Glaura
Glaura
Glaura
II - A poca e o Estilo
Reao aos exageros do Barroco
Volta aos modelos clssicos greco-romanos e renascentistas
Ordem direta da frase, com uso do verso branco
Arte voltada para o Belo, Bem, Perfeito e Equilbrio
Bucolismo, pastoralismo e Mimesis.
Motivos Clssicos: Fugere Urbem (fuja da cidade); Locus
Amoenus(lugar tranqilo); Aurea mediocritas(Busca do equilbrio);
Carpe Diem(Aproveite o dia) e Inutilia Truncat(Acabem-se com as
inutilidades).
Surge na poca o Rococ, que alguns crticos observam em Gonzaga e
Silva Alvarenga, onde so acentuados certos traos arcdicos, abusando da
linguagem melodiosa, mesclando natureza e volpia, excedendo-se na
afetao lrica, registrando cenas ntimas e domsticas, valorizando as
miniaturas, os minuetos musicais, as porcelanas, as mscaras e os disfarces.
Com Glaura, realiza a sua mais caracterstica poesia lrica, fruto do
movimento arcdico ou neoclssico.
O livro composto por 60 ronds e 57 madrigais.
De acordo com os princpios estticos neoclssicos, o poeta no possui
liberdade total de composio.
Os poemas de Glaura obedecem a uma moldura: todos so rimados e
metrificados, submetidos ao formato do rond e do madrigal.
O rond, de origem francesa, j traz no nome a idia de circularidade,
Em sua maioria, ele composto por treze quadras, sendo que o estribilho
(refro) abre e fecha a composio, alm de aparecer trs vezes aps duas
quadras. Quanto mtrica, a maioria dos ronds exibe a redondilha maior.
J os madrigais so compostos, geralmente, de oito a onze versos,
numa s estrofe, alterando hexasslabos com decasslabos.
Os poemas de Silva Alvarenga trazem os principais elementos estticos
da literatura pastoril, apoiando-se na simplicidade, na claridade do
pensamento, bem como nas constantes referncias mitologia clssica:
No recreiam sempre os montes// Coas delcias de Almatia;
Vem, Glaura, a ruiva areia,// Rio e fontes animar.
Nesse trecho do Rond VI A praia, o poeta faz referncia cabra que
amamentou Zeus.
Ao longo da obra, h vrias referncias mitologia greco-romana
(Ninfas, divindades midas e fecundas; Napias, ninfas dos vales e
pradarias; Dris, me das nereidas, as ninfas do mar; Galata, uma das
nereidas, que foi amada do ciclope Polifemo; Orfeu, o cantor que foi ao
Inferno em busca da mulher Eurdice, etc, etc.).
O poeta delega sua voz lrica ao Pastor Alcindo(alter-ego), que finge
viver numa suposta Arcdia, entre grutas, brenhas, Ninfas.
Sua amada Glaura, nome fictcio de mulher, talvez inspirado na Laura
de Petrarca, poeta do pr-classicismo italiano; talvez em Clara ou
Laureana, suposta namorada de Silva Alvarenga, falecida no RJ.
H crticos que at questionam a existncia real da amada.
Para Antonio Candido, no importa se os textos foram ou no inspirados
em um amor infeliz, o fato que no se sente aqui a presena dela pois
no se traa uma s vez um retrato realista da amada. Poeticamente, Glaura
tornou-se um mito, inspirando muitos nomes, at mesmo de pessoas que
no nasceram, como em Nana para Glaura, de Jos Paulo Paes de onde
colhemos essa quadra:
Dorme quem// nem os olhos abrisse
por saber desde sempre// quanto o mundo triste.
Esse clima triste e lrico o que prevalece em Glaura.
Toma a lira, Alcindo Amado,// Neste prado Glaura canta;
Ah! levanta a voz dvina,// E me ensina a suspirar.
Importante: embora repleto de elementos convencionais do Arcadismo,
o livro chama nossa ateno para aspectos da paisagem nacional (cajueiro,
mangueira, jasmineiro, jambo, Gvea, Jequitinhonha), bem como
referncias aos meses em que o calor brasileiro comea e atinge a plenitude
(agosto, dezembro e fevereiro).
O madrigal XLIX, por exemplo, exibe a mescla de elementos
convencionais com aspectos brasileiros:
Flexvel Jasmineiro,// Cobre os teus ramos de cheirosas flores:
Favnio lisonjeiro// J torna a ver as Ninfas e os Pastores.
Glaura, vem; terno Amor, ah! que favores
No espera alcanar um puro amante?
Neste ditoso instante// Foge veloz o ardente Fevereiro.
Flexvel Jasmineiro, Cobre os teus ramos de cheirosas flores;
Que elas ho de adornar os meus Amores.
O vento austral (Favnio), os Pastores e as Ninfas (divindades dos
bosques) misturam-se com elementos brasileiros, como o Jasmineiro e o
quente ms de Fevereiro
A forma do madrigal (uma estrofe com versos hexasstabos e
decasslabos), embora mais flexvel que a do rond (geralmente quadras
heptasslabas seguidas de estribilhos), exemplifica o formato neoclssica.
Alguns crticos, com certo exagero, vem a manifestao pr-romntica
nesses ndices de nativismo.
Para Jos Aderaldo, tais elementos nativistas so componentes de uma
paisagem propcia aos idlios, constituindo apenas cor local destituda de
sentimentos e sem intenes de adequar a nossa paisagem aos ideais da
paisagem-modelo arcdica.
Alvarenga pode ser sim, um precursor romntico, no simplesmente por
citar plantas e frutas, mas por trazer um lirismo lnguido, meloso,
extremamente musical, que contagiar as futuras baladas e serenatas.
Destaca-se tambm o fato de ser ele o nico rcade que deixa de lado
carneiros e ovelhas, j que em seu bestirio entram cobras, onas,
panteras, morcegos, pombas e beija-flores.
Em seus textos tericos sobre a arte, Silva Alvarenga aconselhava que o
poeta precisa seguir as leis mais simples da prpria natureza.
Tanto a pintura quanto o fato narrado deveriam brotar de forma
espontnea da composio. Era preciso evitar a exibio erudita,
responsvel por tornar o texto artificial demais.
Sua subjetividade sentimental, abundante em interjeies, prenuncia o
clima romntico e evoca as serestas, visvel no rond L, A Lua:
Como vens to vagarosa,// formosa e branca Lua!
Vem coa tua luz serena// Minha pena consolar.
Oh que lgubre gemido// Sai daquele cajueirol
E do pssaro agoureiro// O sentido lamentar.
Para Lus Andr Nepomuceno parece ser exagerado o rtulo de pr
romntico: Silva Alvarenga, longe das disposies subjetivas que lhe
foram atribudas pela crtica romntica e ps-romntica, poeta cannico,
horaciano, formado luz das poticas de Boileau e de Cndido Lusitano, e
tem como princpio, na poesia lrica, um padro esttico puramente
corteso. Tambm longe do intimismo que lhe foi atribudo, toda a sua
potica, mesmo nos versos de maior sensibilidade configurada sob um
jogo de artificialismos e convenes que determinam uma espcie de
controle metdico e terico da expresso. Mesmo nos ronds que se
referem morte de Glaura (os dez ltimos), a conduta do poeta sempre o
redimensionamento de velhos temas arcdicos e petrarquistas