1 SM
1 SM
1 SM
Capítulo II
RESUMO
Este texto apresenta uma revisão da definição, da fisiopatologia e do manejo das emergências respira-
tórias e da insuficiência respiratória aguda na criança, enfatizando os dispositivos mais adequados de
liberação de oxigênio. As crianças são mais suscetíveis aos problemas respiratórios graves, sendo
estes, causas importantes de procura pela sala de emergência em pediatria. O reconhecimento preco-
ce e o início rápido de tratamento são pontos fundamentais para o melhor desfecho desses pacientes.
Introduçã
Introduçãoo ção para parada cardíaca, maiores serão as chan-
ces de sobrevivência.2,3
Os problemas respiratórios são causas comuns
de atendimento nas salas de emergência em todo
mundo e constituem uma das principais causas de Definições
parada cardiorrespiratória em crianças, tanto em am-
biente pré-hospitalar quanto hospitalar. Aproximada- A insuficiência respiratória aguda é definida
mente 2/3 dos casos de insuficiência respiratória agu- como a incapacidade do sistema respiratório de obter
da acontecem no primeiro ano de vida.1 oxigênio (O2) para suprir as necessidades teciduais e
O reconhecimento precoce da insuficiência res- de eliminar dióxido de carbono (CO2) proveniente do
piratória é de importância fundamental, uma vez que metabolismo celular. Caracteriza-se por hipoxemia,
o desfecho após a parada respiratória é bem melhor hipo/ normo ou hipercapnia e distúrbios do equilíbrio
do que após a parada cardíaca (70% vs. 10% de so- ácido-base. Define-se hipoxemia como uma pressão
brevida). Portanto, quanto mais cedo forem detec- parcial de O2 em sangue arterial (PaO2) < 50 mm Hg
tados os sinais de desconforto respiratório ou de em recém-nascidos e < 60 mm Hg em crianças maio-
insuficiência respiratória e quanto mais precoce o res, e hipercapnia como PaCO2 > 45 mm Hg, em qual-
início da terapia apropriada, evitando-se evolu- quer idade.1
169
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança http://www.fmrp.usp.br/revista
170
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
http://www.fmrp.usp.br/revista Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança
Tabela 1
Fatores, mecanismos fisiopatológicos e causas de hipoxemia.
Fatores Mecanismos Causas
Baixa PO2 ambiental Diminuição da PaO2 Altas altitudes
Desequilíbrio ventilação (V)/ per- Áreas não ventiladas, mas com perfusão Pneumonia
fusão (Q) adequada, resultando em diminuição da SDRA
PaO2, e em menor extensão, aumento da Edema pulmonar
PaCO2 Atelectasia
Asma, bronquiolite
ção 2). Portanto, em regiões localizadas muito acima consequente eliminação de CO2 pelas unidades alveo-
do nível do mar, a PAO2 é mais baixa, podendo causar lares ventiladas. Deve-se ressaltar que em quadros
hipoxemia. 1,6 obstrutivos de vias aéreas inferiores (asma e bron-
Nos distúrbios da difusão decorrentes do au- quiolite), a distribuição da ventilação pelos pulmões é
mento da espessura da barreira alvéolo-capilar, ocor- bastante heterogênea, podendo ocorrer tanto aumen-
re hipoxemia, com aumento da D(A-a)O2. Como o to do espaço morto causado por hiperinsuflação quanto
CO2 é aproximadamente 20 vezes mais difusível que efeito shunt em áreas com atelectasia.1,4
o oxigênio, a PaCO2 pode estar normal.3 Normalmente, o shunt fisiológico total é de 3
O desequilíbrio ventilação-perfusão, caracteri- a 5% do débito cardíaco, e corresponde à fração do
zado por unidades alveolares pouco ventiladas, mas débito cardíaco que passa do sangue venoso misto
com perfusão normal (ou quase normal), causa hipo- para o sangue arterial sem ser oxigenado. De manei-
xemia, pois não há trocas gasosas nas unidades alvé- ra simplificada, o shunt (Qs/ Qt) pode ser calculado
olo-capilares mal ventiladas. Portanto, o sangue ve- pela Equação 4. O shunt é considerado leve quando
noso que retorna destas unidades tem baixa satura- < 15%, moderado de 15 a 25%, e grave > 25%. 5
ção de O2, levando à mistura de sangue arterializado
e venoso no lado esquerdo do coração (efeito shunt).
Qs/ Qt = D(A-a) O2/ 20 (Equação 4)
Nestas situações, a D(A-a)O2 está aumentada, po-
rém o shunt não eleva significativamente a PaCO2.
Na maioria das vezes, a PaCO2 está normal, porque As condições clínicas associadas à diminuição
ocorre aumento da ventilação alveolar decorrente da do débito cardíaco (p. ex. , choque) ou do conteúdo
estimulação dos quimiorreceptores pela hipóxia, com arterial de oxigênio (CaO2) (p. ex. , anemia) alteram o
171
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança http://www.fmrp.usp.br/revista
transporte de oxigênio (DO2) (Equação 5) e podem turbulento têm resistência muito maior do que aqueles
causar hipóxia tissular. com fluxo laminar, e, portanto, em situações de obs-
trução de vias aéreas é importante manter o paciente
DO2 = Débito cardíaco x CaO2 (Equação 5) calmo para evitar turbulência do fluxo e aumento do
trabalho da respiração.4
Onde: As patologias pulmonares restritivas e o au-
CaO2 = Concentração de hemoglobina (g/dL) x 1,34 mento da pressão intra-abdominal levam à diminui-
x SaO2 + (PaO2 x 0,003)
Tabela 2
Os fatores que influenciam a saturação arterial
Causas de insuficiência respiratória
de oxigênio pelo desvio da curva de dissociação da
oxihemoglobina para a esquerda, aumentando a afini- Depressão do centro respiratório
dade do oxigênio pela hemoglobina, levam à diminui- - Drogas (sedativos, anestésicos)
- Encefalopatia hipóxico-isquêmica
ção da liberação de oxigênio aos tecidos e hipóxia te-
- Trauma crânio-encefálico
cidual, como a intoxicação por monóxido de carbono
- Infecções (meningites, encefalites)
(inalação de fumaça) e a metahemoglobinemia. O
monóxido de carbono apresenta maior afinidade pela Doenças neuromusculares
- Síndrome de Guillain-Barré
hemoglobina que o oxigênio, deslocando a ligação do
- Miastenia Gravis
oxigênio à hemoglobina por competição. A metahe-
moglobina não transporta oxigênio e desvia a curva Distúrbios metabólicos
- Hipofosfatemia
de dissociação da oxihemoglobina para a esquerda,
- Hipomagnesemia
diminuindo a liberação de oxigênio aos tecidos.
- Hipopotassemia
As causas de insuficiência respiratória estão - Alcalose metabólica grave
listadas na Tabela 2.3, 6
Bloqueio neuromuscular por drogas
As patologias obstrutivas levam ao aumento do
trabalho respiratório pelo aumento da resistência das Patologias obstrutivas de vias aéreas
vias aéreas. A resistência é definida como a variação • Obstrução de vias aéreas superiores
de pressão transpulmonar (∆P) necessária para pro- - Laringite
- Epiglotite
duzir fluxo de gás através das vias aéreas aos pul-
- Corpo estranho
mões (Equação 6), sendo diretamente proporcional ao • Obstrução de vias aéreas inferiores
comprimento e inversamente proporcional à quarta - Asma brônquica
potência do raio da via aérea (Equação 7). Portanto, a - Bronquiolite
diminuição do diâmetro da via aérea pela metade au- - Compressão extrínseca
menta 16 vezes a resistência.7 Patologias restritivas do parênquima pulmonar
- Fibrose pulmonar
Resistência = ∆P/ fluxo (Equação 6) - Cifoescoliose
Diminuição da complacência pulmonar
Resistência ~ n L/ r4 (Equação 7) - Edema pulmonar
- Pneumonia
- Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo
Onde: - Doença da membrana hialina
n é a viscosidade do gás, L é o comprimento, e r é o Patologias abdominais
raio da via aérea. • Aumento da pressão intra-abdominal e elevação do
diafragma
Ressalta-se que durante a respiração normal, o - Ascites volumosas
fluxo de entrada de ar nos pulmões é laminar. Quando - Tumores abdominais
ocorre turbulência do fluxo de ar, a resistência é mai- - Hemorragia intra-abdominal
or, sendo inversamente proporcional à quinta potência - Obstrução do trato gastrintestinal
do raio da via aérea. Desta forma, os pacientes agita- Diminuição do transporte de CO2
dos com fluxo de entrada de ar nos pulmões rápido e - Choque
172
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
http://www.fmrp.usp.br/revista Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança
ção da complacência pulmonar e/ou da caixa toráci- saltando-se que o aparecimento de cianose requer
ca. A complacência é a capacidade de estiramento aproximadamente 5 g/dL de hemoglobina reduzida e,
dos pulmões e da caixa torácica, definida como varia- portanto, a cianose pode não aparecer em crianças
ção de volume (∆V) por unidade de variação de pres- anêmicas. A diminuição do nível de consciência e do
são transmural (∆P) (Equação 8). Os pulmões com tônus muscular são sinais tardios associados à fadiga,
alta complacência expandem-se facilmente. Por ou- e ocorrem em fases mais avançadas da insuficiência
tro lado, os pulmões com baixa complacência são “du- respiratória aguda.3
ros” e, portanto, mais esforço é necessário para insu-
flar os alvéolos.1 Avaliação laboratorial e monitori-
zação
Complacência = ∆V/∆P (Equação 8)
A gasometria arterial permite avaliar a eficácia
da oxigenação e da ventilação, quantificar acidose
Quadro clínico da insuficiência res- respiratória ou metabólica, e monitorar a resposta à
piratória aguda terapêutica. Os dados gasométricos podem ser utili-
zados para classificar a insuficiência respiratória, de
A frequência respiratória geralmente está au- acordo com sua evolução temporal (Figura 1). Na fase
mentada (taquipneia) e pode-se observar aumento do inicial (fase I), o organismo sob influência do proces-
esforço respiratório, com batimento de asas do nariz, so mórbido começa a apresentar queda da PaO2. A
tiragem intercostal, supra/ sub-esternal, supraclavicu- seguir (fase II), o paciente apresenta aumento do vo-
lar, subcostal, contração da musculatura acessória da lume minuto respiratório, o que evita quedas maiores
respiração e movimento paradoxal do abdome. A di- da PaO2 e causa diminuição da PaCO2. Na fase III,
minuição da frequência respiratória (bradipneia) e o apesar do aumento do trabalho respiratório, a PaO2
aparecimento de ritmo respiratório irregular são sinais diminui progressivamente e a PaCO2 volta ao “nor-
de alerta para a deterioração das condições clínicas mal”, ou seja, eleva-se gradativamente, pois o esforço
da criança. Gemidos expiratórios sinalizam colapso respiratório foi superado. A fase IV caracteriza-se pela
alveolar e de pequenas vias aéreas, pois, na tentativa falência respiratória, com aumento progressivo da
de aumentar a capacidade residual funcional e melho- PaCO2 e diminuição gradual da PaO2 decorrentes de
rar a oxigenação, a criança fecha a glote na expiração, fadiga muscular.1
emitindo gemidos. O estridor inspiratório e as altera- A oximetria de pulso permite avaliar continua-
ções da voz sugerem obstrução das vias aéreas supe- mente a saturação arterial de oxigênio. Porém, o
riores (extratorácicas). Sibilos e aumento do tempo oxímetro de pulso requer fluxo sanguíneo pulsátil para
expiratório ocorrem nas patologi-
as obstrutivas das vias aéreas in-
feriores (asma e bronquiolite) e no
edema pulmonar. Podem ser ob-
servadas alterações na expansibi-
lidade torácica na presença de
efusões pleurais, pneumotórax,
atelectasia, aspiração de corpo es-
tranho e paralisia diafragmática. A
ausculta de murmúrio vesicular di-
minuído com estertores crepitan-
tes sugere pneumonia ou edema
pulmonar. A diminuição ou aboli-
ção do murmúrio vesicular ocorre
no derrame pleural, pneumotórax,
atelectasia e obstrução de vias aé-
Figura 1: Evolução da PaO 2 e da PaCO 2 de acordo com a progressão da insuficiência
reas. Palidez cutânea e cianose respiratória.
central sinalizam hipoxemia, res-
173
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança http://www.fmrp.usp.br/revista
determinar a saturação de oxigênio e pode ser impre- Permeabilização das vias aéreas
ciso na presença de choque e de má perfusão teci- • Posicionamento: Pode ocorrer obstrução de vias
dual, por vasoconstricção intensa nas extremidades. aéreas pelo posicionamento inadequado da cabeça
Além disso, a oximetria de pulso não reflete a satura- devido à flexão do pescoço e, em crianças sonolen-
ção total da hemoglobina normal em situações de me- tas ou inconscientes, em decorrência de relaxamento
tahemoglobinemia ou carboxihemoglobinemia.8 da mandíbula, deslocamento posterior da língua em
A monitorização do CO2 exalado pode ser útil direção à parede posterior da faringe e colapso da
para confirmar a posição do tubo traqueal e estimar a hipofaringe. Por isso, é importante que se posicione
PaCO2, em situações em que não há obstrução de corretamente a cabeça da criança, de forma a ali-
vias aéreas ou desequilíbrio ventilação-perfusão nos nhar os eixos oral, traqueal e faríngeo. Esta posição
pulmões. O CO2 exalado pode ser monitorado por dis- é adquirida colocando-se um coxim embaixo dos
positivos quantitativos (capnografia), que medem a con- ombros (crianças < 2 anos) para evitar flexão do
centração de CO2 usando detectores infravermelhos pescoço ou um coxim abaixo do occipício (a partir
de absorção, ou por dispositivos qualitativos, que se de 2 anos), alinhando-se a parte anterior do ombro
baseiam na reação química entre o CO2 exalado e um com o meato auditivo (Figuras 2a e 2b). 2,3
detector químico impregnado em uma tira de
papel. Na presença de CO2, haverá mudan-
ça da cor do dispositivo, em que a cor roxa
significa ausência de CO2 e a amarela, pre-
sença de CO 2. A capnografia quantitativa
permite a monitorização do CO2 exalado de
forma contínua através do formato de onda
quadrada durante o ciclo respiratório.2
174
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
http://www.fmrp.usp.br/revista Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança
175
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança http://www.fmrp.usp.br/revista
176
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
http://www.fmrp.usp.br/revista Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança
• Ventilação assistida: Se a ventilação do paciente se houver obstrução parcial de vias aéreas, dimi-
não for efetiva, com movimentos insuficientes e sons nuição da complacência pulmonar ou pressão
respiratórios inadequados, mesmo com as vias aé- ventilatória excessiva. A distensão gástrica pode
reas pérvias, deve-se proceder à ventilação assisti- atrapalhar a ventilação; ela pode ser minimizada
da. Em situações de emergência, a ventilação com em pacientes inconscientes pelo aumento do tem-
bolsa e máscara é o tratamento inicial de escolha. po inspiratório, fornecimento de volume corrente
• Ventilação com bolsa-máscara: Permite ventilar suficiente para expandir os pulmões (evitando
e oxigenar o paciente; pode ser realizada em pa- volumes excessivos) com frequência respiratória
cientes com cânula orofaríngea ou nasofaríngea, e adequada para dar tempo suficiente para a exa-
naqueles que não necessitam de nenhum dispositi- lação e por fim, pela aplicação de pressão sobre
vo para manter as vias aéreas pérvias.3 a cartilagem cricoide (Manobra de Sellick). Esta
- Técnica de ventilação com bolsa-máscara: manobra, além de diminuir a distensão gástrica,
Qualquer pessoa que provê cuidado pré-hospita- evita regurgitação e aspiração do conteúdo gás-
lar, intra-hospitalar e durante o transporte deve trico, pois oclui o esôfago proximal pelo desloca-
estar apta a fornecer ventilação e oxigenação ade- mento posterior da cartilagem cricoide.3
quada com bolsa-máscara. Inicialmen-
te, realiza-se a abertura das vias aére-
as, coloca-se a máscara na face, for-
necendo o volume corrente necessário
para o tórax expandir. A técnica para
abrir as vias aéreas e ajustar a másca-
ra na face é chamada de técnica do
“C e E”. O terceiro, o quarto e o quin-
to dedos de uma mão (formando um
E) são posicionados ao longo da man-
díbula elevando-a para frente e para
cima; esta elevação deve ser feita cau-
telosamente nos pacientes com suspeita
de trauma cervical. Ao mesmo tempo,
o polegar e o segundo dedo da mesma
mão mantêm a máscara sobre a face
Figura 5: Técnica do “C e E”.
da criança (formando um C) (Figura 5).
Deve-se evitar exercer pressão abai-
xo do queixo, pois pode causar compressão e obs- - Escolha da máscara adequada: Idealmente, a
trução das vias aéreas. Podem ser necessárias máscara deve ser transparente para possibilitar a
duas pessoas para a ventilação com bolsa-más- observação da cor dos lábios da criança, a
cara, caso se opte por fazer a técnica do “C e E” condensação do ar (indica exalação) e a obser-
utilizando as duas mãos. A velocidade da ventila- vação de regurgitação ou vômito, evitando a as-
ção será de 12-20 movimentos por minuto, se a piração deste conteúdo para os pulmões. A más-
criança tiver ritmo cardíaco com alguma perfu- cara de tamanho adequado engloba a face desde
são. Durante a ventilação, pode ser necessário a ponta do nariz até a cissura do queixo, devendo
mover o pescoço gentilmente para trás ou para haver uma vedação hermética para que a con-
frente, até atingir a posição ótima para a ventila- centração oxigênio inspirado não diminua e a ven-
ção efetiva. Se apesar disto, não se conseguir ven- tilação seja eficaz. 3
tilação efetiva, deve-se reposicionar a cabeça da - Tipos de bolsa: Há bolsas autoinfláveis e fluxo-
criança, assegurando que a máscara esteja bem infláveis. Durante a ressuscitação, dá-se prefe-
vedada sobre a face, elevando a mandíbula e faz- rência às bolsas autoinfláveis, pois, embora as bol-
se a aspiração das vias aéreas, se necessário. sas fluxo-infláveis sejam muito utilizadas em anes-
Durante a ventilação com máscara facial é co- tesia, elas requerem treinamento prévio na mani-
mum ocorrer distensão gástrica, principalmente pulação de suas válvulas. As bolsas autoinfláveis
177
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança http://www.fmrp.usp.br/revista
devem estar disponíveis em tamanhos adequa- O uso da máscara laríngea durante o transporte de
dos a todas as faixas etárias. As bolsas de 250 pacientes pode ser problemático, pois é difícil mantê-
mL, utilizadas para ventilação neonatal, podem la no local apropriado durante a movimentação.10
ser inadequadas para manter um volume corren- • Intubação traqueal: A ventilação através do tubo
te efetivo em neonatos a termo e lactentes. Por- traqueal é o método mais efetivo e confiável de ven-
tanto, para recém-nascidos a termo, lactentes e tilação assistida, por vários motivos: Permite oferta
crianças, a bolsa de ressuscitação deve ter capa- de oxigênio e ventilação adequada sem insuflação
cidade mínima de 450-500 mL, mas independen- do estômago; reduz aspiração pulmonar do conteú-
temente do tamanho da bolsa, deve-se sempre do gástrico; facilita a aspiração de secreção e ou-
observar a expansão torácica para fornecer so- tras substâncias das vias aéreas; possibilita melhor
mente a ventilação necessária. As bolsas auto- controle do tempo inspiratório e dos picos de pres-
infláveis sem reservatório, quando acopladas a são, e a aplicação de pressão expiratória positiva
uma fonte de oxigênio, fornecem no máximo 40% final. 9
de concentração de O2, enquanto que as bolsas - Indicações de intubação traqueal:
com reservatório, com fluxo de oxigênio adequa- 1. Controle inadequado da ventilação pelo siste-
do para encher o reservatório (10-15 L/min), po- ma nervoso central.
dem fornecer uma fração inspirada de O2 de até 2. Presença de obstrução funcional ou anatômi-
100%. Antes de iniciar a ventilação com bol- ca grave das vias aéreas.
sa-máscara, confirme se o oxigênio está 3. Perda dos reflexos de proteção das vias aé-
conectado adequadamente à bolsa. 2 reas.
• Efeitos adversos da ventilação com pressão 4. Trabalho respiratório excessivo levando à fa-
positiva com bolsa-máscara: Volume corrente e diga e insuficiência respiratória.
pressão de vias aéreas excessivos podem reduzir o 5. Necessidade de alto pico de pressão inspirató-
débito cardíaco por levar à diminuição do retorno ria para manter as trocas gasosas.
venoso e ao aumento da pós-carga do coração di- 6. Necessidade de proteção das vias aéreas.
reito, pela elevação da pressão intratorácica e dis-
- Tubo traqueal: Deve ser estéril, descartável e
tensão dos alvéolos. Além disso, pode haver escape
feito de cloreto de polivinil, um material translúcido
de ar (barotrauma). Para minimizar o risco desta
e radiopaco. Na extremidade distal do tubo pode
complicação, muitas bolsas possuem valvas de se-
haver um orifício na parede lateral, chamado de
gurança limitadas à pressão (35-45 cm H2O). 2
olho de Murphy, que serve para reduzir o risco de
• Máscara laríngea: Dispositivo usado para assegu- atelectasia do lobo superior direito e a probabili-
rar as vias aéreas, que fornece um modo efetivo de dade de obstrução completa do tubo, caso a aber-
ventilação e oxigenação. Consiste em um tubo, dis- tura da extremidade seja ocluída. O tubo apre-
ponível em vários tamanhos, com projeção tipo senta marcas em centímetros que servem como
máscara na extremidade distal com cuff que após ponto de referência durante a sua colocação e
sua introdução na faringe é inflado, vedando a facilitam a detecção de possíveis deslocamentos
hipofaringe e deixando a abertura distal do tubo so- do tubo; pode haver também uma marca para a
bre a abertura glótica, mantendo a via aérea pérvia. corda vocal. Existem tubos com e sem cuff. Usu-
É usada em pacientes inconscientes e sua introdu- almente, eram utilizados tubos sem cuff para crian-
ção é feita às cegas, até encontrar resistência. Pode ças até 10 anos, pois até esta idade, a criança
ser utilizada em cirurgias de curta duração, em pa- apresenta um estreitamento anatômico no nível
cientes com trauma facial ou alteração anatômica do anel cricoide, provendo, desta forma, um cuff
das vias aéreas superiores e naqueles com intuba- funcional. Atualmente, pode-se utilizar cânula com
ção difícil, por ser de manejo mais fácil. O uso des- cuff em todas as idades, principalmente em crian-
te dispositivo é contraindicado nos pacientes com ças que necessitem de altas pressões inspiratórias
reflexo de vômito intacto, pois não protege as vias devido à baixa complacência pulmonar (p. ex. ,
aéreas da aspiração de conteúdo gástrico. Durante síndrome do desconforto respiratório agudo) ou
parada cardíaca ou respiratória, pode ser alternati- alta resistência de vias aéreas (p. ex. , asma). Ao
va efetiva para o restabelecimento das vias aéreas. insuflar o cuff, que é um mecanismo de alto volu-
178
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
http://www.fmrp.usp.br/revista Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança
me com baixa pressão, deve-se respeitar a pres- de ou reduzir a pressão do cuff para minimizar o
são de perfusão da mucosa traqueal (25-35 mm risco de trauma das vias aéreas.3, 9
Hg), tomando o cuidado de evitar que a pressão - Tamanho do tubo traqueal: O tamanho ade-
fique baixa demais, a ponto de permitir escape de quado do tubo varia de acordo com a idade. Em
ar excessivo. Portanto, a pressão de insuflação recém-nascidos prematuros, pode-se usar cânu-
deve ficar em torno de 20-30 mm Hg; o ideal é las com diâmetro interno de 2 mm, 2,5 mm ou até
que se monitore esta pressão com aparelho ade- de 3,0 mm. Em recém-nascidos a termo, utilizam-
quado (cufômetro). A intubação com tubo traqueal, se cânulas com diâmetro interno de 3 ou 3,5 mm,
com ou sem cuff, deve permitir escape de gás e em crianças com 1 ano, 4 ou 4,5 mm. Em crian-
mínimo, audível quando a ventilação é realizada ças maiores de 2 anos, o diâmetro interno do tubo
com uma pressão de 20-30 cm de H2O. A ausên- (em mm) pode ser calculado segundo as Equa-
cia completa de escape pode indicar que o tubo é ções 9 e 10. Embora seja um método de medida
muito grande, o cuff está excessivamente inflado grosseiro e de pouca precisão, pode-se estimar o
ou há laringoespasmo ao redor do tubo. Essas diâmetro interno do tubo comparando-o ao diâ-
condições podem causar pressão excessiva na metro do quinto dedo da mão do paciente. Os
superfície interna da traqueia; portanto, tão logo tamanhos de cânula e de sonda de aspiração de
seja possível, deve-se substituir o tubo muito gran- acordo com a faixa etária estão na Tabela 3.11
Diâmetro interno (cânula com cuff) (mm) = (Idade em anos/ 4) + 3,5 (Equação 10)
Tabela 3
Tamanhos de tubo traqueal e de aspiração pediátricos
Diâmetro interno do Tamanho do cateter
Tamanho aproximado para idade (peso) tubo traqueal (mm) de aspiração (F)
179
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança http://www.fmrp.usp.br/revista
- Profundidade de inserção da cânula tra- 4. Estilete (fio guia) para aumentar a rigidez do
queal: É importante para a ventilação adequada, tubo traqueal e ajudar a guiá-lo através das
pois se a cânula estiver muito profunda, pode cordas vocais; cuidado para não ultrapassar
haver ventilação seletiva para um pulmão, geral- a ponta do estilete além da extremidade dis-
mente o lado direito, por apresentar o brônquio tal do tubo.
fonte mais retificado, e se pouco profunda, o pa- 5. Três tamanhos de tubo, o estimado pela fór-
ciente pode se extubar facilmente. A maioria dos mula, um de menor calibre e outro de maior
tubos traqueais possui marcas que devem ficar calibre.
na altura das cordas vocais, mas há fórmulas para 6. Lâmina e cabo de laringoscópio com luzes
estimar a profundidade de inserção da cânula; a funcionando.
mais simples é 3 vezes o diâmetro interno da câ- 7. Fitas, cadarços ou esparadrapo para fixar o
nula (p. ex., o tubo de 5,0 mm deve ser inserido tubo, ou fixadores apropriados.
15 cm). Para recém-nascidos prematuros, pode- 8. Cateter de aspiração do tubo traqueal.
se usar outra regra: 6 + peso da criança, indepen- 9. Detector de CO2 (capnógrafo).
dentemente do número da cânula (p. ex. , crian-
ça de 1 kg, inserção de 7 cm).3 - Técnica de intubação: A intubação nas crian-
- Laringoscópio: Consiste em um cabo com pi- ças é mais difícil que nos adultos, por vários fato-
lhas e uma lâmina com uma fonte de luz. A lâmi- res: 1) A laringe tem posição posterior e mais
na é usada para expor a glote pelo deslocamento cefálica, fazendo com que a epiglote tenha um
lateral da língua. Em posicionamento adequado, ângulo agudo em relação à base da língua, difi-
possibilita uma linha visual reta através da boca e cultando sua visualização; por isso, lâminas retas
da faringe até a laringe, permitindo que se passe são geralmente mais úteis do que as curvas para
o tubo traqueal. Existem lâminas de diversos ta- criar um plano visual direto da boca até a glote,
manhos e a escolha certa para cada paciente deve principalmente em lactentes; 2) dificuldade de con-
ser baseada na medida entre a rima labial e o trolar a posição da língua com laringoscópio, por
ângulo da mandíbula.3 ela ser relativamente maior, havendo menor es-
- Preparação para intubação: Antes de intubar, paço para comprimi-la anteriormente; 3) a epiglote
deve-se permeabilizar as vias aéreas e fornecer é mais longa, flexível, estreita e angulada, dificul-
oxigênio por máscara, se o paciente estiver res- tando seu controle com o laringoscópio; 4) facili-
pirando espontaneamente; caso contrário, se o dade de entrada do tubo no esôfago ou de se pren-
paciente não estiver respirando ou sua respira- der na comissura anterior da corda vocal. Para
ção não for efetiva, deve-se iniciar ventilação com visualização adequada da glote, os eixos da boca,
bolsa-valva e máscara antes da intubação, seguin- faringe e traqueia devem estar alinhados. Utiliza-
do-se os passos abaixo:3 se a estabilização manual para manter a posição
1. Monitorar a frequência respiratória e a satu- neutra. Em crianças sem suspeita de trauma cer-
ração de oxigênio antes de tentar intubar. vical, posiciona-se a cabeça alinhando o meato
Nos pacientes em parada cardíaca ou insu- auditivo à parte anterior do ombro, como referido
ficiência cardiopulmonar, não perder tempo anteriormente. Após o posicionamento da crian-
na monitorização, pois estas situações não ça, segura-se o cabo do laringoscópio com a mão
geram pulsos detectáveis. esquerda e introduz-se a lâmina dentro da boca,
2. Verificar o equipamento de intubação. na linha média, seguindo o contorno natural da
3. Usar precauções universais para reduzir ris- faringe até a base da língua. Uma vez que a pon-
cos de infecção. ta da lâmina esteja na base da língua e com a
epiglote visualizada, move-se a extremidade
- Equipamento de intubação: proximal da lâmina para o lado direito da boca e
1. Monitor cardiorrespiratório e oxímetro de depois, arrasta-se a língua em direção à linha
pulso. média para obter seu controle. Pode-se usar a
2. Dispositivos para aspiração de grande calibre. lâmina reta ou a curva; idealmente, a ponta da
3. Ressuscitadores manuais e fonte de oxigê- primeira serve para levantar a epiglote e visuali-
nio. zar a abertura glótica, já a lâmina curva é intro-
180
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
http://www.fmrp.usp.br/revista Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança
duzida na valécula para deslocar a língua anteri- - Confirmação da intubação: A confirmação ini-
ormente. Após a introdução da lâmina no local cial da intubação é a visualização da passagem
apropriado, faz-se a tração do cabo para cima para do tubo através das cordas vocais. Depois da in-
deslocar a base da língua e a epiglote anterior- trodução do tubo traqueal e do início da ventila-
mente, expondo a glote (Figura 6). Não deve ser ção com pressão positiva, é feita avaliação clíni-
feito movimento de báscula ou alavanca e a gen- ca para confirmação da posição apropriada do
giva e os dentes não devem servir como ponto de tubo, que inclui: 1. Observação da expansão torá-
apoio para a lâmina, pois estes movimentos po- cica; 2. ausculta do murmúrio vesicular nos cam-
dem danificar os dentes, traumatizar a gengiva e pos pulmonares, axilas e ápice bilaterais (os acha-
reduzir a capacidade de visualização da laringe. dos do exame pré-intubação devem servir de base
As tentativas de intubação devem ser breves; ten- para comparação depois da intubação); 3. aus-
tativas que duram mais de 30 segundos podem culta da região epigástrica, (se o tubo estiver na
produzir hipoxemia profunda, especialmente nos traqueia, haverá ausência de murmúrio vesicular);
lactentes, cujas reservas de oxigênio são meno- 4. detecção do CO2 exalado. A avaliação clínica
res. Se hipoxemia significativa, cianose, palidez somente pode não ser suficiente para a confirma-
ou bradicardia ocorrerem, a tentativa de intuba- ção da intubação e, portanto, a detecção do CO2
ção deve ser interrompida e o paciente deve ser exalado deve ser usada como confirmação pri-
ventilado imediatamente com oxigênio a 100%, mária da intubação. Em pacientes com ritmo car-
utilizando bolsa-valva e máscara até melhora da díaco com perfusão e peso > 2 kg, detecta-se a
saturação e da frequência cardíaca. Em situações presença de CO2 após seis ventilações manuais.
em que o paciente estiver instável e for difícil ven- Recomenda-se a realização de seis ventilações,
tilar ou oxigenar com bolsa-valva e máscara, é objetivando eliminar o CO2 que possa estar pre-
preferível que se tente novamente a intubação e sente no estômago e no esôfago. Depois de seis
esta tentativa deve ser feita pelo profissional mais ventilações, o CO2 detectado deve ser considera-
habilitado. Nas situações de emergência, a intu- do como proveniente da traqueia, pois há concen-
bação orotraqueal é preferida, pois pode ser feita tração insignificante de CO2 no ar ou no estôma-
com maior rapidez que a nasotraqueal.2,6 go. Apesar de a detecção de CO2 exalado em
pacientes com ritmo cardíaco com perfusão ser
método sensível e específico para confirmar a lo-
calização do tubo na traqueia, não é confiável para
confirmar a intubação em pacientes com parada
cardíaca. Nestes, a ausência de CO2 exalado não
indica que o tubo esteja em posição esofágica,
pois estes pacientes têm fluxo sanguíneo pulmo-
nar limitado e, portanto, mesmo que o tubo esteja
na traqueia pode ser que o CO2 não seja detecta-
do. Além da parada cardíaca, outras condições
que causam fluxo muito baixo de CO2 expirado
podem produzir resultados enganosos, como por
exemplo, em adultos com asma grave e edema
pulmonar, pode haver eliminação de CO2 prejudi-
cada, com resultado falso negativo. Pode haver
também contaminação do detector colorimétrico
com ácidos ou fármacos ácidos, como a epinefri-
na administrada por via intratraqueal. Deve-se
suspeitar desta contaminação se a cor permane-
cer amarela em todo o ciclo respiratório. Outras
formas de confirmar a intubação são pela obser-
Figura 6: Visão da glote exposta pela colocação da lâmina curva vação de vapor d’água no tubo durante a exala-
do laringoscópio na valécula. ção (é sugestiva, mas não confirma a intubação);
181
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança http://www.fmrp.usp.br/revista
melhora da saturação de oxigênio ou sua perma- ente. Lembrar que uma das causas de aumento
nência em níveis adequados após a intubação, da resistência à ventilação manual com bolsa-
exceto se houver comprometimento pulmonar valva e ausência de expansão torácica é a obs-
importante; ausência de distensão epigástrica du- trução do tubo; neste caso, deve-se proceder à
rante a ventilação – caso ocorra, deve-se suspei- aspiração da cânula ou à troca do tubo, caso a
tar de intubação esofágica. Se persistir alguma obstrução seja extensa. Outra causa de ausência
dúvida sobre a posição do tubo, deve-se usar o de expansão torácica é o deslocamento do tubo e
laringoscópio para confirmar sua posição através a extubação do paciente. Assimetria da expan-
da visualização direta. Após confirmação da são torácica e da ausculta do murmúrio vesicular,
intubação, fixa-se a cânula, e depois confirma-se quando maiores à direita, sugerem intubação se-
a posição correta do tubo na traqueia pela radio- letiva, pois a tendência natural da cânula é entrar
grafia de tórax (o local adequado é pelo menos 1 no brônquio fonte direito, que é mais retificado
cm acima da carina ou na altura da segunda ou que o esquerdo. Nestes casos, deve-se observar
terceira vértebra torácica).3 também a medida em que foi fixado o tubo, para
- Causas de deterioração aguda de pacientes verificar se o mesmo pode ter se deslocado. Caso
intubados: Os pacientes intubados estão em ris- persistam dúvidas se o paciente está ou não
co constante de apresentar problemas que po- intubado, faz-se a observação direta com larin-
dem resultar em perda potencialmente fatal da goscópio e, se necessário, reintuba-se imediata-
função das vias aéreas. Para detectar estes pro- mente o paciente ou reposiciona-se o tubo no lo-
blemas precocemente e solucioná-los prontamen- cal correto, de acordo com a medida da profundi-
te, o paciente deve estar monitorizado com oxi- dade de inserção do tubo inferida pela fórmula (3
metria de pulso e monitorização cardíaca e do x diâmetro do tubo), verificando a simetria da
CO2 exalado. Quando há desenvolvimento súbito ausculta pulmonar. Outra possibilidade de deteri-
de desconforto respiratório e/ou cianose, deve- oração súbita em paciente intubado que evolui com
se avaliar rapidamente se a troca dos gases e a assimetria da ausculta pulmonar é o pneumotó-
oxigenação estão adequadas, pela observação da rax hipertensivo. Clinicamente, este diagnóstico
expansibilidade torácica, monitorização não inva- pode ser suspeitado quando há diminuição do
siva (citada acima) e ausculta do tórax. Esta ava- murmúrio vesicular e timpanismo à percussão do
liação determinará a urgência da conduta a ser tórax no lado acometido; além disso, pode haver
tomada. As possíveis causas de deterioração sú- estase jugular, desvio de traqueia e sinais de bai-
bita podem ser recordadas pelo método mnemô- xo débito cardíaco devido à obstrução mecânica
nico DOPE: D = Deslocamento do tubo ocasio- ao fluxo dos vasos. A conduta de descompressão
nado pela extubação ou pela inserção do tubo deve ser feita rapidamente, assim que o pneumo-
além da carina, fazendo com que a intubação fi- tórax seja detectado clinicamente. Para a des-
que seletiva em algum brônquio; O = Obstrução compressão, utiliza-se agulha número 20, conec-
por secreção, sangue, corpo estranho ou torção tada a uma seringa com selo d’água, introduzin-
do tubo; P = Pneumotórax; E = falha de Equipa- do-a no segundo espaço intercostal, na linha he-
mento, tais como, desconexão do fornecimento miclavicular, na borda superior da costela inferior
de oxigênio, escape de ar do ventilador ou do cir- (terceira costela); se houver ar, o líquido dentro
cuito, falha mecânica ou do fornecimento de ener- da seringa borbulhará. Logo após a confirmação
gia. Na prática, para detectar estes problemas e de pneumotórax com a punção, deve-se proce-
solucioná-los imediatamente, deve-se proceder da der à drenagem torácica.3
seguinte forma: Se o paciente estiver acoplado
ao respirador, deve-se colocá-lo na ventilação Casos clínicos
manual com bolsa-valva; deste modo, pode-se
descartar a falha de equipamento e avaliar se a
complacência e a resistência pulmonar do paci- Caso 1
ente estão alteradas. Se a complacência estiver Criança de 6 meses, chega ao pronto atendi-
diminuída e a resistência aumentada, mais força mento com história de febre de 38º C há 3 dias, 1-2
deverá ser aplicada na bolsa para ventilar o paci- picos por dia, que cede com antitérmico, coriza nasal
182
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
http://www.fmrp.usp.br/revista Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança
hialina, tosse rouca (como um latido de cachorro), e lento é inversamente proporcional à quinta potência
presença de sons inspiratórios. Evoluiu com descon- do raio da via aérea). Além disso, deve-se iniciar a
forto respiratório com piora progressiva, e hoje se apre- terapêutica específica para a doença de base. No caso,
senta com cansaço mais acentuado, sendo trazida para usa-se aerossol com adrenalina 0,5 mL/kg/dose (máx.
atendimento. 5 mL) de h/h ou a cada 2 h, e corticosteroide EV ou
Cenário 1. Inicial: Ao exame, a criança en- IM (dexametasona 0,15 mg/kg/dose de 6/6 h).
contra-se agitada, com cianose central, retração de
fúrcula esternal à inspiração, retração intercostal e Caso 2
estridor inspiratório audível sem estetoscópio. A fre- Criança de 5 anos, apresenta tosse há uma se-
quência respiratória é de 68 ipm, a frequência cardía- mana, inicialmente seca, que se tornou produtiva há 3
ca de 160 bpm, com pulsos periféricos e centrais pal- dias, acompanhada de febre alta de difícil controle com
páveis e cheios, tempo de enchimento capilar 2 seg, antitérmicos, além de perda do apetite e queda do es-
pressão arterial 90/50 mm Hg. A oximetria de pulso tado geral, que vêm piorando progressivamente. Hoje
revela saturação de O2 de 80%. a mãe notou que criança estava com muita dificulda-
de para respirar e a trouxe para atendimento.
Pergunta-se: Quais são o diagnóstico e a con- Cenário 1. Inicial: Ao exame, a criança se en-
duta? contra inconsciente, com cianose generalizada e
Resposta: O diagnóstico é de insuficiência dispneia importante, com respiração tipo “gasping”,
respiratória aguda secundária à obstrução de vias aé- frequência respiratória de 8 ipm, frequência cardíaca
reas superiores (com desconforto respiratório na fase de 150 bpm, pressão arterial de 110/ 60 mm Hg, pul-
inspiratória), tendo como causa provável a laringite sos periféricos e centrais cheios, tempo de enchimen-
viral (crupe). A conduta adequada é: 1) Permeabilizar to capilar de 2 segundos. A ausculta pulmonar revela
as vias aéreas pelo posicionamento da cabeça com diminuição do murmúrio vesicular à direita, com
colocação de coxim sob os ombros, alinhando o meato estertores crepitantes na base. A oximetria de pulso
auditivo com a parte anterior do ombro, e aspirar as mostra saturação de O2 de 70%.
vias aéreas com delicadeza, pois a aspiração pode
provocar laringoespasmo, piorando a obstrução Quais são o diagnóstico e a conduta?
provocada pelo edema adjacente à laringe. 2) Ofertar Resposta: O diagnóstico é insuficiência respi-
oxigênio. Como neste caso, a criança ainda mantém ratória aguda em iminência de parada respiratória (com
um drive respiratório efetivo, com frequência e es- respiração agônica tipo “gasping” e bradipneia), de-
forço respiratório adequados, pode ser ofertado O2 vido à provável pneumonia bacteriana. A conduta ini-
com máscara não reinalante com fluxo de oxigênio de cial consiste em posicionar a cabeça da criança pela
10-15 L/min. Após cada procedimento, deve-se re- colocação de coxim sob o occipício, aspirar as vias
avaliar a criança. aéreas e, logo em seguida, iniciar ventilação com pres-
Cenário 2. Após reavaliação: A reavaliação são positiva com bolsa-valva e máscara. Como a cri-
após permeabilização de vias aéreas e oferta de oxi- ança possui perfusão sanguínea no pulmão (ou seja,
gênio revela que a criança está sem cianose, com sa- não está em parada cardíaca), deve-se ventilar com
turação de O2 de 94%, mantém estridor com retração frequência de 12-20 movimentos por minuto, e se ne-
de fúrcula, frequência cardíaca de 120 bpm, pressão cessário, aumentar a frequência da ventilação con-
arterial de 90/50 mm Hg, tempo de enchimento capi- forme a saturação de O2 na oximetria de pulso.
lar de 2 segundos, pulsos periféricos e centrais cheios, Cenário 2. Após reavaliação: A criança apre-
mas quando ela chora ou se agita, a saturação de O2 senta expansibilidade torácica adequada à ventilação
cai para 89%. assistida com bolsa-valva e máscara, mantendo satu-
ração de O2 de 95%, mas está entregue à ventilação
Pergunta-se: Qual é a conduta? manual.
Resposta: É necessário acalmar a criança, dei-
xando-a em posição confortável, de preferência no Pergunta-se: Qual é a conduta agora?
colo da mãe, pois quando ocorre agitação, o fluxo de Resposta: O próximo passo é a intubação oro-
ar se torna mais turbulento, dificultando a sua passa- traqueal, com cânula número 5 (Idade/4 + 4 ~ 5), fixa-
gem (a resistência à passagem de ar com fluxo turbu- da em 15 (3 x diâmetro interno da cânula = 15).
183
Medicina (Ribeirão Preto) 2012;45(2): 168-84
Matsuno AK. Insuficiência respiratória aguda na criança http://www.fmrp.usp.br/revista
ABSTRACT
This paper presents a review of the definition, pathophysiology and management of respiratory distress
and failure in children, and emphasizes the most appropriate devices for oxygen delivery. Children are
more susceptible to severe respiratory problems, which are leading causes of pediatric emergency
room demand. Prompt recognition and effective management of respiratory problems are essential to
improve outcome of these patients.
Keywords: Respiratory Failure. Child. Emergency Service, Hospital. Oxygen Delivery Devices.
184