Terapia Ocupacional Ginecologica
Terapia Ocupacional Ginecologica
Terapia Ocupacional Ginecologica
RESUMO: Por meio do relato de caso, este artigo apresenta a atuao do terapeuta ocupacional na enfermaria de ginecologia do
Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros, referncia na Zona Leste de So Paulo. Descreve os atendimentos clnicos e apresenta os
pressupostos tericos que norteiam a interveno.
DESCRITORES: Ginecologia-hospitalizao,Terapia Ocupacional,Sade da Mulher
ABSTRACT: By means of a case story, this article presents the performance of the occupational therapist in the gynecology infirmary of
Maternity Hospital Leonor Mendes de Barros, reference in the East Zone of So Paulo. It describes clinical assistance and it presents the
theoretical assumptions that guide the intervention.
KEYWORDS: Gynecology-hospitalization,Occupational Therapy,Womans Health
RESUMEN: Por medio de una historia de caso, este artculo presenta el funcionamiento del terapeuta ocupacional en la enfermera de
ginecologa del Hospital- Maternidad Leonor Mendes de Barros, referencia en la Zona Este de So Paulo. Describe las asistencias clnicas
y presenta las bases tericas que dirigen la intervencin.
PALABRAS LLAVE: Ginecologia-hospitalizacin,Terapia Ocupacional,Salud de la mujer
*
Terapeuta Ocupacional do Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros e da Irmandade Santa Casa de Misericrdia de So Paulo.
Especialista em T.O. aplicada Neurologia: uma viso dinmica. [email protected].
e em Terapia Ocupacional em reabilitao neuro-msculo-esqueltica.
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Terapeuta Ocupacional do Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros. Especialista em T.O. aplicada a Neurologia: uma viso dinmica.
Especializanda em Terapia Ocupacional dinmica pelo Centro de Estudos de Terapia Ocupacional (CETO). [email protected]
***
Professor Doutor pela UNICAMP. Diretor do Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros.
****
Psicloga-chefe do Grupo de Reabilitao do Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros.
tucional que no prev os desejos A terapeuta ocupacional foi at cupada com a qualidade do produ-
e necessidades das pacientes. o leito, onde a paciente j a aguar- to final. Falou sobre a possibilida-
Os procedimentos de terapia dava, e sugeriu algumas atividades, de de passar o final de semana no
ocupacional auxiliam na organi- dentre as quais M. escolheu a pin- quarto vazio, j que suas compa-
zao de uma parte das atividades tura em tela. Na sala de atendi- nheiras teriam alta hospitalar.
do dia a dia da paciente, conside- mentos, o material foi oferecido: A terapeuta sugeriu deixar a ati-
rando-se sua histria de vida. tela (com desenho de paisagem j vidade para que M. pudesse finali-
Nos atendimentos individuais gravado), tintas e pincis. z-la. A paciente foi orientada sobre
de terapia ocupacional, as ativida- No incio da terapia, M. apre- a necessidade de realizar as refeies
des so de livre escolha, com ma- sentou-se insegura quanto qua- nos horrios marcados e dividir o
terial fornecido pelo hospital, sen- lidade do produto final. Cuida- tempo para descansar e realizar a
do que o produto final fica com as dosa, com medo de errar, passou atividade sem pressa. Observou-se
pacientes. todo o tempo da terapia (40 minu- que a paciente estava um pouco
Durante a terapia, as queixas tos) pintando a parte referente ao menos preocupada com a qualidade
de dor e reclamaes tambm so cu. Comentou sobre a sua casa, do produto final.
constantes. Alm da dor fsica, seu marido e seus filhos, principal- Alm do ensino de atividades,
existe a dor da perda de uma parte mente os problemas relacionados importante que o terapeuta po-
ao filho mais novo. sicione adequadamente a paciente
do corpo que representa sua iden-
No final do atendimento a pa- e a oriente sobre a importncia da
tidade feminina, o medo da cirur-
ciente recebeu a visita de seu filho organizao da rotina, dividindo o
gia e o medo da morte.
mais novo, e o assunto era a rotina tempo entre autocuidado, descan-
Atravs do relato de caso, pre-
da casa de M., sem ela. O filho deu so e lazer.
tende-se apresentar os procedi-
apenas boas notcias, relatando sua Permite-se que a paciente fique
mentos, as dificuldades e os resul-
experincia de dono de casa, em com as atividades pois considera-
tados do atendimento da terapia se que as atividades possibilitam a
ocupacional. lavar, passar, fazer o almoo etc.
manuteno da realidade externa
Em vez do aplacamento de sin-
e ampliam o campo da conscincia,
tomas, na terapia ocupacional pro-
Relato de caso permitindo o autoconhecimento e
pe-se o fazer para construir ou
o fazer-se conhecer (Benetton,
Os atendimentos sero descritos reconstruir cotidianos [...] ape-
1999). Na ausncia da terapeuta, as
em ordem cronolgica, seguidos de sar de doena ou de deficincia
atividades podem funcionar como
comentrios grafados em itlico e (Benetton et al., 2000). Segundo
o objeto transicional que ajuda a
articulando consideraes tericas. Takatori (2001), busca-se com o
sustentar a espera entre um aten-
tratamento de terapia ocupacional, dimento e outro.
Sesso 1 apesar da doena e da internao, So as manifestaes transferen-
A psicloga da equipe interdis- a possibilidade do resgate dos as- ciais positivas, nascidas de uma
ciplinar solicitou atendimento de pectos saudveis. O cotidiano pre- aliana provida pelo fazer parti-
terapia ocupacional para a pacien- cisa ser marcado com momentos lhado, que estabelecem a depen-
te M., 67 anos, ps-mastectomia. agradveis e de possibilidades de dncia, dependncia esta necess-
O principal motivo do encaminha- construo. Observa-se o medo ini- ria tanto por parte da terapeuta
mento: a paciente j estava inter- cial da paciente com relao s difi- ocupacional como no uso do pro-
nada nesse local por alguns dias e culdades na atividade e ficam cla- fessor, porque dela decorre a pro-
devido complicao do seu qua- ros em seu discurso a saudade e a duo, a construo e a criao no
dro clnico e necessidade de ini- preocupao com a casa e a famlia. desenvolvimento psico-educacio-
ciar antibioticoterapia, a internao nal. (Benetton, 1994)
se prolongaria. A paciente queixava- Sesso 2
se de dor e da falta do que fazer. A terapeuta foi atender M. no Sesso 3
A psicloga props paciente final do dia, que j a aguardava Por volta das 16:00hs a terapeu-
que realizasse algo durante o pero- ansiosamente, pois achava que a ta encontrou a paciente contente
do de internao, falando da tera- terapeuta no iria v-la neste dia. com o produto final, e M. solicitou
peuta ocupacional. M. relata que A paciente foi posicionada da outro quadro para pintar. Preocu-
sempre quis pintar, mas nunca ti- melhor forma possvel no leito. M. pou-se em devolver todas as tintas
vera oportunidade. ainda se apresentava muito preo- deixadas no final de semana, fazen-
do questo de cont-las. A terapeu- dades e da vida do paciente, mas terapeuta responde que no, pois a
ta disse que no era preciso devol- ajud-lo a, apesar dessas dificulda- paciente estava dormindo. A T. O.
ver e que deixaria com ela para que des, realizar algo concretamente falou sobre a possibilidade de assi-
fossem utilizadas no dia seguinte, com sucesso e satisfao. Atravs nar os quadros j pintados. M. fina-
durante o perodo da manh, en- das marcas na realidade externa, lizou o terceiro quadro, contente e
quanto a terapeuta no estivesse tambm vai sendo transformada a confiante.
no hospital. M. contou sobre o final realidade interna. A paciente j no ficava mais an-
de semana sozinha, porm com siosa pela presena da terapeuta, pois
um quadro para terminar, alm das Sesso 4 tinha as atividades e a constncia da
visitas familiares, e mencionou que s 14:45hs, a terapeuta encon- presena da terapeuta, que marcaram
sua neta e seus filhos adoraram o trou a paciente realizando a pintu- um ritmo e um tempo dentro da roti-
quadro. Ela mesma, talvez por re- ra no leito, j no trmino do segun- na hospitalar
ceber muitos elogios, brincou com do quadro. M. estava bastante ani- Para as terapeutas ocupacio-
a possibilidade de expor seus qua- mada, e com a auto-estima eleva- nais francesas
dros no hospital. Disse tambm da, pois estava recebendo muitos o terapeuta ocupacional uma
que entrara doente no hospital e elogios da equipe e de todos os que referncia. A referncia do tempo e
sair pintora. olhavam seus quadros. Falou da de um lugar precisos. O tempo de
Na situao teraputica a ativi- possibilidade da visita de sua filha, terapia ocupacional pode se inscre-
dade precisa ter sentido para o pa- que poderia trazer alguns quadros ver de outro modo, para viver coisas
ciente, ser agradvel de forma a for- para ela pintar. Iniciou o terceiro diferentes. O que se faz em terapia
necer-lhe prazer (Benetton, 1999). quadro. O material continuou sen- ocupacional diferente do que se faz
Alm disso, o fato do sucesso na do deixado com a paciente, j mais fora, pois feito na presena de uma
atividade tambm foi importante. acostumada com essa rotina e me- referncia. Alis, o paciente, mes-
Para o paciente da terapia ocupacio- nos preocupada com essa respon- mo em crise aguda, tem lembrana
nal, marcado por histrias de insu- sabilidade. M. relatou que estava do que feito em nossa presena.
cessos, dores e dificuldades, a satis- se sentindo requisitada ao receber (Arnaud et al., 1994, p. 2)
fao com o produto final, compar- uma visita de uma outra paciente
tilhado e validado pelo mundo ex- da enfermaria que estava interes- Sesso 6
terno, fundamental. o terapeuta sada em ver seus quadros, junta- A terapeuta encontrou a pa-
ocupacional quem deve, atravs de mente com a psicloga. O assunto ciente realizando atividades no
suas tcnicas, facilitar o fazer. Isso da terapia passou a ser os elogios leito s 14:20hs, pintando o qua-
s possvel se o terapeuta conhece das pessoas. dro que sua filha havia lhe trazido.
a dinmica de realizao de ativi- Percebe-se que o fato das ativi- M. contou que daria este quadro
dades, que Benetton (1994) nos fala dades terem sido realizadas com para uma pessoa do hospital que
que est embutida na tcnica e se sucesso possibilitaou uma mudan- havia lhe pedido. Falou sobre o
caracteriza pela qualidade de per- a no discurso e na postura da pa- seu dia, cheio de procedimentos
mitir aglutinar, superpor, queimar, ciente: j no fala mais da dor, mas pela manh (medicao, fisiote-
trocar e criar etapas sem alterar o dos elogios e das atividades. rapia etc.), restando apenas um
produto. ela que tambm nos ofe- As atividades, em terapia ocupa- tempo para pintar no perodo da
rece a delimitao do movimento, cional, no existem apenas para tarde. Comentou que as pessoas
ritmo, balano corporal, assim co- serem feitas mas para serem tam- estavam pedindo seus quadros e
mo alguns caracteres dos investi- bm conversadas, discutidas, de- por isso precisaria pintar mais para
mentos fsicos, psicolgicos e sociais batidas, orientadas, mudando de poder presentear a todos. Quan-
requeridos para a realizao de uma lugares, de pessoas e, ateno, in- do a terapeuta observou os outros
dada atividade. Ela , ento, tudo clusive admitindo a possibilidade quadros, encontrou-os assinados.
de subjetivo que uma tcnica po- de no serem feitas. (Benetton, As observaes da terapeuta
de conter (Benetton, 1994). Essa 1994). com relao s atividades vo sen-
tcnica de realizao de atividades do incorporadas pela paciente. As
de domnio do terapeuta ocupa- Sesso 5 atividades so o tema das con-
cional, que a partir dela pode ofere- M. foi encontrada no leito reali- versas com a terapeuta; h mais
cer ao paciente a possibilidade de zando a atividade. Perguntou sobre sobre o que se falar: o discurso sai
fazer algo com sucesso. No se trata a outra paciente: se ela havia inicia- da doena e passa a ser sobre o
de ignorar as dificuldades das ativi- do a pintura, ou outra atividade. A que se faz.
REFERNCIAS
Arnaud C, Bernard-Granger C. et al. Terapia ocupacional e sade mental: reflexes de um grupo de trabalho. J dErgotherpie
1994; 16(4):157-162.
Benetton MJ. A terapia ocupacional como instrumento nas aes de sade mental. [tese]. Campinas: [s.n.]; 1994.
Benetton MJ. Trilhas associativas: ampliando recursos na clnica da terapia ocupacional. So Paulo: CETO; 1999.
Takatori M. A terapia ocupacional no processo de reabilitao: construo do cotidiano. Mundo Sade 2001; 25(4):371-377.