Meningites Agudas Bacterianas Protocolo
Meningites Agudas Bacterianas Protocolo
Meningites Agudas Bacterianas Protocolo
Filipa Prata, Marta Cabral, Lurdes Ventura, Paula Regina Ferreira, Maria João Brito
2. ETIOLOGIA:
2.1. DE ACORDO COM O GRUPO ETÁRIO:
Recém- Escherichia coli K1, outras Enterobacteriaceas,
nascido
Streptococcus do Grupo B (SGB), Listeria monocytogenes
1 – 3M Enterobacteriaceas, Streptococcus do Grupo B,
Listeria monocytogenes, Streptococcus pneumoniae,
Neisseria meningitidis, Haemophilus influenzae,
3M – 5A Streptococcus pneumoniae, Neisseria meningitidis,
Haemophilus influenzae
> 5ª Neisseria meningitidis, Streptococcus pneumoniae
4. DIAGNÓSTICO:
4.1 CLÍNICA (varia com idade, estadio da doença e resposta do hospedeiro à infecção)
Lactentes Crianças
Instabilidade térmica (febre versus Febre, arrepio, vómitos, náuseas
hipotermia) Cefaleias, fotofobia
“Sensação de doença” Exantema petéquial ou purpúrica*
Recusa alimentar Rigidez da nuca, Sinal de Kernig e
Gemido, irritabilidade, choro gritado Brudzinsky
Intolerância ao ruído/fonofobia Convulsões, sinais neurológicos focais
Letargia, hipotonia, convulsões Parésia de pares cranianos
Vómitos, diarreia, ictericia Edema da papila, confusão, alteração
Fontanela anterior abaulada da consciência, coma, ataxia
(sinal tardio só em 30%) Letargia, Irritabilidade
Sinais meníngeos (podem estar ausentes
antes dos 12-18M)
Contra-indicações
a)Absolutas:
• Instabilidade cardiorrespiratória
• Alteração do estado de consciência (ECG <9, sinais neurológicos focais,
anisocoria, pupilas pouco reactivas)*
• Convulsão prolongada*
• Sinais de hipertensão intracraniana (edema da papila, fundoscopia alterada,
HTA com bradicardia, parésia do III, IV ou VI pares cranianos)*
• Infecção cutânea no local de punção, púrpura extensa ou de agravamento
progressivo, mielomeningocelo
*implicam realização prévia de TC-CE (assim como história de traumatismo
crânio-encefálico, shunt do sistema nervoso central, meningite recorrente)
2
b)Relativas:
• Trombocitopenia (plaquetas <50.000/mm3)
• Alteração da coagulação (até correcção)
3
5. DIAGNÓSTICO DIFERÊNCIAL
Meningite viral,
Meningite tuberculosa,
Abcesso cerebral,
Tumor cerebral,
Hemorragia subaracnoideia,
Outras causas de meningismo (ex: pneumonia)
6. TERAPÊUTICA
6.1. ANTIBIOTICOTERAPIA
Deve ser iniciada precocemente, endovenosa e os antibióticos devem atingir níveis
bactericidas no LCR.
Terapêutica
Idade Alternativa*
empírica
Ampicilina
RN Ampicilina +
+ Cefotaxima
Cefotaxima +
Gentamicina
Terapêutica
Idade Doses Nº tomas
empírica
Ampicilina 400 mg/Kg/dia 4
(máx.12g/dia)
+
1 – 3M
200-300 mg/Kg/dia 32
Cefotaxima
(máx.12g/dia)
±
Vancomicina2 60 mg/kg/dia 4
1
Ceftriaxone 100mg/Kg/dia
(máx.4g/dia)
ou 1
200-300
Cefotaxima
>3 mg/Kg/dia 3
+ (máx.12g/dia)
meses
Vancomicina2 60mg/Kg/dia 45
3
(monitorização dos valores vale (15-20
4
mcg/ml)
1
Se quadro sugestivo de sépsis menigococica deverá optar-se por monoterapia com
ceftriaxone. 2A vancomicina deve ser administrada a todos os lactentes e crianças com
idade> 1 mês, com suspeita de meningite por Streptoccocus pneumoniae dada a
elevada incidência de resistência à penicilina G e às cefalosporinas de 3ª geração.
3
Monitorizar as concentrações plasmáticas nos caso de RN e de insuficiência renal.
4
valores adaptados do adulto. 5No caso do Redman Syndrome a administração
4
endovenosa deve ser mais lenta numa perfusão de 4 horas associada a uma pré-
medicação com antihistaminicos. No RN o intervalo entre doses depende da idade
gestacional (ver quadro em anexo 1).
Streptococcus do Grupo B*
Ampicilina + Gentamicina 14 - 21**
Listeria monocytogenes*
Neisseria meningitidis 7
Cefotaxima/Ceftriaxone
Haemophilus influenzae 10
SAMS Flucloxacilina 14
Vancomicina + Rifampicina
SAMR 14
ou Cotrimoxazol ou Linezolide
Streptococcus pneumoniae Ver CIM (Penicilina) 10 – 14
Alternativa Meropenem***
No caso de meningite sem agente isolado numa criança com idade < 3 meses deve-se
manter antibioticoterapia 14 a 21 dias e na criança com idade > 3 meses 7 a 10 dias.
6.2. DEXAMETASONA
Indicações:
Meningite a H. influenzae tipo b (> 6 semanas de vida)
Comprovadamente eficaz em infecções por H. influenzae, diminuindo a perda audição.
Dose:
0,4 a 0,6 mg/kg/dia EV, 12/12 ou 8/8 horas, 2 dias
Efeito máximo se administrada 1 a 2 horas antes da 1ª dose de antibiótico, mas
também eficaz se administrada simultaneamente.
Efeitos adversos:
• Mascarar a clínica dando falsa sensação de melhoria
• Ser causa de hemorragia gastrointestinal (1 a 2%)
• Ser causa de febre secundária
• Provocar atraso na esterilização do LCR (sobretudo na meningite
pneumocócica)
6
• Meningites não bacterianas ou por Gram negativos
• Anomalias do SNC
• Data limite de utilização
6.3.2. Laboratorial
Hemograma, PCR, ureia e creatinina, ionograma sérico e urinário, gasimetria (níveis
de bicarbonato e lactato), urina tipo II; se petéquias, púrpura ou outra forma de
hemorragia, avaliar também fibrinogénio, d-dímeros, TP e aPTT.
7. MEDIDAS DE SUPORTE
Cabeça elevada a 30, na linha média.
Antipiréticos em SOS.
- Iniciar nutrição entérica logo que possível. Colocar SNG nos doentes com
alteração do estado de consciência.
7.3 Se Convulsões
1º Diazepam 0.5 mg/Kg rectal
2º Diazepam 0,2-0,5 mg/kg/dose EV ou IO (se doente em choque) – até 3x (de
5 em 5 minutos)
3º Fenitoína 20 mg/kg (EV) e segue 5 mg/Kg/dia
4º Fenobarbital 20 mg/kg (EV) e segue 5 mg/Kg/dia
8.1 CHOQUE
Reconhecer os sinais de choque
Valorizar a taquicardia e aumento do tempo de reperfusão capilar e a alteração do
estado de consciência como sinais precoces de choque. A hipotensão é um sinal
tardio de choque descompensado.
Atuação:
O2 em alta concentração.
2 acessos EV ou IO.
Soro fisiológico 10-20 ml/Kg em 5-10 min, EV / IO. Pode ser repetido 2- 3 x.
Os objetivos são diminuição da frequência cardíaca, melhoria da perfusão
periférica e normalização da PA.
Cloreto de Sódio hipertónico (NaCl 3%) 3-5 ml/Kg em 5 min. Permite uma boa
expansão da volémia com um volume mais reduzido, tendo utilidade particular
quando há concomitantemente sinais de hipertensão intracraniana.
Após cada bólus avaliar sinais de disfunção cardíaca como fervores
pulmonares ou hepatomegalia.
Se existir coagulopatia: considerar volume útil – Concentrado eritrocitário – 10-
15 ml/Kg; plasma fresco congelado – 10 -15 ml/Kg em perfusão e não em bólus
pois há o risco de agravar o SIRS.
Se mantiver hipotensão após 3 bólus de volume:
Entubação traqueal e iniciar ventilação mecânica.
Iniciar Dopamina – 5 g/Kg/min, que se pode aumentar rapidamente até 10
g/Kg/min, em perfusão continua. Pode ser iniciada em via periférica ou IO.
Neste caso diluir de forma a que 1ml/h = 1g/Kg/min.
Não esquecer de corrigir a hipoglicémia (Glicémia<50mg/dl bólus Gluc 10% -
5 ml/kg EV).
Alternativas:
Lidocaína – 1 mg/Kg EV
Midazolam – 0.2 mg/Kg EV + Fentanyl – 2 g/Kg EV + Vecurónio – 0.1 –
0.2mg/Kg EV ou Rocurónio – 0.5 – 1 mg/Kg EV
Terapêutica hiperosmolar:
- Cloreto de sódio (NaCl) a 3% - 3-5 ml/Kg em 5 – 10 min, pode ser
repetido até Na sérico 160 mEq/L e/ou osmolaridade 360mOs/L seguido
de Cloreto de sódio (NaCl) a 3% em perfusão continua 0.1-1 ml/kg/h.
Na iminência de encravamento podemos usar doses de 6.5 – 10 ml/Kg.
ou
9
- Manitol 20%: 0.25 – 0.5 gr/kg/dose EV durante 15 – 20 min. Pode ser
repetido de 4/4 ou de 6/6 h.
Na eminência de encravamento podemos usar na dose de 1 g/Kg.
9. COMPLICAÇÕES
As complicações dependem de múltiplos fatores: idade e estado clínico prévio do
doente, tempo de evolução da doença antes do início da antibioticoterapia empírica,
agente etiológico e resposta inflamatória do hospedeiro.
As complicações classificam-se em agudas, que se manifestam nas primeiras 72
horas de doença, e em tardias, que se manifestam após as primeiras 72 horas de
doença e podem-se dividir em sistémicas e neurológicas.
9.1.1 Sistémicas
Choque sético, CID, secreção inapropriada de hormona anti-diurética (SIHAD)
9.1.2 Neurológicas
HIC, edema cerebral, hidrocefalia, crises convulsivas (20 a 30%), paralisia de pares
cranianos, acidente vascular isquémico, trombose dos seios venosos cerebrais
9.2.1 Sistémicas
Febre prolongada (> 10 dias), doença mediada por imunocomplexos (artrite,
pericardite), anemia, eosinofilia, trombocitose.
9.2.2 Neurológicas
Abcessos, coleções intracranianas (derrame sub-dural 10 a 30%), ventriculite,
hemiparésia, tetraparésia, surdez neurossensorial, (meningite por Streptoccocus
pneumoniae ≤ 30%, por Neisseria meningitidis 10% e Hib 85-40%), epilepsia
secundária, cegueira, alterações do desenvolvimento psicomotor e
neurocomportamento.
10
Agravamento do estado de consciência (letargia, estupor, coma)*
Sinais neurológicos focais (défices motores/sensoriais e sinais sugestivos de
neuropatia dos nervos oculomotor, facial, óptico e auditivo)*
Convulsão focal tardia (após 48-72h do início da terapêutica) ou de difícil controlo*
Alterações persistentes do LCR
Recorrência ou persistência da febre**
Suspeita de edema cerebral
Suspeita de hidrocefalia (↑ do perímetro cefálico, vómitos em jacto, olhos em sol
poente)
Meningite recorrente
B) Repetir PL:
Meningite neonatal*
Bacilos Gram negativos*
Pneumococo com sensibilidade diminuída à Penicilina (principalmente nos casos
em que foi usada dexametasona)*
Má evolução clínica (melhoria escassa ou ausente após 24 a 48 horas de ATB)
Febre prolongada ou reaparecimento da febre
*Repetir às 48 horas
11. PROGNOSTICO
Mortalidade: <10% (mais elevada no período neonatal e meningite pneumocócica)
Mortalidade por Neisseria meningitidis e Hib < 5%
Sequelas graves no DPM: 10-20%
Morbilidade neurocomportamental: 50%
Fatores de mau prognóstico:
Atraso no diagnóstico e início do tratamento
Factores do hospedeiro: recém-nascidos e lactentes com <6 M; estado imunitário
Tipo e virulência do microrganismo: Gram negativo ou Streptococcus pneumoniae;
microrganismo multirresistente aos antimicrobianos
Glicorraquia < 20 mg/dl na admissão
Concentrações altas de bactérias/produtos bacterianos no LCR ou atraso na
esterilização do LCR
Gravidade da doença à apresentação: sinais neurológicos focais + e/ou coma
(ECG<13)
Convulsões tardias (>72h após início da antibioticoterapia)
Factores do meio ambiente: más condições sócio-económicas, sobrepopulação
11
12.2 Preencher e enviar o impresso de notificação das Doenças de Declaração
Obrigatória (DDO)
As meningites por Neisseria meningitidis e por Hib são doenças de declaração
obrigatória
Rifampicina:
Alternativa: Ceftriaxone <15A: 125mg IM; ≥15A: 250mg IM (toma única) (grávida)
Espiramicina - Droga de eleição na grávida, 500 mg 6/6 horas, oral, 5 dias
Ciprofloxacina ≥ 18 anos, dose única de 500 mg, oral
Nota: A rifampicina provoca coloração alaranjada das secreções corporais (ex. urina,
suor, lágrimas); interacção com anticoagulantes e anticonceptivos orais e o uso de
lentes de contacto; não deve ser administrado a grávidas.
Rifampicina:
12.4. Vacinação
Os doentes não vacinados deverão ser vacinados; aqueles que estão parcialmente
vacinados devem completar o esquema vacinal.
Na meningite meningocócica, como podem ocorrer casos secundários semanas a
meses após o início dos sintomas no indivíduo doente, a vacina anti-meningocócica
administrada aos contactos de alto risco actua como medida adjuvante à
quimioprofilaxia no caso de surto por serogrupo coberto pela vacina (serogrupo C).
13
MENINGITE AGUDA BACTERIANA - ALGORITMO DE ACTUAÇÃO
Suspeita de meningite aguda:
INTERNAMENTO
Se positivo
PCR para DNA bacteriano Terapêutica de acordo com o agente e TSA
Gram - S. grupo B e N. meningitidis
Se negativo 21 dias L. monocytogenes 7 dias
14-21 dias
Manter antibioticoterapia H. influenzae S. Pneumoniae
10 dias 10 dias Ver CIM
14 dias
Evolução
14
Anexo 1
15
Anexo 2
VARIÁVEIS SCORE
Abertura ocular Espontânea 4
À voz 3
À dor 2
Nenhuma 1
Resposta verbal Orientada 5
Confusa 4
Palavras 3
inapropriadas 2
Palavras 1
incompreensiveis
Nenhuma
Resposta motora Obedece comandos 6
Localiza dor 5
Movimento de retirada 4
Flexão anormal 3
Extensão anormal 2
Nenhuma 1
16
Bibliografia
1. Kim K. Acute bacterial meningitis in infants and children. Lancet Infect Dis
2010; 10:32–42
6. Feigin RD, Cutrer WB. Bacterial meningitis beyond the neonatal period. In:
Feigin and Cherry's Textbook of Pediatric Infectious Diseases. Feigin RD,
Cherry JD, Demmler-Harrison GJ, Kaplan SL (Eds), 6th ed, Saunders,
Philadelphia 2009. p.439
7. Thigpen MC, Whitney CG, Messonnier NE, et al. Bacterial meningitis in the
United States, 1998-2007. N Engl J Med 2011; 364:2016
11. Garcia CG, McCracken GH Jr. Acute bacterial meningitis beyond the neonatal
period. In: Pediatric Infectious Diseases. Long SS, Pickering LK, Prober GP
(Eds), 4th ed, Elsevier, Saunders 2012. p.272
13. Castellanos Ortega A., Obeso Gonzalez T., Hernandez M.A. Meningitis e
Encefalitis. In: Manual de Cuidados Intensivos Pediátricos. Lopez –Herce Cid J.,
17
Calvo Rey C., Baldotano Aguero A., Rey Galan C., Rodriguez Núnez A.,
Lorente Acosta M. J. 3ª ed, Ed. Publimed, Madrid 2009:296-306
14. Flores Gonzalez J.C., Varella Katz D., Lopez-Herce Cid J. Shock. In: Manual de
Cuidados Intensivos Pediátricos. Lopez –Herce Cid J., Calvo Rey C., Baldotano
Aguero A., Rey Galan C., Rodriguez Núnez A., Lorente Acosta M. J. 3ª ed, Ed.
Publimed, Madrid 2009:352-364
16. Casado Flores J., Garcia Teresa, M A. Shock Séptico: Tratamiento. In: Tratado
de Cuidados Intensivos Pediátricos. F. Ruza, 3ª ed, Ed Norma Capitel, Madrid
2003: 383- 88
17. Palomeque A., Cambra F.J., Esteban E., Pons M. Traumatismo Craneo-
encefalico y Raquimedular. In: Manual de Cuidados Intensivos Pediátricos.
Lopez-Herce Cid J., Calvo Rey C., Baldotano Aguero A., Rey Galan C.,
Rodriguez Núnez A., Lorente Acosta M. J. 3ª ed, Ed. Publimed, Madrid 2009:
175-86.
18