança e as nossas
empilhadas no outro prato. Se a nossa vida, como cristãos, deixar de corresponder A. vida do Senhor,
estaremos andando indignamente. Vemos aí a importância de que a nossa intercessão mútua focalize a
necessidade de, sob a ação do Espírito Santo, transbordarmos do conhecimento da vontade de Deus.
Daí, o apóstolo aponta cinco conseqüências de uma conduta cristã digna do Senhor:
1) Agradando a Deus. Deve ficar bem claro para o cristão que "viver para o seu inteiro agrado" é,
em síntese, o único propósito para o qual vivemos. Tornou-se bastante conhecida a primeira pergunta do
Catecismo de Westminster: "Qual é a razão principal pela qual o homem existe?" Resposta: "Para glorificar
a Deus e deleitar-se nele para sempre".
2) Frutificando em toda boa obra é a segunda conseqüência. Não se trata de ação ou obra alguma
que o homem possa efetuar para conseguir mérito aos olhos de Deus, mas, sim, atos tão cheios de amor
que quem os observa não pode explicá-los sem recorrer à operação de Deus na vida do cristão. Por isso
Jesus recomendou que fizéssemos boas obras que redundassem em glória para Deus por parte dos
homens (Mt 5:16).
3) Crescendo no pleno conhecimento de Deus: isto só ocorre quando o cristão vive santa e
piamente pelo poder de Deus. No v. 9, Paulo recomenda aos seus leitores que transbordem do pleno
conhecimento da vontade divina. E, logo a seguir, notamos que aproximar-se de Deus de forma mais
íntima e pessoal produz o mesmo resultado que o de obedecer à vontade dele na vida prática.
4) Sendo fortalecidos com todo o poder de Deus. Esse poder (dunamis) é comparável (pelo
significado da palavra "segundo") à força dominadora que tem a glória de Deus, cada vez que se
manifesta. Imaginemos o terror dos guardas do túmulo de Jesus quando a pedra foi removida e Cristo
ressurgiu, radiante, superando o poder da morte e a precaução dos romanos! Quando Isaías entrou no
templo, a glória de Deus encheu a casa e o profeta caiu em si, arrependido e disposto a servir ao Senhor
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onde e como este ordenasse. O termo força (kratos) significa imponência de alguém como um imperador
que, pela majestade da sua presença e reconhecimento do seu poder, provoca uma total submissão à sua
vontade.
Esse crescimento no pleno conhecimento de Deus ocorre em virtude de algumas atitudes, aqui
indicadas por duas palavras: "... em toda a perseverança e longanimidade" (v. 11). A primeira (hupomonê)
é freqüentemente traduzida por "paciência", no sentido oposto ao de covardia ou disposição de tentar
escapar de uma situação difícil. A segunda palavra (makrothumia) corresponde àquela paciência que
contrasta com a ira ou hostilidade; expressa bem a atividade passiva de quem aceita de bom grado uma
aflição ou in-justiça, sem ficar revoltado. Bem disse Tertuliano, antigo pai da Igreja: "A fé é a paciência com
a lâmpada acesa".
A terceira atitude característica encontra-se na referência a "alegria". Não é difícil perceber que
tudo que Paulo almeja para os colossenses era experimentado por ele mesmo. Na sua carta aos filipenses,
o termo "alegria" aparece, de uma forma ou de outra, num total de dezesseis vezes, indi cando a forma
como Deus lhe respondia as orações na prisão.
5) A oração é concluída com adoração (N. 12): "Dando graças ao Pai que vos fez idôneos" para
herdar tudo que ele tem para os seus filhos. A gratidão e o louvor são a conseqüência natural de uma
conduta digna do Senhor. Estando idôneos ou capacitados, a nossa mente se abre para toda a obra
redentora de Cristo, mediante a qual Deus nos deu as condições para herdarmos o céu. Aqueles que
estavam, anteriormente, alienados e sem Cristo, os que eram "estranhos às alianças da promessa, não
tendo esperança e sem Deus no mundo" (Ef 2: 12), agora passaram a ter direito à escri tura do paraíso,
lavrada por Jesus Cristo, favorecendo-lhes em tudo.
Em síntese, Paulo fundamenta a sua oração pelos cristãos de Colossos demonstrando a realidade
e o poder do evangelho. Roga a Deus que eles conheçam plenamente a sua vontade, a fim de poderem
viver segundo o inteiro agrado do Senhor. Eis o modelo apostólico de intercessão!
Perguntas para Meditação :
Tendo em mente o que foi exposto, o leitor poderá fazer a si próprio as seguintes perguntas:
1. Será que os irmãos que me conhecem bem vêem a fé, a esperança e o amor como
características da minha vida cristã?
2. Estou sempre dando graças por um determinado filho de Deus? Será que há algum cristão que
sempre agradece a Deus por mim?
3. Quais são as maiores diferenças entre as minhas orações e esta de Paulo, em Colossenses 1:
9-12? 0 que me levará a orar mais segundo o padrão bíblico?
Esta afirmação ressalta a verdade da primazia de Jesus Cristo como o "primeiro gerado", o
herdeiro de tudo. Como Senhor e também autêntico representante e substituto do Pai, a ele cabem todos
os direitos, tanto na área civil quanto na religiosa. Na antiguidade, o primogênito também exercia soberania
na casa (comp. Gn 25: 31; 27: 29, 37; 49: 3). Assim, constatamos que o nosso soberano Senhor é o
herdeiro de tudo quanto já foi criado; e, como tal, possui direitos irrevogáveis para possuir e exercer
absoluta autoridade sobre a criação, quer sejam os céus, quer a terra ou tudo que neles há (cf. Sl 24: 1).
A primogenitura indica também o privilégio de ser eleito ou escolhido para ocupar a mais alta
posição de honra. Neste sentido, Israel foi constituído primogênito de Deus (Ex 4: 22, 23), que assim
declarou o seu amor para com o povo escolhido. Da mesma forma, o Pai se manifestou na ocasião do
batismo de Cristo (Lc 3: 22). Os privilégios decorrentes de se receber o título de primogenitura são
encontrados no Salmo 89: 27, onde o divino descendente de Davi é assim descrito: "Fá-lo-ei, por isso, meu
primogênito, o mais elevado entre os reis da terra" (comp Ap 1: 5). Não obstante os argumentos dos
arianos do Século IV, que afirmaram ser Jesus parte da criação, é muito claro que ele foi co-agente e já era
antes de tudo o que Deus fez (vs. 16, 17). Em Romanos 8: 29 há mais um sentido no qual o Primogênito,
Cristo, está relacionado com a Igreja, que é constituída por muitos filhos de Deus, irmãos transformados na
imagem do próprio Primogênito. O apóstolo concentra sua atenção num horizonte distante, a partir do
versículo 19 do referido capítulo de Romanos. Toda a criação geme, na ansiedade de presenciar a
restauração de todas as coisas, no glorioso dia em que o Senhor da Criação tomará posse do novo céu e
da nova terra. Nesse mesmo dia, os filhos de Deus receberão corpos reconstituídos, como o de Cristo,
declarado as primícias da ressurreição (I Co 15: 23).
Por que o Senhor foi exaltado à primogenitura? Três verdades fundamentam o pensamento de
Paulo com respeito à relação entre a Criação e Jesus Cristo. A palavra "pois" (do grego hoti) mostra que a
posição atribuída ao Senhor é conseqüência do que Paulo apresenta logo em seguida:
1) Nele, todas as coisas foram criadas (v. 16).
Portanto, ele é a fonte originadora de tudo que existe no céu e na terra; tudo que o olho humano é
capaz de perceber, bem como o invisível ou que está fora do alcance dos sentidos humanos, tudo se
originou no plano e no poder do Senhor. Tronos e senhorios, tanto de anjos quanto de ho mens, príncipes e
autoridades do mundo sobrenatural, todos emanaram do seu poder criador. "Cristo, ele próprio, enche o
universo da maior profundeza até a maior altura com Deus e faz da alma humana o seu santo dos santos."
Tais implicações não devem ter passado desapercebidas aos colossenses, que consideravam tão
atraentes as reivindicações dos mestres gnósticos acerca dos poderes invisíveis dos ares. Paulo
simplesmente derruba qualquer busca de meios e caminhos para influenciar os "soberanos" invisíveis do
universo, apresentando a inabalável verdade: "Cristo é senhor, herdeiro e primogênito sobre tudo e sobre
qualquer inteligência desencarnada". Buscá-los a única forma de vencer todas as forças opositoras na vida!
2) Tudo foi criado por meio dele (v.16).
Cristo é o agente do poder criador de Deus. Se é que tudo que existe passou pelas mãos dele,
então podemos ter absoluta confiança no seu controle providencial. Para ele não há surpresas e nunca
poderia encarar como tal os nossos incidentes e "por acasos", já que nada do que existe nem qualquer
ocorrência pode ser separado da sua divina vontade (veja Jo 1:3eHb2:8).
3) Tudo foi criado para ele (v. 16).
Cristo, aqui, é-nos apresentado como o alvo da criação. Todas as coisas feitas e moldadas pelas
sua mãos, todas as funções da variedade infinita do nosso universo - tudo tem como única finalidade
render ao Senhor todo o louvor possível! Desde os bilhões de sóis que compõem as galáxias espalhadas
pelos céus, até os micróbios unicelulares, tudo rende e ainda prestará dívidas de louvor, numa sinfonia que
proclama eternamente que o Senhor é digno de receber toda a honra, glória e adoração (Sl 19: 1-4; 5:11-
14).
A Primazia de Cristo
Após declarar a razão por que Cristo merece ser o primogênito de toda a criação, no v. 17 Paulo
passa a apresentar duas verdades que apóiam a absoluta primazia de Jesus.
Exposição Bíblica de Colossenses 11
Russel Shedd
Vida Nova
Em primeiro lugar, "Ele é antes de todas as coisas". Quando Jesus surpreendeu os judeus, ao
declarar que já existia antes de Abraão (Jo 8:58), lançou a base para o que Paulo diz aos colossenses
aqui. Além disso, Jesus empregava a frase "Eu sou" (no grego, ego eimi), colocando-se a si mesmo acima
do tempo, no sentido em que os homens o vivem; ele era sem início e sem fim, "o mesmo ontem, hoje e
para sempre" (Hb 7: 3; 13: 7). No pensamento antigo, quem vem antes merece o primeiro lugar.
Confrontamo-nos, assim, com a prioridade de Jesus, evidenciada no fato de que, já que todas as coisas lhe
são posteriores, logo ele é superior a tudo que existe.
Considere-se, em segundo lugar, o fato de Cristo integrar todo o universo. "Nele tudo subsiste"
significa que ele é o centro de coerência ou coesão. Sendo ele o segredo da unidade, que interliga e dá
simetria a todas as leis da física ou da química, da biologia como também da astronomia, os sistemas de
leis que regem todo o universo são manifestações para dar lugar aos novos céus e à nova terra. Talvez
assim possamos entender melhor a declaração do v. 20, que aponta a cruz como o veículo de
reconciliação de "todas as coisas". Os rabinos judaicos acreditavam- firmemente que a primeira criação
tinha sido o modelo ou o tipo da nova criação. A redenção não se efetivou num vácuo, mas no centro da
História e do universo. Deus encara com tanta seriedade a ordem própria do mundo por ele estabelecido,
que sacrificou seu próprio Filho a fim de salvar o mundo sem desprezar essa ordem. A nova criação vem a
ser, portanto, o "não" de Deus aos problemas deste mundo, como também o seu "sim " para o propósito
original.
Na época de Paulo (e em parte também na nossa), o homem não se preocupava tanto com seus
problemas pessoais, seu pecado ou retidão, mas, sim, com os problemas do mundo : a falta de significado
na vida, a ameaça do azar, a tirania desoladora das forças que controlavam os eventos terrestres e as
estrelas que supostamente determinavam toda mudança na sorte dos homens. Mas Paulo teve uni en -
contro com Cristo e, ao conhecê-lo, descobriu a solução para todo esse quebra-cabeça. A resposta estava
enquadrada na soberania de Cristo: não uma verdade teórica ou apenas religiosa mas, sim, para o dia-a-
dia. Assim, ao enfrentar o sofre-mento, perseguição ou qualquer problema, o apóstolo passou a encará-los
como manifestações da graça de Cristo, que atuava em tudo (veja II Co 12: 7-10).
O Senhorio de Jesus Cristo Sobre A Nova Criação
Em relação à Igreja, encontram-se nos vs. 18 e 19 quatro afirmações de amplo significado:
O Cabeça do Corpo
Além de ser o titular do governo sobre a criação, Jesus Cristo foi exaltado à posição de Cabeça do
corpo, figura escolhida por Paulo para salientar a relação orgânica existente entre Cristo e a Igreja
universal. Assim como Eva foi criada do corpo de Adão, também a Igreja surgiu pela encarnação do único
Filho de Deus, o qual, na sua morte e ressurreição, se ofereceu para criá-la (Jo 2: 19-21). Ao se dizer que o
Senhor é "a cabeça", está implícita a sua inseparabilidade do corpo, ao mesmo tempo que se exdui a sua
identidade total com esse corpo. Os benefícios da redenção fluem da cabeça para o corpo, mas este não
tem o direito de reivindicar soberania sobre o mundo, nem de exercer um espírito triun falista. Cristo, e não
a Igreja (e muito menos a sua hierarquia), é o Senhor. Cada vez que a Igreja tem usurpado a posição
soberana de Cristo sobre o mundo, foram notados sinais, não do seu caráter celestial, mas carnais e até
infernais.
O Princípio da Nova Criação
Cristo estabeleceu o esboço da Igreja, assim como os alicerces dão, em princípio, a idéia projetada
de como será o prédio a ser sobre eles edificado. Em Hebreus 12:2, Cristo aparece como o "autor e
consumador da nossa fé". Daí percebemos que ele é o Cabeça por ser o iniciador da nova raça dos salvos.
O Primogênito de Entre Os Mortos
Focalizando a ressurreição (veja também Ap 1: 5), esta frase declara que o Senhor tem o direito de
governar a sua Igreja por ser o Herdeiro, o primeiro e o principal dentre muitos irmãos. Mais ainda, este
versículo ensina que o fato de que "dos mortos a vida por ele começou" (O Novo Testa-mento, versão de
Phillips) implica em ser ele realmente o Senhor de tudo na Igreja. Quando os santos, que compõem seu
corpo, evidentemente lhe desobedecem, estão negando abertamente a finalidade da ressurreição. Deus
Pai o constituiu para exercer pleno domínio sobre os seus "irmãos mais no-vos". No grego, Paulo usou a
Exposição Bíblica de Colossenses 12
Russel Shedd
Vida Nova
palavra "auton" (ele mesmo) dentro da cláusula: "para em todas as coisas (ele mesmo) ter a primazia ". Isto
objetiva enfatizar que somente Jesus Cristo tem o direito de dirigir, e não o pastor ou a congregação; não o
bispo ou mesmo o Papa, mas Cristo, sozinho. Todos estes devem se subordinar ao Cabeça, para servirem
unicamente a ele. E evidente que nem o mundo, nem os demônios ou os anjos rebeldes reconhecem ainda
a primazia de Cristo, mas a sua Igreja deve testemunhar incessantemente essa realidade.
Nele Reside Toda A Plenitude
Uma outra razão pela qual Cristo deve ter a primazia sobre tudo na Igreja surge na frase: "porque
aprouve a Deus que nele residisse toda a plenitude" (v. 19). 0 termo plenitude (plêrõma) denominava, para
os gnósticos, todas as emanações que ocupavam o espaço entre o deus espiritual e o mundo material.
Provavelmente, é neste sentido que Paulo deseja que seus leitores concebam a Cristo, como aquele que
preencheria totalmente qualquer necessidade que eles tivessem de alcançar o Deus verdadeiro. Poderia
indicar também todos os atributos divinos de Cristo (2: 9). Assim, podemos confiar que Cristo supre tudo
que a Igreja necessita para cumprir sua missão ou para enfrentar os poderes do mal.
Cristo, O Reconciliador de Tudo
Tendo apresentado a pessoa de Jesus Cristo, Paulo volta a discutir o seu direito de primazia em
decorrência da sua obra (vs. 20-22): "Havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele
reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus ".
A obra efetuada por Cristo proporciona a visão dos benefícios que acompanharão os salvos no dia
do encontro.
A Paz Entre Pecadores e Deus
Convém lembrar a rica herança que tem a palavra "paz" nas suas raízes hebraicas: o Shalom de
Deus. Não somente refere-se ao cancelamento de inimizade, como também à prosperidade que Deus
concede aos seu amigos (Abraão, Davi, ... ). Esta relação de amizade foi ganha na morte de Cristo na cruz.
Seu sangue homologou a Nova Aliança de paz, um tratado gracioso originado inteiramente nos propósitos
e planos de Deus. E Paulo novamente nos adverte que o preço que pagou essa paz foi o sangue sacrificial
vertido na cruz.
Reconciliação
Reconciliação reflete duas palavras hebraicas que expressam a remoção da inimizade, criando, por
um lado, uma atmosfera agradável e, por outro, acalmando atitudes hostis. Objetivamente, no sacrifício
expiatório e substitutivo de Cristo Deus removeu a inimizade criada pelo pecado humano, apaziguando
essa rebelião.
Ao notar a condição em que estavam os colossenses quando foram alcançados pelo evangelho,
Paulo aponta para a situação dos gentios, tão necessitados de reconciliação. Eram estranhos, isto é,
pertenciam literalmente a um outro rei ou dono, que os hostilizara com Deus. Eram alienados, cidadãos de
uma outra potência que os mobilizara numa rebelião contra a autoridade de Deus. A expressão no
entendimento (v. 21) indica que essa alienação e hostilidade contra Deus eram o resultado de uma
persuasão de Satanás, que levara suas mentes e imaginação a concluírem que as obras malignas estavam
certas. Ideologias como o marxismo, ou mesmo a conversa informal de uma turminha de jovens numa
grande cidade, são exemplos de como a mente humana concorda com a maldade e racionaliza qualquer
ação repreensível praticada no corpo.
Ao outrora do passado (v. 21) segue-se o hoje presente (v. 22), caracterizado pela reconciliação
dentro do corpo de Jesus, por ele oferecido voluntariamente na cruz. O corpo da sua carne ferida pelos
cravos mortíferos possibilitou uma nova harmonia com Deus. E são as testemunhas vivas dessa harmonia
que compõem o novo povo de Deus, a Igreja.
A segunda parte do versículo 22 resume o tríplice propósito de Deus ao oferecer o "Filho do seu
amor". Ele quer apresentar a si mesmo, num dia futuro, os membros do Corpo de Cristo, que deverão ter
as seguintes características:
Santos: Esses pecadores, que antes serviam prazerosamente a Satanás, são agora santos,
inteiramente consagrados e separados para Deus. Ele os santificou pela reconciliação e amizade plenas,
Exposição Bíblica de Colossenses 13
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Vida Nova
tal qual o filho pródigo foi santificado pela restaurada harmonia com seu pai (Lc 15: 11-32).
Inculpáveis: No grego, usava-se a palavra "amomos" para descrever animais limpos, imaculados e,
conseqüentemente, aceitáveis para o sacrifício a Deus. Esta mesma palavra é usada por Pedro para
comunicar a qualidade do "cordeiro (Cristo) sem defeito", absolutamente aceitável como sacrifício para a
nossa remissão (I Pe 1: 19).
Irrepreensíveis: Isto é, sem possibilidade de ser alvo de uma acusação efetiva. Não haverá cheiro
de escândalo nem crítica válida que o inimigo das almas possa lançar contra os convidados para as bodas
do Cordeiro. Os salvos estarão absolutamente imunes ao castigo que os seus pecados merecem. Toda
repreensão cairá sobre o Filho perfeito (Isa 53:6).
As Condições Providenciadas por Deus
No versículo 23 vemos essas importantes condições, que definem os que realmente podem ser
enquadrados no rol dos reconciliados:
Firmes na Fé
"Se é que permaneceis na fé " parece ser uma condição para gozarmos todos benefícios oferecidos,
em princípio, na morte reconciliadora do Senhor Jesus. E preciso preservar na fé até o fim (comp. Mt 24:
13). Esta perseverança na comunhão de Cristo é a única base válida para a segurança da salvação (Jo 15:
2-6). 0 cristão que se afasta daquele que é o único capaz de salvar não deve pensar que a fé efêmera do
passado lhe garantirá automaticamente o futuro.
Alicerçados na Rocha
Alicerçados mostra que, sem que a nossa confiança esteja fundamentada na rocha, não há base
para presumirmos que de fato temos a segurança na salvação. O homem que construiu a sua casa sobre a
areia necessitava deste fundamento imprescindível (Mt 7: 24-27; Lc 6:48, 49). Cristo é o único fundamento
(I Co 3: 11) e a Rocha eterna. Quem nele confia não será envergonhado.
Firmes
"Firmes", juntamente com a palavra "inabaláveis" (I Co 15: 58), mostra a constância e a imutável
firmeza que são condições para se esperar essa apresentação gloriosa, já vista no v. 22.
"
Não vos deixando afastar da esperança do evangelho."
Aqui o apóstolo emprega a figura dos estragos decorrentes de um terremoto, capaz de remover um
edifício do seu fundamento, destruindo-o. Durante o reinado do impera-dor Tibério (14-37 A. D.), doze
cidades da Ásia Menor foram arrasadas. No ano 60, segundo Tácito (para Eusébio, em 64 ou 65), um
fortíssimo terremoto abalou Laodicéia, atingindo também Colossos, cidade vizinha. Se é que isto acabava
de acontecer, entende-se que efeito causaria nos cristãos colossenses a advertência de Paulo quanto a
não se deixarem levar por ensinamentos falsos que viessem a destruir a sua esperança no evangelho.
Esperançosos no Evangelho
Segue-se a condição de esperarem no evangelho que já ouviram (v. 23b). O evangelho não
significa boas novas apenas para alguns, mas para toda a humanidade, que tem ple nos direitos a ouvi-lo.
Toda barreira de raça, cor, geografia, idade, língua ou tribo foi tirada, em princípio, quando Jesus afirmou
que o evangelho seria pregado por todo o mundo, antes do fim (Mt 24: 14). Por isso ele deu aos seus
discípulos a missão de levar o evangelho a todas as nações (Mt 28: 20) e prometeu o poder incontido do
Espírito para dar sucesso a esse empreendimento mundial de testemunhar dele (At 1: 8). Ao declarar que
"foi pregado a toda criatura debaixo do céu", Paulo queria dizer que o evangelho já se espalhara aos
grandes centros do império, tornando-se acessível a todos.
Desse evangelho é que Paulo foi apontado ministro (do grego diakonos, termo ainda muito geral,
na sua acepção neotestamentária). Sobre esse ministério, ele discorrerá nos versículos seguintes.
não quem jamais pecou (veja Fp 3: 12-15). Um cristão adulto, em contraste com o imaturo (I Co 3: 1,2; Hb
5: 12-14), pode servir ao Senhor, conduzindo outros à maturidade. A criança na fé fica na dependência da
ajuda e sustento do cristão mais maduro, sendo incapacitada de continuar sem esse apoio. Neste curto
v.28, Paulo fala em "todo homem" três vezes, querendo mostrar com isso o quanto lhe desgostara a atitude
dos gnósticos de Colossos, não reconhecendo a universalidade do evangelho. Eles queriam "aperfeiçoar"
somente alguns, uma elite; mas o evangelho, por natureza, tem que ser para todos. Todos merecem ouvir.
Um Ministério de Trabalho (1:29 a 2: 4)
0 apóstolo não apenas sofre (v. 24) e desempenha sua mordomia (vs. 25 - 28); ele trabalha.
"Também me afadigo, esforçando-me (agonizõ) o mais possível, segundo a sua eficácia (energeia) que
opera eficientemente (energoumenên... en dunamei)". Se compararmos este versículo com Filipenses 2:
12, 13, verificaremos que o esforço humano pode abrir caminho para a manifestação do poder divino. A
Paulo não importava desgastar o seu corpo e ficar bem cansado ("me afadigo" traduz bem o grego "kopioõ
", com o sentido de trabalhar tanto até se cansar muito). O seu esforço, porém, não se realizava na "carne",
mas no Espírito. Provavelmente ele estava falando da oração, já que na prisão não lhe era possível gastar
muita energia física em favor dos colossenses.
Só Paulo, no Novo Testamento, emprega nove vezes o vocábulo aqui traduzido por "eficácia" (veja
Ef 1: 19; 3: 7; 4: 16; Fp 3: 21). A nossa palavra "energia" vem do grego, mas o original enfatiza a eficiência
da energia usada. Muitas vezes sentimos cansaço no trabalho de Deus sem ver um resultado
correspondente. Por quê? Não se explicaria este fenômeno pelo esforço carnal em vez da oração do justo,
que "muito pode, por sua eficácia" (Tg 5: 16)? 0 elemento chave é a fé, sem a qual não é possível agradar
a Deus, e muito menos efetivar o seu serviço espiritual.
Paulo prossegue, em 2: 1, expondo a importância da oração na sua estratégia de batalha. Não
queria que os cristãos de Colossos e Laodicéia pensassem que ele, por não conhecê-los pessoalmente,
deixava de lutar por eles de uma for-ma absorvente, concentrando todo o seu ser nessa "agonia" (grego:
agõna. Compare com Fp 1:30 e I Tm 6: 12). A semelhança do conflito de Jesus no Getsêmani, o apóstolo
se empenhou na batalha pela salvação das almas que Cristo comprara com o seu precioso sangue. Essa
luta de joelhos, na prisão de Roma, vencia as forças satânicas que avançavam contra os mal protegidos
cristãos da Ásia. Combate idêntico ele já travara outrora em favor dos gálatas e coríntios, que também
enfrentaram o perigo de serem enganados por um falso evangelho.
O que Paulo pedia em favor do colossenses?
1) Encorajamento para os seus corações (v.2) "Confortados" traduz a palavra grega parakaleõ, que
tem o sentido de exortar, encorajar, animar. Corações desanimados geram um pessimismo na Igreja. A
depressão espiritual não deixa de ser o campo mais propício para o inimigo semear o "joio" doutrinário,
para não dizer o da falta de amor e a desunião. O pedido de que Deus os encoraje condiz com a promessa
do Pai (Jo 14: 16ss, 26; 15:26; 16: 7,13): o Espírito Santo, o Consolador (paraklêtos). Este, sim, atuan do
em resposta às orações, conforta os corações dos santos.
2) Vinculados pelo amor (v. 2)
Além de encorajamento para os seus corações, Paulo pedia que os crentes fossem estreitamente
ligados pelos vínculos do amor. Esta mesma palavra, vinculados, é empregada em 2: 9 para descrever a
maneira como funcionam juntas e ligamentos do nosso corpo, ilustrando assim as relações dinâmicas e
edificantes em toda a Igreja. Quando o povo de Deus se une em amor, pode resultar em encorajamento e
firmeza contra o erro e, sobretudo, orientação para a plena riqueza da convicção trazida pelo entendimento
(v.2). 0 erro doutrinário tem livre acesso à mente que não tem certeza (grego: pieroforia) daquilo em que
crê, justamente por não o entender. Tudo resulta numa compreensão de quem é realmente o Se nhor Jesus
Cristo. Ele é o conteúdo do segredo de Deus. E a humanidade tateia em busca de solução definitiva da
conquista do pecado e do sofrimento, até encontrá-la em Cristo (comp. At 17: 27), pois é nele e na sua
obra redentora que se encontra a salvação.
Em Cristo encontra-se a mina inesgotável de todos os valores da verdadeira sabedoria (sofra) e
conhecimento (epignósin). Mas esta sabedoria não está na superfície, nem este conhecimento é como as
águas do mar para o marinheiro: ambos estão ocultos em Cristo. É preciso buscar, cavar nessa mina, cujos
Exposição Bíblica de Colossenses 17
Russel Shedd
Vida Nova
brilhantes só se desenterram com oração, leitura da Palavra, meditação e espera no Espírito Santo. Em I
Coríntios 1 a 4, Paulo desenvolve o tema da sabedoria, ressaltando esta verdade: a espiritualidade real só
se encontra em Cristo, e este crucificado.
Esses tesouros, sabedoria e conhecimento, como já vimos nos versículos 9 e 10 (Cap. 1), levam-
nos a urna verdadeira penetração no mistério de Deus, isto é, uma integração dentro do propósito divino,
revelado na vinda de Jesus Cristo ao mundo. Devemos saber que o objetivo de Deus Pai ao dar o seu Filho
ao mundo foi produzir muitos filhos semelhantes ao seu Unigênito (Rm 8:29). Quem buscar em Cristo, na
singularidade da sua pessoa e vida, e também no seu ensino, a sabedoria de Deus, encontrá-la-á. Este
seria o galardão prometido a quem se restringir a procurar de fato o ponto de vista divino em sua única
fonte, o tão grande Salvador!
0 objetivo desta ênfase de Paulo era advertir os seus leitores quanto ao perigo do engano (no
original: para, "ao lado de"; logizõ, "raciocinar") através de palavras cativantes ou "argumentos atraentes"
(v. 4). Palavras habilmente utilizadas podem persuadir, assim como um filme de cinema pode iludir. Se não
tivermos critérios bíblicos, como discerniremos a verdade no meio de tantas palavras persuasivas? (Veja At
20:30.)
Um Ministério de União Espiritual (2: 5)
Embora fisicamente separado dos colossenses, Paulo declarou sua presença espiritual com eles
(v. 5): ou pelo seu próprio espírito (imaginando), ou pelo Espírito Santo (revelando), ele presenciava o que
acontecia na Ásia distante. Isto lhe dava ânimo, pois observava, com muita alegria, duas características da
igreja (ele as descreve usando uma terminologia militar). Primeiro, sua boa ordem (grego: taxin, "fileiras
ordeiras de um exército") e, segundo, sua firmeza (stereóma, "linha de frente firme", "falange pronta para
receber o impacto do inimigo, sem recuar") na fé, posta no Senhor.
Assim, neste trecho o apóstolo Paulo nos dá o privilégio de divisar um panorama geral do seu
ministério. Mostra a nós, seus leitores, as vantagens do sofrimento, os valores do esforço e a centralidade
da oração. Tudo isso para proteger uma igreja pequena contra os ataques de um inimigo sobremaneira
esperto e poderoso. Mais uma vez conserva-se no centro a imagem de Jesus Cristo. Foi ele quem inspirou
seu servo a se gastar no amor que o incentivou a desempenhar tão desinteressadamente o seu serviço.
E nós? Seguimos nos seus passos marcantes ou consideramos o preço alto demais? Só a clara
visão de Cristo nos moverá a tal excesso de sacrifício pelos outros!
6- EM CRISTO, O SENHOR
Texto: Colossenses 2: 6 a 154
6 "Ora, como recebestes a Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele, 7 nele radicados e edificados,
e confirmados na fé, tal como fostes instruídos, crescendo em ações de graça. 8 Cui dado que ninguém vos
venha a enredar com sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a tradição dos homens, conforme os rudi -
mentos do mundo, e não segundo Cristo: 9 porquanto nele habita corporalmente toda a plenitude da
Divindade. 10 Também nele estais aperfeiçoados. Ele é o cabeça de todo principado e potestade. 11 Nele
também fostes circuncidados, não por intermédio de mãos, mas no despojamento do corpo da carne, que é
a circuncisão de Cristo; 12 tendo sido sepultados juntamente com ele no batismo, no qual igualmente
fostes ressuscitados mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos. 13 E a vós
outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões, e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida
juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos; 14 tendo cancelado o escrito de dívida, que era
contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-
o na cruz; 15 e, despojando os principados e as potestades, publicamen te os expôs ao desprezo,
triunfando deles na cruz."
Andai Nele!
Até o final de 2: 5, não encontramos qualquer exortação, imperativo ou mandamento explícito. Mas
no v. 6 o apóstolo Paulo muda a maneira de falar. Aqui aparece uma ordem, simples e clara. "Andai nele",
ordena o apóstolo, "tal como recebestes Jesus Cristo, o Senhor"! Ou, em outras palavras: "Portanto, visto
Exposição Bíblica de Colossenses 18
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Vida Nova
que Jesus foi entregue a vós como Cristo e Senhor, continuai vivendo conforme esse fato de ele ser o
vosso Senhor". (0 verbo éntregue, em grego "paralembanõ ", sugere esta tradução.) "Recebestes" ou "foi
entregue" era o termo comumente usado para indicar o recebimento de uma tradição. Logo no v. 8 Paulo
adverte contra o perigo de abraçar "a tradição dos homens". Ou vivemos se gundo a lei da liberdade que o
Senhor grava no coração, ou em breve estaremos moldando a nossa conduta pelas especulações
humanistas da cultura semi-religiosa contemporânea.
A vereda, então, é Cristo Jesus, continuamente convidado a se assenhorear de todos os nossos
atos, planos, pensamentos e ambições (comp. Rm 12: 2). Esta figura do caminho nos lembra a afirmação
de Jesus: "Eu sou o caminho" (Jo 14: 6). No livro de Atos, os discípulos são o "povo do caminho" (22: 4),
símbolo desta verdade: todo verdadeiro cristão é um peregrino (Mt 8: 20) e estrangeiro (Hb 11: 13) que
caminha na direção de sua pátria celeste.
Nele Radicados, Edificados e Confirmados
Três palavras ligadas às figuras da árvore e do edifício apresentam outras verdades muito
significativas (v. 7):
Nele radicados está no pretérito perfeito, indicando uma experiência no passado que não mudará.
A árvore, uma vez enraizada, só fica mais fume à medida que o tempo passa e ela cresce. Paulo deixa
bem claro que, à semelhança da árvore, os cristãos foram plantados em Cristo, de uma vez para sempre.
Sendo um verbo passivo, dá para entender que foi Deus quem plantou a Igreja, e não uma decisão
meramente humana.
Nele edificados sugere um prédio em construção. O comentarista Lightfoot traduz assim: "Sendo
edificados nele hora após hora". As pedras vivas, lavradas por Deus, estão sendo colocadas no Templo
vivo da ressurreição (Jo 2: 20ss). Não foi, porém, um simples ato, mas é um processo contínuo.
Maravilhoso é pensar que as influências e experiências que Deus manda para nós, individual e
coletivamente, têm o único propósito de nos edificar. E este edifício o Senhor está construindo para sua
habitação (Ef 2:22).
Nele confirmados novamente é verbo passivo no tempo presente. Fala de um processo pelo qual
se garante uma verdade, tornando-a imutável (veja Hb 2: 2; 3: 14). 0 andar em Cristo, a firmeza das raízes
crescendo no evangelho, o processo de edificação, tudo deve confirmar a convicção do crente na fé. Por
isso não é de se admirar que Paulo, muitos anos depois de experimentar um encontro transformador na
estrada de Damasco, pudesse escrever aos filipenses: "Estou plena-mente certo de que aquele que
começou boa obra em vós há de completá-la até ao dia de Cristo Jesus."
As três descrições da vida cristã nos termos "radicados", "edificados" e "confirmados" ocorrem
onde há instrução verdadeira e cuidadosa na doutrina dos apóstolos (At 2: 42). Junto com a instrução deve
haver crescente louvor e ações de graças, que indicam a importância da adoração verdadeira para a
santificação da vida em Cristo.
O Perigo do Ensino Falso
Mesmo havendo tão excelentes motivos para que os colossenses crescessem na fé, Paulo sabia
que também havia perigos que ameaçavam o fundamento do edifício, bem como idéias falazes que bem
poderiam cortar as raízes da árvore da fé cristã. Daí a nova ordem do apóstolo: "Cuidado que ninguém vos
venha enredar com sua filosofia e vãs sutilezas" (v. 8). Enredar (no grego, sulagogõ: "seqüestrar", "raptar")
adverte os leitores para o perigo de serem persuadidos a mudarem as convicções de mente por meio da
filosofia. Mas não se tratava de filosofia que buscasse a verdade pela análise cuidadosa, sempre
consciente de suas limitações; muito pelo contrário, a heresia constava de idéias insensatas, de um
intelectualismo capaz de penetrar onde nenhuma mente humana poderia ii sem a iluminação de Deus. Daí
Paulo revelou a fonte de tais especulações: não passavam de "tradições humanas", isto é, falatórios
consagrados pela transmissão. As vezes o passar de palavras da boca para o ouvido, ou da cabeça para o
papel e tinta, impressiona ouvintes ou leitores como sendo válido. Confiamos na capacidade da mente
humana de discernir a verdade e descartar o erro. Mas nada fica mais longe da realidade! Jesus condenou
redondamente a facilidade com que os homens transformam a revelação em especulação e os
mandamentos de Deus em tradição humana.
Exposição Bíblica de Colossenses 19
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Ao conteúdo dessa tradição o apóstolo chama de "rudimentos" (grego: stoicheia). Esta palavra
significava, no primeiro século, os elementos básicos de toda existência, ou o "ABC" de qualquer assunto,
no sentido de passos preliminares e básicos (veja Hb 6: 1). Mas também significava poderes espirituais ou
corpos celestes que supostamente governavam (no pensamento astrológico) as circunstâncias da vida
humana. De fato, não importa muito o que seriam aqueles "elementos", uma vez que reconhecemos a sua
oposição total à realidade de Cristo (v. 8). Ele tanto é o único fundamento como o destino de toda rea-
lidade. "Alfa e Omega" é a feliz designação dada por João no Apocalipse (1: 8).
Cristo, A Única Fonte
Não se pode esperar qualquer auxílio de nenhuma destas fontes, diz o apóstolo. A razão é muito
simples. Em Cristo reside permanentemente toda a plenitude da Divindade em corpo. Como, então,
procuraria o cristão manifestações de poder, proteção ou qualidades sobrenaturais de outra fonte que não
fosse Cristo? Uma interpretação sugere que a plenitude seria uma referência às emanações intermediárias
que, na opinião dos gnósticos, preenchiam o espaço entre o deus espiritual e mundo material. Paulo,
então, declara que Cristo não seria qualquer um destes, mas a soma total dos seus supostos poderes,
englobados sob a sua soberania. Outra interpretação vê nesta passagem a verdade inegável de que todos
os atributos divinos habitam (objetivamente) em Cristo.
O termo "divindade" foi usado em Romanos 1: 20 para indicar a mão de Deus revelada na criação
do universo. Aqui, estaríamos vendo a Cristo como a revelação da face de Deus.
A palavra "corporalmente" pode significar "encarnado"; portanto, acontecido concreta e
historicamente na pessoa de Jesus de Nazaré. Também esta palavra (sõmatikõs) pode ter a idéia de
"totalmente", ou "unidamente", e não poderes ou espíritos distribuídos e espalhados, como pensaram os
gnósticos. Paulo relembra os colossenses de que já passaram pela experiência da "circuncisão espiritual"
(v. 11). Assim é que eles foram galardoados com a perfeição de Cristo (v. 10). A indagação de como se
apropriaram desta plenitude de Deus, Paulo responde: pelo novo nascimento, cujo sinal foi o batismo, um
ato que tinha profundas raízes no Antigo Testamento e na paixão e ressurreição de Cristo.
Não por intermédio de mãos humanas nos mostra que o valor da cerimônia inicial da vida cristã
não depende de ação humana (Jo 1: 13). Também não coincide, de forma alguma, com o rito judaico da
circuncisão física, que marcava a vinculação da criança com a aliança feita por Deus com Abraão, quase
vinte séculos antes. Mas é o “despojamento do corpo da carne", isto é, a negação definitiva, no ato do
batismo, da vida marcada pelo egoísmo e pela sensualidade. Em Romanos 6: 6, uma passagem paralela,
Paulo aponta para o batismo como o homem velho (as práticas e atitudes anteriores à conversão) sendo
crucificado com Cristo, "para que o corpo do pecado seja destruído".
A circuncisão de Cristo se refere especificamente à morte de Jesus na cruz, morte esta
compartilhada por todo cristão que é enxertado em Cristo pelo novo nascimento, e testemunhada pelo seu
batismo. Os cristãos não só compartilharam da crucificação de Cristo, mas também do sepultamento com
ele no seu túmulo. Trata-se de um enterro espiritual acentuado pelo batismo, simbolizando o fim da vida
velha no mundo e a ressurreição espiritual como membro do Corpo de Cristo. Estas realidades somente
podem ser apropriadas pela "fé no poder de Deus" (v. 12), que literalmente levantou Jesus Cristo dentre os
mortos. Crer na ressurreição é essencial para que se receba o dom da salvação (Rm 10:9; I Co 15: 14, 17).
Este modo de falar tem muito em comum com o pensamento dos judeus em relação ao Êxodo. Na
Páscoa, a família judia revivia a realidade dos eventos que deram à luz a nação israelita. Através da
celebração, na qual o judeu comia o cordeiro e os pães asmos, ouvia e respondia às perguntas de seus
filhos, entendia-se que os participantes realisticamente compartilhavam do acontecimento original. Nesse
contexto de pensamentos, o apóstolo fala da repetição, através do batismo, do evento salvador original,
quando Cristo morreu e reviveu por nós.
Além de focalizar a morte de Cristo compartilhada por todos os seus "irmãos menores", Paulo
chama atenção, no v. 13, para o estado mortal que precede a nova vida ressurreta dos regenerados. O
estado de morte é primeiramente descrito como um produto das transgressões. O pecado, rebelião contra
Deus, merece ser condenado pelo Deus da criação. No jardim do Éden nossos primeiros pais sofreram a
implacável ira de Deus contra a sua desobediência. No mesmo dia, Adão e Eva morreram, no sentido de
comunhão vital com Deus. A transgressão da lei de Deus é sempre punida pela separação dele, que é a
Exposição Bíblica de Colossenses 20
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única fonte de vida. Assim devemos considerar o sentido de morte pelas transgressões.
Em segundo lugar encontramos a frase "pela incircuncisão da vossa carne". Quer dizer, alienados
e separados da aliança que Deus fez com Israel (Ef 2: 12). Foi Deus quem tomou a iniciativa de fazer essa
aliança de graça e favor junto ao seu povo. Os colossenses, porém, não eram judeus, mas gentios;
portanto, não podiam reivindicar qualquer vantagem dessa natureza.
Diante de tão impossível situação de marginalização espiritual, Cristo veio e "deu vida juntamente
com ele" (v. 13), vida que Paulo exporá mais claramente no capítulo 3, nos versículos 1 a 4. Assim, a vida
ressurreta de Cristo substitui a morte que antes nos caracterizava.
Todos os pecados foram perdoados por esta ação divina providenciada no Filho. Diz Sócrates, o
famoso filósofo grego: "Pode ser que a deidade possa perdoar pecados, mas não vejo como!" O renomado
Dr. Bob Pierce, acometido pela terrível leucemia, passou dezessete dias no hospital aguardando a morte,
que Deus miraculosamente afastou por um longo tempo. Comentando sobre aquele período, poucos
meses atrás, em nossa igreja, ele disse: "A única coisa realmente importante é que todos os meus pecados
estão debaixo do sangue!" Cada dia a realidade do perdão deve tornar-se mais gloriosa e suscitar contínuo
louvor.
Paulo explica, no v. 14, o meio pelo qual Deus nos outorgou este perdão: foi cancelado
(exaleipsas, quer dizer, "apagar", "remover", "queimar ou inutilizar uma acusação ou dívida escrita") o
escrito de dívida que seria a base de punição. A figura de um tribunal está na mente de Paulo. O réu está
no banco. A escrita, repleta de acusações, está sendo preparada e lida. Mas o juiz, que é Deus, inocenta o
culpado, tendo satisfeito na morte de Jesus, seu Filho amado, todas as exigências da lei (comp. Mt 18:23 -
35).
O apóstolo denomina essas exigências de "escrita de dívida" (cheirographon, uma promessa de
pagar uma quantia x, assinada pessoalmente), que consistia nas ordenanças de Deus encontradas na
Bíblia. As leis e obrigações do Antigo Testamento, que os homens sozinhos seriam incapazes de cumprir, e
mesmo os mandamentos do Novo Testa-mento, nunca deixariam de condenar impreterivelmente todo
pecador ao inferno. Por isso encontramos a palavra "ordenanças" (dogmasin, "ordens de tribunal ou juiz ",
"decretos"; comp. v. 20, dogmatizesthe: "sois sujeitos a ordenanças").Mas este vocábulo acrescenta a idéia
de "tradição humana".
Paulo pede aos seus leitores que considerem tão maravilhosa verdade. Cristo tomou sobre si
mesmo as acusações todas. Em obediência absoluta a todas as ordens de Deus, ele cumpriu
completamente as obrigações, removendo-as inteiramente (v. 14). Ficaram cravadas na cruz do Calvário
as mãos e os pés do nosso Senhor, estendidos e transpassados pelos cravos, mostrando assim sua total
submissão a toda a vontade de Deus. Fragmentos rasgados jazem espalhados no seu túmulo. Assim,
nossa sujeição não pode ser mais a essas ordenanças religiosas, mas a Cristo, o Senhor. A "Lei", no
sentido legalista, não é mais constitucional no Reino do Filho do seu amor. Como Paulo escreveu aos
coríntios: "Não estais sem lei para com Deus, mas debaixo da lei (ennomos) de Cristo..." (9:21).
O v. 15 destaca a maravilhosa vitória de Jesus Cristo sobre os poderes satânicos: despojou
(apekdusamenos, "desarmou-os", "derrotou-os", "tirou todas as suas armas", "neutralizando-os") os
principados e potestades, ao vencer todas as tentações satânicas, vivendo uma vida absolutamen te sem
pecado. Mais ainda, Cristo os venceu pela morte conquistada na ressurreição. Os poderes do mal tentaram
destruir a Jesus, publicamente, pela rejeição do povo, que gritava: "Crucifica-o!" e pelo poder político dos
líderes israelitas, junto com a concordância de Roma (At 2: 23). Justa-mente na hora da maior vitória das
trevas sobre o Senhor da Glória, ele rompeu os grilhões da morte, demonstrando sua vitória sobre o poder
do pecado na sua expiação na cruz e sobre a morte pela ressurreição. A palavra grega aqui traduzida por
"triunfando" (também em II Co 2: 14) pode indicar o cortejo triunfal do general romano que, após a
conquista de território novo, traz os cativos amarrados, junto com o seu exército vitorioso.
Resumindo, entenderemos o argumento deste capítulo se lembrarmos que os colossenses
estavam sendo atraídos por uma "salvação" mística, intelectual, especulativa e pela busca de contato
benéfico com poderes espirituais. Procuravam uma "perfeição", não moral ou espiritual, mas teosófica.
Paulo combateu toda essa palha, reconfirmando as principais verdades históricas e teológicas do
Evangelho:
Exposição Bíblica de Colossenses 21
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