Nutrição Básica e Metabolismo Livro

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 201

NUTRIO BSICA

E METABOLISMO

NEUZA MARIA BRUNORO COSTA

MARIA DO CARMO GOUVEIA PELUZIO

Viosa - UFV 2007

1
NDICE

Contedo Pgina
Captulo 1 Conceito e Histrico da Nutrio 1
Captulo 2 Digesto e Absoro no Trato Gastrointestinal 8
Captulo 3- Carboidratos 20
Captulo 4- Fibras 45
Captulo 5- Protenas 64
Captulo 6- Lipdios 84
Captulo 7- Metabolismo Energtico 100
Captulo 8- Vitaminas 113
Captulo 9- Minerais 140
Captulo 10- gua e Eletrlitos 182
Captulo 11- Antioxidantes da Dieta 192

2
Captulo 1: CONCEITO E HISTRICO DA NUTRIO
Snia Machado Rocha Ribeiro
Neuza Maria Brunoro Costa
1.1. Conceito
Nutrio o processo atravs do qual os organismos vivos utilizam as substncias necessrias para a manuteno da
vida. Inclui, portanto, no s a retirada da matria-prima do ambiente, mas todos os processos necessrios para a
disponibilizao das substncias (nutrientes) dentro da clula, na via metablica da qual o nutriente participa. A nutrio ocorre
em todos os seres vivos, vegetais e animais, unicelulares e pluricelulares, por dois mecanismos, que so a autotrofia e a
heterotrofia. Todo esse processo converge para um objetivo geral: obteno de energia.
Quando se considera a inter-relao de todas as formas vivas, percebe-se que, pequena parte da energia solar (a outra
parte destinada ao aquecimento) que alcana a superfcie da Terra absorvida pelos vegetais, que funcionam como
conversores de energia, uma vez que transformam energia luminosa em energia qumica. Esta ltima a modalidade de energia
utilizvel pelos seres vivos e armazenada em molculas, primariamente na forma de carboidrato, o qual precursor da sntese
de lipdios e protenas. A partir dessas trs molculas armazenadoras de energia, so sintetizadas outras molculas no
fornecedoras de energia, mas necessrias aos processos biolgicos. Assim, quando se consideram os nveis trficos ou
alimentares, a planta verde ocupa o nvel trfico de produtor e os animais de consumidores.

1.2. Histrico
Nutrio um campo interdisciplinar da cincia e interprofissional por excelncia. Embora o processo da nutrio seja
to antigo quanto a vida no planeta, o interesse pelo entendimento cientfico do assunto pode ser considerado recente. Por muito
tempo, a pesquisa no campo da nutrio foi conduzida por investigadores bioqumicos, visando desvendar os segredos do
metabolismo. As vitaminas foram descobertas uma a uma, no perodo de 1910 a 1940, quando foi possvel identificar que os
fatores causais de diversas doenas estavam associados carncia de alimentos especficos. At esta data, o conhecimento de
nutrio foi caracterizado por poucas, mas grandes descobertas, desde as experincias de Lavoisier, o pai da nutrio, no
sculo XVIII, quando vrias hipteses foram elaboradas com poucas comprovaes cientficas. Pode se afirmar que a
vitaminologia constituiu um marco no campo da cincia da nutrio, que at ento no existia, enquanto corpo terico
cientfico.
A histria da nutrio, como cincia, a prpria histria da evoluo do conhecimento sobre os nutrientes.
Compreende desde a sua identificao, como componentes alimentares at a comprovao de seus efeitos no organismo e a
elucidao de vias bioqumicas das quais estes participam. O conhecimento sobre os carboidratos iniciou-se com as descobertas
registradas na ndia (3000 a. C.), quando foi descrito o processo de extrao do acar. Em 1493, com as cruzadas, introduziu-
se o acar da cana no Novo Mundo, e, a partir de 1812, qumicos russos j realizaram estudos qumicos preliminares com o
amido, submetendo-o aos tratamentos trmico e cido. Em 1844, foram identificados os tomos componentes dos carboidratos
(carbono, hidrognio e oxignio) e demonstrada a presena de acar no sangue, apesar de a urina doce j ter sido noticiada
pelos hindus, no sculo VI. Em 1856, Claude Bernard descobriu a presena de amido no fgado, o que na poca, se acreditava
ser formado a partir de alimento protico. Os estudos bioqumicos marcantes das vias de metabolismo de carboidratos datam de
meados do sculo XX. A determinao das vias glicolticas, ciclo do cido ctrico, transporte mitocondrial de eltrons, ciclo da
uria e outras, esclareceu sobre como o meio biolgico extrai energia dos macronutrientes. Entretanto, na rea de nutrio
humana novos conhecimentos emergiram a partir de observaes dos diferentes efeitos metablicos dos carboidratos,
constitudos de diversas unidades de monossacardeos e tipos de ligaes glicosdicas. Em meados de 1980, houve uma
exploso de evidncias cientficas que contriburam para o avano do conhecimento da nutrio sobre os polissacardeos no
digerveis pelo organismo humano, culminando na melhor compreenso sobre as estruturas qumicas de compostos
(polissacardeos ou no) que constituem a fibra alimentar.
No incio do sculo XIX foi descoberta uma substncia contendo nitrognio, a qual era requerida na dieta, mas s um
sculo mais tarde (1930) houve a identificao dos constituintes da protena. O interesse na caracterizao das protenas, a
identificao dos aminocidos e o estabelecimento de seus requerimentos pelo organismo humano tambm datam do sculo
XX. Registros da sndrome da deficincia protica foram feitos no Mxico em 1985, mas sem a associao com a ingesto de
protena. Do final do sculo XIX at o perodo ps-guerra (1950) so registradas vrias descries enfocando o quadro clnico
da carncia protica, mas apenas em 1959 Jellife denominou a sndrome como a m-nutrio protico-calrica. A partir de
ento, intensificaram-se os estudos sobre a deficincia diettica da protena, em vrias regies do mundo, o que conduziu ao
conhecimento do efeito qualitativo e quantitativo das protenas alimentares sobre o crescimento humano e a necessidade de se
estabelecerem quantidades dirias que devem ser ingeridas na dieta. Essa realidade fortaleceu os trabalhos de alguns comits de
nutrio, j iniciados a partir de 1940 e que, atravs de organismos internacionais so responsveis pelo estabelecimento das
recomendaes nutricionais. Pode-se considerar que a protena foi o nutriente mais pesquisado no incio da histria da cincia
da nutrio humana, justificando a atribuio de funo nobre protena. Atualmente, no se pode considerar um nutriente
mais importante que o outro, pois todos tm as suas funes no meio biolgico.
As pesquisas sobre lipdios iniciaram-se a partir dos estudos sobre o colesterol. Em 1930, ficou demonstrado que ratos
sintetizavam menos colesterol quando alimentados com uma dieta contendo colesterol. Em 1950 ficou demonstrado, in vitro,
que a sntese de colesterol a partir de acetato no fgado era suprimida pela ingesto de colesterol na dieta. A partir de tais
3
evidncias surgiram os estudos para a determinao das vias metablicas da sntese de lipdios e a grande preocupao com a
quantidade de gordura ingerida na dieta, como fator de risco das doenas cardiovasculares. Em 1979, trabalhos cientficos
evidenciaram a baixa incidncia de doena coronariana em esquims, os quais consumiam deitas ricas em lipdios
poliinsaturados. Esse trabalho pioneiro marcou para a nutrio uma nova etapa, na qual se considera que os efeitos dos lipdios
dietticos no organismo dependem no s da quantidade ingerida, mas tambm de sua qualidade. Os ltimos 15 anos do sculo
XX podem ser considerados, para a nutrio humana, os de maior avano no conhecimento dos lipdios.
Em paralelo ao avano do conhecimento das rotas metablicas dos macronutrientes, de suas estruturas e funes
biolgicas, identificou-se a importncia dos minerais, bem como foram estabelecidas as funes das vitaminas. A contribuio
da medicina foi relevante no despertar da curiosidade cientfica para investigar as causas de vrias doenas carenciais de
vitaminas e minerais. medida que se comprovava a participao dos nutrientes no aparecimento de doenas, surgiu a
necessidade de se conhecer melhor a composio dos alimentos, visando combin-los e prepar-los, de forma adequada, para
prevenir ou curar tais doenas. Assim nasceu, por uma necessidade da medicina, um ramo da cincia da nutrio, denonimado
diettica. Em 1981, Pedro B. Landabure escreveu a cincia da nutrio tem adquirido nos ltimos 30 anos uma importncia
antes inesperada. Isso resultou da evidncia de que a sade se mantm em conseqncia de uma alimentao correta; muitas
enfermidades podem surgir, manter-se ou se curar com uma alimentao adequada. Percebe-se nesse comentrio o conceito de
alimentos funcionais, o que, no momento, tem sido apresentado como uma atualidade.
claro que cada continente teve seu prprio percurso no avano da cincia da nutrio. Na Amrica Latina, os
escassos registros histricos tm permitido destacar a influncia de alguns trabalhos na evoluo do conhecimento da nutrio
como uma cincia. Os estudos sobre a relao da alimentao e patologias deram origem a uma transformao dos
procedimentos da clnica mdica, iniciada oficialmente em 1937, quando Pedro Escudero iniciou sua atuao na ctedra de
clnica da nutrio (inspirada e criada por ele) na Universidade de Buenos Aires. Por vrias dcadas, os trabalhos de Escudero
enriqueceram a clnica mdica, com estudos que relacionavam patologias e teraputicas dietticas, dando subsdios para a
proposio das bases doutrinrias da alimentao normal e da dietoterapia, baseada no conhecimento da composio dos
alimentos, nos requerimentos do organismo, na fisiologia e na tcnica diettica. A partir de ento, as leis da alimentao foram
o seu guia. Prosseguindo os trabalhos de Escudero, cita-se a contribuio de Jaime Espejo Sol, aluno de Escudero que
continuou os trabalhos de seu antecessor, no Instituto Nacional de la Nutricin, na Escuela Nacional de Dietistas. No Brasil, o
avano da cincia da nutrio ocorreu em paralelo expanso da atuao do profissional nutricionista e s pesquisas realizadas
nas diversas reas afins. Merecem destaque, como pioneiros dos trabalhos cientficos envolvendo o tema nutrio humana no
Brasil, os professores Nelson Chaves e Josu de Castro. O primeiro, atravs de suas publicaes no perodo de 1932 a 1944,
trouxe grande contribuio para a evoluo do conhecimento dos aspectos fisiolgicos e sociais da nutrio humana em nosso
pas, enquanto Josu de Castro sistematizou as informaes sobre a situao alimentar e nutricional do Brasil, lanando em
1946 o livro Geografia da Fome. A partir desses trabalhos, nascia a rea de estudo no campo da nutrio humana, que a
nutrio em sade pblica.

1.3. Perspectivas da Cincia da Nutrio


O avano da cincia da nutrio esteve, historicamente, e continuar sendo ligado ao aprofundamento dos
conhecimentos em outras reas correlatas. A biologia molecular causou um avano to grande na cincia que, no momento, h
uma sensao de que o homem estar, em breve, desvendando todos os mistrios dos organismos vivos: conhecendo o cdigo
gentico de cada um e ainda mais, podendo manipul-lo. Se isso vier acontecer, no se constituir, ainda, o limite para a cincia
da nutrio. Findados os trabalhos sobre o genoma, prosseguem as pesquisas sobre as protenas, os moduladores dietticos da
expresso de genes, as interaes gene-nutriente, os efeitos do nvel de nutrientes sobre a velocidade das reaes e suas
conseqncias metablicas. Alm disso, a composio dos alimentos necessita ser mais explorada.
A nutrio humana trabalha com um grupo limitado de substncias consideradas nutrientes. Entretanto, as evidncias
cientficas reforam a idia de que inmeros outros compostos no-nutrientes, presentes naturalmente ou adicionados aos
alimentos, exercem efeitos diversos no organismo humano e potencializam, anulam ou diminuem os efeitos dos nutrientes e de
outras substncias contaminantes do meio biolgico. Os estudos de interaes qumicas dos nutrientes in vitro se avolumam,
entretanto as interaes qumicas no meio fisiolgico no so ainda completamente conhecidas. Interaes que ocorrem no
lmen intestinal, anteriormente absoro dos nutrientes, dependem da composio do contedo intraluminal, o qual varivel
em cada refeio e, muito provavelmente, depende do status nutricional de cada nutriente e da ecologia intestinal de cada
indivduo.

1.4. Ingesto Diettica de Referncia IDR


1.4.1. Consideraes gerais
A partir de 1940 surgiram, em nvel mundial, Comits de Especialistas em Nutrio Humana com o objetivo de
determinar a quantidade que deve ser ingerida de cada um dos nutrientes para o organismo se manter saudvel, considerando
faixa etria, sexo e estados fisiolgicos. Surgiram tambm os estudos sobre as necessidades nutricionais de energia e de
nutrientes especficos, utilizando-se vrias metodologias. Atualmente, existem comits internacionais que estabelecem as
recomendaes para as populaes de pases especficos e dos pases em geral, os quais ainda no estabeleceram suas prprias
recomendaes nutricionais.

4
Desde 1941, a Food and Nutrition Board (FNB), da National Academy of Science, nos Estados Unidos, vem
estabelecendo Quotas Dietticas Recomendadas ou Recommended Dietary Allowances (RDAs), com a finalidade de fornecer
padres alimentares de ingesto de nutrientes. RDAs se definem como os nveis de ingesto de um nutriente essencial que,
com base no conhecimento cientfico, so julgados pela FNB como adequados para atingir a necessidade de praticamente todos
os indivduos saudveis. No atendem os indivduos com necessidades nutricionais especiais.
As recomendaes nutricionais so atualizadas medida que novos conhecimentos cientficos apontam a necessidade
de modificaes quanto s referncias para a ingesto dos nutrientes. A ltima atualizao foi em 1997, quando a FNB
estabeleceu novas bases para as recomendaes nutricionais de nutrientes, que foram denominadas Ingestes Dietticas de
Referncia (IDRs) ou Dietary Reference Intakes (DRIs). As IDRs compreendem conceitos atuais sobre o papel dos nutrientes e
componentes dos alimentos na sade ao longo do tempo, indo alm das recomendaes para prevenir deficincias nutricionais.
As IDRs so valores de referncia para nveis de ingesto de nutrientes, estabelecidos atravs de estimativas, para
serem usados no planejamento e avaliao da ingesto diettica de indivduos sadios.

1.4.2. Conceitos das IDRs


As IDRs compreendem quatro conceitos de referncia para a ingesto de nutrientes:
RDA - Quota Diettica Recomendada ou Recommended Dietary Alowances.
As RDAs so quantidades recomendadas considerando os nveis mdios de ingesto diettica dirios, suficientes para
atingir a necessidade nutricional de quase todos os indivduos sadios (97 a 98%), considerando-se faixas etrias, estados
fisiolgicos especficos e sexo. So metas para a ingesto diettica de indivduos sadios. As RDAs no foram determinadas
para se avaliar ou planejar a dieta de indivduos ou grupos populacionais.

EAR Estimated Average Requirement ou Necessidade Mdia Estimada


O EAR a quantidade de um nutriente que estimada para atingir a necessidade do nutriente pela metade dos
indivduos sadios de um grupo populacional. o nvel mais baixo de ingesto contnua de um nutriente que ir manter
adequado o estado de nutrio de um indivduo, em relao ao referido nutriente. EAR so usadas para avaliar a adequao da
ingesto de grupos populacionais e para estabelecer as RDAs. Se a necessidade de um nutriente segue uma distribuio normal
e o seu desvio-padro conhecido, ento a sua RDA ser igual EAR mais duas vezes o desvio-padro (RDA = EAR +
2DPEAR). Se os dados da variabilidade da necessidade do nutriente so insuficientes para se calcular o desvio-padro, o
coeficiente de variao de 10% assumido, estabelecendo-se que RDA = 1,2 x EAR. Se o coeficiente de variao de 15%,
ento RDA = 1,3 x EAR. EAR uma estimativa da necessidade do nutriente e fornece subsdios para o estabelecimento da
RDA.

AI Adequate Intake ou Ingesto Adequada


As AIs so nveis de ingesto diettica diria recomendados com base em aproximaes da ingesto de nutrientes de
um grupo de indivduos sadios, determinados por observaes ou registros. O nvel de ingesto diettica de nutrientes
estabelecido pela AI quando no se podem determinar as EARs por insuficincia de informao cientfica para estabelecer as
RDAs. Como exemplo, cita-se AI estabelecida para crianas lactentes, para as quais o leite materno a nica fonte de alimento
nos primeiros 4 a 6 meses de idade. Nesse caso, a AI para os nutrientes baseada na mdia diria de nutrientes fornecidos pelo
leite materno, considerando-se crianas a termo e alimentadas exclusivamente ao seio.

UL Tolerable Upper Intake Level ou Nvel de Ingesto Mxima Tolervel


So os nveis mais altos de ingesto diria de um nutriente, provveis de no causarem risco ou efeito adverso sade
de quase todos os indivduos de determinado grupo populacional. medida que a ingesto do nutriente aumenta acima do UL,
aumenta tambm o risco do efeito adverso. UL aplica-se para o uso crnico dirio de determinado nutriente, proveniente da
dieta, e muito til para se orientar em questo de alimentos fortificados e de suplementos alimentares. Nem todos os
nutrientes tm UL estabelecido.

A Figura 1 evidencia que a Necessidade Mdia Estimada (EAR) o consumo no qual o risco de inadequao de 0,5
ou 50%. A Quota Recomendada (RDA) a ingesto em que o risco de inadequao muito pequeno: 0,02 a 0,03 (2 a 3%). A
Ingesto Adequada (AI) no tem relao consistente com o EAR e RDA por ter sido estabelecida sem ter sido estimada a
necessidade. Nos nveis de ingestes situadas entre RDA e UL, os riscos de inadequao e de efeitos adversos esto ambos
prximos de zero. Ingestes acima do UL implicam maior risco de efeitos adversos. A linha pontilhada foi usada para AI, visto
que a real forma da curva no foi determinada experimentalmente.

5
Figura 1 Ingestes dietticas de referncia

medida que ocorre o aprofundamento nos conhecimentos sobre as necessidades de determinado nutriente, os
comits de nutrio podem alterar a recomendao do referido nutriente. Assim, as recomendaes nutricionais passam por
constantes alteraes ao longo dos tempos. Ressalta-se ainda que, pelo fato de existirem vrios fatores, distintos entre os pases,
os quais influenciam a nutrio dos indivduos, o ideal que cada pas adapte as recomendaes nutricionais sua realidade.

1.5. Referncias

BERDANIER, C. D. Advanced nutrition: macronutrients. Flrida: Ed: Wolinsky, I & Hickson, J. F. CRC Press, 1995. 277
p.

BRODY, T. Nutritional biochemistry. San Diego: Academic Press, 1994. 658 p.

CASTRO, J. Geografia da fome.11. ed. Rio de Janeiro: Editora Griphus, 1992.

IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for calcium, phosphorus, magnesium, vitamin D, and
fluoride. Washington, D.C.: National Academy Press, 1997. 432 p.

IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for thiamin, riboflavin, niacin, vitamin B6, folate, vitamin
B12, pantothenic acid, biotin, and choline. Washington, D.C.: National Academy Press, 1998. 564 p.

IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for vitamin C, vitamin E, selenium, and carotenoids.
Washington, D.C.: National Academy Press, 2000. 506 p.

IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for vitamin A, vitamin K, arsenic, boron, chromium,
copper, iodine, iron, manganese, molybdenum, nickel, silicon, vanadium, and zinc. Washington, D.C.: National Academy
Press, 2001. 769 p.

IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol,
protein, and amino acids. Part 1. Washington, D.C.: National Academy Press, 2002. 484 p.

IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol,
protein, and amino acids. Part 2. Washington, D.C.: National Academy Press, 2002. 480 p.

MAHAN, L.K.; ESCOTT-STUMP, S. Krause: alimentos, nutrio & dietoterapia. 10. ed. So Paulo: Ed. Roca, , 2002. 1133
p. (Apndice, 54).

SOCIEDADE BRASILEIRA DE ALIMENTAO E NUTRIO. Cadernos de nutrio; v. 2, 1990.

SOL, J. E. Manual de dietoterapia de las enfermidades del adulto. 5. ed. Buenos Aires: Livraria Ateneo, , 1981. 499 p.
6
STIPANUK, M. H. Biochemical and physiological aspects of human nutrition. Philadelphia: W. B. Saunders Company,
2000. 1007 p.

VASCONCELOS, F. A. G. Um perfil de Nelson Chaves e da sua contribuio nutrio em sade pblica no Brasil. Cadernos
de Sade Pblica, v. 17, n. 6, p. 1505-18, 2001.

7
Captulo 2: DIGESTO E ABSORO NO TRATO GASTROINTESTINAL
Neuza Maria Brunoro Costa
Regiane Lopes Sales

2.1. Introduo
Os alimentos, em sua maioria, so ingeridos na forma no disponvel ao organismo e devem ser quebrados em
molculas menores antes de serem absorvidos e transportados nos fluidos corporais.
O trato gastrointestinal o sistema que desempenha as funes de digesto e absoro. Ele se estende da boca ao nus
e consiste de uma estrutura tubular com aberturas para a entrada das secrees da glndula salivar, do fgado e do pncreas. O
sistema gastrointestinal inclui a boca, o estmago, o intestino delgado e o intestino grosso, assim como os rgos acessrios
(glndulas salivares, pncreas, fgado e vescula biliar), para proverem secrees essenciais (Figura 2.1).
A maior funo do trato gastrointestinal digerir as molculas complexas dos alimentos e absorver os nutrientes
simples, incluindo monossacardeos, cidos graxos, aminocidos, vitaminas, minerais e gua. Serve ainda como uma barreira
entrada de bactrias no organismo e contm clulas especializadas que secretam muco, fluidos, enzimas digestivas, fator
intrnseco e alguns hormnios peptdeos.

Figura 2.1 O trato gastrointestinal e as glndulas excrinas associadas.

8
2.2. Digesto
Digesto definida como o desdobramento qumico de alimentos por enzimas secretadas no lmen do trato
gastrointestinal pelas glndulas da boca, do estmago e das clulas excrinas do pncreas e pela borda em escova (brush
border) e no citoplasma das clulas da mucosa do intestino delgado. Assim, a digesto ocorre antes da entrada dos nutrientes
nos fluidos intestinais e, portanto, no sistema circulatrio, pelo qual os nutrientes so levados a todas as clulas do organismo.

2.3. Absoro
Absoro o movimento dos nutrientes, incluindo gua e eletrlitos, atravs das clulas da mucosa nos fluidos
intestinais, a partir dos quais caem no sangue ou na linfa.
Os processos envolvidos na absoro incluem difuso, difuso facilitada, transporte ativo (primrio e secundrio),
arraste por solvente e endocitose.
Assim que os nutrientes deixam as clulas absortivas do intestino e chegam aos fluidos intestinais, eles podem tanto
entrar nos capilares sangneos quanto nos vasos linfticos. gua e outras molculas podem ser absorvidas por movimento
paracelular entre as clulas.

2.4. Boca
Na mastigao, os alimentos so cortados e triturados pelos dentes. O processo da mastigao assegura no s que o
alimento ser subdividido, mas tambm que ser misturado com a saliva. medida que ocorre essa mistura, a amilase salivar
pode iniciar a digesto do amido e, ainda mais importante, o bolo alimentar j estar lubrificado para facilitar a deglutio.
A saliva apresenta diversas funes, incluindo digesto dos nutrientes, atividade bactericida (devido presena de
tiocianato, lactoferrina e lisozima), umedecimento da boca para facilitar a fala e a deglutio e funo de tampo.
As glndulas salivares secretam -amilase, que atua no bolo alimentar at ser inativada pela secreo cida do
estmago. A secreo salivar est sob o controle nervoso. Outras enzimas, como a lipase salivar, so de importncia
insignificante na espcie humana.
A deglutio um processo altamente coordenado. O esfncter esofagiano relaxa aps a deglutio para permitir a
entrada do alimento no estmago. A no ser nesse caso, ele permanece fechado para prevenir contra o refluxo de cido do
estmago para o esfago. Durante a gravidez, o esfncter esofagiano pode no estar to contrado como usualmente, e isso pode
permitir o refluxo de cido no esfago, dando a sensao de queimao ou azia.

2.5. Esfago
O esfago um tubo que se estende da orofaringe ao hiato diafragmtico, onde se une ao estmago, e mede cerca de
25 cm em um adulto. Nele se iniciam as ondas de peristaltismo, responsveis por transportar o alimento no trato digestivo. A
gravidade no est relacionada a esses movimentos.

2.6. Estmago
A principal funo do estmago armazenar os alimentos deglutidos para process-los, de maneira preliminar, para a
sua liberao no intestino delgado.
Aps a entrada do alimento no estmago, este tem a sua musculatura relaxada (relaxamento adaptado). No estmago,
os alimentos so submetidos a modificaes fsicas e qumicas.
Embora o estmago no seja importante rgo de absoro, alguma quantidade de gua e substncias lipossolveis so
nele absorvidas, como etanol e cidos graxos de cadeias curta e mdia.
A mucosa gstrica contm muitas glndulas profundas constitudas, principalmente, por clulas parietais, principais e
mucosa. A secreo mista dessas clulas chamada de suco gstrico. Este contm mucina, sais inorgnicos, cido clordrico
(HCl) e enzimas digestivas ou zimgenos (lipase gstrica e pepsinognio/pepsina).
As clulas parietais produzem HCl, com secreo de H+ por meio da H+, K+ - ATPase.
A acidez gstrica favorece a desnaturao das protenas, a ativao do pepsinognio a pepsina e a ao proteoltica da
pepsina e destri muitos microrganismos, que entram no trato gastrointestinal pela cavidade bucal.
As clulas parietais secretam, ainda, fator intrnseco, uma glicoprotena necessria para a absoro de vitamina B12.
As clulas mucosas secretam bicarbonato e muco, enquanto as clulas principais, pepsinognio e lipase gstrica.
A estimulao da secreo gstrica depende de mecanismos nervosos, endcrinos (hormonais) e parcrinos. As
protenas dos alimentos so um potente estimulante da liberao de gastrina na corrente sangnea pelas clulas endcrinas do
estmago. Da mesma forma, estmulo vagal, ons clcio (Ca++) e a alcalinizao do estmago promovem a liberao de
gastrina. No entanto, a secreo de gastrina inibida pela presena de cido no estmago.
A pepsina inicia o processo de digesto das protenas no estmago pela clivagem da protena em grandes fragmentos
peptdicos e alguns aminocidos livres. A lipase gstrica hidrolisa triacilglicerol (especialmente os de cadeias mdia e curta),
formando predominantemente diacilglicerol e cidos graxos livres.
As contraes peristlticas da poro distal do estmago propulsionam o contedo estomacal em direo ao piloro
(localizado entre o estmago e o duodeno). O piloro formado por uma banda densa de msculo circular. Sua contrao com os
movimentos peristlticos favorece a formao de partculas pequenas. Alm disso, o quimo cido (massa semifluida de
alimentos parcialmente digeridos) que no consegue passar pelo piloro ser retropulsionado para o interior do estmago,
resultando na mistura do quimo e na disperso das gotculas de lipdios em pequenas partculas emulsionadas. A disperso das
9
gotculas de lipdios facilitam, sobremaneira, sua subseqente digesto no intestino delgado pela lipase pancretica. Somente
lquidos e pequenas partculas no quimo conseguem passar para o duodeno devido pequena abertura resultante da contrao
do esfncter pilrico.
A motilidade e secreo gstricas so reguladas por mecanismos tanto nervosos quanto hormonais. O hormnio que
estimula a secreo e motilidade gstrica a gastrina. O estmulo nervoso dado pelo nervo vago. O estmago regula a
quantidade de alimento presente no duodeno, de forma a no exceder a sua capacidade absortiva. Isso se d graas ao de
hormnios como o peptdio inibitrio de gastrina e a colecistoquinina, que so liberados no intestino delgado em resposta
presena do quimo, inibindo a motilidade, o esvaziamento e a secreo gstricos.

2.7. Intestino Delgado


A maior parte da digesto e absoro ocorre no intestino delgado, que aparelhado para esse fim. Ele mede cerca de 3
m de comprimento e 4 cm de dimetro e constitudo de trs partes: duodeno, jejuno e leo. O duodeno (cerca de 30 cm de
comprimento) recebe o quimo proveniente do estmago e as secrees do fgado e do pncreas. O jejuno, parte superior do
intestino aps o duodeno, compreende 40% do comprimento e o leo, poro inferior, os 60% restantes.
A fim de facilitar a digesto e absoro de nutrientes na sua superfcie, o intestino delgado anatomicamente adaptado
para aumentar grandemente sua superfcie absortiva. Sua rea de aproximadamente 200 m2, em funo das dobras da mucosa
(parte interna da parede intestinal), vilos ou projees em forma de dedos e devido aos microvilos da membrana luminal ou
borda em escova "brush border", que compem a camada superficial dos vilos (Figura 2.2). Em conjunto, essas adaptaes da
estrutura da mucosa aumentam a rea superficial do intestino delgado para 600 vezes a rea de um cilindro do mesmo dimetro.

Vilosidades

Entercitos
Lmina prpria

Lmina prpria

Muscular da mucosa
Cripta

Camada
submucosa
Canal
Artria

Veia

Figura 2.2 Vilosidades intestinais, estrutura, vasos sanguneos e linfticos.

As clulas absortivas epiteliais que apresentam a borda em escova so chamadas entercitos. Essas clulas so
constantemente renovadas, tendo uma vida mdia de cerca de 72 horas.
As criptas (tubos glandulares simples na base dos vilos) contm unidades proliferativas que provm diversos tipos de
clulas para o trato gastrointestinal. Essas clulas migram a partir das criptas para o pice dos vilos, onde so imediatamente
descamadas no lmen do intestino delgado, podendo sofrer digesto. As clulas da cripta secretam um fluido chamado de suco
entrico, que contm gua e eletrlitos. medida que as clulas epiteliais proliferam e migram para o pice dos vilos, a
atividade das enzimas digestivas da mucosa e a capacidade de absorver nutrientes aumentam, enquanto a capacidade de secretar
muco diminui.
A membrana da borda em escova contm diversas glicoprotenas embebidas, que se estendem da membrana at o
lmen. As ramificaes de carboidratos dessas glicoprotenas formam um glicoclix prximo membrana da borda em escova.
Esse glicoclix age retendo gua e formando uma camada esttica de gua prximo superfcie de absoro. Muitas dessas
10
glicoprotenas so enzimas digestivas. Em razo de essa camada de fluidos prximo superfcie epitelial das clulas ser
pobremente misturada, o principal mecanismo de movimento de solutos atravs da camada esttica de gua a difuso a favor
de um gradiente de concentrao.

2.8. Digesto no Intestino Delgado


A digesto no intestino delgado realizada pelas enzimas secretadas pelo pncreas, pelas enzimas localizadas na
membrana luminal dos entercitos e pelas enzimas dentro dos entercitos. Com a entrada do quimo cido proveniente do
estmago no duodeno, o cido estimula as clulas S enteroendcrinas (clulas endcrinas especiais do duodeno) a liberarem um
hormnio gastrointestinal chamado de secretina, que estimula as clulas acinares do pncreas (clulas envolvidas na secreo
de gua, eletrlitos e enzimas) a secretarem uma secreo rica em bicarbonato, que tem um pH alcalino de aproximadamente 8.
Essas clulas S so encontradas em maior concentrao no duodeno e jejuno e em menor concentrao no leo.
A presena de lipdios parcialmente hidrolisados (cidos graxos) e protenas (aminocidos e peptdeos) no quimo que
chega ao duodeno, assim como o pH cido do quimo, estimula as clulas I enteroendcrinas da poro proximal do intestino
delgado a liberarem o hormnio colecistoquinina (tambm chamado de pancreozimina), que promove a liberao de zimgenos
das clulas acinares do pncreas e a secreo do suco pancretico, rico em enzimas/zimgenos.
A secreo pancretica contm -amilase pancretica, lipases (lipase pancretica e colesterol esterase), pr-fosfolipase
A2, enzimas nucleolticas (ribonuclease e desoxirribonuclease), diversas pr-enzimas proteolticas (tripsinognio,
quimotripsinognio, proeslastase e carboxipeptidase) e uma protena no enzimtica, chamada de procolipase. As enzimas
pancreticas so mais ativas em pH na faixa da neutralidade, e a rpida neutralizao do quimo cido pelo bicarbonato do suco
pancretico na poro proximal do intestino delgado facilita a digesto dos nutrientes pelas enzimas pancreticas (Figura 2.3).
O fgado secreta a bile no ducto biliar, que se esvazia no duodeno. Nos intervalos entre as refeies, a abertura desse
ducto mantida fechada, e o fluxo biliar flui para a vescula biliar, um rgo em formato de saco anexo ao ducto biliar
heptico, que serve para estocar e concentrar a bile. Os hormnios liberados na poro proximal do intestino delgado estimulam
o fluxo biliar. A secretina estimula a secreo biliar pelo fgado, e a colecistoquinina estimula a contrao da vescula biliar e a
liberao da bile da vescula no duodeno.
A bile uma soluo alcalina contendo eletrlitos, pigmentos, sais biliares e outras substncias, como colesterol e
lecitina. O ducto pancretico se une com o ducto biliar heptico imediatamente antes de alcanar o duodeno, de forma que as
secrees pancretica e biliar se misturam antes de entrarem no intestino. Os sais biliares desempenham importante papel na
digesto e absoro de lipdios.

11
ALIMENTO
Estimulo visual
Distenso do estmago
Protena

GASTRINA
Estimula contrao
gstrica
ESTMAGO
Clulas parietais

HCl
Bolo alimentar
Pepsina Pepsinognio
(protena)

Peptdio inibitrio de gastrina

Quimo cido Clulas S


INTESTINO
Secreo de gua e bicarbonato
SECRETINA PNCREAS

Presena de Secreo de bile Produo de


enzimas
Lipdio pancreticas
Aminocidos FGADO (zimognios)
Clulas I
Peptdios

Contrao da vescula biliar


COLECISTOQUININA

Figura 2.3 Esquema de controle da digesto pela gastrina no estmago, secretina e colecistoquinina no intestino.

Embora a digesto da maioria dos nutrientes no intestino delgado seja realizada pelas enzimas pancreticas, as enzimas
localizadas na borda em escova dos entercitos so responsveis pela concluso desse processo e liberam molculas que podem
ser transportadas pela membrana da borda em escova. Diversas -glicosidases, a -galactosidase e diversas peptidases esto
presentes na borda em escova. Essas enzimas so necessrias para a digesto posterior de oligossacardeos e peptdeos
resultantes da hidrlise no lmen intestinal, assim como dissacardeos e outros compostos. Essas enzimas da borda em escova
so chamadas de ectoenzimas, por serem localizadas no exterior da clula, ou seja, na fase luminal da membrana. Di e
tripeptidases podem penetrar nas clulas epiteliais do intestino e ser subseqentemente hidrolizadas para formarem aminocidos
livres pelas peptidases intracelulares. Tambm esto presentes nas clulas do epitlio intestinal enzimas envolvidas na
assimilao de produtos da digesto de lipdios para formarem triacilglicerol, steres de colesterol e fosfolipdios, que sero
incorporados nos quilomcrons.

2.9. Motilidade Intestinal


A motilidade intestinal (peristaltismo) adaptada para facilitar a digesto e a absoro de nutrientes no intestino
delgado, e a taxa de digesto depende da exposio dos nutrientes s enzimas no lmen intestinal. Essa motilidade assegura a
mistura do contedo intestinal, o que favorece sua digesto e absoro. Isso se torna possvel devido s ondas lentas de
contrao seguidas de relaxamento de diferentes segmentos do intestino. A motilidade ainda permite uma migrao lenta do
quimo do duodeno em direo ao intestino grosso, assegurando um tempo adequado para que a digesto e absoro se
processem.

2.10. Absoro no Intestino Delgado


Para que os nutrientes possam ser absorvidos, eles devem mover-se atravs das clulas da mucosa (entercitos), que
constituem uma barreira entre o lmen do trato gastrointestinal e o fluido intersticial. Processos de transporte esto envolvidos
na captao de nutrientes pela borda em escova ou membrana luminal e tambm na liberao dos nutrientes atravs da
membrana basolateral (localizada no lado oposto da borda em escova do entercito) no fluido extracelular.
A captao de nutrientes e eletrlitos pelas clulas epiteliais usualmente mediada por um dos quatro mecanismos
gerais de absoro, quais sejam: 1) transporte mediado, 2) difuso passiva, 3) pinocitose, e 4) paracelular (Figura 2.4).
12
2.10.1. Transporte mediado
Requer um carreador especfico ou protena de transporte na membrana. Esses carreadores so localizados na
membrana da clula. Tal sistema de transporte pode ser uniporte (transporta apenas um composto), simporte (move dois
compostos simultneos) ou antiporte (move um composto para dentro e outro para fora da clula).
O transporte mediado pode ser passivo ou ativo:

a) Transporte mediado passivo


Envolve um carreador e tambm chamado de difuso facilitada. O transporte passivo se d a favor de um gradiente
de concentrao, ou seja, de uma rea de maior concentrao para uma de concentrao mais baixa. Pode ser bidirecional e
permitir uma equalizao da concentrao do substrato em ambos os lados da membrana. Exemplos de transporte mediado
passivo so os transportadores de hexoses independentes de Na+, como GLUT5, que transporta frutose atravs da membrana
para o interior do entercito; o GLUT2, que transporta glicose, galactose e frutose para fora do entrercito pela membrana
basolateral; os canais inicos; e os carreadores mveis de ons, que transportam ons, como Ca2+, Mg2+ e H+.

b) Transporte mediado ativo


Envolve o gasto de energia. Esse transporte pode ser unidirecional e concentrativo. A energia suprida pela hidrlise
de ATP, mas a energia requerida pode ser primria ou secundria. Por exemplo, a concentrao de sdio (Na+) e potssio (K+)
na clula mantida pela Na+, K+-ATPase, que bombeia Na+ para fora da clula e K+ para dentro da clula (contra um gradiente
de concentrao) s custas da hidrlise de ATP. Esse o transporte ativo primrio de Na+ e K+ por antiporte.
A estequiometria da reao Na+, K+-ATPase 1 mol de ATP hidrolisado conjugado com o bombeamento para o
exterior de 3 mol de Na+ e simultneo bombeamento para o interior de 2 mol de K+, que gera uma baixa concentrao de Na+
no citosol e um potencial eltrico de cerca de -60 mV no citosol em relao ao fluido extracelular.
Os cotransportes de Na+ e glicose e de H+ e dipeptdeos so, no entanto, por transporte ativo secundrio. Nesses
processos, a energia diretamente derivada do gradiente de concentrao ou do potencial eltrico atravs da membrana em vez
da energia qumica da quebra da ligao co-valente, como na hidrlise do ATP. Gradientes podem ser estabelecidos pela
hidrlise de ATP, como visto no caso da Na+, K+-ATPase. Por exemplo, o transportador de glicose e de Na+ SGLT1 pode
concentrar glicose (contra um gradiente de concentrao), devido ao co-transporte de Na+ a favor do seu gradiente
eletroqumico. Portanto, a baixa concentrao intracelular de Na+ e o potencial eltrico negativo, que so mantidos pela
bomba Na+, K+-ATPase, que prov a fora para a captao de glicose. O transportador SGLT1 um exemplo de transporte
ativo secundrio por simporte.
O transpote mediado permite a captao de nutrientes e outros compostos em stios especficos, visto que apenas o
segmento do intestino delgado que expressa a protena transportadora capaz de reter a substncia. Uma vantagem desse
sistema a captao de cidos biliares que s ocorre na poro final do intestino delgado (leo), permitindo a presena de
cidos biliares adequados no lmen para a eficiente digesto de lipdios.

2.10.2. Difuso Passiva


Este o tipo de transporte para gua, muitas molculas lipossolveis e para gases, como H2 ou CO2, pelo fato de eles
poderem se difundir pela camada dupla de lipdios das membranas da clulas epiteliais. Essas substncias se difundem, atravs
da membrana em ambas as direes, a favor de um gradiente de concentrao. Essa forma de absoro pode tambm ocorrer no
estmago e no intestino grosso.

2.10.3. Pinocitose
Endocitose mediada por receptores pode ser responsvel pela captao de algumas protenas, assim como de pequenas
molculas que so englobadas dentro de vesculas endocticas. De forma semelhante, molculas podem ser transportadas para
fora da clula por exocitose. Os quilomcrons so transportados para fora dos entercitos por exocitose pela membrana
basolateral.

2.10.4. Paracelular
um mecanismo de captao de gua e eletrlitos atravs das junes entre as clulas.
A osmolaridade desempenha importante papel na absoro de gua e eletrlitos no intestino delgado por esse processo.
A osmolaridade do plasma de cerca de 300 mOsm. Quando uma refeio hipotnica ingerida, a gua rapidamente
absorvida pelo duodeno e jejuno pela via paracelular. A absoro de gua facilita a absoro de eletrlitos por arraste. Quando
uma refeio hipertnica ingerida, a gua retida no lmen. O acmulo de gua no lmen e a absoro de ons e nutrientes
tornam o contedo do lmen isotnico. Dessa forma, a poro proximal do intestino responsvel pela absoro de gua de
refeies hipotnicas, e a poro distal do intestino delgado o por sua absoro quando a refeio hipertnica.

13
Simporte
(a)

Antiporte

Uniporte

Paracelular

Transporte ativo
primrio (b)
Transporte ativo
secundrio Pinocitose
Canal inico

Difuso facilitada
Carreador
inico mvel
Difuso simples

Figura 2.4 Meios de absoro intracelular: (a) Transcelular (simporte, antiporte e uniporte) e paracelular. (b) Transcelular:
transporte ativo primrio, transporte ativo secundrio, difuso facilitada, difuso simples, canal inico, carreador
inico mvel e pinocitose.

2.11. cidos Biliares e a Circulao Entero-Heptica


O fgado desempenha importante papel na digesto e captao de lipdios pelo trato gastrointestinal devido sua
funo de sintetizar e secretar cidos biliares. Os cidos biliares primrios, cido clico e cido quenodesoxiclico so
sintetizados a partir do colesterol no fgado. Esses cidos biliares so conjugados com taurina ou glicina, tornando-se mais
polares. Em funo da alta concentrao de ons Na e K na bile, seu pH alcalino, e por isso os cidos biliares e seus
conjugados existem na forma de sais biliares. Algum colesterol pode estar solubilizado nos sais biliares e ser transportado do
fgado para o intestino.
Os cidos biliares apresentam propriedade emulsificante, o que aumenta a rea de superfcie entre lipdio e a fase
aquosa e facilita a digesto de steres de colesterol, fosfolipdeos e monoglicerdeos, assim como a solubilizao e absoro de
produtos da digesto dos lipdios. Os cidos biliares formam agregados chamados de micelas mistas.
Os cidos biliares so recuperados por absoro passiva ao longo do intestino delgado e por transporte mediado por
receptor no leo. A reciclagem de compostos, como os cidos biliares entre o intestino delgado e o fgado, chamada de
circulao entero-heptica. Essa circulao permite um aproveitamento de cerca de 99% dos cidos biliares, sendo o 1%
restante perdido nas fezes em cada passagem pelo intestino. O "pool" de cidos biliares, cerca de 4 g, reciclado atravs do
intestino cerca de 12 vezes por dia, dependendo da freqncia das refeies. Dessa forma, a perda de 1% (0,05 g) em cada
passagem resulta numa perda diria de cerca de 0,5 g de cidos biliares por dia nas fezes. Essa perda compensada pela sntese
diria de quantidade equivalente de cidos biliares no fgado. A perda de cidos biliares nas fezes representa a principal forma
de excreo de colesterol do organismo.
Uma poro dos cidos biliares primrios no intestino pode ser metabolizada pelas bactrias intestinais e levar
desconjugao e 7-desidroxilao, produzindo cidos biliares secundrios, ou seja, cido desoxiclico a partir do cido
clico e cido litoclico a partir do cido quenodesoxiclico. Esses cidos biliares secundrios, especialmente o cido
desoxiclico, podem ser reabsorvidos e participar da circulao entero-heptica, juntamente com os cidos biliares primrios.

14
2.12. Metabolismo de Nutrientes nos Entercitos
Aps a absoro dos produtos da digesto nas clulas epiteliais do intestino delgado, os nutrientes so assimilados ou
pela veia porta ou pelos vasos linfticos para serem levados s outras partes do corpo ou serem utilizados pelos entercitos.
As clulas epiteliais do intestino delgado so metabolicamente muito ativas e constantemente renovadas, requerendo
alto suprimento de nutrientes absorvidos do intestino para a manuteno da sua estrutura e integridade funcional da mucosa
intestinal. O intestino delgado particularmente utiliza glutamina como combustvel, que estimula a proliferao dos entercitos.
O jejum causa atrofia da mucosa do intestino delgado, e essa atrofia pode ser revertida pela ingesto de certos aminocidos,
como a glutamina.
No interior dos entercitos, a maioria dos produtos da digesto dos lipdios, particularmente monoacilgliceris e cidos
graxos de cadeia longa, reesterificada, formando triacilgleris, incorporados nos quilomcrons e exportados. Os quilomcrons
tambm transportam colesteril steres, fosfolipdeos e vitaminas lipossolveis. Os quilomcrons so estruturas muito grandes
para atravessar os poros dos capilares, mas podem passar atravs dos vastos orifcios dos vasos linfticos. Os quilomcrons so
liberados do sistema linftico na circulao sangnea, na altura do ducto torcico, anteriormente sua entrada no corao.

2.13. Transporte de Nutrientes na Circulao


Os nutrientes so absorvidos no trato gastrointestinal e, subseqentemente, transportados pela circulao portal ou pelo
sistema linftico. A maioria dos nutrientes hidrossolveis (aminocidos, monossacardeos, glicerol, cidos graxos de cadeia
curta, eletrlitos e vitaminas hidrossolveis) transportada predominantemente pela circulao portal. Esses nutrientes entram
nos capilares que alimentam a veia porta, levando o sangue venoso at o fgado (Figura 2.5).

Figura 2.5 Stios de absoro no trato gastrointestinal Estmago: lcool, cidos graxos de cadeia curta e cobre;
Duodeno: Cl-, SO4=, Fe, Se, P, Cu, Ca, Zn, Mg; Jejuno: glicose, galactose, frutose, vitamina C, tiamina, riboflavina,
piridoxina, cido flico, cido pantotnico; leo: protena, vitaminas A, D, E, K, lipdio, colesterol, sais biliares, vitamina B12; e
Clon: Na+, K+, vitamina K sintetizada por bactrias, gua, biotina, cido pantotnico. As vitaminas A, D, E, K, lipdios e
colesterol so captados pelo sistema linftico, caem na veia jugular e subclvia, chegando ao corao atravs da veia cava
superior. Os demais nutrientes entram nos vasos sangneos no intestino, caem na veia porta que os leva diretamente ao fgado,
que por sua vez os lanam na circulao geral, atravs da veia cava inferior.

O sistema linftico no trato gastrointestinal desempenha papel importante no transporte de substncias lipossolveis.
As substncias transportadas pelo sistema linftico entram na corrente sangnea pouco antes de chegar ao corao e vo ento
circular pelo corpo no sangue arterial, enquanto aquelas substncias transportadas pela circulao portal iro passar primeiro
pelo fgado, onde elas podem ser captadas e metabolizadas pelos hepatcitos ou retornar circulao pela veia heptica.

15
Essa distino entre transporte linftico e portal de grande importncia para a indstria farmacutica determinar o
destino de certas drogas.
O sistema linftico tambm desempenha importante papel na manuteno do balano dos fluidos corporais, agindo
como um sistema de drenagem para o retorno de excesso de fluidos e de protenas do espao intersticial de volta para o sistema
circulatrio.
Embora muitas substncias transportadas pelo sistema portal possam tambm ser carreadas pela circulao linftica, o
fato de o fluxo de sangue portal ser muitas vezes maior do que o fluxo linftico faz que o transporte linftico seja de pouca
expresso, em comparao com o portal para a maioria das substncias hidrossolveis.

2.14. Regulao da Digesto e Absoro


Digesto e absoro de nutrientes so regulados tanto por mecanismos nervosos quanto hormonais. Em termos de
digesto, a regulao envolve a modificao na taxa de liberao do quimo no intestino delgado, a liberao da secreo
gstrica, a liberao e composio da secreo pancretica e a liberao da secreo biliar. A regulao da absoro envolve a
rea de superfcie absortiva, assim como a expresso de certas molculas transportadoras localizadas na membrana da borda em
escova.

2.14.1. Controle Nervoso


O trato gastrointestinal inervado pelo sistema nervoso intrnseco e extrnseco. O sistema nervoso intrnseco
responsvel, principalmente, pela regulao neural da motilidade e funo gastrointestinal. influenciado pelo sistema nervoso
extrnseco, principalmente pelo sistema nervoso parassimptico e, em menor grau, pelo sistema nervoso simptico. Todo o trato
gastrointestinal inervado pelas fibras nervosas aferentes vagais (parassimptico). O termo aferente se refere ao fato de eles
carregarem informaes do trato gastrointestinal para o sistema nervoso central. O sistema nervoso aferente vagal desempenha
importante papel na regulao da funo intestinal.
O trato gastrointestinal tambm inervado pelos eferentes vagais. Eferente se refere ao fato de carregarem
informaes do sistema nervoso central at o trato gastrointestinal.
Um bom exemplo do controle nervoso da funo gastrointestinal a regulao da secreo salivar. A secreo salivar
pelas glndulas salivares quase que exclusivamente controlada pelos sinais nervosos. As secrees gstrica e pancretica, no
entanto, so controladas tanto por controles nervosos quanto hormonais. O sistema nervoso parassimptico o mais importante
regulador fisiolgico da secreo salivar. Aroma, viso, sabor e textura dos alimentos excitam os ncleos salivares do sistema
nervoso central, que, por sua vez, aumentam a atividade parassimptica, inervando as glndulas salivares. Como resultado da
ativao parassimptica, a secreo salivar pode ser aumentada em at 6 - 8 vezes. Embora as glndulas salivares sejam
tambm inervadas pelo sistema nervoso simptico, ele parece exercer papel pouco importante na regulao da secreo salivar.
O mecanismo neural est envolvido no esvaziamento gstrico mais rpido induzido pela distenso do estmago e na
reduo do esvaziamento induzido pela presena de uma refeio hipertnica no duodeno. Mecanismos nervosos esto ainda
envolvidos na regulao da secreo exgena do pncreas. Por exemplo, a distenso gstrica estimula a liberao de
acetilcolina pelos impulsos vagais, o que, por sua vez, estimula a secreo do suco pancretico, que rico em enzimas. Os
impulsos vagais so tambm envolvidos na liberao de acetilcolina em resposta presena de produtos da digesto de lipdios
e protenas no lmen do intestino delgado. Isso, similarmente, estimula a liberao da secreo pancretica, rica em enzimas.

2.14.2. Hormnios Gastrointestinais


Os hormnios gastrointestinais so intimamente envolvidos na liberao coordenada das secrees no duodeno, na
manuteno da integridade da homeostase celular, na regulao da motilidade do trato gastrointestinal e no controle da ingesto
alimentar.
A absoro, ou mesmo a presena de alimento no trato gastrintestinal, contribui para a modulao desse controle. O
trato gastrintestinal possui diferentes tipos de clulas secretoras de peptdeos que, combinados com outros sinais, regulam o
processo digestivo e atuam no sistema nervoso central para a regulao do processo digestivo, alm da fome e da saciedade. A
sinalizao ocorre por meio dos nervos perifricos (como pelas fibras vagais aferentes) e por meio de receptores.

a) Gastrina
Gastrina o hormnio produzido pelo estmago. Sua principal funo a estimulao da secreo do cido clordrico
e do pepsinognio, alm da motilidade gstrica. A gastrina ainda desempenha importante papel na proliferao das clulas da
mucosa gstrica.
A gastrina liberada pelas clulas G no antro do estmago na presena de protena no lmen deste. Sua liberao
inibida pela acidificao do lmen gstrico abaixo de pH 3. Esse mecanismo de retroalimentao regula a quantidade de
gastrina liberada e, conseqentemente, a quantidade de cido secretada em resposta alimentao.

b) Secretina
Secretina foi o primeiro hormnio gastrointestinal descoberto. Secretina secretada pelas clulas S do duodeno,
estimulada pela acidificao do lmen duodenal. Sua principal funo no trato gastrointestinal a estimulao da secreo de
bicarbonato pelo pncreas, que neutraliza o quimo cido e promove a digesto pelas enzimas pancreticas. Pode tambm inibir
o esvaziamento gstrico.
16
c) Colecistoquinina
Colecistoquinina (CCK) um hormnio gastrointestinal secretado pelas clulas I enteroendcrinas do duodeno e
jejuno, assim como pelos neurnios do crebro e do trato gastrointestinal. A CCK responsvel pela secreo ps-prandial de
enzimas pancreticas e da contrao da vescula biliar em resposta ao estmulo provocado pela presena de lipdios ou de
protenas no intestino delgado. Alm do efeito secretrio, a colecistoquinina pode estimular a hiperplasia e hipertrofia do
pncreas.
A colecistoquinina exerce influncia positiva na liberao de insulina pelo pncreas. Foi observado que uma infuso
intravenosa do hormnio reduz a glicemia em pessoas no-diabticas e diabticas no-insulino dependente.
Outra funo da CCK est relacionada ao controle da ingesto alimentar. Atuando juntamente com outros peptdeos
secretados pelo trato digestivo, um dos responsveis pela saciedade ps-prandial (saciao). No longo prazo, entre os perodos
de jejum a CCK no age na saciedade; seu efeito parece estar limitado ao evento ps-prandial.
O papel da CCK na saciedade e os seus mecanismos de ao ainda no esto completamente esclarecidos.

d) Somatostatina
A somatostatina tem sido encontrada nos neurnios do crebro e da coluna vertebral e nas clulas D do trato
gastrointestinal. Apresenta grande efeito inibitrio na liberao de hormnios, como: hormnio do crescimento, hormnio
estimulante da tireide, gastrina, glucagon, polipeptdeo inibitrio gstrico, insulina, motilina, neurotensina, polipeptdeo
pancretico, secretina, calcitonina e renina. Da mesma forma, inibe secrees gastrointestinais, como cido gstrico, pepsina,
secrees exgenas do pncreas e secrees do intestino delgado, e, ainda a motilidade gastrintestinal.

e) Grelina
A grelina, hormnio gastrointestinal identificado no estmago do rato em 1999, um potente estimulador da liberao
de GH nas clulas somatotrficas da hipfise e do hipotlamo, sendo o ligante endgeno para o receptor secretagogo de GH.
Alm de sua ao como liberador de GH, a grelina possui outras importantes atividades, incluindo a estimulao da secreo
lactotrfica e corticotrfica, atividade orexgena acoplada ao controle do gasto energtico; controle da secreo cida e da
motilidade gstrica, influncia sobre a funo endcrina pancretica e metabolismo da glicose e, ainda, aes cardiovasculares e
efeitos antiproliferativos em clulas neoplsicas.
um dos mais importantes sinalizadores para o incio da ingesto alimentar. Sua concentrao mantm-se alta nos
perodos de jejum e nos perodos que antecedem as refeies, caindo imediatamente aps a alimentao, o que tambm sugere
um controle neural. Alguns estudos tm comprovado que a grelina est associada tambm ao controle da ingesto alimentar no
longo prazo.

f) Leptina
Leptina um hormnio produzido pelos adipcitos e pela mucosa gstrica e pode servir para coordenar a regulao no
curto e longo prazos da ingesto alimentar.
A leptina gstrica est envolvida no controle alimentar de curto prazo, atuando em conjunto com a CCK na reduo da
ingesto alimentar. Est tambm envolvida na absoro de macronutrientes, principalmente protena.
O nvel circulante de leptina correlaciona-se com a quantidade de gordura corporal, e a deficincia desse peptdeo
determina obesidade grave. A leptina reduz a ingesto de alimento e aumenta a atividade do Sistema Nervoso Simptico.

g) Galanina
A galanina um peptdeo de 29 aminocidos isolado no crebro e no trato gastrintestinal. A injeo deste hormnio
aumenta a ingesto alimentar. Muito embora o tratamento crnico com galanina no provoque aumento de peso, antagonistas
da galanina so potenciais agentes teraputicos da obesidade. A galanina interage com outros peptdeos, como leptina e
colecistoquinina, para regular a ingesto alimentar e a homeostase energtica.

h) Oxintomodulina
A oxintomodulina (OXM) foi recentemente identificada como um supressor da ingesto alimentar no curto prazo.
secretado na poro distal do intestino e parece agir diretamente nos centros hipotalmicos para diminuir o apetite, a ingesto
calrica e os nveis sricos de grelina.

i) Glucagon-like-peptide 1 (GLP-1) e polipeptdeo insulinotrpico dependente de glicose (GIP)


O GLP-1 atua inibindo o esvaziamento gstrico e, assim, promovendo uma sensao de saciedade prolongada.
O GIP secretado em resposta a nutrientes presentes no lmen do estmago e a outros peptdeos, como as bombesinas
e a somatostatina.
O GIP e GLP 1 potencializam a liberao de insulina induzida por glicose e, assim, mantm um importante papel na
regulao da homeostase de glicose sangnea.

j) Peptdeo YY (PYY)

17
O PYY um hormnio peptdico intestinal secretado pelas clulas endcrinas L da poro distal do intestino delgado e
intestino grosso, no perodo ps-prandial, proporcionalmente quantidade de calorias ingeridas. O PYY diminui a motilidade
intestinal e aumenta a saciedade, o que provoca diminuio do apetite e da ingesto de alimentos.

2.15. O Intestino Grosso e a Ao das Bactrias Intestinais


O resduo da digesto e absoro passa pela vlvula ileocecal, chegando ao intestino grosso. O clon ou intestino
grosso mais largo em dimetro do que o intestino delgado, e no apresenta vilos, mas tem glndulas que secretam muco.
O intestino grosso serve para duas funes gerais: o clon ascendente o local onde a maior parte da fermentao
ocorre e o clon descendente promove a absoro de gua e eletrlitos e formao das fezes.
So gastas aproximadamente quatro horas para que a primeira poro de uma dieta-teste alcance a poro inicial do
intestino grosso e cerca de oito horas aps ter sido ingerida at que toda a parte indigervel de uma dieta entre no intestino
grosso. Em contraste, o transporte atravs do intestino grosso muito mais lento e pode levar at uma semana para recuperar
todos os resduos de uma dieta nas fezes.
Os carboidratos que no so absorvidos no intestino delgado, assim como os carboidratos componentes do muco, so
transformados em cidos actico, propinico ou butrico pelas bactrias do clon. Esses cidos graxos de cadeia curta so
amplamente absorvidos no intestino grosso por difuso. Uma vez absorvidos, esses cidos graxos so metabolizados em corpos
cetnicos no epitlio ou so transportados pela veia porta para outros tecidos, onde podem ser usados como fontes de energia.
Embora seu significado nutricional na espcie humana seja ainda incerto, para os ruminantes os cidos graxos de cadeia curta
ou volteis podem contribuir com at 70% do seu requerimento energtico.
Grande variedade de bactrias no clon produz gases hidrognio, metano e dixido de carbono pelo seu metabolismo
(fermentao) de polissacardeos no absorvidos e outros resduos alimentares. Outras bactrias consomem gases produzidos
pelas bactrias produtoras de gases. O grau de flatulncia determinado pelo balano entre gases produzidos e consumidos.
A microbiota intestinal tambm possui enzimas que podem metabolizar cidos graxos de cadeia longa. Os cidos
graxos hidrolisados resultantes, como o cido hidroxiesterico (um produto da hidratao do cido olico), podem exercer
profunda influncia no transporte de gua e eletrlitos no clon. Essa inibio induz a diarria.
Quase todo o colesterol que entra no clon excretado pelas fezes. Pequena poro metabolizada pelas bactrias a
coprostanol e coprostatane, ambos pouco solveis e, portanto, pouco disponveis para absoro.
Pequena frao dos cidos biliares que no so reabsorvidos no leo entra no clon, onde so metabolizados
extensivamente pelas bactrias. Os produtos dessa degradao so mais lipossolveis do que os prprios cidos biliares,
facilitando sua absoro passiva no clon. Os cidos biliares podem ser seqestrados por fibras e lipdios, interferindo com a
sua absoro.
Aproximadamente, 25% da uria sintetizada no fgado chega ao trato gastrointestinal por difuso pelo sangue. Urease
bacteriana no clon converte uria em amnia, que se difunde rapidamente pela mucosa do clon e, pela veia porta, retorna ao
fgado, onde usada para ressintetizar uria. A absoro de amnia pelo clon pode contribuir para a elevao dos nveis de
amnia no sangue de pacientes com patologias do fgado.

2.16. Referncias
ALBERTS, B.; BRAY, D.; LEWIS, J.; MARTIN, R.; ROBERTS, K.; WATSON, J.D. Biologia molecular da clula. 4. ed.
Porto Alegre: Editora Artmed, 2004. 1549 p.

BATTERHAM, R.L.; COHEN, M.A.; ELLIS, S.M.; LE ROUX, C.W.; WIHTERS, D.J.; FROST, G.S. et al. Inhibition of food
intake in obese subjects by peptide YY. N Engl. J. Med., v. 349, n. 10, p. 941-8, 2003.

CINTI. S.; De MATTEIS, R.; CERESI E, PICO, C.; OLIVER, J.; OLIVER, P.; PALOU, A.; OBRADOR, A.; MAFFEIS, C.
Leptin in the human stomach. Gut., v. 49, p. 155, 2001.

COHEN, M.A.; ELLIS, S.M.; LE ROUX, C.W.; BATTERHAM, R.L.; PARK, A.; PATTERSON, M.; FROST, G.S.; GHATEI,
M.A.; BLOOM, S.R. Oxyntomodulin suppresses appetite and reduces food intake in humans. v. 88, p. 4696-4701, 2003.

DATE, Y.; TOSHINAI, K.; KODA, S.; MIYAZATO, M.; SHIMBARA, T.; TSURUTA, T.; NIIJIMA, A.; KANGAWA, K.;
NAKAZATO, M. Peripheral interaction of ghrelin with cholecystokinin on feeding regulation. Endocrinology, v. 146, p.3518-
3525, 2005.

KOEGLER, F.H.; RITTER, S. Feeding induced by pharmacological blockade of fatty acid metabolism is selectively attenuated
by hindbrain injections of the galanin receptor antagonist, M40. Obes. Res., v. 4, p.329-36, 1996.

KONTUREK, S.J.; KONTUREK, J.W.; PAWLIK, T.; BRZOZOWKI, T. Brain-gut axis and its role in the control of food
intake. J. Physiol. Pharmac., v. 55, p. 137-54, 2004.

LIDDLE, R.A. Regulation of cholecystokinin secretion in humans. J Gastroenterol., v. 35, p. 181-187, 2000.

18
MANCINI, M.C.; HALPERN, A. Aspectos fisiolgicos do balano energtico. Arq Bras. Endocrinol. Metabol., v. 46, n. 3, p.
230-248, 2002.

MARZULLO, P.; VERTI, B.; SAVIA, G.; WALKER, G.E.; GUZZALONI, G.; TAGLIAFERRI, M.; DI BLASIO, A.;
LIUZZI, A. The relationship between active ghrelin levels and human obesity involves alterations in resting energy
expenditure. J Clin Endocrinol Metab., v. 89, p. 936-939, 2004.

PICO, C.; OLIVER, P.; SANCHES, J.; PALOU, A. Gastric leptin: a putative role in the short-term regulation of food intake.
Br J Nutr., v. 90, n. 4, p.735-41, 2003.

RASMUSSEN, H.; ZAWALICH, K.C.; GANESAN, S.; CALLE, R.; ZAWALICH, W.S. Physiology and pathophysiology of
insulin secretion. Diabetes Care., v. 13, n. 6, p. 655-666, 1990.

RUSHAKOFF, R.A.; GOLDFINE, I.D.; BECCARIA, L.J.; MATHUR, A.; BRAN, R.J.; LIDDLE, R.A. Reduced postprandial
cholecystokinin (CCK) secretion in patients with non insulin-dependent diabetes mellitus: Evidence for a role for CCK in
regulating postprandial hyperglycemia. J Clin Endocrinol Metab., v. 76, p. 489-493, 1993.

SHIIYA, T.; NAKAZATO, M.; MIZUTA, M.; DATE, Y.; MONDAL, M,S.; TANAKA, M.; NOZOE, S.; HOSODA, H.;
KANGAWA, K.; MATSUKURA, S. Plasma ghrelin levels in lean and obese humans and the effect of glucose on ghrelin
secretion. J. Clin. Endocrinol Metab., v. 87, p. 240-244, 2002.

STIPANUK, M.H. Biochemical and physiological aspects of human nutrition. Philadelphia: W. B. Saunders Company,
2000. 1007 p.

VERDICH, C.; TOUBRO, S.; BUEMANN, B.; MARSEN, J.L.; HOLST, J.J.; ASTRUP, A. The role of postprandial releases of
insulin and incretin hormones in meal-induced satiety effect of obesity and weight reduction. Int. J. Obes., v. 25, p. 1206-
1214, 2001.

19
Captulo 3 - CARBOIDRATOS
Neuza Maria Brunoro Costa
Andr Gustavo Vasconcelos Costa

3.1. Consideraes Gerais


Os carboidratos so a principal fonte de energia para os seres humanos, podendo ser encontrados em frutas, vegetais,
leguminosas, cereais, leite e mel. Fornecem a maior parte da energia necessria para a pessoa se movimentar, executar trabalhos
e viver, contribuindo com um porcentual de 50 a 80% das calorias totais da alimentao. Em geral, so os responsveis pela
textura e flavor em muitos processamentos de alimentos. No intestino delgado, so digeridos e absorvidos e, no intestino
grosso, fermentados por bactrias (STIPANUK, 2000).
Nos pases em desenvolvimento, os carboidratos so consumidos principalmente na forma de amido, proveniente de
razes, tubrculos e cereais, enquanto nos pases industrializados se consome grande proporo de acares simples,
particularmente sacarose. De modo geral, a proporo de carboidratos na dieta maior nos nveis socioeconmicos mais
baixos. Embora os gros sejam uma fonte importante de carboidratos, eles tambm fornecem a maior parte da protena para a
populao mundial.
Os carboidratos no so nutrientes essenciais como alguns aminocidos e cidos graxos, porm importante para a
sade e bem-estar que os alimentos contenham certa quantidade de carboidratos. Isso verdade no apenas para os
carboidratos, que podem ser digeridos, absorvidos e metabolizados, mas tambm para os polissacardeos indigerveis, que
constituem as fibras da dieta.

3.2. Definio e Importncia


Carboidratos so polidroxialdedos (aldoses, que possuem em sua constituio um grupo aldedico) ou cetonas
(cetoses, que possuem em sua constituio um grupo cetona) ou substncias que produzem esses compostos quando
hidrolisadas. So constitudos por tomos de carbono, oxignio e hidrognio na proporo: (CH2O)n. Porm, essa simples
relao merece ateno, uma vez que no fornece indicao da estrutura. Alm disso, essa frmula geral no pode ser
estritamente seguida, pois algumas substncias, no classificadas como carboidratos, apresentam essa mesma frmula, por
exemplo o cido actico (GROFF, 1995). Os carboidratos so freqentemente encontrados ligados, por uma ligao covalente,
a protenas e lipdios. Essa glicoconjugao origina as glicoprotenas, proteoglicanos e glicolipdios (STIPANUK, 2000).
Os carboidratos so nutrientes preponderantemente energticos e mais eficientes que os lipdios e as protenas no
fornecimento de energia para a atividade celular, alm de desempenharem outras funes, como: economizam protenas,
poupando-as para a sua funo construtora; ajudam a manter a normalidade da oxidao de lipdios, devido sua ao
anticetognica; e entram na constituio de inmeros compostos que regulam o metabolismo (CAVALCANTI, 1995).

3.3. Classificao
Existem trs classes principais de carboidratos de interesse na nutrio: monossacardeos, oligossacardeos e
polissacardeos Os monossacardeos so estruturas simples de carboidratos que no podem ser hidrolisados em partculas
menores, fato pelo qual so tambm conhecidos como "acares simples". A glicose o monossacardeo que mais interessa
nutricionalmente. Oligossacardeos so constitudos por pequenas cadeias de monossacardeos duas, trs ou quatro, originando
os di-, tri- ou tetrassacardeos. A sacarose, constituda por uma molcula de glicose e uma de frutose, o dissacardeo que mais
interessa nutrio, chegando a compreender 1/3 do total de carboidrato da dieta. Por fim os polissacardeos, que so longas
cadeias, centenas ou milhares de unidades de monossacardeos. Os de maior interesse na nutrio so o glicognio, encontrado
em certos animais, inclusive os humanos, o amido e a celulose, originados de plantas (GROFF, 1995).

3.3.1. Monossacardeos
Os monossacardeos (Fig. 3.1A), como mencionado anteriormente, constituem os chamados acares simples e
consistem em uma s unidade aldedica, quando o grupo carbonila est em uma das extremidades da cadeia carbnica; ou
cetnica, quando o grupo carbonila est em qualquer outra posio da cadeia. Os mais simples so as duas trioses (trs tomos
de carbono): gliceraldedo e diidroxicetona. Aqueles com quatro, cinco, seis e sete tomos de carbono so chamados,
respectivamente, de tetroses, pentoses, hexoses e heptoses (LEHNINGER, 1995).
As hexoses mais abundantes nos alimentos so a D-frutose e a D-glicose. A D-glicose o principal combustvel para a
maioria dos organismos vivos e o monmero primrio bsico dos polissacardeos mais abundantes como amido e celulose.
Dentre as hexoses, apenas glicose, galactose e frutose podem ser absorvidas por seres humanos (ETTINGER, 2002).
Os principais monossacardeos que ocorrem livres nos alimentos so a glicose, uma aldo-hexose, e a frutose, uma ceto-
hexose. A galactose e a manose raramente aparecem na forma livre na natureza, mas podem existir tanto em cadeia aberta
quanto em anel. Quando esto ligadas em di ou polissacardeos, permanecem na forma cclica. As pentoses, como ribose,
desoxirribose, xilose e arabinose, so outros tipos de monossacardeos no encontrados na forma livre nos alimentos. Elas so
derivadas de pentosanas de frutas, dos cidos nuclicos e de derivados de carne e frutos do mar (ETTINGER, 2002).

20
CH2OH
CH2OH
O
O HOH2C O CH2OH
HO
OH HO
OH
HO OH
OH
OH OH
OH
-D-Glicose
-D-Galactose -D-Frutose

Figura 3.1 Estruturas dos carboidratos - Monossacardeos.

Glicose
A glicose, tambm chamada de dextrose, um carboidrato simples abundante em frutas e hortalias. As clulas
utilizam a glicose proveniente da dieta, onde est presente em sua forma simples ou em formas mais complexas como sacarose,
lactose e amido; nesse caso, essas molculas precisam ser degradadas para serem absorvidas. A glicose tambm pode ser
proveniente dos estoques de glicognio muscular e heptico e do esqueleto carbnico dos aminocidos glicognicos e do
glicerol, durante seu metabolismo no processo chamado de gliconeognse (STIPANUK, 2000).
A glicose a melhor forma de acar para ser utilizada quando necessrio um suprimento imediato de energia, uma
vez que no requer mudanas para ser empregada, relativamente barata e pode ser adicionada a alimentos lquidos para
aumentar a ingesto de carboidratos, sem afetar o sabor dos alimentos, pois tem cerca de 3/5 da doura do acar da cana.
Em condies normais, clulas, como as hemcias, so incapazes de usar outro tipo de combustvel seno a glicose,
que tambm essencial para as clulas do sistema nervoso central, dos pulmes e do msculo cardaco. No entanto, a maioria
das clulas do organismo humano tambm pode utilizar os lipdios e protenas como fonte energtica; por exemplo, em
situaes de jejum prolongado, o sistema nervoso pode se adaptar para utilizar corpos cetnicos com fonte de energia
(STIPANUK, 2000).
As clulas no so capazes de armazenar glicose como monossacardeo, pois sua estrutura de reserva o glicognio,
um polissacardeo conhecido como "amido animal". Porm, a glicose a forma de acar encontrada normalmente na corrente
sangnea, sendo sua concentrao no sangue estreitamente regulada; em um indivduo adulto, a faixa de normalidade
compreende 70 a 110 mg/dL de sangue.
A digesto do carboidrato da dieta no trato gastrointestinal superior fornece glicose, frutose e galactose para absoro
intestinal. A presena de oligossacardeos no absorvveis e de fibras como pectinas, -glicanos e gomas das frutas, vegetais e
cereais reduz a eficincia da hidrlise de enzimas e torna mais lenta a velocidade com a qual a glicose entra na corrente
sangnea. A reduo na eficincia da hidrlise diminui o ndice glicmico dos alimentos que esto sendo digeridos.
Abaixo esto valores de ndices glicmicos de alguns alimentos, tendo com referncia o po branco (IG po
branco=100) (ETTINGER, 2002).
Arroz 109 Manga 80
Batata frita 107 Biscoito de aveia 79
Abbora 107 Batata-doce 77
Melancia 103 Banana 76
Cenoura 101 Inhame 73
Batata assada 100 Chocolate 70
Fub 97 Macarro 64
Refrigerante 97 Laranja 62
Biscoito amanteigado 95 Pudim 61
Abacaxi 94 Ma 52
Batata cozida 93 Iogurte 51
Beterraba 91 Gro-de-bico 47
Po de hambrguer 87 Feijo-roxo 42
Sorvete 87 Leite 39
Mamo 83 Ameixa 34
21
ndice Glicmico e Carga Glicmica
O ndice glicmico (IG) definido como a rea abaixo da curva relativa ao aumento da glicose sangnea no
perodo de 2 h aps a ingesto de certa quantidade de carboidratos de um alimento (ex. 50 g), comparado com a ingesto da
mesma quantidade de carboidratos de um alimento-referncia (po branco ou glicose), avaliado no mesmo indivduo, nas
mesmas condies, usando a concentrao de glicose inicial como ponto de base (Fig 3.2). Assim, o ndice glicmico a
categorizao dos alimentos com base na resposta de glicose sangnea ps-prandial, comparada com um alimento de
referncia (ETTINGER, 2002).
A carga glicmica mdia derivada da mesma maneira que o ndice glicmico, mas sem dividir pela quantidade
total de carboidratos consumidos. A carga glicmica , portanto, um indicador da resposta glicmica ou insulnica induzida
pelo consumo total de carboidratos e no apenas de uma quantidade preestabelecida, como 50 g para determinao do IG.
Alguns alimentos que contm carboidratos elevam os nveis de glicose sangnea muito rapidamente, enquanto
outros permitem que o organismo mantenha um "estado constante" com relao liberao de insulina para controlar os
nveis de acar do sangue (MATHAI, 2002). Esse ndice uma proposta como um meio de prescrever dietas para
diabticos e para controle de energia.
Diversos fatores influenciam o IG. E os que mais contribuem para reduzir esse ndice so: alta relao entre
amilose: amilopectina; maior tamanho de partcula do gro ingerido; menor processamento (cozimento) dos alimentos;
menor grau de amadurecimento das frutas, presena de fibra solvel e de inibidores enzimticos (-amilase) e a interao
fsica com lipdios e protenas. A chave do processo de IG parece ser a taxa de absoro do alimento.

ndice Glicmico

160

140
Glicose (mg/dL)

120 Feijo
100 Batata

80

60
0 15 30 45 60 75 90 120
Tempo (min)

Figura 3.2 ndice glicmico (valores fictcios). A rea abaixo da curva do alimento em relao rea correspondente para
glicose ou po branco fornece o ndice glicmico (IG).

Frutose
A frutose, tambm chamada de levulose, encontrada juntamente com a glicose e a sacarose no mel e nas frutas. um
acar muito solvel e o mais doce dos acares simples. A frutose, combinada com a glicose, forma sacarose. Constitui a
unidade estrutural da inulina, um oligossacardeo encontrado em certas razes (alcachofra) e bulbos (cebola e alho). A inulina
muito pouco digerida no trato gastrointestinal e, juntamente com frutooligossacardeos (FOS), constitui uma das principais
fontes de prebiticos na alimentao.

Galactose
A galactose raramente encontrada livre na natureza, mas obtida principalmente pela hidrlise da lactose, encontrada
no leite. menos solvel em gua e menos doce do que a glicose. A galactose tambm um constituinte dos glicolipdios e das
glicoprotenas, encontrados em muitos tecidos, inclusive no tecido nervoso. No organismo, a glicose pode ser transformada em
galactose, para que as glndulas mamrias possam produzir lactose.

22
3.3.2. lcoois de Acares
Os lcoois de acares no so carboidratos, mas derivados deles atravs de hidrogenao, e so encontrados em
diversos vegetais (Fig. 3.3).
O sorbitol, produzido comercialmente por hidrogenao da glicose e tambm encontrado em muitas frutas e hortalias,
absorvido de forma muito lenta na corrente sangnea, e pode ser metabolizado aparentemente sem insulina. Tem o mesmo
valor calrico da glicose, o acar do qual obtido e tem cerca da metade do poder adoante da sacarose. Em altas doses, o
sorbitol tem efeito laxativo.
O manitol, obtido comercialmente por hidrogenao da manose, ocorre naturalmente em abacaxis, azeitonas,
cogumelos, aspargos e cenouras, podendo tambm ser adicionado como agente desidratante em outros alimentos. Uma vez que
muito pouco absorvido, o manitol fornece quase a metade do valor energtico da glicose.
O xilitol, encontrado em menor concentrao nas plantas, derivado da xilose extrada da hemicelulose e tem o
mesmo poder adoante e o mesmo valor energtico da sacarose. Tem sido muito utilizado como adoante, por no ser
cariognico. tolervel por diabticos, pois sua transformao em glicose no fgado lenta e parcial.
O inositol ocorre em muitos alimentos, especialmente na casca dos gros de cereais. Quando combinado com certos
grupos fosfato, forma o cido ftico, que reduz a absoro de clcio, zinco e ferro nos intestinos.
O dulcitol, obtido da galactose por hidrogenao, , s vezes, adicionado aos alimentos.
O glicerol ocorre na natureza e importante componente dos lipdios.
O lcool, ou o etanol, produzido pela fermentao da glicose por enzimas em leveduras e pode, em certos indivduos
consumidores de grandes quantidades de bebidas alcolicas, representar parte significativa da ingesto total de energia. Um
grama de lcool produz 7 kcal. O etanol no requer digesto e pode ser absorvido no trato gastrointestinal.

HO OH

OH

OH

HO

OH

mio-Inositol

CH2OH CH2OH CH2OH

H C OH HO C H H C OH

HO C H HO C H HO C H

H C OH H C OH H C OH

H C OH H C OH CH2OH

CH2OH CH2OH

Sorbitol Manitol Xilitol

Figura. 3.3 Estruturas dos lcoois de acares.

23
Reao de Maillard

A reao de Maillard consiste na ligao, atravs de enzimas, do grupamento amino dos aminocidos,
principalmente da lisina, com o grupamento carboxil de acares redutores. Essa importante reao ocorre no
processamento de alimentos, especialmente naqueles assados ou frituras, sob altas temperaturas, como na panificao, na
evaporao do leite. O resultado dessa reao um escurecimento do alimento, formando um pigmento marrom; no
obstante ocorre perda do valor nutritivo das protenas (STIPANUK, 2000; GROFF, 1995).

3.3.3. Dissacardeos
Os dissacardeos so representados pela sacarose (acar da cana ou da beterraba), maltose (acar do malte) e lactose
(acar do leite), compostos de duas molculas de hexoses (Fig. 3.4):
Sacarose = glicose + frutose
Maltose = glicose + glicose
Lactose = glicose + galactose
So hidrolisados em seus constituintes monossacardeos pelas enzimas digestivas, antes de serem absorvidos no
organismo.
Sacarose
A sacarose o acar comum da mesa e encontrado principalmente no acar da cana, no acar da beterraba e no
melao. Quando hidrolisada, forma-se uma mistura 50:50 de glicose e frutose. Essa mistura chamada de acar invertido e
vista freqentemente em rtulos de alimentos.

Maltose
A maltose, ou acar do malte, no existe livre na natureza. chamada de acar "derivado", pois um produto da
digesto do amido pela diastase, uma enzima obtida de gro germinado, como ocorre na fabricao da cerveja.
A maltose tambm formada no trato gastrointestinal, durante a digesto do amido. A reao se inicia com a -
amilase salivar e continua com a -amilase pancretica. No intestino, a maltase hidrolisa a maltose em duas molculas de
glicose, forma na qual absorvida. A maltose no prontamente fermentada pelas bactrias do clon e, como a fermentao
freqentemente leva diarria, essa propriedade torna a maltose til, em combinao com dextrina, nas frmulas infantis.

Lactose
A lactose o principal acar encontrado no leite, 4 a 6% do leite de vaca e 5 a 8% do leite humano. No est
presetnte nas plantas e limita-se, quase que exclusivamente, glndula mamria de animais lactantes. menos solvel que os
outros dissacardeos comuns e tem apenas um sexto da doura da sacarose. Quando hidrolisada, produz glicose e galactose e
digerida mais lentamente que os outros dissacardeos.
Na fabricao do queijo, parte da lactose do leite convertida em cido ltico e outros cidos. A lactose permanece no
soro e obtida comercialmente como um subproduto da manufatura do queijo. Conseqentemente, a maioria dos queijos
contm pouca ou nenhuma lactose.

CH2OH

HOH2C O CH2OH

OH HO
O
HO

OH OH
Sacarose

24
CH2OH CH2OH
O O

OH OH
O
HO OH

OH OH

Maltose
CH2OH
CH2OH
O
HO O

OH O
OH

OH
OH Lactose Figura 3.4 Estrutura dos dissacardeos.
OH
3.3.4. Oligossacardeos Os oligossacardeos rafinose e estaquiose so encontrados em leguminosas, como a soja e o feijo, e
so responsveis por certas disfunes digestivas, como a flatulncia. A rafinose um trissacardeo, composto de sacarose e de
resduo da galactose. A estaquiose um tetrassacardeo com outro resduo de galactose ligado rafinose. Esses
oligossacardeos podem ser hidrolisados pela -D-galactosidase, durante a germinao dos gros. O homem no sintetiza essa
enzima. Desta forma, os oligossacardeos no so digeridos e passam para o intestino grosso, onde so fermentados, produzindo
gases.

Intolerncia Lactose
Intolerncia lactose uma sndrome caracterizada pela incapacidade primria ou secundria de hidrolisar a
lactose em monossacardeos. A manifestao clnica caracterstica a diarria aquosa explosiva, mas podem ser
encontrados outros sintomas isolados.
Normalmente, para ser absorvida, a lactose deve ser degradada pela enzima lactase, presente na borda em escova
do intestino delgado. A partir da, origina os monossacardeos galactose e glicose, que so conduzidos ao interior das
clulas. Quando a atividade da enzima diminuda, a lactose no hidrolisada, ficando intacta no lmen intestinal; isso faz
que a osmolaridade aumente. Ao mesmo tempo, a lactose sofre fermentao pelas bactrias intestinais, o que aumenta ainda
mais a osmolaridade. Dessa forma, aparecem os sintomas da diarria aquosa explosiva, distenso abdominal, flatulncia,
vmitos e diminuio no crescimento, devido perda contnua de nutrientes.
A intolerncia pode ser classificada em primria, defeito intrnseco da enzima, ou secundria, devido a um dano na
mucosa intestinal que acarreta a deficincia da enzima. Tal dano pode ser originado da desnutrio, doena celaca, diabetes
mellitus, fibrose cstica, lcera duodenal e colite ulcerativa, dentre outras.
O diagnstico compreende uma anamnese alimentar dirigida, exame fsico e testes que avaliem a digesto e
absoro desse carboidrato. Detectada a intolerncia, o tratamento deve ser direcionado para a retirada desse acar da dieta
ou na ingesto oral de lactase sempre que o indivduo consumir esse acar ou na substituio do leite por frmulas
industrializadas isentas de lactose, como as frmulas base de soja (SABR et al, 1994).

3.3.5. Polissacardeos
Para um armazenamento eficiente de energia potencial, plantas e animais encerram a energia dos carboidratos em
unidades bem maiores do que os acares, quais sejam: amido, dextrina e glicognio. Todos esses polissacardeos so
molculas que podem conter vrias centenas de unidades de glicose. Conseqentemente, so menos solveis e mais estveis,
mas diferem entre si em alguns aspectos, como digestibilidade e resistncia deteriorao.
Para ser utilizado como fonte de energia na alimentao humana, o carboidrato deve estar sujeito digesto pelas
enzimas do trato digestivo. Os amidos e as dextrinas esto dentro dessa categoria, mas celulose, hemiceluloses, pectinas, gomas
e mucilagens, que tambm esto presentes nos alimentos vegetais, no so digeridas pelos humanos.

Amido

25
O amido a principal forma de carboidrato na dieta, sendo composto de duas subunidades: amilose e
amilopectina. A primeira consiste de longas cadeias no ramificadas, polissacardicas de unidades de glicose ligadas entre si,
como a maltose (ligaes (14), enquanto a segunda uma estrutura ramificada formada por unidades de glicose. O
comprimento das ramificaes de 24 a 30 resduos de glicose. A ligao do esqueleto (14), mas os pontos de
ramificao so laos (16). A composio do amido varia conforme a sua origem, porm todos eles contm amilose e
amilopectina.
O amido encontrado em gros de cereais, leguminosas, hortalias, razes e tubrculos. O amido do gro est
principalmente no endosperma, encapsulado por uma cobertura protetora de celulose (a casca). O grnulo de amido do
endosperma consiste em minsculas partculas de amido, geralmente arrumadas em camadas concntricas num padro de forma
e aparncia caractersticas. Os grnulos de amido, por sua vez, podem ser encerrados em clulas de tamanho maior.
Antes que o amido possa ser usado pelo organismo, a membrana externa precisa ser rompida, seja por triturao, seja
por cozimento. Aplicando-se calor e umidade, o envelope celulsico externo rompido, e a umidade permeia os grnulos de
amido. Esses possuem afinidade pela gua, absorvendo-a tal como o faz uma esponja e aumentando grandemente de volume.
Aps a ruptura da parede celular por cozimento, o amido torna-se gelatinizado e, nessa forma, pode sofrer mais facilmente a
ao das enzimas digestivas.

Dextrinas
A aplicao longa de calor seco, como no assado ou na torrefao, transforma o amido em dextrina solvel. O paladar
da crosta formada nos pes, nas torradas ou em cereais tostados devido em parte s formas de dextrina.
As dextrinas aparecem principalmente como produtos intermedirios na hidrlise parcial dos amidos, por ao
enzimtica ou coco. So formadas por muitas unidades de glicose ligadas entre si com o mesmo tipo de ligao do amido. As
molculas individuais so menores e no possuem a propriedade de espessamento do amido.

Glicognio
O glicognio a forma na qual os animais armazenam glicdio. um polissacardeo similar amilopectina, porm
com mais cadeias ramificadas e um peso molecular maior. Quando na corrente sangnea entra quantidade de glicose maior do
que pode ser imediatamente metabolizada, o indivduo normal combina muitas molculas de glicose (at 30.000) para formar
glicognio no fgado ou no msculo. Do mesmo modo, quando a glicose necessria, o glicognio quebrado, e ela se torna
logo disponvel para a produo de energia. Aproximadamente de 340 a 350 g de glicognio podem ser estocados por adultos
do sexo masculino, sendo 115 g no fgado e 230 g nos msculos. O glicognio heptico disponvel para a reposio de acar
no sangue, enquanto o muscular usado primariamente como combustvel para os prprios msculos.
Quase nenhum glicognio encontrado nos alimentos. As pequenas quantidades existentes na carne e nos alimentos
marinhos so convertidas em cido ltico quando o animal morre, durante a "rigidez mortis".

Celulose, Hemiceluloses e Pectinas


A celulose um polmero de cadeia reta, constitudo por unidades de glicose. a moldura celular das plantas; uma
substncia fibrosa resistente e insolvel na gua, encontrada na parede celular. A celulose o polissacardeo estrutural
extracelular mais abundante do mundo vegetal e tambm a mais abundante de todas as biomolculas encontradas na natureza.

O ser humano no tem as enzimas necessrias para hidrolisar a celulose para que ela possa ser utilizada. Os ruminantes
podem utilizar a celulose porque ela digerida por bactrias do rmen; no sendo digerida, no ser absorvida, passando dessa
forma para o intestino grosso. A celulose apenas contribui para o volume do bolo fecal, no oferecendo, porm, valor nutritivo
para as clulas do corpo.
A indigestibilidade da celulose a sua principal vantagem, uma vez que as fibras no digeridas fornecem a massa
necessria para uma ao peristltica eficiente e normal do intestino.
Boas fontes alimentares de celulose so as frutas secas, os cereais de gro integral, as folhas dos vegetais, as
leguminosas, as castanhas e as nozes. Os alimentos muito refinados, como a farinha de trigo branca e outros, praticamente no
contm celulose.
As hemiceluloses, em contraste com a uniformidade da celulose, so componentes da parede celular que consistem de
ampla variedade de polissacardeos, que contm uma mistura de pentoses e hexoses, sendo muitos desses polmeros
ramificados. Portanto, esses polissacardeos no so relacionados estruturalmente com a celulose. O termo hemicelulose,
entretanto, prevalece para designar a mistura complexa de polissacardeos que podem ser extrados da parede celular das
plantas com lcali diludo. As hemiceluloses tm a capacidade de reter gua, aumentam o volume do bolo fecal e estimulam o
peristaltismo intestinal, sendo essa a sua principal funo na nutrio humana.
Embora presentes em quantidades menores do que outros componentes das paredes celulares, as pectinas so comuns a
quase todas as clulas vegetais e esto presentes tambm em camadas intercelulares. Elas constituem cerca de 1 a 4% dos
polissacardeos totais da parede celular. As frutas ctricas desidratadas contm cerca de 30% de pectina, ma 15% e a cebola
11 a 12%.
Duas propriedades das pectinas devem ser mencionadas: sua capacidade de formar gis e de se ligar a ons. A pectina
comercial, preparada a partir de cascas de ma e caroos de limo, obtida com lquido ou p e usada para fazer gelias de
fruta e gelatinas.
26
Uma grande importncia da pectina na nutrio humana o seu efeito na reduo dos nveis de colesterol plasmtico.
A habilidade da pectina em baixar a concentrao de colesterol no sangue tem sido amplamente investigada e confirmada por
numerosos estudos.
3.4. Funes dos Carboidratos no Organismo
Fornecimento de Energia: A principal funo dos carboidratos ser a maior fonte de energia para o corpo. A maioria
dos tecidos pode usar outras fontes de energia, mas o crebro e as clulas vermelhas do sangue so mais restritos. Cada grama
de carboidrato digervel fornece cerca de 4 kcal, independentemente da fonte - monossacardeo, dissacardeo ou polissacardeo.

Ao Anticetognica e Economizadora de Protenas: O combustvel usado para a contrao muscular so os


carboidratos. As reservas de glicognio no msculo so pequenas e, se o indivduo entrar em atividade fsica prolongada e
severa, haver decrscimo na glicose sangnea, aumentando a utilizao de protenas e gorduras do corpo, sendo os
aminocidos e o glicerol convertidos em glicose. Haver, em conseqncia, eliminao maior, na urina, de nitrognio e corpos
cetnicos. Se, no entanto, o indivduo tiver feito uma refeio rica em glicdios antes do exerccio, haver eliminao muito
menor de nitrognio e corpos cetnicos na urina. Esse efeito do carboidrato exemplifica sua ao anticetognica e
economizadora de protenas.

Desintoxicao: O glicognio heptico exerce ao de proteo e desintoxicao, pois o cido glicurnico, um


metablito da glicose, tem a funo importante de se combinar com toxinas qumicas e bacterianas e, ainda, com alguns
metablitos, convertendo-os numa forma na qual possam ser excretados.

Crescimento bacteriano: A lactose permanece no intestino por mais tempo e estimula o crescimento de bactrias
benficas, resultando numa ao laxativa. Acredita-se que essas bactrias sejam sintetizadoras de vitamina k e do complexo B.
Alm disso, a fermentao bacteriana da lactose facilita a absoro do clcio.

Funo intestinal: A celulose e outros carboidratos insolveis facilitam a funo intestinal, estimulando o peristaltismo
e prevenindo vrias doenas, alm de auxiliar no tratamento de outras enfermidades.

Precursores de compostos orgnicos: Os carboidratos so precursores de compostos como cidos nuclicos, matriz do
tecido conectivo e galactosdeos do tecido nervoso.

3.5. Digesto dos Carboidratos


Alguns polissacardeos, como celulose, hemicelulose e pectina, no sofrem digesto ao longo do trato gastrointestinal.
Os nicos que so digeridos pelo homem so os amidos e o glicognio, que precisam ser quebrados em monossacardeos, que
so as molculas aptas a passar atravs das clulas da mucosa intestinal.
O processo de digesto dos carboidratos comea na boca, pela ao da -amilase salivar (ptialina). A eficcia da
amilase salivar, porm, depende do grau de mistura do alimento com a saliva e do tempo que a enzima permanece em contato
com o substrato. Geralmente, os hbitos alimentares permitem um tempo curto para a interao enzima/ substrato, e, depois que
o alimento chega ao estmago, a ao da amilase salivar depende do tempo necessrio para que o pH fique entre 6,6 e 6,8, que
a faixa tima de atuao da enzima. Dessa forma, o significado da digesto salivar limitado pela curta passagem e
incompleta mastigao do alimento na boca.
As enzimas do estmago no so especficas para carboidratos. Poderia haver uma hidrlise cida, caso a permanncia
do bolo alimentar fosse mais prolongada.
O intestino delgado o principal local da digesto de carboidratos e, quando o quimo atinge o duodeno, os
carboidratos sofrem o ataque de enzimas secretadas pelo pncreas. Na fase luminal (ou seja, enquanto o quimo se encontra na
luz do intestino), a -amilase pancretica continua a degradao do amido, onde terminou a ao da amilase salivar. A digesto
do amido est mostrada na Figura 3.5.

27
(1-4)

Amido

-amilase

(1-6)

Maltose Maltotriose

Dextrina-limite
Maltase

Isomaltase

Glicose

Maltose Maltotriose

Maltase

Glicose

Figura 3.5- Digesto do amido: a enzima -amilase quebra a cadeia linear do amido em maltose, maltotriose e dextrina-
limite. A digesto continuada pela maltase, liberando glicose, e pela isomaltase, que quebra a ligao 1-6
das ramificaes. Glicose o produto da digesto do amido.

28
Essas enzimas agem nas ligaes internas da amilose e tm pouca especificidade para as ligaes no final da molcula,
por isso os produtos finais possuem apenas ligaes mais externas, resultando em dissacardeos (maltose) e trissacardeo
(maltotriose). Como a molcula de amido contm no apenas ligaes (14) mas tambm (16), surgem tambm como
produtos finais da digesto pela -amilase oligossacardeos, que contm justamente o ponto de (16), as chamadas
dextrinas-limite. Portanto, a digesto pela -amilase consegue liberar apenas traos de glicose livre, j que essa enzima no
quebra ligaes externas.
Os estgios finais da digesto dos carboidratos so feitos pelas enzimas ligadas membrana no lado luminal da
membrana lipoprotica da clula mucosa (borda em escova). As enzimas mais importantes, que atuam na digesto dos
carboidratos nessa parte do aparelho digestivo, so:
- Isomaltase ou (16) glicosidase: atua nos pontos de ramificao, quebrando as ligaes (16).
- Sacarase: tambm chamada de invertase, desdobra a sacarose em glicose e frutose. - Maltase: desdobra a maltose
em duas molculas de glicose. Atua tambm nas maltatrioses.
- Lactase ou - galactosidase: atua sobre a lactose, resultando em uma molcula de glicose e uma de galactose.
Os acares ingeridos como monossacardeos no sofrem digesto ao longo do aparelho digestivo.

3.6. Absoro dos Carboidratos


Os monossacardeos, ingeridos como tal ou resultantes da digesto dos polissacardeos, so quase que totalmente
absorvidos no intestino delgado.
A absoro dos monossacardeos se d de duas maneiras:
1. No especfica, ou seja, um processo fsico de difuso passiva, aquele que absorvido por um gradiente de
concentrao entre o acar na mucosa do lmen intestinal e o das clulas da mucosa intestinal.
2. Absoro ativa: so utilizados carreadores especficos. No caso da glicose e da galactose, h um sistema de
carregamento que dependente da presena de sdio (Fig. 3.6). Por utilizarem o mesmo mecanismo de transporte ativo, glicose
e galactose competem na sua absoro. A frutose absorvida por um processo de difuso facilitada ainda no totalmente
compreendido, que duas vezes mais lento que a absoro ativa. Os outros acares como a manose, a xilose e a arabinose so
absorvidos ainda mais lentamente, sendo, assim, de pequena importncia nutricional.
Estudos com ratos tm apontado que as velocidades relativas de absoro dos diferentes monossacardeos, tomando a
glicose como 100, so as seguintes:
- Galactose - 110
- Glicose - 100
- Frutose - 40
- Manose - 20
- Xilose - 15
- Arabinose - 10
Borda em Membrana
Escova Basolateral

Na+
S
G
Glicose T
ou L G
Galactose L
U
G T
Frutose L 2
U
T

ATP ADP

Figura 3.6- Absoro de carboidratos: glicose e galactose so absorvidas por transporte mediado ativo, dependente de sdio. O
transportador SGTL1 liga-se simultaneamente glicose ou galactose e ao sdio. Glicose e galactose so liberadas do
entercito pelo transportador GLUT2, na membrana basolateral. O sdio eliminado pela bomba sdio-potssio, com
gasto de energia. A frutose absorvida por transporte mediado passivo pelo transportador GLUT 5, que no depende
29 do
sdio. A sada da frutose do entercito se d pelo mesmo transportador de glicose e galactose (GLUT 2). Os
monossacardeos seguem pela veia porta at o fgado.
3.7. Metabolismo dos Carboidratos
3.7.1. Consideraes Gerais
Todos os tecidos do organismo so capazes de remover a glicose da circulao e utiliz-la na produo energtica.
Existem diferenas entre os tecidos relativas captao de glicose, como uma fonte de energia, assim como s vias metablicas
nas quais ela liberada. Os tecidos do Sistema Nervoso Central (SNC) e das clulas do sangue so mais dependentes de um
contnuo suprimento de glicose.
No caso do SNC, de todos os rgos e tecidos do corpo ele o mais dependente da glicose, que, como tal, tem
influncia especfica e indispensvel integridade do tecido nervoso. Quando o nvel de glicose no sangue abaixa, os tecidos
que tm estoques de glicognio podem us-lo para vencer o perodo de escassez. O tecido nervoso tem pouco glicognio, e no
se sabe se ele capaz de utiliz-lo nas emergncias. O que se sabe que o contedo de glicognio do tecido nervoso permanece
mais ou menos constante mesmo na hiperglicemia ou na hipoglicemia e pode ser considerado como parte integrante da
estrutura do nervo. Essa no-disponibilidade do glicognio presente nas clulas nervosas evidenciada pelo desenvolvimento
rpido dos sintomas quando ocorre baixa na glicemia. Durante um jejum prolongado, as clulas do SNC parecem se adaptar
para utilizar corpos cetnicos no lugar da glicose como fonte de energia.
Alguma glicose, entretanto, sempre necessria, e o organismo tem meios para armazen-la quando um excesso
disponvel e para mobiliz-la ou converter outras substncias em glicose quando o suprimento limitado.

3.7.2. O Fgado
As clulas hepticas exercem papel regulador sobre os carboidratos da dieta. Depois de absorvidos, os carboidratos
vo at o fgado pela veia porta. Nas clulas hepticas, frutose e galactose sero convertidas em glicose. Assim, o principal
carboidrato que surge na circulao geral, aps a passagem dos glicdios da dieta pelo fgado, a glicose. Uma das principais
funes metablicas do fgado ser um agente "glicosttico" do sangue, convertendo os excessos de glicose em estoques de
reserva em tempos de plenitude e reconvertendo tais estoques em glicose na hora das necessidades, mantendo, assim, um nvel
adequado de glicose no sangue.

3.7.3. Utilizao da Galactose e Frutose


Galactose
A ingesto de galactose no apresenta problemas em indivduos normais. No fgado, ela rapidamente convertida em
uridinodifosfoglicose (UDP-glicose), que pode ser incorporada ao glicognio ou convertida em glicose-1-fosfato.
A galactose ingerida, derivada da lactose do leite, fosforilada pela galactoquinase:

Galactose + ATP Galactose-1-fosfato + ADP

A galactose-1-P pode ser integrada ao metabolismo da glicose pelas aes consecutivas da fosfogalactose
uridiltransferase e UDP-glicose epimerase, como se segue:

transferase
Galactose-1-P + UDP-Glicose UDP-Galactose + Glicose-1-P

epimerase
UDP-Galactose UDP-Glicose

Em uma enfermidade congnita chamada de galactosemia, a habilidade de metabolizar a galactose est impedida
devido deficincia da enzima galactose-1-P uridil transferase, requerida para a converso da galactose. Conseqentemente, a
galactose-P acumula-se em muitos tecidos. Isso pode resultar em falha no crescimento, formao de cataratas e retardamento
mental.
Com uma dieta livre de galactose, portanto sem leite, os indivduos com essa falha gentica podem viver at a vida
adulta sem nenhum sintoma de galactosemia.

Frutose
A frutose pode ser fosforilada por quinases no especficas para dar frutose-6-fosfato, todavia a afinidade dessas
enzimas pela frutose muito baixa, de tal forma que a maioria da frutose ingerida fosforilada pela frutoquinase que cataliza a
reao:

frutoquinase
Frutose + ATP Frutose - 1-P + ADP

A frutose 1-P no pode ser diretamente convertida em frutose -6-P nem em frutose 1-6-di P, mas, em
vez disso, ela sofrer a ao da frutose -1-P aldolase:
frutose-1-P aldolase
Frutose - 1-P Diidroxiacetona-P + Gliceraldedo
30
A diidroxiacetona-P um intermdio da via glicoltica, mas o gliceraldedo precisa ser oxidado na mitocndria pela
gliceraldedo desidrogenase para dar glicerato, o qual , ento, fosforilado pela gliceroquinase para produzir 2-fosfoglicerato,
outro intermedirio da via glicoltica.

3.7.4. Vias do Metabolismo dos Carboidratos


A captao de glicose pelas clulas a etapa limitante de sua utilizao em muitos tecidos, incluindo o msculo, o
corao e o tecido adiposo. A insulina indispensvel entrada da glicose nesses tecidos, enquanto o processo independente
de insulina no fgado e no SNC. A glicose captada pelo fgado apenas em condies de hiperglicemia.
Para que a glicose possa entrar na clula, so necessrios carreadores especficos, usualmente protenas de membranas.
Uma famlia de cinco protenas est envolvida no transporte da glicose (ou frutose) pela membrana celular, cada protena com
funes fisiolgicas e distribuio nos tecidos especficas, conforme esquema a seguir:
Transportador Tecido Caracterstica
GLUT 1 Maioria das clulas Alta capacidade
GLUT 2 Fgado, clulas beta, hipotlamo, Alta capacidade e baixa afinidade. Carreador
membrana basolateral do intestino de glicose e frutose. Carreador de glicose
delgado para fora do fgado e dos rins.
GLUT 3 Neurnios, placenta, testculos Alta capacidade
GLUT 4 Msculos esqueltico e cardaco; tecido Ativado pela insulina. Est presente na clula
adiposo na forma inativa. Pela ao da insulina,
levada at a superfcie da membrana celular,
onde favorece o transporte de glicose. Depois
retorna sua forma inativa.
GLUT 5 Superfcie da mucosa do intestino Especfico para frutose
delgado; esperma
Igualmente importante e talvez relacionada captao de glicose sua fosforilao a glicose-6-fosfato pelas
hexoquinases antes que ela possa entrar nas vias metablicas da clula. Essa reao praticamente irreversvel na maioria dos
tecidos. Uma vez que se torne glicose-6-P, ela deve entrar na via metablica, e no pode voltar ao sangue, exceto no fgado e no
rim, onde uma outra enzima, a glicose-6-fosfatase pode transform-la em glicose livre.
A glicose-6-P serve como uma ligao entre as principais vias do metabolismo da glicose:
Glicogenlise

Ciclo das Pentoses GLICOSE-6-P

Gliclise Fermentao ltica

Ciclo de Krebs

Gliclise
uma via do catabolismo da glicose que, sob a maioria das condies, uma etapa preliminar necessria liberao
de toda energia biologicamente disponvel da molcula de glicose. Resulta na conservao da glicose-6-P em duas molculas de
piruvato ou lactato, dependendo do tecido e do suprimento de oxignio da clula. A energia fornecida nessa via depende do
produto final. Algum ATP diretamente produzido pelos graus de fosforilao do substrato, no importando a disponibilidade
de oxignio. Outra reao liberadora de energia envolve a reduo concorrente do NAD+ que, sob condies aerbicas, ser
oxidado, gerando ATP (Fig. 3.7).

Ciclo de Cori
Durante perodos de limitado fornecimento de oxignio, como no msculo durante um exerccio vigoroso, o piruvato
reduzido a lactato pela desidrogenase lctica, utilizando NAD reduzido como coenzima. Embora isso reduza o fornecimento
total de ATP, pode servir como importante fonte de energia para o msculo, devolvendo o NAD oxidado para a quebra
contnua de glicose e produo de ATP (da gliclise), que cessaria devido inabilidade de oxidao do piruvato e do NADH.
Quando o oxignio se torna novamente disponvel, o lactato pode ser reoxidado a piruvato e metabolizado
posteriormente no Ciclo de Krebs. No msculo esqueltico, a reconverso do lactato a piruvato limitada. Em vez disso, ele
liberado para o sangue, removido pelo fgado para reoxidao e subseqente converso para glicose. Liberada para o sangue,
31
essa glicose se torna disponvel ao msculo novamente. Essa reciclagem dos carbonos da glicose entre o fgado e o msculo
conhecida como o ciclo do cido lctico ou ciclo de Cori (Fig. 3.8).

Descarboxilao oxidativa do piruvato


O elo entre a formao do piruvato e o ciclo do cido ctrico a formao do acetil-CoA (Fig. 3.9). Em outras
palavras, essa etapa faz a ligao do catabolismo dos carboidratos e de alguns aminocidos ao ciclo de Krebs (Fig. 3.10), que
a via comum de oxidao.
A descarboxilao oxidativa do piruvato ocorre em condies aerbicas, na matriz mitocondrial, envolve uma srie de
reaes complexas e catalizada pelo complexo piruvato/ desidrogenase.
Nessa etapa, o piruvato convertido em acetil-CoA e CO2. A reao requer trs enzimas diversas e cinco coenzimas,
organizadas num complexo multienzimtico.
As enzimas so: piruvato descarboxilase, lipoil transacetilase e diidrolipoil desidrogenase.
As coenzimas so: TPP, coenzima A, FAD, NAD e o cido lipico.
importante ressaltar aqui que, envolvidas nessas coenzimas, esto quatro vitaminas:
- Vitamina B1 - tiamina - TPP
- Vitamina B2 - riboflavina - FAD
- Niacina - NAD
- cido pantotnico - Coenzima A

Glicogenlise
o desdobramento do glicognio, sendo a glicose o principal produto no fgado e o piruvato e o lactato, nos msculos.
Essa via usada quando h necessidade de glicose no organismo. Nesse caso, a glicose produzida a partir dos depsitos de
glicognio existentes, principalmente, no fgado (Fig. 3.11).
Glicognese
Sntese de glicognio a partir da glicose. Essa via usada sempre que o nvel de glicose no sangue atingir limites
acima dos normais (Fig. 3.11).

Gliconeognese
o reverso da gliclise. Consiste na formao de glicose, partindo de fontes que sejam ou no carboidratos (Fig. 3.12).
Aparentemente, apenas o rim e o fgado tm a capacidade enzimtica de realizar a gliconeognese.

Via da Pentose Fosfato


Prov uma via alternativa para a utilizao da glicose-6-fosfato em alguns tecidos, incluindo o fgado, o tecido adiposo
e eritrcitos. uma via multicclica complexa que, no final, pode obter a completa oxidao da glicose em CO2 (Fig. 3.13).
Provavelmente, menos de 10% da oxidao total da glicose no organismo se faz nesse ciclo. As duas funes mais importantes
dessa via so a produo de pentoses para sntese de cidos nuclicos e de NADP reduzido para a sntese de cidos graxos.

32
Glicose

ATP
Etapa 1
ADP

Glicose-6-P

Frutose-6-P
Etapa 2
ATP
ADP

Frutose-1,6-diP

Diidroxicetona-P
Etapa 3
Gliceraldedo-3P

NAD
NADH x2 Etapa 4

1,3-diP-glicerato

ADP
ATP x2
3-P-glicerato

2-P-glicerato
Etapa 5

Fosfoenolpiruvato -PEP

ADP
ATP x2

Piruvato

Figura 3.7 - Gliclise: Rendimento energtico = 8 ATP (Etapa 3: 2 NADH x 3 = 6 ATP + Etapa 4: 2 ATP + Etapa 5: 2 ATP =
10 ATP Etapas 1 e 2: 2 ATP).

33
Msculo Fgado

Sangue

Glicose
Glicose
2 NAD
2 NAD
2 ATP
2 NADH
6 ATP 2 NADH
2 Piruvato
2 Piruvato
2 NADH
2 NADH
2 NAD
2 NAD
2 Lactato
2 Lactato

Figura. 3.8 - Ciclo de Cori. O lactato produzido no msculo pela via anaerbia levado na corrente
sangnea at o fgado, onde, pela gliconeognese, convertido em glicose, que pode retornar
ao msculo.

34
Lactato desidrogenase
Lactato Piruvato

NAD NADH
TPP
Via anaerbica FA
Piruvato desidrogenase cido
lipico
NAD CoASH

NAD CO2
H Via aerbica

Acetil CoA

Figura 3.9 - Descarboxilao oxidativa do piruvato (via aerbica) e produo de lactato (via anaerbica). A
enzima piruvato desidrogenase requer cinco coenzimas: tiamina pirofosfato (TPP), coenzima A,
FAD, NAD e cido lipico.

35
Piruvato

Acetil CoA

Oxalacetato Citrato

NADH

Malato Isocitrato

Ciclo do cido
Tricarboxlico
NADH

Ciclo de Krebs
Fumarato -cetoglutarato

FADH2

NADH

Succinato Succinil-CoA

GTP

Figura 3.10 - Ciclo do cido tricarboxlico (Ciclo de Krebs): rendimento energtico = 24 ATP (glicose = 2
acetil CoA; NADH = 3 ATP; FADH2 = 2 ATP; e GTP = 1 ATP.

36
Glicose

AT
AD

Glicose-6P Gliclise

Glicose-1P
Uridino tri-

P
Glicose(n-
Glicose-UDP

P Glicose(n-1)

Glicognio UD
Glicose(n)
Glicogenlise Glicognese

Figura 3.11 - Glicognese e glicogenlise

37
Glicose
(sangue)

Hexoquinase Glicose-6-fosfatase
(clula) (fgado)

Glicose-6P

Frutose-6P

Frutose-1,6diP)

Gliceraldedo-3P Diidroxicetona-P

P-enolpiruvato (PEP)
Glicerol

Oxalacetato

Msculo Ciclo de
Lactato Piruvato Krebs

Fgado
Aminocidos

Figura 3.12 - Gliconeognese a partir de lactato, aminocidos e glicerol.

38
Glicose-6P (6C)

NAD

NADP
H
6P-Gluconato (6C)

NAD
CO2
NADP
H
Ribulose-5P (5C)

Ribose-5P (5C) Xilulose-5P (5C)

Sedoheptulose-7P (7C) Gliceraldedo-3P (3C)

Eritrose-4P (4C) Frutose-6P (6C)

Via Glicoltica

Gliceraldedo-3P (3C)
Glicose-6P (6C)

Figura 3.13 - Via da pentose fosfato ou shunt da hexose monofosfato prov NADPH para a
biossntese, ribose-5P para a sntese de cidos nuclicos e outros metablitos da via
glicoltica.

39
3.8. Controle da Glicemia
3.8.1. Vias de captao e de remoo de glicose sangnea
Por meio da corrente circulatria, a glicose transportada para as clulas do organismo, onde serve como fonte de
energia e para a sntese de vrias substncias. A glicose continuamente retirada do sangue pelas clulas, mas reposta
principalmente pelo fgado, de modo que sua concentrao sangnea se mantm praticamente constante.
A dependncia da glicose por parte de vrios tecidos varia amplamente. A glicose essencial para o sistema nervoso
central, uma vez que a principal fonte de energia que atravessa efetivamente a barreira hematoenceflica. O msculo e outros
tecidos podem obter energia de outras fontes, como os corpos cetnicos e aminocidos ramificados. O msculo cardaco
relativamente insensvel a variaes de glicemia, pois remove efetivamente cidos graxos e lactato do sangue.
Aps 3 h de jejum, a concentrao de glicose no sangue cerca de 70 a 90 mg/100 mL. Logo aps a alimentao, pode
atingir 140 a 150 mg/100 mL (glicemia ps-prandial), mas em poucas horas a glicemia atinge os valores do jejum. Se a
concentrao sangunea atinge 160 a 180 mg/100 mL, a glicose ser excretada pelos rins (glicosria), mas isso raramente ocorre
nos indivduos normais, uma vez que o fgado bastante eficiente no processamento da glicose, sendo esta armazenada como
glicognio e utilizada para a sntese de lipdios.
A concentrao em excesso de glicose no sangue denominada hiperglicemia, caracterstica do diabetes mellitus. Uma
concentrao inferior normal denominada hipoglicemia, que pode ocorrer devido a desordens do metabolismo heptico ou
quando o pncreas secreta quantidades excessivas de insulina.
So fontes de glicose sangnea:
1 - Absoro de carboidratos da dieta.
2 - Degradao do glicognio heptico (glicogenlise).
3 - Gliconeognese a partir de aminocidos.
4 - Gliconeognese a partir do glicerol.
5 - Gliconeognese a partir do lactato.

Uma vez que a absoro intestinal de carboidratos um processo descontnuo, o fgado mantm o abastecimento
contnuo de glicose para o sangue, por meio da hidrlise da glicose-6-fosfato proveniente da glicogenlise, o que tambm
ocorre, em menor extenso, nos rins e no intestino. O fgado tambm o principal rgo onde acontece a gliconeognese a
partir de amincidos, lactato e glicerol; cerca da metade dos esqueletos carbnicos dos aminocidos presentes nas protenas
glicognica. tambm importante ressaltar que os cidos graxos, os corpos cetnicos e o glicognio muscular no contribuem
diretamente para a elevao da glicemia, uma vez que no podem dar origem glicose.
A glicose sangnea retirada do sangue pelas seguintes vias:
1 - Captao celular contnua para a produo de energia.
2 - Sntese de glicognio heptico (glicognese).
3 - Sntese de lipdios no fgado e no tecido adiposo (lipognese).
4 - Sntese de substncias derivadas (converso).
5 - Eliminao renal, quando o seu limiar excedido.

A concentrao da glicose sangunea resulta das velocidades relativas da produo de glicose pelo fgado, da absoro
intestinal e de sua utilizao por todos os tecidos. Tecidos como o fgado e o msculo assimilam mais rapidamente a glicose na
presena de altos nveis de glicemia. A concentrao elevada de glicose no sangue favorece a formao de glicognio e de
triglicerdeos, sobretudo no fgado e no tecido adiposo.

3.8.2. Controle Hormonal


Vrios mecanismos, controlados por hormnios, esto envolvidos no controle da glicemia. Quase todos atuam
elevando o nvel de glicose sangnea; o nico hormnio que diminui a concentrao de glicose no sangue a insulina.

Hipfise
A hipfise anterior tem efeito indireto sobre a glicemia, por meio da tirotrofina (TSH), que estimula a tireide, e da
adrenocorticotrofina (ACTH), que estimula a crtex adrenal. Contudo, tem tambm efeito direto, por meio da somatotrofina ou
hormnio do crescimento (GH ou SH). O GH antagoniza a ao da insulina, diminui a captao e utilizao da glicose e
aumenta a mobilizao de lipdios para fins energticos. Acredita-se que a liberao de GH em excesso pode ter efeito
diabetognico, pois pode aumentar de 50 a 100 vezes o nvel de glicose no sangue, estimulando o pncreas a secretar cada vez
mais insulina, o que pode levar disfuno desse rgo, com posterior desenvolvimento de diabetes.

Tireide
A tiroxina (T4), liberada pela tireide pelo estmulo da TSH da adenohipfise, um hormnio derivado do aminocido
tirosina e contm iodo. um estimulador dos metabolismos muscular e heptico, aumentando a velocidade do metabolismo
basal. Aumenta a concentrao da glicose sangnea, porque eleva a absoro intestinal de carboidratos, a glicogenlise e
gliconeognese hepticas, embora tambm estimule a gliclise.

Adrenais (supra-renais)
40
A adrenalina, ou epinefrina, secretada pela medula ou poro interna das glndulas supra-renais, tambm um
hormnio derivado do aminocido tirosina. A medula adrenal essencialmente parte do sistema nervoso, de quem recebe os
sinais. Quando os impulsos nervosos atingem a glndula, causam a exocitose dos grnulos que armazenam a adrenalina para o
fluido extracelular circulante e da para o sangue, podendo aumentar a concentrao sangnea desse hormnio de at 1.000
vezes. A secreo de adrenalina aumenta durante o estado de raiva e medo, resultando em aumento da produo de glicose, que,
presumivelmente, serve como fonte extra de energia, permitindo o organismo responder mais rapidamente ao estado de crise.
Os tecidos-alvo da adrenalina so o fgado e os msculos esquelticos, bem como o corao e o sistema vascular. A adrenalina
prepara o organismo para os estados de emergncia de vrias formas. Aumenta a freqncia e o rendimento cardacos e a
presso arterial, preparando o sistema circulatrio para a emergncia. Estimula a degradao do glicognio heptico em glicose
sangnea, o combustvel para realizar o trabalho muscular anaerbico, alm de inibir a sntese do glicognio, por inativar a
glicognio sintetase. Promove a degradao do glicognio do msculo esqueltico at lactato, via gliclise, estimulando,
portanto, a formao glicoltica de ATP.
A adrenalina no penetra realmente na clula heptica para exercer seu efeito. Ela liga-se a receptores especficos da
membrana plasmtica dos hepatcitos, provocando alterao na protena receptora. Essa alterao "transmitida" para a clula
que estimula a sntese de AMP cclico (AMPc), o segundo mensageiro. A sntese de AMPc desencadeia uma srie de reaes
em cascata de fosforilao de protenas, que terminam por ativar a fosforilase do glicognio ao mesmo tempo que inativam a
glicognio sintetase. O fenmeno em cascata de uma enzima promovendo a ativao ou inativao de outras enzimas resulta em
uma grande e rpida amplificao do sinal inicial, em que cada enzima da seqncia promove a ativao de muitas molculas
da prxima enzima. Dessa forma, a ligao de poucas molculas de adrenalina aos receptores do hepatcito resulta rapidamente
na liberao de muitos gramas de glicose para a circulao. Um efeito semelhante ocorre no msculo, mas, devido falta de
glicose-6-fosfatase, o tecido muscular no produz glicose. Em vez disso, a formao aumentada de glicose-6-fosfato no
msculo leva a um aumento na taxa de gliclise at lactato, tornando o ATP disponvel para a contrao.
Os glicocorticides, hormnios esterides secretados pela crtex adrenal, tambm contribuem para elevar a glicemia.
Aumentam o catabolismo protico, estimulando a gliconeognese a partir de aminocidos. Estimulam tambm a mobilizao
das gorduras, diminuindo a utilizao celular da glicose.

Pncreas
O pncreas o principal rgo endcrino no controle da glicose circulante. O glucagon, secretado pelas clulas alfa
das ilhotas pancreticas em estados de hipoglicemia, ativa a fosforilase do glicognio, estimulando a glicogenlise heptica.
Estimula tambm a gliconeognese e o transporte de aminocidos glicognicos, a fim de prover os carbonos necessrios para a
sntese de glicose. A soma desses efeitos resulta na elevao da glicemia.
O mecanismo de atuao do glucagon semelhante ao da adrenalina, sendo tambm mediada pela AMPc. Entretanto,
no estimula a gliclise muscular; ao contrrio, inibe-a indiretamente pela inibio da piruvato-quinase. O glucagon tambm
difere da adrenalina por possuir uma ao mais longa e por no estimular a freqncia cardaca ou elevar a presso arterial.
A insulina efetivamente o nico hormnio cuja ao reduz a glicemia. secretada pelas clulas beta das ilhotas
pancreticas, por um processo complexo que requer clcio. A taxa de secreo de insulina determinada principalmente pela
concentrao da glicose plasmtica. Quando a concentrao de glicose se eleva, ocorrer aumento da secreo de insulina.
O mecanismo exato de ao da insulina no est completamente estabelecido. Receptores de insulina foram detectados
nas superfcies das clulas do fgado, do msculo esqueltico e tambm do tecido adiposo. Sabe-se que esse receptor, uma vez
ativado, tem atividade cataltica, podendo se autofosforilar e fosforilar outras protenas. Apesar de esforos intensos, um
segundo mensageiro intracelular, liberado quando a insulina se liga aos seus receptores na superfcie celular, ainda no foi
identificado. Tambm no so conhecidas quais as protenas-alvo de fosforilao, entretanto acredita-se que o clcio
intracelular importante no desencadeamento da ao da insulina, e observou-se tambm um efeito moderador sobre os nveis
citoplasmticos de AMPc.
A insulina atua diminuindo o nvel da glicose sangunea porque aumenta a velocidade de captao da glicose pelas
clulas musculares e adiposas para a produo de energia, promove o armazenamento de glicose como glicognio no fgado e
msculo e estimula a converso de glicose em gordura no fgado e tecido adiposo. Em resumo, a insulina aumenta a taxa de
utilizao da glicose com trs propsitos bsicos: oxidao, glicognese e lipognese.
Embora o metabolismo da glicose no fgado seja dependente de insulina, esse rgo no necessita desta para a
captao de glicose. A clula heptica livremente permevel entrada e sada de glicose. Alm disso, em contraste com certos
tecidos como o muscular e o adiposo, em que a captao de glicose insulino-dependente, a glicose apenas captada pelo
fgado em condies de hiperglicemia. A insulina favorece a sntese de glicoquinase, que fosforila a glicose formando glicose-
6-fosfato no fgado. Essa enzima serve para capturar todo o excesso da glicose sangnea na clula heptica, independente da
concentrao de glicose-6-fosfato (um conhecido inibidor da hexoquinase muscular), permitindo, assim, o armazenamento de
glicose sob a forma de glicognio ou, aps o metabolismo posterior, na forma de cidos graxos.
A insulina possui outros efeitos, alm de aumentar a captao de glicose pelas clulas. Suprime a sntese de piruvato-
carboxilase, fosfoenolpiruvato-carboxiquinase e frutose-di-fosfatase, inbindo, assim, a gliconeognese. Alm disso, estimula o
aumento dos nveis de glicognio-sintetase e acelera a velocidade de oxidao da glicose pela via do fosfogliconato. Inibe a
liplise, ao mesmo tempo que estimula a sntese de cidos graxos a partir de glicose e piruvato (lipognese). Favorece tambm
a sntese de protenas e inibe o catabolismo protico, tanto no msculo quanto no fgado, o que contribui para suprimir a
gliconeognese a partir de aminocidos.
41
Sndrome Metablica e Resistncia Insulina
A resistncia insulina um problema metablico comum, caracterizado por um impedimento fisiolgico de
resposta insulina. um fator-chave na patognese do diabetes tipo 2 e pode anteceder o desenvolvimento da hiperglicemia
por muitos anos. A resistncia insulina e as vrias outras desordens metablicas e vasculares associadas so conhecidas
como sndrome metablica ou sndrome X ou sndrome da resistncia insulina. As caractersticas da sndrome metablica
incluem obesidade central, hipertenso, dislipidemia, intolerncia glicose e anormalidades na funo endotelial e de
coagulao. Est freqentemente associada infiltrao gordurosa no fgado e ao desenvolvimento de esteato-hepatite no-
alcolica, assim como com o aumento no risco de doenas cardiovasculares. A origem exata da sndrome metablica ainda
no completamente conhecida, no entanto est inquestionavelmente relacionada com o aumento da gordura corporal.

3.9. Recomendaes Nutricionais


A recomendao nutricional (RDA) de carboidratos foi estabelecida pelo Institute of Medicine (IOM, 2002) em 130
g/dia para adultos e crianas, com base na quantidade mnima de glicose utilizada pelo crebro. A ingesto de carboidratos, no
entanto, excede a esse valor para atender s necessidades de energia do organismo, quando so consumidas quantidades
aceitveis de lipdios e de protenas. O consumo mdio de carboidratos de 200 a 330 g/dia para homens e de 180 a 230 g/dia
para mulheres.
As recomendaes no levam em considerao o ndice glicmico dos alimentos, devido falta de evidncias que
comprovem seu papel na preveno de doenas crnicas.

3.9.1. Consideraes para a Determinao da Recomendao de Carboidratos


O limite mais baixo de ingesto de carboidratos compatvel com a vida aparentemente igual a zero, desde que
quantidades adequadas de lipdios e de protenas sejam consumidas. No entanto, a quantidade de carboidratos que prov um
estado de sade timo para o ser humano desconhecida.
Grupos populacionais conhecidos por consumirem altos teores de lipdios e de protenas e quantidades mnimas de
carboidratos, como os Masai e nativos do Alasca e Groelndia, no mostram efeitos aparentes dessa alimentao na sua sade e
longevidade. possvel que o adequado suprimento de protenas e de glicerol, proveniente dos triacilgliceris, seja suficiente
para prover substrato para a gliconeognese, mas a adaptao utilizao de protenas e lipdios como combustvel requer
ajustes metablicos. Essa dieta restrita em carboidratos e rica em gordura promove grande formao de corpos cetnicos e pode
estar deficiente em vitaminas hidrossolveis e em alguns minerais. Isso pode resultar, dentre outras coisas, em perda ssea,
hipercolesterolemia, aumento do risco de urolitase e alterao das funes do sistema nervoso central.
As nicas clulas que tm absoluta necessidade de glicose como combustvel so as do sistema nervoso central
(crebro) e aquelas que dependem da oxidao parcial da glicose para produzir lactato e,ou, alanina como fonte de energia (via
anaerbica da gliclise), como as clulas vermelhas e clulas brancas do sangue e medula renal. O sistema nervoso pode se
adaptar, pelo menos em parte, a usar corpos cetnicos derivados do metabolismo dos lipdios, e as demais clulas podem obter
energia a partir da oxidao indireta dos cidos graxos pelos ciclos do lactato e da alanina-glicose.
Em um homem adulto de 70 kg, em estado ps-absortivo (aps uma noite em jejum), a produo de glicose de cerca
de 210 a 270 g/dia, sendo 50% proveniente da glicogenlise heptica e 50% da gliconeognese. A produo endgena de
glicose correlaciona-se bem com o tamanho do crebro, no entanto nem toda a glicose produzida utilizada pelo crebro, que
requer cerca de 110 a 140 g/dia. Quando o suprimento de glicose se encontra abaixo desses valores, h aumento na produo de
corpos cetnicos, que leva cetose.

3.9.2. IDR para carboidratos em funo da faixa etria e do estado fisiolgico


Crianas de 0 a 12 meses
Em crianas nessa faixa etria, o tamanho do crebro em relao ao corpo aumentado, e o crebro utiliza cerca de
60% do total de energia da criana. A criana consegue utilizar corpos cetnicos como combustvel, porm o menor limite de
consumo de carboidratos compatvel com um bom estado de sade desconhecido.
Para crianas at 6 meses de idade, o leite materno capaz de suprir todas as suas necessidades nutricionais.
Considerando uma produo de 0,78 L/dia de leite e um teor de carboidratos (lactose) de 74 g/L, aproximadamente 60 g de
carboidratos so consumidos por dia, representando 37% do total energtico da alimentao. Essa quantidade de carboidratos e
sua relao com o teor de lipdios do leite humano so considerados como timos para garantir o crescimento e
desenvolvimento da criana at o 6o ms de vida.
Aps o 6o ms, a criana recebe dos demais alimentos cerca de 51 g de carboidratos. Considerando um consumo de
leite materno de 0,6 L/dia, o consumo de carboidrato proveniente do leite seria de 44 g/dia (0,6 L/dia x 74 g/dia), o que
representa um consumo total de 95 g/dia de carboidratos. Portanto, para essa faixa etria estabelecida a Ingesto Adequada
(AI):

AI para crianas de 0 6 meses: 60 g/dia de carboidratos


AI para crianas de 7 12 meses: 95 g/dia de carboidratos

A partir de 1 ano de idade

42
O crescimento do crebro ainda considervel at aproximadamente 5 anos de idade, e aps essa idade o crescimento
modesto. Apesar disso, o consumo de glicose aps 1 ano de idade permanece praticamente inalterado at a fase adulta, em
ambos os sexos.
Dessa forma, a necessidade energtica a mesma em indivduos aps 1 ano de idade, independentemente do sexo:

EAR = 100 g/dia de carboidrato


RDA = 130 g/dia de carboidrato (CV = 15%; RDA = 2 x CV)

Essa quantidade suficiente para suprir o crebro com glicose, sem o aumento dos nveis de corpos cetnicos
circulantes, quando comparado com o indivduo aps uma noite em jejum.
Com o avanar da idade, ocorre uma reduo de cerca de 10% na taxa de oxidao da glicose e no tamanho do crebro.
No entanto, no existem evidncias que indiquem uma menor necessidade de glicose para indivduos acima de 70 anos de
idade.

Gravidez
Na gravidez ocorre um aumento na utilizao da glicose, independentemente do incremento no gasto energtico. Cerca
de 33 g/dia de glicose so necessrios para suprir o crebro do feto com combustvel, sem que ele utilize corpos cetnicos.
Considerando que a me ir necessitar de 100 g/dia de carboidratos (EAR) sem necessitar de corpos cetnicos como substrato
energtico, um adicional de 35 g/dia de glicose recomendado, passando o EAR da gestante para 135 g/dia de carboidratos,
independentemente da idade da gestante.

EAR = 135 g/dia de carboidratos


RDA = 175 g/dia de carboidratos (CV = 15%; RDA = 2 x CV)

Lactao
O contedo de lactose do leite de cerca de 74 g/L. Como a lactose sintetizada a partir da glicose, um suprimento
adicional de carboidratos da dieta ou de aminocidos e glicerol para a gliconeognese necessrio.
A necessidade de carboidratos na lactao representa a soma do total de carboidratos necessrios para repor a secreo
de leite materno (60 g/dia) e o EAR para mulheres (100 g/dia), totalizando 160 g/dia.

EAR = 160 g/dia de carboidratos


RDA = 210 g /dia de carboidratos (CV = 15%; RDA = 2 x CV).

3.9.3. Consideraes Finais


O consumo excessivo de carboidratos tem sido associado a uma srie de efeitos adversos, como hiperatividade em
crianas, crie dental, elevao dos nveis sangneos de triacilgliceris, colesterol total e LDL-colesterol; reduo nos nveis de
HDL-colesterol; e aumento do risco de doenas cardiovasculares, diabetes tipo 2, obesidade e cnceres de pulmo, mama,
prstata e clon.
Alguns estudos apontam os carboidratos com alto ndice glicmico como sendo diretamente relacionados a essas
patologias. Entretanto, as evidncias no so ainda suficientes para se estabelecer o limite mximo tolervel (UL) de ingesto
de carboidratos.

3.10. Referncias

BEYER, P.L. Terapia clnica nutricional para os distrbios do trato gastrointestinal alto. In: MAHAN, L.K.; ESCOTT-STUMP,
S. Krause: alimentos, nutrio & dietoterapia. 10. ed., So Paulo: Ed. Roca, 2002. Cap. 30, p. 627-642.

CAVALCANTI, M.L.F. Temas de pediatria n 60. So Paulo: NESTL - Servio de Informao Cientfica, 1995.

ETTINGER, S. Macronutrientes: carboidratos, protenas e lipdeos. In: MAHAN, L.K.; ESCOTT-STUMP, S. Krause:
alimentos, nutrio & dietoterapia. 10. ed. So Paulo: Ed. Roca, 2002. Cap. 3, p. 30-64.

GROFF, J.L.; GROPPER, S.S.; HUNT, S.M. Advanced nutrition and human nutrition. 2. ed. St. Paul: Ed. West, 1995. p.
71-101.

INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes Energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol,
protein, and amino acids. Washington, D.C.: The National Academy Press, 2002. 484p.

LEHNINGER, A.L.; NELSON, D.L.; COX, M.M. Princpios de bioqumica. 2. ed. So Paulo: Ed. Sarvier, 1995. Cap. 11, p.
222-241.
43
LEWIS, B.A. Structure and properties of carbohydrates. In: STIPANUK, M.H. Biochemical and physiological aspects of
human nutrition. Philadelphia: Ed. Saunders, 2000. Cap 1, p. 3-22.

MATHAI, K. Nutrio na idade adulta. In: MAHAN, L.K.; ESCOTT-STUMP, S. Krause: alimentos, nutrio &
dietoterapia. 10. ed. So Paulo: Ed. Roca, 2002. Cap. 12, p. 261-275.

SABR, A. et al. Temas de pediatria n 57. So Paulo: NESTL - Servio de Informao Cientfica, 1994.

STIPANUK, M. H. Biochemical and physiological aspects of human nutrition. Philadelphia: W. B. Saunders Company,
2000. 1007 p.

44
Captulo 4 _ FIBRAS ALIMENTARES
Neuza Maria Brunoro Costa
Hrcia Stampini Duarte Martino
4.1. Histrico
Em 400 AC, hipcrates j mensionava os efeitos benficos da fibra alimentar (FA). Por volta de 1920, Kellogg
verificou seu efeito positivo, porm McCance e Lawrence consideraram a FA como parte no-digervel de alimentos de origem
vegetal que irritava o intestino. Trinta anos mais tarde, Cleave relacionou certos tipos de doenas com a deficincia na ingesto
de FA. No final da dcada de 60, Burkit observou que a populao africana que consumia dieta rica em FA no era acometida
por certos tipos de doenas, como cncer de clon, mais comum entre sociedades ocidentais mais desenvolvidas, onde o
consumo de FA era menor. Nos anos 70, Walker verificou que a populao negra do sul da frica, que consumia farinha de
milho no refinada e com elevado contedo de FA, tinha menos risco de doenas como ateroscleroses, hemorridas e cncer de
clon. Resultado similar foi observado por Trowell, em 1976.
No final do sculo XX cresceu o interesse da comunidade cientfica em estudar o contedo de FA e os efeitos de sua
ingesto pelo homem, pelas observaes de que dietas pobres em FA eram freqentemente associadas a doenas coronarianas,
diabetes, doenas diverticulares e cncer de clon, alm de uma srie de outros distrbios do trato gastrointestinal.
Os efeitos da FA so decorrentes no da sua assimilao pelo organismo, mas principalmente pela sua natureza
indigervel, desempenhando papel importante em vrios processos fisiolgicos, na preveno de doenas de diferentes
etiologias e recentemente exercendo a funo de ingrediente funcional. Apesar das investigaes e descobertas ao longo dos
anos sobre FA, existem muitas discusses e controvrsias sobre sua definio, mtodo de anlise, propriedades e aspectos
funcionais.

4.2. Definio
O conceito de fibra vem sendo associado a vrios significados ao longo dos anos, os quais resultaram de discusses
internacionais baseadas nas vantagens das tcnicas analticas, nas informaes fisiolgicas e nutricionais, e tambm do interesse
das indstrias de alimentos. Na Tabela 4.1 apresentam-se algumas definies. Nos Estados Unidos a FA definida pelo nmero
de mtodos analticos que so aceitos pela Association of Official Analytical Chemists (AOAC), e esses mtodos isolam
carboidratos no-digerveis de plantas e animais.
Os componentes de FA podem ser isolados e concentrados usando-se os mtodos disponveis sem necessariamente
obter efeitos benficos sade. No entanto, outros compostos no digerveis podem ser desenvolvidos com o processamento e
propiciar efeitos benficos sade. Por essa razo, a Food and Nutrition Board props as seguintes definies de fibra (IOM,
2001):
- A fibra alimentar consiste de carboidratos no-digerveis e de lignina presentes de forma intrnseca e intacta nas plantas.
Fazem parte da fibra alimentar a celulose, a pectina, as hemiceluloses, as gomas, as -glucanas, o amido resistente encontrado
naturalmente ou produzido durante o processamento convencional de cereais (cereais matinais), os oligossacardeos
encontrados em leguminosas como rafinose e estaquiose e as frutanas como frutooligossacardeos e inulina encontrados na
cebola e na chicria.
- A fibra funcional consiste de carboidratos no-digerveis, isolados que exercem efeitos benficos ao indivduo. Fazem parte
da fibra funcional as fraes isoladas ou extradas usando-se processos qumicos, enzimticos ou aquosos de celulose, lignina,
hemiceluloses, pectina, -glucanos, gomas, oligossacardeos ou psilium. Amido resistente manufaturado e polissacardeos
como polidextrose, bem como produtos de origem animal como quitina e quitosanas, encontrados em artrpodes como
caranguejo e lagosta, esto includos nesta definio.
- A fibra alimentar total a soma da fibra alimentar e da fibra funcional.

4.3. Classificao
A fibra alimentar total (FAT) pode ser classificada conforme a sua caracterstica qumica, botnica e fisiolgica.
De acordo com sua constituio qumica, FATs so carboidratos complexos, com exceo da lignina, que um
polifenol. Diferem entre si pelos resduos de acar que compem os polissacardeos e pelo arranjo desses resduos.
Adicionalmente, algumas FATs possuem diferentes graus de metilao e de sulfonao. Os principais resduos das FATs so
glicose, galactose, manose e algumas pentoses. No entanto, as FATs no so apenas a soma dessas partes. De fato, o
arranjamento dessas partes geralmente mais importante para os seus efeitos fisiolgicos do que os constituintes por si ss. Por
exemplo, pectina um polmero de resduos de cido galacturnico que podem estar metilados. Nesse caso, no haver grupos
inicos para se ligarem ao clcio e reter gua.
A localizao das FATs e a classificao de suas funes nas plantas podem tambm ser teis. As principais categorias
botnicas de FAT so celulose, hemicelulose, substncias pcticas, gomas, mucilagens, polissacardeos de algas e lignina.
A localizao do componente das fibras na planta e se esta ou no extrada da planta ou consumida intacta podem ter
significantes conseqncias fisiolgicas. Se a fibra est intacta na planta, a parede celular precisa ser primeiro rompida para que
seu efeito possa ser exercido. Isso, por sua vez, depende da estrutura da parede celular e do grau de lignificao. Portanto, o
tamanho da partcula, o cozimento, o processamento e a mastigao podem determinar a acessibilidade da parede celular s
enzimas digestivas.

45
As FATs podem tambm ser classificadas pelos seus efeitos fisiolgicos, como sendo solveis e insolveis ou
viscosas e no-viscosas ou, ainda, fermentveis e no-fermentveis.
Em geral, as FAs estruturais (celulose, lignina e algumas hemiceluloses) so insolveis, no-viscosas e no-
fermentveis. Em contraste, pectinas, gomas, mucilagens e as demais hemiceluloses so solveis, viscosas e fermentveis.
Entretanto, h exceo, como a goma-arbica, que solvel, porm no viscosa.
A viscosidade afeta, principalmente, as funes da poro superior do trato gastrointestinal e a fermentabilidade, a
poro inferior do intestino grosso. A fermentabilidade depende do tipo de FAT e da microflora intestinal.

46
Tabela 4.1 Caractersticas de vrias definies de fibra alimentar (FA)
CHO Animal CHO No- Mono e Amido Fonte de FA FA Resistente Efeito
Mtodo No- Preciptado por Dissacardios Lignina Resistente Intacta e Natural a Enzimas Fisiolgico
digervel lcool No-digerveis dos Alimentos Digestivas Especfico da FA
No
Trowell et al., 1976 No No considerado No considerado Sim No considerado especificamente Sim No
listado
USFDA, 1987 Sim Alguma inulina No Sim Algum No No No
FAO/WHO, 1995
(Codex Alimentarius Sim Alguma inulina No Sim Algum No Sim No
Commission)
AACC, 2000 Sim Sim Sim Sim Sim No Sim
IOM, 2001
Fibra alimentar No Sim No Sim No Sim Sim No
Fibra funcional Sim Sim Sim Sim Sim No Sim Sim

Fonte: IOM (2001). IOM = Institute of Medicine, USFDA = United State Food and Drug Administration, AACC = American Association of Cereal Chemists

47
4.4. Componentes da FAT presentes nos alimentos e, ou, isolados
4.4.1. Celulose
a molcula orgnica mais abundante na natureza, sendo o principal polissacardeo estrutural das
plantas, conferindo a rigidez de seus tecidos. um polmero linear formado de unidades de glicose, unidas
por ligao glicosdica (1-4), apresentando elevado grau de polimerizao (at 10.000 unidades), Figura 4.1.
A conformao da molcula confere celulose uma caracterstica de longos filamentos, bastante resistente
fora mecnica ou ao ataque qumico ou a insolubilidade em gua quente.
A celulose no hidrolisada pelas enzimas digestivas humanas, embora possa ser parcialmente
fermentada pela sua microbiota intestinal. Sua principal funo na nutrio do ser humano fornecer uma
"massa" no-digervel, que estimula o peristaltismo, promovendo uma funo intestinal eficiente.
Est presente na polpa e casca das frutas, caule e folhas de hortalias, revestimento externo de gros,
sementes e nozes. A maioria da FAT do farelo constituda de celulose e classificada como FA ou fibra
funcional.

Figura 4.1 Estrutura da celulose formada por resduos de glicose unidos por ligaes glicosdicas (1-4).

4.4.2. Hemiceluloses
Sob essa denominao genrica, incluem-se vrios polmeros complexos que combinam pentoses,
como xilose e arabinose; e hexoses, como glicose, galactose e manose, sendo encontrados tambm cidos
urnicos (Figura 4.2). Juntamente com a celulose e a lignina, as hemiceluloses compem a parede das clulas
vegetais. No so digeridas pelas enzimas do trato gastrointestinal, mas so mais suscetveis degradao
microbiana que a celulose. As hemiceluloses com molculas cidas so levemente carregadas e, portanto,
solveis em gua; outras so insolveis.
As hemiceluloses podem conter alto grau de ramificao, e tipicamente cada molcula possui de 50 a
200 unidades de acares. As xilanas so basicamente polmeros de D-xilose, unidas por ligao glicosdica
(1-4) formando a cadeia principal da molcula, que pode ser ramificada em C-2 ou C-3 por resduos de L-
arabinose e, ou, cido D-glicurnico ou seu ter 4-0-metlico. As glicomananas so polmeros
predominantemente de D-manose, podendo a cadeia principal ser intercalada por unidades de D-glicose e
conter ramificaes de D-galactose
Os cereais contm polmeros ricos em arabinose e xilose, enquanto a batata possui polmero de
galactose, sendo classificada como fibra alimentar.

48
Figura 4.2 Resduos das hemiceluloses: cadeia principal(a) e cadeias laterais (b)

4.4.3. Pectinas
Formam um grupo de polissacardios amorfos, encontrados principalmente no material intercelular
cimentante dos tecidos vegetais, mas ocorrem tambm em menor quantidade na parede celular. No so
hidrolisadas pelas enzimas digestivas, mas podem ser completamente fermentadas pela microbiota intestinal.
So, principalmente, polmeros de cido galacturnico, contendo tambm L-ramnose na cadeia principal e
ramificaes com D-galactose e L-arabinose. A presena de L-ramnose na cadeia principal confere
molcula uma configurao de zig-zag, e a presena das ramificaes importante na caracterstica
gelificante das pectinas. Os cidos galacturnicos podem ocorrer em propores variadas na forma de ster
metlicos, ou mesmo na forma de cidos urnicos, neutralizados com clcio ou magnsio (Figura 4.3).
As frutas e os vegetais contm de 5 a 10% de pectina. Em alguns alimentos, como as frutas ctricas e
mas, podem chegar a 15-30% da matria seca. Apresentam grande capacidade de adsorver gua e formar
gel, sendo amplamente usadas na indstria de alimentos como agentes espessantes. Isolados de pectina so
utilizados na produo de gelia e adicionados em produtos lights como gelias e iogurtes. Assim, pectinas
podem ser classificadas como fibra alimentar e, ou, funcional.

49
Figura 4.3 Estrutura da pectina.

4.4.4. Lignina

So componentes essenciais das paredes celulares, atingindo cerca de 20% de sua composio, em
que podem estar ligados quimicamente aos polissardeos fibrosos. So polmeros muito complexos, de
estrutura tridimensional, formados de unidades de fenil-propanides e, portanto, no so carboidratos.
Entretanto, a lignina classificada como FA devido aos seus efeitos fisiolgicos e associao com a fibra na
planta.
A lignina extremamente resistente ao ataque qumico ou enzimtico e no digerida nem
fermentada pela microbiota intestinal. Ao contrrio das hemiceluloses e pectinas, tem uma capacidade muito
reduzida de reter gua, uma vez que relativamente apolar, tendo capacidade de formar ligao hidrofbica.
A lignina isolada e adicionada nos alimentos pode ser classificada como fibra funcional apresentando
efeitos fisiolgicos positivos em humanos. Vegetais formados por razes, como cenoura, trigo e frutas
consumidas com sementes, como o morango, so ricos em lignina.

Figura 4.4 Estrutura da lignina.

4.4.5. Gomas
A goma-arbica, guar, tragacante e outras so caracterizadas como hidrocolides e tm estruturas
altamente ramificadas, consistindo de acares no-ionizveis, como galactose, cido galacturnico,
arabinose, ramanose, manose e cido urnico (Figura 4.4). As gomas so grupos de polissacardios
encontradas naturalmente nos alimentos como farinha de aveia, cevada e leguminosas ou isolados de
sementes. So amplamente usadas como agentes espessantes, podendo ser classificadas como fibra funcional
ou alimentar.
As gomas guar e "locust bean" so polmeros contendo manose e galactose e tipicamente encontradas
em leguminosas e usadas amplamente como agentes gelificantes em alimentos.

50
A goma-arbica o hidrocolide mais comumente usado como aditivo dos alimentos graas s suas
propriedades fsicas, como elevada solubilidade, estabilidade do pH e caracterstica gelificante.
Certas bactrias tambm contm polissacardeos tipo goma, que se enquadram na definio de fibra
funcional, a exemplo das gomas xantanas.

Figura 4.4 Estrutura da goma-arbica: X: L- Ramanopiranose ou L- Arabinofuranose; GALP:


Galactopiranose; e GA: cido glicurnico.

4.4.6. Quitina e quitosana


A quititina um aminopolissacardio contendo ligaes (1-4) como na celulose. A diferena
estrutural da celulose deve-se aos grupos hidroxilas localizados na posio 2, que na quitina foram
substitudos pelos grupos acetaminos.
A quitosana um produto desacetilado da quitina (Figura 4.5). Durante o curso da desacetilao,
parte das ligaes N-acetil do polmero rompida com formao de unidades que contm um grupo amnico
livre. Entretanto, a quitosana no uma entidade qumica uniforme e sim um grupo de polmeros
parcialmente desacetilados. Os que apresentam grau de desacetilao acima de 30% j podem ser
considerados como quitosana, sendo que as aplicaes e caractersticas do polmero dependem
fundamentalmente do grau de desacetilao e do tamanho da cadeia do polmero. Para a indstria,
importante um controle rgido das condies reacionais para se obter um polmero de cadeia longa e com grau
de desacetilao na faixa desejada.
A quitina encontrada em maior abundncia na natureza do que a quitosana e tem como principais
fontes naturais as carapaas de crustceos (caranguejo, camaro e lagosta), sendo tambm encontrada em
insetos (aranha, formiga e besouros), algas verdes, leveduras, fungos, esporos e algas marrons. Apresenta
grande utilidade na indstria alimentcia. A quitina e a quitosana so consumidas principalmente como
suplementos e podem ser classificadas como fibra funcional, se os efeitos fisiolgicos benficos forem
documentados em humanos.

a)

51
b)

Figura 4.5 Estrutura qumica da quitina (a) e quitosana (b).

4.4.7. Inulina, oligofrutose e frutooligossacardio


A inulina e a oligofrutose so encontradas em vrias plantas. As formas comerciais so extradas da
sacarose ou purificadas das razes da chicria. A oligofrutose tambm formada pela hidrlise parcial da
inulina. Esta composta por 2 a 60 unidades de frutose com ligao -(2,1) entre as molculas de frutose e
um resduo de glicose no final da cadeia, as quais so resistentes ao ataque pelas enzimas digestivas humanas
(Figura 4.6). fermentada no clon, formando gases (10%) e cidos graxos volteis (50%), e excretada na
biomassa bacteriana (40%).
A oligofrutose sinttica contm ligao (2,1) com dois a oito monmeros de frutose com e sem
unidades de glicose terminal. Os frutooligossacardios (FOS) sintticos tm a mesma composio qumica e a
estrutura das oligofrutoses, exceto o grau de polimerizao, que varia de dois a quatro. So encontradas no
trigo, centeio, aspargos, cebola, chicria e alcachofra.
Os dados da tabela de composio de alimentos do United State Department of Agriculture (USDA)
no incluem inulina, oligofrutose e frutooligossacardio, como fonte de FA, pois os mtodos de anlise de
fibra se baseiam na preciptao dos componentes da FAT com etanol, e as frutanas so insolveis em etanol,
portanto no so analisadas.
As frutanas encontradas em plantas como chicria e alho podem ser classificadas como FA, enquanto
as frutanas extradas e sintetizadas podem ser classificadas com fibra funcional quando existirem dados
sufucientes apresentando efeitos fisiolgicos benficos em humanos.

Figura 4.6 Estrutura da inulina.

52
4.4.8. Mucilagens
As mucilagens esto presentes em clulas especiais na camada externa das sementes da famlia
plantain, tal como a ispgula, sendo classificada como fibra alimentar. Esses polissacardeos tm alta
capacidade de reteno de gua e so usados como laxantes.
O psilium, conhecido como casca de espgula, uma mucilagem muito viscosa originria da casca
da semente do psilium. A semente pequena, escura, com tom vermelho-marrom, sem odor e praticamente
sem textura. Pode ser classificado tambm como fibra funcional.

4.4.9. -glicanas
So polmeros de glicose, assim como a celulose, porm de menor tamanho e apresentam algumas
ramificaes com resduos de glicose. Formam solues viscosas e contribuem com cerca de 40% da matria
seca da parede celular da aveia e da cevada e tambm esto presentes nos fungos e nas algas. So
classificadas como fibra alimentar e quando isoladas e adicionadas, como fibra funcional.

4.4.10. Polissacardeos de algas


Esse grupo contm alginatos, caragenanas e gar, que so usados amplamente como aditivos na
indstria de alimentos. Os alginatos contm tipicamente 200 a 1.000 unidades de acares cidos por
molcula, enquanto as caragenanas e o gar so polmeros de galactose com grupos sulfato ligados a certas
unidades dos acares.

4.4.11. Oligossacardeos
A rafinose e a estaquiose so oligossacardios indigerveis, como aqueles associados flatulncia,
porque so facilmente fermentveis pelos microrganismos do clon, produzindo grande quantidade de gases.
Esto presentes em vegetais como soja, feijo, ervilha, lentilha e gro-de-bico. A rafinose um trissacardio,
formado de glicose, frutose e galactose, sendo a estaquiose formada por rafinose e galactose.

4.4.12. Polidextrose e poliis


A polidextrose um polissacardio sintetizado da polimerizao da glicose e do sorbitol. No
digerida pelas enzimas do intestino delgado, mas so parcialmente fermentadas pela microflora do intestino
grosso. Os poliis so adicionados nos alimentos e podem fornecer efeitos fisiolgicos benficos sade e ser
classificados como fibra funcional.

4.4.13. Amido resistente


O amido resistente (AR) ocorre naturalmente nos alimentos e tambm pode ser produzido da
modificao do amido durante o processamento dos alimentos. O amido resistente tipo I fisicamente
inacessvel enzima na matriz do alimento, como em gros inteiros ou parcialmente modos de cereais,
leguminosas e sementes. O AR tipo II aquele que no seu estado nativo se encontra em alimentos crus, como
bananas e batatas, e que durante a gelificao pode ser degradado pela amilase. O AR tipo III formado
durante o processamento dos alimentos, quando o amido sofre retrogradao, como nas batatas cozidas, pes
e cereais matinais. O tipo IV ocorre quando o amido modificado quimicamente. O AR tipos III e IV no
digerido pelas enzimas do intestino delgado, porm parcialmente fermentado no clon, sendo classificado
como fibra funcional. O amido tipos I e II classificados como fibra alimentar.

4.4.14. Dextrinas resistentes


Componente indigervel hidrolisado do amido produzindo dextrinas indigerveis tambm chamadas
de maltodextrinas resistentes. Diferente das gomas que possuem elevada viscosidade que podem levar a
problemas durante o processamento e alteraes sensoriais indesejveis, maltodextrinas resistentes so
facilmente adicionadas nos alimentos e tm boa aceitao ao paladar. Maltodextrinas resistentes so
produzidas pelo tratamento trmico e cido do amido de milho, seguido pelo tratamento com a enzima
amilase. Consiste de polmeros de glicose com ligaes glicosdicas (1-4) e (1-6), bem como (1-2) e
(1,-3). Dextrinas resistentes podem ser classificadas como fibra alimentar e no como fibra funcional, por no
existirem dados sufucientes apresentando efeitos fisiolgicos benficos em humanos.

4.5. Mtodos de anlise


Em conseqncia da importncia que a fibra alimentar total (FAT) tem adquirido nos ltimos anos,
numerosos mtodos tm sido desenvolvidos para a sua determinao, embora no tenha encontrado consenso

53
sobre uma definio exata. Muitos so especficos e precisos para identificao e quantificao de diferentes
componentes da FAT. Alguns mtodos utilizam enzimas altamente purificadas, liberando oligo e
polissacardios que constituem os componentes da fibra. De interesse especial so aquelas enzimas que
hidrolisam frutanas, galactanas, mananas, arabinanas e -glicanas. Na Tabela 4.2, apresentam-se os
componentes de fibra alimentar e, ou, funcional medidos pelos variados mtodos de anlise.
O mtodo de fibra bruta foi o primeiro a ser desenvolvido e adotado pela Association of Official
Analytical Chemists (AOAC) at os anos de 1960. Consistia de uma extrao da fibra com soluo cida e
bsica, com grandes perdas de seus constituintes.
O mtodo de van Soest foi originalmente desenvolvido para raes animais, como aprimoramento do
mtodo de fibra bruta, sendo simples e fcil de ser realizado. Entretanto, apresenta como principal
desvantagem a perda dos componentes solveis da fibra, principalmente a pectina. Ele se baseia nas
determinaes de Fibra Detergente cido (ADF), Fibra Detergente Neutro (NDF) e Lignina.
A ADF o resduo obtido aps a extrao por refluxo com soluo a 2% de detergente, brometo de
cetiltrimetilamnia, em meio cido diludo. Essa preparao fornece essencialmente a lignina e a celulose da
parede celular das plantas, embora contenha tambm produtos indigerveis do cozimento e parte dos minerais.
A NDF o resduo que se obtm aps a fervura do alimento em presena de soluo neutra de
detergente, lauril sulfato de sdio e EDTA. uma extrao no-hidroltica, que remove os carboidratos
solveis, protenas e lipdios com detergentes complexos, embora remova tambm a pectina. A NDF
tambm denominada material da parede celular das plantas, uma vez que determina essencialmente lignina,
celulose e hemicelulose.
A lignina pode ser determinada separadamente atravs do tratamento do resduo com cido
sulfrico72%, como no mtodo de Southgate.
Subtraindo a lignina da ADF, obtm-se uma estimativa da celulose, enquanto a subtrao NDF
menos ADF fornece a hemicelulose.
Desses procedimentos originais foram desenvolvidos diversos mtodos analticos. De acordo com
ASP et al. (1992), os mtodos de anlise de fibra so classificados em dois grupos.
O primeiro grupo conhecido como mtodo enzimtico-gravimtrico, que consiste em quantificar a
FAT como resduo aps o tratamento da amostra com enzimas especficas que degradam amido e protena. A
grande vantagem que com essas determinaes, possvel separar a fibra alimentar insolvel da solvel, em
que a solvel obtida pela preciptao com etanol. Os tratamentos enzimticos devem ser padronizados com
enzimas altamente purificadas para obteno de resultados confiveis quando se determina FAT de alimentos
que contm quantidade significante de -glicanas, amido resistente e frutanas. Apesar de vrios mtodos j
terem sido desenvolvidos, estudos inter-laboratoriais so ainda necessrios para validao de novos mtodos
obtidos como referncia daqueles oficialmente aceitos.
O segundo grupo determina a FAT sem considerar suas propriedades fisiolgicas. Eles so mtodos
enzimticos gravimtricos para isolar e fracionar polissacardios no celulsicos, celulose e lignina, seguido
pela hidrlise de cada frao e quantificao da composio de seus acares por cromatografia gasosa com
ou sem acetilao prvia dos acares liberados em cada frao. As tcnicas com HPLC que no requerem a
derivao dos acares tambm podem ser usadas. Existem tambm mtodos colorimtricos que consistem
em determinar o contedo de acares dos compostos coloridos que so formados pela reao entre o acar
hidrolisado e o cido p-aminoidroxibenzico.
Alm dos mtodos mencionados anteriormente, existem outros mtodos rpidos cujos resultados so
confiveis e comparveis com os procedimentos tradicionais. Estes incluem o uso do Espectroscpio de
Infravermelho Prximo (NIR) para determinao de FAT de diferentes fontes e a quantificao daqueles
componentes da FAT que podem agir como prebiticos, principalmente as oligofrutoses, inulina e
polidextrose, que podem ser utilizadas como ingrediente funcional em diferentes tipos de alimentos, incluindo
a matriz aquosa, bem como aqueles alimentos ricos em lipdios e acares.
Muitas anlises de prebiticos so baseados no uso de tcnicas cromatogrficas. As anlises por
cromatografia gasosa so complexas, pois requerem prvia derivao da amostra para formar compostos
volteis, embora apresentem a vantagem de determinar oligossacardios com grau de polimerizao menor
que 10. Os mtodos baseados na filtrao em gel necessitam de um tratamento enzimtico prvio com
inulinase. A determinao de polidextrose tambm implica o uso de enzimas que liberam oligossacardios do
alimento. Nesse caso, a mistura enzimtica consiste de frutanase, amiloglicosidase e isoamilase. Os mtodos
de isolao, anlises e quantificao de prebiticos esto sendo desenvolvidos e previstos para serem aceitos
como mtodos oficiais aps a validao.

54
Tabela 4.2 Componentes de fibra alimentar e,ou, funcionais determinados pelos diversos mtodos de anlise
Oligossa
Polissacardeos Amido Poli - Maltodextrina Quitina e Sulfato de No-
Mtodos de Referncia Lignina Inulina -
No-digerveis Resistente dextrose Resistente Quitosana Condroitina Carboidratos
cardeos
Asp et al., 1983 Sim Sim Pouco Pouco No No No Um pouco Um pouco Um pouco
Englyst e Cummings, 1984 No Sim No No No No No Um pouco Um pouco No
McCleary et al., 2000 (AOAC
No No No Sim No No No No No No
999.03)
Prosky et al., 1985, 1988, 1992,
1994, (AOAC 985.29, 993.19, Sim Sim Pouco Pouco No No No Um pouco Um pouco Um pouco
991.42)
Southgate, 1969 Sim Sim Pouco No No No No Um pouco Um pouco No

Fonte: IOM (2001)

55
4.6. Contedo e consumo
A FA est naturalmente presente nos cereais, vegetais, frutas e oleaginosas, entretanto a quantidade e
composio desta difere de alimento para alimento. Diversos alimentos que no so fontes de amido fornecem
de 20 a 35 g de FA/100 g de peso seco, e aqueles que so fontes de amido apresentam 10 g/100 g de FA em
relao ao peso seco. O contedo de FA nos vegetais pode representar de 28 a 30% do peso seco, embora em
alguns produtos, como feijo-preto e vermelho, valores maiores podem ser encontrados. Similar aos vegetais,
as frutas contm um grande percentual de gua e pequena quantidade de tecido vascular lignificado,
apresentando menor contedo de FA 1 a 3,5% do peso mido.
Entre os diferentes alimentos ricos em FA, os cereais so as fontes mais importantes, contribuindo
com cerca de 50% da ingesto dos pases ocidentais. Os vegetais fornecem em torno de 30 a 40%, as frutas
cerca de 16 e os 3% restantes vm de outras fontes.
A quantidade de FA dos cereais difere em grande parte, dependendo da fonte e do processamento do
produto. Assim, o contedo de FA da farinha de trigo varia de 2,5g /100 g na farinha refinada a 12 g/100 g na
farinha no-refinada, obtida do farelo de trigo. A maior parte da FA da farinha de trigo insolvel e perdida
durante o processo de refinamento.
Em razo do desenvolvimento de numerosos mtodos analticos para determinao do teor de FA
dos alimentos, seu contedo pode sofrer variaes dependendo do mtodo empregado (Tabela 4.3). Alm
disso, como a maior parte da FA derivada da parede celular e do material intercelular dos vegetais, outras
substncias naturais podem estar fsica ou quimicamente associadas (protena, oxalatos, fitatos, substncias
fenlicas). A presena de substncias no-digerveis, derivadas do processamento dos alimentos, dificulta
avaliar o teor exato de FA presente nos alimentos e, conseqentemente, a quantidade consumida pelas
populaes humanas.
Pesquisas indicaram que o consumo de FA entre os pases menos desenvolvidos mais elevado.
Entre populaes africanas rurais, que consomem dietas base de farinha de milho pouco refinada, estimou-
se um consumo mdio de 50 g/dia. Nos pases escandinavos, a ingesto de FA menor que nos pases do sul
da Europa, como Frana, Itlia e Espanha. Na Amrica Latina, sobretudo no Brasil, existem poucos dados
disponveis sobre o consumo de FA. Observou-se um consumo mdio de 20 g/dia de FA pelas mulheres e 29
g/dia de FA pelos homens, em 559 indivduos adultos estudados na regio metropolitana de So Paulo. Nos
Estados Unidos foi observado um consumo variado de 14 a 52 g de FA por dia, em indivduos no-
vegetarianos.

Tabela 4.3 Comparao entre os teores de fibra em alimentos, determinados por diferentes mtodos
analticos (% em base seca)
Alimento Fibra Bruta NDFa Fibra Totalb
Trigo integral 2,9 8,5 11,8c
Farinha de centeio integral 2,2 nd 23,0
Batata-inglesa 1,9 10,8 11,0
Farinha de mandioca 2,0 nd 6,3
Feijo-carioca 4,9 nd 19,3
Alface 13,7 14,1 33,1
Couve 6,9 16,0 32,6c
Couve-flor 9,4 14,0 27,0c
Repolho 11,6 12,1 27,2c
Tomate 9,7 17,6 22,1
Pepino 8,7 16,0 28,5c
Beterraba 8,2 8,8 15,9
Cebola 6,7 4,9 15,5
Cenoura 8,5 10,1 23,9c
Ma 4,4 16,5 13,8
aFibra Detergente Neutro NDE, bMtodo enzimtico-gravimtrico, cMtodo de Englyst e nd = no
determinado.

56
4.7. Recomendao nutricional
No h parmetros bioqumicos que possam ser utilizados para estabelecer o estado nutricional de
um indivduo em relao fibra alimentar, funcional ou total. Assim, as recomendaes sobre a quantidade de
fibra que deve ser ingerida no so as mesmas em todos os pases. No Reino Unido, prope-se a ingesto de
18 g/dia e na Alemanha, de 30 g/dia.
A dieta mediterrnea, tipicamente presente na Espanha, Itlia e Grcia, possui alto contedo de fibra,
por ser rica em vegetais, cereais, frutas e leguminosas. A recomendao da ingesto de FA nesses pases de
20 g/dia para homens e 15,7 g/dia para mulheres.
No Brasil, a Sociedade Brasileira de Alimentao e Nutrio (SBAN, 1990) recomenda uma
ingesto diria de 20 g ou de 8 a 10 g/1.000 kcal.
Nos Estados Unidos, baseado em estudos epidemiolgicos prospectivos, relacionando o consumo de
FA com a ocorrncia de doenas cardiovasculares, foi estabelecida a ingesto adequada (AI) de 14 g/1.000
kcal, independentemente do estgio de vida e do estado fisiolgico. Para crianas de 0 a 6 meses de idade,
considerando o leite materno como alimento adequado para suprir todas as necessidades nutricionais e
considerando ainda que o leite no fornece FA, no foi estabelecida AI para esses indivduos. Para crianas de
7 meses a 1 ano de idade, embora o consumo de alimentos slidos j esteja presente na alimentao da
criana, no h dados suficientes para se estabelecerem recomendaes de FA. Assim, no h AI de FA para
crianas de at 1 ano de idade. Na Tabela 4.4, apresentam-se as AI de FA total baseadas no consumo
energtico (14 g/1.000 kcal), de acordo com o estgio de vida e o estado fisiolgico.

Tabela 4.4 Recomendaes nutricionais para a ingesto de fibra alimentar total em diferentes estgios de
vida e estado fisiolgico
Estgio de Vida Fibra Alimentar Total (g/dia)*
(anos) Sexo
Masculino Feminino
1a3 19 19
4a8 25 25
9 a 13 31 26
14 a 18 38 26
19 a 30 38 25
31 a 50 38 25
50 a 70 30 21
> 70 30 21
Gestantes 28
Lactantes 29
*IOM (2002) baseado na ingesto adequada (AI).

4.8. Propriedades fsico-qumicas das fibras


A porosidade e superfcie disponvel da fibra podem influenciar a sua fermentao, enquanto a
estrutura qumica da camada pode desempenhar papel importante nas propriedades fisico-qumicas e na
adsoro de algumas molculas, produzindo alguns efeitos fisiolgicos.

4.8.1. Solubilidade e viscosidade


A solubilidade tem relao ntima com a funcionalidade da fibra. Polissacardios solveis podem
impedir a digesto e a absoro de nutrientes no intestino. Por exemplo, a celulose um polmero mais
estvel, devido conformao em que as molculas se mantm firmemente ligadas a um arranjo cristalino,
sendo mais insolvel. J os polissacardios com estrutura mais irregular tende a ser solvel. Polmeros com
alguns grupos carregados como pectina so solveis em soluo salina devido repulso eletrosttica. Ao
contrrio, eles podero ser insolveis na forma cida como na presena de ons fortes. Alguns materiais
insolveis em gua fria podero dissolver em elevadas temperaturas e ocorrer a forma desordenada pela
quebra das ligaes.
A viscosidade pode ser definida como a resistncia do fluxo. Ela causada pela interao fisiolgica
entre os polissacardios na soluo. A viscosidade depende da caracterstica intrnsica do polissacardio, ou
seja, espao ocupado pelo polmero caracterizado pela viscosidade intrnsica, sua concentrao e se as
molculas so separadas uma das outras e livres para mover independentemente.

57
4.8.2. Degradao microbiana dos polissacardeos
As fibras podem ser degradadas pela flora microbiana no intestino grosso. O grau de degradao
varia consideravelmente entre os polissacardeos e est relacionado com a capacidade de reteno de gua e
com a estrutura do polissacardeo da fibra.
Pectinas, gomas e mucilagens parecem ser completamente degradadas, enquanto a celulose apenas
parcialmente degradada, cerca de at 40%. Seguem os efeitos da degradao microbiana:
- Produo de cidos graxos de cadeia curta (AGCC ou SCFA) ou cidos graxos volteis (AGV ou VFA),
como acetato, propionato e butirato. Esses cidos graxos podem ser absorvidos e utilizados pelas clulas do
clon para produo de energia, especialmente butirato. Podem ainda ser absorvidos na veia porta, indo at o
fgado, onde influenciam o metabolismo de lipdios (propionato) e de carboidratos (acetato).
- Formao de gases como CO2, H2 e CH4, que podem ser eliminados pela respirao ou causar flatulncia.
- A fermentao promove abaixamento de pH intestinal, afetando a atividade das enzimas microbianas, como
as responsveis pela converso de cidos biliares primrios em secundrios. A reduo desses cidos biliares,
especialmente a de cido litoclico, est associada menor incidncia de cncer de clon. O abaixamento de
pH pode tambm favorecer a solubilizao e a conseqente absoro de certos minerais no clon, pelo
transporte paracelular.
- As fibras, ao serem fermentadas, contribuem para um maior crescimento das clulas microbianas, o que
pode contribuir com uma poro significativa do peso fecal.

4.8.3. Capacidade de reteno de gua (WHC)


A WHC associada com a fermentabilidade da fibra e pode aumentar indiretamente o bolo fecal pelo
incremento das clulas microbianas.
Est relacionada capacidade de hidratao das fibras, que resulta na formao de gel. As pectinas,
mucilagens e algumas hemiceluloses tm alta capacidade de reteno de gua, podendo aumentar a
viscosidade do contedo gastrointestinal e, como conseqncia, reduzir o esvaziamento gstrico, a difuso e a
absoro de nutrientes.
A composio qumica, a anatomia e as caractersticas fsicas da fibra influenciam o processo de
hidratao. Alm disso, os processos de moagem, secagem, aquecimento ou extruso pelo cozimento
modifica as propriedades fsicas da matriz da fibra, afetando sua WHC.
.
4.8.4. Capacidade de troca catinica e adsoro de molculas orgnicas
A fibra foi considerada prejudicial absoro de minerais devido aos polissacardios, como a pectina
carregada pelos seus grupos carboxlicos livres nos resduos de acares e tambm por estar associada a
substncias como fitato em cereais, mostrado em estudos in vitro. Entretanto, polissacardios com carga no
tm efeito nutricional na absoro de mineral e nem em elementos-trao, enquanto substncias associadas
como fitato podem ter efeito negativo. Alm disso, essas medidas de capacidade de ligao de minerais in
vitro no um bom indicador da biodisponibilidade de minerais. A fibra alimentar apresenta a propriedade de
ligar minerais "in vitro". No entanto, seu efeito na absoro de minerais "in vivo" controverso, e estima-se
que a quantidade de fibra normalmente consumida no seja suficiente para interferir negativamente na
absoro dos minerais.
A habilidade de vrias fibras de sequestrar e ligar-se quimicamente aos cidos biliares tem sido
sugerida como o potencial mecanismo pelos quais certas fibras, ricas em cidos urnicos e compostos
fenlicos, podem ter ao hipocolesterolemiante. O mecanismo de adsoro dos cidos biliares no
totalmente compreendido. As condies ambientais, as propriedades fsicas e qumicas e a natureza dos
cidos biliares podem influenciar a sua capacidade de adsoro. Tem sido demonstrado, in vivo, que
algumas fibras aumentaram a excreo fecal de cidos biliares e esterides, devido ao processo de adsoro e
ao aumento de viscosidade do meio.

4.8.5. Tamanho da partcula


O rompimento da parede celular pelo processo de moagem ir influenciar a resposta fisiolgica da
fibra. O tamanho da partcula tem influncia na WHC, no tempo de trnsito, na fermentabilidade da fibra e na
excreo fecal. Se a parede celular estiver completamente intacta, haver menor penetrao das enzimas
digestivas e menor liberao dos nutrientes dos alimentos.
A dimenso do tamanho da partcula depende do tipo de parede celular presente nos alimentos e do
grau de processamento. O tamanho da partcula de fibra pode variar durante o trnsito intestinal, como
resultado da mastigao e triturao no estmago e no intestino grosso pelas bactrias do clon. Nesse

58
processo, alguns componentes ligados na matriz da fibra pode ser solubilizado. Portanto, o tamanho da
partcula antes da ingesto no relevante para medir o potencial de ao da fibra no trnsito intestinal.

4.9. Efeitos fisiolgicos das fibras alimentar e funcional


Dietas pobres em fibras podem estar associadas com constipao intestinal, diverticulose e cncer do
intestino grosso, diabetes, obesidade e doenas coronarianas. Uma vez que o aumento no consumo de fibra e,
portanto, de alimentos vegetais est geralmente associado com a variao de outros constituintes da dieta,
difcil estabelecer uma relao clara do consumo unicamente da fibra com a incidncia dessas enfermidades.
Recomendaes dietticas devem incluir a ingesto de diversos tipos de fibra, pois isso pode contribuir para a
reduo na incidncia de doenas metablicas como diabetes, obesidade e, ou, doenas cardiovasculares
(Lajolo et al., 2001).

4.9.1. Fibras e intestino grosso


Como as fibras no so digeridas pelas enzimas presentes no intestino delgado, elas passam para o
intestino grosso, afetando profundamente suas funes. Aumentam o volume das fezes e a freqncia das
defecaes, diminuem o tempo de trnsito dos alimentos no trato gastrointestinal e alteram sua microbiota.
A constipao intestinal difcil de ser definida, portanto sua incidncia real no conhecida. Uma
definio aceitvel a de que ela ocorre quando o indivduo no defeca pelo menos uma vez por dia. A
constipao est freqentemente associada ao baixo consumo de fibra de cereais, sendo portanto, muito
comum nos pases ocidentais, onde o consumo de po tem-se declinado e o uso de farinhas integrais vem
sendo substitudo por farinhas refinadas, pobres em fibra. A hemorrida considerada conseqncia
secundria da constipao intestinal. Estima-se que um em cada dois americanos maiores de 50 anos sofra de
hemorrida, enquanto a doena extremamente incomum entre africanos. Doenas diverticulares esto
tambm associadas ao baixo consumo de fibra de cereais. Em pases ocidentais est presente em uma entre
trs pessoas, sendo bem mais rara em naes menos desenvolvidas.
Dados de 120 artigos publicados entre 1932 e 1992 indicaram a mdia do aumento da excreo de
fezes com o consumo de fibra expressa em g de fezes por grama de fibra (g/g). O farelo de trigo cru, apesar da
desvantagem de conter 3% de fitato, inibidor da absoro de minerais bivalentes, apresentou aumento
significativo da excreo de fezes de 7,2 (3 14,4) g/g, enquanto o farelo cozido foi de 4,4 (2 12,3) g/g. Em
frutas e vegetais foi de 6,0 (1,4 19,6) g/g, no psilium 4,0 (0,9 6,6) g/g, na aveia 3,4 (1 5,5) g/g, nas
gomas e mucilagens 3,1 (0,3 10,2) g/g, no milho 2,9 (2,8 3,0) g/g, nas leguminosas, especialmente a soja,
1,5 (0,3 3,1) g/g e na pectina 1,3 (0 3,6) g/g. Em sete estudos houve aumento mdio de 1,5 g de fezes/g de
amido resistente consumido, sendo sua contribuio bem menor, em comparao com cereais integrais, frutas,
vegetais, psilium, aveia e milho. Entretanto, sua contribuio na produo de butirato importante. Os
oligossacardios so substratos para fermentao, mas seus efeitos sobre o aumento do volume fecal no
foram observados.
As fibras, ao promoverem o aumento do volume fecal, reduzem o tempo de trnsito intestinal devido
presena de resduos de fibras no degradadas, ao aumento do teor de gua nas fezes e ao aumento na massa
microbiana pela fermentao. A forma fsica e o tipo de fibra so importantes com relao a esse efeito. Por
exemplo, farelo de trigo grosso mais eficaz do que quando modo fino; as fibras insolveis so mais eficazes
do que as solveis. Frutas, hortalias e farelo de trigo aumentam o volume fecal e reduzem o tempo de
trnsito intestinal, enquanto pectinas e gomas no apresentam esse efeito.
Os carboidratos prebiticos so altamente solveis em gua e estimulam o crescimento das bactrias
probiticas no intestino grosso, aumentando a resistncia contra patgenos invasores e a produo de cidos
graxos de cadeia curta, alm de reduzirem o risco de neoplasias no epitlio intestinal. Existem evidncias de
que eles podem ter efeitos no intestino delgado, aumentando a absoro de clcio.

Diverticulite e Hemorrida x Fibra


A baixa ingesto de fibra produz material fecal muito firme e duro dentro do intestino grosso, difcil
de ser eliminado. A presso exercida por esse material duro sobre o intestino grosso leva formao de
pequenas bolsas em sua parede (divertculos), que podem inflamar ou mesmo romper-se (diverticulite).
A dificuldade na defecao causa dilatao excessiva das veias da regio anal, o que pode levar a
distenso da camada muscular, sangramento e consequente desenvolvimento de varizes, o que caracteriza a
hemorrida.

59
4.9.2. Fibras e cncer de clon
Estudos epidemiolgicos vm demonstrando a correlao da incidncia de cncer no intestino grosso
com a baixa ingesto de fibra. Um mecanismo plausvel para o efeito anticarcinognico das fibras a reduo
no tempo de trnsito da massa alimentar atravs do clon, portanto reduzindo a possibilidade de pr-
carcingenos, carcingenos e promotores de tumores potenciais interagirem com a superfcie mucosa. Alm
disso, o aumento na massa, volume e maciez das fezes diluem os carcingenos. A reduo do pH intestinal
promovido pela fermentao reduz a atividade das enzimas microbianas, diminuindo a produo de cidos
biliares secundrios, especialmente o cido litoclico, que carcinognico e reduz a produo de amnia,
conhecida ser txica para as clulas.
Fibras afetam a diviso celular tanto aumentando quanto reduzindo a concentrao luminal de fatores
mitognicos. Juntamente com a fermentao das fibras so produzidos cidos graxos de cadeia curta,
especialmente butirato, que estimulam a proliferao celular no clon. Em situaes normais de indivduos
sadios, isso pode ser benfico. Entretanto, na presena de carcingenos isso pode acelerar o processo
carcinognico. A fermentao da fibra impede que ela exera o efeito de diluio dos carcingenos. Portanto,
no que diz respeito ao cncer de clon as fibras insolveis, menos fermentadas, so mais protetoras.
A maioria dos estudos clnicos e de interveno epidemiolgica no mediu os aspectos funcionais
dos mecanismos potenciais pelos quais a fibra pode ser protetora. Tentou-se demonstrar aspectos fisiolgicos,
como peso fecal e tempo de transito intestinal ,para promover proteo contra o desenvolvimento de tumor.
Cummings et al. (1992) relataram que o peso fecal maior que 150 g protetor contra o cncer de clon. Em
estudos realizados por Birkett et al. (1997) foi demonstrado que o peso fecal maior que 150 g melhorou os
marcadores para o cncer de clon, incluindo volume fecal, razo de cidos graxos primrios para secundrio,
pH das fezes, produo de amnia e tempo de trnsito intestinal.

4.9.3. Fibras e diabetes


Alimentos ricos em fibra so usualmente recomendados para diabticos por causa da sua suposta
ao na diminuio da resposta glicmica dos alimentos e, conseqentemente, reduo na necessidade de
insulina. A parede celular que no sofreu ruptura durante a preparao ou moagem protege o amido dentro da
clula da ao fsica do estmago ou da atividade microbiana no intestino grosso. Constituintes especficos da
parede da clula, como -glicana, podem exercer ao positiva na resposta glicmica. Se no for hidrolisado
durante o tratatamento, pode exercer resposta metablica especfica devido sua elevada viscosidade. As
gomas, principalmente goma-guar com elevado peso molecular, tm efeito similar em razo de sua elevada
viscosidade. As fibras -glicanas (monmeros de glicose) e goma-guar (monmeros de galactose e manose)
so neutras, sendo incapazes de interagir quimicamente com outras molculas endgenas ou exgenas.
Qualquer tratamento que possa aumentar a viscosidade poderia tambm induzir os efeitos biolgicos
benficos.
A viscosidade pode influenciar a absoro de glicose por vrios mecanismos, como redues no
esvaziamento gstrico, na acessibilidade da -amilase ao amido e na absoro de glicose produzida da
hidrlise do amido, devido difuso lenta da glicose e ao aumento da camada de gua na superfcie do
intestino delgado.
Outra categoria de fibra que parece exibir efeito similar a pectina. Esta fibra de alta viscosidade e
tem capacidade de troca catinica, sendo sensvel ao pH e, em ambiente inico, pode estar sob a forma cida
ou bsica.
Em 15 estudos com grupos de 24 indivduos, a goma-guar reduziu em 44% os nveis de glicose
sangnea. Em metanlise similar, a pectina e o psilium reduziram esses nveis em 29%. De 33 dos 50
estudos revisados, pectina e goma-guar e aquelas presentes nos produtos de feijo e aveia diminuiram
significativamente a resposta glicmica. Em contraste, somente 3 de 14 estudos com fibra insolvel
apresentaram esse efeito (Cummings et al., 2004).
Psilium conhecido por reduzir a glicose sangnea, sendo sugerido como adjunto no tratamento de
pacientes com diabetes tipo II. O mecanismo de ao do psilium na glicemia ps-prandial, insulinemia e
trigliceridemia no pode ser atribuda ao esvaziamento gstrico reduzido, mas ao aumento no tempo para
absoro intestinal da glicose.
Os mecanismos de ao envolvidos no efeito das fibras na resposta glicmica so mais
compreendidos. Eles so mltiplos e dependem da estrutura fsica dos alimentos e da caracterstica intrseca
da fibra, ou seja, a estrutura da parede celular da planta e sua capacidade de aumentar a viscosidade no
intestino delgado. Acredita-se que o efeito principal das fibras no lmem intestinal seja de natureza mecnica,
produzido pela reduo no tempo de trnsito intestinal pelas fibras insolveis e pelo retardo no esvaziamento

60
gstrico e na absoro dos acares pelas fibras solveis, permitindo melhor controle dos nveis plasmticos.
As fibras tambm melhoram a sensibilidade insulina, visto que cidos graxos de cadeia curta, como o
acetato, provm uma fonte alternativa de energia para substituir a glicose, sem requerer insulina.
O consumo crnico de dietas pobres em fibra pode tambm ser importante na precipitao do
aparecimento de diabetes em indivduos geneticamente predispostos. Desse modo, a ingesto de fibra no
representa apenas um recurso teraputico no controle da diabetes, mas tambm pode ser um fator
etiopatognico dessa enfermidade. Essa hiptese apoiada pela baixa incidncia de diabetes em populaes
africanas, que consomem tradicionalmente dietas com elevado contedo de fibras.

4.9.4. Fibras e obesidade


Alguns estudos epidemiolgicos evidenciaram que a ingesto de fibra menor em indivduos obesos
do que em magros e que o IMC menor em homens e mulheres com elevado consumo de fibra. Entretanto, os
estudos so ainda inconclusivos em demonstrar que a ingesto de fibra aumenta a saciedade e reduz a ingesto
de alimentos. A probabilidade de a fibra reduzir a ingesto de alimentos pode ser atribuda sua viscosidade,
o que diminui o esvaziamento gstrico e proporciona menor sensao de fome por um perodo de tempo
maior. Entretanto, essa hiptese no foi validada em estudos clnicos.
Pesquisas tem apontado o efeito de vrias fontes de fibra em mudanas de apetite e saciedade no
curto prazo. Cummings et al. (2004) verificaram que 15 dos 21 estudos revisados, de curta durao,
confirmaram que a ingesto de fibra reduz o apetite. Entretanto, existiram dificuldades em omitir, tanto para
os investigadores quanto para os indivduos pesquisados, os alimentos que estavam sendo consumidos. Alm
disso, foi difcil validar mudanas na ingesto alimentar em condies experimentais, pois o apetite
controlado por efeitos fisiolgicos, psicolgicos e sociais.
Apesar de no haver estudos epidemiolgicos adequados correlacionado ingesto de fibra e
obesidade, existem alguns mecanismos potenciais: as fibras podem aumentar a saciedade, reduzir a densidade
calrica da dieta, aumentar o esforo na mastigao, alterar a palatabilidade da dieta e diminuir o
esvaziamento gstrico, aumentar a viscosidade no intestino delgado e regular a absoro de caboidratos,
lipdios e protenas. Como conseqncia, haver menor ingesto e, ou, disponibilidade energtica da dieta,
contribuindo para a reduo do peso corporal. No entanto, a fermentao microbiana das fibras promove a
formao de cidos graxos de cadeia curta que aumentam o fornecimento energtico da dieta, porm esse
efeito parece ser menor do que a reduo energtica produzida pelo consumo de fibras na dieta.
Medidas da produo de energia a partir das fibras no so muito precisas, pois dependem da sua
fermentabilidade e da microbiota intestinal. Estima-se que cerca de 1,44 kcal/g seja produzido pela ingesto
de fibras e 2,01 kcal/g pela ingesto de amido resistente, comparados com 4 kcal/g de amido.
Pelos estudos j realizados, pode-se concluir que os alimentos contendo fibra ou suplementados
reduzem o apetite no curto prazo, mas no promovem mudanas consistentes no balano energtico no longo
prazo. Muitos outros fatores contribuem para controlar o apetite e o peso, no sendo a fibra o principal deles.

4.9.5. Fibras e doenas cardiovasculares


As doenas cardiovasculares so enfermidades multifatoriais, cujas principais causas so a presso
sangnea elevada, o hbito de fumar e nveis elevados de colesterol sangneo. Desde os anos de 1950,
estudos epidemiolgicos tm indicado que populaes que consomem dietas com elevado contedo de fibra
apresentam menor incidncia de doenas cardiovasculares.
Acredita-se que o efeito das dietas ricas em fibras na proteo contra as doenas cardiovasculares
esteja na reduo dos lipdios plasmticos, especialmente do nvel de colesterol. Sabe-se que pequena reduo
no nvel plasmtico de colesterol est associada com decrscimo significativo na probabilidade de ocorrncia
de doenas cardiovasculares.
Embora ainda seja limitado o conhecimento sobre as inter-relaes das fibras com o metabolismo
dos lipdios, sabe-se que esse efeito restrito ao consumo de fibras solveis, como as pectinas, gomas,
mucilagens e -glicanas. As fibras encontradas na aveia e no feijo produzem efeito hipocolesterolemiante.
Andersson (1998) observou maior excreo de cidos biliares com a ingesto de -glicanas da aveia e pectina
de frutas ctricas. As fibras insolveis como a celulose e a lignina, como as presentes no farelo de trigo e de
arroz ou na celulose pura no apresentaram esse efeito. Houve aumento de colesterol e reduo na excreo
de cidos biliares com a ingeto de fibra de beterraba e cevada. Os diferentes tipos de alimentos ricos em fibra
tm efeitos diversos na reduo dos nveis plasmticos de lipdios. Algumas frutas, hortalias, leguminosas
(feijo) e polissacardeos viscosos, como pectinas e gomas, so capazes de reduzir os nveis plasmticos de
lipdios.

61
Acredita-se que diversos mecanismos possam estar envolvidos na reduo de colesterol sangneo
pelas fibras. Dentre esses foram citados:
- Menor digesto e absoro de lipdios, devido ao esvaziamento gstrico mais lento e maior viscosidade do
meio, que dificultam a ao de enzimas digestivas.
- Maior eliminao de cidos biliares, que se complexam com pectina, interferindo com a formao de
micelas, reduzindo a absoro de colesterol, cidos biliares e lipdios.
- A fermentao produz cidos graxos de cadeia curta, especialmente propionato, que absorvido na veia Porta
vai at o fgado, inibe a atividade da enzima HMG CoA redutase (hidroxi-metil-glutaril coenzima A redutase)
e, portanto, a sntese de colesterol heptico, diminuindo seus nveis sangneos.
A ingesto de fibra solvel resulta em reduo consistente no pool de colesterol heptico, devido
menor quantidade de colesterol via remanescente de quilomcrons que chega at o fgado ou ao aumento da
atividade da 7--colesterol hidroxilase, responsvel pela interrupo da circulao ntero-heptica de cidos
biliares. Isso gera um balano negativo de colesterol heptico, resultando no estmulo da HGMCoA redutase e
receptotres apo B/E e reduo na atividade da acilCoA:colesterol aciltransferase (ACAT). Essas alteraes na
homeostase de colesterol heptico esto correlacionadas com reduo na secreo de VLDL-colesterol,
aumento da remoo da VLDL do plasma, diminuio na converso de VLDL para LDL e aumento na taxa
catablica da frao ApoB da LDL-colesterol. Alm disso, a atividade da protena ester de colesteril
transferase (CETP) reduzida e provavelmente a lipase lipoprotica aumenta (LPL). Todas essas alteraes
no metabolismo de colesterol heptico, como sntese, processamento intravascular e catabolismo de LDL,
resulta no conhecido efeito da fibra solvel em reduzir a concentrao de LDL-colesterol no plasma.
A ingesto de 8,7 g de -glicana do farelo de aveia aumentou em 83% a excreo de cidos biliares
aps 24 horas e em 93% aps a ingesto da refeio-teste, rica em lipdio e colesterol e com 6 g de -glicana.
A excreo endgena de colesterol diminuiu aps a refeio-teste com fibra de aveia. Isso pode ser um efeito
secundrio devido ao aumento da excreo de cidos biliares e, conseqentemente, sntese heptica de
colesterol. O colesterol srico tambm utilizado para sntese de cidos biliares, explicando a reduo na
concentrao de colesterol aps longo tempo de ingesto da fibra de aveia. O aumento da excreo de lipdio
parece ser pela reduo no processo de solubilizao no intestino, resultando na menor secreo de
quilomcrons na circulao linftica.
Vrias fontes de fibra so conhecidas por ter efeitos benficos na dislipedemia. O mecanismo de
ao depende de suas propriedades fsico-qumicas e tm sido identificados como fator de risco para doenas
cardiovasculares LDL-colesterol elevado, HDL-colesterol reduzido e trigliceridemia. As fibras, que so
capazes de otimizar esses marcadores, so recomendadas para todas as pessoas, especialmente para aqueles
indivduos com risco de dislipidemias.

4.10. Referncias

ANDERSSON, H. Summary of activities regarding metabolic effects of non-digestible carbohydrates related


to the small bowel. In: GUILLON F., et al.. PROFIBRE - symposium, functional properties of non
digestible carbohydrates. Proccedings. Nantes: Imprimerie Parenthses, 1998. p. 92-96.
ASP, N.G.; SCHWEIZER, T.F.; SOUTHGATE, D.A.T.; THEANDER, O. Dietary fibre analysis. In
SCHWEIZER, T.F.; Edwards, C.A.; Dietary fibre. A component of food London: Springer, 1992. p. 57-
101.
BIRKETT A.M.; JONES, G.P.; De SILVA, A.M.; YOUNG, G.P.; MUIR, J.G. Dietary intake and faecal
excretion of carbohydrate by Australians: importance of achieving stool weights greater than150 g to improve
faecal markers relevant to colon cancer risk. Eu. J. Clin. Nutr., v.51, p. 625-632, 1997.
CUMMINGS, J.H.; BINGHAM, S.A.; HEATON, K.W.; EASTWOOD, M.A. Fecal weight, colon cancer risk
and dietary intake of non-starch polysaccharides (dietary fiber). Gastroenterology, v. 103, p.1783 - 1789,
1992.
CUMMINGS, J.H.; EDMOND, L.M.; MAGEE, E.A.. Dietary carbohydrates and health: do we still need the
fibre concept? Clinical Nutrition Supplements, v.1, p. 5 - 17, 2004.
GROFF, J.L.; GROPPER, S.S.; HUNT, S.M. Advanced nutrition and Humam metabolism. 2. ed. New
York, West Publishing Company, 1995. p.1 - 575.

62
GURR, M.I.; ASP, N.G. Dietary fiber. Blgica: ILSI Europe Concise Monograph Series, 1994. 23 p.
INSTITUTE OF MEDICINE: Dietary reference intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, faty acids,
cholesterol, protein and amino acids. Food and Nutrition Board (FNB). [S.L.], 2002.
INSTITUTE OF MEDICINE: Dietary reference intakes: Proposed definition of Dietary fiber. Food and
Nutrition Board (FNB). [S.L.], 2001.
KAMP, J.W.; ASP, J.; MILLER, J.; SCHAAFSMA, G. Dietary fiber. Wageningen, The Netherlands:
Wageningen Academic Publishers, 2004. 357 p.
LAJOLO, F.M.; SAURA-CALIXTO, F.; PENNA, E.W.; MENEZES, E.W. Fibra diettica en
iberoamrica: Tecnologa y salud. So Paulo: Livraria Varela, 2001. 472p.
LUPTON, J.R.; TURNER, N.D. Dietary fiber. In: STIPANUK, M.H. (Ed.) Biochemical and physiological
aspects of human nutrition. Philadelphia, W.B: Saunders Company, 2000. cap 8; p. 143 - 154.
RODRGUEZ, R.; JIMNEZ, A.; FERNNDEZ-BOLAOS, B.; GUILLN, R.; HEREDIA, A. Dietary
fibre from vegetable products as source of functional ingredients. Trends in Food & Technology, v. 17, p. 3
- 15, 2006.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE ALIMENTAO E NUTRIO. Cadernos de nutrio; v. 2, 1990.

63
Captulo 5 - PROTENAS
Maria do Carmo Gouveia Peluzio
Ellencristina da Silva Batista

5.1. Introduo
A palavra protena vem do grego protos, que significa primeiro. Foi o primeiro macronutriente
considerado essencial para o organismo e o mais abundante componente estrutural e funcional das clulas
do corpo humano.
O corpo de um homem de 70 kg contm aproximadamente 11 kg de protena. Metade dessa protena
(43%) est presente como msculo esqueltico, enquanto outras estruturas como pele e sangue contm cerca
de 15% do total de protenas. Os tecidos viscerais metabolicamente ativos possuem apenas 10% do total de
protenas, e o restante encontra-se nos demais rgos (crebro, intestino, corao e ossos). A distribuio da
protena entre os rgos varia de acordo com a faixa etria. O recm-nascido tem menos tecido muscular e
mais crebro e tecido visceral que o adulto. tambm interessante realar que, apesar da grande variedade de
protenas dentro de um nico organismo, quase a metade do contedo total delas no ser humano se encontra
em apenas quatro protenas: miosina, actina, colgeno e hemoglobina. O colgeno, especificamente
compreende 25% do total.
As protenas possuem diversas funes, cuja importncia evidenciada pelo fato de que a
informao gentica expressa como protenas. Assim como existem milhares de genes no ncleo celular,
cada um especificando uma caracterstica distintiva do organismo, existem tambm, correspondentemente,
milhares de diferentes protenas na clula, cada uma executando uma funo especfica, determinada pelo
gen.
Dentre as inmeras funes das protenas, pode-se citar aquela que serve de carreador de substncias
como ons ou molculas no plasma sanguneo, a exemplo da hemoglobina. Outras protenas ancoradas em
membranas biolgicas so receptores para compostos especficos que funcionam na regulao celular,
incluindo o transporte de molculas para dentro e para fora da clula. Alm disso, h os fatores de coagulao,
os anticorpos, os hormnios, as enzimas que tambm so protenas.
Contm em sua estrutura carbono, hidrognio, oxignio e, adicionalmente, nitrognio, juntamente
com enxofre, e algumas possuem elementos como fsforo, ferro e cobalto na sua estrutura.

Como calcular o teor de protena de um alimento?

O teor de nitrognio nas protenas vegetais varia de 16,28% a 18,75%, e nas protenas animais o valor
mdio de 16%. A fim de adotar um fator universal para todos os produtos, convenciou-se uma mdia de
16%. Esse porcentual de nitrognio pode ser usado para obter o teor de protena.
100 g protena 16 g nitrognio
X 1 g nitrognio
X = 6,25 g protena

Ento, 6,25 o FATOR UNIVERSAL adotado para converso do teor de nitrognio no teor de protena
do alimento. Assim, dosando o teor de nitrognio do alimento pelo mtodo de Kjedhall e multiplicando o
valor encontrado por 6,25, obtm-se o teor de protena do alimento.

5.2. Aminocidos
5.2.1. Formao das Protenas
As protenas so macromolculas cuja unidade estrutural so os aminocidos. Na natureza j foram
identificados cerca de 200 aminocidos, sendo que quase todas as protenas nos seres vivos so compostas
pelos mesmos 20 aminocidos que so conhecidos como primrios. A protena da dieta fonte para esses 20
aminocidos primrios.
a ordem desses aminocidos primrios e a freqncia com que aparecem na estrutura que permitem
que as protenas sejam umas diferentes das outras e possuam diversas funes. Cada tipo de protena tem
uma seqncia nica de aminocido.

64
Todos os aminocidos contm em sua estrutura pelo menos um grupo amino (-NH2) na posio alfa
e um grupo carboxila (COOH-) e todos, com exceo da glicina, contm um tomo assimtrico. Na Figura 5.1
esta representada a frmula geral dos aminocidos:

COO
H 3N C H
R
Figura 5.1: Frmula geral dos aminocidos

Devido presena do carbono assimtrico, os aminocidos podem existir como ismeros. Os de


ocorrncia natural esto dispostos na configurao L. protenas.

Existem outros aminocidos alm dos primrios?


Alm dos primrios, outros aminocidos tm sido encontrados como componentes de apenas alguns
tipos de protenas, todos derivados de alguns dos aminocidos primrios. Entre os aminocidos no primrios
esto 4-hidroxiprolina e 5-hidroxilisina, encontrados no colgeno; 6-N-metilisina, encontrado na miosina; y-
carboxiglutamato encontrado na protrombina; desmosina, presente na elastina; selenocistena, encontrado na
glutationa-peroxidase; e ornitina e citrulina, intermedirios na biossntese da arginina no ciclo da uria.

Os aminocidos unem-se uns aos outros para formar uma protena por meio da ligao peptdica. Tal
ligao constituda pela unio de um grupo carboxlico de um aminocido ao grupo amino de outro, com
liberao de gua (Figura 5.2).

1 2
R H R
+ -
H 3N CH C OH + H N CH COO
O H 2O H 2O

1 2
R H R
+ -
H 3N CH C N CH COO
O

Figura 5.2- Unio dos aminocidos formando as ligaes peptdicas, com sobra de uma molcula de gua.

65
A seqncia da ligao, determinada geneticamente, conhecida como estrutura primria. A sua
conformao no espao em forma linear, dupla hlice ou folha pregueada constitui a estrutura secundria da
protena. J a forma como a estrutura secundria se arranja no espao, estendendo-se ou dobrando-se sobre si
mesma, a estrutura terciria. A estrutura quaternria a associao de subunidades da estrutura terciria. J
a estrutura tridimensional das protenas vai influenciar sua digestibilidade e, conseqentemente seu valor
nutricional.
A unio de dois aminocidos por uma ligao peptdica forma um dipeptdio. Trs aminocidos
podem ser reunidos por duas ligaes peptdicas para formar um tripeptdio e, assim, sucessivamente para
formar tetra e pentapeptdios. A estrutura formada por pequeno nmero de aminocidos chamada de
oligopeptdeo, e quando os aminocidos so reunidos em estruturas que variam at aproximadamente 10.000
Dltons, essas estruturas so chamadas de polipeptdeos. As estruturas com peso molecular acima de 10.000 a
milhes de Dltons j so protenas.

Temperatura elevada e protenas

Em certos tipos de processamentos de protenas, como aquecimento em meio alcalino, ou em temperatura


ambiente muito elevada, pode ocorrer a isomerizao dos aminocidos, com a transformao da forma L
na forma D. Isso tem importncia nutricional, pois vrios aminocidos D no so aproveitados pelo
organismo ou o so em menor velocidade. Por exemplo, a D-fenilalamina e a D-metionina so
aproveitadas pelo organismo do homem, mas com menos eficincia que as formas L.

5.2.2. Classificao dos aminocidos


Uma vez que, certas condies clnicas podero causar alteraes especficas no metabolismo e
requerimento dos aminocidos, eles podem ser classificados de acordo com a sntese no organismo,
dependendo da razo fornecimento/demanda.
Os aminocidos podem assim, ser classificados em trs categorias: dispensveis, indispensveis e
condicionalmente indispensveis. Nove dos aminocidos primrios so indispensveis, pois a sua cadeia
carbnica no pode ser sintetizada no organismo e devem provir da dieta. So eles: valina, leucina, isoleucina,
fenilalanina, triptofano, treonina, metionina, lisina e histidina, portanto devem estar presentes na dieta. J o
aminocido arginina no pode ser sintetizado pelos humanos durante as fases de desenvolvimento e
crescimento, sendo considerado indispensvel somente na infncia e adolescncia. Alm disso, a cistena e a
tirosina, apesar de no serem considerados aminocidos indispensveis, so sintetizadas a partir dos
aminocidos indispensveis metionina e fenilalanina, respectivamente, sendo considerados condicionalmente
indispensveis. Os outros aminocidos que podem ser sintetizados pelo organismo so os dispensveis.
Se um aminocido que dispensvel for usado pelo organismo mais rapidamente do que o
produzido, ele se torna indispensvel nesse caso. Como exemplo, pode-se citar a glutamina no trauma grave e
no jejum. Os considerados condicionalmente indispensveis so a histidina, a arginina, a cistena e a tirosina.
A histidina necessria para crianas e para adultos com uremia. A arginina necessria em perodo de
rpido crescimento celular, infncia e certas condies clnicas como desnutrio e sepse. A cistena e tirosina
so condicionalmente indispensveis por serem sintetizadas a partir de metionina e fenilalanina,
respectivamente.
No Quadro 5.1 esto listados os aminocidos de acordo com a sntese no organismo.

66
Quadro 5.1 - Aminocidos indispensveis, dispensveis e condicionalmente indispensveis na dieta humana
Indispensveis Dispensveis Condicionalmente Precursores dos
indispensveis condicionalmente
indispensveis
Histidina Alanina Arginina Glutamina/glutamato/
Aspartato
Isoleucina cido asprtico Cistena Metionina/serina
Leucina Asparagina Glutamina cido Glutmico/amnia
Lisina cido glutmico Glicina Serina/colina
Metionona Serina Prolina Glutamato
Fenilalanina Tirosina Fenilalanina
Treonina
Triptofano
Valina

Fonte: IOM, 2002.

5.3. Classificao das Protenas


As protenas podem ser classificadas em completas e incompletas, de acordo com os aminocidos
que possuem.
Completas: protenas que contm teor equilibrado de aminocidos, tanto qualitativa quanto
quantitativamente. So, sobretudo, as protenas dos alimentos de origem animal, como carnes, ovos e leite.
Incompletas: so as que apresentam deficincias de um ou mais aminocidos essenciais. As protenas
dos alimentos de origem vegetal esto nessa categoria.

De acordo com a composio da sua estrutura, as protenas podem ser divididas em simples e
conjugadas.
Protenas simples: so aquelas que, por hidrlise, fornecem apenas aminocidos. Podem ser:
Fibrosas Aquelas constitudas de cadeias polipeptdicas que se organizam em um arranjo paralelo
ao longo de um eixo, formando fibras ou filamentos. So pouco solveis, de consistncia rgida e tm
normalmente funes estruturais. Como exemplo, tm-se o colgeno, a queratina e a elastina.
Globulares So constitudas de cadeias polipeptdicas enoveladas em estruturas esfricas ou
globulares. Em geral, tm funes dinmicas na clula, como os anticorpos, a maior parte das enzimas, os
hormnios e muitas protenas carreadoras, como a albumina e a hemoglobina.
Protenas conjugadas: So aquelas combinadas com outros grupos, alm dos aminocidos. A
poro no-aminoacdica da molcula chama-se grupo prosttico. As protenas conjugadas so classificadas
de acordo com a natureza do grupo prosttico:
Lipoprotenas So complexos de lipdios com protenas. A poro lipdica constituda de
triglicerdeos, fosfolipdeos, colesterol ou derivados ligados protena. As lipoprotenas tm funo estrutural
quando associadas a membranas de organelas celulares e de transporte de lipdios. So exemplos as
lipoprotenas sricas HDL, VLDL, IDL, LDL e quilomcrons, as quais so detalhadas no captulo de lipdios.
Alm das lipoprotenas sricas, so exemplos importantes as da gema do ovo lipovitelinas e lipovitelininas,
que agem como emulsificantes.
Glicoprotenas So as protenas ligadas co-valentemente s molculas de glicdios. A poro
glicdica encontra-se ligada molcula protica, atravs de grupos hidroxila da serina e treonina ou de grupos
NH2 dos resduos de asparagina e glutamina. Essa conjugao aumenta a solubilidade da protena, que capaz
de formar solues altamente viscosas. So exemplos importantes as fito-hemaglutininas do feijo que,
quando no inativadas, causam problemas na absoro e aproveitamento dos nutrientes. E ainda a ovomucina,
que um dos responsveis pela alta viscosidade da clara do ovo, entre outras.
Metaloprotenas So complexos de metais com protenas. O metal pode estar fortemente ligado,
como no caso da hemoglobina e da mioglobina, em que o tomo de ferro est includo no ncleo porfirnico
ou ligado mais fracamente e facilmente removvel, como as ligaes de Fe, Cu e Zn com a ovoalbumina e do
Fe com ferritina no fgado. Muitas dessas ligaes permitem que os metais, que de outra forma so insolveis,
sejam solubilizados e transportados nos pHs fisiolgicos dos fluidos orgnicos.

67
Fosfoprotenas So protenas que possuem grupo fosfato na molcula, ligados normalmente na
forma de ster aos grupos hidroxila da serina e da treonina. So exemplos a casena do leite e a vitelina da
gema do ovo. A casena do leite na forma micelar, cuja estabilidade mantida devido a esses grupos de
fosfato ligados ao clcio, forma uma estrutura estvel no pH natural desse fluido, no se precipitando pelo
aquecimento. Alm disso, a presena de grupo fosfato dificulta a ao de enzimas digestivas na sua
proximidade, resultando da hidrlise parcial fosfopeptdeos, que podem ter importante funo na absoro de
clcio.
Nucleoprotenas So complexos de protenas bsicas com cidos nuclicos encontrados no ncleo
celular. As histonas e protaminas so nucleoprotenas.

As protenas podem tambm ser classificadas conforme a solubilidade em diferentes solventes:


Albuminas: So facilmente solveis em gua e coagulveis pelo calor. Formam um grupo de
protenas, das quais constitui exemplos tpicos a albumina do ovo e do soro do leite.
Globulinas: So insolveis ou moderadamente solveis em gua, porm sua solubilidade
aumentada pelo acrscimo de sais neutros, como cloreto de sdio; so coagulveis pelo calor, por exemplo
imunoglobulinas plasmticas, as globulinas do msculo e as globulinas das sementes.
Glutelinas: So protenas insolveis em solues salinas diludas, porm solveis em cidos ou bases
diludas. So encontradas principalmente em cereais, a exemplo da glutenina do trigo e do milho.
Prolaminas: So insolveis em gua e em solues salinas e solveis em solues alcolicas, sendo
encontradas normalmente em semente de cereais como a zena no milho e a gliadina no trigo.
Escleroprotenas: So praticamente insolveis. A solubilizao dessas requer a ao de agentes de
degradao das molculas, como cidos e bases, detergentes e dispersantes. Essas protenas so as protenas
fibrilares, como o colgeno, as queratinas, a fibrona, a elastina.
Histonas: So protenas solveis em gua e liberam, pela hidrlise, grande quantidade de
aminocidos bsicos. A maioria das histonas aparece combinada com os cidos nuclicos (nucleoprotenas).
Elas esto presentes em grandes quantidades em certos tecidos glandulares como timo e pncreas.
Protaminas: So protenas fortemente bsicas. Essas protenas no contm enxofre, tirosina e
triptofano. Aparecem tambm associadas aos cidos nuclicos e esto presentes em clulas espermticas de
peixe.

5.4. Digesto
Aps a ingesto os alimentos so triturados com o processo de mastigao para digesto das
protenas. A boca tem ao apenas mecnica, pois a saliva no contm enzimas proteolticas. Quando o
alimento deixa o esfago, ele se deposita temporariamente no estmago. A distenso do estmago, causada
pela ingesto de alimentos, provoca liberao do hormnio gastrina pela mucosa gstrica, que por sua vez
estimula a liberao do cido clordrico, que desnatura as protenas, facilitando a sua degradao. O pH cido
propiciado por esse cido leva converso do pepsinognio em pepsina, a qual inicia o processo de digesto
das protenas. Esse processo de converso autocataltico, isto , depois da converso inicial do pepsinognio
em pepsina, ela mesma capaz de ativar o pepsinognio.
importante observar que todas as enzimas proteolticas do trato digestivo so produzidas na forma
de zimognios inativos, para proteger as clulas secretoras da autodestruio.
A pepsina hidrolisa as protenas da dieta em pequenos peptdios, clivando preferencialmente grupos
aminos dos peptdeos que tenham anis aromticos como cadeias laterais e, portanto podem agir em vrios
pontos entre as cadeias polipeptdicas.
Do estmago, a protena parcialmente digerida vai para o duodeno. As protenas que deixam o
duodeno so agora uma mistura de protenas no digeridas, polipeptdeos e cerca de 15% j como
aminocidos. A pepsina, cujo pH timo est prximo de 1,8, tem sua ao bloqueada, pois o pH duodenal
passa a ser de 6,5, favorvel ao de outras proteases.
Esses produtos da digesto estomacal aps penetrarem no intestino delgado estimulam a secreo
pela mucosa intestinal da enteroquinase, uma enzima que transforma o tripsinognio pancretico em tripisina
ativa. A tripsina, por sua vez, ativa outras enzimas pancreticas proteolticas. A elastase a enzima
pancretica que hidrolisa a elastina e o colgeno.
Os zimognios do suco pancretico so tripsinognio, quimotripsinognio e procarboxipeptidase. A
ativao dos zimognios pela tripsina se d pela clivagem de uma ligao peptdica adjacente a uma arginina
ou lisina, no comeo da cadeia do zimognio.

68
As enzimas proteolticas pancreticas so classificadas em endopeptidases: a tripsina, quimotripsina,
elastase; e exopeptidases: a carboxipeptidase e aminopeptidase.
Essas enzimas independem da ao da pepsina para agir. As endopeptidase quebram ligaes
peptdicas na poro interna da molcula; a tripsina age em ligaes onde um aminocido dibsico contribui
com a carboxila (lisina e arginina); a quimotripsina, por sua vez, hidrolisa a ligao onde um aminocido
aromtico contribui com a carboxila (fenilalamina, tripotofano e tirosina); e a exopeptidase libera
aminocidos livres. Ela age no aminocido, que tem a carboxila terminal, da o nome carboxipeptidase; as
aminopeptidases agem na extremidade amnica.
A quantidade de enzimas secretadas pelo pncreas regulada pelo teor de protena na luz intestinal.
A tripsina vai se ligando protena diettica at que esteja em excesso. Quando isso acontece, a tripsina livre
no intestino envia sinal ao pncreas para reduzir a sntese de tripsinognio.
A digesto dos peptdeos provenientes da ao das enzimas gstricas e pancreticas at aminocido
completada pelas mltiplas peptidases produzidas pelas microvilosidades, principalmente do duodeno e
jejuno. So elas as peptidases mais importantes: as aminopolipeptidases e as dipeptidases. Essas enzimas
desdobram os polipeptdeos remanescentes em tripeptdeos e dipeptdeos e alguns aminocidos.
Os tripeptdeos, dipeptdeos e os aminocidos so facilmente transportados atravs da membrana das
microvilosidades para o interior do entercito, onde h outras peptidases especficas para os tipos de ligaes
restantes entre os aminocidos das molculas dos tripeptdeos e dipeptdeos. Em poucos minutos,
praticamente todos os tripeptdeos e dipeptdeos so digeridos a aminocidos, os quais, a seguir, passam para
o sangue circulante.
A maior parte dos produtos da digesto de protenas absorvidas est na forma de aminocidos, com
raras excees nas formas de peptdeos e protena que, se ocorrerem, podem causar distrbios imunolgicos,
como a alergia alimentar.

5.5. Absoro
Quase todas as protenas da dieta so absorvidas na forma de aminocido no intestino. Entretanto, as
molculas de aminocidos so grandes para sofrer difuso atravs dos poros das membranas celulares,
portanto os aminocidos s podem atravess-los por transporte ativo ou facilitado, utilizando-se mecanismos
carreadores.
Entre as formas isomricas dos aminocidos, h diferena na velocidade de absoro intestinal. O
ismero natural L ativamente transportado atravs da mucosa. Essa transferncia para a serosa envolve a
participao da vitamina B6 (pirididoxal-fosfato). J os ismeros D so transferidos por difuso simples. O
sistema ativo de absoro envolve a participao de energia e carreadores para o transporte de aminocidos
atravs da membrana:
- Sistema para o transporte de aminocidos neutros.
- Sistema para o transporte de aminocidos bsicos (lisina, arginina, histidina).
- Sistema para o transporte de aminocidos cidos (aspartato e glutamato).
- Sistema para o transporte de prolina e hidroxiprolina.

O transporte de aminocidos ocorre somente na presena simultnea do transporte de sdio. Os


sistemas carreadores esto localizados na borda em escova. A teoria mais aceita para o transporte de
aminocidos atravs da membrana postula que o carreador possua stios de ligao para a molcula de
aminocidos e para o on sdio, transportando consigo o aminocido que ser captado no espao intracelular.
O aumento da concentrao intracelular no aminocido ir gerar o gradiente de sua concentrao em
relao ao sangue, resultando na difuso do aminocido para o sistema porta at o fgado.
O transporte de aminocidos essencial para evitar perdas destes na urina. Entretanto, como ocorre
com outros mecanismos de transporte ativo nos tbulos renais, existe um limite superior para a intensidade do
transporte de cada tipo de aminocido. Por essa razo, quando determinado tipo de aminocido atinge
concentraes muito elevadas no plasma e no filtrado glomerular, o excesso que no pode ser ativamente
reabsorvido perdido na urina. Alm disso, o limiar plasmtico a partir do qual cada aminocido comea a
ser perdido na urina apresenta-se acentuadamente reduzido, pois os sistemas transportadores apropriados para
a reabsoro ativa de certos aminocidos quase sempre so deficientes ou ausentes no epitlio tubular renal.

69
5.6. Metabolismo de aminocidos
Do fgado, os aminocidos podem seguir duas rotas: a anablica e a catablica. A direo a ser
tomada depende do suprimento de aminocidos nos alimentos e das necessidades do organismo e do controle
hormonal. Na rota catablica, as protenas intracelulares so hidrolisadas por catepsinas.
Ao conjunto de aminocidos livres presentes na circulao geral de todo o organismo, oriundos da
dieta, da quebra de protenas tissulares ou da sntese de aminocidos dispensveis no corpo, d-se o nome de
pool circulante.
No existe reserva considervel de aminocidos livres no organismo, qualquer quantidade acima das
necessidades para a sntese protica celular e dos compostos no-proticos que contm nitrognio ser
metabolizada, ou seja, os excessos so excretados. H um limite superior, aps o qual os aminocidos so
degradados e utilizados como energia ou armazenados como gordura.
O turnover protico o contnuo estado de sntese e degradao de protenas, que necessrio para
manter o pool metablico e a capacidade de satisfazer a demanda de aminocidos nas clulas e tecidos
quando estes so estimulados a produzir protenas. Os tecidos de substituio de protenas mais ativos so as
protenas plasmticas, a mucosa intestinal, o pncreas, o fgado e os rins, enquanto os msculos, a pele e o
crebro so menos ativos.
Quando a ingesto protica inadequada, em termos de quantidade ou proporo de aminocidos
essenciais ou se h um dficit no fornecimento energtico, o catabolismo dos aminocidos excede sua
incorporao nas protenas teciduais. O catabolismo dos aminocidos tambm um meio de utilizar a energia
de aminocidos extras ingeridos com alto teor de protena.
no fgado que ocorre o catabolismo de seis dos nove aminocidos indispensveis; os demais, os
aminocidos de cadeia ramificada, so degradados, principalmente, nos msculos e rins. O catabolismo de
aminocidos dirigido para a separao do grupo amino do esqueleto de carbono, com subseqente destino
desses dois componentes. Entretanto, cada aminocido segue um caminho diferenciado na rota metablica.
Neste momento, trata-se aqui apenas das reaes comuns maioria dos aminocidos no metabolismo
protico.

5.6.1. Destino do Grupamento -amino dos Aminocidos


Os grupos -aminos removidos, se no so reutilizados para a sntese de novos aminocidos ou
outros compostos nitrogenados, so coletados e, no fim, convertidos em produto que possa ser excretado pelo
rim. O principal produto final do metabolismo do nitrognio das protenas a uria, entretanto pequena parte
dos aminocidos tambm pode ser convertida em cido rico, amnia e creatinina.
A separao do grupo amino do esqueleto carbnico feita por dois tipos de reaes enzimticas:
transaminao e desaminao (Figura 5.3).
Na reao de transaminao ocorre a transferncia reversvel do grupo amino para um alfa-cetocido
intermedirio do metabolismo da glicose. A transaminao catalisada pelas enzimas transaminases ou
aminotransferases, provocando a aminao do -cetoglutarato e a conseqente formao de outro
aminocido. Assim, ocorre concentrao do nitrognio proveniente dos aminocidos em trs principais
aminocidos: aspartato, alanina e glutamato. Dessa forma, o catabolismo de grupo amino converge em trs
principais produtos, dependendo do aminocido que recebeu o grupo amino. Ser formada a alanina se o
receptor for o piruvato e aspartato se o receptor for o oxaloacetato; se o alfa-cetoglutarato receber o grupo
amino, o produto ser o glutamato.

70
Transaminao
cido glutmico cido -cetoglutrico
COOH COOH

CH2 CH2

CH2 CH2

CHNH2 C O

COOH COOH

CH3 CH3

C O CHNH2

COOH COOH

cido pirvico Alanina

Desaminao oxidativa
NH3
Flavina
R CH COOH R C COOH R C COOH
Enzima
NH2 NH O
H2O

Aminocido Aminocido Acetocido

Figura 5.3 Reaes de transaminao e desaminao oxidativa.

A maioria das transaminases especfica para o receptor do grupamento amino, mas muito menos
especfica para outro substrato, o aminocido que doa o grupamento amino.
O -cetoglutarato o receptor comum dos grupos aminos da maioria dos outros aminocidos.
Agora, o novo aminocido formado com a recepo do grupo amino sofrer a desaminao, que a
reao na qual o nitrognio do aminocido formado pela transaminao removido, resultando na formao
de amnia e liberao do esqueleto carbnico.
Por exemplo, se for o glutamato o produto da transaminao, este pode ser desaminado pelo
mecanismo de desaminao, em que o grupo amino do glutamato removido do esqueleto carbnico.

Glutamato alfa-cetoglutarato + NH3

A glutamato desidrogenase muito ativa no fgado e funciona conjuntamente com o ciclo da uria.
Portanto, uma srie de transformaes, que em ltima anlise concentra o nitrognio no glutamato, previne a
formao excessiva de amnia livre, que altamente txica.
A amnia formada pode ser recuperada e reutilizada na sntese de aminocidos, e, nesse caso, a
glutamato desidrogenase atua inversamente, formando o glutamato a partir de alfa-cetoglutarato e amnia.

71
Embora sendo mais ativa no fgado, a desaminao oxidativa do glutamato um processo que ocorre
praticamente em todos os tecidos.
A maneira usada para transportar amnia dos tecidos perifricos ao fgado na maioria dos animais
convert-la num composto txico antes de lan-la no sangue. Em muitos tecidos, incluindo o crebro, a
amnia enzimaticamente combinada com o glutamato, produzindo glutamina pela ao da glutamina
sintetase; ou seja:
ATP + NH4+ + glutamato ADP + Pi + glutamina + H+

A glutamina formada um composto no-txico, neutro, que atravessa facilmente as membranas


celulares, enquanto o glutamato, que possui carga lquida negativa, no o consegue. A glutamina
transportada pelo sangue ao fgado, onde, pela ao da glutaminase, produzir glutamato e amnia.

Glutamina + H2O glutamato + NH4+

A glutamina a principal forma de transporte da amnia e est presente no sangue normal em


concentraes muito superiores s dos outros aminocidos.

5.6.2. Sntese da Uria


A uria a principal forma de eliminao dos grupos amino derivados dos aminocidos. Seu ciclo
comea com amnia e gs carbnico, que so incorporados no carbamoil fosfato pela enzima mitocondrial
carbamoil fosfato sintetase I. O carbamoil fosfato, ento, combina com a ornitina, formando a citrulina, que
transportada para fora da mitocndria. No citosol, a argninossuccinato sintetase e a arginossuccinato liase
acrescentam outro nitrognio, proveniente do aspartato, citrulina, produzindo, assim, a arginina. Esta ,
ento, hidrolisada, liberando uria e ornitina. A ornitina retorna mitocndria para comear o ciclo
novamente.
Aps sua sntese, a uria carreada na circulao do fgado para o rim, para ser excretada na urina
(Figura 5.4)

72
DIETA -Cetoglutarato NAD(P)H + H
-Aminocidos
PROTENA CORPORAL

Glutamato
Aminotransferase desidrogenase

METABOLISMO -Cetocidos Glutamato


NAD(P)

ADP + Pi ATP Glutamato


Purinas, pirimidinas

Glutamina
sintetase

Nitrognio amida
doado nas reaes GLUTAMINA NH3 Compostos
nitrogenados
biossintticas

na
Glutaminase

ria
b a ct e e
s
Urea
H2O Glutamato
Ciclo
da
uria

URIA URINA

Figura 5.4 - Destino do esqueleto de carbono dos aminocidos.

Dependendo do estado metablico do corpo, o esqueleto carbnico, proveniente da metabolizao


dos aminocidos, pode ser diretamente oxidado a CO2 e H2O, com a produo de ATP, ou pode ser
primeiramente convertido em glicose ou cidos graxos para uso posterior ou armazenamento, quando um
excesso de calorias ingerido. O fator importante que, desde que o grupamento amino seja removido, os
compostos de carbono resultantes entram em um pool comum de intermedirios metablicos, manejados
posteriormente como produtos de catabolismo de glicdios ou lipdios.
So chamados de glicognicos aqueles aminocidos que podem contribuir para a sntese de glicose,
por causa da natureza dos compostos de carbono que eles tm (piruvato ou intermedirios do ciclo de Krebs
que podem ser convertidos em glicose). So eles: alanina, arginina, aspartato, cistina, glutamato, glicina,
histidina, hidroxiprolina, metionina, prolina, serina, treonina e valina.
Cetognicos so os aminocidos cujo catabolismo leva a acetil-CoA e ou, a acetoacetil-CoA, que so
os precursores dos corpos cetnicos e no podem fornecer glicdios para a sntese de glicose, como o caso
da leucina.
A diviso entre os aminocidos glicognicos e cetognicos no to rgida, pois alguns aminocidos
(isoleucina, lisina, fenilalanina, tirosina e triptofano) so tanto cetognicos quanto glicognicos (Figura 5.5)

73
Glicognio

CARBOIDRATOS Glicose-1-fosfato
LIPDIOS

Glicose Glicose-6-fosfato
Glicerol Acetoacetato CoA

VIA
ANAERBICA cido acetoactico

AMINOCIDOS GLICOGNICOS:
Glicina Alanina AMINOCIDOS CETOGNICOS:
Cistina Serina Fenilalanina
Cistena cido pirvico
Triptofano Tirosina
Metionina Leucina
Isoleucina
cido ltico Acetil-CoA Lisina

cido cido
cido asprtico
oxalactico CICLO ctrico
DE
KREBS
Succinil
CoA cido
2-cetoglutrico AMINOCIDOS GLICOGNICOS
Prolina
AMINOCIDOS GLICOGNICOS Lisina
Valina cido glutmico Arginina
Treonina Histidina
Hidroxiprolina

Figura 5.5 - Diviso entre os aminocidos glicognicos e cetognicos.

Como exposto anteriormente, os aminocidos de cadeia ramificada, leucina, isoleucina e valina, so


degradados tanto em tecidos perifricos quanto no corao, rim, tecido adiposo e, principalmente, no msculo
esqueltico. Esses aminocidos exercem importantes funes nos indivduos que praticam atividade fsica.
No metabolismo da valina e isoleucina, a cadeia carbnica liberada vai para o ciclo de Krebs, o que
provoca diminuio no consumo de carboidratos, poupando o glicognio muscular. J a parte nitrogenada
desses aminocidos utilizada para a sntese de glutamina. A leucina alm de fornecer sua poro nitrogenada
para a formao de glutamina, serve tambm como fonte de acetil coenzima A (AcetilCoA), forma pela qual a
maioria das molculas entra no ciclo de Krebs (Figura 5.6).

74
PIRUVATO AGL

LEUCINA

Malato Oxalocetato
Acetil-CoA

Citrato
Fumarato

VALINA Amnia NH2


Isocitrato
Sucinato

2-oxiglutarato
Sucinil-CoA 2-oxi-3 Glutamato
metilbutarato

GLUTAMINA
NH2

ISOLEUCINA
Figura 5.6 Destino dos aminocidos de cadeia ramificada.

A fraca ligao nitrogenada dos aminocidos de cadeia ramificada une-se ao piruvato, formando
outro aminocido, a alanina. Esta tambm desempenha papel especial no transporte da amnia do msculo
para o fgado, numa forma no-txica, atravs do ciclo da glicose-alanina.
Nesse ciclo, a amnia convertida no grupo amino do glutamato pela ao da glutamato
desidrogenase:
NH4 + alfa-cetoglutarato + NADPH + H+ glutamato + NADP+ + H2O

O glutamato formado transfere o seu grupo alfa-amino ao piruvato pela ao da alanina-


transaminase.

Glutamato + piruvato alfa-cetoglutarato + alanina

A alanina, um aminocido neutro, sem carga lquida em pH prximo de 7, cai no sangue e


transportada para o fgado, onde ela transfere o seu grupo amino ao alfa-cetoglutarato pela ao da alanina
transaminase, produzindo glutamato. Este, por sua vez, sofre a ao da glutamato desidrogenase, produzindo
alfa-cetoglutarato e amnia. A amnia formada removida do sangue atravs de sua converso em uria no
ciclo da uria, e o piruvato volta a formar glicose pela gliconeognese.

5.7. Regulao Hormonal da Sntese Protica

5.7.1. Hormnio do Crescimento (GH)


O hormnio do crescimento aumenta a velocidade da sntese protica, determinando aumento da
quantidade de protenas teciduais. Embora o mecanismo de ao no seja completamente conhecido, acredita-
se que o GH estimula o transporte de aminocidos atravs das membranas celulares e ou, acelera o processo
de transcrio e traduo de DNA e RNA para a sntese protica. Parte dessa ao poderia tambm resultar do

75
efeito do GH sobre o metabolismo de gorduras, o que aumenta a liberao de seus depsitos, tornando-a
disponvel para a produo de energia. Isso reduz a oxidao de aminocidos, que se tornam disponveis aos
tecidos para a sntese protica.

5.7.2. Insulina
A insulina acelera o transporte de aminocidos para as clulas, o que poderia representar um
estmulo para a sntese protica. Alm disso, aumenta a disponibilidade de glicose para as clulas, de modo
que o uso de aminocidos para a produo de energia diminui.

5.7.3. Glicocorticides
Os glicocorticides secretados pelo crtex supra-renal diminuem a quantidade de protenas na
maioria dos tecidos, enquanto elevam a concentrao de aminocidos no plasma. Os efeitos dos
glicocorticides sobre o metabolismo protico so especialmente importantes, por promoverem a cetognese a
partir dos aminocidos disponveis no plasma.

5.7.4. Testosterona e Estrognio


A testosterona aumenta a deposio de protenas em todos os tecidos do organismo, incluindo as
protenas contrteis do msculo. O estrognio tambm determina a ligeira deposio de protenas, porm seu
efeito muito menor do que o da testosterona.

5.7.5. Tiroxina
A tiroxina, hormnio da tireide, aumenta a velocidade do metabolismo de todas as clulas e,
portanto, afeta indiretamente o metabolismo protico, se houver quantidade insuficiente de carboidratos e
lipdios para a produo de energia. No entanto, na presena de quantidades adequadas de carboidratos e de
lipdios e da disponibilidade em excesso de aminocidos nos lquidos extracelulares, a tiroxina pode aumentar
a velocidade da sntese protica.

5.8. Funo metablica dos aminocidos


Os aminocidos tambm so precursores de vrios compostos no-proticos importantes para o
organismo, como mostrado no Quadro 5.2.

Quadro 5.2 Aminocidos precursores de compostos no-proticos


Aminocido Precursor Produto Final
Triptofano Serotonina
Triptofano cido nicotnico
Tirosina Catecolaminas
Tirosina Hormnios da tireide
Tirosina Melanina
Lisina Carnitina
Cistena Taurina
Arginina xido ntrico
Glicina Heme
Glicina, arginina, metionina Creatina
Metionina, glicina, serina Grupos metil do metabolismo
Glicina, taurina cidos biliares
Glutamato, cistena, glicina Glutationa

Glutamato, aspartato, glicina Bases nucleotdicas


Fonte: IOM, 2002.

76
5.9. Necessidades Dirias de Aminocidos e Protenas
O fornecimento de um aporte diettico adequado de protena essencial para manter a integridade da
clula e suas funes. Apesar de as recomendaes serem feitas na forma de protena, na verdade a
necessidade biolgica para aminocidos.
A recomendao da ingesto de protenas so calculadas com base na manuteno da sade de
indivduos saudveis. E essa recomendao deve satisfazer as necessidades fisiolgicas de todos os indivduos
de determinada faixa etria, gnero e estado metablico.
No Quadro 3 so apresentadas as recomendaes de protenas de acordo com o sexo e a faixa etria.
Foi estimado pela National Academy of Sciences (2002) o Acceptable Macronutrients of
Distribution Ranges AMDR, ou distribuio do total de energia para adultos, oriunda dos macronutrientes,
sendo gordura de 20-35%; carboidrato de 45-65% e protenas de 10-35%, de acordo com a necessidade de
assegurar uma dieta nutricionalmente adequada. No h evidncia de que a AMDR para protena deva ser
abaixo dos valores preconizados pela RDA (cerca de 10% do total de energia) para adultos. Para
complementar as AMDRs de gordura e carboidrato, a ingesto de protenas pode ser ento aumentada (10-
35%) (Quadro 5.3).

Quadro 5.3 DRI para protenas, de acordo com IOM, 2002


Estgio da Vida Idade RDA/AI g/dia EAR g/kg/dia AMDR %
Infante 0-6 meses 9,1 ND
7-12 meses 13,5 1,1 ND
Criana 1-3 anos 13 0,88 5-20
4-8 anos 19 0,76 10-30
Homens 9-13 anos 34 0,76 10-30
14-18 anos 52 0,73 10-30
19-30 anos 56 0,66 10-35
31-50 anos 56 0,66 10-35
51-70 anos 56 0,66 10-35
> 70 anos 56 0,66 10-35
Mulheres 9-13 anos 34 0,76 10-30
14-18 anos 46 0,71 10-30
19-30 anos 46 0,66 10-35
31-50 anos 46 0,66 10-35
51-70 anos 46 0,66 10-35
> 70 anos 46 0,66 10-35
Gestante 18 anos 71 0,88 10-35
19-30 anos 71 0,88 10-35
31-50 anos 71 0,88 10-35
Lactao 18 anos 71 1,05 10-35
19-30 anos 71 1,05 10-35
31-50 anos 71 1,05 10-35

Para crianas de 0-6 meses, a recomendao da ingesto de protenas baseada na Ingesto


Adequada (AI - Adequate Intake), que reflete a observao da mdia de ingesto da criana alimentada
principalmente com leite humano. Apesar de a AI ser baseada em dados de estudos em que o volume do leite
humano foi medido e de se ter utilizado a mdia da concentrao do leite humano, o contedo de protena
varia de acordo com os estgios da lactao. No volume de ingesto de 0,78 L/dia e uma mdia do contedo
de protena do leite humano de 11,7 g/dia, multiplicando esses valores, tem-se uma AI =9,1 g/dia ou 1,52
g/kg/dia, com base na referncia de peso de 6 kg para 2-6 meses de vida.
Durante os segundos seis meses de vida da criana, alimentos slidos tornam-se mais importantes na
dieta e a adio de boa quantidade de protena. Para crianas de 7-12 meses, a AI de 7,3 g/dia para crianas
alimentadas com leite humano e 7,1 g/dia para crianas com alimento, com um contedo de protena de 12,1
g/L (12,1 g/L x 0,6 L/dia). A mdia de volume de leite consumido passa a ser em torno de 0,6 L/dia e a
protena mdia total, 14,4 g/dia ou 1,6 g/kg/dia, baseando-se na referncia de peso de 9 kg de 7-12 meses de
idade.

77
Para garantir que a quantidade recomendada de ingesto de protenas ir satisfazer as necessidades
preconizadas, necessrio ingerir quantidade adequada de calorias provenientes de carboidratos e lipdios.
Atendendo s necessidades energticas do indivduo, impede-se que as protenas ingeridas sirvam como
substrato energtico para o organismo e sejam desviadas de suas funes metablicas.
Na alimentao, so fundamentais considerar a quantidade e qualidade da protena ingerida.
A qualidade nutricional de uma protena determinada pela qualidade e quantidade dos seus
aminocidos constituintes, que estaro disponveis para o organismo aps a absoro.
Uma protena considerada de alto valor biolgico quando contm todos os aminocidos essenciais
em propores adequadas. Os alimentos de origem animal possuem protenas de alto valor biolgico.
Para se estabelecerem as necessidades proticas, so utilizadas protenas de alto valor biolgico.
Quando se trata de uma alimentao mista, como a do nosso pas, correes devem ser feitas em funo da
qualidade da protena ingerida.
O valor nutricional de uma protena pode ser estimado atravs da comparao do seu perfil de
aminocidos, obtido por anlise qumica, com um padro de referncia. Esse padro atualmente recomendado
pelo FAO para os diferentes estados fisiolgicos do indivduo o requerimento de aminocidos essenciais
para pr-escolares, exceto para lactentes cujo padro deve ser o leite humano. Entretanto, maiores
informaes so necessrias para se estabelecer em, com mais preciso, as necessidades de aminocidos
indispensveis para as diferentes faixas etrias (Quadro 5.4).

Quadro 5.4 Escore-padro de aminocidos para lactentes, pr-escolares e adultos, baseados nos
requerimentos estimados para protenas e aminocidos indispensveis.
Aminocidos Infantes Pr-escolar (1-3 anos)b Adultosb
mg/g prot. mg/g prot mg/g N mg/g prot mg/g N
Histidina 23 18 114 17 104
Isoleucina 57 25 156 23 142
Leucina 101 55 341 52 322
Lisina 69 51 320 47 294
Metionina + cistena 38 25 156 23 142
Fenilalanina + tirosina 87 47 291 41 256
Treonina 47 27 170 24 152
Triptofano 18 8 43 6 38
Valina 56 32 299 29 180
Padro baseado na composio do leite humano.
b
Padro derivado de EAR de aa.: EAR para protena (para criana de 1-3 anos EAR prot.= 0,88 g/kg/dia; para
adultos EAR de prot. 0 0,66 g/kg/dia).
Fonte: IOM, 2002.

5.10. Fonte Alimentar


Os alimentos de origem animal como carnes, ovos, leite e derivados so as melhores fontes de
protenas da dieta, pois contm todos os aminocidos indispensveis e em quantidades balanceadas. J as
protenas dos vegetais so deficientes em um ou mais aminocidos indispensveis, por isso no devem ser a
nica fonte de protena da dieta. As leguminosas (soja, feijo, amendoim, vagem etc.), apesar de deficientes
em metionina, possuem o valor biolgico que mais se aproxima daquele dos alimentos de origem animal.

5.11. Fatores antinutricionais


Alm das toxinas produzidas por microrganismos, que podem contaminar os alimentos, algumas
protenas de ocorrncia natural nos alimentos apresentam propriedades txicas e antinutricionais. A distino
entre protenas txicas e de ao antinutricional que as primeiras agem de forma aguda, produzindo leses
nos rgos e tecidos e alteraes fisiolgicas que resultam em enfermidades, podendo, inclusive, causar a
morte de pessoas ou animais que as ingerem, enquanto os fatores antinutricionais oriundos de protenas
seriam aqueles que, embora no causem alteraes teciduais e fisiolgicas evidentes, atuam no sentido de
diminuir a eficincia do metabolismo, interferindo na absoro e biodisponibilidade dos nutrientes.
Pensando em um conceito mais amplo, os fatores antinutricionais podem ser definidos como
compostos que tm a habilidade de reagir ou interagir com protenas, vitaminas ou carboidratos, diminuindo a
disponibilidade desses nutrientes para absoro e conseqente utilizao pelo organismo humano. Dessa

78
forma, podem-se relacionar no s as protenas que atuariam como antinutricionais, mas todos os compostos
que se encaixam na definio anterior, a saber:
- Inibidores de proteases.
- cido ftico.
- cido oxlico.
- Polifenis.
- Fibras alimentares.
- Inibidores de -amilase.
- Lectinas.

5.12. Avaliao da qualidade nutricional de protenas


Os mtodos para medir a qualidade de uma protena avaliam a eficcia da protena em fornecer
aminocidos em qualidade e quantidades necessrias para o crescimento do organismo e manuteno.
Para avaliar uma protena, podem ser utilizados mtodos qumicos, biolgicos, microbiolgicos e
clnicos.

5.12.1. Mtodos Qumicos


a) Escore Qumico
Este mtodo pode tambm ser denominado cmputo ou ndice qumico. Baseia-se na anlise dos
aminocidos indispensveis de uma protena em estudo ou mistura de protenas em comparao com o perfil
desses aminocidos de uma protena-padro.

Escore qumico = mg do aminocido/g da protena-teste________


mg do mesmo aminocido/g da protena-padro
Para avaliar a qualidade de uma protena, compara-se sua composio aminoacdica com a
composio aminoacdica do padro E observa-se qual dos aminocidos da protena em estudo est mais
deficiente com relao ao mesmo item no padro e se expressa o resultado em porcentual. O aminocido que
est em falta ou em menor proporo em determinado alimento chamado de aminocido limitante, pois
limitar a utilizao da protena, e o seu porcentual o escore qumico.
importante que se identifique o padro no clculo do escore qumico. A FAO (1991) preconiza que
o padro para avaliar a qualidade protica deve ser a recomendao de aminocidos a pr-escolares da
FAO/OMS/UNU (1985) de todas as idades, exceto as crianas at 1 ano de idade, para as quais deve ser usada
a composio aminoacdica do leite humano.
Esse mtodo de determinao da qualidade protica apresenta vantagens por ser simples seu clculo
e de baixo custo, principalmente se os dados forem fornecidos em tabelas pela literatura, que permite
identificao de fatores limitantes com facilidade e previso do valor nutricional ou efeito complementar de
misturas.
Contudo, apresenta limitaes por no garantir que os aminocidos estaro disponveis
biologicamente, pois no retrata os processos de digesto, absoro e metabolismo do organismo, portanto
no garante que os aminocidos estaro disponveis biologicamente. Alm disso, no considera a
disgestibilidade da protena e o desequilbrio de aminocidos ou presena de fatores txicos que s
detectada em testes com animais. Para compensar as limitaes deste mtodo deve-se associ-lo aos mtodos
que analisam o crescimento de animais submetidos a dieta com determinados alimentos como fonte protica.

b) Digestibilidade in vitro
estimada usando-se enzimas proteolticas que agem normalmente na digesto, procurando imitar as
condies de acidez do estmago e de intestino onde a digesto das protenas ocorre. Usa-se pepsina em pH
de 1 a 1,5 por duas horas e em seguida pancreatina em pH 8 por 24 horas, um de cada vez temperatura de
37 C.
A digestibilidade indica a poro de protena que pode ser hidrolisada pelas enzimas digestivas at
aminocidos, ou seja, aqueles disponveis biologicamente, desde que no haja interferncia na absoro.

D(%) = Nitrognio hidrolisado_____ X 100


Nitrognio total da amostra

79
c) Estimativa da disponibilidade de aminocidos em alimentos
Para correo da limitao do escore qumico em determinar qual ou quais aminocidos essenciais
no est presente na protena em estudo, necessrio conhecer a disponibilidade desses aminocidos.

c.1) Lisina disponvel


O mtodo baseia-se na reao do grupo amino da lisina com o 2,4dinitrofluorobenzeno (DNFB) ou
com o 2,4,6-trinitribenzeno (TNSB). A reao se processa em meio alcalino, resultando em um derivado de
colorao amarela que pode ser medido colorimetricamente.
A reao s ocorre com o grupo amnico da lisina livre ou intacto. Portanto, reaes tipo Maillard
resulta em bloqueio da reao com DNFB ou TNBS e, provavelmente, a lisina presente no alimento est
diminuda na sua disponibilidade no organismo.

c.2) Metionina disponvel


O mtodo baseia-se na reao do brometo de cianognio com tomo de enxofre da metionina,
provocando rompimento da ligao peptdica que contm o grupo carboxlico da metionina, como produto
final da reao metil-tiocianato (CH3SCN) livre e lactona de homosserina como derivado da metionina. O
CH3SCN formado proporcional ao contedo de metionina na protena, pois somente a metinina no oxidada
e potencialmente disponvel reagir com o BrCN. O CH3SCN pode ser quantificado diretamente por
cromatografia lquida-gasosa.
Outro procedimento tambm usado para estimar a metionina potencialmente disponvel o da
hidrlise enzimtica (pepsina + pancreatina), seguida de dosagem colorimtrica da metionina liberada.

5.12.2. Mtodos Biolgicos


Os mtodos biolgicos utilizados para avaliao do valor nutritivo de uma protena baseiam-se na
resposta de um organismo ingesto desta. A utilizao biolgica de uma protena normalmente obtida por
experimentos com animais, realizados por diversas tcnicas. Esses mtodos tm valor prtico, entretanto,
como em outros casos, apresenta suas limitaes.
Os resultados podem apresentar variabilidade e, portanto, necessrio incluir um grupo-padro ou
controle, em que os animais recebem uma dieta com protena de boa qualidade, geralmente casena ou
ovoalbumina. Os resultados so obtidos comparando os de um grupo com o de outro.
Os parmetros empregados para obter o valor biolgico so, usualmente, o crescimento ou alteraes
de nitrognio na carcaa do animal

a) Mtodos baseados no crescimento


a.1) Protein Efficiency Ratio-PER ou Coeficiente de Eficincia Protica
um mtodo bastante simples, que relaciona o ganho de peso do animal com a protena-teste
ingerida.

PER = Ganho de peso (g)__


Protena ingerida (g)

O valor de PER varia de 0 a 4. Se o valor do PER da casena, por exemplo, for de 2,5, pode-se dizer
que para cada grama de protena ingerida tm-se 2,5 g de ganho de peso. Os valores de PER 2 so
considerados bons, uma vez que correspondem ao valor mdio ou acima da mdia, na escala de 0 a 4.
Para a realizao do mtodo, os animais so divididos em seis grupos, alimentados com uma dieta
contendo uma concentrao de 9 a 10% de protena, sendo que um grupo, o controle, mantido com dieta de
casena como fonte protica.
A maior parte de erro no mtodo est no uso do ganho de peso como nico critrio do valor da
protena, no se fazendo referncia manuteno. Nem sempre o peso reflexo fiel da protena incorporada
ao organismo. Algumas dietas podem provocar reteno de gua e, ou, depsito exagerados de lipdio.
Algumas protenas, no entanto, administradas ao nvel de 9 a 10% podem no produzir crescimento e
at mesmo provocar decrscimo de peso, no alcanando nenhum resultado no final do experimento.
Apesar disso, o mtodo apresenta tambm vantagens, como a de ser de fcil aplicao, permitir a
localizao das protenas em uma escala segundo a sua qualidade e possibilitar a realizao de clculos
estatsticos aplicveis a qualquer organismo em crescimento, inclusive criana.

80
a.2) Net Protein Ratio (NPR) ou Razo Protica Lquida
Trata-se de uma modificao do PER, em que o NPR leva em considerao a qualidade da protena
para fins de crescimento e manuteno. Verifica-se a capacidade da protena de manter o peso do animal e
promover crescimento, portanto o NPR representa a soma do ganho de peso dos animais dos grupos
experimentais, com a perda de peso do grupo com dieta livre de nitrognio, aprotica.

NPR = g de ganho de peso do grupo-teste + g de perda de peso do grupo aprotico


g de protena ingerida pelo grupo-teste

Quanto pior a qualidade da protena, maior a diferena entre NPR e PER, pois ela no vai promover
crescimento, mas ser utilizada na sua manuteno.

a.3) Net Protein Utilization (NPU) ou Utilizao Protica Lquida


a.3.1) Mtodo da carcaa Durante 10 dias, os animais so tratados com uma dieta contendo 10%
de protena, sendo, ento, sacrificados, secados em estufa e desengordurados. Dosa-se o nitrognio
na carcaa, sendo o resultado dado pela equao:

NPU = N da carcaa do grupo-teste - N da carcaa do grupo aprotico


N ingerido pelo grupo-teste
a.3.2) Mtodo da gua corporal Trata-se do mtodo de NPU simplificado. Neste mtodo, a partir
da demonstrao de que h correlao positiva bastante alta entre nitrognio corporal e gua
corporal, estabeleceu-se a seguinte relao:

Y= 2,92 + 0,02X

Em que: y = N corporal (g) X 100


H20 corporal (g)
X = idade dos ratos em dias, no incio do experimento.

b) Mtodos Baseados no Balano de Nitrognio


b.1) Balano de Nitrognio
O balano de nitrognio mede a ingesto e a excreo de nitrognio. O clculo do balano
nitrogenado (BN) a diferena entre o nitrognio ingerido (I) e a soma do excretado nas fezes e na urina.

BN = I E, sendo E= (U + F)
Para quantificao exata do balano nitrogenado, necessrio considerar que o organismo, mesmo
no recebendo protenas na dieta, est constantemente eliminando nitrognio pela urina e pelas fezes
provenientes da descamao das clulas do intestino, de secrees do trato gastrintestinal, da flora intestinal e
do metabolismo dos produtos nitrogenados no-proticos. Por isso, para o clculo do verdadeiro valor do
balao nitrogenado necessrio incluir no experimento um grupo de animais alimentados com dieta aprotica.
Assim, o balano nitrogenado obtido com a seguinte equao:
BN= I (U- Uk) - (F Fk)
Em que:
I = N ingerido;
F = N fecal do grupo teste;
Fk = N fecal do grupo aprotico;
U = N urinrio do grupo teste; e
Uk = N urinrio do grupo aprotico.

Um balano nitrogenado (+) significa crescimento ou incorporao de nitrognio no organismo. Um


balano (-) o resultado de perda de protena endgena, indicando que a protena ingerida no foi suficiente
para satisfazer as necessidades orgnicas. Quando for igual a zero, o organismo estar no estado de equilbrio
dinmico.

81
b.2) Digestibilidade in vivo
A digestibilidade um mtodo que mede a proporo de nitrognio absorvido aps a digesto.
calculada medindo-se o nitrognio ingerido e o nitrognio eliminado nas fezes, o que a digestibilidade
aparente, pois no se considera que nas fezes sempre se est eliminando quantidade de nitrognio no
proveniente da dieta.

D ap= Ni Nf X 100
Ni
Para determinar a digestibilidade verdadeira, seria necessrio submeter os animais a uma dieta
aprotica, bem como medir o nitrognio fecal que seria, ento, utilizado para corrigir o nitrognio das fezes.
Assim, a frmulas da digestibilidade verdadeira :

DV = I (F- Fk) X 100


I
A maioria das protenas de origem animal tem boa digestibilidade, o que implica absoro eficaz dos
aminocidos, e os resultados que se obtm com as de origem vegetal so geralmente inferiores.

b.3) Net Protein Utilization (NPU)


Alm de ser determinado pelo mtodo da carcaa, o NPU pode ser determinado pelo mtodo do
balano, representando o nitrognio ingerido, que retido no organismo.
NPU = I (U- Uk) - (F Fk) X 100
I
Em que:
I = N ingerido;
F = N fecal do grupo teste;
Fk = N fecal do grupo aprotico;
U = N urinrio do grupo teste; e
Uk = N urinrio do grupo aprotico.

c) Net Dietary Protein Calories Per Cent (NDPCal %) ou Porcentagem de Calorias Lquidas da
Protena Diettica
Este mtodo til na avaliao das dietas humanas, em que a relao da protena para calorias totais
pode variar de modo acentuado. Portanto, a avaliao biolgica de um cardpio por ser feita atravs da
verificao do seu teor de protenas (quantidade e qualidade), ou seja:

NDPCal%= NPCal X 100


VCt

Em que:
NPUop obtido atravs dos seguintes fatores de correo:
Cereais= 0,5;
Leguminosas= 0,6; e
Protena animal=0,7.

De acordo com os valores calculados de protenas da mais alta qualidade (ovo integral ou leite
humano), uma dieta que fornea menos de 5% das calorias na forma de protena disponvel no preencher as
necessidades do ser humano adulto. Com relao s crianas, pelo menos 8% requerido (FAO, 1995).
Assim, o valor de NDPCal% de uma dieta deve ser de no mnimo 6% e o mximo, 15%. Valores
acima de 15% so considerados anti-econmicos, pois as protenas podero ser utilizadas como fonte de
energia. Se o NDPCal for inferior a 5%, ele permitir a manuteno do peso corporal, mas poder provocar
desnutrio.

82
d) Protein Digestibility Corrected Amino Acid Score (PDCAAS) ou Escore Qumico Corrigido
pela Digestibilidade
Mtodo para avaliao da qualidade protica baseado na correo do valor do escore qumico de um
aminocido pela digestibilidade verdadeira da protena.

PDCCAS (%) = [mg de aminocido em 1 g da protena-teste]_______ X [DV (%)]


mg do mesmo aminocido em 1 g da protena-padro

5.13. Referncias

INSTITUTE OF MEDICINE. Protein and amino acids. In: - Dietary reference intakes Energy,
carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and amino acid. Part 2, Chapter 10. Washington, D.C.,
United States of America: The National Academy Press, 2002. p 10; 1-10; 143.

CHAMPE, C. P.; HARVEY, R. A. Bioqumica ilustrada. 2. ed, Porto Alegre: editora arte mdicas, 1996, 446
p.

DUTRA DE OLIVEIRA, J.E. Cincias nutricionais. So Paulo: SARVIER, 1998. 403 p.

LENHGINER, A.L. Princpios de bioqumica, 2. ed. So Paulo: SARVIER, 1995. 839 p.

SGARBIERI, V.C. Protenas em alimentos proticos Propriedades, degradaes, modificaes. So


Paulo: Livraria Varela 1996. 517 p.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE ALIMENTAO E NUTRIO. Protenas. In: Cadernos de nutrio; v. 2,


p. 51- 61, 1990.

VIEIRA, E.C. Protenas. In: TEIXEIRA NETO, F. Nutrio clnica. Rio de Janeiro: Editora Guanabara
Koogan S.A. Cap. 3, 2003. p.20-24.

WAITZBERG, D. L. Nutrio oral, enteral e parenteral na prtica clnica. 3. ed. So Paulo: Ed. Atheneu.
2000. 1858 p.

WAITZBERG, D. L. Dieta, nutrio e cncer. So Paulo: Ed. Atheneu. 2004. 783 p.

83
Captulo 6 LIPDIOS
Cphora Maria Sabarense
Maria do Carmo Gouveia Peluzio
6.1. Introduo
Os lipdios definem um conjunto de substncias qumicas que, ao contrrio das outras classes de
compostos orgnicos, no so caracterizadas por algum grupo funcional comum, e sim pela sua alta solubilidade
em solventes orgnicos e pela baixa solubilidade em gua. Fazem parte de um grupo conhecido como
biomolculas e se encontram distribudos em todos os tecidos, principalmente nas membranas celulares e nas
clulas de gordura.
Geralmente, os lipdios ocorrem combinados, seja co-valentemente, seja atravs de ligaes fracas, para
produzir molculas compostas, como os glicolipdios, que contm tanto carboidratos quanto grupos lipdicos, e
lipoprotenas, que contm tanto lipdios quanto protenas. Em tais biomolculas, as distintas propriedades
qumicas e fsicas de seus componentes esto combinadas para preencher funes biolgicas especializadas.
Ao contrrio das demais biomolculas, os lipdios no so polmeros, isto , no so repeties de uma
unidade bsica. Embora possam apresentar estrutura qumica relativamente simples, as funes dos lipdios so
complexas e diversas, atuando em muitas etapas do metabolismo e na definio das estruturas celulares.
Desempenham vrias funes biolgicas importantes no organismo, entre elas:
Reserva de energia (1g de gordura = 9 kcal) em animais e sementes oleaginosas, sendo a principal forma
de armazenamento como triacilgliceris ou triglicerdeos (TG).
Componente estrutural das membranas biolgicas.
So molculas que podem funcionar como combustvel alternativo glicose, pois so os compostos
bioqumicos mais energticos.
Oferecem isolamento trmico, eltrico e mecnico para proteo de clulas e rgos e para todo o
organismo (panculo adiposo sob a pele), contribuindo tambm, para a forma esttica caracterstica.
Do origem a molculas mensageiras, como hormnios, prostaglandinas, etc.
As gorduras (triacilgliceris), devido sua funo de reserva de energia, so acumuladas principalmente
no tecido adiposo. A reserva sob a forma de gordura muito favorvel clula, uma vez que so
insolveis na gua e, portanto, no contribuem para a presso osmtica dentro da clula.
6.2. Utilizao dos Lipdios da Dieta
Com base na ingesto de dietas ricas em gorduras foi estimado pela National Academy of Sciences (2002)
as Acceptable Macronutrientes of Distribution Ranges AMDR, com a distribuio de gordura total variando de
20-35% da energia diria para adultos. Alm disso, estima-se que a AMDR da ingesto de gordura total seja de
aproximadamente 30 a 40% para crianas com idade entre 1 a 3 anos e 25 a 35% de energia para indivduos de 4 a
18 anos (Institute of Medicine, 2006).
Os TG constituem aproximadamente 95% da gordura presente nos alimentos e so a principal forma de
estocagem de energia do organismo para utilizao nos perodos ps-prandial ou jejum prolongado.
Tradicionalmente, a principal preocupao com relao aos lipdios da dieta era sua digestibilidade.
Atualmente, existe um interesse crescente na qualidade dos lipdios consumidos, durante a infncia, como
principal determinante do crescimento e desenvolvimento visual e neurolgico, e da sade em longo prazo. Dessa
forma, a seleo dos lipdios da dieta no incio da vida considerada de grande importncia.
Uma questo presente na elaborao e, ou, recomendao de dietas , principalmente, qual deve ser a
proporo entre os cidos graxos saturados, monoinsaturados e poliinsaturados dentro do consumo total de
gorduras, considerando-se tanto indivduos saudveis quanto doentes.

6.3. Triacilgliceris TG
O glicerol um composto simples que contm trs grupamentos hidroxila. Quando os trs grupamentos
lcool formarem ligaes ster com cidos graxos, o composto resultante ser um triacilglicerol. So geralmente
chamados de lipdios saponificveis, porque a reao destes com uma soluo quente de hidrxido de sdio
produzem o sal sdico do cido carboxlico correspondente, isto , o sabo.
A Figura 6.1 ilustra a estrutura de um triacilglicerol, com o glicerol mostrado para comparao. Observa-
se, nessa figura, que os trs grupos ster esto na parte polar da molcula, ao passo que as caudas dos cidos
graxos so apolares. comum que trs cidos graxos diferentes estejam esterificados a grupamentos lcool da
molcula de glicerol. Os triacilgliceris no so componentes de membranas (como outros tipos de lipdios),
sendo acumulados em tecido adiposo (principalmente em clulas adiposas) e constituindo um meio de

84
armazenamento de cidos graxos, particularmente em animais, e armazenados sob a pele servem tambm como
isolantes contra temperaturas externas muito baixas.
Como combustveis estocados, os triacilgliceris tm duas vantagens significativas sobre os
polissacardeos, como o glicognio e o amido. Os tomos de carbono dos cidos graxos so quimicamente mais
reduzidos que aqueles dos aucares e, portanto, a oxidao dos triacilgliceris libera, grama por grama, uma
quantidade de energia duas vezes maior que a liberada pelos carboidratos. Ainda, como os triacilgliceris so
hidrofbicos, a molcula que transporta a gordura no tem que carregar o peso extra da gua de hidratao que
est sempre associada aos polissacardeos armazenados.
O contedo elevado de triacilgliceris sangneos pode ser um fator de risco para doena aterosclertica.
Esse aumento ocorre como resultado de distrbios no metabolismo de carboidrato ou excesso de gordura na dieta.

Figura 6.1 Estrutura do glicerol, cidos graxos (R) e triacilglicerol (TG). Os cidos graxos podem ser iguais
ou diferentes, esterificados aos grupamentos lcool da molcula de glicerol nas posies sn-1,
sn-2 e sn-3.

6.3.1. Digesto dos Triacilgliceris


O estmago possui papel importante na digesto de lipdios: um importante stio para emulsificao das
gorduras, que um pr-requisito para a ao da lipase pancretica. Sua contribuio est relacionada ao
mecnica que a peristalse antral promove sobre as gorduras, produzindo glbulos de gorduras menores. Associado
a isso ter o papel das lipases cidas que podem hidrolisar at 30% dessas gorduras, alm de atuar de forma
sinrgica com a lpase pancretica no duodeno.
A digesto dos lipdios consiste em vrias etapas seqenciais, as quais envolvem eventos fsico-qumicos
e enzimticos. Inicia-se pela ao das lipases presentes na saliva e na secreo gstrica e continua no duodeno com
a ao da lipase pancretica. Uma importante caracterstica das lipases a sua especificidade para substratos
insolveis e emulsificados.
A emulsificao que iniciada no estmago deve ser considerada uma etapa fundamental na digesto de
gorduras, por gerar uma interface leo-gua essencial para a interao entre as lipases (hidrossolveis) e os
lipdios (insolveis).
As propriedades dessa interface modulam a digesto e, conseqentemente, a disponibilidade de lipdios.
As propriedades dos glbulos de gordura que orienta essa interface so o tamanho e a organizao dos
glbulos e a estrutura molecular dos TG constituintes. A emulso mais fina tem uma liplise maior do que a
emulso com glbulos maiores.
A lipase salivar atua principalmente sobre os cidos graxos de cadeia curta e de cadeia mdia presentes,
principalmente da posio sn1 ou sn-3 dos TG, produzindo diacilgliceris ou diglicerdeos (DG) e cidos graxos
livres (AG).
A lipase gstrica atua, sobretudo, sobre os cidos graxos de cadeia mdia tambm na posio sn-1 ou sn-
3.
A emulso de lipdios entra no intestino delgado (duodeno) como pequenas gotculas com
aproximadamente 0,5 mm. A ao da bile e da secreo pancretica proporciona modificaes na forma fsico-
qumica dos lipdios.
A lipase pancretica necessita da interface leo-gua formada entre os sais biliares e os glbulos de
gordura (ao detergente) para atuar na clivagem da molcula de TG nas posies sn-1 e sn-3, produzindo 2-
monoacilglicerol (2-MG) e dois AG livres.

85
A lipase pancretica pura atua de maneira ineficiente na mistura de lipdios e sais biliares, mas, quando
ela est associada com a secreo pancretica, capaz de hidrolisar os TG com extrema eficincia. Isso ocorre em
funo da presena da colipase, que auxilia a atuao das lpases gstrica e pancretica.
A colipase secretada pelo pncreas como pr-colipase. No intestino delgado, ativada pela clivagem de
um pentapeptdeo terminal. Ao ser hidrolisada pela tripsina forma um pentapeptdeo denominado enterostatina.
A pr-colipase gstrica ativada pela pepsina e pelo HCl, formando a colipase gstrica e os peptdeos de
enterostatina imunorreativos.

6.4. cidos Graxos AG


Os cidos graxos so classificados como saturados ou insaturados, dependendo da ausncia ou presena
de ligaes duplas carbono-carbono. Os insaturados, que contm tais ligaes, so facilmente convertidos em
saturados atravs da hidrogenao cataltica.
A presena de insaturao nas cadeias de cido carboxlico dificulta a interao intermolecular, fazendo
que, em geral, essas cadeias se apresentem temperatura ambiente, no estado lquido; j os saturados, com maior
facilidade de empacotamento intermolecular, so slidos.
Os cidos graxos de ocorrncia natural geralmente possuem nmero par de tomos de carbono.

6.4.1. Nomenclatura de cidos Graxos


O nome sistemtico do cido graxo vem do hidrocarboneto correspondente. Existe tambm um nome
descritivo para a maioria dos AG originada em funo da fonte predominante ou do local onde foi primeiramente
identificada. No Quadro 6.1, podem-se identificar a nomenclatura e caractersticas dos cidos graxos de ocorrncia
natural.

Quadro 6.1 Nomenclaturas e caractersticas de alguns dos cidos graxos saturados e insaturados de ocorrncia
natural.
Nmero de
Nome descriti Nome "Geneva" Posies da
tomos de Frmula estrutural
(cido) (cido) duplas liga
carbono
Lurico 12 CH3(CH2)10CO2H Dodecanico
Mirstico 14 CH3(CH2)12CO2H Tetradecanico
Palmtico 16 CH3(CH2)14CO2H Hexadecanico
Esterico 18 CH3(CH2)16CO2H Octadecanico
Araqudico 20 CH3(CH2)18CO2H Eicosanico
Palmitolico 16 CH3(CH2)5CH=CH(CH2)7CO2H Hexadecenico 9
Olico 18 CH3(CH2)7CH=CH(CH2)7CO2H Octadecaenico 9
Linolico 18 CH3(CH2)4CH=CH(CH2)CH=CH(CH2)7CO2H Octadecadienico 9,12
-linolnico 18 CH3(CH2CH=CH)3(CH2)7CO2H Octadecatrienico 9,12,15
Araquidnico 20 CH3(CH2)4(CH=CHCH2)4(CH2)2CO2H Eicosatetraenico 5,8,11,14
Fonte: Campbell (2000).

Os AG so cidos carboxlicos e tm seus carbonos numerados de duas formas: a partir da carboxila a


numerao acompanhada da letra grega Delta [], e a partir do grupamento metil terminal a numerao
acompanhada da letra mega [].
Os carbonos 2, 3 e 4, contados a partir da carboxila, so denominados, respectivamente, , , (Figura
6.2).

86
Figura 6.2 Estrutura do cido graxo saturado, com 12 tomos de carbono. Os asteriscos correspondem,
respectivamente, (*) = , (**) = e (***) = .

As duplas ligaes, quando presentes, podem ser descritas em nmero e posio em ambos os sistemas.
Por exemplo:
O cido linolico possui 18 tomos de carbono e duas duplas ligaes, entre os carbonos 9 e 10, e entre
os carbonos 12 e 13; sua estrutura pode ser descrita como (Figura 6.3):

Figura 6.3 Estrutura do cido linoico, C18:2 9,12 ou 18:2 (9,12) e pertencente famlia mega -6.

6.4.2. cidos Graxos Saturados


Os cidos graxos so formados por uma cadeia linear de tomos de carbono ligada a tomos de
hidrognio, com uma extremidade final cido (COOH) e outra contendo um grupo metil (CH3).
O grupo carboxlico constitui a regio polar e a cadeia carbnica a parte apolar. cidos graxos livres so
pouco encontrados no organismo. Esto mais freqentemente ligados a um lcool, que pode ser o glicerol ou a
esfingosina. Os lipdios resultantes no primeiro caso so os triacilgliceris e os glicerofosfolipdios, no segundo
caso, so os esfingolipdios. Os triacilgliceris, os glicerofosfolipdios e os esfingolipdios, juntamente com o
colesterol, fazem parte das membranas celulares.

6.4.3. cidos Graxos Insaturados


Os cidos graxos monoinsaturados (AGM), que contm apenas uma dupla ligao, possuem a
configurao geomtrica cis ou trans, de acordo com a posio dos tomos de hidrognio. 92% dos cidos graxos
monoinsaturados cis que compem a dieta so formados pelo cido olico (cis 18:1).
As cadeias de cidos graxos podem conter uma ou mais ligaes duplas. Quando as ligaes duplas esto
presentes, so quase sempre na configurao cis, ou seja, os tomos de hidrognio dispem-se do mesmo lado da
dupla ligao (Figura 6.4). Os cidos graxos trans (os tomos de hidrognio esto em lados opostos na dupla
ligao) no ocorrem naturalmente nos vegetais, e somente em pequenas quantidades na gordura de ruminantes.
Porm, os cidos trans so formados em abundncia durante a hidrogenao de leos vegetais lquidos, por
exemplo na produo da margarina tradicional e gordura vegetal parcialmente hidrogenada, estimando-se que
contribuam com at 12% da gordura consumida na alimentao.

87
Figura 6.4 Fonte: Estruturas de cidos graxos com isomeria geomtrica cis e trans.
Fonte: Sabarense e Mancini-Filho, 2003a. Reproduo autorizada.

Os cidos graxos poliinsaturados contribuem com menos energia, em torno de 7%. O guia de
recomendao da Associao Americana do Corao para adultos saudveis recomenda uma dieta que prov uma
quantidade menor que 10% de calorias de AGS at 10% de AGP e 15% de AGM. A recomendao-limite de at
30% de calorias de gorduras da dieta facilita a reduo de AGS e auxilia o controle do peso. No Quadro 6.2,
apresentam-se a composio em lipdios e os alimentos ricos em AGS, AGM e AGP.

Quadro 6.2 Composio em AGS, AGM e AGP de alimentos ricos em lipdios (em 100g de parte comestvel)
Alimentos Calorias Gordura AGS AGM AGP
Total (g) (g) (g)
(g)

leo Vegetal
Azeite de oliva (e.v.) 900 100 14,9 75,5 9,5
leo de Canola 900 100 7,9 62,6 28,4
leo de Girassol 900 100 10,8 25,4 62,6
leo de Milho 900 100 15,2 33,4 50,9
leo de Soja 900 100 15,2 23,3 60,0

Sementes e nozes
Noz crua 620 59 5,6 8,7 44,1
Cco, Bahia, cr 411 42 30 1,5 0,3
Amendoim gro cr 544 44 8,7 17,2 16,2
Manteiga com sal 726 82 49,2 20,4 1,2

Fonte: TACO, 2006

6.4.4. cidos Graxos trans


No processo de hidrogenao, o leo aquecido exposto sob presso ao hidrognio em presena de um
catalisador, em geral o nquel. O resultado da incorporao do hidrognio pelas duplas ligaes dos cidos graxos
uma mudana do estado lquido para o estado semi-slido e uma maior estabilidade oxidativa do produto.

88
Trs modificaes ocorrem na molcula:
a) A dupla ligao pode ser modificada para uma ligao simples.
b) A localizao da dupla pode se movimentar ao longo da molcula do cido graxo.
c) A configurao cis da dupla ligao poder passar para uma configurao trans.
O leo de soja um dos mais empregados para a hidrogenao. Durante esse processo, o contedo de
cido linolico C18:2 9c,12c reduzido e so produzidos os cidos olico C18:1 9c, eladico C18:1 9t e o
esterico C18:0 .

Acido cido trans- cido cido


olico vacnico eladico esterico
C18:1 11t C18:1 9t
0
Figura 6.5 Estruturas dos cidosPF 44 trans-vacnico,
olico, C eladicoPF 51o C com os respectivos pontos de fuso.
e esterico
Fonte: Sabarense e Mancini-Filho, 2003a. Reproduo autorizada.

A modificao nas propriedades fsico-qumicas dos leos permite que estes sejam utilizados como
matria-prima para elaborao de gordura para frituras, margarina e gorduras tcnicas (shortenings). Estas so
fundamentais na produo de biscoitos e bolos, entre outros produtos de panificao, conferindo-lhes maciez.
A concentrao de cidos graxos trans varia com a extenso e o tipo de processamento do leo.
Geralmente, margarinas contm menor concentrao de cidos graxos trans do que as gorduras tcnicas. Um dos
fatores envolvidos nessa variabilidade a escolha dos ingredientes. No Brasil, o teor dos ismeros trans nas
margarinas varia de 12,3 a 38,1%, nos cremes vegetais de 15,9 a 25,1%, nas gorduras tcnicas de 30 a 40% (9) e
nas gorduras vegetais parcialmente hidrogenadas variam de 10 a 50%. Tal variao est relacionada aos leos
empregados no processamento. O leo de soja o mais utilizado no Brasil. Em situao de escassez, tem no leo
de milho ou no de algodo seus principais substitutos. Essa uma das razes que justificam a dificuldade de
padronizao do perfil de cidos graxos trans nas gorduras e nos alimentos que utilizam a gordura hidrogenada
como matria-prima, com conseqncias sobre a rotulagem dos alimentos que os contenham.
Durante o processo de hidrogenao, a isomerizao dos cidos graxos insaturados reduz
proporcionalmente as concentraes de cidos graxos essenciais. No entanto, a mistura de leos hidrogenados e
no-hidrogenados promove aumento no ponto de fuso e uma funcionalidade que contribuem para elevar o nvel
de cidos graxos poliinsaturados e reduzir o teor de cidos graxos trans. Considera-se, portanto, uma alternativa
para a produo de margarinas com menos ismeros trans.
Outro fator que determina a composio em cidos graxos das gorduras so as condies empregadas
durante o processo de hidrogenao. Seletividade o termo utilizado para descrever essas condies. Quando a
seletividade baixa, forma-se um pouco ou quase nenhum cido graxo trans, porque todos esses cidos so
hidrogenados na mesma proporo. Contudo, forma-se um produto rico em cido esterico, isto , muito saturado
e com um ponto de fuso muito elevado. com o produto desse tipo de processamento que se obtm os cremes
vegetais sem cidos graxos trans, encontrados no mercado brasileiro.
Recomenda-se que sejam utilizados os leos vegetais na sua forma natural pela indstria de alimentos,
mas a substituio da gordura hidrogenada empregada na confeco de bolos, biscoitos, massas e outros produtos
pode no alcanar as caractersticas de palatabilidade e de conservao desses alimentos. Provavelmente, outros
avanos tecnolgicos possam superar esse problema, mas os investimentos necessrios so elevados para as
indstrias de alimentos, uma vez que j tm as suas linhas de produo estabelecidas.

89
6.4.4.1 - Metabolismo dos cidos Graxos trans
A digestibilidade das gorduras hidrogenadas pode variar de 79 a 98%, dependendo do ponto de fuso da
gordura. A digesto dos triacilgliceris contendo cido eladico pelas enzimas pancreticas no apresentou
diferenas quando comparada com triacilgliceris esterificados com outros cidos graxos nem para a localizao
nas diferentes posies na molcula do triacilglicerol. Aps a absoro, os ismeros so transportados para vrios
tecidos para deposio ou catabolismo.
Os cidos graxos trans monoinsaturados com 18 tomos na cadeia carbnica so primariamente
incorporados nos fosfolipdios e triacilgliceris do plasma, fgado, rim, corao, tecido adiposo e clulas
sangneas. Alm de serem depositados nesses rgos e tecidos so tambm oxidados, uma vez que, com a
descontinuidade da dieta, somente pequenas quantidades de cidos graxos trans so encontradas, com exceo do
tecido adiposo.

6.4.5. cidos Graxos Conjugados


Os cidos graxos trans so encontrados tambm no leite, carne e gordura de mamferos ruminantes,
resultantes da bioidrogenao de cidos graxos poliinsaturados por bactrias do rmen. O mais comum o cido
trans-vacnico, 18:1 11-t, que em geral se apresenta nas concentraes de 2 a 8%.
Os cidos graxos trans so produzidos no primeiro estmago dos ruminantes como intermedirios da
hidrogenao dos cidos graxos insaturados da dieta, durante a fermentao bacteriana. A primeira etapa dessa
bioidrogenao a isomerizao do cido linolico, principalmente a C18:2 9c, 11t, numa reao anaerbica.
Esses intermedirios so, ento, hidrogenados para formar uma mistura trans-vacnico e cido eladico, sendo o
primeiro o cido graxo monoinsaturado trans predominante nas gorduras dos tecidos e fluido desses animais
utilizados na alimentao humana.
O termo cido Linolico Conjugado (CLA) refere-se a uma mistura de ismeros dienicos do cido
linolico geomtrica e posicionalmente conjugados. produzido naturalmente no rmen dos animais, pela
fermentao de bactrias, Butyrovibrio fibrisolvens, que isomeriza o cido linolico a CLA. Assim, numerosos
ismeros so encontrados em produtos lcteos como leite e queijos, bem como carnes e produtos derivados.
O termo cido linolico conjugado utilizado para designar todos os ismeros geomtricos e de posio
do cido octadecadienico, nos quais as ligaes duplas esto separadas por uma ligao simples carbono-
carbono, produzindo uma estrutura dieno-conjugada (Figura 6.6).
Teoricamente, so oito os possveis ismeros geomtricos de 9, 11- e 10, 12-cido octadecadienico (c9,
c11; c9, t11; t9, c11; t9, t11; c10, c12; c10, t12; t10, c12; t10, t12) que podem formar a isomerizao do cido
linolico. O ismero cis-9,trans-11 a principal forma diettica do CLA. Alm desse ismero, encontram-se as
formas trans-10,cis-12 e trans-9, cis-12 em diversas misturas cruas e alimentos comercialmente disponveis.

Figura 6.6 Estrutura do CLA - C18:2 9c;11t. O realce identifica as duplas ligaes com a isomeria
geomtrica e de posio.

Muita ateno tem-se dispensado a esses ismeros devido ao seu efeito protetor contra o cncer, durante
os estgios de iniciao e promoo da carcinognese, alm das propriedades anti-aterognicas e anti-
inflamatrias. No entanto, os efeitos biolgicos dos CLA no podem ser explicados por um nico mecanismo
bioqumico. Dentre as vrias hipteses, podem-se citar:
a) Efeito direto de um ou mais ismeros CLA na diferenciao celular.

90
b) Efeitos do CLA no metabolismo da vitamina A, que poder tambm influenciar a diferenciao
celular.
c) Efeitos do CLA no metabolismo das prostaglandinas, influenciando todas essas hipteses no
desenvolvimento da carcinognese.
d) efeitos no metabolismo lipdico podem estar diretamente relacionados regulao e atividade
bioqumica de enzimas-chave encontradas no tecido adiposo e msculo esqueltico.

6.4.6. cidos Graxos mega-3 e mega-6


O sistema de nomenclatura "mega" usado para a classificao dos cidos graxos insaturados. O termo
"mega" seguido de um nmero refere-se posio da dupla ligao do cido graxo, comeando a contar como
nmero 1 o carbono do grupamento metil terminal, ou seja, comea-se a contar o carbono oposto ao grupamento
carboxlico. O cido olico, que tem dupla ligao entre o carbono 9 e 10 contando a partir do grupamento
metlico, considerado um cido graxo mega-9 (ou -9); j o cido linolico um mega-6, porque sua primeira
dupla ligao est no carbono 6. O cido -linolnico um mega-3 como todos os seus derivados, o cido
eicosapentaenico (EPA) e o cido docosaexaenico (DHA).
Os cidos graxos mega-3 despertaram o interesse da comunidade cientfica e da populao de um modo
geral, em razo da descoberta da sua ao na reduo dos nveis de triglicerdeos, colesterol e lipoprotenas
plasmticas quando fazem parte da alimentao diria de uma populao, ou quando so oferecidos em dosagens
teraputicas. Suas propriedades so anticoagulantes e antitrombognicas, porm a quantidade necessria para tal
efeito de cerca de 2 g/dia.
O cido -linolnico pode ser encontrado em leos de origem vegetal, no entanto seus derivados, os
cidos graxos EPA e DHA, so encontrados quase que exclusivamente em leo de peixe de guas profundas.
O consumo de gorduras contendo cidos graxos poliinsaturados mega-6 (principalmente cido linolico)
reduz o colesterol plasmtico quando em substituio s gorduras saturadas, que diminuem a incidncia de doena
arterial coronariana. Os cidos graxos mega-6 so encontrados em vrios leos vegetais, incluindo os leos de
aafro, girassol, milho e soja.
Derivados Poliinsaturados de Cadeia Longa
As reaes de sntese dos cidos graxos poliinsaturados de cadeia longa em geral ocorrem nos
microssomos hepticos.
Os cidos graxos so convertidos em derivados poliinsaturados de cadeia longa, por sucessivas etapas
que envolvem alongamento e dessaturao da cadeia carbnica. As primeiras etapas so seqencialmente
organizadas, em dessaturao, seguida do alongamento da cadeia carbnica, na etapa final para formao do
C22:5 -6 e do 22:6 -3. Uma nova via foi estabelecida, na qual os precursores dos cidos graxos com 22 tomos
de carbonos so inicialmente alongados a 24:5 -6 e 24:6 -3, seguidos de mais uma dessaturao pela 6
dessaturase e de uma oxidao peroxissomal (ou retroconverso) do produto. Essas reaes metablicas
ocorrem entre o grupo carboxlico e a dupla ligao mais prxima e, conseqentemente, no afeta a estrutura
molecular entre o grupo metlico final e a ltima dupla ligao (Figura 6.7). Portanto, todo cido graxo
poliinsaturado derivado das famlias -9, -6 e -3 pertencero s suas famlias de origem.

Figura 6.7 Esquema da dessaturao dos cidos graxos -9, -6 e -3. Reproduo autorizada. Sabarense,
2003b.

91
O alongamento da cadeia geralmente acontece numa velocidade maior do que a da dessaturao, e a
velocidade de converso depende do tamanho da cadeia, bem como da posio das duplas ligaes,
preferencialmente com cadeias contendo 18 tomos de carbono. Desse modo, os ismeros monoinsaturados
podem tambm ser alongados. Em estudos com microssomos de ratos, foram observados que os ismeros com
duplas ligaes nos carbonos 7 e 9 so os mais reativos.
O cido linolico (C18:2 n-6) precursor do cido graxo araquidnico (C20:4 n-6) e o cido -
linolnico (C18:3 n-3) precursor dos cidos eicosapentaenico (C20:5 n-3) e docosaexaenico (C22:6 n-3). O
alongamento da cadeia e a insero de duplas ligaes carbono-carbono ocorrem nas posies 5 e 6 da molcula,
contando a partir do grupo carboxlico. Esse processo ocorre principalmente no fgado.
Os cidos graxos poliinsaturados formados so fundamentais para a sntese dos eicosanides, molculas
participantes do controle do sistema circulatrio (prostaglandinas e tromboxanos) e compostos envolvidos no
sistema imune (leucotrienos).
O cido araquidnico (C20:4 -6) tem papel importante na agregao plaquetria. medida que
liberado dos fosfolipdios da membrana da plaqueta, esse cido utilizado na formao de prostanides pela ao
da cicloxigenase com efeito pr-agregatrio. Essa propriedade modulada pela concentrao de cidos graxos
poliinsaturados com 20 e 22 tomos de carbono na molcula.
O cido linolico e o cido -linolnico competem pelas mesmas enzimas, logo, eles podem inibir tanto
o prprio alongamento quanto a dessaturao.
A deficincia de cido linolico acarreta alteraes no crescimento, nas funes reprodutivas e leses
na pele. Os sinais so mais obscuros na deficincia em cido -linolnico, mas pode se observar, em animais
experimentais, uma reduo na acuidade visual, determinada por eletrorretinogramas anormais e, possivelmente,
conseqncias sobre a cognio e o comportamento.

6.5. Fosfolipdios (Fosfoacilgliceris)


Um grupamento lcool do glicerol pode ser esterificado por uma molcula de cido fosfrico, em vez de
um cido carboxlico. Em tais lipdios, dois cidos graxos so tambm esterificados molcula de glicerol. O
composto resultante chamado de cido fosfatdico. Uma molcula de cido fosfrico pode formar ligaes ster
tanto com glicerol quanto com outros lcoois, criando um fosfodister. Os fosfodister so classificados como
fosfoacilgliceris ou fosfolipdios. Existem, portanto, duas classes de fosfolipdios: aqueles com um esqueleto de
glicerol e aqueles que contm esfingosina. Ambas as classes so encontradas como componentes da membrana,
mas os fosfolipdios contendo glicerol possuem papis adicionais no organismo, por exemplo, como componentes
essenciais da bile, em que suas propriedades auxiliam a solubilizao do colesterol, servindo de ncoras para
algumas protenas nas membranas celulares e participando, dessa forma, na transmisso de sinais atravs das
membranas e como componentes do surfactante pulmonar.
Assim como os cidos graxos, os fosfolipdios so de natureza anfiptica, isto , cada um possui uma
cabea hidroflica (o grupo fosfato mais o que quer que esteja ligado a ele, como: serina, etanolamina, colina etc.)
e uma cauda longa e hidrofbica (contendo duas cadeias de cidos graxos). As pores hidrofbicas das molculas
esto associadas a outros constituintes apolares de membranas, incluindo os glicolipdios, esfingolipdios,
protenas e esteris como o colesterol. A cabea hidroflica polar do fosfolipdio estende-se para fora da
membrana. A caracterstica arquitetnica central das membranas biolgicas uma dupla camada lipdica, que
constitui uma barreira passagem de molculas polares e de ons, formada pelos fosfolipdios citados
anteriormente.
Alguns dos lipdios mais importantes dessa classe (fosfolipdios) so a fosfatidiletanolamina (cefalina), a
fosfatidilserina, a fosfatidilcolina ou lecitina, o fosfatidilinositol, o fosfatidilglicerol e o difosfatidilglicerol ou
cardiolipina (Figura 6.8). Em cada um desses tipos de compostos, a natureza dos cidos graxos na molcula pode
variar amplamente.

92
Figura 6.8 Fosfolipdios
Fonte: Sabarense, 2003b. Reproduo autorizada.
As membranas so de fundamental importncia para a estrutura e funo celular. A membrana
plasmtica, que envolve as clulas, e outras membranas formam uma superfcie intracelular contnua (retculo
endoplasmtico), sendo a base estrutural de organelas intracelulares, como as mitocndrias.
Cada espcie lipdica exibe um perfil caracterstico de cidos graxos, uma vez que h uma
especificidade das acil-transferases que catalisam a acilao tanto dos triglicerdios, quando dos fosfolipdios.
O funcionamento normal da membrana vital para os processos celulares, sendo modulada por uma
extensa variedade de fatores. Pesquisas recentes tm demonstrado que componentes dietticos podem influenciar
caractersticas das membranas, como a fluidez estabilidade e a suscetibilidade ao dano oxidativo.
Diferenas qualitativas na gordura da dieta afetam a composio em cidos graxos das membranas. Os
efeitos so mais evidentes quando h deficincia de cidos graxos essenciais na dieta e em perodos de intenso
desenvolvimento tecidual, por exemplo durante os perodos fetal e neonatal. Os cidos graxos poliinsaturados n-3
podem aumentar a fluidez da membrana dos eritrcitos quando esterificados aos fosfolipdios da membrana.
Contrapondo a isso, a substituio dos cidos graxos saturados por monoinsaturados cis ou trans no apresentou
alterao na fluidez. J, aumentando o contedo de colesterol e de cidos graxos saturados, a fluidez decresce. O
colesterol, os cidos graxos saturados e os cidos graxos trans podem agir enrijecendo a membrana e inibindo a
maioria dos movimentos transmembrana.

6.6. Glicolipdios
Os glicolipdios, como seu nome indica, so lipdios que contm glicdios. Nas clulas animais, os
glicolipdios, como a esfingomielina, so derivados da esfingosina, um aminolcool, sendo, ento, chamados de
glicoesfingolipdios. O grupamento amino do esqueleto da esfingosina acilado por um cido graxo. Os
glicolipdios diferem da esfingomielina na natureza da unidade que est ligada ao grupamento hidroxila primria
do esqueleto da esfingosina, no contendo fosfato. Assim como os fosfolipdios, os glicoesfingolipdios so
componentes essenciais de todas as membranas do organismo, mas so encontrados em maiores quantidades no
tecido nervoso. Eles esto localizados primariamente na camada externa da membrana plasmtica, onde interagem

93
com o ambiente extracelular. Como tal, eles desempenham algum papel na regulao das interaes, crescimento
e desenvolvimento celulares.
A mielina uma bainha de membranas, rica em lipdios, que circunda axnios de clulas nervosas e tem
um contedo particularmente alto de esfingomielina. Ao contrrio de muitos tipos de membranas, a mielina , em
essncia, uma bicamada lipdica com uma pequena quantidade de protenas. Sua estrutura, composta por
segmentos com interrupes (ndulos), promove a transmisso rpida de impulsos nervosos entre ndulos
sucessivos. A perda da mielina leva lentido e, eventualmente, interrupo da transmisso nervosa. Na
esclerose mltipla, uma doena incapacitante e fatal, a bainha de mielina destruda, de modo progressivo, por
placas esclerticas, que afetam o crebro e a medula espinhal.

Figura 6.9 O termo glicolipdos designa alguns compostos contendo um ou mais resduos de
monossacardeos ligados por uma ligao glicosdica parte hidrofbica da molcula,
como um acilglicerol, esfingosina ou ceramida. No exemplo apresentado um
galactolipdio, onde so representadas as estruturas (I) cidos graxos, (II) glicerol e (III)
resduo de galactose.

6.7. Esteris
Os esteris so produzidos em animais e vegetais. Todos os esteris compartilham de uma estrutura
qumica especfica, uma cadeia de carbono similar e um grupo alcolico (-OH), e atendem s mesmas funes
biolgicas: a formao de estruturas da membrana celular. Aproximadamente, apenas 2% dos esteris so solveis
em leo e praticamente insolveis em gua.
Nosso organismo no pode sintetizar os esteris encontrados em vegetais (fitosteris). Os esteris
vegetais so componentes encontrados em leos vegetais comestveis. Quando leos comestveis passam por
refino normal para aumentar sua estabilidade, os esteris vegetais so parcialmente extrados com alguns
tocoferis (utilizados para fabricar suplementos de vitamina E).
Estima-se que necessitam ser refinadas 2.500 toneladas de leos vegetais para produzir uma tonelada de
esteris vegetais. Um estudo foi divulgado mostrando a eficcia dos fitosteris (Instituto de Pesquisa Nutricional e
Alimentar-Holanda), onde 100 voluntrios selecionados aleatoriamente, 42 do sexo masculino e 58 do sexo
feminino, com faixa etria entre 19 e 58 anos e nveis de colesterol sangneo normal e moderadamente elevados,
utilizaram cinco produtos diferentes. Trs margarinas que continham nveis elevados de fitosteris (3%, 6,5% e
13% m/m) e altas concentraes de gordura polinsaturada, manteiga e Becel (70% de gordura). As duas ltimas
foram utilizadas como controle. Os voluntrios consumiram-nas durante 3,5 semanas consecutivas, diariamente.
Os resultados apontaram que todas as margarinas enriquecidas com fitosterol reduziram efetivamente as
concentraes de colesterol total e LDL do sangue, enquanto os nveis de colesterol HDL no foram afetados.
O colesterol o esterol mais conhecido obtido dos alimentos de origem animal. Pode ser sintetizado por
todas as clulas do organismo humano, mais intensamente no fgado e no intestino.
um componente das membranas celulares e funciona como precursor dos cidos biliares, hormnios
esterides e vitamina D. Dessa forma, fundamental que as clulas dos principais tecidos do corpo recebam um
suprimento contnuo de colesterol. Ao lado dos cidos graxos, importante modulador de fluidez da membrana.

94
O fgado desempenha papel central na regulao do balano corporal do colesterol. O colesterol que entra
no fgado proveniente de uma srie de fontes, incluindo o colesterol da dieta, o colesterol sintetizado pelos
tecidos extra hepticos e a sntese de novo do colesterol pelo fgado. O colesterol eliminado pelo fgado
inalterado na bile, como um componente das lipoprotenas do plasma enviadas aos tecidos perifricos ou como
sais biliares secretados na luz intestinal.

6.7.1. Biossntese do Colesterol


O colesterol um esterol com um grupo hidroxila em uma extremidade e uma cauda hidrocarbonada
flexvel em outra. A molcula insere-se na bicamada com seu eixo longitudinal perpendicular ao plano da
membrana. O grupo hidroxila forma pontes de hidrognio com o oxignio da carbonila de fosfolpedes, enquanto
a cauda de hidrocarboneto se localiza no centro apolar da bicamada. Assim, o colesterol inibe a cristalizao das
cadeias acila, por se colocar entre elas, aumentando a fluidez da membrana. No entanto, interpondo-se a essas
cadeias, bloqueia grandes movimentaes, o que torna a membrana menos fluida.
A via de sntese de colesterol d origem tambm a outros importantes poliisoprenides constituintes
da membrana, dolicis e isoprenides da cadeia lateral de ubiquinonas (Figura 6.10).
Todos os 27 tomos de carbono da cadeia de colesterol so derivados do acetil CoA. A
colesterognese pode ser didaticamente dividida em trs fases:
1. Formao de isopentenil pirofosfato.
2. Formao de esqualeno e ciclizao.
3. Rearranjo final da estrutura do colesterol.
Na primeira etapa, duas molculas de acetil CoA condensam-se pela ao da 3-cetotiolase,
originando a acetoacetil CoA. Esta, por sua vez, reage com uma terceira molcula de acetil CoA, formando o 3-
hidroxi-3-metilglutaril CoA (HMG CoA), reao catalisada pela HMG CoA sintase. Pela ao de outra enzima,
HMG CoA redutase, HMG CoA reduzido a mevalonato. Esse passo irreversvel a etapa limitante na sntese
de colesterol, sendo a HMG CoA redutase enzima-chave da reao:

HMG CoA + 2 NADPH + 3H+ Mevalonato + 2 NADP+ CoA

O mevalonato, ento, convertido a isopentenil pirofoAGSto (IPP) por trs reaes consecutivas
envolvendo ATP, duas fosforilaes e uma descarboxilao. IPP, um isoprenide de cinco carbonos, bloco
bsico para a construo do colesterol nas reaes subseqentes.
A segunda etapa da colesterognese envolve a polimerizao dos blocos isoprenides, IPP condensa-se
ao seu ismero (dimetil alil pirofoAGSto), formando o intermedirio de 10 carbonos, geranil pirofoAGSto (GPP)
que, aps nova condensao com IPP, resulta em farnesil pirofoAGSto (FPP) com 15 tomos de carbonos. Duas
molculas de FPP unem-se para dar origem ao intermedirio linear de 30 carbonos, o esqualeno.
A etapa final da sntese comea com a ciclizao do esqualeno, formando epxido de esqualeno, com
participao de oxignio molecular e NADPH. Ocorre movimento de eltrons por quatro duplas ligaes e
migrao de dois grupos metila. Finalmente, o lanosterol convertido em colesterol pela remoo de trs grupos
metila, reduo de uma ligao por NADPH e migrao de outra dupla ligao.

95
-hidroxi--metilglutaril CoA

Mevalonato

3 isopentenil pirofoAGSto 2 isopentenil pirofoAGSto

geranil pirofoAGSto 2 isopentenil tRNA

farnesil pirofoAGSto 2 isopentenil adenosina

esqualeno trans-poliprenilpirofoAGSto 2 isopenteniladenina

lanosterol cispoliprenil pirofoAGSto Dolicis

desmosterol isoprenide de cadeia lateral de ubiquinonas

COLESTEROL

Figura 6.10 Sntese de colesterol e outros poliisoprenides

6.7.2. Formao e Metabolismo das Lipoprotenas


Os lipdios constituem os componentes bsicos das membranas celulares e a principal forma de
estoque energtico no organismo humano. Esses compostos, com atividades fisico-qumicas diversas, so
representados principalmente pelos triacilgliceris (TG), fosfolipdios e colesterol.
Os lipdios so transportados por lipoprotenas, tendo estas larga significncia biolgica no somente
no transporte de lipdios, mas tambm no envolvimento em processos diversos como reaes imunes, coagulao
e reparo de tecidos.
As lipoprotenas so complexos macromoleculares de lipdios e protenas. Grande diversidade na
sua composio e em suas propriedades fsicas possvel tanto na sade quanto nas doenas. Como tal, sua
classificao e definio so particularmente difceis, uma vez que cada lipoprotena tem sua relao de
componentes, origem e via metablica prprias. A Tabela 6.1 mostra as principais funes e caractersticas das
lipoprotenas do plasma de acordo com a sua origem, proporo de frao lipdica e protica e quanto s
propriedades.
De acordo com sua origem, composio, densidade e tamanho, as lipoprotenas podem ser
classificadas em: quilomcrons (QM), lipoprotenas de muito baixa densidade (VLDL), lipoprotenas de densidade
intermediria (IDL), lipoprotenas de baixa densidade (LDL) e lipoprotenas de alta densidade (HDL).
As apolipoprotenas (Apo), protenas componentes das lipoprotenas, so um grupo de protenas de
imensa diversidade estrutural que conferem estabilidade s partculas de lipoprotenas, bem como o seu
direcionamento metablico, graas interao com receptores celulares especficos, que as reconhecem em
clulas alvo. Alm disso, as apolipoprotenas atuam como co-fatores das enzimas envolvidas no metabolismo de
lipoprotenas.

96
Tabela 6.1 Caractersticas e funes das lipoprotenas do plasma

Caractersticas QM VLDL IDL LDL HDL


Densidade < 0,95 0,95 1,006 1,006 1,019 1,019 1,063 1,063 1,210
Mobilidade eletrofortica origem PR - PR - a
Fgado e Fgado, intestino
Origem Intestino Catabolismo Catabolismo
intestino remanescentes
Composio (%)
Triglicerdios 90 60 40 10 5
Colesterol 5 10 30 50 20
Fosfolipdios 3 18 20 15 25
Protenas 2 10 10 25 50
Transporte d Transporte d Transporte de
Transporte reverso
Papel fisiolgico principa lipdios da lipdios Precursor de LD colesterol para o
colesterol
dieta endgenos tecidos

QM quilomcrons, VLDL lipoprotena de muito baixa densidade, IDL lipoprotena de densidade


intermediria, LDL lipoprotena de baixa densidade e HDL lipoprotena de alta densidade.
Fonte: adaptado de Mackness e Durrington, 1995.

Os QM transportam os TG de origem alimentar. So formados no intestino, a partir da digesto das


gorduras alimentares e Apo B-48, E, A-1 e C sintetizadas nos entercitos. A composio, o nmero e o tamanho
dos QM formados dependem do suprimento e caractersticas da dieta. A partcula rica principalmente em TG, o
que lhe confere densidade inferior a 1,006 e tamanho variando de 80 nm a 1m. Uma vez sintetizados, os QM so
lanados na linfa intestinal e atingem a circulao geral atravs do ducto torcico, sofrendo a ao da enzima
lipase lipoprotica (LPL), que se encontra aderida membrana basal das clulas endoteliais dos capilares
sangneos.
Aps sofrerem a ao de LPL, os quilomcrons resultantes, ento chamados de remanescentes, so
removidos da circulao pelo fgado por um processo que envolve a ligao da Apo-E com o receptor de
remanescentes (ou receptor de Apo-E) no fgado.
O fgado re-empacota os lipdios e os secreta diretamente no sangue em VLDL, lipoprotenas
ricas em triglicerdios, cuja apoprotena principal a Apo B-100. A VLDL hidrolisada por LPL, da mesma
forma que os quilomcrons. Os remanescentes de VLDL so chamados de IDL e contm Apo-B100 e Apo-E na
sua superfcie. Cerca de 50% das partculas de IDL so removidas da circulao pelo fgado, atravs da ligao de
Apo-E com o receptor de remanescentes (receptor de Apo-E) ou da ligao de Apo B-100 ou Apo-E com o
receptor de LDL (ou receptor B/E). Os 50% restantes so convertidos em LDL pela lipase lipoprotica heptica ou
transformados em LDL no plasma aps a perda de Apo-E, dentre outras modificaes.
As LDL so constitudas por um ncleo rico em colesterol esterificado (CE), principalmente steres
de cido linolico, circundado por uma monocamada de fosfolipdios e colesterol, sendo menos enriquecido em
TG.
A LDL funciona como fonte de colesterol necessrio para formao de membranas e sntese de
hormnios esterides. Logo, sua principal funo transportar do fgado o colesterol para os tecidos que dele
necessitam. A nica molcula de Apo B-100 contida na LDL reconhecida tanto nos tecidos extra-hepticos
quanto no fgado pelos receptores de LDL. Quando a demanda de colesterol alta, os receptores de LDL so
ativados para aumentar a captao da lipoprotena. No entanto, quando a clula est repleta de colesterol, o
mecanismo de regulao negativa do receptor protege-a contra os efeitos deletrios da acumulao desse lipdio.
O colesterol no degradado in vivo, e sim secretado pelo fgado na bile. O transporte reverso de
colesterol consiste na remoo do excesso de colesterol livre dos tecidos perifricos e lipoprotenas e no
subseqente depsito no fgado para secreo. Esse processo mediado por HDL, que , portanto, considerada
como uma lipoprotena antiaterognica. O fgado, intestino e os remanescentes de lipoprotenas so as principais
fontes de HDL, cujas principais apoprotenas so Apo-AI e Apo-AII.
O colesterol livre em contato com HDL nascente substrato para a enzima plasmtica lecitina:
colesterol acil transferase (LCAT) e ativada pela apo A-1, resultando na formao de steres de colesteril e
aumento no tamanho da partcula de HDL. Os steres de colesteril podem ser transferidos para as lipoprotenas
que contm Apo B pela protena de transferncia de ster de colesterol (CETP) e, em seguida, retornar para o
fgado via receptor de LDL. Apesar de a HDL exercer papel importante no transporte reverso, 80% do colesterol

97
captado e esterificado nas partculas de HDL transportado para outras lipoprotenas (1.500 mg/dia), por ao da
enzima CETP. Aproximadamente, 9 mg de colesterol/kg de peso corporal/dia sintetizados pelos tecidos perifricos
vo ser transportados para o fgado para o catabolismo, quando pode ser excretado na bile (principal via para
eliminao) ou reabsorvido (circulao entero-heptica).

6.8 - O Azeite de Oliva e os Nveis de Colesterol


Muitos especialistas em Nutrio consideram o azeite de oliva como um dos melhores leos para a
alimentao humana. No se pode esquecer de que o azeite de oliva, junto com o vinho, as frutas e hortalias,
constitui um dos alimentos-chave que caracterizam a dieta mediterrnea na Europa. Dieta essa que evidenciou os
primeiros estudos a respeito dos efeitos benficos do azeite de oliva sobre os nveis de colesterol.
Como elemento integrante da dieta, o azeite de oliva ajuda a manter os nveis adequados de colesterol e
prevenir problemas cardiovasculares. O mecanismo pelo qual esta contribuio ocorre est relacionado com o
transporte do colesterol atravs do sangue, pelo sistema de transporte reverso, em que a HDL reconhece o excesso
de colesterol das paredes arteriais e o leva para o fgado para que este o elimine. A LDL transporta o colesterol do
fgado e facilita o seu depsito nas paredes das artrias.
O azeite de oliva provoca uma reao tendendo a aumentar a HDL e a diminuir a LDL, reduzindo a taxa
de colesterol e mantendo os nveis adequados. O efeito do azeite de oliva sobre a HDL e LDL exclusivo desse
alimento, j que outras gorduras, como os cidos graxos poliinsaturados do pescado ou os azeites de sementes,
reduzem o colesterol em LDL, mas tendem a diminuir a HDL, o que faz com que o efeito seja menos positivo que
o realizado pelo azeite de oliva. Este efeito do azeite de oliva est associado ao contedo de cidos graxos
monoinsaturados, principalmente o cido olico.
Apesar das evidncias, nenhum cido graxo deve ser utilizado como medicamento para a reduo dos nveis altos
de colesterol no sangue. No entanto, quem possui nveis de colesterol elevados deve diminuir o consumo de
gorduras, seja ela qual for.

6.9. - Oxidao dos cidos Graxos


A degradao oxidativa dos cidos graxos d-se, principalmente, na matriz mitocondrial pela via da -
oxidao, porm os cidos graxos de cadeia longa podem tambm ser degradados pela oxidao peroxissomal, em
que a primeira etapa catalisada por uma flavoprotena, a acil-CoA oxidase. Alm disso, ao contrrio da oxidao
mitocondrial, essa reao produz perxidos de hidrognio que so prontamente destrudos pela catalase. As
demais etapas ocorrem de maneira semelhante oxidao mitocondrial .
Os primeiros estudos avaliando a oxidao dos cidos graxos trans demonstraram a existncia de certa
equivalncia oxidativa ao seu correspondente de configurao cis. No entanto, o cido eladico geralmente
preferencial em relao ao cido olico em mais de uma das etapas da oxidao mitocondrial dos cidos graxos,
identificando-se que a taxa de oxidao peroxissomal do cido eladico 2,5 vezes maior do que a do cido olico.

6.10. Referncias
ALVAREZ-LEITE, J.I. Mecanismo de ao da goma guar sobre o metabolismo de colesterol: ausncia de
participao da flora microbiana intestinal. Belo Horizonte: UFMG, 1993. Tese (Doutorado) -
Departamento de Bioqumica e Imunologia da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.

CALDER, P.C. Dietary fatty acids and the immune system. Nutrition Reviews, v.56, n.1, 1998.

CAMPBELL, M.K. Bioqumica. Trad. Por Henrique Bunselmeyer Ferreira [et al.]. 3.ed. Porto Alegre: Ed. Artes
Mdicas Sul 2000. 751 p.

CHAMPE, P.C.; HARVEY, R.A. Bioqumica ilustrada. Porto Alegre: Ed. Artes Mdicas.1996. 446 p.

COSTA, R.P. Hipertrigliceridemia e aterosclerose. Projeto Becel para uma Vida Saudvel. [S.l..]; abr-jun1999.
1-4 p.

COSTABEBER, I.; IBAEZ, P.J. Olivo, aceituna, aceite y sus efectos teraputicos. Una recopilacin. La
Alimentacin Latinoamericana, n. 234, p. 72-79, 2000.

98
FUENTES, J.A G. Que alimentos convm ao corao? Higiene Alimentar, v. 12, n. 53, p. 7-11, 1998.

GARCIA Rollan, M. Alimentacin humana. Errores y sus consecuencias. Madrid, Espanha: Ediciones Mundi-
Prensa: 1990.

GOMES, C.C.F. Elaborao e avaliao clnica de um alimento destinado a insuficientes renais crnicos em
programa de hemodilise. Viosa, Minas Gerais: UFV, 1998. Tese (Doutorado) - Departamento de
Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Viosa. Viosa.

INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes : the essential guide to nutrient requirement. Part 2.
Washington, D.C.: The National Academy Press, 2006 ; 123-139 p.

LEHNINGER, A L.; NELSON, D.L.; COX, M.M.. Princpios de Bioqumica, 2. ed. So Paulo: Editora Sarvier:
1995. 839 p.

LIMA, F.E.L.; MENEZES, T.N.; TAVARES, M.P.; SZARFARC, S.C.; FISBERG, R.M.. cidos graxos e
doenas cardiovasculares: uma reviso. Revista de Nutrio, v. 13, n. 2, p. 73-80, 2000.

MARZZOCO, A.; TORRES, B.B. Bioqumica Bsica. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A., 1999.
360 p.

MENSINK, R.P.; KATAN, M.B. Effect of monounsaturated fatty acids versus complex carbohydrates on high-
density lipoproteins in healthy men and women. Lancet, v. 1; p. 122-125, 1987.

NETTLETON, J.A .Omega-3 fatty acids and health. New York: Chapman & Hall, 1995. 359 p.

ORDOVAS, J.M.. cidos graxos trans, lipdios plasmticos e enfermidade coronariana. Soynoticias, v. 249; p.
10-12, 1997.

SABARENSE, C.M.. MANCINI FILHO, J. cidos graxos trans em alimentos: formao, consumo e mtodos de
anlise. Food Ingredients, n. 25, p. 80-83, 2003a.

SABARENSE, C.M. Avaliao do efeito dos cidos graxos trans sobre o perfil dos lipdios teciduais de ratos
que consumiram diferentes teores de cidos graxos essenciais. So Paulo: USP, 2003b. Tese (Doutorado) -
Faculdade de Cincias Farmacuticas da Universidade de So Paulo, So Paulo.
139 p.

SALES, R. L.; PELUZIO, M.C.G.; COSTA, N.M.B. Lipoprotenas: uma reviso do seu metabolismo e
envolvimento com o desenvolvimento de doenas cardiovasculares. Nutrire, v. 25; 71-86, 2003.

STRYER, L. Biochemistry. 3. ed. New York: WH Freeman, 1988. 1087 p.

TACO - Tabela brasileira de composio de alimentos. Ncleo de Estudos e Pesquisas em Alimentao


NEPA-UNICAMP. Campinas: Verso II Universidade Estadual de Campinas, 2006, 105 p.

99
Captulo 7: METABOLISMO ENERGTICO

Neuza Maria Brunoro Costa


Cristiane Gonalves de Oliveira

7.1. Introduo
O ser vivo alimenta-se para satisfazer duas necessidades bsicas: obter substncias que lhe so
essenciais e energia para a manuteno dos processos vitais.
Os animais necessitam, alm de oxignio, gua e minerais, de certas substncias orgnicas que eles
no so capazes de sintetizar, como aminocidos essenciais, cidos graxos essenciais e vitaminas. Alm
desses compostos essenciais, necessitam de energia que requerida para a manuteno de diversas funes
orgnicas, incluindo respirao, circulao, atividade fsica e manuteno da temperatura corporal.
A energia dos alimentos liberada no organismo pela oxidao, produzindo a energia qumica
necessria para manter o metabolismo, transmisso dos impulsos nervosos, respirao, circulao e atividade
fsica. O calor que gerado durante esse processo usado para a manuteno da temperatura corporal.
Os principais nutrientes que fornecem energia para o organismo so: carboidratos, lipdios e
protenas.
O balano energtico de um indivduo depende do seu consumo e do seu gasto energtico. O
desbalano entre eles resulta no ganho ou perda de componentes corporais, principalmente na forma de
gordura, o que determina as alteraes no peso corporal.
O requerimento ou necessidade estimada de energia (EER) definido como o consumo de energia
que previsto para manter o balano energtico de um adulto saudvel de determinada idade, sexo, peso,
altura e nvel de atividade fsica, compatvel com um bom estado de sade.

7.2. Princpios de Calorimetria

O interesse em conhecer a origem do calor produzido pelos animais norteou os primeiros trabalhos
sobre calorimetria, e deles se descobriu que a produo de calor resulta dos processos de oxidao dentro da
clula. Quando os produtos derivados dos alimentos so oxidados, existe uma produo de calor, da mesma
forma da que quando uma substncia queimada fora do organismo. A combusto, no to intensa,
realizada com a ajuda de complicadas reaes enzimticas, mas ao final ela uma oxidao que gera calor ou
outras formas de energia.
A principal vantagem biolgica da oxidao no , entretanto, a produo de calor para aquecer o
corpo, e sim a transformao da energia contida nos alimentos em uma forma de energia utilizvel para o
trabalho animal interno e externo. O calor produzido como um resultado final da oxidao biolgica
benfico para a manuteno da temperatura corporal, mas ele no tem valor para a realizao do trabalho,
sendo considerado um sub-produto do metabolismo.
A fonte de energia til para os animais a energia qumica fornecida pelos alimentos
A oxidao dos alimentos prov energia qumica para as reaes celulares. Como a energia
transformada de uma forma para outra (como ocorre no metabolismo dos nutrientes na clula), a capacidade
da energia total para desenvolver trabalho diminui. Quando macromolculas de carboidratos, lipdios e
protenas so quebradas em fragmentos progressivamente menores, por meio das enzimas do metabolismo
intermedirio, a mudana de estado altamente organizado para um desorganizado (maior entropia). O
processo, por ocorrer em etapas, garante a captura de cerca de 40% da energia na forma de adenosina
trifosfato (ATP). O restante perdido como calor. Entretanto, quando molculas so rompidas violentamente,
em contato com o oxignio atmosfrico, como numa bomba calorimtrica, o estado de desorganizao tal
que toda a energia potencial do alimento liberada como calor.

7.2.1. Definio e unidades de energia


Caloria
Como o calor um dos resultantes da energia gerada pelo corpo, a unidade de energia habitualmente
utilizada em nutrio humana a quilocaloria (1.000 calorias). A caloria a unidade-padro para medida de
calor.
Uma quilocaloria a energia calorfica necessria para elevar em 1 L de gua a temperatura de 14,5
para 15,5 C.

100
Joule
A unidade de medida da energia no sistema mtrico o joule, medida de energia em termos de
trabalho mecnico. a energia necessria par acelerar 1 N a 1 m de distncia.
Cerca de 90% da populao mundial usa o sistema mtrico ou em vias de converso ao seu uso.
Devido a isso, o joule foi selecionado como a unidade de energia na literatura sobre nutrio. Uma
quilocaloria igual a 4,184 quilojoules. Na prtica, usa-se 1 kcal = 4,2 kJ.
Converso: 1 cal = 4,184 J
1 kcal = 4,184 kJ

1 J = 0,239 cal
1 kJ = 0,239 kcal
1 MJ = 239 kcal (MJ = megajoule)

7.3. Mtodos para determinar o valor energtico dos alimentos


7.3.1. Calorimetria direta
O contedo calrico total, ou energia total disponvel de um alimento, pode ser medido por meio de
bomba calorimtrica ou calormetro. O equipamento consiste de um recipiente de metal fechado que imerso
em um volume de gua conhecido, no qual o alimento queimado. A amostra do alimento de peso conhecido
queimada em uma atmosfera de oxignio acesa por uma descarga eltrica. A elevao da temperatura da
gua aps a combusto do alimento pode ser usada para calcular a energia calorfica ou as calorias geradas.
Cada alimento tem seu valor calrico especfico. Isto , dada quantidade de alimento ir liberar certo
nmero de calorias quando metabolizado. As calorias liberadas dependem da composio do alimento em
termos de protenas, lipdios, carboidratos e lcool.
A quantidade de calor produzida por 1 g de amostra purificada de protenas, lipdios, carboidratos e
lcool queimados em uma bomba calorimtrica est apresentada na Tabela 7.1.

Tabela 7.1 - Caloria produzida por 1 g de carboidrato, lipdio, protena e lcool queimados em bomba
calorimtrica.
Nutrientes kcal/g
Protena 5,65
Lipdio 9,45
Carboidrato 4,10
lcool 7,10

No corpo, alguns alimentos no so totalmente digeridos e absorvidos. Portanto, importante o grau


em que um nutriente ingerido est disponvel para as clulas. Normalmente, cerca de 98% de carboidrato,
95% de lipdios e 92% de protenas so absorvidos. Todavia, h ampla variao na digestibilidade das
protenas.
A caloria liberada dos carboidratos e lipdios utilizados pelas clulas no corpo quase a mesma que
na bomba calorimtrica ou no calormetro, j que so completamente oxidados em CO2 e H2O. Isso no
vlido para as protenas. O grupo amina (NH2) dos aminocidos no oxidado no corpo como na bomba
calorimtrica, mas excretado na urina, principalmente como uria. Assim, os fatores fisiolgicos de
combusto devem ser corrigidos, conforme Tabela 7.2.

Tabela 7.2 - Fatores fisiolgicos de combusto para nutrientes energticos.


Carboidrato Lipdio Protena
Combusto em bomba calorimtrica (kcal/g) 4,10 9,45 5,65
Perda devida combusto incompleta de compostos 0 0 -1,25
nitrogenados (kcal/g)
Digestibilidade (%) 98 95 92
Fator fisiolgico para os combustveis (kcal/g) 4 9 4
(kJ/g) 17 38 17

101
Os valores de 4, 9 e 4 kcal por grama de protena, lipdio e carboidrato, respectivamente, podem ser utilizados
para fins prticos na estimativa de valor calrico dos alimentos.
O lcool fornece 7 kcal/g, o que se chama de calorias vazias, j que no contribui para a nutrio,
alm de exercer efeitos txicos. obrigatoriamente oxidado, principalmente no fgado, cuja capacidade
mxima de 160 a 180 g de etanol/dia. Na Figura 1 est esquematizado o metabolismo do lcool.
A Figura 7.2 ilustra a utilizao de energia proveniente dos alimentos.

102
Substitui os cidos graxos como
combustvel
Drogas e Etanol
hormnios
NADPH

NAD Hidrognio
MEOS cidos graxos
ADH
NADH
NADP

Cetose

Acetaldedo
(Txico) Triglicerdeos

Metablitos polares

cido pirvico
Esteatose Hiperlipidemia
Acetato heptica

cido lctico

Glicose (hipoglicemia)
Hiperlactacidemia

Acidose renal

Uricademia Gota
Figura 7.1 - Metabolismo do lcool. ADH - Desidrogenase alcolica e MEOS - Sistema microssmico de oxidao do etanol.

103
Energia dos alimentos
(Calor de combusto em kcal/g)

91,99%
Energia no-digervel, perda
pelas fezes ou utilizadas por
bactrias (1 9%)
Energia digervel :
(E. consumida - E. fezes) x 100
E. consumida

85 93%
Perdas em urina, suor e clulas
(6%)
Energia metabolizvel, valor
energtico dos alimentos
(carboidrato, protena, lipdio e
etanol)

Calor produzido em
catabolismo ou ciclos
inteis - < 50%
27 30%

Energia utilizada ou acumulada


Energia necessria para digesto, (energia liquida para
absoro, distribuio, modificao e metabolismo basal e atividade
armazenamento de nutrientes digerveis fsica).
(TID) 6 10%

Figura 7.2 - Utilizao de energia proveniente dos alimentos e energia lquida utilizada para o metabolismo basal e
atividade fsica.

7.3.2. Calorimetria indireta


O valor energtico do alimento calculado medindo-se a quantidade de O2 necessria para a combusto
completa de uma amostra de peso conhecido. A quantidade de O2 consumido est diretamente relacionada ao valor
energtico do alimento. So oxidados a CO2, H2O e xido de N2. O oxicalormetro o instrumento usado para
determinar o valor energtico do alimento.

7.4. Necessidade de energia pelo corpo


A necessidade energtica total de um organismo depende do metabolismo basal, da termognese induzida pela
dieta (TID) e da atividade fsica.
A energia utilizada para o metabolismo basal ou atividade fsica proveniente da ingesto alimentar, porm,
uma vez que o alimento ingerido, ele sofre inmeras transformaes, disponibilizando somente 27-37% do valor
calrico inicial, conforme mostrado na Figura 7.2.

7.4.1. Metabolismo basal e de repouso


A taxa de metabolismo basal (TMB) corresponde taxa do gasto energtico que ocorre em estado ps-
absortivo, definido como a condio do organismo aps uma noite de jejum de 12 a 14 h, repousando confortavelmente
em posio supina, acordado, porm sem movimentos, em um ambiente termoneutro. Essa condio padronizada de
estado metablico, metabolismo basal, corresponde a uma situao em que os alimentos e a atividade fsica exercem
influncia mnima no metabolismo.
A TMB, portanto, reflete a energia necessria para manter as atividades das clulas e dos tecidos, mais a
1041
energia necessria para manter a circulao sangnea, a respirao e as funes gastrointestinais e renais. A TMB
corresponde a cerca de 5 a 10% menos do que a taxa metablica durante o sono. geralmente extrapolada para as 24
horas do dia e, dessa forma, referida como o gasto energtico basal (GEB). A taxa de metabolismo de repouso (TMR),
que corresponde energia gasta em condies de repouso, perodo ps-prandial, tende a ser de 10 a 20% maior que a
TMB, devido ao efeito trmico dos alimentos ou termognese induzida pela dieta (TID) ou pelo efeito residual da
atividade fsica praticada recentemente.
Os gastos energticos basal, de repouso e do sono esto relacionados com a massa corporal, mais
especificamente com a massa livre de gordura, que corresponde ao peso corporal menos o peso da massa gorda. A
massa livre de gordura geralmente responde por 70 a 80% do porcentual de variao da TMR. Outros fatores, como
sexo, idade, composio corporal, estado nutricional, alteraes endcrinas, especialmente hipo e hipertireoidismo,
tambm afetam a TMR.

7.4.2. Medida de calor produzido pelo corpo


A quantidade de calor produzida pelo corpo pode ser medida de duas formas:
Calorimetria direta
Mede-se a quantidade de calor liberado pelo corpo, isto , a quantidade de energia consumida, medida por
variao da temperatura. Consiste em uma cmara bem isolada, hermeticamente fechada, com tamanho varivel para
acomodao de um homem ou animal de grande porte. O calor gerado pela pessoa na cmara absorvido pela gua em
circulao na serpentina de metal colocada perto do teto da cmara. Calcula-se a quantidade de calor liberado durante
certo perodo de tempo, medindo-se a elevao da temperatura da gua durante sua passagem pela serpentina na
cmara.
Esse mtodo muito caro, de difcil operao, e h poucos calormetros grandes disponveis.
Calorimetria indireta
a) Quociente respiratrio - Este mtodo mensura o consumo de oxignio, a produo de gs carbnico e a excreo de
nitrognio. A oxidao protica estimada pela excreo de nitrognio urinrio; em trabalhos, padronizada a excreo
de 13 mg N/dia. A taxa de metabolismo medida por meio da determinao do oxignio consumido e da produo de
dixido de carbono no corpo em um perodo de tempo:
QR = moles de CO2 expirado
moles de O2 consumido
Essas determinaes so, ento, convertidas em unidades de calor produzido por metro quadrado de superfcie
corporal, por hora e expresso como calorias despendidas. Esse mtodo amplamente utilizado e tem a vantagem da
mobilidade e do baixo custo do equipamento. Ele pode ser aplicado quando o corpo est deitado em repouso ou em
vrias atividades.
Quociente respiratrio dos alimentos:
I) Carboidratos: a oxidao completa da glicose, por exemplo, pode ser representada assim:
C6H12O6 + 6 O2 6 CO2 + 6 H2O

QR = CO2 = 6 = 1
O2 6

II) Lipdios: tm um QR menor, devido ao fato de o teor de oxignio de sua molcula ser bastante baixo em
relao ao carbono. Conseqentemente, necessitam de mais oxignio externo. Exemplo de oxidao da triestearina:
2 C57H110O6 + 163 O2 114 CO2 + 110 H2O

QR = CO2 = 114 = 0,7


O2 163

III) Protenas: a oxidao das protenas no pode ser expressa to facilmente, porque sua estrutura qumica
varivel. O QR das protenas aproximadamente 0,8 por clculos feitos.

possvel avaliar as necessidades energticas basais das pessoas de constituio corporal: 1 kcal/kg de peso/h
para homens de 0,9 kcal/kg de peso/h para as mulheres. Para aqueles acima de 50 anos de idade, a taxa reduzida em
10%.
Os valores conseguidos com esses clculos tm boa correspondncia com os obtidos nos testes reais de
metabolismo basal. Contudo, quando o clculo usado para pessoas cujo peso corporal desvia do padro, a
concordncia menos satisfatria.

b) Outros mtodos indiretos de medir o gasto energtico: vrios outros mtodos tm sido usados para medir o gasto
energtico em humanos, em condies normais de vida. As tcnicas mais comuns utilizadas recentemente se baseiam na
medida do ritmo cardaco ou na freqncia cardaca, e a tcnica da gua duplamente marcada com istopos estveis.
O mtodo da freqncia cardaca, embora confivel, pode apresentar limitaes de uso, visto que alguns
fatores que afetam o ritmo cardaco, como o volume das refeies, a variao na postura e o consumo de cigarros,
podem superestimar o gasto energtico.

1051
O mtodo da gua duplamente marcada (2H218O) baseado na diferena de velocidade de turnover entre 2H2O
18
e H2 O na gua corporal, o que usado para estimar a taxa de produo de CO2 e, por conseguinte, o gasto energtico.
Varia com as condies nutricionais do indivduo e com as condies ambientais e pode ser usado tambm para medir a
composio corporal do indivduo e o consumo de gua e em gestantes, mulheres, homens, lactentes, crianas e idosos.

7.4.3. Fatores que influenciam o metabolismo basal


a) rea de superfcie: quanto maior a superfcie corprea ou rea cutnea, maior a quantidade de calor perdida,
aumentando a necessidade de calor a ser produzido pelo organismo. Uma pessoa alta e magra tem rea de superfcie
maior e, conseqentemente, um metabolismo basal mais alto do que um indivduo baixo e corpulento do mesmo peso e
sexo.

b) Sexo: as mulheres, em geral, tm metabolismo 5 a 10% menor do que os homens, mesmo quando da mesma
altura e peso.

c) Gravidez: o metabolismo basal da gestante aumenta em razo da elevada atividade de rgos, como corao,
pulmes e outros, e maior demanda de O2. Alguns pesquisadores acreditam que o aumento seja de 20-28% acima do
normal.

d) Idade: a taxa de MB maior durante os perodos de crescimento rpido, principalmente no primeiro e segundo
anos, e alcana um pico menor nos anos de puberdade e adolescncia em ambos os sexos. A TMB declina cerca de 2%
por dcada de vida durante a vida adulta.

e) Composio corporal: o tecido adiposo diminui a taxa de metabolismo basal, pois requer menos oxignio e,
portanto, tem taxa metablica menor que o tecido muscular.

f) Glndulas endcrinas: a secreo da glndula tireide influencia o metabolismo mais que qualquer outra
secreo endcrina:
- Hipotireoidismo pode diminuir de 30 a 40% o MB.
- Hipertireoidismo pode elevar o MB em at 80%

g) Estado nutricional: nos subnutridos crnicos, a taxa do MB menor devido menor quantidade de tecido ativo.

h) Clima: o MB das pessoas que vivem nos trpicos menor que o daquelas que vivem em locais de clima frio. O
uso de roupas apropriadas compensa a diferena.

i) Febre: infeces ou febre aumentam a TMB em cerca 13% para cada grau acima de 37 C.

7.4.4. Clculo da Taxa de Metabolismo Basal (TMB)


O mtodo usado para obteno da TMB depende do grau de preciso desejado. Quando um conhecimento
preciso importante, deve ser obtido por calorimetria. Se for suficiente uma estimativa geral da TMB, usualmente so
utilizadas tabelas-padro. A estimativa da TMB (kcal/dia), segundo a FAO/OMS (1985), baseada no peso (kg), idade e
sexo est representada na Tabela 7.3.

Tabela 7.3 - Equaes para estimativa da TMB (FAO/OMS, 1985), segundo a faixa etria e o sexo
Idade (anos) Masculino Feminino
0-3 (60,9 x P) - 54 (61,0 x P) - 51
3 -10 (22,7 x P) + 495 (22,5 x P) + 499
10 - 18 (17,5 x P) + 651 (12,2 x P) + 746
18 - 30 (15,3 x P) + 679 (14,7 x P) + 496
30 60 (11,6 x P) + 879 (8,7 x P) + 829
> 60 (13,5 x P) + 487 (10,5 x P) + 596
A estimativa do peso ideal pode ser feita pelo clculo do ndice de Massa Corporal (IMC), que representa a
relao entre o peso (kg) e o quadrado da altura (m) (Tabela 7.4):
IMC = P/H2 , em que P = peso (kg)
H = altura (m)

Tabela 7.4 - Mediana e margem de IMC, segundo o sexo


Sexo IMC
Mediana Margem
Masculino 22,0 20 a 25
Feminino 20,8 19 a 24

1061
7.4.5. Termognese Induzida pela Dieta
A termognese induzida pela dieta (TID), ou efeito trmico dos alimentos, representa o aumento do gasto
energtico durante a digesto dividido pelo contedo energtico do alimento consumido. A TID varia de 5 a 10% para
carboidratos, de 0 a 5% para lipdios e de 20 a 30% para protenas. O consumo de uma dieta mista geralmente implica
em aumento equivalente a 10% do contedo energtico da dieta. A TID pode resultar em aumento considervel no gasto
energtico de repouso (GER) durante as horas que sucedem a ingesto de uma refeio. Os alimentos condimentados
intensificam e prolongam essa termognese.
A termognese pode ser tanto obrigatria quanto facultativa:
a) Obrigatria essencial promover a digesto, absoro e metabolizao dos nutrientes.
b) Facultativa o excesso de energia gasto, alm da metabolizao dos nutrientes, atribuvel a
ineficincia metablica, mediada pelo sistema nervoso simptico.

7.4.6. Atividade Fsica


A energia gasta com atividade fsica varia grandemente entre os indivduos, bem como no dia-a-dia de um
mesmo indivduo. Naqueles sedentrios, dissipada menos da metade da energia gasta para as sua atividades basais nas
24 horas do dia (GEB). Em indivduos muito ativos, a energia gasta em 24 horas pode chegar a duas vezes a energia de
repouso.
O nvel de atividade fsica normalmente expresso como a taxa do gasto energtico total pelo basal. Essa
relao tambm conhecida com fator de atividade fsica (FAF).
Na Tabela 7.5 so fornecidos alguns nveis de gasto de energia, expressos como mltiplos da TMB, de acordo
com a Food and Nutrition Board/National Research Council (NRC, 1989):

Tabela 7.5 - Gasto aproximado de energia para vrios nveis de atividade, como mltiplos da TMB
Categoria Fator de Atividade
Repouso TMB x 1,0
Dormindo, recostado
Muito Leve TMB x 1,5
Atividades assentadas ou de p, dirigindo, desenhando, trabalho de
laboratrio, datilografando, costurando, passando roupa, jogando cartas, tocando
instrumento
Leve TMB x 2,5
Andando no plano (4 a 5 km/h), garagistas, eletricistas, carpinteiros, garons,
limpando casa, cuidando de crianas, jogando pingue-pongue
Moderada TMB x 5,0
Andando no plano (6 a 7 km/h), capinando, carregando peso leve, andando
de bicicleta, jogando tnis, danando
Pesada TMB x 7,0
Subindo ladeira carregando peso, lenhadores, escavao manual pesada,
jogando basquete ou futebol, escalando

As necessidades energticas podem ser estimadas utilizando-se de fatores de atividade fsica dirios totais,
quando so conhecidos os padres gerais de atividade fsica do indivduo. Os fatores de atividade fsica (gasto
energtico x TMB) mais utilizados para clculo das necessidades energticas esto apresentados nas Tabelas 7.6, 7.7,
7.8 e 7.9.

Tabela 7.6 - Intensidade de atividade fsica por sexo, segundo a FAO/OMS (1985)
Atividade Homens Mulheres
Mnima 1,4 1,4
Leve 1,7 1,7
Moderada 2,7 2,2
Pesada 3,8 2,8

Tabela 7.7 - Intensidade de atividade fsica por sexo, segundo a FNB/NRC (1989)
Atividade Homens Mulheres
Muito leve 1,3 1,3
Leve 1,6 1,5
Moderada 1,7 1,6
Pesada 2,1 1,9
Excepcional 2,4 2,2

1071
Tabela 7.8 - Classificao da atividade fsica por sexo, segundo o SBAN (1990)
Atividade Homens Mulheres
Metabolismo basal 1,0 1,0
Mnima de sobrevivncia 1,27 1,27
Sedentria 1,4 1,4
Leve 1,55 1,55
Moderada 1,8 1,8
Intensa 2,1 2,1

Tabela 7.9 - Intensidade de atividade fsica, segundo a WHO (1995)


Atividade Fsica Mltiplos do Metabolismo Basal
Metabolismo basal 1,0
Mnima de sobrevivncia 1,27
Sedentria 1,4
Leve 1,55
Moderada 1,8
Intensa 2,1

A atividade fsica pode ser estimada por um monitor de acelerao corporal de trs dimenses. Esse monitor
empregado para a avaliao do gasto energtico com a atividade fsica, utilizando-se sensores de movimento nas
direes ntero-posterior, mdio-lateral e vertical.

7.5. Gasto Energtico Total


A Organizao Mundial de Sade (OMS) define a necessidade energtica como sendo o nvel de energia
necessrio para manter o balano entre consumo e gasto energtico, quando o indivduo apresenta peso e composio
corporal e um nvel de atividade fsica compatveis com um bom estado de sade. Ajustes devem ser feitos para
indivduos em diferentes estados fisiolgicos (crescimento, gestao, lactao e idosos).
O consumo energtico medido pelo valor energtico dos alimentos consumidos, considerando-se os fatores
fisiolgicos para o clculo, ou seja, 4 kcal/g para carboidratos e protenas e 9 kcal/g para lipdios.
O gasto energtico total estimado a partir da determinao da TMB, acrescido do gasto energtico da
atividade fsica e da TID (Tabela 7.10).

Tabela 7.10 - Exemplo de clculo das necessidades energticas de um estudante adulto do sexo masculino de 25 anos de
idade e 64 kg de peso
Atividade Fator de Atividade Horas Custo Energtico
(x TMB) (kcal)
Dormindo 1,0 8 552
Atividades ocupacionais 2,7 8 1490
Atividades livres:
Sociais 3,0 2 414
Esportes 7,0 1/2 242
Tempo restante 1,4 5 1/2 531
TOTAL 1,95 24 3230

Mais recentemente, o Institute of Medicine (IOM, 2002) estabeleceu novas equaes para calcular o
requerimento ou necessidade estimada de energia (EER), definido como o consumo de energia previsto para manter o
balano energtico de um adulto saudvel de determinada idade, sexo, peso, altura e nvel de atividade fsica,
compatvel com um bom estado de sade.
Para calcular o EER, equaes foram desenvolvidas para indivduos de peso normal (IMC de 18,5 a 25 kg/m2),
de 0 a 100 anos de idade, baseando-se em dados de gasto energtico medidos pela tcnica da gua duplamente marcada.
Para crianas e mulheres grvidas ou lactantes, o EER inclui as necessidades de deposio de tecido ou de
secreo de leite a uma taxa consistente com um bom estado de sade.
Embora seja esperada variabilidade interindividual quanto ao EER, no h RDA (margem de segurana) para
energia, uma vez que o seu consumo acima do EER resulta em ganho de peso. Para a maioria dos nutrientes, o
requerimento corresponde quantidade mdia suficiente para atingir os critrios especficos mais dois desvios-padro a
fim de atingir as necessidades de quase todos os indivduos saudveis. Entretanto, isso no se aplica para energia, visto
que o excesso desta no pode ser eliminado e se deposita na forma de gordura. Essa reserva prov o organismo durante
perodos de limitado consumo energtico, porm pode resultar em obesidade.
O conceito de UL (limite mximo tolervel) tambm no se aplica para energia, visto que qualquer consumo
acima do EER pode resultar em ganho de peso indesejvel ou, mesmo, prejudicial ao indivduo.

1081
EER para lactentes e crianas de 0 a 2 anos de idade
A necessidade total de energia para lactentes e crianas de at 2 anos de idade varia com a idade, o sexo e o
modo de alimentao da criana. A necessidade energtica aumenta com o crescimento e maior em meninos do que
em meninas. A massa livre de gordura responsvel pelas diferenas entre sexo e idade. A TID em crianas
alimentadas com frmulas infantis maior do que em crianas amamentadas com leite materno.
As equaes que definem as necessidades de energia para esse grupo no levam em considerao o sexo e a
altura da criana, uma vez que esses fatores interferem no peso e, dessa forma, somente o peso se correlaciona
diretamente com o gasto energtico total. A atividade fsica tambm no foi considerada, em razo do pequeno tamanho
amostral. Assim, o gasto energtico total (GET) dado pela equao:

GET (kcal/dia) = 89 ( DP 3) x peso da criana (kg) 100 ( DP 36)

Uma vez que as crianas nessa faixa etria se encontram em fase de crescimento, uma quota para a deposio
energtica deve ser considerada na estimativa da necessidade energtica total (EER), de forma que EER = GET +
Energia de deposio:

0-3 meses: EER = (89 x peso da criana [kg] 100) + 175 (kcal para deposio energtica)
4-6 meses: EER = (89 x peso da criana [kg] 100) + 56 (kcal para deposio energtica)
7-12 meses: EER = (89 x peso da criana [kg] 100) + 22 (kcal para deposio energtica)
13-35 meses: EER = (89 x peso da criana [kg] 100) + 20 (kcal para deposio energtica)

Recomenda-se o leite materno como nica fonte de nutrientes, inclusive de energia, para lactentes de at 4 a 6
meses de idade. Considerando um consumo mdio de 780 mL de leite materno por dia e uma densidade energtica de
650 kcal/L, o consumo energtico total dessa criana seria de 500 kcal/dia. O EER calculado pelas equaes anteriores
superior a 500 kcal/dia para muitas crianas de ambos os sexos.

EER para crianas de 3 a 8 anos de idade


Para essa faixa etria, foram levados em considerao, para a estimativa do gasto energtico total
(GET), o sexo, a idade, a altura, o peso e a atividade fsica das crianas:

EER para meninos de 3 a 8 anos


EER = GET + Energia de deposio

EER = 88,5 61,9 x idade [anos] + atividade fsica x (26,7 x peso [kg] + 903 x altura [m]) + 20 (kcal de deposio
energtica)

Em que a atividade fsica (AF) ser:


AF = 1,00, se o FAF for estimado como sendo de 1,0<1,4 (sedentrio)
AF = 1,13, se o FAF for estimado como sendo de 1,4<1,6 (pouco ativo)
AF = 1,26, se o FAF for estimado como sendo de 1,6<1,9 (ativo)
AF = 1,42, se o FAF for estimado como sendo de 1,9<2,5 (muito ativo)

EER para meninas de 3 a 8 anos


EER = GET + Energia de deposio

EER = 135,3 30,8 x idade [anos] + atividade fsica x (10,0 x peso [kg] + 934 x altura [m]) + 20 (kcal de deposio
energtica)

Em que a atividade fsica (AF) ser:


AF = 1,00, se o FAF for estimado como sendo de 1,0<1,4 (sedentrio)
AF = 1,16, se o FAF for estimado como sendo de 1,4<1,6 (pouco ativo)
AF = 1,31, se o FAF for estimado como sendo de 1,6<1,9 (ativo)
AF = 1,56, se o FAF for estimado como sendo de 1,9<2,5 (muito ativo)
EER para adolescentes de 9 a 18 anos de idade
Para essa faixa etria, as necessidades de energia so definidas para manter a sade, promover timo
crescimento e maturao e garantir um nvel desejvel de atividade fsica. O gasto energtico basal nessa faixa
altamente influenciado pela massa livre de gordura, de forma que os meninos apresentam maior necessidade de energia
e de nutrientes do que as meninas.
As equaes derivadas para a determinao da EER dos adolescentes do sexo masculino e feminino so as
mesmas utilizadas para meninos e meninas de 3 a 8 anos de idade, respectivamente, mostradas anteriormente, exceto a
energia de deposio, que passa de 20 para 25 em ambos os sexos.

1091
EER para adultos acima de 19 anos de idade
EER para homens acima de 19 anos de idade:

EER = 662 9,53 x idade [anos] + atividade fsica x (15,91 x peso [kg] + 539,6 x altura [m])

Em que a atividade fsica (AF) ser:


AF = 1,00, se o FAF for estimado como sendo de 1,0<1,4 (sedentrio)
AF = 1,11, se o FAF for estimado como sendo de 1,4<1,6 (pouco ativo)
AF = 1,25, se o FAF for estimado como sendo de 1,6<1,9 (ativo)
AF = 1,48, se o FAF for estimado como sendo de 1,9<2,5 (muito ativo)

EER para mulheres acima de 19 anos de idade:

EER = 354 6,91 x idade [anos] + atividade fsica x (9,36 x peso [kg] + 726 x altura [m])

Em que a atividade fsica (AF) ser:


AF = 1,00, se o FAF for estimado como sendo de 1,0<1,4 (sedentrio)
AF = 1,12, se o FAF for estimado como sendo de 1,4<1,6 (pouco ativo)
AF = 1,27, se o FAF for estimado como sendo de 1,6<1,9 (ativo)
AF = 1,45, se o FAF for estimado como sendo de 1,9<2,5 (muito ativo)

Exemplo:
Mulher de 30 anos de idade, 1,65 m de altura, atividade fsica pouco ativa e peso de 50,4 kg (IMC = 18,5).

EER = 354 6,91 x 30 + 1,12 x (9,36 x 50,4 + 726 x 1,65)


EER = 354 207,3 + 1,12 x (471,7 + 1.197,9)
EER = 146,7 + 1,12 x (1.669,6)
EER = 146,7 + 1.869,95
EER = 2.016,65 kcal/dia

Comparando com a equao da FAO/OMS, 1985, tem-se para essa mesma mulher:

TMB = (14,7 x P) + 496


TMB = 1.236,88 kcal/dia

GET = TMB x FAF


GET = 1.236,88 x 1,7 (atividade leve)
GET = 2.102,7 kcal/dia

EER na gravidez
O aumento no gasto energtico basal (GEB) durante a gravidez devido contribuio metablica do
tero e do feto, bem como do aumento do trabalho cardaco e respiratrio. O aumento do GEB o principal
responsvel pelo incremento da necessidade energtica na gravidez.
Durante a gestao no h variao no efeito trmico do alimento ou TID e a atividade fsica aumenta no
final da gestao, em razo do esforo decorrente do aumento de peso.
O EER durante a gravidez derivado da soma do gasto energtico total (GET) da mulher antes da
gravidez mais a alterao mdia no GET de 8 kcal/semana mais a energia de deposio durante a gravidez de
180 kcal/dia. Como o GET varia muito pouco durante o primeiro trimestre, o consumo adicional de energia
recomendado apenas nos segundo e terceiro trimestres.

EER para gestantes de 14 a 18 anos de idade:


EER = EER para adolescentes + Energia de deposio na gravidez:

1o trimestre: EER = EER da adolescente + 0 (energia de deposio na gravidez)


2o trimestre: EER = EER da adolescente + 160 kcal (8 kcal/semana x 20 semanas) + 180 kcal
3o trimestre: EER = EER da adolescente + 272 kcal (8 kcal/ semana x 34 semanas) + 180 kcal

EER para gestantes de 19 a 50 anos de idade:


EER = EER da mulher adulta + Energia de deposio na gravidez:

1o trimestre: EER = EER da mulher adulta + 0 (energia de deposio na gravidez)


2o trimestre: EER = EER da mulher adulta + 160 kcal (8 kcal/semana x 20 semanas) + 180 kcal
3o trimestre: EER = EER da mulher adulta + 272 kcal (8 kcal/ semana x 34 semanas) + 180 kcal
1101
EER na Lactao
Nos primeiros seis meses aps o parto, uma lactante bem nutrida perde cerca de 0,8 kg/ms, o que
equivalente a 170 kcal/dia (6.500 kcal/kg) de perda de peso. Assume-se uma estabilidade de peso aps os seis
meses que se sucedem o parto.
A produo de leite varia de 0,78 L/dia do nascimento at 6 meses e de 0,6 L/dia do 7o ao 12o ms.
Considerando a densidade de 0,67 kcal/L, a energia gasta diariamente na secreo do leite de 523 kcal, que
pode ser arredondada para 500 kcal/dia no primeiro semestre e 402 kcal/dia, que pode ser arredondada para 400
kcal/dia no segundo semestre de lactao.

EER para lactantes de 14 a 18 anos de idade:


EER = EER para adolescentes + Energia da secreo do leite perda de peso:

1o semestre: EER = EER da adolescente + 500 170 (Energia da secreo do leite perda de peso)
2o semestre: EER = EER da adolescente + 400 0 (Energia da secreo do leite perda de peso)

EER para lactantes de 19 a 50 anos de idade:


EER = EER da mulher adulta + Energia da secreo do leite perda de peso:
1o semestre: EER = EER da mulher adulta + 500 170 (Energia da secreo do leite perda de peso)
2o semestre: EER = EER da mulher adulta + 400 0 (Energia da secreo do leite perda de peso)

Atletas
Com pequenas excees, as recomendaes dietticas para os atletas no diferem daquelas para a populao
em geral. A quantidade de energia deve ser ajustada para alcanar ou manter um peso corporal timo para atletas de
competio e outros com atividades fsicas semelhantes. Assim como para a maioria da populao, tambm o atleta de
competio dever fazer uso de refeies em pequenos volumes e maior freqncia. Atletas com hipertrofia muscular
podero alcanar IMC acima de 25 kg/m2.

De acordo com a Food and Agriculture Organization (FAO, 2001) o requerimento energtico a ingesto de
alimentos necessria para manter o balano energtico, o que inclui a manuteno da composio e forma corporal, a
prtica de atividade fsica, a promoo do crescimento e desenvolvimento da criana, a deposio de tecidos durante a
gestao e o fornecimento de energia suficiente para a secreo de leite durante a lactao, promovendo sade para a
me e o filho.
Para adultos, a necessidade energtica calculada em funo da taxa metablica basal, atividade fsica, peso
corporal e sexo. O gasto energtico na atividade fsica estimado pelo tipo de atividade fsica realizada e pelo tempo de
durao.
A energia necessria para a gestante determinada pela necessidade do ganho de peso gestacional, associado
ao ganho de protena e gordura maternas, fetal e tecidos placentrios, aumento do metabolismo basal e atividade fsica.
O ganho de peso gestacional foi calculado, em mdia, em 12,5 kg e o peso da criana ao nascer, em torno de 3,4 kg. O
aumento do metabolismo basal devido acelerada sntese de tecidos, aumento do trabalho cardiorrespiratrio e da
massa muscular. O aumento do metabolismo basal de 5, 10 e 25% no primeiro, segundo e terceiro trimestres,
respectivamente, o que corresponde a 20, 85 e 310 kcal/dia para um ganho de 12 kg durante toda a gestao. A energia
de deposio durante a gravidez recomendada por causa da ineficincia do organismo na utilizao de energia
proveniente das gorduras e protenas em 10%, sendo recomendados os acrscimos de 85, 285 e 475 kcal /dia durante o
primeiro, segundo e terceiro trimestres de gestao.
A necessidade total energtica durante a lactao igual necessidade da pr- gestante, porm h demanda
maior de energia para a produo e secreo do leite. O acmulo de gordura durante a gestao cobre parte da energia
gasta para a produo do leite nos primeiros meses.

7.6. Consideraes Finais


Alteraes no peso invariavelmente ocorrem em condies de aumento ou diminuio do consumo energtico.
Alguns trabalhos tm evidenciado que a magnitude de reduo no gasto energtico maior quando o consumo de
energia mais reduzido do que o correspondente aumento no gasto energtico quando o consumo de energia
aumentado. Quando um indivduo recebe excesso de energia na dieta, porm limitado, ele ir inicialmente ganhar peso.
Entretanto, aps algumas semanas seu gasto energtico ir aumentar, devido ao incremento do seu tamanho corporal, de
modo que o seu peso eventualmente ir se estabilizar. Uma reduo no consumo alimentar ir produzir efeito contrrio.
provvel que para a maioria dos indivduos o principal mecanismo de manuteno do peso corporal se d
prioritariamente pelo controle do consumo energtico do que pelo aumento da atividade fsica.
Indivduos, especialmente crianas desnutridas (com dficit energtico), apresentam alteraes na sua
composio corporal, assim como menor desempenho escolar, retardo no crescimento sseo e maior suscetibilidade a
infeces. Em adultos, um baixo IMC est associado a uma menor capacidade de trabalho e menor disposio para a

1111
atividade fsica voluntria.
IMC acima de 25 kg/m2, no entanto, est associado a maior risco de mortalidade prematura devido a diabetes
do tipo 2, hipertenso, doenas cardiovasculares, infarto, osteoartrite e alguns tipos de cncer.
Assim, em diversos estudos sugere-se buscar manter o IMC de 22 kg/m2 ao final da adolescncia, a fim de
garantir um possvel aumento de peso na idade adulta, sem que o IMC ultrapasse os 25 kg/m2.

7.7. Referncias
DIENER, J. R. C. Calorimetria indireta. Rev. Ass Med Brasil, v. 43, n. 3, p. 245-53, 1997.

FAO/WHO/UNU Expert Consulation Report on Human Energy Requirement, 2001.

INSTITUTE of MEDICINE. Dietary reference intakes Energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol,
protein, and amino acids. Washington, D.C.: The National Academy Press, 2002. Part 1, 484 p.

JQUIER, E. Methods of measuring energy expenditure and substrate utilization, Diabetes Reviews, v. 4, n. 4, p. 423-
431, 1996.

LABAYEN, I.; LOPES-MARQUS, J.; MARTNEZ, J. A. Mtodos de medida del gasto energtico, Nutricin
Clnica, v., 15, n. 6, p. 7-17, 1997.

LIVESEY, G. Thermogenesis associated with fermentable carbohydrate in humans, validity of indirect thermogenesis
for energy requirements, food energy and body weight. Internacional Journal of Obesity, v. 26, p. 1553- 1569, 2002.

RAVUSSIN, E.; SWINBURN, B. A. Energy Metaboism. In: Obesity: theory and therapy. 2. ed. [S.l.]: Raven Press,
1993. Cap.6, p. 97-123.

SCHUTZ, Y. The basis of direct and indirect calorimetry and their potentials. Diabetes/ Metabolism Reviews, v. 11, n.
4, p. 383- 408, 1995.

SCHUTZ, Y.; DEURENBERG, P. Energy metabolism: Overview of recent methods used in human studies, Ann Nutr
Metab, v. 40, p. 183, 1996.

1121
Captulo 8 - VITAMINAS
Maria do Carmo Gouveia Peluzio
Vanessa Patrocnio de Oliveira

8.1. Introduo
Vitaminas so compostos orgnicos que participam de importantes processos celulares, sendo essenciais para a
manuteno das funes orgnicas (crescimento, metabolismo e integralidade) e, em pequenas quantidades, para o
funcionamento adequado do organismo humano. Distinguem-se dos macronutrientes por no serem catabolizadas a CO2
e H2O - conferindo energia s clulas e nem usadas em carter estrutural.
A primeira preparao de alimento com nutrientes especficos incorporados foi um concentrado anti-beribri,
introduzido por Funk e Hopkins em 1912. O fator introduzido foi uma amina, que sendo necessria vida, recebeu o
nome de vitamina. Apesar de o seu estudo ter sido intensificado apenas no sculo XX, relatos de doenas provocadas
por deficincia de vitaminas vo desde os primrdios da humanidade. Nos esqueletos dos homens pr-histricos foram
encontradas evidncias claras de deficincia de vitamina D (raquitismo) e vitamina C (escorbuto). Na Antigidade,
eram de conhecimento mdico os sintomas da deficincia de vitamina B1 (beribri) e vitamina A (cegueira noturna),
sintomas que tambm so relatados em vrios manuscritos da Era Crist.
At recentemente, acreditava-se que a principal funo das vitaminas era evitar as doenas causadas por
deficincia aguda desses compostos orgnicos. Hoje, alguns estudos, tm evidenciado o seu uso profiltico com o
emprego de suplementos vitamnicos.
Durante o sculo XX foram isoladas, identificadas (inicialmente atravs de letras do alfabeto e posteriormente
por meio de nomes qumicos) e sintetizadas quimicamente. Descobriram-se ento, a grande variedade na composio
qumica e a funo das vitaminas, que vai desde a atuao como coenzima sntese de hormnios, regulao no
catabolismo de macronutrientes, antioxidante e substrato de reaes qumicas.
As vitaminas so classificadas de acordo com a sua solubilidade, em dois grupos:
Vitaminas lipossolveis(imiscveis em gua): vitaminas A, D, E e K.
Vitaminas hidrossolveis(miscveis em gua): vitaminas B1, B2, B3, B5, B6, B7, B9, B12 e C.
As necessidades de vitaminas, de acordo com os valores de referncia Dietary Reference Intakes (DRI) ou
tambm conhecidas como Ingesto Diettica Recomendada (IDR), so as mesmas tanto para indivduos saudveis
quanto para diabticos. Estes valores foram desenvolvidos para as populaes americana e canadense e, portanto,
devem ser utilizados com bastante cautela.

8.2. Recomendao e adequao:


A ingesto adequada de vitaminas dentro dos valores recomendados (IDR-2000) previne doenas ocasionadas
por deficincias e importante para a manuteno da sade e bem-estar dos indivduos.
Para a formulao das quantidades de vitaminas que um indivduo necessita diariamente, foram formados
Comits de Especialistas pelo Food and Nutrition Board, pelo Institute of Medicine da National Academy of Sciences
dos Estados Unidos e pelo Health Canad (2000). Os valores de referncia propostos so: Estimated Average
Requeriment (EAR), Recommended Dietary Allowance (RDA), Adequate Intake (AI) e Tolerable Upper Intake Level
(UL) (Tabela 8.1).
A RDA o nvel de ingesto dirio que suficiente para os requerimentos de aproximadamente todos os
indivduos saudveis (97-98%) dentro das especificidades para sexo, idade, estgio de vida e condies fisiolgicas. Na
situao de insuficincia da informao para estabelecer a necessidade pela RDA utiliza-se o valor mdio de ingesto
do nutriente por um grupo de indivduos (AI) (Institute of Medicine, 2006).
As recomendaes foram desenvolvidas a partir de pesquisas sobre a alimentao de indivduos considerados
saudveis, avaliao da ingesto alimentar e nutricional, experimentaes animais, estudos clnicos e informaes
epidemiolgicas sobre alimentao e doenas populacionais. So utilizadas com os objetivos de planejar e avaliar a
ingesto alimentar de grupos e indivduos.

Observao: Para grupos selecionados, como indivduos idosos, mulheres grvidas ou em lactao,
vegetariano estrito, indivduos com dietas restritas em calorias, a suplementao com complexos multivitamnicos
aconselhvel.

1131
Tabela 8.1 - IDR das vitaminas para diferentes fases do ciclo de vida:
RDA/AI* UL
Lactentes (meses)* Crianas Mulheres Homens
(Anos) (Anos) (Anos)
0-6 7-12 1-3 4-8 9-13 14-18 19-50 51-70 >70 9-13 14-18 19-50 51-70 >70
Vitamina A 400 500 300 400 600 700 700 700 700 600 900 900 900 900 3.000
g/dia
Vitamina D 5 5 5 5 5 5 5 10 15 5 5 5 10 15 50
g/dia
Vitamina E 4 5 6 7 11 15 15 15 15 11 15 15 15 15 1.000
mg/dia de alfa-tocoferol
Vitamina K 2 2,5 30 55 60 75 90 90 90 60 75 120 120 120 DI
g/dia *
Tiamina 0,2 0,3 0,5 0,6 0,9 1,0 1,1 1,1 1,1 0,9 1,2 1,2 1,2 1,2 DI
mg/dia
Riboflavina 0,3 0,4 0,5 0,6 0,9 1,0 1,1 1,1 1,1 0,9 1,3 1,3 1,3 1,3 DI
mg/dia
Niacina 2 4 6 8 12 14 14 14 14 12 16 16 16 16 35
mg/dia
cido Pantotnico 1,7 1,8 2,0 3,0 4,0 5,0 5,0 5,0 5,0 4,0 5,0 5,0 5,0 5,0 DI
mg/dia*
Vitamina B6 0,1 0,3 0,5 0,6 1,0 1,2 1,3 1,5 1,5 1,0 1,3 1,3 1,7 1,7 100
mg/dia
Biotina 5 6 8 12 20 25 30 30 30 20 25 30 30 30 DI
g/dia*
cido Flico 65 80 150 200 300 400 400 400 400 300 400 400 400 400 1.000
g/dia do equivalente diettico ao folato
Vitamina B12 0,4 0,5 0,9 1,2 1,8 2,4 2,4 2,4 2,4 1,8 2,4 2,4 2,4 2,4 DI
g/dia
Vitamina C 40 50 15 25 45 65 75 75 75 45 75 90 90 90 2.000
mg/dia
DI: Dados insuficientes
Fonte: IDR (Institute of Medicine, 2001)

1 114
8.3. Vitaminas Lipossolveis
Grupo de substncias orgnicas sem valor energtico, com vrias estruturas celulares essenciais ao
organismo humano, sendo necessria sua ingesto via alimentao. Por serem insolveis em gua, so
necessrias a sua absoro, a presena de bile e a formao dos quilomicrons para seu transporte. Na
circulao so transportadas por protenas especficas, como as vitaminas A e D, ou ligadas a lipoprotenas
como as vitaminas E e K. A principal via de excreo dessas vitaminas a fecal, as quais, no organismo, so
armazenadas fgado (vitamina A) e tecido adiposo (Vitaminas D e E).

8.3.1. Vitamina A
8.3.1.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
Relatos sobre a atividade dessa vitamina vm desde a Antigidade, como no Egito, relacionando-se a
distrbios da viso. Em 1913, foi publicado o primeiro trabalho relacionando vitamina A, presente em
alimentos lipdicos de origem animal, com o crescimento e desenvolvimento adequados. Nas dcadas de 1920
e 1930, foram elucidadas as relaes tnues entre a vitamina A e o crescimento, xeroftalmia, diferenciao
celular e resistncia a infeces. Nessa poca foi tambm proposta a estrutura qumica da vitamina A.
Sua estrutura est relacionada a um lcool lipdico, de massa molecular de 286,46: o Retinol (Figura
8.1). Descreve uma famlia de compostos lipossolveis. Apresenta-se como leo de cor amarelada ou em
slido cristalino, forma mais estvel da vitamina. sensvel oxidao na presena de luz, calor e meio cido,
convertendo-se em um aldedo (retinal ou retinaldedo) e, posteriormente, em cido carboxlico (cido
retinico). Existem espcies em alimentos de origem vegetal determinadas carotenides, que apresentam
atividades de pr-vitamina A e so convertidos em retinol pelo organismo.

Figura 8.1- Estrutura qumica do retinol e -caroteno

O termo genrico vitamina A refere-se aos retinides (retinol e seus derivados metablicos e
sintticos) e aos carotenides com atividade pr-vitamnica, ou seja, so precursores do retinol, a forma ativa
da vitamina. Essa vitamina essencial para a viso, proliferao e diferenciao celulares e a integridade do
sistema imune.
Os carotenides so pigmentos naturais que conferem cores aos alimentos, que vo do amarelo ao
vermelho. So classificados, segundo a sua estrutura qumica, em , e -caroteno, licopeno, lutena,
criptoxantina e zeaxantina (xantofilas), sendo que os trs ltimos no possuem atividade pr-vitamnica. O -
caroteno o carotenide de maior atividade pr-vitamnica e possui dois anis -ionona, formando em sua
hidrlise duas molculas de retinol.

8.3.1.2. Metabolismo
Os alimentos-fonte fornecem a vitamina A em duas formas: vitamina A pr-formada (steres de
retinol) nos alimentos de origem animal e carotenides pr-vitamina A, oriundos de alimentos de origem
vegetal. Sofrem a ao de enzimas digestivas e so emulsificados pela bile para posterior absoro pelo
entercito. A absoro em nvel fisiolgico saturvel, com uma eficincia de 70-90% dos steres de retinol
ingeridos. Porm, em doses farmacolgicas o processo absortivo no-saturvel, constituindo ponto
importante na toxicidade da vitamina A pr-formada. Os carotenides so clivados a retinal e, posteriormente,
a retinol, sendo a eficincia de absoro desses compostos de 50-60%, o que depende da biodisponibilidade,
sendo essa eficincia inversamente proporcional ingesto do nutriente.
Uma vez nos entercitos, o retinol esterificado com cidos graxos de cadeia longa, e no retculo
endoplasmtico so agrupados aos lipdios neutros (triacilgliceris, steres de colesterol e fosfolipdios),

115
formando o ncleo dos quilomicrons. Estes, por sua vez, so absorvidos pelo sistema linftico, levados ao
sistema circulatrio e metabolizados pelo fgado.
Cerca de 40-50% da vitamina A absorvida armazenada no fgado. Este rgo responsvel por 90%
da reserva corporal do nutriente sob a forma de steres retinlicos, permitindo a manuteno dos nveis
plasmticos do nutriente mesmo sem o seu consumo contnuo, 20% dela excretada pelas fezes, 17% pela
urina e 3% pela transpirao.

8.3.1.3. Funes
Viso
a mais conhecida funo da vitamina A, relacionada preveno da cegueira noturna e ao
melhoramento da acuidade visual. necessria aos olhos por dois aspectos: como 11-cis-retinal, atuando na
transduo de luz em sinais neurais na retina, e como cido retinico, mantendo a diferenciao normal das
clulas constituintes dos olhos e prevenindo a xeroftalmia.
As clulas fotossensveis da retina, cones (percepo de cores na luz clara) e bastonetes (percepo de
movimentos e viso noturna) possuem protenas denominadas opsinas, que, com o 11-cis-retinal formam uma
unidade (rodopsina nos bastonetes e opsinas nos cones) essencial para a captao de luz em diferentes
comprimentos de onda. No processo, a luz atinge o complexo rodopsina/opsina, isomerizando a ligao 11-cis
11-trans e dissociando o complexo em opsina e retinal-trans, o qual reduzido retinol-trans na presena de
NADH e lanado na circulao, onde ocorre o processo inverso e o complexo rodopsina/opsina
reconstitudo. Nos processos de desintegrao da rodopsina/opsina e isomerizao do retinol acontecem a
liberao de energia, a ativao do nervo ptico e a excitao nervosa que ocasiona a viso.
A deficincia da vitamina leva lentido no processo da regenerao da rodopsina aps o estmulo
luminoso, processo esse definido como cegueira noturna.
Tecidos da retina, crnea e conjuntiva ptica dependem de cido retinico para a manuteno de sua
integridade estrutural. A vitamina A liberada via secreo lacrimal. A deficincia de vitamina A leva ao
ressecamento das conjuntivas da crnea (xerose) e formao de depsitos de clulas e bactrias denominados
manchas de Bitt. A evoluo da deficincia pode levar queratomalacia, lcera da crnea e,
conseqentemente a uma cegueira irreversvel.

Diferenciao e Integridade Celular


O cido retinico capaz de estimular clulas-tronco a se diferenciarem em clulas maduras e
pararem a proliferao celular. Podem tambm induz, algumas vezes, a apoptose. Essas atividades conferem ao
retinol propriedades anticarcinognicas e contribuem para o desenvolvimento fetal normal.
Est relacionado biossntese de mucossacardeos, responsveis pela lubrificao intercelular, alm
de atuar como cimento flexvel de adeso celular. Na deficincia da vitamina ocorre a queratinizao de
epitlios (reduzindo a funo protetora de alguns epitlios como o respiratrio, o digestivo e o urinrio),
tornando a pele seca e sem brilho.

Desenvolvimento e Crescimento
O cido retinico necessrio para o desenvolvimento fetal ps-gastrulao, uma vez que, ao ligar em
seus receptores, ativa genes responsveis pela regulao da morfognese, como o Hox. Contribui para o
crescimento, induzindo osteoblastos a produzir colgeno e glicoprotenas (matria orgnica do osso), por meio
da sntese do cido condroitina sulfrico.

Imunidade
A deficincia de vitamina A est associada a aumento na incidncia de certos tipos de infeces. A
vitamina A parece influir nos sistemas sinalizadores da resposta imunolgica adequada, no havendo contudo,
alterao nas estruturas imunolgicas na deficincia retinica.

8.3.1.4. Recomendaes:
As ingestes recomendadas de vitamina A so expressas em microgramas de equivalente retinol por
dia (g ER/d). A necessidade varia de acordo com o grupo populacional e estado metablico, como visto na
Tabela 2 (DRI de vitamina A nas diversas fases da vida).
O clculo da quantidade total de vitamina A em g ER, nos alimentos como segue abaixo :
gER = vitamina A pr-formada*(g) + 1/6 -caroteno(g) + 1/12 outros carotenos
precursores de vitamina A (g)
*Alimentos de origem animal.

A ingesto excessiva de retinol pode levar a efeitos txicos no organismo, provocando a secura de
mucosas, raleamento dos cabelos, unhas quebradias, dores sseas e articulares, esplenomegalia, cefalia,

116
vmitos, descamao, alteraes hepticas, hemorragia e coma. Os retinides so capazes de inserir, expandir
e desestabilizar membranas, levando s rupturas de clulas e organelas celulares como lisossomos. Os
retinides tambm possuem efeito teratognico, sendo seu consumo em excesso associado malformao
congnita e abortos espontneos.
A ingesto elevada de -caroteno parece no ser txica, apesar de o consumo macio desse nutriente
levar a carotenodermia, em que a sola dos ps e mos tornam-se amarelados ou alaranjados. O efeito
reversvel com a diminuio do consumo.

8.3.1.5. Fontes
As fontes de vitamina A pr-formadas so alimentos de origem animal, como fgado, gema de ovo,
leite, manteiga, margarina (vitamina adicionada), atum, queijo, creme de leite e leite em p integral. Os
carotenides pr-vitamnicos so encontrados em alimentos de origem vegetal principalmente, frutas,
hortalias amarelas e vermelhas e hortalias verdes, como podem tambm ser encontrados em alguns
alimentos de origem animal, como gema de ovo, leite e manteiga.

Vitamina A e Diabetes Mellitus


A vitamina A e os carotenides parecem estar envolvidos no Diabetes Mellitus (DM). Estudos
epidemiolgicos sugerem efeito benfico na ingesto de vegetais fontes de carotenides na diminuio do risco
de desenvolvimento do DM (SARGENT et al., 2001; MONTONEN et al., 2004; YLNEN et al., 2003;
COYNE et al., 2005b).
Em modelos experimentais de DM induzido por streptozotocina (STZ), os nveis sricos de retinol se
correlacionaram com a proteo das clulas pancreticas (CHETOW et al., 1989). Os nveis de retinol
sricos apresentam-se mais baixos, apesar de os estoque hepticos se apresentarem notadamente mais
elevados. O tratamento do DM com insulina, por sua vez, proporcionou melhora no metabolismo da vitamina
A, indicando uma ligao entre o estado dessa vitamina e a secreo da insulina (CHETOW et al., 1987;
TUITOEK et al., 1996).
Estudo com a suplementao de vitamina A em pacientes diabticos tipo 1, em que os nveis sricos
de retinol esto abaixo dos parmetros normais, evidencia efeito benfico (GRANADO et al., 1998), porm o
uso da suplementao diettica com vitamina A como terapia do diabetes precisa de maiores evidncias
cientficas para ser adotado com segurana (ADA, 1996). Em estudos com animais, a suplementao com
vitamina A parece diminuir a glicosria e a hiperglicemia (SEIFER et al.,1981).
Os mesmos efeitos no ocorrem com os carotenides, mesmo estes sendo pr-vitamnicos A. LIU et
al. (1999), em um estudo clnico de interveno randomizado, com homens eutrficos recebendo
suplementao alimentar de -caroteno e sem a pr-vitamina (placebo), por 12 anos, no verificaram efeito
dessa suplementao alimentar, em indivduos saudveis na reduo do risco de desenvolvimento do DM tipo
2. FORD, et al. (1999) avaliaram os nveis plasmticos de cinco tipos de carotenides em 1.665 indivduos,
subdivididos em quatro diferentes grupos, segundo o nvel de tolerncia glicose (normoglicmicos, baixa
tolerncia glicose, diabticos diagnosticados recentemente e diabticos com diagnstico antigo). O estudo fez
parte do 3rd National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES III) e relatou que os nveis
plasmticos de licopeno e -caroteno eram maiores em indivduos normoglicmicos do que naqueles com leve
tolerncia a glicose.
Sabe-se que o estresse oxidativo, desbalano entre a produo de espcies reativas e as defesas
antioxidantes do organismo, est envolvido no desenvolvimento do DM tipo 1 e na progresso do DM tipo 2
(GIUGLIANO et al. , 1995; RUHE et al., 2001). Sua ao na progresso do DM est envolvida com a
hiperglicemia, hiperinsulinemia e resistncia insulnica, que aumentam a produo de espcies reativas que
contribuem ainda mais para o estresse oxidativo (PAOLISSO; GIUGLIANO, 1996) que pode estar aqum da
capacidade da defesa antioxidante do organismo (MAXWELL et al., 1997). Os carotenides podem estar
reduzidos em indivduos diabticos, pois fazem parte da defesa antioxidante, principalmente no estresse
oxidativo provocado pela intolerncia glicose (COYNE et al., 2005a).

8.3.2. Vitamina D
8.3.2.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade:
Esta vitamina faz parte do grupo de compostos lipossolveis de origem vegetal e animal, com
atividade anti-raquitismo (PINTO; PENTEADO, 2003). originria de fitoplnctons do oceano, funcionando,
a princpio, como filtro solar, pois absorve a radiao ultra-violeta ou como um sinal fotoqumico (HOLICK,
2003).
Possuem uma estrutura esteride, variando de acordo com a origem do composto. Os tecidos vegetais
produzem o ergocalciferol (vitamina D2) e os tecidos animais, o colecalciferol (vitamina D3), diferindo-se na
estrutura devido apenas presena de uma insaturao no carbono 22 do ergocalciferol (Figura 8.2). Para

117
realizao de suas funes biolgicas, necessrio que a vitamina D se transforme em sua forma ativa, atravs
de hidroxilaes no rim e no fgado (PINTO; PENTEADO, 2003).

Figura 8.2 - Provitamina D e vitamina D ativa.

As vitaminas D3 e D2 so compostos cristalinos de coloraes branca e amarela, insolveis em gua,


suscetveis oxidao pela presena de luz , oxignio, temperatura ambiente e meio cido.
normalmente produzida em quantidades adequadas nos seres humanos e nos animais submetidos
exposio solar regular, uma vez que a luz UV tem importante funo na ativao da vitamina.
Pode ser considerada um hormnio, ao invs, de uma vitamina, uma vez que produzida na pele e
tem como principais rgos-alvo os rins, intestino delgado e ossos, alm da presena de receptores em tecidos
no relacionados a homeostase ssea, como pncreas, crebro, pele, estmago, corao, gnadas e linfcitos T
e B ativados (HOLICK, 2004).

8.3.2.2. Metabolismo
Assim como a vitamina A, a vitamina D aps a ingesto solubilizada nas micelas emulsificadas pela
bile, para absoro com uma eficincia entre 55-99%, sendo o transporte na circulao linftica por meio dos
quilomicrons. Na circulao sangnea, tanto a vitamina quanto seus metablitos so transportados por uma
protena ligadora de vitamina D, que leva o composto aos tecidos-alvo. Os tecidos adiposo e muscular
esqueltico constituem os principais estoques da vitamina.
A vitamina D proveniente da dieta e sintetizada na pele transportada ao fgado e sofre a ao da
enzima 25-hidroxilase, que adiciona ao carbono 25 da molcula um oxignio, formando o 25-hidroxivitamina
D ou calcidiol, uma forma inativa da vitamina. Esse metablito a principal forma circulante da vitamina,
sendo seus nveis parmetros para avaliao da concentrao de vitamina D no organismo.
Nos rins, o calcidiol sofre ao de outras duas hidrolases formando os metablitos 1,25-
dihidroxivitamina D ou calcitriol e a 24,25-hidroxivitamina D. O calcitriol considerado a forma ativa da
vitamina, responsvel por suas funes no organismo. A 24,25-hidroxivitamina D tem ao na via de
desintoxicao da vitamina D e supresso do hormnio paratireoidiano.
A produo de calcitriol regulada de acordo com a necessidade de clcio no organismo, sendo
influenciada pelos nveis de clcio, fsforo e paratormmio plasmticos. A principal via de excreo da
vitamina D a fecal, com o auxlio dos cidos biliares.

8.3.2.3. Funes
As principais funes da vitamina D no organismo humano esto relacionadas ao metabolismo dos
minerais, clcio e fsforo, contribuindo, assim, para a mineralizao ssea, sustentao das funes
neuromusculares e os processos celulares dependentes desses minerais.

Homeostase dos nveis de clcio e fsforo

118
Nos intestinos, a vitamina D responsvel pela induo da sntese de protenas, como a calbindina,
responsvel pela absoro intestinal de clcio, e estimula o transporte ativo de fosfato. No paratormnio
(PTH), mobiliza os estoques de clcio dos ossos para a manuteno dos nveis plasmticos adequados do
mineral, assim como possui influncia na reabsoro do mineral, mobilizando tambm o fosfato do osso para
manter seus nveis plasmticos.
A deficincia da vitamina D pode levar ao raquitismo em crianas, ossos amolecidos e sujeitos
deformidades, e osteomalcia em adultos, quadro clnico em que os ossos e dentes ficam enfraquecidos mais
suscetveis a fraturas.
Por estar intimamente ligada ao metabolismo sseo, a vitamina D usada no tratamento da
osteoporose, alm de ser fundamental para o crescimento e desenvolvimento infantil.

Proliferao e Diferenciao Celular


Exerce efeito no crescimento e diferenciao de clulas da pele, principalmente na produo de
queratincitos. Tambm parece ter influncia na diferenciao de clulas da medula ssea, sendo importante
no tratamento de leucemias.

Preveno de Doenas
Estudos utilizando modelo animal (camundongos), evidenciam que a vitamina D pode prevenir o
desenvolvimento de doenas auto-imunes, como o DM tipo 1. Sua ao est ligada a receptores nucleares de
vitamina D, fator transcricional, em clulas do sistema imune e em clulas das ilhotas do pncreas.
GIARRATANA et al. (2004) em estudo in vivo (modelo animal) e in vitro (cultura de clulas pancreticas
humanas), utilizando um anlogo da vitamina D (BXL-219), observaram reduo no desenvolvimento do DM
tipo 1 (auto-imune) por retardar a progresso da resposta inflamatria s ilhotas, diminuindo a produo de
quimiocinas pr-inflamatrias, inibindo a infiltrao de lifcitos B no tecido pancretico via inibio da
expresso de TRL (molculas de superfcie que reconhecem diferentes estruturas patognicas, induzindo a uma
resposta inflamatria).
A ativao dos receptores de vitamina D est ligada inibio de genes relacionados produo de
interleucinas pr-inflamatrias (IL-2, IL-4 e IL-12), fator de necrose tumoral- (TNF- ) e interferon-
(JONES et al., 1998). O polimorfismo desse receptor est ligado ao desenvolvimento do DM tipo 1. A
alterao de um simples nucleotdeo no gene de expresso do receptor poderia aumentar o risco de
desenvolvimento da doena. Porm, NEJENTSEV et al. (2004) verificaram que fatores ambientais, como a
ingesto de vitamina D, sejam na dieta ou via suplementao, exercem maior influncia no desenvolvimento
de DM tipo 1 que a alterao gentica mais comum do receptor, em populao do Reino Unido, Finlndia
(TURPEINEN et al., 2003), Noruega, Romnia e Estados Unidos. Resultado semelhante ao encontrado para as
populaes alem e indiana, onde houve associao positiva entre o receptor nuclear de vitamina D e seus
diferentes alelos e a suscetibilidade de desenvolvimento de DM tipo 1 (PANI et al., 2000; McDERMOTT et
al.,1997).
Em indivduos com insuficincia renal, a suplementao com vitamina D melhora a secreo de
insulina, resistncia insulina e intolerncia glicose. Porm, o mecanismo pelo qual a vitamina D atua ainda
no est elucidado (BAYNES et al., 1997).
A deficincia de vitamina D est associada a nveis altos de PTH, que em excesso pode reduzir a
tolerncia glicose (PROCPIO; BORRETTA, 2003) e induzir a secreo de citocinas inflamatrias
(MITNICK et al., 2001).
Na ausncia de exposio ao sol, a ingesto de vitamina D deve ser aumentada. Em idosos, cuja
capacidade de sntese de vitamina D ativa est reduzida, recomenda-se ateno nas fontes alimentares dessa
vitamina.
O excesso de ingesto de vitamina D pode levar a toxicidade e efeitos adversos, como a hipercalcemia
e calcificao de tecidos moles.

8.3.2.4. Fontes
A vitamina D3 encontrada em alimentos de origem animal, como peixes gordurosos (salmo,
sardinha, bacalhau e arenque), gema de ovo, fgado, leite e derivados. A vitamina D2, presente em alimentos de
origem vegetal, encontrada predominantemente em leveduras e cogumelos comestveis. Os vegetais so fontes
pobres de vitamina D, sendo que os cereais e as frutas no apresentam essa vitamina.

8.3.3. Vitamina E
8.3.3.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade:
A princpio denominada vitamina da esterilidade, a vitamina E um componente lipoflico essencial
para o organismo. O termo vitamina E designa oito compostos, divididos em duas sries distintas: os
tocoferis e os tocotrienis (Figura 8.3)

119
Dos oito compostos derivados do termo vitamina E, o -tocoferol o que apresenta maior atividade
biolgica. Em sua estrutura, o grupo hidroxila ligado ao anel aromtico possui grande importncia, uma vez
que cumpre a sua funo biolgica e permite a esterificao para a formao do componente comercial.
A diferena entre os compostos se encontra na posio ocupada pelos grupos metil do anel aromtico.

E
A

F
B

C G

D H

A vitamina E sensvel oxidao na presena de oxignio, luz UV, lcalis, ons metlicos (Fe e Cu)
e perxidos lipdicos. Assim, durante o processamento e armazenamento de alimentos ricos dessa vitamina,
podem ocorrer perdas considerveis, resultando na diminuio do valor nutricional dos alimentos.

8.3.3.2. Metabolismo
Os steres tocofers, quando presentes na dieta, so hidrolisados em tocoferis livres, por meio da
ao de enzimas esterases oriundas do pncreas. Aps a emulsificao pelos sais biliares, a vitamina
absorvida, de forma passiva, pelo entercito. No meio intracelular, incorporado aos quilomicrons, que, por
sua vez, so secretados no sistema linftico e, posteriormente, na corrente sangunea.
Durante o catabolismo dos quilomicrons, parte da vitamina E presente na estrutura incorporada a
outras lipoprotenas circulantes, principalmente a lipoprotena de alta densidade (HDL), uma vez que, com a
ao da lpase lipoprotica, o ncleo lipdico se torna menor e o excesso de superfcie transferido para a
HDL. Essa lipoprotena , ento, responsvel pelo transporte e incorporao da vitamina nas outras
lipoprotenas circulantes no plasma, por meio da protena de transferncia de fosfolipdio.
Seus nveis na corrente sangunea so regulados pela protena heptica de transferncia de -
tocoferol, sendo esta tambm responsvel pela incorporao da vitamina nas lipoprotenas nascentes de muito
baixa densidade (VLDLs).
A excreo se d por via fecal, atravs dos sais biliares. Seu local de armazenamento no tecido
adiposo.

8.3.3.3. Funes
Antioxidante
Sendo o melhor antioxidante lipoflico biolgico na defesa contra efeitos nocivos dos radicais livres,
principalmente na proteo dos tecidos musculares contra leses oxidativas, o -tocoferol, forma mais reativa
de vitamina E, absorvido de forma ineficiente pelo intestino, atravs do sistema linftico. As lipases
produzidas pelo pncreas e a bile so necessrias na absoro da forma lipossolvel da vitamina E. steres de
acetato e succinato de -tocoferil so primeiro hidrolisados para produzir -tocoferol.

Preveno de Doenas
H evidncias de que a vitamina E exerce papel importante, modulando a sntese de prostaglandinas e,
como conseqncia, a agregao de plaquetas. Observou-se que, durante o processo de agregao de plaquetas,
h peroxidao de lipdios. Diversos trabalhos demonstraram o efeito protetor da vitamina E como
antioxidante, interrompendo reaes em cadeia na peroxidao lipdica e protegendo os cidos graxos
poliinsaturados das membranas celulares. Demonstraram tambm o seu papel na preveno contra danos

120
oxidativo, atuando ao lado das enzimas antioxidantes catalases, peroxidases e superxido dismutase,
estabilizando membranas e debelando as espcies reativas de oxignio (ROS) contra danos nas bases do DNA,
nas protenas, noscarboidratos e nos lipdios. Outras funes da vitamina E ou seus anlogos, como inibio e
potenciao do metabolismo do cido araquidnico, interaes da vitamina E durante a proliferao e
diferenciao de clulas, seu efeito sob a ativao do NF-kB e ativao da protena quinase C, so tambm
relatadas em alguns dos estudos, com a finalidade de demonstrar o importante papel dessa vitamina no
organismo de animais e humanos.
O efeito do tocoferol na preveno de hipercolesterolemia e arteriosclerose ainda controverso.
Variaes no contedo de -tocoferol de LDL e no contedo de cidos graxos poliinsaturados, perxidos pr-
formados, relao protena-colesterol, so algumas das indagaes quanto resistncia oxidao da LDL.
ESTERBAUER et al. (1997), relataram que a ubiquinol-10 seja mais eficiente na inibio da oxidao da LDL
do que o -tocoferol. A concentrao do ubiquinol-10 em LDL 10 vezes menor, em relao concentrao
do tocoferol, sendo duvidoso que tais concentraes to baixas contribuam na extenso da fase lag na oxidao
da LDL.

Atividade de Outras Vitaminas


Auxilia a atividade da vitamina A, por evitar sua oxidao e conseqente perda no trato
gastrointestinal. O mesmo ocorre com a vitamina C em alimentos.

8.3.3.4. Recomendaes
Em 1968, a vitamina E foi oficialmente considerado um nutriente essencial, sendo estabelecido
primeira recomendao de 30 UI por dia para um homem adulto. Contudo, aps estudos experimentais e
clnicos, as recomendaes foram revisadas e os valores passaram a ser expressos em equivalentes de -
tocoferol (-TE), em que 1mg de -TE igual a 1 mg do ismero RRR--tocoferol. Os demais ismeros
devem ser convertidos, multiplicando-se as miligramas de cada ismero pelo fator de atividade relativo (RRR-
-tocoferol por 0,5 e RRR--tocoferol por 0,1). Em UI, o fator de converso de 1,49 UI/1 mg -TE.
A deficincia da vitamina E pode causar disfunes neurolgicas, miopatias e atividade plaquetria
anormal. Em recm-nascidos prematuros, causa anemia hemoltica devido ao aumento da sensibilidade de
membranas celulares e ao estresse oxidativo. Geralmente, a causa da deficincia envolve alteraes no
metabolismo lipdico, na fase absortiva ou de transporte em lipoprotenas. Em recente pesquisa, os autores
relataram que a dose mnima de 400 UI de vitamina E por dia em indivduos sadios produz aumento
significativo na resistncia de oxidao da LDL. Desse modo, uma nica dose com quantidade 10 vezes maior
que o recomendado diariamente para adultos dispensaria a suplementao pela dieta.
Na suplementao com a vitamina E, observa-se o efeito benfico do antioxidante sob a ao da
insulina e diminuio da relao glutationa reduzida/glutationa oxidada, indicando melhor proteo contra
estresse oxidativo.

8.3.3.5. Fontes
A vitamina E, apesar de ser sintetizada apenas por vegetais, tendo, assim, os leos vegetais como
principal fonte, est difundida em alimentos de origem animal, como ovos, leite e fgado.

Antioxidantes de vitaminas
Apesar de no haver razes tericas para suplementao de antioxidantes (vitamina E, vitamina C,
beta-caroteno) em diabticos, h pouca evidncia sobre seus benefcios.
De acordo com a avaliao do Instituto de Medicina dos Estados Unidos, o consumo de megadoses de
antioxidantes dietticos, como as vitaminas C, E ou mesmo os precursores da vitamina A, os -caroteno ou
outros carotenides, no protegem contra doenas cardiovasculares, DM e cncer, como tambm no existe
comprovao quanto proteo contra deficincias nutricionais.
Os pacientes que necessitam de reposio adicional so aqueles com maior risco de deficincia, como
vegetarianos estritos, idosos, gestantes, lactentes e pacientes crticos, alm daqueles que usam medicamentos
que alteram o metabolismo de micronutrientes.

8.3.4. Vitamina K
8.3.4.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
A vitamina K foi descoberta por DAM, em 1935, como fator anti-hemorrgico, presente nas
gorduras e essencial ao organismo. O termo vitamina K designa uma srie de compostos com atividades anti-
hemorrgicas derivadas da naftoquinona. As filoquinonas esto presentes em alimentos vegetais verdes e as
menaquinonas, como resultado do metabolismo bacteriano nos intestinos. O composto sinttico menadiona
possui atividade duas vezes maior que os compostos naturais, devido sua estrutura, quando o organismo
insere a cadeia lateral para a utilizao como vitamina (Figura 8.4). Essa vitamina sensvel a luz e lcalis,
porm resiste a oxidao pelo calor.

121
A

8.3.4.2. Metabolismo

Figura 8.4 - Vitamina K. A: filoquinona K1, B: menaquinona K2 e C: menadiona K3

Como as demais vitaminas lipossolveis a vitamina K necessita da emulsificao da bile para sua
absoro, cujo stio se d na poro superior do intestino delgado. A eficincia de absoro varia de acordo
com a fonte alimentar, oscilando entre 10-80%.
Dos quilomicrons, a vitamina K transferida para o tecido heptico esplnico e sseo. O fgado o
principal local de armazenamento da filoquinona, sendo esta transportada no plasma, principalmente atravs da
VLDL, que representa 50% da vitamina K plasmtica.
A excreo da vitamina se d, sobretudo, por via fecal, sendo, contudo, 30% por vias urinrias.

8.3.4.3. Funes
Sntese de Protenas e Fatores da Cascata de Coagulao
Sete protenas da cascata de coagulao so dependentes da vitamina K, sendo trs pr-enzimas e
quatro fatores do ncleo de coagulao (II, VII, IX e X). Aparentemente, um precursor da protena
protrombina est constantemente sendo produzido pelo fgado, porm a etapa pela qual esse precursor
convertido em protrombina ativa dependente de vitamina K.

Composio do Sistema Microssomal


Para a manuteno das propriedades do sistema microssomal, necessrio substrato peptdico
contendo glutamina, oxignio, dixido de carbono e a vitamina K somados ao NADH ou uma hidroquinona de
vitamina K, formando uma reao de carboxilao na posio -carboxila do glutamato ligado a peptdeo.
Esse complexo citado nas membranas do retculo endoplasmtico responsvel pela ligao dos ons Ca2- a
protenas, como as da cascata de coagulao.

8.3.4.4. Recomendaes:
A vitamina K existe em quantidades abundantes na dieta usual, alm de ser sintetizada por bactrias
intestinais. Contudo, as bactrias intestinais no so capazes de produzir quantidade de menaquinona
necessria ao organismo, sendo, assim, necessrio o consumo dessa substncia na dieta.
A deficincia em humanos, exceto recm-nascidos, rara, geralmente decorrente da alterao na
absoro de lipdios ou crescimento da microflora intestinal comprometida pelo uso de antibiticos. A
principal manifestao e evidncia clnica da deficincia da vitamina um aumento no tempo de coagulao,
evidenciando a hipoprotombinemia. O quadro pode levar hemorragias e, em casos extremos ocasionar
anemia fatal.

122
Os neonatos esto mais suscetveis deficincia identificada como doena hemorrgica do recm-
nascido, que se deve falha no estabelecimento da microflora intestinal e baixa transferncia placentria da
vitamina. Porm recomenda-se o uso de uma dose profiltica da vitamina via intramuscular aps o parto.
Os efeitos adversos relacionados ao excesso da vitamina K so raros, porm as doses excessivas
podem causar anemia hemoltica em ratos e ictercia grave em bebs.

8.3.4.5. Fontes
Amplamente distribuda nos alimentos, a filoquinona tem origem vegetal e encontrada em vegetais
verdes como brcolis, espinafre e repolho, e em leos vegetais como canola, oliva e soja. Seu contedo
aumenta com o tempo de maturao e condies de cultivo. Menaquinonas so encontrados em carnes, peixes
e produtos lcteos, alimentos que possuem baixo teor de filoquinona.

8.4. Vitaminas Hidrossolveis


a. O conceito de vitaminas hidrossolveis engloba as vitaminas do chamado complexo B e a
vitamina C, que so compostos essenciais em muitos aspectos do metabolismo, uma vez que essas substncias
funcionam como coenzimas das diversas rotas metablicas do organismo. Tambm, podem atuar como grupo
prosttico de enzimas responsveis por reaes qumicas essenciais.

b. 8.4.1. Vitaminas do Complexo B


Substncias hidrossolveis, com funo biolgica de co-fatores essenciais ou substratos de enzimas
envolvidas em uma srie de reaes metablicas. Esto distribudas na poro aquosa da clula (citoplasma,
espao e matriz mitocondrial). Geralmente, no so armazenadas no organismo em quantidades necessrias
para o desempenho pleno das funes do organismo, assim o consumo regular de fontes alimentares dessas
sustncias se faz indispensvel.
O chamado complexo B comeou a ser pesquisado no incio do sculo XX, e os primeiros estudos
se concentravam no beribri. Tem como constituintes: tiamina (B1), riboflavina (B2), niacina (B3), cido
pantotnico (B5), piridoxina (B6), biotina (B7), cido flico (B9) e cianocobalamina (B12). O Quadro 8.1
relaciona a atuao das vitaminas do complexo B no metabolismo.

Quadro 8.1 - Principais funes das vitaminas do complexo B no metabolismo e suas fontes alimentares:

Composto Frmula qumica Papel no metabolismo Principais fontes


alimentares
Tiamina Ativao metablica da TTP (Tiamina Trifosfato), uma co- Leveduras, fgado,
carboxilase que atua na converso de piruvato Acetil Coa. gros integrais e
Participa de reaes da transcetolase na via das pentoses, farelo de trigo
funcionando como um provedor de ribose para a sntese de
RNA. Atua na reduo do NADPH, no metabolismo de cidos
graxos.
Riboflavina Transportador de eltrons de reaes de oxido-reduo, Leveduras, farelo
essencial para o metabolismo (FAD e FMN). de trigo, carnes,
ovos e peixes

Niacina Coenzima de reaes de xido-reduo envolvidas no Carnes magras,


metabolismo de carboidratos, lipdios e protenas (NAD e aves, peixes,
NADP). Atuam como arreadores de prtons e eltrons. amendoim e
leveduras

123
cido Na forma de coenzima A, atua como um ativador energtico Ovo e levedura.
Pantotnico do grupamento acetil derivado do metabolismo de acares,
participando do ciclo de Krebs, como protena carreadora do
grupo acil (ACP), participando de cidos graxos de cadeia
longa, e como um antioxidante envolvido no funcionamento
adequado dos linfcitos B.
Vitamina B6 Coenzima de mais de 100 reaes do metabolismo de Levedura, cereais
aminocidos. Sendo algumas enzimas do metabolismo de integrais, fgado e
carboidratos dependentes dessa vitamina, como a glicognio- carne de frango.
fosforilase.

Biotina Carreador do grupo carboxil, de diversas enzimas, entre elas as Vsceras, leite,
carboxilases. aveia e arroz
integral.

cido Flico Coenzima em processos de reduo e de transformao dos Hortalias, couve-


tomos de carbono, processos como a sntese de DNA e flor, laranja,
metilao de substncias para a biossntese de diversas fgado e levedura.
substncias.

Vitamina B12 Participa do metabolismo de carboidratos por atuar como Carnes, leite e
coenzima em diversas rotas metablicas, como o metabolismo derivados e
do proprionato, metilao da homocistena e formao da mariscos
metionina e degradao inicial de aminocidos.

8.4.1.2. Vitamina B1 - Tiamina


8.4.1.2.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
Muito antes do descobrimento da tiamina, era conhecida uma doena denominada beribri, que afeta
os sistemas nervoso e cardiovascular.
A tiamina foi a primeira vitamina B identificada. conhecida como a vitamina antineurtica, por ser
necessria ao funcionamento normal do sistema nervoso. Sua deficincia em animais causa paralisia da parte
traseira. A vitamina foi denominada tiamina para designar a presena de enxofre e de um grupo amino no
complexo molecular. Ela consiste de uma substncia com um anel pirimidnico ligado ao tiazol por uma ponte
metlica.
um composto muito solvel em gua, pouco solvel em lcool e insolvel em clorofrmio e ter.
Contudo, a solubilidade em gua determinada acordo com a estrutura ligada vitamina, o hidrocloreto de
tiamina possui uma solubilidade 1:1, porm o nitrato de tiamina apresenta solubilidade de 1:44, sendo ambas
as forma so vendidas comercialmente.
A tiamina um composto sensvel oxidao por tiocromo em meio alcalino tornando-a fluorescente
no aquecimento em meios no neutros. Em meios bsicos so formados produtos da degradao ricos em
enxofre, enquanto em meios cidos ocorre a quebra das molculas de tioazol e pirimidina.

8.4.1.2.2. Metabolismo
O mecanismo de absoro da tiamina no est completamente elucidado. Sabe-se que em baixos
teores ela absorvida por processo ativo saturvel dependente de Na++. Quando a ingesto oral excede os 5
mg/dia, o transporte intestinal feito por meio da difuso facilitada. O principal local de absoro o duodeno.
A tiamina prontamente absorvida em meio cido no duodeno proximal e, em algum grau, no duodeno distal.

124
No entercito, a tiamina fosforilada a Tiaminapirofostato (TPP). Para o transporte na corrente
sangnea, o TPP desfosforilado por fosforilases mitocondriais. No plasma, a tiamina livre ligada
albumina e transportada para os tecidos.
No armazenada em grande quantidade no organismo e, conseqentemente, necessita ser fornecida
diariamente. excretada na urina em quantidades que refletem a ingesto e a quantidade armazenada. As
gorduras e as protenas poupam tiamina, enquanto uma ingesto grande de carboidrato aumenta a necessidade
de tiamina.
Alguns microrganismos presentes no trato intestinal podem sintetizar a tiamina, mas a quantidade
sintetizada insuficiente para suprir as necessidades dirias.

Observao: O consumo de etanol leva inativao do transporte ativo da vitamina, deixando o indivduo
mais suscetvel ao desenvolvimento de uma deficincia vitamnica.

8.4.1.2.3. Funo
A tiamina combina-se com o fsforo para formar a coenzima TiaminaPirofosfato (TPP) que funciona
como uma carboxilase. A TPP necessria para a descarboxilao oxidativa de -cetocidos a aldedos
(metabolismo dos carboidratos). A descarboxilao oxidativa do piruvato e -cetoglutarato desempenha um
papel-chave no metabolismo energtico da maioria das clulas. Envolvida na transmisso de impulsos
nervosos, pode atuar como bloqueadora do canal de potssio em clulas neurais. Na deficincia de tiamina, a
produo de ATP prejudicada com concomitante diminuio da funo celular.

8.4.1.2.3. Recomendaes
A deficincia de tiamina ocorre, mais freqentemente, em reas onde a alimentao bsica consiste de
arroz ou de farinha refinada. Tambm, aparecem com uma ingesto baixa de tiamina as populaes que tm
hbito de comer peixes crs, que contm em seu trato gastrointestinal microrganismos que sintetizam a
tiaminase, enzima que quebra a tiamina.
A deficincia acentuada de tiamina causa o beribri. H trs tipos de beribri: o seco ou neurtico, o
beribri mido ou dermatoso e o beribri infantil ou agudo. No beribri seco, o incio lento, e o sintoma mais
importante a fraqueza progressiva dos msculos que so mais utilizados, como dos braos, pernas e coxas.
So comuns os sintomas de perda de apetite, fadiga, paralisia e insuficincia cardaca. Ocorre, principalmente,
em alcolatras, devido baixa ingesto, m-absoro ou fosforilao defeituosa. No beribri mido, o
quadro se agrava porque, alm dos distrbios do sistema nervoso perifrico, ocorrem manifestaes
cardiovasculares e edema, podendo mascarar a atrofia muscular. O beribri infantil existe em partes do
Oriente, onde constitui importante causa de mortalidade infantil. Os lactentes alimentados com o leite materno,
cujas mes se alimentam, na maior parte das vezes, com o arroz polido e demonstram deficincia de tiamina,
podem tambm desenvolver o beribri infantil.
Nos EUA, a deficincia de tiamina observada primariamente em associao com o alcoolismo
crnico, sendo devida insuficincia diettica ou absoro intestinal diminuda da vitamina. Alguns
alcolatras desenvolvem a sndrome de Wernicke-Korsakoff, um estado de deficincia caracterizado por
apatia, perda de memria e um movimento rtmico dos globos oculares.

8.4.1.2.4.Fonte
A tiamina encontrada em uma grande variedade de alimentos, mas em quantidade relativamente
baixa, estando presente em todos os tecidos animais e vegetais.
Fontes ricas incluem: leveduras, grmen de trigo, cereais integrais, castanhas e carne de porco magra
fresca. O fgado e outras vsceras, aves, carnes magras, peixes, gema de ovo, ervilhas, feijes secos, soja e
amendoim so tambm fontes excelentes da tiamina. O leite contm quantidades relativamente baixas dessa
vitamina.
A suplementao com a vitamina B6 pode ter influncia positiva sobre as retinopatias e neuropatias
tpicas do diabetes. Esse efeito se deve capacidade inibidora da vitamina e formao de espcies altamente
glicosiladas, bem como produtos da lipoxidao. O tratamento em modelo experimental com a vitamina B6
previne as modificaes patolgicas que iro culminar nas retinopatias dos indivduos diabticos.

8.4.1.3. Vitamina B2 - Riboflavina


8.4.1.3.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade

Em 1920, o pesquisador Emmett, destruindo o fator neurtico (vitamina B1) de extratos de levedura
pelo aquecimento, demonstrou a existncia de um fator remanescente que podia promover o crescimento. Esse
fator foi designado vitamina B2. Em pesquisas posteriores, ela foi isolada do leite (pigmento amarelo
esverdeado) e da clara do ovo.

125
A riboflavina pertence a um grupo de pigmentos fluorescentes amarelos denominados flavinas. O anel
da flavina liga-se a um lcool relacionado ribose. As duas formas biologicamente ativas so a Flavina
Mononucleotdeo (FMN) e a Flavina Adenina Dinucleotdeo (FAD), formadas pela transferncia de um AMP
do ATP a FMN. A FMN e FAD so capazes de aceitar, reversivelmente, dois tomos de hidrognio, formando
a FMNH2 ou FADH2. A FMN e FAD esto ligadas fortemente, algumas vezes co-valentemente, a
flavoenzimas, que catalisam a oxidao ou reduo de um substrato.
A tiamina estvel ao calor, oxidao e aos cidos, mas desintegra na presena de lcalis ou luz,
especialmente ultra-violeta. Devido estabilidade ao calor e a hidrossolubilidade limitadas, muito pouco
perdido no cozimento e processamento de alimentos. Todavia, por ser sensvel ao pH>7,0, a adio de
bicarbonato de sdio para amaciar ervilhas secas ou feijes para um cozimento mais rpido destri grande
parte da riboflavina. O sol, secando frutas e vegetais, como utilizado em alguns pases, tambm pode causar
uma destruio considervel do contedo da riboflavina.

8.4.1.3.2. Metabolismo
As formas FAD e FMN so liberadas devido ao baixo pH estomacal, uma vez que esto ligadas
protenas. No intestino delgado sofrem ao de enzimas e so liberadas para absoro no leo superior. Estudos
tm demonstrado a existncia de duplo mecanismo de absoro, contudo a principal via o transporte ativo de
sdio dependente.
No entercito, a riboflavina sofre fosforilao por meio da ao da flavoquinase, sendo transformada
em FMN, e transportada ao fgado via sistema porta ligada albumina plasmtica. No fgado ocorre a
transformao da FMN em FAD, que representa a principal forma de armazenamento da vitamina (70-90%).
A biodisponibilidade da vitamina B2 , muitas vezes, comprometida devido sua baixa solubilidade
em gua, sendo os sais biliares um importante fator que contribui para a absoro de riboflavina, alm da
difcil liberao da matriz alimentar e da natureza saturvel do processo de transporte ativo.
A excreo da vitamina via urinria, na forma de glicosdeo (provenientes do metabolismo heptico
da riboflavina). Ocorre pela combinao entre filtrao glomerular, secreo e reabsoro tubular e degradao
bacteriana.

a. 8.4.1.3.3. Funo
Importante no metabolismo dos carboidratos, lipdios e protenas, por participar do sistema de
oxirreduo e transporte de eltrons. Ela essencial na sntese de coenzimas com funo nas reaes de
oxirreduo, envolvidas no catabolismo da glicose, cidos graxos , corpos cetnicos e aminocidos. A
riboflavina combina com o cido fosfrico, nos tecidos, para tornar-se parte da estrutura de duas flavinas
coenzimas (FMN e FAD), que so grupos prostticos das flavoprotenas, enzimas que catalisam as reaes de
oxirreduo nas clulas, como transportadores de hidrognio na cadeia respiratria.
Acredita-se que a riboflavina tenha mltiplas funes na produo de corticosterides, na formao de
hemceas, na gliconeognese e no crescimento celular.
Est tambm envolvida na ativao da vitamina B6 (Piridoxina).

b. 8.4.1.3.4. Recomendaes
A deficincia de riboflavina no ocorre isoladamente, mas em conjugao com deficincias de outras
vitaminas do complexo B. Os sintomas de deficincia incluem: dermatite, glossite, queilose, estomatite, dor de
garganta, edema e hiperemia na orofaringe.
A toxicidade ainda controversa, uma vez que os nveis plasmticos so mantidos por um processo
saturvel. O efeito do excesso de vitamina est associado a alteraes no eletrocardiograma.

8.4.1.4. Vitamina B3 Nicotinamida


8.4.1.4.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
Niacina o nome da vitamina, englobando duas substncias, a nicotinamida e o cido nicotnico, que
pode ser convertido facilmente em nicotinamida.
A niacina o cido carboxlico-3-piridina, de cor branca, slido, cristalino e facilmente convertido
em um composto fisiologicamente ativo a nicotinamida. Ambos solveis em gua e lcool, a nicotinamida tem
maior solubilidade do que a niacina.
Uma caracterstica relevante da niacina a capacidade de sntese dessa vitamina atravs do
triptofano, sendo que 60 mg de triptofano pode ser convertido em 1 mg de niacina.
A niacina muito mais estvel do que a tiamina e a riboflavina, sendo notavelmente resistente a calor,
luz, cidos e lcalis. Pequenas quantidades so perdidas na gua de cozimento quando esta descartada.

126
8.4.1.4.2. Metabolismo
A absoro realizada por difuso facilitada em todas as pores do trato intestinal, sendo
pobremente armazenada no organismo. Os excessos so eliminados via urinria.
A niacina facilmente absorvida pelo intestino e covertida em NAD (nicotinamida adenina
dinucleotdeo) e NADP (nicotinamida adenina dinucleotdeo fosfato) no fgado.
A absoro do cido nicotnico e da nicotinamida rpida e em baixas concentraes mediada por
difuso facilitada dependente de Na+. Em altas concentraes, a difuso passiva predomina. As glico-
hidrolases no fgado e no intestino catalisam a converso da nicotinamida em NAD. A nicotinamida
transportada para os tecidos para ser usada na sntese de NAD quando necessrio.

8.4.1.4.3. Funo
Essa vitamina funciona metabolicamente como componente das coenzimas NAD e NADP, s quais
podem aceitar eltrons de muitos substratos biolgicos:
Substrato reduzido + NAD+ substrato oxidado + NADH + H+
Substrato reduzido + NADP+ substrato oxidado + NADPH+ H+

Dessa forma, essas coenzimas tm importantes funes de xido reduo em todo o organismo,
participando de reaes essenciais para a vida: sntese de fosfatos ricos em energia, gliclise, metabolismo de
piruvato, biossntese de pentoses, metabolismo de glicerol e cidos graxos e obteno da energia a partir de
protenas.

8.4.1.4.4. Recomendaes
Entre os vrios sintomas da deficincia de niacina, podem-se citar: fraqueza muscular, anorexia,
ingesto e erupo cutnea. Ao mesmo tempo ocorre diminuio das coenzimas NAD e NADP.
A deficincia grave de niacina leva pelagra, caracterizada por dermatite, demncia e diarria (os trs
D) , tremores e lngua amarga.O quadro clnico inclui o aparecimento de leses dermatolgicas em reas de
exposio ao sol (face, pescoo, dorso dos braos, mos e ps). A dermatite tpica da doena , geralmente,
precedida pelas alteraes intestinais e acomete, inicialmente, o dorso das mos. A leso eritematosa,
pruriginosa no incio, hiperpigmentada e com descamao grosseira. caracterstica simtrica e bilateral, em
forma de luva nos membros superiores e bota nos membros inferiores. A leso no pescoo atinge as
regies lateral e anterior, s vezes prolongando-se ao longo do esterno (colar de casal/outros locais s vezes
comprometidos so cotovelos, joelhos, locais comuns de traumatismos). As leses do trato grastrointestinal
podem incluir glossite e estomatite. Diarria uma manifestao freqente com evacuaes lquidas e de
pequeno volume. Perturbaes mentais tambm esto presentes.
Pacientes alcoolistas e com sndrome de m-absoro so altamente suscetveis pelagra.
Altas doses de niacina tambm podem ser prejudiciais, levando sensao de formigamento e
enrubescimento da pele e ao latejamento devido ao vasodilatadora. Tambm, pode interferir no
metabolismo de metionina.

8.4.1.4.5. Fontes
Carnes magras, vsceras, levedura de cerveja, amendoim, aves e peixes so boas fontes de niacina. Ao
passo que leites e ovos no o so, mas sim fontes de excelentes de triptofano. As bactrias do trato
gastrointestinal podem sintetizar niacina, embora a contribuio no seja muito bem conhecida.

Observao: O estabelecimento de quotas desta vitamina um tanto difcil no s pela escassez de


observaes em seres humanos, diferentes grupos etrios, mas tambm pelo fato de que determinada
quantidade de triptofano se converte, no organismo, em niacina. Uma ingesto de 60 mg de triptofano
considerada equivalente a 1 mg de niacina. Isso no significa, contudo que as 60 mg ingeridas sejam oxidadas
para formar 1 mg de niacina, pois apenas quantidade suficiente de triptofano oxida-se para fornecer 1 mg de
niacina, aproximadamente. O triptofano da dieta, em estados de deficincia, utilizado primeiro para
equilibrar o balano nitrogenado.
A converso do triptofano em niacina mais eficiente nas gestantes.
Em conseqncia disso, nas populaes que se alimentam base de milho, que pobre em triptofano,
elevada a incidncia de pelagra. A carncia protica, de um modo geral tem muita importncia na
etiopatogenia dessa enfermidade.

8.4.1.5. Vitamina B5 cido Pantotnico


8.4.1.5.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
O cido pantotnico foi identificado na dcada de 1930 como um fator necessrio ao crescimento de
leveduras.

127
O cido pantotnico outro grupo do complexo B reconhecido primeiramente, como essencial para
ratos, cachorros, porcos, pombos e galinhas. A sntese completa do cido foi descrita como causa de
emagrecimento, perda e embranquecimento de cabelo em animais escuros, lcera do trato intestinal e
danificao de diversos rgos internos.
Apresenta como um composto branco, cristalino e de sabor amargo, sendo facilmente decomposto por
cidos ou bases. razoavelmente estvel durante o cozimento e o armazenamento, porm podem ocorrer
perdas durante o processamento e o refino de alimentos.

8.4.1.5.2 Metabolismo
O cido pantotnico incorporado a coenzima A hidrolisado no intestino at a forma de pantetena,
processo que ocorre por meio da ao das enzimas pirofosfatase e fosfatase. A pantetena , ento, hidrolisada,
dando origem ao cido pantotnico e ao -mercaptoetilamina, ainda no lmen intestinal. Por meio da ao de
transportadores especficos da vitamina, o cido pantotnico absorvido independentemente da sua quantidade
na dieta e facilmente absorvido no trato gastrointestinal, assim com sua forma alcolica, o pantotenol. Sua
maior via de eliminao a urinria. No se tm relatos da deficincia nem de efeitos txicos

8.4.1.5.3. Funes
O cido pantotnico parte da coenzima A, que tem papel bsico no metabolismo de glicdios e
protenas e na liberao de energia dos carboidratos. Est envolvido na sntese de aminocidos, cidos graxos,
colesterol, fosfolipdeos e hormnios esterides. tambm essencial para a formao de porfirina, a poro
pigmentar da molcula de hemoglobina.

8.4.1.5.4. Recomendaes
Acredita-se que a ingesto diria de cido pantotnico na alimentao normal no permita a
ocorrncia de deficincias. Pode-se dizer que a ingesto diria adequada seja em torno de 4 a 7 mg/dia (NRC,
1989).

8.4.1.5.5. Fontes:
A palavra pantotnico significa espalhamento, indicando que a distribuio dessa vitamina muito
extensa. Dados sobre teores de cido pantotnico nos alimentos so limitados em nmero. Levedura, fgado,
rim, corao, salmo e ovos so as suas melhores fontes, seguidos de brcolis, couve-flor, cogumelos, carne de
porco, lngua de boi, amendoins, trigo, centeio e farinha de soja. Cerca da metade do cido pantotnico perde-
se durante a moagem dos gros, o que constitui prejuzo na dieta normal. As frutas so relativamente pobres
dessa vitamina.

8.4.1.6. Vitamina B6 Piridoxina


8.4.1.6.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
Existem trs formas naturais de vitamina B6: um lcool (piridoxina), um aldedo (piridoxal) e uma
amina (piridoxamina). As trs formas so igualmente eficazes na nutrio, e a maior parte da vitamina B6 nos
alimentos est sob as formas piridoxal e piridoxamina. As formas ativas so as coenzimas piridoxal-5-fosfato
(PLP) e a piridoxamina-5-fosfato.
A piridoxina (forma sinttica) solvel em gua e lcool, estvel ao calor em meio cido e
relativamente instvel em solues alcalinas, sendo tambm muito estvel luz.

8.4.1.6.2. Metabolismo
As diversas formas de vitamina B6 sofrem desfosforilao pela ao das enzimas fosfatases alcalinas e
so facilmente absorvidas no jejuno, por meio de transporte passivo. So transportadas ao fgado, onde sofrem
fosforilao, sendo parte utilizada pelo hepatcito em suas diversas reaes enzimticas e parte transportada da
circulao ligada albumina plasmtica. Antes de ser captada nos tecidos perifricos, sofre nova
desfosforilao e, no meio intracelular, novamente fosforilada para a execuo de suas funes (Figura 8.5).
Para o metabolismo da vitamina B6, necessrio a participao da vitamina B2. O principal tecido de
armazenamento da vitamina o tecido muscular esqueltico.

128
B6

Fosfatase alcalina
PN e PNP PL PLP
PM e PLP
PN e PMP
PM

Entercito Hepatcito Tecidos perifricos


8.4.1.6.3. Funes
PLP-
Albumina
PL

Desfosforilao

Figura 8.5 - Absoro intestinal e transporte de vitamina B6.

A vitamina B6 exerce papel essencial em vrios dos processos bioqumicos, atravs dos quais os alimentos
so metabolizados no organismo. Essa vitamina B6 encontrada nas clulas na forma ativa piridoxal-fosfato
(PLP), uma forma essa que age no metabolismo de protenas, gorduras e carboidratos. Porm, sua funo
primria como coenzima para diversas reaes qumicas relacionada ao metabolismo das protenas. O
piridoxal-fosfato age nas reaes envolvidas na degradao no-oxidativa de aminocidos, a saber:

a) Transaminaes - A atividade das transaminases nos tecidos baixa na deficincia de piridoxina.


b) Desaminaes - Remoo do grupamento amino de alguns aminocidos, com liberao do esqueleto de
carbono.
c) Dessulfurao - Transferncia ou retirada dos grupos sulfidrila.
d) Descarboxilao - Remoo de CO2 dos grupos COOH.

O piridoxal fosfato necessrio para a formao de compostos porfirnicos, partes essenciais da


molcula de hemoglobina. Outra importante funo da vitamina B6 se refere formao e ao metabolismo do
triptofano na sua converso em niacina.
A piridoxina, como parte da enzima fosforilase, auxilia na liberao do glicognio heptico e
muscular como glicose-1-fosfato. Recentemente, descobriu-se que essa vitamina exerce papel fundamental na
formao do tecido conectivo, especialmente em relao formao do colgeno e da elastina.

8.4.1.6.3. Recomendaes
A deficincia primria no comum devido grande distribuio da vitamina em alimentos.
Estudos experimentais em ratos demonstraram que a deficincia dessa vitamina leva a dermatite,
diminuio do crescimento, esteatose heptica, anemia e decrscimo de resposta imune, dentre outros.
A deficincia da vitamina B6 pode levar maior exceo urinria de oxalato, o que resulta em maior
ocorrncia de clculos renais. A deficincia grave pode levar a anormalidades no sistema nervoso central.
Os sintomas clssicos de deficincia so: a dermatite seborrica, anemia microctica (como reflexo da
diminuio da sntese de hemoglobina), convulses epilpticas, depresso e confuses. Mais recentemente,
aumentou-se o interesse no papel dessa vitamina na diminuio da homocistena circulante, um fator de risco
para doenas vasculares.
Certos defeitos metablicos respondem ingesto de altos teores de piridoxina. Alguns recm-
nascidos com crises convulsivas responderam ao tratamento com grandes doses de vitamina B6 (2 g/dia). Em
adultos, uma anemia hipocrnica ocasionalmente encontrada com reservas normais de ferro. Tais casos
respondem ao tratamento com piridoxina, por isso parece existir uma anormalidade na sntese de heme,
envolvendo uma coenzima B6.
A necessidade de vitamina B6 complicada, pois influenciada pela quantidade de protena na dieta:
quando a ingesto de protena mais elevada, a necessidade de vitamina B6 maior.

129
8.4.1.6.4. Fontes
As melhores: amendoim, gema de ovo, banana, abacate, carnes, fgado, nozes e cereais de gro
integral.
Essa vitamina amplamente distribuda entre os alimentos de origem animal e vegetal.

8.4.1.7. Vitamina B7 Biotina


8.4.1.7.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
A biotina foi descoberta entre 1920 e 1930 como um fator que prevenia dermatite, perda de cabelo e
anormalidades neurolgicas causadas pela ingesto de uma dieta com altas doses de ovo cr fornecida a ratos.
A biotina, outro membro do complexo vitamnico B, foi primeiramente isolada em 1933, como fator
essencial para o crescimento de clulas de levedura. Dois compostos qumicos diferentes, denominados
vitamina H e coenzima R, fator de crescimento das leveduras, foram identificados como sendo os mesmos.
Ficou provado que esses diversos fatores so idnticos e, agora, conhecidos como biotina. As investigaes
apontaram que uma deficincia de biotina pode ser produzida em ratos, coelhos e macacos, alimentando-os
com uma substncia chamada de avidina, encontrada na clara de ovo cr. A avidina inativa a biotina e
conhecida como uma antivitamina.
A deficincia de biotina tambm foi reconhecida no homem somente quando sua dieta inclua grandes
quantidades de clara de ovo cr. A sntese intestinal de biotina comum na maioria dos animais, e
provavelmente no homem. A biotina parece ter papel essencial nas ocorrncias dos erros inatos do
metabolismo e, tambm, estar ligada ao metabolismo de carboidratos e de lipdios.
A biotina um cido mono-carboxlico, estvel ao calor, solvel em gua e lcool e bastante
suscetvel oxidao. Existem oito ismeros de biotina, por ter em sua molcula trs carbonos assimtricos,
mas somente o ismero d-biotina o biologicamente ativo.

8.4.1.7.2. Metabolismo
A biotina diettica existe na forma livre e ligada. Quando ligada biotina digerida no trato
gastrointestinal em forma de biocitina. Os mecanismos de absoro no intestino ainda no esto bem
elucidados, estudos evidenciam que o transporte de biotina no intestino saturado na presena de um gradiente
de Na+, mas linear na presena de um gradiente colina. Sendo predominantes o transporte saturado na regio
proximal do intestino e o transporte linear na poro distal.
No plasma, parte da biotina circulante est ligada protena plasmtica denominada biotinidase.
A principal via de excreo a urinria.

8.4.1.7.3. Funes
A biotina tem uma funo essencial como coenzima na fixao de CO2; a sntese de cido graxo, por
exemplo, necessita de uma enzima contendo biotina (a acetil-CoA carboxilase) para formar a malonil-
coenzima A, a partir da acetil- coenzima A.
O papel da biotina no metabolismo de protena e glicdios menos claro, e a sua relao com a sntese
de RNA necessita de elucidaes posteriores. Acredita-se que a biotina pode ser essencial para o crescimento
celular, homeostase da glicose e para a sntese de DNA, estando mais relacionadas s carboxilases (enzimas
dependentes da biotina) do que prpria biotina. Esta est relacionada ao metabolismo da vitamina B12 e do
cido pantotnico.
A deficincia de biotina resulta em fadiga, anorexia, depresso, mal-estar, dores musculares, nuseas,
anemia, hipercolesterolemia e alteraes no eletrocardiograma.
A suplementao com biotina parece atuar no tratamento da acne e da seborria, no sendo comum a
deficincia em humanos, mas em animais caracterstico ocorrer uma dermatite.
Sinais de deficincia incluem dermatite, anorexia, glossite, hipercolesterolemia, dores musculares,
depresso e anormalidades cardacas.

8.4.1.7.4. Recomendaes
A maior parte da dieta dos norte-americanos contm cerca de 150 a 3.000 g de biotina/dia, o que
inteiramente adequado para uma boa sade. A sntese pela microflora intestinal parece fornecer a maior fonte
dessa vitamina. Acredita-se que uma ingesto entre 30 e 100 g por dia dessa vitamina adequada para o ser
humano (NRC, 1989).

8.4.1.7.5. Fontes:
Uma das melhores fontes de biotina o leite (humano e de vaca). Sabe-se que ela abundante no
fgado e outras vsceras, nos cogumelos e nos amendoins, nos ovos (gema) e em certas frutas e vegetais.
largamente fornecida pela sntese bacteriana no trato intestinal.

130
Biotina e Diabetes Mellitus
O estado nutricional da biotina est comprometido no DM. Em estudos epidemiolgicos, observou-se
relao inversa entre os nveis da vitamina no plasma e o diagnstico de DM e glicemia ps-prandial
(MAEBASHI et al., 1993). Em estudos experimentais, verificou-se que a deficincia de biotina est ligada
reduo da tolerncia a glicose e a sua utilizao pelo organismo (DEODHAE; MISTRY, 1970). Assim, a
recuperao do estado nutricional da biotina poderia melhorar as anormalidades do DM, como a reduo da
glicemia e melhora da tolerncia glicose (KOUSTIKOS et al., 1996; REDDI et al., 1988; ZHANG et al.,
1996).
A biotina parece ativar genes envolvidos no metabolismo e homeostase da glicose, entre eles o gene
que codifica uma glicoquinase pancretica e heptica, que regula a secreo de insulina pelas clulas em
resposta glicemia. Entretanto, tambm induz a reduo da expresso gnica de fosfoenolpiruvato
carboxiquinase, enzima essencial para a gliconeognese (DAKSHINAMURTI; LI, 1994; BEZ-SALDAA
et al., 2004).

8.4.1.8. Vitamina B9 cido flico


8.4.1.8.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade:
A vitamina conhecida como cido flico adquiriu esse nome do termo latino folium que significa
folha, j que foi isolada pela primeira vez a partir de folhas verdes, como o espinafre.
O cido flico foi reconhecido como um elemento essencial nas dietas das galinhas em 1939 e mais
tarde considerado uma necessidade para outros animais. A folacina foi primeiro usada clinicamente em 1945
por Spies, que mostrou ser efetiva no tratamento de anemias macrocticas em gestantes e sndromes tropicais,
sendo essas descobertas confirmadas.
O cido flico (pteroiglutmico - PGA) no encontrado como tal em alimentos, ou no corpo
humano. Ele ocorre em alimento sobretudo, como poliglutamatos e como 5-metil-tetraidrofolato (N5 metil
THF) que so convertidos na forma ativa de vitamina pelo organismo.

8.4.1.8.2. Metabolismo
O cido flico pode ser absorvido ao longo do intestino delgado; entretanto, h evidncias de que o
jejuno o local primrio de absoro ativa. Alm da absoro dependente de energia, o folato tambm parece
ser absorvido por difuso passiva. A maior parte da vitamina aparece na dieta sob a forma de poliglutamato.
Antes de ser absorvido, o excesso de glutamato da cadeia lateral da molcula removido por conjugases
encontradas no lmen intestinal ou clulas epiteliais. A absoro de cido flico , portanto, controlada pelo
mecanismo desconjugante, o qual, por sua vez, pode ser afetado por inibidores de conjugases em alimentos,
i.e., leveduras. A taxa de absoro de folatos conjugados parece estar relacionada ao tamanho de cadeia.
O folato, ligado protena, transportado no sangue at as clulas da molcula ssea, reticulcitos e
talvez outras clulas. O metilfolato parece ser a forma principal da vitamina em tecidos sseos. Cerca da
metade do cido flico armazenado no organismo est no fgado. Algum folato excretado na bile, assim
como na urina. Nveis sorolgicos de folacina so encontrados numa faixa de 7 a 16 nanogramas (1ng = 10-9
grama) por ml de soro.
As questes de deficincias primrias e secundrias de cido flico foram levantadas. No caso da
ltima, possveis causas numerosas foram citadas: falhas na absoro de folato alimentar; excreo urinria
aumentada de cido flico; maior destruio de folato; interferncia na sntese ou ativao de enzimas
necessrias para utilizao do folato; e produo de antifolatos.

8.4.1.8.3. Funes
A funo metablica mais importante dos fatos agir como coenzimas que transportam fragmentos de
um carbono em reaes do metabolismo dos aminocidos e na sntese de purinas e pirimidinas dos cidos
nuclicos (DNA e RNA).
O aminocido histidina necessita de cido flico para sua utilizao completa. Quando o cido flico
no disponvel, um produto intermedirio, o cido forminoglutmico (FIGLU) excretado na urina. Nveis
de excreo de FIGLU podem, portanto, ser usados para determinar o estado nutricional do cido flico.
A deficincia do cido flico produz defeitos na reproduo celular e alteraes na sntese de
protenas. Esses efeitos se tornam mais evidentes em tecidos de crescimento rpido. Resulta em anemias
megaloblsticas (reduo no nmero de glbulos vermelhos sendo estes imaturos e de tamanho maior que o
normal), glossites e distrbios gastrointestinais. Por causa da interdependncia das vitaminas B12, B6, cido
ascrbico e cido flico, a anemia encontrada nessas deficincias pode ser similar e responder a tratamento
com um ou vrios desses nutrientes. Deve-se dizer, entretanto, que o tipo de anemia perniciosa pode melhorar
com o cido flico, mas somente a vitamina B12 cura os sintomas neurolgicos.
Os grupos populacionais de mais alto risco incluem os adolescentes, mulheres grvidas, pessoas que
consomem muita bebida alcolica e pessoas idosas.

131
Entre mulheres em idade frtil, a complementao alimentar com cido flico, a partir de trs meses
antes da concepo at as primeiras seis a 12 semanas de gestao, pode prevenir anormalidades no feto
conhecidas como defeitos do tubo neural (DTN), incluindo anencefalia (crebro incompleto ou ausente),
encefalocele e espinha bfida.
J foi demonstrado que a complementao de cido flico pode reduzir o risco de certas enfermidades
cardiovasculares, por meio da reduo da homocistena no sangue.
A maior parte dos alimentos no rica em folatos, o que dificulta o aumento de seu consumo. O
folato contido nos alimentos apresenta-se na estrutura qumica como tetraidrofolato reduzido, que suscetvel
a rompimento por oxidao. Alm disso, esse folato est ligado a uma cadeia de cidos glutmicos que deve
ser eliminada antes que o intestino absorva a vitamina atravs da hidrolise enzimtica. bem provvel que
esse desdobramento reduza a biodisponibilidade do folato nos alimentos.

8.4.1.8.4. Recomendaes
Altos nveis devem ser requeridos para minimizar os defeitos no nascimento. As recomendaes para
mulheres de idade precoce, que esto aptas a engravidar, devem ingerir 400 g de folato/dia, derivados de
suplementos e, ou, alimentos fortificados, em adio ingesto normal de folato nos alimentos.

8.4.1.8.5. Fontes alimentares


Alm da presena em folhas verdes, esses fatores so encontrados no fgado, carnes, peixes, legumes,
cereais fortificados, nozes, leguminosas e todos os gros.
Muitos dos folatos nos alimentos so facilmente destrudos pela armazenagem, coco e outros
processos. Em virtude da destruio da atividade do cido flico em leite em p, foi sugerido que deve ser
adicionado cido ascrbico como preservativo do leite antes do processamento.

8.4.1.9. Vitamina B12 Cianocobalamina


8.4.1.9.1. Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
Em 1948, esse composto foi isolado de extrato de fgado, demonstrando-se potente atividade contra a
anemia perniciosa. Ele contm o metal pesado cobalto, no centro de um grande anel tetrapirrlico, muito
similar ao anel porfirnico de heme. Cianocobalina o nome genrico da vitamina B12, devido presena de
cobalto.
A vitamina B12 o fator extrnseco dos alimentos to necessrios para o tratamento e a preveno da
anemia perniciosa.
A vitamina B12 forma cristais de cor vermelho-escura, absorvem facilmente a gua e so solveis
nesta.
Pelo fato de essa vitamina ser destruda pela luz, cidos, bases e agentes oxidantes ou redutores, o
processamento dos alimentos como o cozimento leva a perdas significativas.

8.4.1.9.2. Metabolismo
A vitamina B12 absorvida atravs de dois mecanismos. O primeiro, provavelmente por difuso,
ocorre ao longo de todo o intestino delgado, sendo importante apenas na presena de quantidades
farmacolgicas de B12. O segundo feito atravs de um mecanismo especifico, que envolve fator intrnseco
(FI), o clcio inico e as clulas da mucosa do leo. A presena de cido clordrico tambm necessria para
quebrar as ligaes peptdicas da vitamina B12.
O fator intrnseco, uma glicoprotena secretada pelas clulas parietais do estmago, liga-se vitamina
B12 e forma um complexo construdo por duas molculas de fator intrnseco e duas vitaminas B12. Esse
complexo (FI + B12) transportado para o leo, onde adere s vilosidades das clulas da mucosa na presena
de clcio inico e num pH acima de 6. Atravs de um mecanismo ainda desconhecido, a vitamina B12
liberada deste complexo dentro do prprio leo, de onde passa para o sangue venoso atravs de eritrcitos.
No fluxo sangneo, a vitamina B12 transportada por duas protenas, a trasncobalamina I e a
transcobalamina II, sendo a ltima mais importante, fisiologicamente.
O armazenamento corpreo de vit B12 substancial, aproximadamente 2 mg, com o fgado contendo
50 a 90% do estoque total da vitamina. Quando necessrio, a vitamina B12 pode ser liberada para a medula
ssea e outros tecidos. Pode levar de 5 a 6 anos para os sintomas da deficincia surgirem aps a restrio do
suprimento corpreo a partir de fontes naturais. Porm, quando h ingesto excessiva a vitamina excretada na
urina.

8.4.1.9.3. Funes
A vitamina B12 um nutriente essencial para todas as clulas do organismo; em sua ausncia o
crescimento de tecidos prejudicado; juntamente com os derivados do cido flico, a vitamina necessria
para a sntese de DNA. Assim, a auscia da vitamina B12 resulta em insuficincia de maturao de ncleo e,
portanto, insuficincia de diviso celular. As clulas eritoblsticas da medula ssea no proliferam

132
normalmente; tornam-se maiores que o normal (megaloblastos). Os macrcitos (hemcias de tamanho maior
que o normal) so assim liberados no sangue perifrico. Embora esses macrcitos de forma irregular possam
transportar oxignio, sua vida mdia reduzida, em conseqncia da fragilidade de sua membrana, muitas
vezes metade ou dois teros do normal. No sistema nervoso, atua na formao da bainha de mielina.
De modo geral, essa vitamina est envolvida no metabolismo de gorduras, carboidratos e protenas, e
associada absoro e metabolismo do cido flico.
A deficincia da vitamina B12 causa a anemia perniciosa ou megaloblstica, caracterizada pelo
aparecimento de clulas vermelhas maiores e imaturas, mas em nmero menor do que o normal. Sua
deficincia pode resultar em problemas neurolgicos, problemas de pele, diarria e perda de apetite.

8.4.1.9.4. Recomendaes
As recomendaes (Tabela 1) so convenientes para indivduos adultos completando a alimentao
com alimentos fortificados com a vitamina B12 e, ou, usando suplementos de vitamina B12, devido alta
incidncia de m-absoro, isto, principalmente, em pessoas com mais de 50 anos de idade.

8.4.1.9.5. Fontes
A nica fonte de vitamina B12 conhecida na natureza a obtida pela sntese de microrganismo. Est
amplamente disseminada na natureza, na gua do mar, e em produtos de fermentao. As plantas (frutas,
hortalias, gros) no contm vitamina B12, exceto quando so contaminados pelos microrganismos. Os
animais superiores no podem sintetizar vitamina B12 e devem obt-la direta ou indiretamente das fontes
bacterianas. Quantidades substanciais da vitamina so produzidas pela flora do rmen de diversos animais na
presena de quantidade suficiente de cobalto.
As melhores fontes de vitamina B12 so: fgado, crebro, corao, mariscos, ostras e gema de ovo;
fontes intermedirias: carnes musculares, subprodutos do leite, peixe, camaro e lagosta; fontes pobres:
vegetais verdes, batatas, clara de ovo e cereais.

8.4.2. Vitamina C- cido Ascrbico


8.4.2.1.Histrico, propriedades fsico-qumicas e atividade
Uma doena comum entre os marinheiros do sculo XV, o escorbuto, foi curada com a adio de suco
de limo na alimentao. Na dcada de 1930, descobriu-se que a substncia isolada poderia curar escorbuto em
cobaias. Essa substncia conhecida como cido ascrbico na sua forma reduzida e como cido
deidroascrbico na sua forma oxidada. O escorbuto experimental foi primeiramente induzido em cobaias no
ano de 1906 por Holst e Frlich, na Noruega; esses animais, ao contrrio de ratos, galinhas, ces e outros
animais domsticos, desenvolvem caractersticas hemorrgicas em volta das articulaes, dentes, e outras
estruturas sseas muito similares ao escorbuto em seres humanos. O homem, os primatas e as cobaias no
possuem a habilidade de sintetizar a vitamina C; quando essa vitamina falta em sua dieta, eles dependem
totalmente da vitamina C ingerida na alimentao.
Por volta de 1932, o isolamento da vitamina C numa forma cristalina pura foi obtida por dois grupos
de pesquisadores. A estrutura qumica foi identificada e o produto, sintetizado em uma forma fisiologicamente
ativa; logo depois, em 1938, o cido ascrbico foi oficialmente aceito como nome qumico para a vitamina
C. Ela est presente naturalmente em alimentos sob duas formas: a forma reduzida (cido ascrbico) e a forma
oxidada (cido desidroascrbico). Ambas so fisiologicamente ativas e encontradas nos tecidos dos
organismos.
O cido ascrbico um material branco, hidrossolvel e cristalino, sendo facilmente oxidado pelo
calor. A oxidao pode ser acelerada pela presena de cobre e pelo pH alcalino. Tais caractersticas fazem que
muita vitamina seja perdida ou jogada fora na gua do cozimento. Tambm, o processamento e a exposio de
frutas e verduras luz levam a perdas dessa vitamina.
a mais instvel das vitaminas, podendo ser perdida facilmente pelo calor, oxidao, secagem,
armazenamento, alcalinidade, presena de metais como Fe e Cu, lixiviao (altamente solvel em gua).

8.4.2.2. Metabolismo
A absoro de cido ascrbico ocorre na parte superior do intestino delgado, passando corrente
sangunea e chegando at os tecidos do corpo. A quantidade de cido ascrbico nos diferentes tecidos
varivel. Os tecidos supra-renal e pituitrio, crebro, pncreas, rim, fgado e bao apresentam concentraes
relativamente altas; seguidos das clulas sangneas que contm maior quantidade que o soro.
Quando os tecidos atingem a sua concentrao mxima da vitamina, eles so considerados saturados e
o cido ascrbico em excesso excretado pela urina na forma de cidos oxlico, trenico e deidroascrbico,
substncias que facilitam o aparecimento de clculos renais.

8.4.2.3. Funes
Formao do colgeno

133
A vitamina C tem grande variedade de funes nos processos vitais, mas at agora suas funes
bioqumicas especficas ainda no so bem compeendidas. Um de seus papis mais significativos na
formao de colgeno, a substncia protica que une as clulas. O colgeno contm os aminocidos
hidroxiprolina e hidroxilisina, formados no organismo, a partir dos aminocidos prolina e lisina e parece que o
cido ascrbico necessrio a essa converso.
Foi postulado que o cido ascrbico ativa a enzima propil-hidroxilase (incorporao de prolina numa
ligao peptdica), causando a agregao de trs subunidades inativas para formar um composto ativo. A
deficincia na sntese de colgeno resulta na cicatrizao demorada de feridas, ocorrendo aumento de cido
ascrbico na rea do ferimento durante sua caracterizao. Por causa da falha do funcionamento adequado dos
osteoblastos durante o escorbuto, h uma desorganizao na estrutura ssea. A dentina dos dentes tambm
pode ser afetada pela deficincia de vitamina C, embora os defeitos estruturais desses quase nunca aparecem
no homem. A falta dessa vitamina resulta na fragilidade das paredes capilares, que por sua vez pode provocar
hemorragias de vrios graus.

Metabolismo de aminocidos
O cido ascrbico atua no metabolismo dos aminocidos de fenilalanina e tirosina. No caso da
tirosina, foi demonstrado que o cido ascrbico tem papel na biossntese de tirosina hidroxilase.

Ativao e recuperao de outras vitaminas


Ele tambm participa na converso da forma inativa da vitamina cido flico para a forma ativa, cido
folnico, e na regulao do ciclo respiratrio na mitocndria e nos microssomos.

Facilitar a biodisponibilidade de ferro


O cido ascrbico permite a absoro de ferro, reduzindo a forma frrica para a forma ferrosa mais
facilmente absorvida.

Antioxidante
O cido ascrbico tem a capacidade de ceder e receber eltrons, o que lhe confere papel essencial
como antioxidante. Acredita-se que a vitamina C poderia atuar na preveno e tratamento do cncer, na
diminuio do risco de doenas cardiovasculares, no tratamento da hipertenso e na reduo da incidncia de
cataratas.

Outras funes
Entre outras funes, pode-se citar que a vitamina C pode funcionar na inativao da lpase do tecido
adiposo e participar de reaes de desaminao de protenas, bem como facilitar a remoo do colesterol da
circulao, auxiliar a hidroxilao de dopamina para norepinefrina, prevenir a reduo do nitrito em
nitrosamina e participar na converso de colesterol em cidos biliares. Pode estar associada funo dos
leuccitos, resposta imune, cicatrizao e reaes alrgicas.
O sulfato de cido ascrbico (SAA) foi identificado com metablico do cido capaz de funcionar
como um agente surfactante no homem. O efeito antiaterognico do cido ascrbico, por exemplo, pode ser
responsvel pela formao do sulfato do colesterol da circulao ntero-heptica. Igualmente interessante a
hiptese de que o cido ascrbico funciona na converso de colesterol em cidos biliares, participando em
reaes de hidroxilao.
Observaes clnicas de inmeras infeces acompanhadas por Feber apontaram diminuio no nvel
sangneo de cido ascrbico, indicando que, ou h uma necessidade ou uma destruio aumentada por essa
vitamina. Entretanto, parece que uma ingesto inadequada de vitamina C no uma causa de predisposio
para qualquer uma dessas infeces. Observou-se, ainda, que as altas concentraes de cidos ascrbico no
crtex supra-renal so esgotadas sempre que a glndula estimulada por hormnios ou certas toxinas. Embora
no haja concordncia quanto relao de cido ascrbico e o estresse, parece haver aumento nas necessidades
de cido ascrbico em situaes de estresse; entretanto, no h, at agora, conhecimento suficiente para
afirmar, em termos absolutos ou quantitativos, sobre os nveis aumentados dessas necessidades.
A administrao de grandes doses de cido ascrbico parece proteger o indivduo exposto a
temperaturas muito baixas. Entretanto, a controvrsia que envolve o uso e grandes doses de cido ascrbico
para aumentar a resistncia ao frio comum ainda no foi conhecida. O Food and Nutrition Board no
recomenda grandes ingestes de vitamina C.

8.4.2.4. Recomendaes
Estudos foram realizados para determinar as necessidades humanas quanto ao cido ascrbico em
diferentes idades, sob vrias condies do meio ambiente, durante exerccios fsicos, estados febris e em
infeces. A quantidade necessria para prevenir sintomas de escorbuto no homem muito menor (10 mg) do
que as recomendadas para a manuteno da sade.

134
As recomendaes nutricionais da vitamina C vm aumentando ao longo do tempo. A comisso de
especialistas da FAO/OMS recomendava, na dcada de 1960, 30 mg para adultos (homens e mulheres acima
de 13 anos), 50 mg durante a gestao e lactao e 20 mg para crianas recm-nascidas e crianas at a idade
de 13 anos. Nos anos de 1970, o National Research Council recomendava 45 mg dirios para adultos, 60 mg
durante a gestao e 80 mg durante a lactao.
A deficincia grave de vitamina C causa escorbuto, caracterizado por fenmenos hemorrgicos pelo
aumento da permeabilidade da parede de pequenos vasos sangneos, pelo decrscimo na excreo urinria,
concentrao plasmtica e tecidual de vitamina C. Os sintomas incluem sangramento, fraqueza, perda de
apetite, anemia, edema, inflamao nas gengivas (podendo ocorrer perda dos dentes) e dor, entre outros
sintomas. Podem ocorrer tambm distrbios neurticos, como hipocondria, histeria e depresso. Os sintomas
desaparecem rapidamente com a administrao de doses teraputicas.
Entre os efeitos txicos, tem-se a formao de clculos renais, alm do que uma ingesto em altas
doses pode gerar certa dependncia .
8.4.2.5. Fontes
As frutas e hortalias so as fontes mais ricas de cido ascrbico; como exemplo: as frutas ctricas e
vrios vegetais folhosos crs. As melhores fontes so: laranja, limo, acerola, morango, brcolis, repolho,
espinafre etc. Os sucos de frutas ctricas, enlatados ou congelados, podem ser a fonte mais barata de vitamina
C quando as frutas ctricas frescas so escassas ou caras, podendo ser mais baratas do que o suco de tomate,
pois leva trs vezes mais tomate para se obter um suco do que um suco ctrico para fornecer as mesmas
quantidades de vitamina C.
Muitos fatores afetam o teor de cido ascrbico nas frutas e vegetais, como: a variedade, o estado de
maturao, o tempo de armazenamento, a parte da planta, as estaes e as reas geogrficas. Como as plantas
maduras tm menos cido ascrbico, os brotos de feijo ou gros apresentam o teor de cido ascrbico nos
vegetais. Tabelas de grupos de alimentos fornecem mdias representativas, entretanto os alimentos,
individualmente, podem variar muito em relao a esses valores.

8.5. Referncias:

AMERICAN DIABETES ASSOCIATION. Nutrition principles and recommendations in diabetes, Diabetes


Care, v. 27, m.1, S36-S46, 2004.

AUDO, I. et al. Vitamin D analogues increase and apoptosis in a xenograft model of human retinoblastoma.
Invest Ophthalmol Vis Sci., v. 44, p. 4192-4199, 2003.

BEZ-SALDAA, A.; ZENDEJAS-RUIZ,I.; REVILLA-MONSALVE, C.; ISLAS-ANDRADE, S.;


CRDENAS, A.; ROJAS-OCHOA, A.; VILCHES, A.; FERNANDEZ-MEJIA, C. Effects of biotin on
pyruvate carboxylase, acetyl-CoA carboxylase, propionyl-CoA carboxylase, and markers for glucose and lipid
homeostasis in type 2 diabetic patients and nondiabetic subjects. Am. J. Clin. Nutr., v.79, p. 238-43, 2004.

BALL, G.F.M. Bioavailability and analysis of vitamins in foods. [s.l.]: Chapman & Hall, 1998, 569 p.

BASU, T. K., TZE, W. J.; LEICHTER, J. Serum vitamin A and retinolbinding protein in patients with insulin-
dependent diabetes mellitus. Am. J. Clin. Nutr., 50, p. 329-331,1989.

BAYNES, K.C.R.; BOUCHER, B.J.; FREKENS, E.J.M.; KROMHOUT, D. Vitamin D, glucose tolerance and
insulinaemia in elderly men. Diabetologia. v. 40, p. 344-347, 1977.

BEAULIEU, C.; KESTEKIAN, R.; HARVRANKOVA, J.; GASCON-BARRE, M. Calcium is essential in


normalizing intolerance to glucose that accompanies vitamin D depletion in vivo. Diabetes, v. 24, p. 35-43,
1993.

BIZZARRI, M. et al. Melatonin and vitamin D3 increase TGF--1 release and induce growth inhibition in
breast cancer cell cultures. J. Surg Res., v. 110, p. 332-337, 2003.

BOLT, M.J. et al. Critical role of vitamin D in sulfate homeostasis: regulation of the sodium-sulfate co-
transporter by 1,25-dihydroxyvitamin D3. Am. J. Physiol Endocrinol Metab, v. 287, p. E744-E749, 2004.

BRANCH, D. R. High-dose vitamin C supplementation increases plasma glucose. Diabetes Care, v. 22, m. 7,
p. 1218, 1999.

135
CARLBERG, C. Current understanding of the function of the nuclear vitamin D receptor in response to its
natural and synthetic ligands. Recent Results Cancer Res., v. 164, p. 29-42, 2003.

CHANG, J.M. et al. 1-,25-Dihydroxyvitamin D3 regulates inducible nitric oxide synthase


messengerRNA expression and nitric oxide release in macrophage-likeRAW264.7 cells. J. Lab.
Clin. Med., v. 143, p. 14-22, 2004.

CHERTOW, B.S.; WEBB, M.D.; LEIDY, J.W. Jr; CORDLE, M.B. Protective effect of retinyl palmitate on
zterptozotocin and aloxan induced beta-cell toxicity in rat. Res. Comm. Chem. Path. Pharm., v. 63, p. 21-44,
1989.

COMBS JR., G. F. Vitaminas. In: MAHAN, L. K.; ESCOTT-STUMP, S. Krause: alimentos, nutrio e
dietoterapia. 10. ed. So Paulo: Roca,2002. p. 65-105.

COYNE, T. et al. Diabetes mellitus and serum carotenoids: findings of a population-based study in
Queensland, Australia. Am. J. Clin. Nutr., v. 82, p. 685-93, 2005.

COYNE, T. et al. Evaluation of brief dietary questions to estimate vegetable and fruit consumption using
serum carotenoids and red cell folate. Public Health Nutr., v. 8, p. 298-308, 2005a.

DEODHAR, AD. MISTRY, S.P. Regulation of glycolysis in biotin-deficient rat liver. Life Sci II, v. 9, p. 581-
8, 1970.

FORD, E.S.; WILL, J.C.; BOWMAN, B.A.; Narayan, K.M. Diabetes mellitus and serum carotenoids:
findings from the third National Health and Nutrition Examination Survey. Am. J. Epidemiol., v. 149,
p. 168 -76, 1999.

FRANZ, M.J. A.et al. Evidence-based nutrition principles and recommendations for the treatment and
prevention of diabetes and related complications. Diabetes Care, v. 25, m. 1, p. 148-198, 2002.

FRESKENS, E.J.M.; BOWLES, C.H.; KROMHOUT, D. Inverse association between fish intake and the risk
of glucose intolerance in normoglycemic elderly men and women. Diabetes Care, v. 14, p. 935-941, 1991.

GIARRATANA, N. et al. A vitamin D analog down-regulates proinflammatory chemokine production by


pancreatic islets inhibiting t cell recruitment and type 1 diabetes development. The Journal of Immunology,
v. 173, p. 2280-2287, 2004.

GIUGLIANO D,; CERIELLO A.; PAOLISSO, G. Diabetes mellitus, hypertension, and cardiovascular disease:
which role for oxidative stress? Metabolism, v. 44, p. 363-8, 1995.

GRANADO, F.; OLMEDILLA, B.; GIL-MARTINEZ, E.; BLANCO, I.; MILLAN, I.; ROJAS-HIDALGO, E.
Carotenoids, retinol and tocopherols in patients with insulindependent diabetes mellitus and their immediate
relatives. Clin. Sci. (Lond.), v. 94, p. 189-195, 1998.

GREGORI, S. et al. A 1_,25-dihydroxyvitamin D3 analog enhances regulatory t-cells and arrests autoimmune
diabetes in NOD mice. Diabetes, v. 51, p. 1367-74, 2002.

HARRIS, S.S. Vitamin D in type 1 Diabetes prevention. J. Nutr., v. 135, p. 323-325, 2005.

HEISE, C. C.; KING, J. C.; COSTA, F. M.; KITZMILLER, J. L. Hyperzincuria in type I diabetes women:
relationship to measures of glycemic control, renal function, and tissue catabolism. Diabetes Care, v. 11, p.
780-786, 1988.

HITMAN, G.A. et al. Vitamin D receptor gene polymorphisms influence insulin secretion in Bangladeshi
Asians. Diabetes, v. 47, p. 688-690, 1998.

HOLICK, M.F. Vitamin D: importance in the prevention of cancers, type 1 diabetes, heart disease, and
osteoporosis. Am. J. Clin. Nutr., v. 79, p. 362-71, 2004.

136
HOLICK, M.F. Vitamina D. In: SHILS, M.E.; OLSON, J.A.; SHIKE, M.; ROSS, A.C. Tratado de nutrio
moderna na sade e na doena. 9 ed. Barueri: Manole, [s.d]. v.1, p. 351-368.

HYPPONEN, E.; LAARA, E.; JARVELIN, M-R.; VIRTANEN, S.M. Intake of vitamin D and risk of type 1
diabetes: a birth-cohort study. Lancet, v. 358, p. 1500-3, 2001.

INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes : the essential guide to nutrient requireriment.
Part 3. Washington, D.C., United States of America: The National Academy Press, 2006 ; 167-285 p.

JONES, G.; STRUGNELL, S.A.; DELUCA, H.F. Current understanding of the molecular actions of vitamin
D. Physiol Rev., v. 78, p. 1193-1231, 1998.

KARACHALIAS, N. et al. High-Dose thiamine therapy counters dyslipidemia and advanced glycation of
plasma protein in streptozotocin-induced diabetic rats. Ann. N.Y. Acad. Sci., v. 1043, p. 777-783, 2005.

KOUSTIKOS, D. et al. Oral glucose test after high-dose i.v. biotin administration in normoglucemic
hemodialysis patients. Ren Fail, v. 18, p. 131-7, 1998.

LI, Y.C. et al. Vitamin D: a negative endocrine regulator of the renin-angiotensin system and blood pressure. J
Steroid Biochem Mol Biol, p. 89-90, p. 387-392, 2004.

LIU, S.; AJANI, U.; CHAE, C.; HENNEKENS, C; BURING, J. E.; MANSON, J. E. Long-term -Carotene
supplementation and risk of type 2 diabetes mellitus. A randomized controlled trial. JAMA, v. 282, p. 1073-
1075, 1999.

LU, J; DIXON, W.T.; TSIN, A. T.C.; BASU, T. K. The metabolic avaliability of vitamin A is decressed at the
outset of Diabetes in BB rats. J. Nutr. v. 130p. 1958-1962, 1999.

MAEBASHI, M.; MAKINO Y.; FURUKAWA Y.; OHINATA K.; KIMURA S.; TAKAO S.
Therapeutic evaluation of the effect of biotin on hyperglycemia in patients with non-insulin diabetes mellitus.
J. Clin. Biochem. Nutr., v. 14, p. 211-8, 1999.

MATHIEU, C. et al. Prevention of autoimmune diabetes in NOD mice by 1, 25 dihydroxyvitamin D3.


Diabetologia, v. 37, p. 552-8, 1994.

MAXWELL, SR.; et al. Poor glycaemic control is associated with reduced serum free radical scavenging
(antioxidant) activity in non-insulin-dependent diabetes mellitus. Ann. Clin. Biochem., v. 34, p. 638-44, 1997.

MCDERMOTT, M.F. et al. Allelic variation in the vitamin D receptor influences susceptibility to IDDM in
Indian Asians. Diabetologia, v. 40, p. 971-975, 1997.

MITNICK, M.A. et al. Parathyroid hormone induces hepatic production of bioactive interleukin-6 and its
soluble receptor. Am. J. Physiol. Endocrinol. Metab., v. 280, p. E405-E412, 2001.

MONTONEN, J.; KNEKT, P.; JARVINEN, R.; REUNANEN, A. Dietary antioxidant intake and risk of type 2
diabetes. Diabetes Care, v. 27, p. 362- 6, 2004.

NEJENTSEV, S. et al. Analysis of the Vitamin D Receptor Gene Sequence Variants in Type 1. Diabetes.
Diabetes, v. 53, p. 2709-2712, 2004.

OGUNKOLADE, B-H. et al. Vitamin D receptor (VDR) mRNA and VDR protein levels in relation to vitamin
D status, insulin secretory capacity, and VDR genotype in Bangladeshi Asians. Diabetes, v. 51, p. 2294-2312,
2002.

PANI, M.A. et al. Vitamin D Receptor Allele Combinations InfluenceGenetic Susceptibility to Type 1
Diabetes in Germans. Diabetes, v. 49, p. 504-507, 2004.

PAOLISSO, G.; GIUGLIANO, D. Oxidative stress and insulin action: is there a relationship? Diabetologia, v.
39, p. 364-6, 1996.

137
PENTEADO, M.V.C. (Org.). Vitaminas-Aspectos nutricionais , bioqumicos, clnicos e analticos. Barueri:
Manole, 2003. 612 p.

PRESTA, M. et al. Heparin derivatives as angiogenesis inhibitors. Curr. Pharm. Des. v. 9, p. 553-566, 2003.

PROCOPIO, M.; BORRETTA, G. Derangement of glucose metabolism in hyperparathyroidism. J.


Endocrinol. Invest., v. 26, p. 1136-1142, 2003.

REDDI, A.; DEANGELIS, B.; FRANK, O.; LASKER, N.; BAKER, H. Biotin supplementation improves
glucose and insulin tolerances in genetically diabetic KK mice. Life Sci., v. 42, p. 1323-30, 1988.

RONCADA, M.J. Vitaminas lipossolveis. In: MANCHI, J.S.; DUTRA-DE-OLIVEIRA, E. Cincias


Nutricionais. So Paulo: Sarvier, 2000. p. 167-189.
ROSS, A. C.Vitamina A. In: SHILLS. Tratado de nutrio na sade e na doena. 10. ed. [s.l.s.m.], 2004

RUHE, RC.; MCDONALD, RB. Use of antioxidant nutrients in the prevention and treatment of type 2
diabetes. J. Am. Coll. Nutr., v. 20(suppl.),p. 363S-6S, 2001.

SARGENT, L.; et al. Fruit and vegetable intake and population glycosylated haemoglobin levels: the EPIC-
Norfolk Study. Eur. J. Clin. Nutr. v. 55, p. 342-8, 2000.

SAULENAS, A.M.; COHEN, S.M.; KEY, L.L.; WINTER, C.; ALBERT, D.M. Vitamin D and retinoblastoma.
The presence of receptors and inhibition of growth in vitro. Arch Ophthalmol, v. 106, p. 533-535, 1988.

SEIFER, E.; RETTURA, G.; PADAWER, J.; STRATFORD, F.; KAMBOSOS, D.; LEVENSON, S. M.
Impaired wound healing in streptozotocin diabetes. Prevention by supplemental vitamin A. Ann. Surg., v.
194, p. 42-50, 1981.

SOLOMON, L.R.; COHEN, K. Erythrocyte O2 transport and metabolism and effects of vitamin B6 therapy in
type II Diabetes mellitus. Diabetes, v. 38, m. 7, p. 881-886, 1989.

SUZUKI, K.; ITO, Y.; NAKAMURA, S.; OCHIAI, J.; AOKI, K. Relationship between serum carotenoids and
hyperglycemia: a population-based crosssectional study. J. Epidemiol., v. 12, p. 357-66, 2002.

SUZUKI, T.; SANO, Y.; KINOSHITA, S. Effects of 1_,25-dihydroxyvitamin D3 on Langerhans cell


migration and corneal neovascularization in mice. Invest Ophthalmol Vis Sci., v. 41, p. 154-158,
2000b.

SUZUKI, T.; SANO, Y.; SOTOZONO, C.; KINOSHITA, S. Regulatory effects of 1,25-
dihydroxyvitamin D(3) on cytokine production by human corneal epithelial cells. Curr. Eye. Res., v.
20, p. 127-130, 2000a.

TAVERNA, M.J.; JEAN-LOUIS SELAM, J-L.; SLAMA, G. Association between a protein polymorphism in
the start codon of the vitamin D receptor gene and severe diabetic retinopathy in C-Peptide-Negative type 1
diabetes. J. Clin. Endocrinol. Metab., v. 90, p. 4803-4808, 2005.

TAVERNA, M.J.; SOLA, A.; GUYOT-ARGENTON, C.; PACHER, N.; BRUZZO, F.; SLAMA, G.;
REACH, G.; SELAM, J.L. Taq I polymorphism of the vitamin D receptor and risk of severe diabetic
retinopathy. Diabetologia, v. 45, p. 436-442, 2002.

TUITOEK, P. J.; ZIARI, S., TSIN, T. C.; RAJOTTE, R. V.; SUH, M.; BASU, T. K. Streptozotocin-induced
diabetes in rats is associated with impaired metabolic availability of vitamin A. Br. J. Nutr. V. 75, p. 615-622,
1966.

TURPEINEN, H. et al. Vitamin D receptor polymorphisms: no association with type 1diabetes in the Finnish
population. European Journal of Endocrinology, v. 149, p. 591-596, 2003.

VANNUCHI, H.; JR JORDO, A. F. Vitaminas hidrossolveis. In: MANCHI, J.S.; DUTRA-DE-OLIVEIRA,


E. Cincias nutricionais. So Paulo: Sarvier, 2000. p. 190-207.

138
WAGNER, N.; WAGNER, K.D.; SCHLEY, G.; BADIALI, L.; THERES, H.; SCHOLZ, H. 1,25-
Dihydroxyvitamin D3-induced apoptosis of retinoblastoma cells is associated with reciprocal
changes of Bcl-2 and bax. Exp. Eye Res., v. 77, p. 1-9, 2003.

WAITZBERG, D.L. Nutrio oral, enteral e parenteral na prtica clnica. 3. ed. So Paulo:
Atheneu, 2000. 1858 p.

XUE, M.L.; ZHU, H.; THAKUR, A.; WILLCOX, M. 1-,25-Dihydroxyvitamin D3 inhibits pro-
inflammatory cytokine and chemokine expression in human corneal epithelial cells colonized with
Pseudomonas aeruginosa. Immunol Cell Biol., v. 80, p. 340-345, 2002.

YLONEN, K. et al. Dietary intakes and plasma concentrations of carotenoids and tocopherols in relation to
glucose metabolism in subjects at high risk of type 2 diabetes: the Botnia Dietary Study. Am. J. Clin. Nutr., v.
77, p. 1434-41, 2003.

139
Captulo 9: MINERAIS
Neuza Maria Brunoro Costa

9.1. CLCIO
9.1.1. Ocorrncia e Importncia
O clcio o quinto elemento mais abundante na esfera biolgica (aps o ferro, alumnio, slica e
oxignio). o constituinte do calcrio, do mrmore, dos corais, das prolas, das conchas do mar, da casca de
ovo, dos chifres e dos ossos. Devido ao fato de apresentar solubilidade intermediria, encontrado tanto na
forma slida quanto em soluo. Em muitos solos, o clcio existe como ction trocvel. Ele captado pelas
plantas, cujas partes contm de 0,1 a 8% desse elemento. Em geral, sua concentrao maior nas folhas,
menor nos caules e nas razes e menor ainda nas sementes.
Trata-se do mineral divalente mais abundante no corpo humano, contribuindo com cerca de 1,5% do peso
corporal total. Ossos e dentes contm cerca de 99% do clcio, constituindo uma reserva orgnica do mineral. O
restante do clcio est distribudo nos fluidos intracelular e extracelular. Uma mulher adulta de 60 kg de peso
contm aproximadamente de 1.000 a 1.200 mg (25 a 30 mol) de clcio no corpo.
Nos animais superiores, o papel mais bvio do clcio estrutural ou mecnico, conferindo massa, dureza e
fora aos ossos e dentes. No sangue, a concentrao de clcio tipicamente de 2,25 a 2,5 mmol. De 40 a 45%
destes esto ligados a protenas plasmticas, de 8 a 10% esto complexados com ons como citrato e 45 a 50%
esto dissociados na forma de on livre.

9.1.2. Fontes
As principais fontes de clcio so leite, queijo, sorvete, iogurte, tofu, salmo, sardinha com ossos,
ostras, moluscos, folhas de nabo e de mostarda, brcoli, couve, leguminosas e frutas desidratadas. Carnes,
cereais e nozes so, em geral, fontes pobres de clcio, como mostrado a seguir.

Alimento Quantidade mg
Iogurte light 1 xcara 345
Leite desnatado 1 xcara 302
Leite integral 1 xcara 297
Queijo mussarela 1 fatia (30g) 207
Salmo enlatado com osso 100 g 185
Sorvete de baunilha 1 xcara 176
Queijo ricota xcara 167
Espinafre cozido xcara 138
Queijo tofu regular xcara 130
Leite em p, sem gordura 2 C sopa 104
Feijo branco xcara 64
Laranja 1 mdia 52
Brcolis cozidos xcara 36
Carne magra 100 g 4

9.1.3. Metabolismo
9.1.3.1. Absoro
O clcio usualmente liberado dos complexos na dieta durante a digesto e lanado em soluo,
provavelmente na forma ionizvel para ser absorvido. Entretanto, complexos de baixo peso molecular, como
oxalato de clcio e carbonato de clcio, podem ser absorvidos intactos.
A eficincia da absoro (porcentual de absoro) geralmente varia inversamente com o consumo,
mas a quantidade absoluta absorvida aumenta com o consumo. Uma variao de apenas 20% na absoro de
clcio pode refletir no estado nutricional de clcio.

Mecanismos de Absoro
O clcio pode ser absorvido pelas seguintes vias de transporte:
a) Transporte Transcelular

um transporte ativo, que depende de energia, ocorre na poro proximal do duodeno e dependente de
vitamina D e da protena ligante de clcio, calbindina. Envolve trs etapas seqenciais: entrada na clula,
difuso intracelular e extruso.

140
A entrada na clula atravs da borda em escova se d a favor de um gradiente de eletroqumico, por canais
de clcio na clula (no barrados por voltagem). A difuso intracelular do on de clcio, ou seja, o seu
movimento no sentido da membrana basolateral, a etapa-limite da sua absoro. Esse transporte dependente
da calbindina D9k, protena ligante de clcio, cuja sntese dependente da vitamina D. Na deficincia desta
vitamina, o clcio entra na clula, mas permanece na borda em escova. Calbindina se liga ao clcio e aumenta
sua concentrao intracelular. A extruso de clcio da clula intestinal mediada pela CaATPase. Essa sada
de clcio se d contra um gradiente eletroqumico e constitui a etapa dependente de energia da absoro de
clcio. Este, ao chegar na poro basolateral do entercito, liga-se a um stio do aspecto citoplasmtico da
CaATPase, que atravessa a membrana basolateral. Seguem alteraes induzidas pela fosforilao na
conformao da CaATPase, e o clcio extrusado atravs do canal formado pelos elementos da enzima
transmembrana.

b) Transporte Paracelular
O transporte paracelular se d a favor de um gradiente de concentrao entre as estreitas junes dos
entercitos. A quantidade de clcio absorvido paracelularmente determinada pela sua solubilidade, pela
permeabilidade paracelular ao on e pelo tempo gasto pelo quimo para atravessar determinada regio do
intestino. No caso do clcio, sua solubilidade depende da forma qumica dos seus sais e do pH da regio do
intestino.
Presume-se que, enquanto o on se mantiver em soluo, sua absoro ir ocorrer se houver um gradiente
de concentrao entre o lmen intestinal e os fluidos corporais.
O transporte paracelular a principal forma de absoro de clcio quando o consumo adequado ou alto.
Os altos nveis de clcio na dieta regulam o transporte transcelular. Quando os nveis na dieta so baixos, o
transporte transcelular contribui com cerca de 50% do total de clcio absorvido, porm diminui medida que o
nvel de clcio na dieta aumenta.
Cerca de 90% do tempo que o quimo leva para percorrer o intestino delgado gasto no leo (que no
contm calbindina D9k), e que o principal local de absoro de clcio. A forma de absoro no leo
exclusivamente paracelular.

c) Absoro no Clon
A absoro de clcio ocorre no ceco e no clon ascendente. Assume-se que 11% do clcio absorvido pela
via paracelular em toda a extenso do intestino seja absorvido no clon. O transporte ativo de clcio tambm
ocorre no intestino grosso, visto que contm calbindina D9k. O transporte ativo no intestino grosso tambm
regulado pelo clcio, portanto, em dietas ricas em clcio, sua absoro menor.
Estima-se que a absoro de clcio no clon seja da ordem de 10% do total de clcio absorvido no rato.
Em humanos ileostomizados, a absoro de clcio menor do que em pacientes com o clon preservado.

Diversos fatores fisiolgicos afetam a absoro fracional de clcio:


Aumentam a Absoro Reduzem a Absoro
Adequao de vitamina D Deficincia de vitamina D
Aumento da massa da mucosa Diminuio da massa da mucosa
Deficincia de clcio Menopausa
Deficincia de fsforo Idade avanada
Gravidez Reduo da acidez gstrica
Lactao Aumento do trnsito intestinal
Permeabilidade da mucosa

9.1.3.2. Regulao Homeosttica


As concentraes de clcio nos fluidos intra e extracelular esto sob um preciso controle
homeosttico. A concentrao cistoslica de clcio muito baixa, na ordem de 10-7M. A concentrao total
de clcio no plasma de 2,25 a 2,50 mM (8 a 10 mg/dL), dos quais 1 mM est na forma livre (10.000 vezes a
concentrao de clcio livre no citosol). Essa tremenda diferena nos gradientes de concentrao reflete a
habilidade da clula de regular o fluxo e a concentrao de clcio.
A concentrao de clcio dentro da clula regulada por protenas ligantes de clcio na membrana celular
(membrana plasmtica, retculo endoplasmtico e mitocdria). A concentrao no plasma regulada pelo
sistema vitamina D paratormnio (PTH). Quando a concentrao de clcio no plasma cai, a glndula da
paratireide estimulada a secretar PTH, que estimula a converso de 25-OH-D3 a 1,25-(OH)2-D3 nos rins. A
1,25- (OH)2-D3 estimula a absoro de clcio no intestino e, juntamente com o paratormnio, aumenta a
mobilizao de clcio dos ossos (estimula a ao dos osteoclastos) e a reabsoro de clcio nos tbulos renais.
A ativao da vitamina D ocorre em duas etapas. Uma hidroxilao inicial a 25-OH-D3 acontece no
sistema enzimtico citocromo na mitocndria no fgado. Uma segunda hidroxilao se d nos rins, formando a
1,25-(OH)2-D3 ou calcitriol.

141
Quando a concentrao de clcio no sangue se eleva em resposta a uma absoro de clcio aumentada,
reabsoro renal aumentada ou mobilizao ssea, o limiar renal de excreo alterado e o clcio extra,
excretado na urina.
Em crianas, a principal defesa contra hipercalcemia a liberao de calcitonina pelas clulas C da
glndula tireide. Calcitonina um hormnio peptdeo que se liga a stios nos rins, nos ossos e no sistema
nervoso central. A calcitonina reduz a ao dos osteoclastos e reduz a liberao de clcio dos ossos. Quando a
absoro pra, os nveis de calcitonina caem e a ao dos osteoclastos retorna ao normal. Em adultos,
calcitonina tem pouco significado devido ao fato de a absoro intestinal de clcio ser mais reduzida nessa fase
e de o fluido extracelular ser maior. Como resultado, a calcemia absortiva aps uma dieta rica em clcio
promove apenas pequeno aumento nos nveis de clcio no fluido extracelular.

9.1.3.3. Excreo
O clcio excretado do corpo pela urina, pelas fezes e pelo suor. Cerca de 175 a 250 mmol (7 a 10 g) de
clcio so filtrados diariamente nos rins, dos quais 98% so reabsorvidos, sendo 2,5 a 5 mmol (100 a 200 mg)
excretados na urina por dia. A excreo endgena fecal de clcio semelhante excretada na urina. As perdas
pelo suor so de 0,4 a 0,6 mmol (16 a 24 mg) por dia, e uma adicional perda pela descamao de clulas,
cabelo e unhas aumenta essa excreo para cerca de 1,5 mmol (60 mg) por dia.
O clcio fecal inclui a quantidade da dieta que no absorvida mais o clcio que entra no intestino por
fontes endgenas, incluindo descamao das clulas da mucosa, saliva, suco gstrico, suco pancretico e bile.
O mecanismo de transporte de clcio que ocorre no intestino est tambm presente nos nfrons dos rins.
Ambos os processos so estimulados pelo hormnio PTH e pela 1,25- (OH)2-D3 e tm o complexo miosina-
calmodulina, que pode servir como transportador de clcio. Transporte ativo ocorre no tbulo distal contra um
gradiente de concentrao. Nos rins de mamferos, a regulao da vitamina D funciona via calbindina-D28k,
que se liga a 4 Ca2+ por molcula. Entretanto, na ausncia da vitamina D no observada hipercalciria.
Portanto, o maior efeito na excreo renal exercido pelo PTH, visto que na sua deficincia h aumento na
excreo renal de clcio.
O tranporte paracelular ocorre a favor de um gradiente de concentrao. A reabsoro tubular decresce em
mulheres na fase ps-menopausa. A reabsoro de clcio determinada pelo Na+. Para cada 100 mmol de
sdio excretado, aproximadamente 0,5 a 1,5 mmol de clcio excretado na urina.

9.1.4. Funes
9.1.4.1. Mensageiro Intracelular
O clcio ionizado o elemento mais comum de transmisso de sinal na clula devido sua habilidade
de se ligar reversivelmente a protenas. Um estmulo interno ou externo (fsico, qumico ou eltrico) leva a
uma alterao na concentrao de clcio em um stio especfico da clula atravs da liberao de clcio dos
seus estoques intracelulares ou pela entrada de clcio na clula.
A concentrao de clcio mantida a 0,1 M no citosol por intermdio de diversas protenas ligantes.
Isso se faz necessrio, visto que o clcio no metabolizado como outros segundo-mensageiros. Acmulo de
clcio no citosol levaria a clula morte, porque poderia precipitar fosfato, que vital para a transferncia de
energia.
A membrana plasmtica importante na manuteno da homeostase, porque a membrana em estado
de repouso pouco permevel entrada do clcio, e a bomba Ca2+-Mg2+-ATPase expulsa clcio do citosol
para o espao externo (fluido extracelular). Essa bomba ativada pela calmodulina, protena receptora de
clcio intracelular. Portanto, um momentneo incremento na concentrao de clcio no citosol causado por um
influxo de clcio rapidamente seguido do retorno ao seu nvel de pr-excitao. Outras vias de entrada de
clcio pela membrana incluem canais de clcio, canais de voltagem dependente, canais operados por
receptores e canais de sdio. As vias de sada de clcio so mantidas pelas trocas de Na+-Ca2+ pela bomba de
Na+.
Quando um estmulo interno ou externo, tal como um hormnio ou neurotransmissor se liga ao
receptor de membrana, uma srie de respostas ocorre. O receptor pode ser uma protena G ou tirosina quinase.
A fosfolipase C ativada, o que quebra a fosfatidilinositol-4,5-bisfosfato (PIP2) na membrana da clula em
inositol-1,4,5-trifosfato (InsP3) e diacilglicerol (DG). Ao ser lanado no citosol, o InsP3 se liga a receptores na
membrana do retculo endoplasmtico (ou sarcoplasmtico no msculo), que induz liberao de Ca2+ dos
estoques internos. Ca2+ pode ainda entrar na clula pelos canais de Ca voltagem dependentes na membrana
plasmtica. A concentrao de clcio pode se elevar de 0,1 M para 10 M. O Ca2+ elevado no citosol se liga
calmodulina, que por sua vez ativa a quinase para fosforilar protenas especficas. Esse sistema contribui para a
secreo de aldosterona pelas clulas da adrenal em resposta angiostensina II; a secreo de insulina pelas
clulas panceticas; e a contrao muscular de msculos lisos. Simultaneamente, a poro lipdica da PIP2,
DG, permanece na membrana e ativa outra enzima ligada membrana, a protena quinase C, que estimula a
atividade da bomba de clcio. Clulas excitveis, como msculo esqueltico e neurnios, contm canais de

142
Ca2+ voltagem-dependente, que permitem um dramtico aumento do Ca2+ intracelular, que por sua vez ativa
os receptores rianodines (RyR) a liberarem Ca2+ dos estoques internos.

9.1.4.2. Co-fator para enzimas e protenas extracelulares


O clcio necessrio para estabilizar ou permitir a atividade mxima de uma srie de proteases e
enzimas de coagulao sangnea.

9.1.4.3. Ossos e dentes


O clcio existe primariamente como hidroxiapatita insolvel, cuja frmula geral Ca10(PO)4(OH)2x.
Ele representa 40% do peso da poro mineral do osso.
Alm do papel estrutural bvio, o esqueleto uma importante reserva de clcio para manter a
concentrao plasmtica de clcio. O pool de clcio nos ossos se renova a cada 10 a 12 anos em mdia, porm
no h renovao nos dentes. A remodelagem do osso ocorre ao longo da vida. Os osteoclastos comeam o
processo mobilizando clcio dos ossos, via cido ltico e cido ctrico, para dissolverem o osso e enzimas
proteolticas para digerirem a matriz orgnica. Os osteoblastos, ento, sintetizam o osso novo para repor a
poro mobilizada. Usualmente, esse processo casado. A formao do osso excede a mobilizao durante a
fase de crescimento, e a mobilizao excede a formao durante o processo de osteoporose. A mobilizao
acelerada pelo PTH e inibida pela calcitonina.

9.1.5. Biodisponibilidade
9.1.5.1. Interaes com nutrientes e outros componentes da dieta
Diversos nutrientes afetam a homeostase de clcio ou sua absoro:

Sdio
O maior determinante da excreo urinria de clcio o sdio. Sdio e clcio compartilham alguns
dos sistemas de transporte no tbulo proximal, de forma que cada 100 mmol (2,3g) de incremento na excreo
de sdio carreia aproximadamente 0,6 a 1,0 mmol (24 a 40 mg) de clcio.
Como a excreo urinria de clcio representa 50% da variabilidade da reteno de clcio, o sdio
diettico tem grande influncia potencial na perda ssea. Numa mulher adulta, cada grama de sdio extra
consumido por dia pode produzir uma taxa adicional de perda ssea de 1% ao ano quando a perda de clcio na
urina provm do esqueleto.

Protena e Fsforo
Outro componente da dieta que afeta a excreo urinria de clcio a protena. Cada grama de
protena metabolizada aumenta a excreo de clcio em aproximadamente 1,75 mg. Portanto, dobrando a
quantidade de protena purificada ou de aminocidos na dieta a excreo urinria de clcio aumenta em
aproximadamente 50%. A acidez do sulfato produzido pelo metabolismo de aminocidos sulfurados o
principal responsvel pelo incremento na excreo urinria de clcio. Entretanto, alimentos ricos em protenas
so geralmente ricos tambm em fosfato, que tem efeito hipocalcirico, contrapondo o efeito hipercalcirico
das protenas.
Embora a perda urinria de clcio no se altere com a incluso de alimentos ricos em protenas e
fsforo, como carnes, cereais, feijes e produtos de laticnios, a presena de fsforo aumenta o contedo de
clcio nas secrees digestivas, aumentando tambm, por conseguinte, a perda endgena de clcio nas fezes.
Portanto, o consumo de alimentos ricos em protena resulta numa perda lquida de clcio, que pode exacerbar o
risco de uma dieta pobre em clcio.
A relao clcio:protena da dieta est mais relacionada taxa de ganho sseo em mulheres jovens do
que o consumo de clcio ou de protenas isolados. Num outro extremo, o consumo inadequado de protena
compromete a sade ssea e pode contribuir para a osteoporose na terceira idade.
Embora o consumo de fsforo e clcio em diversos nveis no tenha produzido alteraes no balano
de clcio (possivelmente pelo efeito oposto de protena e fsforo), alguns investigadores tm demonstrado
preocupao com a tendncia no aumento do consumo de fsforo em refrigerantes. Nveis elevados de PTH
podem levar maior mobilizao de clcio dos ossos quando o consumo de fsforo alto e o de clcio baixo.

Cafena
Cafena em altas doses pode elevar a excreo urinria de clcio. Esse efeito, entretanto, no tem sido
demonstrado em alguns estudos duplo-cegos. O consumo dirio de duas a trs xcaras de caf acelera a perda
ssea de vrtebras e dos ossos totais do corpo em mulheres ps-menopausa que consumiam menos de 744 mg
de clcio por dia. A relao entre o consumo de cafena e a perda ssea nesse estudo pode ter sido decorrente
de uma reduo na absoro de clcio ou a fatores de confundimento, como a provvel associao inversa
entre o consumo de leite e a ingesto de cafena.

143
Lipdios
O consumo de gorduras tem impacto negativo no balano de clcio somente na ocorrncia de
esteatorria. Nessa condio, o clcio forma sabes insolveis com os cidos graxos no intestino.

Minerais
O uso de suplementos de clcio e de alimentos fortificados tem aumentado a preocupao sobre o
efeito de altas doses de clcio na induo da deficincia de vrios minerais. Altos consumos de clcio
produzem deficincia de magnsio em ratos. No entanto, o consumo de clcio no afeta a reteno de
magnsio em humanos. Da mesma forma, o alto consumo de clcio no tem sido associado baixa reteno de
zinco. A natureza das interaes controversa e requer maiores estudos.
A absoro de ferro no heme reduzida pela metade quando o consumo de clcio de 300 mg por
dia, aps o qual no h redues subseqentes. Em termos prticos, prudente estabelecer a recomendao de
ferro, admitindo que o indivduo consome a quantidade de clcio presente em pelo menos um copo de leite em
cada refeio. A inibio da absoro de ferro pelo clcio no parece ocorrer no lmen intestinal, mas sim uma
competio no transporte de ferro na mucosa intestinal, possivelmente envolvendo a mobilferrina. Estudos
apontam que a suplementao de clcio em at 12 semanas no afeta o estado nutricional de ferro,
possivelmente pela regulao compensatria na absoro de ferro. Estudos de absoro utilizando uma dose
nica de ferro podem exacerbar o efeito inibitrio do clcio, que pode desaparecer no contexto de uma dieta
completa.

Lactose
Lactose aumenta a absoro intestinal de clcio. O efeito maior em crianas do que em adultos e
parece estar mais relacionado ao mecanismo de absoro, independentemente da vitamina D.

Fibras, Fitato e Oxalato


Diversos estudos indicaram que a adio de quantidades razoveis de fibras na forma de trigo integral,
celulose, frutas e hortalias dieta normal leva os indivduos a um balano negativo de clcio,
independentemente da quantidade de clcio consumida. No claro, entretanto, se a m absoro decorrente
do teor de fibra na dieta. O efeito pode ser devido a outros componentes associados a uma dieta rica em fibras,
como fitato e oxalato, que interagem com minerais. Dietas ricas em fibra normalmente contm mais amido e
baixos teores de acar e lipdios. Todos esses trs fatores podem afetar a absoro de clcio.
As fibras podem se ligar ao clcio possivelmente via grupos carboxlicos e resduos e cido urnico.
A fermentao da fibra no clon libera o clcio, que pode ser, ento, absorvido. A ligao do clcio com fibras
menor em pH mais baixo, como o do duodeno.
O fitato tem grande afinidade pelo clcio e pode formar complexos insolveis nas condies do trato
gastrointestinal. Em pH mais baixo, o clcio torna-se mais solvel do que na faixa de pH de 6 a 7.
O efeito do consumo de cereais integrais ricos em fibra e fitato tem sido mais demonstrado em
estudos de curta do que nos de longa durao.
Apenas oxalato na forma solvel reduz a absoro de clcio. Como o oxalato presente na maioria dos
alimentos est na forma solvel, alimentos ricos em oxalato reduzem a absoro do clcio de outras fontes.

Suplementos de clcio
Um fator importante a ser considerado para a fortificao de alimentos com clcio o teor de clcio
presente nos sais. Isso importante, visto que sais com baixo teor de clcio devem ser adicionados em maior
quantidade, s vezes difcil de ser ingerida. A biodisponibilidade depende de certa forma da solubilidade do
clcio no trato gastrointestinal. Por exemplo, carbonato de clcio praticamente insolvel em gua em pH
neutro, mas se dissolve facilmente em solues cidas. Lactato de clcio solvel numa ampla faixa de pH. O
sal preparado com citrato e malato de clcio (CCM) altamente solvel e mais absorvido do que o clcio do
leite e de outros sais.
A biodisponibilidade dos sais de clcio parece ser influenciada pela secreo gstrica e pela ingesto
simultnea de alimentos. A solubilizao pela acidez gstrica, entretanto, no garante absoro eficiente.

Solubilidade em gua e teor de clcio de alguns sais:


Sal Solubilidade em gua Contedo de Clcio
(g/ 100 g de gua fria) (%)
Carbonato de clcio 0,0015 40
Citrato de clcio. 4H2O 0,85 21
Gluconato de clcio. H2O 3,3 9
Lactato de clcio. 5H2O 3,1 13
Acetato de clcio 37 25

144
9.1.5.2. Mtodos de determinao da biodisponibilidade
A falta de sensibilidade de indicadores do estado nutricional de clcio e a regulao homeosttica das
concentaes de clcio nos meios intra e extracelular limitam os mtodos de avaliao da biodisponibilidade
de clcio. Por exemplo, a mudana na concentrao plasmtica de clcio aps a sua ingesto um pobre
indicador da sua absoro, visto que o mecanismo homeosttico mantm os nveis quase constantes, mesmo
quando altas doses so ingeridas.

a) Mtodos de Balano
A tcnica clssica de balano de clcio, com ou sem o uso de traadores isotpicos, continua sendo a
tcnica mais amplamente usada para estudos de biodisponibilidade de clcio.
O balano de clcio definido como:
Balano = Cai (Caf + Cau + Cad)
Em que: Cai = Ca ingerido;
Caf = Ca fecal;
Cau = Ca urinrio; e
Cad = perda pela pele (perspirao e descamao da pele).

As perdas pela pele so geralmente ignoradas porque so bem menores quando comparadas com as
perdas fecal e urinria e porque so muito difceis de se medir. A absoro aparente, calculada como a
diferena entre clcio consumido e clcio excretado nas fezes, pode tambm ser usado como indicador da
biodisponibilidade. No entanto, subestima a absoro verdadeira de clcio, visto que o clcio fecal inclui
quantidades substanciais de clcio endgeno, alm do clcio no absorvido.
Na prtica, os mtodos de balano so tediosos e demandam muito tempo. Alm do mais, so sujeitos
a grandes erros, desde que as medidas precisas de consumo e das perdas so difceis e o tempo de coleta pode
no estar bem estimado. O uso de marcadores, como o azul brilhante, polietileno glicol e cromo podem ser
usados para corrigir a coleta de fezes.
Uma modificao do mtodo de balano consiste na administrao de uma soluo de lavagem, a fim
de limpar todo o trato gastrointestinal. Os indivduos recebem, ento, uma refeio, e aps 12 horas a lavagem
repetida. O procedimento repetido em outro dia, substituindo a refeio por gua. O contedo total do
efluente retal (aps a ingesto da refeio ou da gua) coletado e a absoro lquida de clcio, calculada pela
seguinte equao:

Absoro lquida de clcio = Ca ingerido (Efluente Ca aps a refeio Efluente de Ca aps a


ingesto de gua)

Essa medida tem a vantagem de ser rpida e, portanto, menos cara do que a tcnica tradicional. A
absoro, ao invs do balano, calculada, visto que a determinao acurada da excreo urinria no pode ser
feita nesse curto perodo de tempo.
provvel que a absoro no clon esteja alterada, uma vez que a ao bacteriana estaria
praticamente ausente, e o tempo de trnsito intestinal estaria muito mais rpido do que o habitual. At que
ponto isso pode interferir na absoro de clcio ir depender do quanto do clcio absorvido no clon.

b) Tcnicas de Traadores Isotpicos


b.1) Balano
O mtodo de balano pode ser realizado em conjunto com traadores isotpicos. Uma dose oral de
47
Ca misturada com a dieta e dada numa nica refeio. Duas horas mais tarde, um segundo traador, por
exemplo 45Ca, dado por via intravenosa (i.v.). Absoro fracional ou verdadeira pode ser, ento, calculada
pela relao entre os dois traadores em amostras de sangue e de urina colhidas algum tempo aps a
administrao dos istopos:

Absoro Fracional = Frao do traador oral


Frao do traador i.v.

Essa medida tem a vantagem de se estimar a absoro de clcio numa nica amostra de sangue e de
urina. A absoro total de clcio pode, ento, ser calculada multiplicando-se a ingesto de clcio pela absoro
fracional. Clcio fecal de origem endgena determinado pelo contedo fecal do traador dado por via i.v. O
balano de clcio pode ser calculado pela equao:

Balano de Ca = Ca absorvido (Ca fecal endgeno + Ca urinrio)

145
b.2) Contagem de corpo inteiro
A contagem de corpo inteiro pode ser realizada aps a administrao oral de 47Ca para a estimativa da
biodisponibilidade de clcio. A radioatividade no corpo medida logo aps o oferecimento da dose e
novamente aps sete dias. A reteno no 7 dia expressa como porcentual da dose inicial.
Esse mtodo pode subestimar a absoro verdadeira de clcio, uma vez que pode haver excreo do
traador absorvido aps sete dias. Apesar disso, um excelente mtodo quando se quer comparar a
biodisponibilidade de diferentes dietas. Infelizmente, contadores de corpo inteiro grandes o suficiente para
estudos com humanos so pouco disponveis e muito caros.

c) Marcao Isotpica de Alimentos


Esse procedimento de traadores isotpicos para medir a biodisponibilidade de clcio depende do
pressuposto de que o traador absorvido e utilizado da mesma forma que o clcio intrnseco do alimento.
Os alimentos podem ser marcados intrinsecamente ou extrinsecamente. A marcao extrnseca
consiste na simples mistura de uma soluo contendo o traador com o alimento antes de ser administrado no
indivduo. A marcao intrnseca consiste na introduo intravenosa do traador no animal (produtos de
origem animal) ou na adio do traador na soluo nutritiva de plantas cultivadas em hidroponia (produtos de
origem vegetal).
A marcao extrnseca mais simples, porm o traador pode no se equilibrar completamente com o
mineral no alimento e, conseqentemente, apresentar diferente biodisponibilidade. A marcao intrnseca
mais tediosa e cara, porm pode-se assumir que o traador quimicamente idntico ao elemento estvel no
alimento.
Estudos tm mostrado que, para produtos lcteos, a marcao extrnseca vlida, porm para
alimentos de origem vegetal o resultado variado. Por exemplo, em couve os resultados entre marcao
intrnseca e extrnseca foram similares. No entanto, no espinafre, que contm mais oxalato, com a marcao
extrnseca a absoro de clcio foi duas vezes maior do que na intrnseca.
Uma desvantagem do uso de traadores isotpicos para estudos com humanos o risco potencial da
radiao ionizante, especialmente quando administrado em crianas, gestantes e nutrizes. Uma alternativa mais
segura o emprego de istopos estveis, porm seu uso ainda limitado pelo seu alto custo e necessidade de
equipamentos sofisticados e nem sempre disponveis nos laboratrios.
Essas tcnicas podem ser perfeitamente utilizadas em estudos com animais, nos quais a radioatividade
medida nos ossos (fmur ou tbia) aps a administrao de uma dose do traador na dieta. A absoro
fracional pode ser medida pela relao do traador nos ossos dos grupos que o receberam na dieta e o traador
nos ossos dos animais que receberam uma dose via intraperitoneal.

9.1.6. Avaliao do estado nutricional


O esqueleto funciona como uma enorme reserva de clcio, para manter os nveis no fluido extracelular,
crtico para as funes celulares. Essa reserva to grande que a deficincia de clcio na clula ou no tecido
nunca encontrada, pelo menos por razes nutricionais. Entretanto, uma reduo nas reservas de clcio resulta
na reduo da fora ssea. O tamanho da reserva pode ser estimado usando "dual-energy x-ray
absorptiometry" (DEXA). Reservas baixas podem estar baixas devido a outras razes, que no as nutricionais,
por exemplo a falta de atividade fsica adequada, perda de peso, deficincia de hormnios gonodais e vrias
doenas e seus tratamentos.
O balano de clcio tem sido usado em pesquisas para determinar as perdas de clcio em funo das
quantidades ingeridas. O balano negativo implica perdas sseas. Essa tcnica no se aplica a indivduos de
vida livre em nveis usuais de clcio.
Baixos nveis sricos de clcio representam anormalidade na funo da paratireide e no no consumo de
clcio.

9.1.7. Recomendaes Nutricionais


A recomendao de clcio foi estabelecida como Ingesto Adequada (AI) e no como Requerimento
Mdio Estimado (EAR), portanto a RDA (Quota Diria Recomendada) no foi estabelecida. As razes pelos
estabelecimentos da AI e no do EAR decorrente das seguintes prerrogativas:
a) Incertezas na preciso dos mtodos de balano, que servem de base para a determinao da reteno
de clcio.
b) A falta de concordncia entre estudos observacionais de consumo e experimentais (o consumo de
clcio no Canad e Estados Unidos muito mais baixo do que os nveis estimados experimentalmente
para se obter reteno adequada de clcio).
c) A falta de estudos longitudinais que possam justificar a falta de consistncia entre estudos de
consumo e experimentais e que possam demonstrar a taxa de perda ssea no longo termo capaz de
levar sua seqela clnica, a fratura ssea.

146
Dessa forma, a recomendao de clcio, segundo a Food and Nutrition Board/ Institute of Nutrition (IOM,
1997), :
Grupo Idade Clcio (mg/dia)
AI*
Lactentes 0-6m 210
7 - 12 m 270
Crianas 1-3a 500
4-8a 800
Homens 9 - 13 a 1.300
14 - 18 a 1.300
19 - 30 a 1.000
31 - 50 a 1.000
51 - 70 a 1.200
> 70 a 1.200
Mulheres 9 - 13 a 1.300
14 - 18 a 1.300
19 - 30 a 1.000
31 - 50 a 1.000
51 - 70 a 1.200
> 70 a 1.200
Gravidez 18 a 1.300
19 - 30 a 1.000
31 - 50 a 1.000
Lactao 18 a 1.300
19 - 30 a 1.000
31 - 50 a 1.000
*AI Ingesto adequada
O nvel de ingesto mxima tolervel (UL) no foi estabelecido para crianas de 0 a 12 meses. Para
crianas acima de 1 ano de idade, bem como para as demais faixas etrias e estados fisiolgicos (gravidez e
lactao), a UL foi estabelecida em 2,5 g/dia, segundo IOM (1997).

9.1.8. Deficincia
Em razo da grande reserva de clcio nos ossos, a deficincia de clcio praticamente inexistente, embora
tenham sido reportadas anomalias bioqumicas, como hipocalcemia, hipercalciria e nveis elevados de
fosfatase alcalina em crianas de 7 a 12 anos de idade consumindo habitualmente 125 mg de clcio por dia.
A inadequao crnica de clcio um dos fatores na etiologia de diversas desordens. O consumo
adequado de clcio tem efeito protetor no desenvolvimento da osteoporose e sido relacionado com a reduo
do risco de hipertenso, cncer de clon, toxidez por chumbo e clculo renal em pacientes com sndrome do
intestino curto. O alto consumo de clcio leva formao de complexos insolveis de oxalato de clcio no
intestino, reduzindo a absoro do oxalato da dieta. O oxalato o principal responsvel pela formao do
clculo renal e no o clcio.

9.1.9. Toxidez
As informaes sobre os efeitos adversos do excesso de consumo de clcio em humanos so
primariamente relacionados ao consumo de suplementos de clcio. Os mais provveis efeitos adversos do
consumo excessivo de clcio so: formao de clculos renais (nefrolitase), sndrome da hipercalcemia e
insuficincia renal com ou sem alcalose (referida historicamente como sndrome alcalina do leite, associada ao
tratamento da lcera pptica) e a interao do clcio com a absoro de outros minerais essenciais.

9.2. FSFORO
9.2.1. Introduo
O fsforo existe na natureza numa diversidade de estados oxidativos, variando de -3 a +5. Do ponto
de vista bioqumico, compostos de fsforo e oxignio so predominantes devido maior estabilidade
termodinmica dos compostos de fosfato em gua.
O fsforo no fluido extracelular representa apenas 1% do total de fsforo do organismo. A maioria
(70%) do total de P no plasma encontrada como constituinte de fosfolipdios orgnicos. No entanto, a frao
de P de significado clnico a concentrao de P inorgnico no plasma. Cerca de 10% do P inorgnico do
plasma est ligado a protenas, 5% complexado com Ca ou Mg e a maioria encontrada como H2PO4- e
HPO4-2. Essas duas fraes de ortofosfato so encontradas, em pH 7,4, na proporo 1:4.

147
9.2.2. Digesto
Sais de fosfato insolveis so formados em pH elevado. O meio cido do estmago (pH=2) e da
poro proximal do intestino delgado (pH=5) desempenha importante papel na manuteno da solubilidade e
biodisponibilidade do fsforo inorgnico. Isso pode ter importncia ainda maior em situaes de acloridria,
observadas em idosos e indivduos com medicao antilcera.
Em dietas vegetarianas, a maioria do fsforo est na forma de fitato. Os animais e o homem no
possuem a enzima fitase, necessria para quebrar o fitato e liberar o fsforo. Dessa forma, o fitato muito
pouco digerido no trato gastrointestinal. No entanto, seres procariotas, como leveduras e bactrias, contm
fitase, o que se torna importante na nutrio humana por duas razes. Em primeiro lugar, o uso de leveduras
como agente de crescimento de massas libera o fsforo pela ao antes de serem assadas. Em segundo lugar, as
bactrias intestinais, localizadas no intestino grosso, podem quebrar o fitato.
O remolho de gros em gua pode efetivamente remover fitato. Por exemplo, 99,6% do fitato do
feijo pode ser extrado na macerao com gua. A moagem dos gros tambm pode remover a camada
superficial do germe, rico em fitato. Entretanto, esses tratamentos tambm reduzem o teor total de fsforo nos
alimentos.
Outras formas orgnicas de fsforo na dieta so primariamente derivadas de compostos celulares que
contm fsforo, como fosfolipdios e acares fosforilados. Esses compostos so digeridos no intestino
delgado, liberando fsforo inorgnico, que transportado atravs da membrana da parede intestinal.

9.2.3. Absoro
Cerca de 60 a 70% do fsforo de uma dieta mista absorvido.
A absoro de fsforo em humanos tem sido demonstrada como sendo linear ao consumo de fsforo
at o nvel de 0,13 a 1 mmol/kg de peso corporal (4 a 30 mg/kg) por dia.
Estados fisiolgicos, como crescimento, gravidez e lactao, so associados a aumentos na
necessidade de P e no correspondente aumento na sua absoro. Em idosos, ocorrem alteraes na excreo e
adaptaes na ingesto de P, de modo que balano negativo , muitas vezes, observado.
O mecanismo celular e molecular da absoro de P no completamente conhecido. O transporte de P
atravs da parede intestinal se d por um mecanismo ativo, dependente de sdio. A absoro intestinal de P
representa a soma do componente saturvel, mediado por carreador e no saturvel, dependente da
concentrao. Nveis intracelulares de P so relativamente altos, e o interior da clula eletronegativo.
Portanto, provvel que um transporte ativo seja necessrio para levar o P para dentro da clula, mas a sada
de P da clula se d por difuso. Um peptdio 145-kd tem sido identificado como o transportador de P da borda
em escova sensvel ao sdio.
O hormnio da paratireide no parece desempenhar papel diretamente na regulao da absoro de P
no intestino. Administrao de metablitos ativos da vitamina D, no entanto, leva a um aumento da absoro
de P tanto em indivduos normais quanto em pacientes urmicos. Em ratos, a administrao da 1,25(OH)2D3
aumenta a absoro de P ao longo de todo o intestino delgado, sendo o maior efeito no jejuno, ao contrrio da
absoro de clcio mediada pela 1,25(OH)2D3, que se d principalmente no duodeno.

9.2.4. Regulao Metablica


O fsforo plasmtico reflete a relao lquida do fluxo de P entre intestino, rins, ossos e tecidos moles.
Os rins so os reguladores primrios dos nveis de P plasmtico, atravs da alterao da taxa de P filtrado que
reabsorvido. Em baixos suprimentos de P, essencialmente todo P filtrado reabsorvido e nenhum excretado
na urina. medida que o P no filtrado glomerular aumenta, a capacidade reabsortiva dos rins excedida, e o P
aparece aumentado na urina.
A regulao do total de P no organismo por um longo perodo de tempo requer um esforo
coordenado dos rins e do intestino. Sob condies de baixo consumo de P, o intestino deve aumentar sua
eficincia absortiva para maximizar a absoro de P, e os rins devem aumentar a reabsoro de P para
minimizar as perdas urinrias de P. Essas adaptaes resultam de alteraes no plasma dos nveis de
1,25(OH)2D3 e de PTH. Se esses mecanismos de adaptao falharem para compensar os baixos consumos de P,
ento o P dos ossos pode ser inicialmente redistribudo para os tecidos moles para garantir o seu crescimento.
No entanto, eventualmente o crescimento pode estar limitado pela restrio do suprimento de P.

9.2.5. Excreo
As perdas fecais endgenas de P variam de 0,03 a 0,14 mmol/kg (0,9 a 4 mg/kg) por dia. Os rins so a
principal via de excreo de P, variando de 0,1 a 20% do P filtrado.
O transporte de P nos tbulos renais ocorre por dois processos: no tbulo proximal, um sistema de
transporte ativo, dependente de sdio, tem sido descrito; um segundo sistema de transporte tambm encontrado
nos rins passivo, independentemente de sdio.
O principal regulador da excreo urinria de P a sua concentrao plasmtica e o principal
hormnio relacionado a essa regulao o PTH. Os nveis plasmticos de PTH so positivamente

148
correlacionados com a excreo urinria de P. PTH afeta tanto a reabsoro dependente de sdio quanto a no
dependente de sdio.
Os principais determinantes da perda urinria de P so consumo aumentado de P na dieta e aumento
da absoro intestinal de P e dos nveis plasmticos de P. Outros fatores importantes que esto associados com
a hiperfosfatria so hiperparatireoidismo, acidose aguda respiratria ou metablica, diurticos e expanso do
volume extracelular.
Redues na excreo urinria de P esto associadas com a restrio diettica de P, aumento dos
nveis plasmticos de insulina, hormnios da tireide, hormnio do crescimento ou glucagon, alcalose
metablica ou respiratria, hipocalemia e contrao do volume extracelular.

9.2.6. Funes e Mecanismos de Ao


DNA e RNA so polmeros baseados em monneros steres de fosfato; as ligaes de fosfato ricas em
energia do ATP so as principais formas de energia dos seres vivos; as membranas celulares so compostas,
em grande parte, por fosfolipdios; e os constituintes inorgnicos dos ossos so basicamente sais de clcio e
fsforo (fosfato de clcio amorfo e hidroxiapatita). A matria viva tem uma enorme demanda por fsforo.
Diversas atividades enzimticas so controladas por fosforilao e desfosforilao de protenas por quinases e
fosfatases celulares.
O metabolismo de todos os principais substratos metablicos depende do P como co-fator de uma
variedade de enzimas e como principal reserva de energia metabolizvel, na forma de ATP, creatina-fosfato e
fosfoenolpiruvato.
Outro importante papel do P est relacionado com o fato de que molculas neutras so solveis em
lipdios e podem atravessar as membranas. Fosfatos so ionizveis em pH fisiolgico, de forma que podem
manter substncias fosforiladas dentro das clulas.
Fsforo combina com clcio para formar hidroxiapatita, o principal composto inorgnico dos ossos.

9.2.7. Fontes Alimentares


Ao avaliar as fontes de P, deve-se levar em considerao no somente o seu teor nos alimentos, mas
tambm a sua biodisponibilidade.
O fsforo encontrado amplamente distribudo nos alimentos. Em geral, boas fontes de protenas
(carnes, leite, ovos e cereais) so tambm ricas em P. Nos cereais, a maior parte do fsforo se encontra na
forma de cido ftico e de compostos organofosfatos.

Alimento Quantidade mg
Leite integral 1 xcara 232
Presunto 100 g 210
Queijo ricota xcara 170
Levedo de cerveja 1 C sopa 140
Castanha de caju xcara 138
Feijo cozido xcara 137
Bife de hamburger 100 g 135
Po integral 1 fatia 74
Bebidas tipo cola 1 lata 46

9.2.8. Biodisponibilidade
Diversos constituintes da dieta e a quantidade relativa de outros minerais nela podem inibir ou
estimular a biodisponibilidade do mineral. Em geral, a biodisponibilidade de P maior nos produtos de origem
animal do que nos de origem vegetal.

Produtos Animais
O fsforo encontrado nas carnes bem absorvido (>70%) em humanos. Nas carnes, o P est presente
principalmente como compostos orgnicos, que so, na sua maioria, hidrolisados no trato gastrointestinal,
liberando P inorgnico, que disponvel para a absoro intestinal. Carnes processadas tambm contm
diversos polifosfatos e pirofosfatos como aditivos.
O fsforo inorgnico representa um tero do P do leite, 20% ocorre como ligaes steres com
aminocidos e casena, 40% est nas micelas de caseinato e o restante, na forma de steres hidrossolvel e
lipossolvel. O P inorgnico do leite encontrado principalmente como sais de fosfato de clcio, magnsio e
potssio.
A biodisponibilidade relativa do P no leite tem sido demonstrada como sendo de 65 a 90% em
crianas. Entretanto, todo o P da casena do leite, que representa 20% do total de P do leite, est na forma de
um polipeptdio 5 kd, que resistente digesto enzimtica pela tripsina e pode reduzir a sua

149
biodisponibilidade. O menor contedo de casena no leite humano, comparado ao leite de vaca, pode ser o
responsvel pela maior biodisponibilidade do P no leite humano.
A maior parte do P no ovo est na forma de uma fosfoprotena 45 kd, chamada de fosvitina, que tem
grande afinidade pelo ferro. No h muita informao sobre a biodisponibilidade de P nos ovos.

Produtos Vegetais
A recomendao de maior ingesto de cereais, leguminosas e vegetais demanda uma reavaliao da
biodisponibilidade de P nesses alimentos. Existe preocupao a respeito da biodisponibilidade de P em gros,
devido ao fato de este ser encontrado, na maior parte, na forma de cido ftico (fosfato de inositol) e compostos
organofosfatos, usados pela planta para estocar P. Em trigo, arroz e milho, mais de 80% do total de P est na
forma de cido ftico, enquanto na batata representa cerca de 35%.

Interaes com Minerais


O alto contedo de P em frmulas infantis usadas para garantir o crescimento de prematuros pode
reduzir a absoro de magnsio. O fsforo pode reduzir a absoro de chumbo em humanos.
O consumo de clcio em nveis de at 50 mmol (2 g) por dia no parece inibir a absoro de P. No
entanto, altos nveis de clcio ingeridos junto com a alimentao inibem a absoro de P em animais e
humanos. A ingesto de 25 mmol (1.000 mg) de clcio numa dieta contendo 12 mmol (372 mg) de P reduziu a
absoro de P de 70 para 31%. Isso de grande importncia, visto o alto interesse por suplementos de clcio
que podem afetar o balano de P quando em excesso.
A ingesto de anticidos contendo alumnio ou magnsio reduz a absoro de P, devido ligao
entre eles.

9.2.9. Recomendaes Nutricionais


As recomendaes nutricionais de fsforo, segundo o IOM (1997), foram estabelecidas em:
Grupo Idade Fsforo (mg/dia)
EAR RDA UL
Lactentes 0-6m 100* NE
7 - 12 m 275* NE
Crianas 1-3a 380 460 3.000
4-8a 405 500 3.000
Homens 9 - 13 a 1.055 1.250 4.000
14 - 18 a 1.055 1.250 4.000
19 - 30 a 580 700 4.000
31 - 50 a 580 700 4.000
51 - 70 a 580 700 4.000
> 70 a 580 700 3.000
Mulheres 9 - 13 a 1.055 1.250 4.000
14 - 18 a 1.055 1.250 4.000
19 - 30 a 580 700 4.000
31 - 50 a 580 700 4.000
51 - 70 a 580 700 4.000
> 70 a 580 700 3.000
Gravidez 18 a 1.055 1.250 3.500
19 - 30 a 580 700 3.500
31 - 50 a 580 700 3.500
Lactao 18 a 1.055 1.250 4.000
19 - 30 a 580 700 4.000
31 - 50 a 580 700 4.000

*AI : ingesto adequada.


NE: no estabelecido.
EAR: necessidade mdia estimada.
RDA: quota diettica recomendada.
UL: nvel de ingesto mxima tolervel.

9.2.10. Deficincia
A deficincia crnica de P em animais resulta na perda de apetite, desenvolvimento de tores nas
juntas, ossos frgeis e aumento da suscetibilidade a infeces. A falta de apetite leva a uma menor massa
ssea.

150
Em indivduos normais, a deficincia de P improvvel de ocorrer devido ao fato de o P ser
amplamente encontrado nos alimentos. Entretanto, bebs prematuros so exceo, devido sua maior
possibilidade de desenvolver raquitismo devido a um inadequado suprimento de clcio e fsforo.
A deficincia de P acompanhada da reduo na sua excreo renal e de aumento na excreo
urinria de clcio, magnsio e potssio, sendo o clcio e o magnsio provenientes dos ossos.
As manifestaes clnicas da hipofosfatemia incluem: manifestaes hematolgicas (reduo nas
clulas vermelhas, anemia hemoltica, disfuno das plaquetas e de leuccitos), respiratrias (falha respiratria
aguda hiper ou hipoventilao), musculares (fraqueza generalizada, miopatia proximal), neurolgicas
(parestesia, confuso, acessos, coma, tremor, ataxia), endcrinas (hipoparatireoidismo funcional, intolerncia
glicose), esquelticas (osteomalcia com dores sseas e pseudofraturas), cardacas (cardiomiopatia reversvel,
reduo da resposta vascular de vasopressores), renais (hipofosfatria, hipercalciria, hipermagnesria, acidose
metablica hiperclormica).

9.2.11. Avaliao do Estado Nutricional


O mais comum ndice de avaliao do estado nutricional de fsforo o nvel de P no soro. Entretanto,
essa medida inadequada por uma srie de razes. Apenas 1% do P est no fluido extracelular, e o nvel de P
no plasma est sob controle fisiolgico. O P no plasma determinado pela capacidade de reabsoro tubular
nos rins, que por sua vez regulado pelos nveis de PTH e outros fatores. Alm disso, o nvel de P no plasma
pode ser elevado artificialmente em funo do catabolismo nos msculos e nos ossos ou decrescer por trocas
rpidas de P no compartimento intracelular.
Os nveis de P intracelular de clulas vermelhas do sangue, leuccitos e plaquetas tm sido
investigados e se correlacionado bem com os nveis de P circulante, entretanto os nveis de ATP intracelular
so mais resistentes a mudanas.
O P urinrio reflete o consumo diettico de P em condies normais. Hipofosfatria e hipercalciria
ocorrem quando h depleo de P. Da mesma maneira, nveis elevados de fosfatase alcalina e 1,25(OH)2D3
podem estar presentes, mas essas alteraes bioqumicas no so especficas o suficiente para predizer as
reservas orgnicas de P.
Novas tcnicas de ressonncia magntica (NMR) oferecem um instrumento poderoso para investigar
o estado de P intracelular sob diversas condies in vivo. Alm disso, a anlise da ativao de neutrons no
corpo inteiro pode medir o P total do corpo in vivo. No entanto, essas tcnicas so muito caras e sofisticadas e,
portanto, de aplicabilidade limitada.

9.2.12. Excesso Alimentar


Hipocalcemia e hiperparatireoidismo secundrio com excessiva perda ssea tm sido demonstrados
em animais alimentados no longo prazo com dieta contendo uma relao P:Ca maior do que 2:1.
Em crianas, o alto contedo de P nas frmulas infantis, substitutas do leite humano, pode causar
hipocalcemia e tetania.

9.3. MAGNSIO
9.3.1. Introduo e Ocorrncia no Organismo
O magnsio o segundo elemento mais abundante no meio intracelular, depois do potssio. No homem
adulto, h cerca de 100 mmol (24 g), dos quais aproximadamente 60% esto no esqueleto, 39% no espao
intracelular, 20% no msculo esqueltico incluindo o corao e apenas 1% se encontra no espao extracelular.
Existem trs pools de magnsio no organismo: um com rpido turnover, constitudo, principalmente,
do Mg extracelular; um segundo pool com uma taxa de turnover duas vezes menor que o primeiro,
constitudo do Mg intracelular; e um terceiro pool com turnover muito baixo, constitudo do Mg do
esqueleto.
O nvel normal de Mg no soro mantido dentro de uma faixa estreita (0,7 a 1,0 mmol/L) e no se
correlaciona com o total de Mg no organismo. Uma deficincia intracelular de Mg pode ocorrer com nveis
normais de Mg no soro. Cerca de 30% do Mg no soro est ligado a protenas, e a maioria do Mg restante se
encontra na forma ionizvel. O Mg intracelular est ligado, principalmente, a protenas e fosfatos ricos em
energia.

9.3.2. Absoro
A absoro se d primariamente no intestino delgado. Alguma absoro pode ocorrer no estmago, e,
em casos de patologias do intestino, o clon pode se transformar num importante stio de absoro. No trato
gastrointestinal da ordem de 35 a 40%.
O Mg endgeno, proveniente da bile e dos sucos pancretico e intestinal, geralmente elevado, cerca de
1,25 mmol/L, e quase que completamente absorvido. O Mg absorvido por transporte transcelular saturvel,

151
que fisiologicamente regulado, e por transporte paracelular no-saturvel, que dependente da concentrao
de Mg no lmen.
Diversos fatores influenciam a absoro de Mg, dentre eles fsforo, fitato, clcio, lipdios e protenas.

9.3.3. Excreo
O balano de Mg regulado pela excreo renal. A excreo urinria normal de Mg de 120 a 140
mg/dia, sendo a maior parte da excreo realizada noite.
Os rins so muito eficientes na conservao do Mg, de forma que indivduos com consumo de Mg muito
baixo so capazes de praticamente no excretar Mg na urina. Doses de Mg injetadas em indivduos normais
so praticamente excretadas na sua totalidade na urina em 24 horas.

Fatores que influenciam a reabsoro tubular de Mg


Reduzem Aumentam
Consumo de glicose Deficincia de Mg
Consumo de lcool Baixo consumo de Mg
Suprimento extra de Na, Ca e Mg Altos nveis de PTH
Expanso do volume extracelular
Agentes osmticos
Diurticos

9.3.4. Controle Homeosttico


Um complexo, porm no muito bem conhecido, sistema de interaes existe entre Mg e diversos
hormnios. H evidncias de que PTH, epinefrina, insulina, calcitonina e taurina estejam envolvidos na
regulao da homeostase de Mg.

9.3.5. Determinao do Estado Nutricional


a) O nvel sangneo de Mg no um bom indicador do estado nutricional, visto que apenas um pequeno
porcentual do Mg corporal est no meio extracelular, devido ao controle exercido pelos rins na regulao da
homeostase.
b) A avaliao do consumo de Mg pode-se determinar se o indivduo est consumindo uma dieta
cronicamente deficiente em Mg. Dietas ricas em lipdios, acares e cereais refinados so pobres em Mg.
Histria de alcoolismo, alguns medicamentos e certas doenas podem ser associados ao baixo consumo de Mg.
Dentre as causas da deficincia de Mg, podem-se citar:
Nutricional e Gastrointestinal:
Hbitos alimentares inadequados (Ex. idosos)
Alimentao enteral ou parenteral prolongada sem adequada suplementao de Mg
Dreno gstrico ou fstula intestinal por longo prazo
Diarria prolongada
M absoro
Alcoolismo
Renal:
Terapia com diurticos
Hipercalcemia
Certas doenas renais
Certos antibiticos
Endcrina:
Aldosteronismo primrio e secundrio
Diabetes
Hipertireoidismo
Hiperparatireoidismo

c) A determinao do Mg livre (forma inica) muito importante, visto que essa a forma
biologicamente ativa do Mg, porm muito difcil de se fazer de forma acurada. Pode ser feita por
ultrafiltrao ou dilise de equilbrio.
d) Tem sido sugerida a determinao de Mg nos tecidos (clulas sanguneas vermelhas e brancas e
msculo).
O teor de Mg nas clulas vermelhas do sangue (RBC) relativamente fcil de se medir e bastante
reprodutvel. Entretanto, muitos estudos no provaram correlao entre esses valores e a concentrao de Mg
no soro, msculo ou clulas brancas do sangue. Portanto, seu uso no est muito claro. Parece haver
determinao gentica nos nveis de Mg nas RBC e efeito da idade, visto que jovens tm maior Mg nas RBC
do que idosos.

152
O teor de Mg em leuccitos (clulas sangneas mononucleares ou WBC) parece ser um melhor
preditor do Mg cardaco e muscular do que o Mg nas RBC ou no soro. No msculo, pode ser determinado por
bipsia, o que requer habilidades e demanda maiores prticas de laboratrio para se obterem resultados
acurados. Esse mtodo mais utilizado em pesquisas especiais.
e) Coleta de urina por 24 horas pode ser til na verificao de perdas de Mg pela urina.
f) Reteno de Mg seguida de administrao parenteral tem sido mais usada como indicador da
deficincia de Mg. Indivduos com balano normal de Mg excretam essencialmente todo Mg injetado, dentro
de 24 a 48 horas. Indivduos eficientes retm significante frao do Mg injetado. At o presente tem sido difcil
relacionar a porcentagem de reteno com a deficincia total de Mg no organismo, e o valor clnico desse teste
incerto.
Alteraes no Mg no soro e Mg excretado seguido de uma dose oral de Mg tm sido usadas para
avaliar a absoro intestinal de Mg. Os resultados so primariamente dependentes da taxa de absoro no
intestino delgado e provavelmente o melhor teste disponvel, do ponto de vista prtico, na avaliao da
absoro de Mg.

9.3.6. Funes
O Mg um co-fator de mais de 300 sistemas enzimticos. indispensvel no metabolismo do ATP e
essencial em uma srie de processos metablicos, como: utilizao da glicose, sntese de lipdios, sntese de
protenas, sntese de cidos nuclicos, contrao muscular e sistema de transporte de membrana.
O Mg considerado um antagonista natural do clcio, afetando sua captao, seu contedo, sua ligao e
a distribuio do Ca nas clulas do msculo liso.
O Mg est presente na superfcie cristalina do osso e age como um veneno de cristal, prevenindo a
formao de cristais de Ca-P grandes e perfeitos. Isso importante, visto que cristais grandes e perfeitos
so rgidos e se quebram mais facilmente do que outros tipos, que so mais maleveis. Ossos de mulheres em
ps-menopausa com osteoporose contm menor teor de Mg e so maiores, e os cristais so mais perfeitos do
que ossos normais.

9.3.7. Recomendaes Nutricionais


As recomendaes nutricionais de magnsio (mg/dia), segundo o IOM (1997) foram estabelecidas
em:
Grupo Idade EAR RDA UL (+)
Lactentes 0-6m 30* NE
7 12 m 75* NE
Crianas 1-3a 65 80 +65
4-8a 110 130 +110
Homens 9 - 13 a 200 240 +350
14 - 18 a 340 410 +350
19 - 30 a 330 400 +350
31 - 50 a 350 420 +350
51 - 70 a 350 420 +350
> 70 a 350 420 +350
Mulheres 9 - 13 a 200 240 +350
14 - 18 a 300 360 +350
19 - 30 a 255 310 +350
31 - 50 a 265 320 +350
51 - 70 a 265 320 +350
> 70 a 265 320 +350
Gravidez 18 a 335 400 +350
19 - 30 a 290 350 +350
31 - 50 a 300 360 +350
Lactao 18 a 300 360 +350
19 - 30 a 255 310 +350
31 - 50 a 265 320 +350
*AI: ingesto adequada.
NE: no estabelecido.
EAR: necessidade mdia estimada.
RDA: quota diettica recomendada.
(+)UL: nvel de ingesto mxima tolervel (dose suplementar de Mg).

9.3.8. Fontes Alimentares

153
Em ordem decrescente de concentrao mdia de Mg por peso, tm-se: nozes, cereais integrais, produtos
do mar, carnes, leguminosas, hortalias, produtos lcteos, frutas, acares refinados e gorduras, sendo que
acares refinados e gorduras no contm virtualmente nenhum Mg.
As folhas verdes so excelentes fontes de Mg, pelo fato de o Mg ser constituinte da clorofila, porm seu
alto teor de gua faz que seu teor por peso seja relativamente baixo.
O refinamento dos cereais remove quase todo o Mg presente no gro. Por exemplo, arroz integral contm
1.477 g/g e arroz polido, apenas 251 g/g.
A coco tambm reduz o teor de Mg; por exemplo, cenoura crua contm 185 g/g e cenoura cozida, 62
g/g.
A gua dura contm altos teores de Mg e pode contribuir com at 30% do consumo dirio de Mg. Esses
teores variam de 0 a 15 g/mL.
O consumo de Mg tem decado nos ltimos anos, possivelmente devido ao refinamento dos alimentos e do
uso de fertilizantes sem Mg.

9.3.9. Deficincia
A deficincia de Mg em humanos pode ser dividida em duas categorias: aguda e crnica.
A deficincia aguda est associada a outras patologias pr-existentes e causa uma variedade de sintomas.
Hipomagnesemia e,ou, deficincia de Mg so usualmente decorrentes de perdas de Mg tanto pelo trato
gastrointestinal quanto pelos rins. Seus sintomas incluem: falta de memria, perda de concentrao, apatia,
depresso, confuso, alucinaes, idias paranicas, sintomas neuromusculares (dormncia, formigamento,
cimbra, fraqueza muscular, tremor, ataxia, tetania, acesso e tremor nos olhos), anormalidades no
eletrocardiograma, arritmias, morte sbita e baixos nveis de Ca e de K.
Sinais da deficincia crnica de Mg em animais experimentais incluem: dentes e ossos defeituosos,
baixa capacidade de superar o estresse pelo frio, calcificao de tecidos como corao, aorta e rins e leses
cardacas, incluindo necrose, fibrose e calcificao.
Deficincia crnica de Mg em humanos pode estar relacionada com a formao de clculos renais e
calcificaes de outros tecidos. Baixos nveis de ingesto de Mg esto associados a doenas cardacas. O nvel
de Mg no msculo cardaco menor em indivduos que tiveram morte por doenas cardacas do que em
pessoas que morreram de outras causas. Mulheres com osteoporose tm menos Mg em seus ossos do que
mulheres normais.
Tem sido demonstrado efeito protetor do Mg no sistema neurolgico de crianas prematuras com peso
ao nascer muito baixo.

9.3.10. Toxidez
Devido ao fato de o Mg ser excretado pelos rins de forma bastante eficiente, problemas de
hipermagnesemia virtualmente s ocorrem quando h reduzida excreo urinria, decorrente de problemas
renais e reduzida eliminao.
Sintomas de hipermagnesemia so geralmente devidos ao consumo excessivo ou administrao de
sais de Mg em pacientes com concomitante disfuno renal. Sais de Mg so comumente usados como
anticidos e laxantes. Mg o tratamento-padro de hipertenso induzida pela gravidez (pr-eclampsia e
eclampsia) e pode causar intoxicao tanto na me quanto no feto.
Os sintomas da hipermagnesemia incluem: desaparecimento do reflexo do tendo, sonolncia,
respirao difcil, anormalidades no eletrocardiograma, hipotenso, cansao, hipocalcemia, nusea, vmito e
manifestaes cutneas.
O tratamento envolve a remoo da fonte de Mg, administrao de Ca e, em pacientes com disfuno
renal, dilise peritoneal ou hemodilise.

9.3.11. Biodisponibilidade
9.3.11.1. Fatores que afetam a biodisponibilidade
No h comprovao de que fatores fisiolgicos como idade, sexo, gravidez e lactao possam afetar
a absoro de Mg. Provavelmente, os rins regulam facilmente a conservao de Mg nos casos de necessidade
aumentada de Mg.
O consumo excessivo de Ca e P em ratos pode reduzir a absoro intestinal de Mg, porm estudos
realizados em humanos tm mostrado que incrementos substanciais de Ca e de P na dieta no provocam
alterao no balano de Mg.
A lactose aumenta a absoro de Mg e provvel que outros carboidratos possam estimular a
fermentao bacteriana no intestino e exercer o mesmo efeito.
lcool e cafena aumentam a excreo urinria de Mg, mas no h evidncias de que isso possa
resultar em deficincia de Mg.
O cido ftico inibe a absoro de Mg, levando a uma baixa concentrao de Mg nos ossos de ratos.
Em humanos, no h evidncias de que esse composto possa alterar o estado nutricional de Mg.

154
9.3.11.2. Mtodos de avaliao da biodisponibilidade de Mg
No h parmetro geralmente disponvel para medir o estado nutricional de Mg. A deficincia desse
elemento em humanos resulta de decrscimo progressivo na sua concentrao no plasma e decrscimo lento
nos eritrcitos, e dentro de poucos dias as excrees urinria e fecal de Mg so reduzidas a valores muito
baixos.
O mtodo clssico de balano tem sido muito empregado.
Radioistopos de Mg disponveis tm meia-vida muito curta (28Mg = 21,3 h), e por isso seu uso
limitado. Istopos estveis como 25Mg e 26Mg tm a desvantagem de ser abundantes na natureza (10,00 e
11,01%, respectivamente). Portanto, o emprego desses traadores requer quantidades relativamente altas para
se obterem valores de enriquecimento suficientemente aumentados. Isso pode ser um problema nos casos em
que o teor de Mg do produto a ser testado relativamente baixo. possvel que tcnicas mais sensveis de
Inductively Coupled Plasma Mass Spectrophotometry (ICPMS) para valores de enriquecimento de istopos
estveis possam tornar possvel a aplicao de traadores estveis em menores quantidades.

9.4. FERRO
9.4.1. Importncia do Ferro na Nutrio Humana
O ferro o 4 elemento mais abundante na natureza, compreendendo cerca de 4,7% da superfcie da
Terra, na forma de hematita, magnetita e siderita.
essencial para todas as formas vivas, com exceo de certos membros do gnero das bactrias
Lactobacillus e Bacillus. Nesses organismos, as funes do ferro so desempenhadas por outros minerais,
como mangans e cobalto. Em todas as outras formas de vida, o ferro um componente essencial ou um co-
fator para centenas de protenas e enzimas.

9.4.2. Panorama da Anemia Ferropriva no Mundo


Apesar da sua abundncia na superfcie terrestre, a deficincia de ferro um srio problema de sade
em muitas partes do mundo.
A deficincia de ferro constitui a carncia nutricional mais prevalente do mundo. Estima-se que
aproximadamente um bilho de pessoas que habitam a Terra, ou seja, um quinto da populao mundial, sofrem
de algum grau de deficincia de ferro. Essa deficincia atinge todas as camadas da sociedade, especialmente
nos pases menos desenvolvidos, onde a prevalncia de anemia ferropriva alcana de 60 a 80% das gestantes e
de 60 a 70% das crianas em idade pr-escolar.
Embora a anemia seja a manifestao clnica da deficincia de ferro, pode existir essa deficincia sem
anemia, portanto a deficincia de ferro tem magnitude ainda maior do que da anemia ferropriva.
As conseqncias da deficincia de ferro dependem da idade e estado fisiolgico do indivduo. Na
gravidez, a carncia de ferro a causa mais importante da anemia, o que leva a um maior risco de partos
prematuros e aumento na morbidade e mortalidade neonatal. Em crianas, a deficincia de ferro pode limitar
seu desenvolvimento psicomotor e seu potencial intelectual, alm de diminuir sua resistncia a infeces. No
adulto, a deficincia de ferro limita a capacidade fsica para o trabalho, reduzindo sua produtividade, com
srias conseqncias do ponto de vista socioeconmico.

9.4.3. Funes do Ferro


O ferro desempenha importantes funes no organismo humano, dentre elas:
Formao dos glbulos vermelhos.
Transporte de O2 e CO2.
Transferncia de eltrons.
Reaes de oxidao reduo.
Produo de energia celular.
Proteo ao sistema imunolgico.
Converso de -caroteno em vitamina A.
Sntese do colgeno.
Formao de purinas (cido nuclico).
Remoo de lipdios do sangue.
Destoxificao de drogas do fgado.
Produo de anticorpos.
Sntese da carnitina (oxidao de cidos graxos na mitocndria).
Sntese de DNA e diviso celular.
Sntese de tiroxina (T4) e triiodotironina (T3): animais severamente anmicos, por serem incapazes de
fazer a termorregulao a baixas temperaturas, tornam-se hipotrmicos.

155
9.4.4. Distribuio no Ser Humano
Nos humanos, a quantidade total de ferro no organismo varia com o peso, a concentrao de
hemoglobina, o sexo e o tamanho do compartimento de reserva:
Homens: 50 mg Fe/kg 4 g/ 80 kg
Mulheres: 35 mg Fe/kg 2,3 g/65 kg

Ferro Essencial:
a) Hemoglobina: 60 a 70% - transporte de O2 no sangue.
b) Mioglobina: 3 a 10%.
c) Enzimas heme: 1 a 3% (catalase, peroxidase, superxido dismutase, citocromo oxidase, lactato
desidrogenase, sulfito oxidase, aldedo oxidase).
d) Transferrina: 0,08% mg Fe Fe +++ - transporte de Fe extracelular (plasma, fluido cerebroespinal,
leite - lactoferrina, smen, fluido amnitico) e intracelular.
A transferrina regula o fluxo de Fe: recebe Fe do trato gastrointestinal, dos estoques e das
hemoglobinas quando destrudas e o leva para a medula ssea, placenta, fgado etc. sintetizada no fgado,
tem vida mdia de 8 a 10 dias e sua sntese influenciada pelo estado nutricional de Fe. As clulas apresentam
receptores de transferrina, os quais transportam Fe por endocitose para o citoplasma.

Ferro No-Essencial
Constitui o Fe de reservas: 15 a 35%
Ferritina: sintetizada no fgado, bao e trato gastrointestinal; estocada em maior quantidade no fgado,
no bao e na medula ssea.
O nvel sangneo indicador das reservas, visto que a ferritina constantemente degradada e
ressintetizada, levando a um equilbrio entre ferritina do soro e ferritina dos tecidos. Tem a funo de prevenir
o acmulo de Fe livre (no ligado) nos tecidos e constitui uma reserva solvel de Fe. Sua sntese induzida
pelo Fe.
Hemossiderina: estoque heptico de Fe; forma insolvel de ferritina, formada pela agregao desta.
A relao entre ferritina e hemossiderina no fgado varia de acordo com o nvel de reserva no
organismo, com a primeira predominando em baixas concentraes e a segunda em altas (overdose).
A liberao de ferro dos estoques requer a presena de substncias redutoras, como a riboflavina
(FMN), niacina (NADH) e,ou, vitamina C.

9.4.5. Absoro e Transporte do Ferro


A passagem do ferro pelo entercito envolve transporte do metal atravs de trs barreiras importantes:
a membrana apical, a translocao atravs do citosol e a liberao do ferro na membrana basolateral e da para
a circulao. Embora parte do ferro da dieta possa ser absorvida passivamente por via paracelular, o transporte
transcelular, dependente de energia, representa a via regulada e mediada por carreadores, a qual controla a
absoro de ferro. Embora a via paracelular seja menor, quantidades significativas de ferro podem ser
absorvidas quando o contedo deste na dieta alto, visto que no h mecanismos reguladores para essa via.

Ferro No-Heme
O balano normal de ferro regulado pela sua absoro intestinal. O ferro inorgnico solubilizado e
ionizado pelo suco gstrico, reduzido a Fe++ e quelado. As substncias que formam quelatos de baixo peso
molecular, como cido ascrbico, acares e aminocidos, promovem a absoro de Fe. Os quelatos podem ser
absorvidos ou excretados, dependendo da natureza do complexo ferro-quelato. Se esse complexo se mantiver
solvel e o ferro estiver ligado fracamente, este elemento pode ser liberado nas clulas da mucosa e ser
absorvido. Entretanto, se o ferro for fortemente ligado ao quelato e estiver numa forma insolvel, ele ser
excretado como parte do quelato.
A absoro pode ocorrer em qualquer local do intestino delgado, mas mais eficiente no duodeno.
Antes de ser captado pela borda em escova das clulas da mucosa, os tomos de Fe devem primeiro atravessar
a camada de muco. O prprio muco tem a propriedade de ligar Fe. O ferro no estado ferroso (Fe++) mais
solvel do que o ferro na forma frrica (Fe+++), portanto o Fe++ atravessa a camada de muco mais rapidamente
para alcanar a borda em escova, em que ligado a protenas ligantes de Fe, que transferem o ferro para dentro
da clula. Diversos estudos tm tentado identificar essas protenas ligantes. Uma dessas protenas a mucina
(glicoprotena do muco), que tambm se liga ao zinco, porm com menor afinidade. Estudos recentes tm
apontado que um transportador de metal divalente (DMT-1) e a protena NRAMP2 (natural resistance
associated macrophage protein) sejam envolvidos na captao do ferro nas clulas do duodeno.
O transporte do ferro atravs do entercito parece envolver outras duas protenas ligantes,
semelhantes transferrina. Uma a integrina e a outra a mobilferrina, esta ltima pode tambm se ligar ao
clcio, cobre e zinco, o que pode explicar a interao na absoro desses elementos. De acordo com essa

156
hiptese, a mucina liga-se ao ferro no estmago, em pH cido, tornando-o solvel e disponvel para a absoro
no pH mais alcalino do duodeno. A integrina, localizada nas vilosidades intestinais, parece facilitar o seu
transporte para dentro da clula. A mobilferrina recebe o ferro da integrina, que age como protena protetora de
ferro no citosol at a membrana basolateral.
Quando o ferro alcana o plasma, ele oxidado a Fe+++ pela ceruloplasmina e, ento, captado pela
transferrina. A poro de ferro no citosol que excede a capacidade de ligao com a transferrina se liga
ferritina e pode ser posteriormente liberada na circulao, porm a maioria permanece nas clulas da mucosa e
liberada no lmen intestinal aps dois a trs dias, quando a clula descamada.
A transferrina ligada ao ferro transportada atravs da membrana basolateral da clula da mucosa. O
ferro , ento, levado aos estoques no fgado, no bao e na medula ssea, assim como para os tecidos, que
precisam de ferro. A captao do ferro pelos tecidos envolve a ligao da transferrina aos receptores celulares.
O complexo penetra na clula por endocitose e forma uma vescula no seu interior. As enzimas lisossomais
liberam o Fe+++ e a apotransferrina, que levada de volta superfcie da clula e segue para o plasma.
A maioria do ferro encontrado no organismo est ligada a uma protena, mas no na forma livre. Essa
ligao protege o Fe da filtrao glomerular e serve como mecanismo de defesa, visto que o Fe++ reage
prontamente com perxido de hidrognio (H2O2), gerando radicais livres, que so extremamente reativos e
causam danos clula.

Ferro Heme
O ferro heme absorvido por um mecanismo diferente dos descritos anteriormente para ferro no-
heme. A maioria do ferro heme ingerida nas formas de hemoglobina e de mioglobina. O grupo heme pode
ser absorvido intacto (como metaloporfirina) diretamente pelas clulas da mucosa aps a remoo da globina
pelas enzimas proteolticas gstricas e duodenais, ou a poro protica pode ser removida no epitlio da
mucosa. Uma vez dentro da clula, o ferro liberado do heme pela enzima hemeoxigenase, formando Fe++ e
protoporfirina, e a partir de ento processado de maneira anloga que acontece com o ferro no-heme. O
ferro atravessa a clula para ser liberado no plasma como Fe+++. Apenas pequena poro do ferro heme que
entra na clula chega at a veia porta como ferro heme. Sua absoro aumentada na deficincia de ferro, mas
no pelo cido ascrbico e tampouco reduzida por substncias como o fitato. ligeiramente inibida pela
administrao simultnea de ferro inorgnico e ferro no-heme.

Fatores que Aumentam a Absoro do Ferro


a) Fatores Fisiolgicos:
Deficincia de ferro.
Hemocromatose.
Gravidez (na segunda metade do perodo gestacional).
Eritropoiese aumentada (anemias ou hipoxias).

b) Fatores Dietticos e Intraluminais:


cido ascrbico.
cido ctrico.
cido succnico.
Acar.
Aminocidos sulfurados (cistena).
Produtos da digesto de carnes de bovino e de aves.

Fatores que Reduzem a Absoro do Ferro


a) Fatores Fisiopatolgicos:
Saturao de ferro.
Trnsito intestinal acelerado.
Sndrome de m absoro.
Aquilia ou acloridria.
Doenas crnicas (artrite reumatide).
Doenas que causam anomalias na mucosa intestinal (doena celaca).

b) Fatores Dietticos e Intraluminais:


Precipitao por alcalinizao.
Fosfatos (fosfato de clcio).
Fitatos (hexafosfato de mioinositol).
Ingesto de compostos alcalinos ou de anticidos.
Protena do leite, albumina, gema de ovo e protena da soja.

157
Caf e ch.
Fibra e farelos de arroz, trigo, milho, nozes, amendoim.
Ingesto concomitante de sais de ferro e zinco.

9.4.6. Metabolismo Celular e Excreo do Ferro


A maioria do ferro circulante no plasma provm da destruio das hemoglobinas (macrfagos do
sistema reticuloendotelial) e das reservas de ferro (ferritina e hemossiderina).
Embora as clulas vermelhas do sangue sejam captadas, na sua maioria, pelo bao, pequena poro da
lise celular ocorre no prprio sangue. Os produtos da degradao se ligam a protenas (haptoglobinas e
hemoplexina) e so levados ao fgado. O ferro das hemoglobinas degradadas reutilizado na eritropoiese. As
clulas vermelhas vivem cerca de 120 dias e so fagocitadas pelas clulas do retculo endotelial,
principalmente no bao.
Um adulto normal libera cerca de 20 a 25 mg de ferro por dia do catabolismo das hemoglobinas. A poro
heme da molcula catabolizada pela heme oxigenase a biliverdina e, subseqentemente, a bilirrubina, que ,
ento, secretada na bile e excretada do organismo. Mais de 90% do ferro da hemoglobina reutilizado.
No homem adulto, as perdas dirias de ferro so de aproximadamente 0,9 a 1,0 mg, sendo a maioria pelo
trato gastrointestinal (0,6 mg), do que cerca de 0,45 mg devido a sangramento (que ocorre mesmo em
indivduos saudveis) e 0,15 mg perdido na bile e por descamao das clulas intestinais; mais 0,2 a 0,3 mg
perdido por descamao das clulas epiteliais e 0,1 mg pela urina. As perdas podem ser aumentadas em
indivduos com lceras gastrointestinais, parasitas intestinais e hemorragias decorrentes de cirurgia e de leses.
As perdas basais de ferro na mulher so um pouco menores devido sua menor superfcie corporal (0,7 a
0,8 mg/dia). Porm, por causa dos ciclos menstruais no perodo de fertilidade, suas perdas totais so estimadas
em 1,3 a 1,4 mg/dia.

9.4.7. Necessidades e Recomendaes de Ferro


A seguir esquema dessas necessidades e recomendaes:

Segundo FAO/OMS (2002) e NRC (1989)


Idade (anos)/ Estado Fe (mg/dia)
fisiolgico Necessidades Recomendao (biodisponibilidade)
FAO/OMS (2002) NRC, 1989
(10 a 15%)
Mediana Percentil 95 Alta Mdia Baixa (5%)
(15%) (10%)
Infantes
0,0 - 0,5 6
0,5 - 1,0 0,72 0,93 6,2 9,3 18,6 10
Crianas
1-3 0,46 0,58 3,9 5,8 11,6 10
4-6 0,50 0,63 4,2 6,3 12,6 10
7 - 10 0,71 0,89 5,9 8,9 17,8 10
Homens
11 - 14 1,17 1,46 9,7 14,6 29,2 12
15 - 17 1,50 1,88 12,5 18,8 37,6 12
18+ 1,05 1,37 9,1 13,7 27,4 10
Mulheres
11 14 1,20 1,40 9,3 14 28 15
pr-menarca
11 14 1,68 3,27 21,8 32,7 65,4
ps-menarca
15 - 17 1,62 3,10 20,7 31 62 15
18+ 1,42 2,94 19,6 29,4 58,8 15
Ps-menopausa 0,87 1,13 7,5 11,3 22,6 15
Gestante 30
Lactante 1,15 1,50 10 15 30 15

158
Segundo IOM (2001):
Grupo Idade Fe (mg/dia)
EAR RDA UL
Crianas 0-6m 0,27* 40
7 - 12 m 6,9 11 40
1-3a 3,0 7 40
4-8a 4,1 10 40
Homens 9 - 13 a 5,9 8 40
14 - 18 a 7,7 11 45
19 - 30 a 6 8 45
31 - 50 a 6 8 45
51 - 70 a 6 8 45
> 70 a 6 8 45
Mulheres 9 - 13 a 5,7 8 40
14 - 18 a 7,9 15 45
19 - 30 a 8,1 18 45
31 - 50 a 8,1 18 45
51 - 70 a 5 8 45
> 70 a 5 8 45
Gravidez 18 a 23 27 45
19 - 30 a 22 27 45
31 - 50 a 22 27 45
Lactao 18 a 7 10 45
19 - 30 a 6,5 9 45
31 - 50 a 6,5 9 45
*AI: ingesto adequada (baseada na composio do leite materno).
EAR: necessidade mdia estimada.
RDA: quota diettica recomendada.
UL: nvel de ingesto mxima tolervel.

9.4.8. Fontes de Ferro


A melhor fonte de ferro da dieta o fgado, seguido de mariscos, ostras, rim, corao, carnes magras,
aves e peixes. Os feijes, os gros integrais e as frutas secas so as suas melhores fontes vegetais,
porm sua biodisponibilidade menor do que nas carnes. O leite e derivados contm baixos teores de
ferro.

9.4.9. Biodisponibilidade de Ferro nas Dietas e Alimentos


Biodisponibilidade Consumo de Carne e cido Ascrbico % Ferro Absorvido
No-heme Heme
Baixa < 30 g carne ou < 25 mg vit C 3 23
Mdia 30 90 g carne ou 25 - 75 mg vit C 5 23
Alta > 90 g carne ou > 75 mg vit C ou 8 23
30 - 90 g carne + 25 - 75 mg vit C
Fonte: Monsen, 1980.

9.4.10. Mtodos de Avaliao da Biodisponibilidade de Ferro


Diversos mtodos tm sido propostos para determinar a biodisponibilidade de ferro, sendo os mais
comuns aqueles envolvendo istopos, tanto radioativos quanto estveis. O princpio desses mtodos
envolvendo istopos baseado no conceito de um "pool" comum de ferro no-heme. Tal conceito assume que
o ferro no-heme de diferentes alimentos numa dieta pode ser uniformemente marcado por um traador
radioisotpico e que a absoro de todo ferro no-heme de um alimento ou refeio ocupa um "pool" comum.
Esse conceito foi evoludo aps a observao de que o ferro marcado intrnseca e extrinsecamente na mesma
refeio absorvido com a mesma eficincia.

9.4.10.1. Tcnicas Radioisotpicas


a) Contagem de corpo inteiro
um dos mtodos mais empregados em estudos com animais. Envolve a administrao do ferro
radioativo como parte de uma refeio, na forma lquida por gavagem no estmago ou na forma de injeo
num segmento do intestino ou, ainda, distribudo uniformemente numa poro de aproximadamente 3 g de
dieta.

159
Uma contagem inicial feita logo aps a administrao da dose e antes de ser excretada (2 a 3 horas aps
a ingesto - tempo zero). Subseqentes contagens so feitas em intervalos de 24 a 48 horas por um perodo de
10 a 14 dias, cujo resultado expresso como porcentagem de reteno em relao ao tempo zero. Para calcular
a absoro, uma poro reta da curva de reteno versus tempo extrapolada no ponto zero. importante
corrigir a decada do radioistopo usando padres apropriados.

b) Incorporao do istopo nas clulas vermelhas


Em estudos com humanos, a tcnica de preferncia, visto que um contador de corpo inteiro nem sempre
disponvel. Ela tcnica freqentemente usada para medir a absoro de ferro em uma nica refeio. O
protocolo geralmente inclui a seleo de indivduos de vida livre, ou seja, aliment-los com uma nica dose do
radioistopo (59Fe e,ou, 55Fe), aps jejum de uma noite; priv-lo de alimentao, exceto gua por vrias horas;
analisar a radioatividade no sangue duas semanas aps a ingesto da dose e expressar o resultado como a
relao entre a absoro da dieta-teste e a absoro de uma dieta de referncia. Assume-se que, em um adulto
normal, 80% ou mais do ferro radioativo absorvido incorporado nos eritrcitos em 14 dias.

9.4.10.2. Depleo e Repleo de Ferro


a) Mtodo da AOAC
O estudo realizado em ratos, em fase de crescimento, que recebem uma dieta-padro deficiente em
ferro por 28 dias. Aps esse perodo (depleo), os animais com nvel de hemoglobina 6 g/dL, considerados
anmicos, so divididos em grupos e recebem suas dietas experimentais contendo 6, 12 ou 24 mg Fe/kg de
dieta, por 14 dias (repleo). A biodisponibilidade de ferro calculada comparando o ganho de hemoglobina
do grupo-teste em relao ao grupo com dieta de FeSO4. O valor geralmente expresso com
biodisponibilidade relativa (RBV), em que o valor do FeSO4 equivalente a 100%. Os animais so mantidos
em gaiolas individuais de ao inoxidvel e recebem dieta e gua deionizada ad libitum, durante todo o
experimento.

b) Medida da eficincia da regenerao de hemoglobina (HRE)


Os animais so tratados de maneira semelhante ao que foi descrito no mtodo da AOAC (dieta de
depleo e de repleo). A dieta de repleo formulada com um nico nvel de ferro. O mtodo HRE mede a
eficincia da converso de ferro em hemoglobina, relativo quantidade de ferro consumida durante o perodo
de repleo.
O teor de ferro na hemoglobina determinado pela equao:

Hb Fe (mg) = peso corporal (kg) x 0,075 L de sangue x Hb (g) x 3,35 mg Fe


peso corporal (kg) sangue (L) Hb (g)

HRE calculada em cada animal, pela seguinte equao:

HRE = [Hb Fe (mg) final] [Hb Fe (mg) inicial]


Fe consumido (mg)

9.4.10.3. Mtodos in vitro


a) Solubilidade em HCl diludo
O alimento contendo quantidade conhecida de ferro adicionado de HCl diludo e agitado, a 37 C por
uma hora. Aps esse perodo, centrifugado e o teor de ferro, analisado no sobrenadante.

b) Ferro dializvel
Baseia-se na passagem do ferro dializvel de uma dieta-teste, previamente digerida enzimaticamente, para
o interior de um saco de dilise aps um perodo de tempo.
Com base em estudos interlaboratorias comparando os diversos mtodos de avaliao da
biodisponibilidade de ferro, Forbes et al. (1989) recomendaram uma avaliao prvia por mtodos in vitro,
seguida da avaliao biolgica pelo mtodo da AOAC, como melhores mtodos para se predizer a
biodisponibilidade de ferro para humanos.

9.4.11. Avaliao do Estado Nutricional de Ferro


9.4.11.1. Parmetros Sangneos
a) Hemoglobina: normal - Homens: 14 - 18 g/dL
Mulheres: 12 - 14 g/dL
Reduzido na anemia ferropriva.

b) Hematcrito: normal - Homens: > 40%

160
Mulheres: > 36%
Reduzido na anemia ferropriva.

c) Ferro srico: normal - Homens: 100 35 g/dL


Mulheres: 90 40 g/dL
Reduzido na anemia ferropriva.

d) Capacidade de ligao total do ferro (TIBC): normal - Homens: 350 50 g/dL


Mulheres: 380 70 g/dL
Aumentado na anemia ferropriva.

e) % de saturao de transferrina = Fe/TIBC x 100


normal: ~ 35%
Reduzido na anemia ferropriva.

f) Ferritina: normal: 15 - 300 g/L


Reduzido na anemia ferropriva

g) Protoporfirina eritroctica (RBC protoporfirina + Fe heme)


normal: 35 15 g/dL
Aumentado na anemia ferropriva.

h) Receptor de transferrina do soro


normal: 8279 1261 g/L no sangue
5000 1100 g/L no soro
Aumentado na anemia ferropriva.

9.4.11.2. Estgios da Deficincia de Ferro


a) Estgio 1: Depleo das reservas de ferro
Decrscimo das reservas de ferro no fgado, no bao e na medula ssea,
detectado pelos nveis sricos de ferritina < 12 g/L.
Falta de ferro na medula ssea.

b) Estgio 2: Deficincia de ferro eritropoitico


Suprimento deficiente de ferro na medula ssea.
Detectado por: ferritina < 12 g/L
saturao de transferrina < 16%
protoporfirina eritropoitica > 70 g/dL.

c) Estgio 3: Anemia por deficincia de ferro (ferropriva)


Microctica (baixo volume corpuscular mdio).
Anemia resultante do decrscimo especfico de ferro no organismo.
Detectado por: ferritina < 12 g/L
saturao de transferrina < 16%
protoporfirina eritropoitica > 70 g/dL
hemoglobina < 12 g/dL
esfregao sangneo anormal (microctico hipocrmico).

9.4.12. Excesso de Ferro


O excesso de ferro no organismo pode-se dar por dois fatores:
a) Absoro excessiva de ferro
Hemocromatose hereditria (aumento dos estoques de ferro com danos aos tecidos, particularmente no
fgado).
Consumo excessivo (administrao teraputica prolongada em indivduos no-deficientes).
Alcoolismo crnico ou doena heptica crnica e, possivelmente, insuficincia pancretica (aumento da
absoro de ferro).
Certos tipos de anemia crnica severa, usualmente associados com eritropoiese alterada e hemlise
aumentada.

161
b) Hemossiderose transfusional (aumento dos estoques de ferro sem danos aos tecidos, em virtude de
transfuso de sangue).

9.5. ZINCO, COBRE E MANGANS


9.5.1. O papel do zinco, cobre e mangans nos sistemas enzimticos
Zinco, cobre e mangans, assim como outros elementos de transio, tm a habilidade de formar
complexos, nos quais o metal serve de tomo central, rodeado de aminocidos, em sistemas enzimticos.
O zinco, depois do potssio e do magnsio, o elemento mais abundante no meio intracelular, sendo
encontrado no citosol, em vesculas, organelas e no ncleo. Sua geometria de coordenao flexvel o torna
ideal para o centro ativo de enzimas, visto que essa propriedade contribui para reduzir a energia de ativao da
reao enzimtica. O zinco, por ser um cido de Lewis forte, pode suprir uma hidroxila (OH-), que pode ser
importante numa reao enzimtica.
Da mesma forma que o zinco, o cobre e mangans atuam como base forte em reaes enzimticas e tm
vantagem quando reaes redox so requeridas, por possuirem mltiplas valncias (Mn2+, Mn3+, Mn7+, Cu1+ e
Cu2+), enquanto zinco apresenta apenas uma valncia (Zn2+).

9.5.2. Necessidades e Recomendaes


A recomendao de Zn tem sido estimada com base na quantidade de Zn necessria para repor as
perdas endgenas de Zn. Essas perdas, no entanto, no so constantes e variam com a quantidade de Zn
consumida. Portanto, seu requerimento incerto. Estudos de metabolismo e de balano de Zn tm sido
considerados boas estimativas para a maioria da populao.
A recomendao de zinco e cobre (RDA) e a de mangans (Ingesto Adequada - AI), segundo a Food and
Nutrition Board/Institute of Nutrition (2001), :
Grupo Idade Zinco Cobre Mangans
(mg/dia) (mg/dia)*
(g/dia) (mg/dia)

RDA UL RDA UL AI UL
Lactentes 0-6m 2* 4 200* NE 0,003 NE
7 - 12 m 3 5 220* NE 0,6 NE
Crianas 1-3a 3 7 340 1 1,2 2
4-8a 5 12 440 3 1,5 3
Homens 9 - 13 a 8 23 700 5 1,9 6
14 - 18 a 11 34 890 8 2,2 9
19 - 30 a 11 40 900 10 2,3 11
31 - 50 a 11 40 900 10 2,3 11
51 - 70 a 11 40 900 10 2,3 11
> 70 a 11 40 900 10 2,3 11
Mulheres 9 - 13 a 8 23 700 5 1,6 6
14 - 18 a 9 34 890 8 1,6 9
19 - 30 a 8 40 900 10 1,8 11
31 - 50 a 8 40 900 10 1,8 11
51 - 70 a 8 40 900 10 1,8 11
> 70 a 8 40 900 10 1,8 11
Gravidez 18 a 12 34 1.000 8 2,0 9
19 - 30 a 11 40 1.000 10 2,0 11
31 - 50 a 11 40 1.000 10 2,0 11
Lactao 18 a 13 34 1.300 8 2,6 9
19 - 30 a 12 40 1.300 10 2,6 11
31 - 50 a 12 40 1.300 10 2,6 11
*AI: ingesto adequada.
RDA: quota diettica recomendada.
UL: nvel de ingesto mxima tolervel.
NE: no estabelecido.

9.5.3. Fontes Alimentares


Zinco
Carnes vermelhas, vsceras (fgado) e mariscos (ostras) so geralmente as melhores fontes de Zn.
Cereais integrais so ricos em Zn, o que no acontece com os cereais refinados, uma vez que o Zn est
presente no farelo e no germe do cereal. Nozes e leguminosas so relativamente boas fontes de zinco, ao passo

162
que frutas e hortalias so pobres. Altos nveis de cido ftico, encontrados em certos cereais, inibem a
biodisponibilidade de Zn.

Cobre
Assim como em Zn, mariscos, nozes, leguminosas, farelo e germe de cereais e fgado so fontes ricas
em Cu (> 0,3 mg Cu/100 g). A maioria das carnes, cogumelos, tomates, frutas secas, banana, batata e uvas tem
quantidades moderadas de Cu (0,1 a 0,3 mg Cu/100 g). Leite de vaca e produtos lcteos, galinha, peixes, frutas
e hortalias so fontes pobres de Cu.

Mangans
O mangans pode ser encontrado em cereais integrais, nozes, ch e folhas de vegetais. Cereais
refinados, carnes, produtos do mar e produtos lcteos so fontes pobres desse elemento.

9.5.4. Absoro
Zn, Cu e Mn so absorvidos ao longo de toda a extenso do intestino delgado. Cu pode ser absorvido
no estmago. O jejuno provavelmente o seu principal local de absoro, devido ao seu comprimento e ao
tempo que o alimento permanece nele.
A absoro regulada para Zn e Cu no intestino e, possivelmente, para Mn. A absoro pode ser
saturvel, regulada, mediada por carreador e no-regulada, difusional.
A absoro de Zn mediada por carreador predomina em baixos nveis de Zn na dieta. A extruso do
Zn para fora do entercito, atravs da membrana basolateral, provvel que seja dependente de carreador e de
ATP (ATPase especfica para Zn). Os carreadores, tanto da borda em escova quanto da membrana basolateral,
no foram ainda identificados. Entretanto, tm-se sugerido dois transportadores, um deles chamado de ZnT-1 e
um transportador de ferro, chamado de NRAMP2 ou DCT1, com afinidade pelo Zn.
Em situaes de baixo estado nutricional de Zn, a absoro transcelular predomina. Quando o estado
nutricional de Zn est alto, a absoro inibida. Essa inibio parece ser resultante da produo de
metalotionena, uma protena ligante de Zn.
Metalotionena uma protena de baixo peso molecular (6,1 kDa) encontrada no citosol e produzida
em resposta a altos nveis de Zn e de Cu, assim como de metais pesados, como cdmio e mercrio. Tem sido
proposto que altos nveis de metalotionena nos entercitos tm ao de se ligar ao Zn e bloquear a sua
absoro. O metal bloqueado posteriormente eliminado do organismo pela descamao dos entercitos no
intestino. possvel que a induo da produo de metalotionena pelo cobre tenha a mesma funo de limitar
a sua absoro.
Altos nveis de ingesto de Zn podem inibir a absoro de cobre, uma vez que estimula a produo de
metalotionena, que bloqueia a absoro transcelular de Cu. Em contraste, altos nveis de Cu no reduzem a
absoro de Zn, embora tambm induza a produo de metalotionena. Isso se d, provavelmente, pelo fato de
o Cu ter maior afinidade pela metalotionena do que o Zn. possvel ainda que o antagonismo Zn-Cu seja
devido ao fato de competirem pelo mesmo transportador de membrana na borda em escova.
A protena responsvel pelo transporte de Zn, Cu e Mn atravs do citosol a partir da borda em escova
at a membrana basolateral no foi ainda identificada.
Tem sido proposta uma protena ligante de Zn2+, chamada de CRIP. No entanto, essa protena
encontrada em muitos outros tecidos, alm do intestino, e parece estar mais associada a alteraes na
diferenciao do que na absoro de Zn.

9.5.5. Transporte no Plasma


Zinco
O Zn aps a absoro se liga albumina do plasma e transportado para o fgado, onde reempacotado e
liberado na circulao sangnea, ligado a 2-macroglobulina. A distribuio de Zn na circulao 57% ligado
albumina, 40% ligado a 2-macroglobulina e 3% ligado a compostos de baixo peso molecular, como
aminocidos. H evidncias de que a captao de Zn pelas clulas regulada, mediada por carreadores e
independente de energia, mas o seu mecanismo especfico no ainda conhecido.

Cobre
O cobre tambm se liga albumina aps a absoro intestinal para ser levado ao fgado, onde
incorporado ceruloplasmina. Nessa forma complexada, levado aos tecidos pela circulao. Ceruloplamina
uma glicoprotena de alto peso molecular (132 kDa), que contm 6 a 7% de carboidratos e pode-se ligar a seis
tomos de Cu. De 90 a 95% do Cu no soro est ligado ceruloplamina, cuja sntese no fgado regulada pelo
Cu, assim como pela interleucina-1 e glicocorticides. O complexo ceruloplasmina-Cu se liga a receptores nas
clulas, sendo o Cu reduzido e liberado dentro da clula na forma livre.

163
Mangans
Aps a absoro, o Mn parece ligar-se 2-macroglobulina e ser levado at o fgado. Devido sua
capacidade de se oxidar formando Mn3+, ele pode se ligar transferrina para ser levado aos tecidos. Isso indica
que o Mn seja captado pelas clulas da mesma forma que o ferro, ou seja, por endocitose mediada por
receptores do complexo transferrina-metal.

9.5.6. Armazenamento
Quando animais so alimentados com dietas sem Cu, Zn ou Mn, seu estado nutricional cai
rapidamente. Isso evidencia que no h um "pool" de reserva desses minerais para ser usado em ocasies de
baixo consumo ou de necessidade aumentada. O zinco pode estar localizado nos ossos quando o seu consumo
alto, porm no mobilizado para servir as necessidades do organismo em condies de baixo consumo.
Quando o consumo de Zn ou Cu elevado, a produo de metalotionena no fgado, nos rins e no
intestino cresce dramaticamente, porm o significado funcional dessa ligao com metais no ainda muito
clara.
Metalotionena a melhor candidata a protena de reserva de zinco. Trata-se de uma protena de baixo
peso molecular (61 aminocidos, dos quais 20 so resduos de cistena, que se ligam ao metal per pontes de
dissulfeto). Pode-se ligar a sete tomos de zinco ou de outro metal de transio (cdmio, mercrio, cobre ou
prata), sendo o Zn o principal metal a se ligar a ela.
A sntese de metalotionena induzida rapidamente no fgado, nos rins e no intestino pela exposio a
altos nveis de metais pesados, e estudos tm suportado a hiptese de que metalotionena seja uma protena de
desintoxicao de metais pesados. H tambm evidncias de que a absoro intestinal de Zn no est reduzida
na deficincia de metalotionena, em altos suprimentos de zinco. Isso suporta o papel proposto da
metalotionena intestinal de limitar a quantidade de Zn que deixa o entercito para entrar na corrente
sangnea.

9.5.7. Sndrome de Menkes e Doena de Wilson


Sndrome de Menkes
Trata-se de um distrbio gentico no metabolismo de cobre. Sua ocorrncia de 1 em 300.000
nascidos vivos, sendo usualmente fatal trs anos aps o nascimento. caracterizada pelo baixo nvel de Cu e
de ceruloplasmina e baixos nveis de Cu no fgado e crebro, mas com nveis elevados na mucosa intestinal, no
msculo, no bao e nos rins. Portanto, tecidos perifricos so os stios afetados por essa sndrome.

Doena de Wilson
tambm um distrbio no metabolismo de Cu, que ocorre com uma incidncia de 1 em 100.000
nascidos vivos. Sua manifestao mais lenta e usualmente diagnosticada aps a terceira dcada de vida. Da
mesma forma que na sndrome de Menkes, os nveis de ceruloplasmina esto baixos. No entanto, ao contrrio
da sndrome de Menkes, o Cu se acumula no fgado e no crebro. Os pacientes com doena de Wilson parecem
apresentar defeito na excreo de Cu via bile.
O estgio final da doena caracterizado por danos neurolgicos e cirrose heptica. Se diagnosticado
precocemente, os pacientes podem ser tratados com a reduo da ingesto de Cu, terapia de quelao com D-
penicilamina ou pela suplementao oral de Zn, que aumenta a sntese de metalotionena e reduz a absoro de
Cu.

9.5.8. Excreo
Em condies normais, muito pouco Zn, Cu ou Mn excretado pela urina ou pela pele, sendo a
maioria excretada nas fezes.
Do total das perdas endgenas nas fezes, parte devida descamao das clulas intestinais.
Entretanto, quando o consumo de Zn ou Cu alto e a sntese de metalotionena induzida, essas perdas podem
ser significantes.
As perdas especficas de Cu e Mn pelo trato gastrointestinal via secreo na bile. A incorporao de
Mn na bile bastante rpida. Quando o Mn transportado at o fgado, ele entra rapidamente na mitocndria,
onde incorporado superxido dismutase (SOD) mitocondrial ou seqestrado para dentro dos lisossomos.
O Mn lisossomal , ento, ativamente transportado para a bile e concentrado na vescula biliar.
Quase toda a excreo do Cu tambm via bile, e o Cu biliar parece estar complexado, de tal forma
que se torna indisponvel para a reabsoro intestinal.
A excreo de Zn na urina varia com o seu consumo, mas geralmente abaixo de 10% do total
excretado. Cerca de 90% da excreo de Zn atravs das fezes. O nvel real de excreo de Zn depende do
consumo e estado nutricional de Zn do indivduo. Embora a bile e as secrees gastroduodenais contribuam
para a excreo endgena de Zn, a secreo pancretica a maior responsvel pelas perdas endgenas de Zn,
devido s enzimas pancreticas dependentes de Zn, como as carboxipeptidases A e B. Essas enzimas podem
ser digeridas e a maioria do Zn, reabsorvida.

164
9.5.9. Funes
9.5.9.1. Fator de transcrio gentico (protena "dedo de zinco" ou "zinc-finger")
O Zn importante na regulao gentica. Ele promove uma dobra nos aminocidos ao seu redor na
transcrio do fator TFIIIA. O Zn, pela formao dessa dobra, na forma de dedo na protena, permite que essa
regio dobrada se ligue seqncia de DNA na regio promotora do gene. Portanto, sem o Zn, a transcrio do
fator no poderia se ligar ao DNA e estimular a transcrio do gene.

9.5.9.2. Regulao do crescimento pelo zinco


A manifestao primria da deficincia de Zn em animais jovens e em crianas o crescimento lento.
A deficincia de Zn parece retardar o crescimento por afetar a funo do fator de crescimento tipo-insulina 1
(insulin-like growth factor-1 ou IGF-1), fator esse que media o efeito celular do hormnio do crescimento. Um
mecanismo possvel de ao do Zn que a deficincia de Zn causa reduo nos nveis de receptores celulares
de IGF-1. Essa hiptese consistente com a observao de que o promotor do receptor de IGF-1 pode ser
ativado por um fator de transcrio promotor especfico (Sp1), que contm uma regio de "dedo de zinco"
ligante de DNA.

9.5.9.3. Imunorregulao do Zn e Cu
A deficincia tanto de Zn quanto de Cu afeta a funo imune. Em estudos com animais e com
humanos, a deficincia de Zn parece reduzir a funo imune devido a uma perda geral no nmero total de
linfcitos (clulas B e T) do sistema imune perifrico. A deficincia de Cu resulta em neutropenia (perda de
neutrfilos/granulcitos circulantes), assim como em menor nmero de linfcitos T.
Estudos evidenciam que a perda de linfcitos e neutrfilos resulta da produo reduzida de novas
clulas e no da morte precoce de clulas. Os efeitos da deficincia de Zn nos linfcitos podem ser resultantes
parcialmente da atrofia do timo, um rgo que controla o desenvolvimento dos linfcitos T e a perda do
hormnio dependente de Zn - timulina.
A deficincia de Cu inibe a proliferao de clulas T em resposta a mitgenos. Interleucina-2 (IL-2)
media a proliferao de clulas T em resposta a mitgenos, mas clulas deficientes em Cu no produzem IL-2
to eficientemente quanto clulas de animais com adequao em Cu.

9.5.9.4. Metabolismo de Fe e Cu
Alm do seu papel de transportadora de Cu, a ceruloplasmina tambm tem uma funo enzimtica de
ferroxidase. Ela oxida o Fe2+ liberado das reservas de Fe no organismo em Fe3+, que se liga a transferrina para
ser transportada para as clulas para ser processado, como a sntese do heme.
Essa funo de forroxidase da ceruloplamina foi proposta aps a observao de anemia em animais
com deficincia severa de Cu, com reservas normais de Fe. A anemia, nesse caso, era revertida com Cu na
dieta, mas no com Fe.

9.5.9.5. Ossos e funo vascular do Cu


A deficincia de Cu resulta no metabolismo sseo anormal e em anormalidades esquelticas em
muitas espcies. Isso devido formao incompleta da matriz de colgeno nos ossos.
A origem desse problema a reduzida atividade da enzima lisil oxidase, que contm Cu. Essa enzima
requerida para a remoo do grupo -amino dos resduos de lisil e hidroxilisil e a oxidao do carbono a
aldedo, que resulta na produo de uma variedade de ligaes de resduos de aminocidos no colgeno. A
perda de atividade da lisil oxidase resulta em mais baixa fora e estabilidade do colgeno dos ossos.
A perda das ligaes pela lisil oxidase tambm afeta a elastina, protena que confere aorta sua
flexibilidade necessria. Na deficincia de Cu, a aorta fica enfraquecida e pode haver ruptura. Anormalidades
cardacas adicionais tm sido observadas na deficincia de Cu, incluindo hipertrofia cardaca,
eletrocardiograma alterado, estrutura da mitocndria anormal e nveis reduzidos de ATP e fosfocreatina. No
se sabe ao certo como a deficincia de Cu pode estar associada a esses ltimos efeitos, mas estes no parecem
estar associados atividade da lisil oxidase.

9.5.9.6. Superxido dismutase e proteo dos radicais livres


Superxido dismutases (SODs) so parte da defesa do organismo contra as espcies reativas de
oxignio. Essas espcies reativas so radicais livres que, se mantidos incontrolveis, podem danificar DNA,
protenas e lipdios dentro das clulas e alterar a funo celular. SODs catalisam a reao pela qual superxido
removido: 2O2- + 2H+ H2O2 + O2. O perxido de hidrognio gerado posteriormente metabolizado tanto
pela catalase (enzima contendo ferro) quanto pela glutationa peroxidase (enzima contendo selnio).
A SOD-Cu/Zn do citosol formada por duas subunidades idnticas, cada uma contendo um tomo de
Cu e um tomo de Zn. A SOD-Cu/Zn extracelular semelhante, porm no idntica SOD-Cu/Zn citoslica.
A SOD-Mn localizada na mitocndria. Nos stios ativos das enzimas, o Cu e o Mn esto alternadamente
reduzidos e oxidados pela superxido para produzir perxido de hidrognio. Portanto, a atividade da enzima

165
completamente inibida na ausncia desses minerais. Ao contrrio, alguma atividade da SOD-Cu/Zn mantida
quando o Zn removido ou substitudo por outro mineral quimicamente semelhante, como cdmio, mercrio
ou cobre. O Zn parece desempenhar duas funes: estabilizar a estrutura nativa da enzima e o grupo Zn-
histidil-Cu pode ser um doador de prton durante o ciclo oxidativo da enzima.
A deficincia de Cu e Zn pode ter conseqncias funcionais relacionadas reduzida defesa contra os
radicais livres.
A mitocndria o stio de fosforilao oxidativa e, portanto, uma tremenda fonte potencial de
espcies reativas de oxignio e radicais livres nocivos. Portanto, a deficincia de Mn se torna uma condio de
intoxicao de radical superxido devido perda de atividade da SOD-Mn. Isso pode levar a anormalidades
funcionais e estruturais da mitocndria. Alteraes na crista e matriz mitocondriais podem ser resultantes da
peroxidao lipdica. Alterao na integridade da mitocndria pode perturbar o metabolismo energtico. A
deficincia de Mn altera o metabolismo de carboidratos pela destruio das clulas do pncreas, o que resulta
em menor utilizao da glicose e reduo na insulina pancretica. Essas alteraes podem ser devidas a danos
causados por radicais livres, em decorrncia da menor atividade da SOD-Mn.

9.5.9.7. Mn e a formao de cartilagem


Assim como para a deficincia de Cu, anormalidades no esqueleto que no so relacionadas com
problemas na mineralizao dos ossos so caractersticas da deficincia de Mn. Em animais em crescimento, a
deficincia de Mn resulta na inibio da osteognese endocondral na cartilagem epifesal de crescimento. Isso
devido reduo na sntese de proteoglicanos, como o sulfato de condroitina.
Proteoglicanos so componentes estruturais essenciais da cartilagem, o que explica a sensibilidade das
placas de crescimento na deficincia de Mn.
Nos casos menos severos da deficincia de Mn, animais tero crias viveis, porm alguns animais
podero exibir ataxia e falta de equilbrio. Essa condio resultante de um defeito estrutural no
desenvolvimento do ouvido interno, resultando no impedimento da funo vestibular. Da mesma forma que
para o defeito nos ossos, essa alterao no ouvido interno resultante do defeito no desenvolvimento da
cartilagem, associado formao reduzida do proteoglicano.

9.5.10. Avaliao do Estado Nutricional


No h instrumentos funcionais confiveis para avaliar o estado nutricional de Zn, Cu ou Mn. Tm
sido examinadas diversas enzimas dependentes desses minerais quanto sua habilidade de servir como um
indicador sensvel para o estado nutricional de Zn (Ex: fosfatase alcalina, SOD-Cu/Zn, 5'nucleotidase) e de Cu
(Ex: SOD-Cu/Zn). Embora algumas dessas avaliaes sejam promissoras, nenhuma apresenta dados
comprovadamente teis. As opes que permanecem so medidas estticas, como nveis dos minerais no soro,
cabelo e clulas do sangue vermelhas e brancas.
Em indivduos normais, saudveis, a concentrao plasmtica de Zn no parece alterar a no ser em
situaes de extrema deficincia. Portanto, a concentrao de Zn no soro ou no plasma no uma medida
adequada para se medir em mudanas sbitas no estado nutricional de Zn.
O nvel plasmtico de Zn cai significativamente na gravidez, mas esse decrscimo est associado com
a queda da albumina plasmtica e a expanso do volume sangneo da gestante.
Os nveis de Cu no soro e de ceruloplasmina tm alguma utilidade na avaliao do estado nutricional
de Cu, mas essas medidas, assim como o Zn no soro, so pouco sensveis inflamao aguda. Durante a
inflamao aguda, o nvel de Zn no soro cai e o nvel de Cu no soro e de ceruloplasmina aumentam, dando
uma falsa impresso de um baixo estado nutricional de Zn e elevado estado nutricional de Cu.
Os nveis de minerais nos cabelos podem ser uma medida bruta do estado nutricional no longo prazo,
mas o contedo de minerais sensvel contaminao do ambiente (Ex: shampoo e emisso no ar).
Recentes estudos tm examinado os nveis de metalotionena no soro ou nos eritrcitos como uma medida
do estado nutricional de Zn. Embora extremos de estados de Zn possam ser medidos por esse mtodo, no h
indicao de que a concentrao de metalotionena seja til para medir o estado nutricional marginal de Zn.
Os teores de Zn nos linfcitos so mais sensveis ingesto marginal de Zn. Entretanto, a associao entre
a concentrao de Zn nos linfcitos e o consumo de Zn no tem sido verificada em grandes grupos e a
dificuldade de isolar essas clulas brancas reduz a sua utilizao na medida do estado nutricional de Zn em
populaes.
A excreo urinria reflete pouco as mudanas no consumo de Zn, Cu ou Mn. Dessa forma, o
desenvolvimento de instrumentos de avaliao essencial para o estabelecimento da necessidade verdadeira de
Zn, Cu e Mn e para a definio dos reais riscos do consumo inadequado desses minerais.

166
9.5.11. Deficincia
Zinco
Os sintomas da deficincia de Zn tm sido observados em populaes com consumo alto de fitato e
baixo de carne. Os sintomas incluem: perda de apetite, baixo crescimento, alopecia (falta de cabelo ou de plos
no corpo), disfuno imune, hipogonadismo, baixa capacidade de cicatrizao e baixa acuidade de paladar.
Devido ampla diversidade de enzimas zinco-dependentes e da importncia da estrutura dedo de
zinco na modelao da interao entre fator de transcrio e DNA, pouco provvel que essas condies
sejam todas provenientes da mesma origem.

Cobre
Os sintomas da deficincia severa de Cu de origem alimentar ou gentica (doena de Wilson) incluem:
anemia, defeitos no esqueleto, aumento cardaco, pigmentao alterada, falhas reprodutivas, baixa elasticidade
da aorta e neutropenia. Essas condies so raras em humanos. No entanto, sintomas como batimento cardaco
irregular e baixa utilizao da glicose tm sido observados em deficincia menos severa de Cu e tm maior
importncia na sade humana.

Mangans
Crescimento reduzido a maior conseqncia da deficincia de Mn. Outros sintomas incluem: ossos
anormais, baixa tolerncia glicose, baixa reprodutividade e mal formao de filhotes de animais.

9.5.12. Toxidez
Como regra, Zn, Cu e Mn so relativamente no-txicos quando consumidos na dieta. A toxidez pode
ser devida a exposies acidentais ou contaminao ambiental.

Zinco
Manifestaes da toxidez pelo Zn iro ocorrer com exposio por longo prazo a doses de 100 a 300
mg por dia (6 a 20 vezes o RDA). Os sintomas da toxidez incluem deficincia de Cu, caracterizada pela
anemia e neutropenia; funo imune comprometida e reduo nos nveis de HDL-colesterol. Consumos de Zn
extremamente altos causam vmito, dor epigstrica, letargia e fadiga.
O uso de pastilhas de Zn no combate da gripe tem efeitos potencialmente eficientes, porm o mau uso
desses produtos pode levar toxicidade de Zn. As doses preconizadas para surtirem efeito, da ordem de 150
mg/dia, podem ser txicas, especialmente se tomadas de maneira crnica ao longo do perodo de gripes e
resfriados.

Cobre
Em condies de consumo excessivo crnico de Cu, a toxidez s ocorre quando a capacidade do
fgado de se ligar e seqestrar Cu est excedida. A quantidade de Cu na dieta necessria para causar toxidez
no conhecida, mas sinais de desconforto gstrico so observados em doses de at 5 mg/dia. As
conseqncias da toxidez do Cu so fraqueza, desateno e anorexia nas fases iniciais, o que pode progredir
para coma, necrose heptica, colapso vascular e morte.

Mangans
Este elemento considerado um dos minerais menos txicos. A toxicidade oral relativamente rara.
No entanto, Mn proveniente do ar devido emisso industrial e de automveis pode causar srios efeitos se a
exposio for suficientemente longa. Sintomas associados toxidez do Mn incluem desordens pancreticas e
neurolgicas, que so semelhantes s observadas em pacientes com esquizofrenia e mal de Parkinson. A
toxidez do Mn tem sido observada tambm em crianas recebendo nutrio parenteral prolongada.

9.5.13. Biodisponibildade
9.5.13.1. Interaes entre Nutrientes
A similaridade com outros nutrientes pode resultar na competio por stios comuns de ligao entre
minerais correlatos. Isso pode explicar a inibio da absoro de Mn pela alta ingesto de ferro e tambm o
antagonismo entre Zn e Cu. A ligao de compostos orgnicos da dieta no lmen do trato gastrointestinal pode
alterar a absoro. o que ocorre com o fitato (mioinositol penta e hexafosfato), que inibe a absoro de Zn,
Fe e outros minerais da dieta. A presena simultnea de clcio e fitato na mesma refeio aumenta o efeito
inibidor da absoro do mineral devido estabilizao do clcio com o fitato.
A ligao de Zn ou Cu com ligantes de baixo peso molecular, como os aminocidos (Ex: histidina),
pode aumentar a absoro intestinal desses minerais, mas a forma de ao no ainda muito clara.

167
O cido ascrbico, embora aumente a absoro de Fe, inibe a de Cu. O efeito o mesmo, ou seja, o
cido ascrbico reduz tanto o Fe3+ para Fe2+, quanto o Cu2+ para Cu1+. Isso indica que o Cu mais bem
transportado na sua forma oxidada de Cu2+.
Altos nveis de ingesto de molibdnio podem aumentar a excreo urinria de Cu, e altos nveis de
Ca na dieta podem aumentar a excreo fecal de Zn exgeno.

9.5.13.2. Avaliao da Biodisponibilidade


Zinco
Indicadores sensveis para avaliar o estado nutricional de zinco so precrios, pelo fato de no haver
um tecido que represente a captao e utilizao do Zn no organismo. Portanto, a sua biodisponibilidade
(utilizao) no pode ser medida facilmente no homem. A taxa de crescimento de crianas em recuperao da
desnutrio tem sido um indicador da disponibilidade de Zn em frmulas infantis.

a) Balano Metablico
Tradicionalmente, a absoro de Zn tem sido determinada pela medida da diferena entre consumo e
excreo fecal. Devido grande excreo intestinal de Zn, essa tcnica no pode explicitamente medir a
absoro de uma dieta ou de um suplemento e limitada ou no utilizada para medir a biodisponibilidade de
Zn.

b) Tcnicas Isotpicas
As limitaes da tcnica de balano podem ser superadas grandemente pelo uso de istopos. A
incorporao biolgica (marcao intrnseca) ou a adio (extrnseca) do istopo radioativo ou estvel de Zn
no alimento e a subseqente medida do istopo retido no corpo ou presente nas fezes, so atualmente as
tcnicas mais precisas de avaliar a absoro de Zn. A tcnica do istopo assume que o istopo adicionado ou
incorporado se comporta de maneira similar ao Zn nativo.

b.1) Tcnica de Radioistopo


O radioistopo comercialmente disponvel o 65Zn, um -emissor, que tem meia-vida de 245 dias de
baixo custo e fcil manuseio. O istopo adicionado dieta e sua absoro estimada por repetidas medidas
da reteno no corpo inteiro em um contador de corpo inteiro para humanos. A grande vantagem dessa tcnica
a sua alta preciso na medida e relativa facilidade de procedimento para os participantes do estudo. Uma das
limitaes da tcnica, alm da disponibilidade do contador de corpo inteiro, que a reteno da dose
administrada oralmente no pode ser determinada at que a frao no absorvida tenha sido liberada do
organismo.
A fim de estimar a excreo endgena de Zn, uma dose radioisotpica intravenosa de Zn deve ser
administrada.
A absoro pode ainda ser estimada pelo monitoramento da excreo fecal do radioistopo. Embora
possa trazer algum desconforto aos participantes, tem a vantagem de no requerer pr-tratamento das amostras
de fezes antes da medida.

b.2) Istopos Estveis


A exposio radiao do istopo de Zn torna essa tcnica menos apropriada para certos grupos,
como crianas e gestantes. Nesses casos, istopos estveis so a melhor alternativa. Zinco nativo existe como
uma mistura de seis istopos com diferentes massas. Dois deles, 67Zn e 70Zn, tm baixa abundncia natural de
4,1 e 0,6%, respectivamente, e podem ser usados de maneira similar aos radioistopos como traadores de Zn.
Como no h um rgo apropriado para medir a reteno de Zn com suficiente preciso, absoro e
disponibilidade tm que ser estimadas no aparecimento do istopo estvel nas fezes. Para assegurar completa
excreo, tm que prover diversos dias de coleta fecal. Assim como para radioistopos, uma dose intravenosa
de um istopo estvel de Zn alternativo pode ser usada para estimar a excreo endgena. Essas medidas
podem ser feitas tambm na urina.
A vantagem da tcnica de istopo estvel a sua segurana e possibilidade de uso de istopos
simultneos (inclusive de diferentes minerais). As desvantagens so os custos do istopo e do equipamento
para anlise, requerendo pessoal qualificado. Outro fator o extensivo pr-tratamento da amostra requerido
por alguns procedimentos para reduzir a interferncia de outras substncias. A fim de tornar possvel a
separao do istopo adicionado do de ocorrncia natural nos alimentos ou excreta, altas doses, tipicamente
25% do contedo do Zn nativo, tem que ser usado.

c) Aparncia no Plasma
A resposta plasmtica ao consumo de Zn numa dieta-teste tem sido usada para avaliar a
biodisponibilidade de Zn. O rpido "turnover" de Zn no plasma limita a viabilidade dessa tcnica. Alm disso,
os nveis de Zn normalmente presentes na dieta no alteram a concentrao plasmtica de Zn. Ao contrrio, o

168
zinco no plasma geralmente cai especialmente aps uma refeio rica em protena, possivelmente devido
rpida captao pelo fgado do Zn transportado por aminocidos.
Essa tcnica tem uso potencial na avaliao da disponibilidade relativa dos diferentes suplementos de
Zn, em que altas doses so usadas. Para estudar a absoro de nveis habituais de Zn na dieta, seria possvel
adaptar essa tcnica pelo uso de istopos estveis, garantindo um enriquecimento suficiente para ser medido no
plasma.

d) Modelos Animais
A biodisponibilidade de Zn tem sido medida em animais experimentais, como ratos, esquilos e
porcos, avaliando seu crescimento e incorporao de Zn em tecidos, como o fmur. A limitao dessas
tcnicas na extrapolao para humanos reside nas diferentes taxas de crescimento e conseqentes
requerimentos diferenciados de minerais desses animais, assim como as diferenas nas enzimas intestinais,
atividade microbiana, anatomia e fisiologia intestinal.
Filhotes de ratos entubados com dieta marcada com istopo tm sido usados para avaliar a absoro
de frmulas infantis. Seu uso limitado a alimentos lquidos e solues aquosas. O total absorvido pelos
filhotes geralmente maior do que em humanos, o que pode indicar diferentes mecanismos de absoro, sendo
a difuso passiva predominante sobre o transporte mediado por carreador nos filhotes de ratos.

Cobre
Estudos mais recentes da biodisponibilidade de Cu tm usado contagem de corpo inteiro, empregando
o radioistopo 67Cu, um -emissor, com meia-vida de 58 horas. A durao da medida de uma meia-vida
biolgica limitada a aproximadamente 20 vezes a sua meia-vida fsica, ou seja, 48 dias. O outro istopo
radioativo o 64Cu, que possui meia-vida ainda menor (12 horas) e tem sido empregado para investigar
absoro de Cu de leite usando um modelo animal.
A falta de suprimentos disponveis de radioistopos, suas meias-vidas curtas, a necessidade de
contadores de corpo inteiro sofisticados e a crescente preocupao com os danos associados radiao
ionizante restringem grandemente o uso de radioistopos na determinao da biodisponibilidade de Cu.
O Cu tem dois istopos estveis, 63Cu e 65Cu, com abundncia de 69,2 e 30,8%, respectivamente. Estudos
metablicos podem ser conduzidos usando enriquecimento de 65Cu. Por ser o nico istopo estvel, no
possvel conduzir estudos com doses oral e intravenosa simultaneamente. Estudos tm mostrado que a
marcao extrnseca com 65Cu se correlaciona bem com a marcao intrnseca e pode ser usada para medir a
absoro de Cu de um alimento ou dieta.
Ao determinar a absoro de Cu pelo monitoramento fecal (balano qumico ou uso de istopos
radioativos ou estveis) ou pela contagem de corpo inteiro (radioistopos), o perodo de tempo da conduo do
estudo crtico. Assim como em todos os nutrientes inorgnicos, se o perodo de balano for muito curto,
ento nem todos os elementos no absorvidos tero sido excretados e a absoro ser superestimada. No
entanto, se o monitoramento for muito longo, algum Cu inicialmente absorvido ser reexcretado, resultando na
subestimao da absoro.

9.6. SELNIO
9.6.1. Importncia
O selnio foi descoberto em 1817 pelo qumico sueco Berzelius. Nos anos de 1930 e 40 foi
identificado como causador de doenas em animais pela sua ingesto excessiva. Nos anos de 1950, entretanto,
foi identificado como um fator de preveno de necrose heptica em ratos e passou a ser considerado um
nutriente essencial. A partir dos anos de 1960, estudos epidemiolgicos apontaram o selnio como tendo
atividade anticarcinognica. Evidncias da essencialidade do selnio para a espcie humana no haviam sido
documentadas at o final dos anos de 1970.
A deficincia de selnio foi pela primeira vez documentada em 1979, num estudo realizado com
pacientes em nutrio parenteral total na Nova Zelndia, cujo solo pobre em selnio. A paciente apresentava
pele seca e dores musculares, que desapareceram com a administrao intravenosa de selnio. Uma doena
chamada de Kashin-Beck, que afeta cerca de oito milhes de pessoas na China, est relacionada ao baixo
consumo de selnio por aquela populao, cuja dieta se baseia na ingesto de milho.

9.6.2. Absoro, Distribuio e Excreo


A absoro de selnio altamente eficiente, o qual eliminado do organismo primariamente pela
urina. A maioria do selnio presente nos tecidos est na forma de selenocistena nas selenoprotenas.
A maioria do selnio das plantas est na forma de selenometionina (o selnio se comporta de maneira
semelhante ao enxofre). Em plantas que acumulam selnio, este se encontra nas formas de selenocistationina e
metilselenocistena. Em produtos de origem animal, o selnio est presente nas selenoprotenas, portanto na
forma de selenocistena. Todas essas formas de selnio nos alimentos so muito bem absorvidas. A
homeostase de selnio no ocorre via regulao da absoro, mas sim pela excreo urinria.

169
O selnio inorgnico comumente usado para suplementao de dietas animais. A forma mais
comum de selnio nessa suplementao selenito de sdio (Na2SeO3), embora selenato de sdio (Na2SeO4)
seja preferido por no possuir eltrons livres capazes de oxidar outros componentes da dieta.
O selnio da dieta de alta biodisponibilidade, e cerca de 84% dele na forma de selenito e 98% na
forma de selenometionina so absorvidos. Enzimas ou transportadores responsveis pela absoro de selnio
so desconhecidos. A selenometionina transportada ativamente pelo mesmo sistema que transporta
metionina.
A ingesto de selnio varia amplamente com o contedo de selnio no solo, onde os alimentos so
produzidos. O consumo tpico na China de 20 g, 35 g na Finlndia e Nova Zelndia e de 50 a 200 g na
Amrica do Norte.
A excreo urinria de selnio se d na forma de metaneselenol, ons trimetilselennio e
dimetilselenito. Tanto a dose quanto o estado nutricional de selnio do animal influencia a forma e a
quantidade de selnio excretado na urina. Em humanos, metanosselenol a principal forma de excreo
urinria em condies adequadas ou insuficientes. Outras formas de excreo aparecem na urina quando doses
maiores so administradas.
Estudos com traadores isotpicos em humanos tm permitido monitorar o fluxo de selnio no
organismo. Um modelo proposto ilustra o intestino, maior stio de absoro, e outros compartimentos, como o
plasma, fgado/pncreas, rins e msculo/outros tecidos. Nesse modelo, o selnio se apresenta em trs formas
distintas: selenoprotena P (SEL-P), glutationa peroxidase plasmtica (GPX3) e o composto de baixo peso
molecular, seleneto de hidrognio (HSe-). Com a ingesto de 70 g de Se, 59 g so absorvidos (84%) e 11 g
so excretados nas fezes. Outros 32 g so reciclados na bile, e a perda urinria aps 12 dias de 12 g (17%
da dose). O restante do selnio absorvido incorporado nas selenoprotenas dos tecidos como parte do
turnover normal das protenas, substituindo o selnio original, que se mistura com o pool de baixo peso
molecular e excretado, mantendo o balano de Se.
O selenito intestinal quase todo reduzido a seleneto durante a absoro. De maneira similar, as
clulas vermelhas do sangue e outros tecidos tambm reduzem o selenito. Portanto, seleneto se encontra
elevado no pool plasmtico aps duas horas da ingesto e desaparece com a meia-vida de 20 minutos. A
maioria desse selnio captada pelo fgado, incorporada na SEL-P e secretada na circulao. A concentrao
de SEL-P plasmtico alcana seu pico mximo aps 10 horas da ingesto, com meia-vida de trs horas. Os rins
so as maiores fontes de GPX3 nos humanos, e os seus nveis no plasma alcanam o pico mximo aps 13
horas, com meia-vida de 12 horas. A captao de SEL-P e de GPX3 no tem sido demonstrada, portanto o
destino dessas formas desconhecido.
O contedo estimado de selnio no organismo humano de cerca de 13 a 20 mg. Msculos, fgado,
sangue e rins contm 61% do total do selnio estimado em humanos.

9.6.3. Metabolismo
O metabolismo intracelular de selnio complexo no s por ser um elemento trao ligado ao
carbono, mas tambm porque vias metablicas distintas so necessrias para converter formas simples de
selnio da dieta em enzimas contendo selnio.
Essas vias incluem metabolismo de selnio inorgnico, vias do metabolismo para selnio orgnico de
baixo peso molecular e, principalmente, diversas vias alternativas que resultam em protenas ou enzimas
contendo selnio.

9.6.3.1. Metabolismo do selnio inorgnico


A converso de selenato para selenito parece envolver adenosina fosfoselenato (APSe) ou
fosfoadenosina fosfoselenato (PAPSe). O selenito reduzido no-enzimaticamente pela glutationa para
selenodiglutationa (GS-Se-SG), com estado de oxidao zero, que na ausncia de oxignio novamente
reduzido pela glutationa redutase para seleneto.
Essa reduo usualmente ocorre nas clulas intestinais ou nas clulas vermelhas do sangue, mas pode
tambm ocorrer em outras clulas. Seleneto e ATP so substratos para selenofosfato sintase, que produz
selenofostato, composto ativado de selnio usado para a sntese de selenoprotenas mediada pelo RNA de
transferncia.

9.6.3.2. Catabolismo do selnio orgnico


A selenometionina, da mesma forma que metionina, no sintetizada pelos animais superiores.
Selenometionina a forma comum de selnio na maioria dos alimentos de origem vegetal e metabolizada pelas
mesmas enzimas do catabolismo de metionina. Portanto, a selenometionina ativada para a forma de
adenosilselenometionina (SeAM). SeAM, assim como adenosilmetionina, um excelente doador metil nos
mamferos e, portanto, convertido a adenosil-seleno-homocistena (SeAH).
SeAH , por sua vez, um substrato para cistationina (Sec) -sintase e cistationina -liase e, portanto,
convertido em selenocistena nos tecidos de mamferos.

170
Sec degradada por uma enzima selnio-especfica, Sec-liase, que libera selnio elementar. O selnio
elementar reduzido no-enzimaticamente a seleneto pela glutationa ou outros tiis. Seleneto pode ser
metilado, usando-se S-adenosilmetionina pela metiltransferase microssomal ou citoslica no fgado para
formar metaneselenol, a principal forma de excreo urinria de selnio. A ingesto excessiva de selnio leva a
outras etapas de metilao, resultando em dimetilseleneto ou no on trimetilsenonio.
Metaloselenol tambm produzido mais diretamente atravs da metionina pela via transaminao
enzimtica e pelas reaes de descarboxilao pela via da transaminao da metionina.

9.6.4. Selenoprotenas
a) Glutationa peroxidase-1
Virtualmente, todas as clulas e plasma animal contm atividade de glutationa peroxidase (GPX). A
atividade de GPX decresce na deficincia de selnio, e a suplementao com selnio restaura essa atividade ao
normal.
A enzima catalisa a seguinte reao:
2GSH + ROOH GSSH + ROH + H2O
GPX1 muito especfica para glutationa (GSH) como substrato doador.

b) Glutationa peroxidase-2 intestinal


Semelhante a GPX1, encontrada no trato gastrointestinal.

c) Glutationa peroxidase-3 no plasma


Responde mais rapidamente deficincia e suplementao de selnio.

d) Glutationa peroxidase fosfolipdio hidroperxido ou GPX4


uma selenoperoxidase intracelular. A enzima reduz fosfolipdio hidroperxido, assim como
colesterol hidroperxido, que no so substrato para a GPX1.

e) Outras Glutationas peroxidases


Alm das quatro glutationas citadas, duas outras glutationas peroxidases contendo cistena foram
identificadas em mamferos, GPX5 e GPX6.

f) Iodotironina 5'-deiodinase-1 (DI1)


a principal enzima que converte tiroxina (T4) em triiodotironina (T3):
T4 + 2GSH T3 + GSSG + I- + H+

g) Deiodinase-2 (DI2) e deiodinase-3 (DI3)


Essas duas enzimas tambm esto envolvidas no metabolismo dos hormnios da tireide e do iodo.
Na deficincia de iodo, a regulao da DI1 conserva o iodo, limitando a converso de T4 em T3 e,
portanto, tornando a T4 disponvel para a converso intracelular pela DI2 em importantes rgos endcrinos.
A deficincia combinada de iodo e selnio pode ser responsvel pela etiologia do cretinismo endmico em
populaes no Zaire. A administrao apenas de selnio parece agravar essa patologia por restabelecer a
atividade de DI1, levando a um aumento da utilizao do T4, que um substrato para DI2 em tecidos
endcrinos.

h) Tioredoxina redutase (TRR)


Essa enzima regula o estado redox intracelular, reduz pequenas molculas intracelulares e pode ser
importante no ciclo celular. Recentes estudos indicam que TRR reduz cido deiidroascrbico e que os nveis
de ascorbato esto reduzidos na deficincia de selnio.

i) Selenoprotena P plasmtica (SEL-P)


A concentrao plasmtica dessa enzima reflete o consumo de selnio em populaes e pode ser
associada com doenas causadas pela deficincia de Se. A enzima pode funcionar como uma protena
antioxidante no espao intersticial. Outras hipteses indicam que seja uma protena de transporte.

j) Selenoprotena W muscular (SEL-W)


Est relacionada com a proteo do msculo branco contra doenas causadas pela deficincia de Se.

k) Outras selenoprotenas em animais superiores


Estima-se que existam de 30 a 50 selenoprotenas nos animais superiores, cuja natureza ainda no foi
caracterizada.

171
l) Protenas ligantes de selnio
Existem diversas protenas ligantes de Se implicadas no seu metabolismo.

m) Protenas contendo selenometionina


Selenomietionina da dieta pode ser incorporada no especificamente em protenas, visto que
selenometionina um excelente anlogo da metionina na sntese protica.

n) Selenoenzimas procariticas
Uma srie de selenoenzimas tem sido identificada em microrganismos, que possivelmente podero
servir como modelo para se estudar em novos papis do Se em organismos superiores.

9.6.5. Necessidades e Recomendaes Nutricionais, segundo IOM (2000):


Grupo Idade Selnio (g/dia)
EAR RDA UL
Lactentes 0-6m - 15* 45
7 -12 m - 20* 60
Crianas 1-3a 17 20 90
4-8a 23 30 150
Homens 9 - 13 a 35 40 280
14 - 18 a 45 55 400
19 - 30 a 45 55 400
31 - 50 a 45 55 400
51 - 70 a 45 55 400
> 70 a 45 55 400
Mulheres 9 - 13 a 35 40 280
14 - 18 a 45 55 400
19 - 30 a 45 55 400
31 - 50 a 45 55 400
51 - 70 a 45 55 400
> 70 a 45 55 400
Gravidez 18 a 49 60 400
19 - 30 a 49 60 400
31 - 50 a 49 60 400
Lactao 18 a 59 70 400
19 - 30 a 59 70 400
31 - 50 a 59 70 400
*AI: ingesto adequada.
EAR: necessidade mdia estimada.
RDA: quota diettica recomendada.
UL: nvel de ingesto mxima tolervel.

9.6.6. Fontes Alimentares


O contedo de selnio nos alimentos varia dependendo do teor de selnio no solo onde a planta foi
cultivada ou o animal foi criado, de forma que o mesmo alimento pode apresentar variao de at 10 vezes no
seu contedo em selnio, dependendo da regio onde foi produzido. Vsceras e frutos do mar contm cerca de
40 a 150 g/100 g desse mineral; carnes vermelhas, e 10 a 40 g/100 g; gro e cereais, de 10 a 80 g/100 g;
produtos lcteos, de 10 a 30 g/100 g; e frutas e hortalias, menos de 10 g/100 g. A castanha-do-par contm
cerca de 1.200 g/100 g (12 g/g), sendo uma das maiores fontes de selnio na alimentao.

9.7. IODO
9.7.1. Introduo
O corpo humano contm de 15 a 20 mg de iodo, dos quais 70 a 80% esto na glndula tireide. A
funo nutricional primordial do iodo como componente dos hormnios da tireide, tiroxina (T4) e
triiodotironina (T3), representando 65% do T4 e 59% do T3. Outras funes no organismo ainda no esto
comprovadas e merecem futuras investigaes.
Os hormnios da tireide esto envolvidos na regulao de vrias enzimas e processos metablicos.
Os hormnios da tireide so essenciais aos mamferos, por regularem a taxa metablica, calorignese,
termorregulao, crescimento, desenvolvimento de diversos rgos, sntese protica e atividade enzimtica.

9.7.2. Absoro, Metabolismo e Excreo

172
O iodo pode ser ingerido de diversas formas, sendo a maioria reduzida no intestino e absorvida quase
que completamente. Em condies normais, a absoro do iodo de cerca de 90%. O iodato, amplamente
usado no enriquecimento do sal de cozinha, reduzido a iodeto antes de ser absorvido. Na circulao, o iodeto
captado principalmente pela glndula tireide e rins. A tireide retm iodeto para a sntese dos hormnios, e
a maioria do iodo no utilizado pela glndula excretada na urina.
Um transportador na membrana basal da tireide responsvel pela transferncia de iodeto da
circulao e sua concentrao na glndula em cerca de 20 a 50 vezes a do plasma.
A sntese do hormnio da tireide se inicia com a sntese da tiroglobulina, uma glicoprotena que
serve de veculo para a iodao, formando diiodotirosina e monoidotirosina. A enzima tiroperoxidase, ento,
catalisa a associao de duas molculas de diiodotirosina, formando tetraiodotironina ou tiroxina (T4). Uma
associao similar entre diiodotirosina e monoidotirosina produz triiodotironina (T3). Dois teros do iodo, no
entanto, so mantidos na forma dos precursores inativos, diiodotirosina e monoidotirosina, que so retirados da
frao protica por uma deiodinase especfica e reciclados dentro da glndula tireide, conservando o iodo no
organismo.
Uma vez na circulao, os hormnios T4 e T3 se ligam a protenas sintetizadas no fgado e migram
para os rgos-alvo, onde T4 convertido em T3, que a forma metabolicamente ativa do hormnio. Essa
converso de T4 em T3 feita pela 5-deiodinase, dependente de selnio. Portanto, a deficincia de selnio
reduz a ao dos hormnios da tireide, mesmo que a ingesto de iodo seja adequada.
A tirotropina ou TSH o principal regulador da funo da tireide. Esse hormnio secretado pela
glndula pituitria, em resposta aos nveis circulantes dos hormnios da tireide. A secreo do TSH aumenta
quando os nveis dos hormnios da tireide esto baixos, de forma que altos nveis de TSH indicam
hipotiroidismo e baixos nveis de TSH indicam hipertiroidismo. Quando os nveis plasmticos de T4
diminuem, a secreo de TSH aumenta, assim como a atividade da tireide e a captao de iodo aumenta.
A principal via de excreo do iodo a urina, que contm mais de 90% do iodo proveniente da dieta e
um bom indicador do consumo e do estado nutricional relativo ao iodo. O restante do iodo eliminado pelas
fezes, e em menor proporo, pelo suor.

9.7.3. Deficincia
A desordem por deficincia de iodo (DDI) inclui retardo mental, hipotiroidismo, bcio, cretinismo e
outras anormalidades do crescimento e desenvolvimento em diversos graus. A deficincia resultante da
produo inadequada dos hormnios da tireide, devido falta de iodo.
O principal efeito da deficincia de iodo no desenvolvimento cerebral. O hormnio da tireide
particularmente importante para a mielinizao do sistema nervoso central, que mais ativo no perodo
perinatal e durante o desenvolvimento fetal e ps-natal inicial. Assim, a deficincia de iodo pode estar
relacionada a altas incidncias de retardo mental em certas regies.
O cretinismo uma forma extrema de dano neurolgico do hipotiroidismo fetal. Ocorre nos casos de
deficincia severa de iodo e caracterizado pelo retardo mental, baixa estatura, surdez e mudez.
O bcio (aumento da glndula tireide) usualmente o sinal clnico inicial da deficincia de iodo. Na
tentativa de se adaptar deficincia do iodo para a produo dos hormnios, a glndula aumenta o tamanho e o
nmero de suas clulas. Num estgio inicial, a hipertrofia pode ser difusa e, em estgios avanados, estar
associada ao hipertiroidismo de ndulos autnomos e ao cncer folicular da tireide. Quando atinge a
prevalncia de 10%, chamado de bcio endmico.
Algumas substncias, chamadas de bociognicas, podem interferir com a produo e utilizao dos
hormnios da tireide. A mandioca pode produzir tiocianato, que bloqueia a captao de iodo pela tireide. A
soja e as crucferas, como o repolho e a couve-flor, tambm contm substncias bociognicas. No entanto,
essas substncias so geralmente volteis e no representam importncia clnica, a no ser que coexista a
deficincia de iodo.
Deficincias de vitamina A, selnio e ferro podem exacerbar os efeitos da deficincia de iodo. O
selnio parte da 5-deiodinase, que converte T4 em T3 no fgado, e tanto a deficincia quanto a
suplementao de selnio podem aumentar o tamanho da glndula tireide em animais com deficincia de
iodo. A vitamina A afeta os hormnios da tireide em diversos nveis e a tiroperoxidase, necessria para a
sntese do T4, uma heme-protena dependente de ferro. Na deficincia de ferro, o metabolismo da tireide
comprometido, levando-se inabilidade do controle da temperatura corporal.

9.7.4. Fontes Alimentares


O contedo de iodo dos alimentos geralmente baixo e dependente do seu contedo no solo.
Alimentos de origem marinha apresentam maior concentrao de iodo, por concentrarem o iodo proveniente
do mar. Alimentos processados tambm podem apresentar maiores teores em funo da adio de sal iodado.
A iodao do sal de cozinha obrigatria no Brasil. A Lei no. 1944, de 14 de agosto de 1953, instituiu
a obrigatoriedade da adio de iodo no sal destinado ao consumo humano, na proporo de 10 mg de iodato de
potssio por kg de sal. Em 1974, passou a vigorar a Lei 6.150 e, em 1994, a Medida Provisria 672 deu nova

173
redao Lei, quanto proporo de iodo, por kg de sal, que passa a ser estabelecida pelo Ministrio da
Sade, tendo em vista a necessidade de iodao para o efetivo controle do bcio endmico no pas
(www.anvisa.gov.br).

9.7.5. Recomendaes Nutricionais, segundo IOM (2001)


Grupo Idade Iodo (g/dia)
EAR RDA UL
Lactentes 0-6m - 110* NE
7 - 12 m - 130* NE
Crianas 1-3a 65 90 200
4-8a 65 90 300
Homens 9 - 13 a 73 120 600
14 - 18 a 95 150 900
19 - 30 a 95 150 1.100
31 - 50 a 95 150 1.100
51 - 70 a 95 150 1.100
> 70 a 95 150 1.100
Mulheres 9 - 13 a 73 120 600
14 - 18 a 95 150 900
19 - 30 a 95 150 1.100
31 - 50 a 95 150 1.100
51 - 70 a 95 150 1.100
> 70 a 95 150 1.100
Gravidez 18 a 160 220 900
19 - 30 a 160 220 1.100
31 - 50 a 160 220 1.100
Lactao 18 a 209 290 900
19 - 30 a 209 290 1.100
31 - 50 a 209 290 1.100
*AI: ingesto adequada.
EAR: necessidade mdia estimada.
RDA: quota diettica recomendada.
UL: nvel de ingesto mxima tolervel.
NE: no estabelecido.

9.7.6. Consideraes Finais


A biodisponibilidade de iodo dos alimentos relativamente alta, de forma que a deficincia ocorre,
sobretudo, devido ao baixo consumo. A quantidade de iodo nos alimentos depende das condies do solo.
Como a maioria do iodo proveniente do mar, as regies montanhosas, em especial o Himalaia, os Andes e os
Alpes, so deficientes em iodo, assim como os alimentos produzidos nessas reas.
O aumento do consumo pela fortificao do sal com iodo, que quase completamente absorvido, tem
sido uma estratgia positiva na reduo da incidncia de DDI.

9.8. FLOR
9.8.1. Introduo
O flor um elemento abundante na natureza. Tem alta afinidade pelo clcio, o que faz que 99% do
flor do organismo esteja fortemente ligado aos tecidos calcificados. Desempenha papel importante na
preveno e reverso do progresso das cries dentrias. Tem ainda a propriedade de estimular a formao
ssea e, por isso, apresenta potencial na preveno e tratamento da osteoporose.

9.8.2. Absoro e Excreo


Em geral, mais de 80% do flor ingerido na dieta absorvido. Sua absoro pode ser reduzida para 50 a
70%, quando na presena de altas concentraes de clcio e de outros ctions que formam compostos
insolveis com o flor. A maioria do flor que deixa o estmago absorvida na poro proximal do intestino
delgado por difuso.
A principal via de excreo do flor atravs dos rins. O flor filtrado nos glomrulos, e sua
reabsoro tubular dependente do pH. Em meio cido (pH = 4,0), encontra-se predominantemente na forma
de cido (HF), que altamente reabsorvido. Em meio alcalino (pH = 7,4), predomina a forma inica (F-), para
a qual a membrana do epitlio tubular virtualmente impermevel, aumentando sua excreo urinria.
Em adultos jovens saudveis, aproximadamente 50% do flor absorvido retido nos tecidos
calcificados e 50%, excretado na urina. Crianas retm at 80% do flor absorvido nos tecidos calcificados, e

174
em idosos provvel que a maior poro do flor absorvido seja excretada. O balano de flor pode-se tornar
negativo, ou seja, a excreo urinria pode exceder a quantidade ingerida quando o consumo crnico de flor
insuficiente para manter as concentraes plasmticas, ocasionando a mobilizao do flor dos tecidos
calcificados. Embora o flor esteja ligado fortemente aos tecidos calcificados, essa ligao no irreversvel,
existindo locais de troca rpida ou lenta.

9.8.3. Efeito Cariosttico do Flor


O flor pode ser depositado na placa dentria pela sua captao direta das fontes alimentares, bem
como proveniente da saliva e da absoro no trato gastrointestinal. O efeito cariosttico do flor no dente ps-
erupo pode ser devido a:
a) Reduo da solubilidade em cido do esmalte do dente.
b) Promoo da remineralizao das leses incipientes no esmalte do dente causadas pela ao das
bactrias formadoras de placas.
c) Reduo na sada de minerais da superfcie do esmalte dos dentes, pela induo da precipitao da
hidroxiapatita pelo flor, formando fluoroidroxiapatita.
d) Inibio de enzimas bacterianas, limitando a captao de glicose e a produo de cido que ataca o
esmalte do dente.
Esse efeito do flor requer exposio freqente do dente a ele ao longo da vida, a fim de atingir e manter a
concentrao adequada do on no esmalte e na placa dentria.

9.8.4. Interaes com componentes dos alimentos


A biodisponibilidade de flor em geral alta, porm pode ser influenciada pela presena de certos
componentes da dieta. A absoro pode ser reduzida pela ingesto simultnea de alimentos ricos em clcio,
como o leite e frmulas infantis. A absoro do flor presente nos cremes dentais, quando na forma de fluoreto
de sdio ou monofluorofosfato (MFP), prxima de 100%.

9.8.5. Fontes Alimentares


A concentrao de flor na maioria dos alimentos inferior a 0,05 mg/100 g, com exceo da gua
fluoretada (0,7 a 1,2 mg/L), bebidas e frmulas infantis feitas ou reconstitudas com gua fluoretada., alm de
chs (0,1 a 0,6 mg/100 mL) e alguns peixes marinhos (0,01 a 2,7 mg/100 g).
A obrigatoriedade da fluoretao da gua de consumo pblico no Brasil foi instituda pela Lei 6.050, de 24
de maio de 1974, e regulamentada pela Portaria 635, de 26 de dezembro de 1975.
Outras fontes no alimentares incluem os suplementos e produtos dentrios fluorados, como os cremes
dentais, especialmente quando deglutidos por crianas. A contribuio da escovao com produtos fluorados
pode chegar a 0,6 mg/dia. Os produtos dentifrcios e enxaguatrios bucais devem atender Portaria no 22, de
20 de dezembro de 1989, do Ministrio da Sade (www.saude.gov.br), quanto aos compostos de flor e suas
concentraes permitidos.

9.8.6. Crie Dentria e Fluorose


O flor reduz o desenvolvimento de cries dentrias em crianas e adultos. A fluoretao da gua (cerca
de 1 mg/L) est associada proteo contra as cries e baixa prevalncia de fluorose.
A fluorose causada pela ingesto excessiva ou pela aplicao tpica de flor, o que provoca desordem
no esmalte do dente antes da sua erupo. Pode ser leve, moderada ou severa, dependendo da quantidade de
flor ingerido. Em geral, a ingesto de 0,03 a 0,1 mg/kg de peso/dia leva fluorose.
Quanto mais cedo a criana for exposta gua fluoretada ou a suplementos de flor, maior a reduo das
cries tanto em dentes primrios (de leite) quanto nos permanentes. Entretanto, as evidncias cientficas so
insuficientes para se recomendar a suplementao pr-natal com flor.

175
9.8.7. Recomendaes nutricionais, segundo o IOM (1997)
Grupo Idade Flor (mg/dia)
AI UL
Lactentes 0-6m 0,01 0,7
7 - 12 m 0,5 0,9
Crianas 1-3a 0,7 1,3
4-8a 1,0 2,2
Homens 9 - 13 a 2,0 10,0
14 - 18 a 3,0 10,0
>19 a 4,0 10,0
Mulheres 9 - 13 a 2,0 10,0
14 - 18 a 3,0 10,0
>19 a 3,0 10,0
Gravidez 18 a 3,0 10,0
19 - 50 a 3,0 10,0
Lactao 18 a 3,0 10,0
19 - 50 a 3,0 10,0
*AI: ingesto adequada.
UL: nvel de ingesto mxima tolervel.

9.9. ELEMENTOS-TRAO
9.9.1. CROMO
9.9.1.1. Introduo
O cromo existe na natureza com as valncias +3 e +6. O cromo III mais estvel e a forma encontrada
nos alimentos e no organismo. O cromo VI um subproduto da indstria de ao inoxidvel, de pigmentos e de
material cromado. altamente oxidvel, provoca irritao e corroso e pode ser carcinognico quando inalado.
J o cromo III tem baixa toxicidade devido, em parte, sua reduzida absoro intestinal.
O cromo potencializa a ao da insulina, restabelecendo a tolerncia glicose. Entretanto, a eficcia do
uso de seus suplementos para controlar a glicemia no est comprovada.
Uma protena de baixo peso molecular ligante de cromo, a cromodulina, parece amplificar a atividade
do receptor de insulina tirosina quinase em resposta insulina. A forma inativa do receptor se liga insulina,
tornando-se ativo. O receptor ativado estimula a entrada de cromo na clula, o qual se liga a essa protena. Esse
complexo ativa a tirosina quinase.

9.9.1.2. Absoro, metabolismo e excreo


Apenas 0,4 a 2,5% do cromo III ingerido absorvido, sendo a sua grande parte, portanto, excretada nas
fezes. Do cromo absorvido, a maioria excretada na urina.
A absoro e excreo do cromo podem ser afetadas por uma srie de fatores da dieta, em que a
vitamina C e alguns aminocidos podem aumentar a absoro. No entanto, o consumo de fitato e de anticidos
parece inibir a absoro de cromo. O alto consumo de carboidratos simples pode aumentar a excreo de
cromo, devido propriedade insulinognica dos carboidratos.
A atividade fsica tambm parece aumentar a absoro de cromo, entretanto ainda no se pode afirmar
que os benefcios da atividade fsica para o metabolismo da glicose e da insulina sejam devidos a esse aumento
na absoro de cromo.
O cromo absorvido transportado pela transferrina e, em razo disso, pode interagir com o ferro. O
excesso de ferro observado na hemocromatose pode interferir no estado nutricional relativo ao cromo.
O cromo concentra-se principalmente no fgado, no bao, nos tecidos moles e nos ossos. A
concentrao de cromo no organismo pode reduzir com o avanar da idade.

9.9.1.3. Deficincia
A deficincia de cromo foi observada em pacientes com nutrio parenteral total no suplementada com
cromo, levando m utilizao da glicose e aumento da necessidade de insulina. Em vista disso, a deficincia
de cromo tem sido considerada fator que contribui para a intolerncia glicose no diabetes tipo II.
A falta de informao sobre o consumo alimentar de cromo e sobre um indicador da sua deficincia
dificulta a associao entre a deficincia desse elemento e a incidncia de diabetes.

9.11.1.4. Fontes Alimentares


O cromo amplamente distribudo nos alimentos, porm em pequenas quantidades. A anlise qumica
do cromo requer cuidados especiais para evitar contaminao. Alm disso, a quantidade de cromo nos

176
alimentos muito varivel e dependente das condies geogrficas. Esses fatores contribuem para a falta de
informao nas tabelas de composio alimentar e, conseqentemente, sobre o consumo alimentar de cromo.
O refinamento de gros e acares reduz o contedo de cromo. Entretanto, o processamento de
alimentos em meio cido pode aumentar o contedo de cromo nos alimentos, especialmente quando
processados em material de ao inoxidvel.
Os cereais podem contribuir com 0,15 a 35 g de cromo por poro de 50 g. Os cereais integrais so
mais ricos em cromo, mas sua biodisponibilidade pode ser afetada pelo fitato.
Leite e derivados, em geral, so pobres em cromo (0,6 g/poro), enquanto carnes, aves e peixes
contribuem com cerca de 1 a 2 g/poro. Sua concentrao em frutas e hortalias muito varivel. Cerveja e
vinho tambm podem fornecer quantidades variveis de cromo.

9.9.1.5. Recomendaes nutricionais, segundo o IOM (2001)


Grupo Idade Cromo (g/dia)
AI
Lactentes 0-6m 0,2
7 - 12 m 5,5
Crianas 1-3a 11
4-8a 15
Homens 9 - 13 a 25
14 - 18 a 35
19 - 50 a 35
> 51 a 30
Mulheres 9 - 13 a 21
14 - 18 a 24
19 - 50 a 25
> 51 a 20
Gravidez 18 a 29
19 - 50 a 30
Lactao 18 a 44
19 50 a 45
AI: ingesto adequada.

A limitao de estudos ainda no permitiu estabelecer o nvel de ingesto mxima tolervel (UL) para o
cromo.

9.9.2. MOLIBDNIO
9.9.2.1. Introduo
O molibdnio atua como co-fator de uma srie de enzimas no organismo humano, como a sulfeto
oxidase, xantina oxidase e aldedo oxidase, enzimas envolvidas no catabolismo de aminocidos sulfurados,
purinas e pirimidinas. Na deficincia da enzima sulfeto oxidase, o sulfeto no oxidado a sulfato, levando a
danos neurolgicos e morte.

9.9.2.2. Absoro, metabolismo e excreo


O molibdnio altamente absorvido por um processo passivo. Quando absorvido, transportado no
plasma por uma protena ligante, provavelmente a -macroglobulina.
Em estudos experimentais, tem-se observado reduo na absoro de molibdnio na presena de
tungstnio, assim como deficincia de cobre em razo da alta ingesto de molibdnio. Entretanto, essas
interaes no tm sido consideradas de importncia para a nutrio humana. A absoro de molibdnio
proveniente da soja menor do que de outras fontes alimentares, provavelmente em razo da presena de
ligantes de minerais na soja, reduzindo sua biodisponibilidade.
A principal via de excreo de molibdnio na urina, que reflete o seu consumo alimentar. A excreo
renal parece ser a maior responsvel pelo controle homeosttico do molibdnio.
A concentrao plasmtica de molibdnio baixa e difcil de ser medida. Portanto, no pode ser usada
para se estabelecerem as necessidades nutricionais do mineral. A deficincia de molibdnio afeta a atividade
das enzimas nas quais atua como co-fator, porm sua deficincia no tem sido observada em indivduos
saudveis.

9.9.2.3. Fontes Alimentares


O contedo de molibdnio nos alimentos de origem vegetal varia com as condies do solo onde so
produzidos. As leguminosas so as principais fontes de molibdnio, assim como gros e nozes. Os produtos de
origem animal e a maioria das frutas e hortalias so pobres em molibdnio.

177
9.9.2.4. Recomendaes nutricionais, segundo o IOM (2001)
Grupo Idade Molibdnio (g/dia)
EAR RDA UL
Lactentes 0-6m 2* NE
7 - 12 m 3* NE
Crianas 1-3a 13 17 300
4-8a 17 22 600
Homens 9 - 13 a 26 34 1.100
14 - 18 a 33 43 1.700
19 - 30 a 34 45 2.000
31 - 50 a 34 45 2.000
51 - 70 a 34 45 2.000
> 70 a 34 45 2.000
Mulheres 9 - 13 a 26 34 1.100
14 - 18 a 33 43 1.700
19 - 30 a 34 45 2.000
31 - 50 a 34 45 2.000
51 - 70 a 34 45 2.000
> 70 a 34 45 2.000
Gravidez 18 a 40 50 1.700
19 - 30 a 40 50 2.000
31 - 50 a 40 50 2.000
Lactao 18 a 35 50 1.700
19 - 30 a 36 50 2.000
31 - 50 a 36 50 2.000
*AI: ingesto adequada.
EAR: necessidade mdia estimada.
RDA: quota diettica recomendada.
UL: nvel de ingesto mxima tolervel.
NE: no estabelecido.

9.9.3. BORO
9.9.3.1. Introduo
A importncia do boro na nutrio humana ainda no completamente conhecida. Esse elemento se
encontra na forma de cido brico e, em condies fisiolgicas, pode dar estabilidade a molculas como
polissacardeos e esterides.
provvel que o boro esteja envolvido no metabolismo da vitamina D e do estrognio em humanos.
Diferentes funes tm sido atribudas ao boro em outras espcies animais.

9.9.3.2. Absoro, metabolismo e excreo


A maioria do boro da dieta convertida a cido brico no intestino, o que favorece a absoro de cerca
de 90% do boro ingerido. Sua absoro provavelmente se d por difuso passiva.
O boro parece ser transportado na corrente sangnea na forma de cido brico, e sua excreo se d
principalmente pela urina. A excreo urinria aumenta com o consumo de boro, o que indica um pequeno
pool desse mineral no organismo, alm da sua eficiente absoro e excreo. Apenas pequena parte do boro
ingerido excretada nas fezes.

9.9.3.3. Fontes alimentares


O boro encontrado em produtos e bebidas base de frutas, tubrculos e leguminosas. Dependendo da
localizao geogrfica, a gua pode contribuir com boro na alimentao. Teores muito baixos so encontrados
em carnes e outros produtos de origem animal, gros e condimentos.

9.9.3.4. Recomendaes nutricionais


O pouco conhecimento que se tem at o presente acerca da importncia do boro na nutrio humana no
permite estabelecer suas recomendaes nutricionais. O consumo de boro pela populao americana varia de
0,75 mg/dia pelos pr-escolares a 1,27 mg/dia pelas lactantes.
O boro apresenta baixa toxicidade, e seus efeitos adversos na espcie humana no so bem conhecidos.
Baseado em estudos animais, as UL para boro foram estabelecidas em 3 mg/dia para crianas de 1 a 3 anos de
idade; 6 mg/dia para crianas de 4 a 8 anos; 11 mg/dia para crianas de 9 a 13 anos de idade; 17 mg/dia para
adolescentes de ambos os sexos, de 14 a 18 anos de idade; e 20 mg/dia para adultos de ambos os sexos,
grvidas e lactantes adultas.

178
9.9.4. NQUEL
9.9.4.1. Introduo
O nquel um elemento essencial para diversas espcies animais. Em ratos, sua deficincia provoca
retardo no crescimento, baixos nveis de hemoglobina e alterao no metabolismo da glicose.
A essencialidade do nquel para a espcie humana no foi ainda demonstrada, e provvel que ele seja
co-fator ou componente estrutural de metaloenzimas envolvidas em reaes de oxirreduo e na expresso
gnica. Pode ainda ser um facilitador da absoro e do metabolismo do ferro e, ainda, interagir na via de
converso da homocistena em metionina, mediada pela vitamina B12 e pelo cido flico.

9.9.4.2. Absoro, metabolismo e excreo


A absoro do nquel da dieta de aproximadamente 10%. Portanto, a maioria do nquel ingerido
excretada nas fezes. Grande quantidade de nquel absorvido excretada na urina, e uma menor poro
eliminada pelo suor e pela bile. A presena de certos alimentos, como leite, caf, ch, suco de laranja e cido
ascrbico reduz a absoro de nquel da dieta.
O nquel transportado no sangue ligado principalmente albumina. Apesar de o nquel no se
acumular na maioria dos rgos e tecidos, as glndulas tireide e adrenal apresentam concentraes
relativamente altas.

9.9.4.3. Fontes alimentares


O nquel encontrado em maiores concentraes nas nozes (128 g/100 g), nas leguminosas (55
g/100 g) e no chocolate. Os demais alimentos contm menos de 40 g/100 g de nquel.
No h relatos de efeitos adversos associados a consumo excessivo de nquel em uma dieta normal. A
ingesto acidental de doses excessivas de sais de nquel provocou nusea, dor abdominal, diarria, vmito,
falta de ar, alteraes hematolgicas e sinais semelhantes dermatite.

9.9.4..4. Recomendaes nutricionais


No h recomendaes para o nquel, no entanto foram estabelecidas as ULs baseadas no No-Observed-
Adverse-Effect ou Nenhum Efeito Adverso Observado (NOAEL) e Lowest-Observed-Adverse-Effect ou
Menor Efeito Adverso Observado (LOAEL), conforme visto no esquema a seguir:

Grupo Idade Nquel


UL (mg/dia)
Lactentes 0-6m NE
7 - 12 m NE
Crianas 1-3a 0,2
4-8a 0,3
Homens e mulheres 9 - 13 a 0,6
14 - 18 a 1,0
> 19 anos 1,0
Gravidez e lactao 18 a 1,0
19 - 50 a 1,0
NE: no estabelecido.

9.9.5. SLICA
9.9.5.1. Introduo
A funo da slica na nutrio humana no est ainda bem definida. Em animais como ratos e aves, a
slica parece estar envolvida com a formao ssea, contribuindo para a atividade prolilidrolase, importante na
formao do colgeno.

9.9.5.2. Absoro, metabolismo e excreo


A slica parece ser bem absorvida, e cerca de 50% do ingerido excretado pela urina. Vrios tecidos
conectivos, como aorta, traquia, ossos, tendes e pele contm a maioria da slica presente no organismo.

9.9.5.3. Fontes alimentares


Os produtos de origem vegetal contm maiores teores de slica do que os produtos de origem animal.
As bebidas, como cerveja, caf e gua contribuem com mais da metade do consumo dirio de slica, seguidas
dos gros e das hortalias. O refinamento dos gros reduz o teor de slica dos alimentos.

9.9.5.4. Recomendaes nutricionais

179
Devido ao fato de no ser conhecida a funo biolgica da slica na espcie humana, suas
recomendaes nutricionais (EAR, RDA e AI) no foram estabelecidas. No h evidncias de que o consumo
habitual de slica na alimentao possa causar algum efeito adverso ou toxidez. O uso de medicamentos
anticidos contendo slica por perodos prolongados pode causar urolitase, devido formao de clculos de
slica. Em virtude da ausncia de informao acerca dos efeitos adversos da slica, a UL tambm no foi
estabelecida.

9.9.6. VANDIO
9.9.6.1. Introduo
A funo do vandio na nutrio humana no foi ainda identificada. Ele parece imitar a ao da
insulina, e sua suplementao medicamentosa pode diminuir a necessidade de insulina em pacientes diabticos
tipo I. Essas altas doses, entretanto, superam o limite mximo tolervel (UL).

9.9.6.2. Absoro, metabolismo e excreo


Menos de 5% do vandio ingerido absorvido, portanto a maior quantidade eliminada nas fezes.
Quando absorvido se liga transferrina e ferritina no plasma. Apenas pequena poro do vandio absorvido
retida no organismo, sendo a maior concentrao encontrada no fgado, nos rins e nos ossos.

9.9.6.3. Fontes alimentares


As principais fontes de vandio na alimentao incluem cogumelos, crustceos, pimenta do reino, salsa
e produtos processados. Cerveja, vinho, gros, sucos e cereais infantis tambm podem contribuir com o
consumo de vandio.

9.9.6.4. Recomendaes nutricionais


Devido ao fato de no ser conhecida a funo biolgica do vandio na espcie humana, suas
recomendaes nutricionais (EAR, RDA e AI) no foram estabelecidas.
No h evidncias de efeitos adversos com o consumo alimentar de vandio. Entretanto, o consumo de
suplemento de vandio causa alterao na funo renal, alterao hematolgica, elevao da presso arterial e
reduo na taxa de fertilizao e de reproduo em animais. Em humanos, a suplementao pode causar
alteraes gastrointestinais moderadas, como clicas e diarria.
O limite mximo de ingesto de vandio (UL) foi estabelecido em 1,8 mg/dia para adultos com idade
acima de 19 anos. Para as demais faixas etrias, inclusive na gravidez e na lactao, no foi estabelecido UL,
sendo sugerido para esses indivduos o consumo de vandio apenas de fontes alimentares.

9.9.7. ARSNICO
9.9.7.1. Introduo
No h evidncias da essencialidade do arsnico na nutrio humana. Em animais, a sua deficincia
pode causar alteraes no metabolismo da metionina, alm de crescimento e reproduo anormais.

9.9.7.2. Absoro, metabolismo e excreo


Mais de 90% do arsnico proveniente da gua e cerca de 60 a 70% vindo dos alimentos podem ser
absorvidos. Quando absorvido metilado no fgado, porm maior quantidade excretada na urina.

9.9.7.3. Fontes alimentares


Peixes, carnes, aves, produtos lcteos, cereais, leos e gorduras contribuem com a maioria do arsnico
na dieta. Arroz, farinhas, suco de uva e espinafre tambm contribuem para a ingesto desse elemento na dieta.
O consumo de arsnico parece variar de 0,5 a 0,81 g/kg de peso/dia.

9.9.7.4. Recomendaes nutricionais


Devido ao fato de no ser conhecida a funo biolgica do arsnico na espcie humana, suas
recomendaes nutricionais (EAR, RDA e AI) no foram estabelecidas.
A forma orgnica de arsnico nos alimentos menos txica do que as formas inorgnicas, que so
conhecidamente consideradas como veneno.
A forma aguda de toxidez do arsnico inorgnico leva a encefalopatia, distrbios gastrointestinais,
anemia e hepatotoxicidade. A ingesto crnica de arsnico est associada alterao na pigmentao da pele,
ceratose, gangrena, neuropatia perifrica e alguns tipos de cncer, como de pele, bexiga, pulmo, fgado e rins.
Embora no tenha sido estabelecida a UL para o arsnico orgnico, seu consumo proveniente dos
alimentos pode implicar risco de efeitos adversos, assim como do consumo de arsnico inorgnico proveniente
do abastecimento de gua.
9.10. Referncias

180
ANDERSON, J.J.B. Symposium: nutritional advances in human bone metabolism - Introduction. Journal of
Nutrition, v. 126, p. 1150S-1152S, 1996.

BEARD, J.L.; DAWSON, H.; PIERO, D.J. Iron metabolism: a comprehensive review. Nutrition Reviews,
v. 54, n. 10, p. 295-317, 1996.

BENITO, P.; MILLER, D. Iron absorption and bioavailability: an update review. Nutrition Research, v. 18,
n. 3, p. 581-603, 1998.

BRONNER, F.; PANSU, D. Nutritional aspects of calcium absorption. Journal of Nutrition, v. 129, p. 9-12,
1999.

BRONNER, F. Calcium absorption - A paradigm for mineral absorption. Journal of Nutrition, v. 128, p. 917-
920, 1998.

DE ANGELIS, R.; CTENAS, M.L.B. Biodisponibilidade de ferro na alimentao infantil. Temas de


Pediatria, n.52, Servio de Informao Cientfica, Nestl, 1993.

FAIRWEATHER-TAIT, S.J. Bioavailability of copper. European Journal of Clinical Nutrition, v. 51S, p.


S24-S26, 1997.

FLEET, J.C. Zinc, copper, and manganese. In: Biochemical and physiological aspects of human nutrition.
STIPANUK, M.H. (ed.). Philadelphia: W.B. Saunders Company, 2000. p.741-760. cap. 32.

FORBES, A.L.; ADAMS, C.E.; ARNAUD, M.J.; CHICHESTER, C.O.; COOK, J.D.; HARRISON, B.N.;
HURRELL, R.F.; KAHN, S.G.; MORRIS, E.R.; TANNER, J.T.; WHITTAKER, P. Comparison of in vitro,
animal, and clinical determinations of iron bioavailability: International Nutritional anemia Consultative Group
Task Force report on iron bioavailability. American Journal of Clinical Nutrition, v. 49, p. 225-238, 1989.

GROFF, J.L.; GROPPER, S.S.; HUNT, S.M. Advanced nutrition and human metabolism, 2 ed. New York:
West Publishing Company, 1995. 575 p.

HURREL, R.F. Bioavailability of iodine. European Journal of Clinical Nutrition, Supp 1:S9-S12, 1997.

IOM - Institute of Medicine. Dietary reference intakes for calcium, phosphorus, magnesium, vitamin D,
and fluoride. Washington, D.C.: National Academy Press, 1997. 432 p.

IOM - Institute of Medicine. Dietary reference intakes for vitamin C, vitamin E, selenium, and
carotenoids. Washington, D.C.: National Academy Press, 2000. 506 p.

IOM - Institute of Medicine. Dietary reference intakes for vitamin A, vitamin K, arsenic, boron,
chromium, copper, iodine, iron, manganese, molybdenum, nickel, silicon, vanadium, and zinc.
Washington, D.C.: National Academy Press, 2001. 769 p.

MILLER, D.D. Calcium in the diet: food sources, recommended intakes, and nutritional bioavailability.
Advances in Food and Nutrition Research, v. 33, p. 103-156, 1989.

NATIONAL RESEARCH COUNCIL - NRC. Recommended dietary allowances, 10 ed. Washington, D.C:
National Academy Press, 1989. 284 p.

SANDSTROM, B. Bioavailability of zinc. European Journal of Clinical Nutrition, v. 51S, p. S17-S19,


1997.

SHILS, M.E.; OLSON, J.A.; SHIKE, M. Modern nutrition in health and disease. 8 ed. Philadelphia: Lea &
Febiger, 1994. v. 1, 923 p.

STIPANUK, M.H. Biochemical and physiological aspects of human nutrition. Philadelphia: W. B.


Saunders Company, 2000. 1007 p.

VANNUCCHI, H.; MENEZES, E.W.; CAMPANA, A.O.; LAJOLO, F.M. Aplicaes das recomendaes
nutricionais adaptadas populao brasileira. Cadernos de Nutrio - SBAN, v. 2, p. 1-155, 1990.

181
Captulo 10- GUA e ELETRLITOS
Neuza Maria Brunoro Costa
Carla de Oliveira Barbosa Rosa
10.1. gua
A gua a substncia mais abundante nos sistemas vivos, contribuindo com 70% ou mais da massa da
maioria dos organismos. Os seus pontos de congelamento, ebulio e calor de vaporizao relativamente altos
so o resultado de atraes intermoleculares fortes na forma de pontes de hidrognio entre molculas de gua
adjacentes. A gua lquida tem considervel ordenamento de curta distncia e consiste de agregados de curta
durao, ligados por ponte de hidrognio. A polaridade e a capacidade de formar pontes de hidrognio fazem
dela um potente solvente para muitos compostos inicos e outras molculas polares.
A gua est mais prxima de ser um solvente universal que qualquer outro material. , todavia, mais
do que um solvente passivo, participando tambm ativamente de diversas funes que so essenciais para a
vida, como o fato de ser o principal fluido no qual nutrientes, gases e enzimas so dissolvidos; de a gua
extracelular que circula as clulas servir como meio de transporte de nutrientes e de oxignio para as clulas e
para remover resduos das clulas; e de a gua intracelular possibilitar um meio fsico-qumico que permite que
vrios processos metablicos se realizem. Alm disso, o volume do fluido intracelular promove um turgor para
os tecidos, importante para sua estrutura e do organismo. Outro papel importante da gua a regulao da
temperatura corporal, o que alcanado pela remoo do excesso de calor do corpo pela gua que evaporada
na pele, ou seja, as propriedades fsicas e qumicas da gua so de importncia central para a estrutura e funo
biolgicas.
A quantidade de gua nos diversos tecidos varia, como pode ser visualizado na Tabela 1.

Tabela 10.1 Porcentagem de gua em diversos tecidos


Tecidos Porcentagem de gua
Sangue 83
Rim 83
Msculo 76
Crebro 75
Fgado 68
Osso 22
Tecido adiposo 10

medida que se envelhece, ocorrem alteraes na proporo e quantidade de gua no organismo. Ao


nascer, cerca de dois teros de gua esto no meio extracelular, enquanto no adulto sucede o contrrio (Tabela
2). As crianas possuem relativamente mais gua corprea do que os adultos, e o recm-nascido pode ter mais
gua ainda. As crianas, comparativamente aos adultos, possuem maior superfcie corprea, so at duas vezes
mais ativas metabolicamente, apresentam maior rapidez na produo de calor e desenvolvem perdas
insensveis duas vezes mais intensas. O adulto possui relativamente maior quantidade de tecido sseo e
colgeno que consomem menos oxignio, em conseqncia do seu metabolismo mais lento do que o das
crianas. A menor produo de calor repercute tambm sobre a perspirao insensvel, tornando-a menos
intensa. A menor perda de gua torna a dinmica de entradas e sadas de lquidos no adulto bastante reduzida,
comparativamente das crianas. Nos jovens, o metabolismo energtico mais intenso requer mais gua para
eliminar os resduos hidrossolveis para o exterior, por intermdio do rim.

Tabela 10.2 Proporo dos lquidos intracelular (LIC), intersticial (LIT) e intravascular (LIV), em relao ao
peso corpreo, em funo da faixa etria
Idade LIC (%) LIT (%) LIV (%)
Recm-nascido 25 45 5
Criana de 1 ano 30-35 30 5
Adulto 40-45 15 25
Idoso 25 10 15

10.1.1. Composio Corporal


A gua o maior constituinte do corpo. O contedo de gua varia com o sexo, idade, adiposidade do
indivduo e atividade fsica.
No recm-nascido, o teor de gua de cerca de 75% do peso corporal, decrescendo progressivamente
para cerca de 60% no adulto jovem e continuando a decrescer em progresso para cerca de 50% por volta dos

182
50 anos de idade. O dbito urinrio mnimo de um adulto de 70 kg de 500 mL, e o de uma criana de 7 kg
de 100 mL. O volume urinrio de uma criana o dobro relativamente ao esperado para o adulto. O organismo
da criana , portanto, mais vulnervel s variaes da gua e, por isso, mais suscetvel s circunstncias que
levam desidratao, como diarria, vmitos ou privao da ingesto de lquidos. Como a perspirao
insensvel determinada pela superfcie corprea e a criana portadora de maior rea corporal relativa do que
do adulto, ela se torna naturalmente mais vulnervel perda de gua tambm por esse mecanismo. Os bebs
tambm possuem maior necessidade de gua por causa da limitada capacidade dos seus rins em lidar com a
carga renal do soluto.
Os idosos possuem menor quantidade de gua do que os jovens. Chegam a ter de 40 a 50% de gua
em seu peso corpreo. Os idosos tendem a perder para o exterior solues isotnicas; alm disso, ingerem
menor quantidade de lquidos. Essa situao exige ajustamentos finos que so naturalmente perdidos com o
envelhecimento.
A gua total no organismo maior em atletas do que em no-atletas, pois a quantidade de gua varia
entre os indivduos, dependendo da proporo de msculo para o tecido adiposo.
Em qualquer idade, a produo do calor e a velocidade do metabolismo so os principais
determinantes do metabolismo da gua. As circunstncias que os aumentam so capazes de provocar
desidratao, a menos que haja ingesto adequada e simultnea de lquidos. Cerca de 20% do total de calor
produzido em 24 horas deve ser dissipado na forma de perspirao insensvel. Cada grama de perspirao
insensvel absorve 0,58 caloria.
Mulheres tm menor contedo de gua do que os homens de mesma idade, e obesos tm menor
contedo de gua do que indivduos magros de mesmo sexo e idade. Essas variaes so atribudas s
diferentes propores de tecido adiposo em relao ao tecido magro (livre de gordura). Clulas gordurosas tm
cerca de 10% de gua, enquanto tecido muscular pode conter cerca de 70% de gua. Portanto, o teor de gua
do organismo varia inversamente ao teor de lipdios do corpo.
O obeso pode chegar a ter 25 a 30% de seu peso corpreo em gua. O equilbrio hdrico no obeso ,
assim, menos estvel do que os magros. A quantidade de gua de reserva maior, e sua disponibilidade para
eventuais necessidades tambm, suprindo mais facilmente suas perdas do que ocorre entre os obesos. Portanto,
o teor de gua do organismo inversamente proporcional ao teor de lipdios do corpo.

10.1.2. Distribuio de gua no Corpo


A gua distribui-se no organismo humano em dois compartimentos: intra (LIC) e extracelular (LEC).
A gua intracelular corresponde a dois teros do total de gua do organismo e a gua extracelular, um tero.
Esta gua compreende o fluido intersticial, plasma, linfa e fluidos transcelulares (fluidos do lmen do trato
gastrointestinal, fluido cerebroespinal, fluidos dos espaos intraocular, pleural, periotoneal e sinuvial). Um
acmulo anormal de lquidos nos espaos intercelulares dos tecidos ou cavidades corpreas chamado de
edema. Os lquidos transcelulares constituem cerca de 2% do total de lquidos corporais e esto em constante
movimento de um compartimento para o outro. Os lquidos intersticiais (LIT) detm 13,5% da gua corprea,
enquanto o plasma, 4,5%. O ser humano possui de 70 a 80 mL/kg de peso de sangue, sendo de 1.300 a 1.800
mL/m2 de plasma. O LIT propicia o ambiente onde se fazem as trocas entre o sangue e as clulas. A linfa faz
parte do LIT e, junto com o tecido linfide, representa cerca de 18% do peso corpreo.

10.1.3. Balano de gua


As solues hdricas so ingeridas intermitentemente e perdidas contnua e variavelmente. Para que
um indivduo mantenha o balano de gua, a quantidade consumida deve se igualar eliminada pelo
organismo.
A gua normalmente encontrada nos alimentos e a produzida por oxidao (gua metablica) so
inadequadas para suprir a perda de gua pelo trato respiratrio, pele, trato gastrointestinal e rins. Portanto, o
indivduo requer ingesto de gua livre para manter o balano de gua. Caso contrrio, haver desidratao ou
hiper-hidratao. A manuteno do equilbrio dinmico de gua e eletrlitos depende da rede de afetores que
so especialmente preparados para perceberem alteraes na presso hidrosttica, distenso, osmolaridade e
fluxo sangneo vasculares. Muitos fatores fisiolgicos, hormonais e neurais regulam os movimentos da gua e
dos solutos no organismo.
A gua ingerida rapidamente absorvida em decorrncia de diferena da presso osmtica entre o
plasma e o contedo intestinal em aproximadamente 20 minutos. A sensao de sede abolida s pelo contato
da gua com a mucosa oral. Esse contato, mesmo sem absoro de gua, permite a saciao da sede por cinco
minutos.
O balano normal de gua muito importante para o metabolismo humano, pois a diminuio entre 4
e 5% da gua corprea reduz de 20 a 30% a capacidade de trabalho de rgos e sistemas.

183
10.1.4. Perda de gua
A gua perdida por quatro vias principais: trato respiratrio, pele, trato gastrointestinal e rins. As
perdas pelos rins so as mais importantes, visto que a excreo renal de gua regulada para manter constante
a osmolaridade dos fluidos orgnicos.

a) Trato respiratrio e pele


Perda insensvel
A gua constantemente perdida pela evaporao no trato respiratrio durante a respirao e pela
evaporao passiva na pele. Essas perdas so chamadas de perdas insensveis ou perspirao insensvel,
porque ocorrem sem que sejam notadas. A gua que o indivduo hgido perde pelos pulmes e pele varia
pouco, mas os rins tm grande capacidade de adaptao, excretando maior ou menor quantidade de urina.
A perda de lquidos pela perspirao pode ser infuenciada pela temperatura e pela umidade do
ambiente e pelo metabolismo corpreo. As perdas respiratrias aumentam em climas frios e secos, quando a
presso de vapor atmosfrico decresce. A gua perdida em grande quantidade quando a temperatura
ambiente igual ou superior a 32 C. As perdas variam de 0,14 a 0,47 L por dia e dependem do tamanho
corporal, da atividade fsica e da temperatura e umidade do ambiente.
A perda insensvel pela pele, que independe do suor, varia de 0,3 a 0,5 L por dia em um indivduo na
temperatura ambiente e em atividade fsica mnima. Portanto, as perdas insensveis pelo trato respiratrio e
pela pele variam de 0,4 a 0,9 L por dia, as quais aumentam com a febre e em indivduos obesos, que tm maior
perda de calor e, conseqentemente, maior vapor de gua sendo perdido. O calor utiliza a circulao sangnea
e o plexo vascular da pele para atingir o exterior. A perda de calor ser maior quanto mais rpido for o fluxo
sangneo pelos vasos dilatados da superfcie cutnea. A perda calrica ser tambm mais intensa se a
temperatura ambiente for inferior corprea.
A perda de calor tambm feita pela expirao. O gs expirado umidificado pelo vapor de gua, o
que consome energia, que levada ao exterior. Dessa maneira, o organismo reduz o calor de seu meio interno.

Suor
O excesso de calor do corpo dissipado na forma de vapores de gua. O volume de gua eliminado
pelo suor altamente varivel, dependendo da temperatura ambiente e da atividade fsica do indivduo. Para
cada grama de gua evaporada na pele, cerca de 0,58 kcal de calor perdida do corpo.
Normalmente, o volume de gua perdido no suor de um indivduo adulto de 65 kg, exercendo
atividade fsica leve em um ambiente de temperatura em torno de 29 C, de 2 a 3 L por dia, mas pode
aumentar para 2 a 4 L por hora se o indivduo estiver exercendo uma atividade fsica pesada em um ambiente
quente e mido. Para cada grau de temperatura acima de 37 C, durante 24 horas, perdem-se mais 150 a 300
mL.

A perda de vrios litros de gua no suor por dia em climas quentes resulta na perda tambm de sdio e
de cloro, alm da gua, que precisam ser repostos.

b) Trato gastrointestinal
O volume de gua perdido nas fezes pequeno, em torno de 0,1 L por dia, e no causa problemas no
balano hdrico, a no ser que perdas excessivas ocorram devido diarria.
O volume de lquidos ingeridos por dia varia com os indivduos, mas em mdia est em torno de 1,7
L. Adicionalmente, so secretados saliva, sucos gstrico, biliar, pancretico e entrico, que somam 7 L por dia.
Normalmente, o intestino delgado absorve a maioria desses lquidos, cerca de 8,3 L, e o clon outros 0,3 L,
resultando numa excreo de 0,1 L de gua nas fezes por dia. Devido a esse volume de lquido reabsorvido ser
de aproximadamente o dobro do plasma sangneo, perdas excessivas de lquido devido diarria podem ter
srias conseqncias, particularmente para as crianas e para os idosos. Outras perdas anormais ocorrem
devido a vmito, hemorragia, drenagem de fstula, exsudato de queimadura e ferimentos ou por drenagem por
sonda cirrgica ou nasogstrica.

c) Rins
O volume mnimo de urina que um indivduo deve produzir por dia, em condies normais de
funcionamento renal, de 0,64 L.
A capacidade renal de ajustar o volume de urina muito grande. O organismo no consegue,
entretanto, eliminar gua pura, nem urina com concentrao de solutos superior a 1 g para 15 mL de gua. O
metabolismo de 70 g de protena resulta na produo de cerca de 21 g de uria, que deve ser excretada na
urina, e contribui com 350 mOsm. Se a ingesto de cloreto de sdio for de 320 mOsm e de potssio 100
mOsm, um total de 770 mOsm de substncias osmoticamente ativas dever ser excretado pelos rins por dia.
Como o rim pode concentrar urina at o mximo de 1.200 mOsm/L, o volume mnimo de urina nesse caso ser
de 0,64 L por dia.

184
A densidade urinria um bom ndice para avaliar a capacidade renal de concentrar a urina. Sua faixa
normal varia de 1,010 a 1,030, entretanto influenciada pela ingesto de lquidos.
Quando o consumo de gua insuficiente ou a perda de gua excessiva, os rins compensam
conservando gua e excretando uma urina mais concentrada. Os tbulos renais aumentam a reabsoro de gua
em resposta ao hormonal do hormnio antidiurtico (ADH). Durante a desidratao, a densidade urinria
aumenta alm dos limites normais.

10.1.5. Ingesto de gua


A quantidade mnima de gua requerida para repor as perdas pelas diversas vias de 1,44 L por dia.
A gua consumida vem das bebidas, gua dos alimentos e a produzida por oxidao dos carboidratos,
lipdios e protenas (0,6 g, 1,0 g e 0,4 g de gua por g, respectivamente). Um indivduo adulto de 65 kg
consumindo 400 g de carboidratos, 100 g de lipdios e 70 g de protenas ir produzir 370 g de gua.
O consumo de gua dos alimentos cerca de 850 g (60% do peso dos alimentos, em mdia), somando
1,22 L de gua por dia (alimentos mais gua metablica). Para manter o balano de gua, o indivduo dever
ingerir no mnimo outros 0,22 L de gua. O excesso de gua ingerida eliminado pela urina.
Uma quota razovel de ingesto de gua de 1 mL/kcal para adultos e de 1,5 mL/kcal para crianas
(RDA, 1989). Em situaes de atividade fsica severa, trabalho pesado, climas quentes, febre, vmito, diarria
e diabetes, a necessidade de gua aumentada. Para 1 C de elevao da temperatura corprea, aumenta-se a
necessidade de ingesto diria de gua, em mdia, de pelo menos mais 15% do seu suprimento habitual. Nas
alteraes da freqncia respiratria, tambm h maior eliminao de gua, por isso a cada cinco incurses
alm de 20 irp/min, durante 24 horas, necessita-se de mais 100 a 200 mL de gua por dia.
As recomendaes nutricionais de gua, segundo o Instituto de Medicina (IOM, 2004), esto
mostradas na Tabela 3. A ingesto adequada (AI) foi estabelecida para gua total, que inclui a gua pura, assim
como a umidade presente nos alimentos slidos e lquidos. No foi possvel estabelecer EAR e RDA para
gua, uma vez que a osmolaridade do soro, que um indicador do estado de hidratao de um indivduo, pode
ser mantida em um nvel constante sob uma ampla faixa de consumo de gua. Assim, o IOM definiu a AI
baseado no consumo de gua da populao americana.
O consumo excessivo de gua pode levar hiponatremia, quando acompanhado de baixa reposio de
sdio durante ou aps a prolongada atividade fsica. No h evidncias, entretanto, de que o consumo habitual
de gua possa resultar em efeitos adversos para indivduos saudveis. Assim, considerando a habilidade de
auto-regulao do consumo de gua em indivduos saudveis sob diversas temperaturas climticas, o nvel de
ingesto mxima tolervel (UL) para gua no foi estabelecido.

Tabela 10.3- Recomendaes Nutricionais (IDR) para gua, segundo o Institue of Medicine (IOM, 2004)
AI Ingesto Adequada
gua (L/ dia)
Grupo Homens Mulheres
Alimentos Bebidas Total Alimentos Bebidas Total
0 a 6 meses 0 0,7 0,7 0 0,7 0,7
7 a 12 meses 0,2 0,6 0,8 0,2 0,6 0,8
1 a 3 anos 0,4 0,9 1,3 0,4 0,9 1,3
4 a 8 anos 0,5 1,2 1,7 0,5 1,2 1,7
9 a 13 anos 0,6 1,8 2,4 0,5 1,6 2,1
14 a 18 anos 0,7 2,6 3,3 0,5 1,8 2,3
19 a 50 anos 0,7 3,0 3,7 0,5 2,2 2,7
51 a 70 anos 0,7 3,0 3,7 0,5 2,2 2,7
> 70 anos 0,7 3,0 3,7 0,5 2,2 2,7
Gestao - - - 0,7 2,3 3,0
14 a 50 anos
Lactao - - - 0,7 3,1 3,8
14 a 50 anos

10.1.6. Regulao do Balano de gua


O organismo no possui dispositivo para armazenamento de gua; portanto, a quantidade perdida a
cada 24 horas deve ser restituda para manter a sade e a eficincia do organismo.
Alteraes no balano de gua levam a mudanas na osmolaridade do plasma, enquanto alteraes no
balano de sdio levam a mudanas no volume dos fluidos corporais.
Para que um indivduo mantenha constante a osmolaridade dos seus fluidos corporais em 290
mOsm/L, a relao entre cloreto de sdio e gua tem que ser regulada dentro de limites estreitos.

185
O excesso de gua resulta na excreo de urina diluda, enquanto o dficit de gua resulta na excreo
de urina concentrada. Essa habilidade de excretar urina diluda ou concentrada depende dos nveis circulantes
do hormnio antidiurtico (ADH).
O balano de gua pode ser resumido, conforme ilustrado na Figura 10.1.

Excesso de perda de gua

Balano de gua negativo


Sensao de sede

Osmolaridade do plasma

Consumo de gua
Osmorreceptores

Secreo de ADH

Nvel plasmtico de ADH

Reabsoro de gua

Excreo de gua

Figura 10.1- Balano de gua: a perda excessiva de gua promove a secreo do hormnio antidiurtico e a
sensao de sede. Em conseqncia, a excreo de urina reduzida e o consumo de gua
aumentado.

10.1.7. Perturbaes do Metabolismo da gua


A desidratao leva secura da mucosa, da lngua e da gengiva; ausncia de sudorese, confuso
mental e depresso, podendo chegar ao coma. Pode ser causada pelo aumento das perdas de gua pela
sudorese, presena de vmito e diarria; ingesto excessiva de sal e de protena sem aumento na ingesto de
gua; diabetes; e ingesto reduzida (idosos).
A reduo no volume urinrio, em decorrncia da insuficincia renal aguda, leva formao de
edema e ao conseqente aumento da presso sangnea, podendo chegar insuficincia cardaca.

10.1.8. gua nos Alimentos


Cada alimento tem uma proporo de gua ou umidade (Tabela 4). Esta gua forma uma
monocamada que se fixa aos grupos polares, como os grupos NH3+ e COO- das protenas, e ao OH- dos amidos
e acares. Quando existe um grau de saturao desses grupos, a gua que eventualmente fica sem unir-se a

186
eles recebe o nome de gua livre. Como elemento fundamental para veicular reaes qumicas, pela grande
capacidade que lhe oferece o fato de ser uma substncia bipolar, essa gua livre permite que os alimentos se
deteriorem por ao de suas prprias enzimas. Isso altera a defesa natural que os alimentos tm contra as
bactrias e os mofos.
A existncia de gua livre pode ser modificada em sua ao sobre os germes pelo pH e tambm pela
existncia ou no do oxignio, segundo o tipo de microrganismo e as substncias antibacterianas que ela possa
conter.

Tabela 10.4 - Teor de gua de alguns alimentos


Alimento gua (g/100g)
Couve 96
Alface 96
Rabanete 95
Repolho cru 93
Melancia 92
Brcolis, beterraba 91
Leite 88
Cenoura 87
Laranja 87
Cereais cozidos 85
Ma 84
Peixe assado 78
Batata cozida 77
Ovos 75
Banana 74
Milho 70
Carne bovina 59
Queijo suo 42
Po branco 37
Manteiga 16
Biscoito de gua e sal 4
Acar branco 1
leos 0
Fonte: Mahan e Escott-Stump, 2005.

10.2. Sdio, Cloro e Potssio


Os ons sdio (Na+), cloro (Cl-) e potssio (K+) so amplamente distribudos no organismo e so os
principais eletrlitos dos fluidos corporais. A concentrao desses ons nos fluidos corporais muito bem
controlada. Esses eletrlitos so encontrados principalmente na forma de ons hidratados, que se ligam
fracamente a molculas orgnicas. Eles atuam na manuteno dos balanos eletroltico e osmtico.
O sdio e o cloro esto presentes principalmente no compartimento extracelular e o potssio, no
compartimento intracelular. As concentraes extracelulares de sdio e cloro so de 145 e 110 mmol/L,
enquanto no meio intracelular se encontram cerca de 12 e 2 mmol/L, respectivamente. A concentrao de
potssio de 150 mmol/L dentro da clula e de 4 a 5 mmol/L no meio extracelular.
A diferena na distribuio desses eletrlitos nos compartimentos devida especialmente bomba
de Na+, K+- ATPase e permeabilidade da membrana celular. A clula gasta grande quantidade de energia
para manter esse gradiente eletroltico, podendo corresponder 20 a 40% da energia de repouso de um adulto. O
gradiente eletroqumico ao longo da membrana celular, mantido pela Na+, K+- ATPase, importante para o
funcionamento normal das clulas nervosas e musculares e para o transporte secundrio de nutrientes, como a
glicose e os aminocidos.
A permeabilidade seletiva da membrana celular previne o movimento de protenas, fosfato, sulfato
e magnsio para fora da clula. Como a clula normalmente mantm altas concentraes desses nions, a alta
concentrao de K+ e Mg+2 no meio intracelular serve para neutralizar o excesso de carga negativa. A sada de
Na+, Cl- e K+ atravs da membrana celular pode ocorrer por difuso passiva, a favor de um gradiente de
concentrao por canais inicos ou, ento, por transporte ativo, contra um gradiente de concentrao, com
gasto de energia na forma de ATP, por meio da bomba Na+, K+- ATPase.
A ligao de Na+ e ATP intracelular ativa a enzima ATPase, que sofre alterao conformacional,
eliminando o Na+ para o meio extracelular e permitindo, ao mesmo tempo, que o K+ extracelular entre na
clula, restabelecendo a conformao da enzima. O gradiente eletroqumico atravs da membrana, mantido
pela Na+,K+-ATPase, importante para o funcionamento normal das clulas nervosas e musculares, para o
transporte de nutrientes, como glicose e aminocidos, e para o processo de secreo de K+ nos rins e no clon.

187
Algumas protenas carreadoras presentes na membrana do lmen intestinal, como a SGLT1
(protena transportadora de sdio e glicose), e diversas protenas transportadoras de aminocidos contm stios
de ligao tanto para o sdio quanto para aminocidos ou monossacardeos (glicose e galactose). A entrada de
Na+ na clula, a favor de um gradiente de concentrao, carreia esses nutrientes para o interior do entercito.
Os nutrientes aumentam, ento, a sua concentrao intracelular, formando um gradiente favorvel sua
difuso pela membrana basolateral, usualmente atravs de outro transportador. O Na+ expulso do entercito
pela bomba Na+,K+-ATPase, contra um gradiente de concentrao, com gasto de energia.

10.2.1. Potencial de Membrana


Todas as clulas do corpo apresentam diferena de potencial na sua membrana, em condies de
repouso, com o interior carregado negativamente, em relao ao meio extracelular. Como o Na+ e o K+ so
ons presentes em maior concentrao, eles desempenham importante papel na gerao do potencial de
membrana. O fluxo passivo de K+ para o meio externo maior do que o influxo de Na+ pelo canal
Na+,K+.Como a membrana impermevel para a maioria dos nions, a sada de K+ da clula gera um estado
polarizado da membrana, com o interior carregado negativamente em relao ao exterior.
A despolarizao da membrana devida ao influxo de Na+, enquanto a repolarizao, ao efluxo de
K . Em situao de hipercalemia, quando a concentrao de K+ plasmtico excede 5,5 mmol/L, a membrana
+

despolariza, causando fraqueza muscular, paralisia facial e arritmia cardaca. Em situao de hipocalemia,
quando a concentrao de K+ plasmtico se encontra abaixo de 3,5 mmol/L, a membrana hiperpolariza,
interferindo no funcionamento das clulas nervosas e musculares. Portanto, importante a manuteno de K+
dentro de limites estreitos no plasma.
A concentrao de Ca+2 tambm afeta a excitabilidade das clulas nervosas e musculares e
desempenha papel importante na excitabilidade das clulas musculares lisa e cardaca.

10.2.2. Volume do Fluido Extracelular


O volume do fluido extracelular (intersticial e plasmtico) determinado primariamente pelo total de
partculas osmticas presentes. Como o Na+ o principal determinante da osmolaridade extracelular, o
distrbio no balano de Na+ ir alterar o volume do compartimento extracelular.
O aumento na concentrao de Na+dada pela infuso de uma soluo de NaCl hipertnica na
circulao aumenta a osmolaridade vascular e intersticial. Os osmorreceptores presentes no hipotlamo so
estimulados pelo aumento da osmolaridade, ativando o mecanismo da sede e, ao mesmo tempo, liberando o
hormnio antidiurtico (ADH). Isso leva menor eliminao de gua na urina, restabelecendo a osmolaridade
e aumentando o volume do fluido extracelular. No entanto, uma reduo na osmolaridade do fluido
extracelular, em decorrncia da perda de NaCl, aumenta a excreo de gua pelos rins. Isso ir restaurar a
osmolaridade do fluido extracelular, diminuindo o seu volume.
Os eletrlitos desempenham outras funes importantes, como interaes com macromolculas
inicas (cidos nuclicos, protenas, polissacardeos) e ativao de enzimas, como Na+, K+- ATPase (Na+ e
K+), enzima conversora de angiotensina (Cl-) e piruvato quinase (K+).

10.2.3. Balano de Na+, Cl- e K+


Um homem adulto de 70 kg contm cerca de 100 g de Na+, 95 g de Cl- e 140 g de K+. Para manter o
contedo estvel desses elementos no plasma e nos tecidos, a quantidade consumida deve corresponder s
perdas corporais. Na criana, deve-se ainda considerar um acrscimo para a formao de tecidos.
Os rins so o principal rgo regulador do balano eletroltico e o intestino desempenha papel
secundrio. Quando o consumo desses eletrlitos na dieta baixo, os rins respondem, reduzindo sua excreo.
Entretanto, o consumo excessivo leva ao aumento da excreo renal.
Esses eletrlitos so filtrados livremente na membrana glomerular dos nfrons, de forma que a sua
concentrao no filtrado glomerular semelhante do plasma. medida que o filtrado flui ao longo dos
tbulos renais, aproximadamente 95 a 97,5% dos eletrlitos e da gua so reabsorvidos. O porcentual restante
(2,5 a 5%) depender das necessidades do indivduo e do seu consumo na dieta.

10.2.4. Sistema Renina-Angiotensina-Aldosterona


A liberao de renina das arterolas aferentes aumentada quando o volume plasmtico est
diminudo, em virtude do dficit de Na+. A renina promove a liberao da angiotensina, que ser clivada para a
sua forma ativa de angiotensina II. Esta, por sua vez, estimula a reabsoro de Na+ e a secreo de K+. Quando
o consumo de K+ elevado, ocorre a elevao da sua concentrao plasmtica e a conseqente secreo de
aldosterona, o que promove sua maior excreo pelos rins.

188
Dficit de sal

Volume plasmtico
Presso sangunea

Atividade simptica filtrao gromerular


Carga de Na+ para a
clula densa da mcula

Secreo de renina

Angiotensina II plasmtica Secreo de
ADH

Secreo de aldosterona

Reabsoro de Na+ Reabsoro de
gua

Excreo de Na+ Excreo de
gua

Figura 10.2 Representao esquemtica do controle renal da excreo de sdio e gua, em situao de dficit
de sal.

10.2.5. Desbalano de Na+ e Cl-


Em geral, a reteno de Na+ resulta na reteno proporcional de gua, e a perda de Na+ resulta numa
proporcional perda de gua, devido osmorregulao envolvendo o hormnio ADH.
Hipernatremia: A reteno de Na+ ocorre quando a sua ingesto excede a capacidade excretria renal.
Essa situao pode ser decorrente da ingesto rpida de uma alta quantidade de sal. A hipernatremia e a
hipervolemia (edema) resultam em hipertenso. Situaes patolgicas, como a falha renal, tambm podem
levar a essa condio.
Hiponatremia: Hiponatremia e hipovolemia podem ocorrer devido ao aumento da perda urinria de
Na+ ou a perdas por outras vias. A administrao de diurticos, diabetes mellitus, doena renal crnica,
nefropatias e deficincia de aldosterona resultam na reduo da reabsoro de Na+ e em conseqente aumento
da sua perda renal. A hiponatremia pode ser decorrente, ainda, de perdas gastrointestinais, devido a vmito e
diarria, que comumente levam desidratao e mortalidade infantil. O tratamento da diarria severa deve
priorizar a reposio de gua e de Na+ para restaurar o volume circulatrio. A hiponatremia leva hipotenso,
fraqueza muscular e cimbra.

10.2.6. Desbalano de K+
Hipercalemia: A hipercalemia raramente ocorre quando os rins funcionam normalmente. A
capacidade de excreo renal de K+ pode ser reduzida por um defeito no processo secretrio dos nfrons
distais, pela falta de secreo de aldosterona ou pela falta de resposta dos tbulos renais aldosterona. A
hipercalemia tambm pode ocorrer na acidose metablica e em danos teciduais, como hemlise, queimadura,
trauma e lise de clulas tumorais, que resultam na liberao de K+ intracelular para o plasma. Uma importante
manifestao clnica da hipercalemia a arritmia cardaca, que pode levar fibrilao ventricular. Outros
sintomas incluem parestesia, fraqueza muscular e paralisia.
Hipocalemia: A hipocalemia pode ocorrer devido depleo de K+ do organismo ou passagem de
K para o meio intracelular, decorrente da alcalose e hiperinsulinemia. A depleo de K+ raramente devida
+

sua baixa ingesto, uma vez que a quantidade usualmente consumida excede as perdas obrigatrias e a
necessidade para manuteno tecidual. A depleo pela dieta ocorre somente durante jejum prolongado ou
severas restries alimentares. A depleo pode ocorrer pela via renal, em situao de desordem endcrina e
metablica, como hiperaldosteromia, alcalose metablcia e terapia diurtica.
Perdas gastrointestinais devidas a vmito e diarria tambm levam hipocalemia. O aumento da
aldosterona para manter os nveis de Na+ e a volemia exacerba a perda de K+. A hipocalemia leva depresso
da funo neuromuscular, como fraqueza muscular e cimbra. Em situaes mais severas, leva arritmia
cardaca, paralisia e alcalose metablica.

189
10.2.7. Recomendaes Nutricionais de Na+ e Cl-
A ingesto adequada (AI) para o Na+ foi estabelecida para adultos jovens em 1,5 g (65 mmol/L) e
-
para Cl em 2,3 g (65 mmol/L), que corresponde a 3,8 g de NaCl por dia (Tabela 5). Esses valores de AI no se
aplicam a indivduos com grandes perdas de Na+ no suor, como ocorre com atletas de competio e
trabalhadores expostos ao estresse trmico.
O principal efeito adverso do consumo elevado de sal (NaCl) na dieta o aumento da presso
sangnea, que o principal fator de risco para doenas cardiovasculares-renais. A hipertenso em resposta ao
consumo de sal parece ser maior em indivduos hipertensos, diabticos, com doena renal crnica, idosos e
negros. Fatores genticos tambm influenciam a presso sangnea em resposta ao NaCl.
Embora diversos fatores afetem a dose-resposta ao NaCl, o nvel de ingesto mxima tolervel (UL)
de Na+ foi estabelecido em 2,3 g (100 mmol/L), equivalente a 5,8 g de NaCl por dia para adultos (Tabela 5). A
UL correspondente para Cl- de 3,5 g por dia. Para indivduos com maior sensibilidade ao Na+, os valores de
UL devero ser bem menores e para indivduos no adaptados atividade fsica em ambientes quentes, suas
necessidades podem exceder as ULs, devido sua maior perda de Na+ no suor.

10.2.8. Recomendaes Nutricionais de K+


O K+ em alimentos naturais, como frutas, hortalias e leguminosas, encontra-se geralmente ligado a
nions orgnicos, que sero convertidos em bicarbonato no organismo. Em situao de deficincia de K+, a
capacidade tamponante do bicarbonato estar reduzida, o que leva maior excreo urinria de Ca++,
desmineralizao ssea e formao de clculo renal de clcio. Portanto, os efeitos adversos do consumo
inadequado de K+ pode resultar da deficincia de K+ per se, do seu nion conjugado, ou de ambos. Em
produtos processados ou suplementos, o nion conjugado com o K+ o cloreto, que no tem efeito-tampo.
A necessidade mdia estimada (EAR) no pode ser estabelecida para o K+, pois no h evidncias
experimentais de doses que poderiam levar sua deficincia. Assim, a ingesto adequada (AI) foi estabelecida
em 4,7 g (120 mmol/L) por dia para adultos (Tabela 5). H evidncias de que esse consumo poderia reduzir a
presso sangnea, contrapondo os efeitos adversos do consumo de Na+ e Cl-, alm de reduzir o risco de
clculos renais e possivelmente a perda ssea. Esses efeitos benficos parecem estar associados apenas s
formas de K+ associadas aos precursores de bicarbonato, encontrados em alimentos naturais, como frutas e
vegetais.
Indivduos com insuficincia renal crnica, diabetes ou usurios de certos medicamentos devem
seguir as recomendaes de consumo de K+ apropriado para sua patologia, que poder ser bem abaixo da AI.
Indivduos com impedimento na excreo urinria de K+ decorrente de condies patolgicas, terapias
medicamentosas ou ambas podem apresentar quadro de hipercalemia. Em indivduos saudveis, entretanto,
no h relatos de hipercalemia resultante da ingesto aguda ou crnica de alimentos ricos em K+. Portanto, a
UL para K+ proveniente dos alimentos no foi estabelecida para indivduos saudveis. Entretanto, o consumo
excessivo de suplementos de K+ pode causar toxicidade mesmo em indivduos saudveis. Assim, a
suplementao de K+ deve ser fornecida somente sob a superviso mdica devido sua toxicidade.

Tabela 10.5- Recomendaes Nutricionais (IDR) para Potssio e Sdio, segundo o Institute of Medicine (IOM,
2004)
AI Ingesto Adequada UL Limite Mximo
Tolervel
Potssio Sdio Sdio
Grupo (g/dia) (g/dia) (g/dia)
Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres

0 a 6 meses 0,4 0,4 0,12 0,12 ND ND


7 a 12 meses 0,7 0,7 0,37 0,37 ND ND
1 a 3 anos 3,0 3,0 1,0 1,0 1,5 1,5
4 a 8 anos 3,8 3,8 1,2 1,2 1,9 1,9
9 a 13 anos 4,5 4,5 1,5 1,5 2,2 2,2
14 a 18 anos 4,7 4,7 1,5 1,5 2,3 2,3
19 a 50 anos 4,7 4,7 1,5 1,5 2,3 2,3
51 a 70 anos 4,7 4,7 1,3 1,3 2,3 2,3
> 70 anos 4,7 4,7 1,2 1,2 2,3 2,3
Gestao - 4,7 - 1,5 - 2,3
14 a 50 anos
Lactao - 5,1 - 1,5 - 2,3
14 a 50 anos

190
10.3. Referncias

IOM Institute of Medicine. Dietary reference intakes for water, potassium, sodium, chloride, and
sulfate. Washington, D.C.: National Academy Press, 2004. 617 p.

MAHAN, L.K., ESCOTT-STUMP, S. Krause - Alimentos, nutrio e dietoterapia. 11 ed. So Paulo: Roca,
2005. 1242 p.

NRC National Research Council. Recommended dietary allowances. 10th ed. Washington, D.C.: National
Academy Press, 1989. 284 p.

SHENG, H.P. Body fluids and water balance. In: STIPANUK, M.H. (Ed.) Biochemical and physiological
aspects of human nutrition. Philadelphia: W.B. Saunders Company, 2000. p. 843-865.

SHENG, H.P. Sodium, chloride, and potassium. In: STIPANUK, M.H. (Ed.) Biochemical and physiological
aspects of human nutrition. Philadelphia: W.B. Saunders Company, 2000. p. 686-710.

191
Captulo 11: ANTIOXIDANTES DA DIETA
Snia Machado Rocha Ribeiro
Maria Eliana Lopes Ribeiro de Queiroz
Maria do Carmo Gouveia Peluzio
Neuza Maria Brunoro Costa
Srgio Luiz Pinto da Matta
Jos Humberto de Queiroz
11.1. O Estresse Oxidativo

11.1.1. Terminologias
A compreenso dos mecanismos pelos quais os antioxidantes da dieta agem protegendo o organismo
contra alguns processos patolgicos envolve o conhecimento sobre os danos oxidativos causados pelos radicais
livres, aos quais as clulas aerbicas esto sujeitas.
Radical livre uma espcie qumica que tem eltrons desemparelhados e, por isso, instvel e
apresenta grande reatividade. Como exemplo, citam-se os radicais livres de oxignio e os radicais livres de
nitrognio que so formados no organismo humano. Outras espcies qumicas reativas podem-se formar a
partir dos radicais livres que, embora no tenham eltrons desemparelhados, apresentam instabilidade
estrutural que atribui a essas espcies reatividade similar dos radicais livres. Por essa razo, Espcies
Reativas de Oxignio (EROs) e Espcies Reativas de Nitrognio (ERNs) so utilizadas como termos
genricos para denominar as espcies reativas na forma de radical livre ou no-radical. Mais recentemente,
sugere-se uma proposta de se utilizar o termo Espcies Oxidativas Reativas para designar tanto EROs quanto
ERNs.

11.1.2. Produo Fisiolgica de Espcies Reativas de Oxignio e de Nitrognio


Os organismos aerbicos utilizam o oxignio como o aceptor final de eltrons no catabolismo
oxidativo, pois, em razo de sua avidez por eltrons, o processo de extrao de energia torna-se altamente
eficiente. Entretanto, em paralelo reduo completa do oxignio molecular, durante o processo oxidativo de
retirada de energia dos nutrientes ocorrem redues parciais do oxignio, de forma que os radicais livres so
gerados constantemente no curso normal do metabolismo celular. A formao fisiolgica de EROs tem
funes e vantagens para o meio biolgico. Considerando-se que so espcies reativas, estas so utilizadas
pelas clulas fagocticas para a defesa do organismo contra bactrias e vrus. Outra funo dos radicais livres
sinalizar eventos celulares importantes, os quais auxiliam a adaptao das clulas e dos tecidos aos estresses,
atravs dos processos de morte e de proliferao celular.
No apenas as espcies reativas de oxignio exercem funes fisiolgicas importantes. O xido
ntrico um radical livre de nitrognio, o qual formado no organismo atravs de vias enzimticas prprias e
apresenta importante funo no relaxamento dos vasos sangneos, evitando elevao persistente da presso
sangnea dentro deles. O xido ntrico pode reagir com as EROs e formar um produto radical livre, que o
peroxinitrito, prejudicial s clulas. Assim, apenas na ausncia do excesso de EROs o xido ntrico pode
exercer sua funo normal sem as conseqncias deletrias ao organismo.
Alm de EROs e ERNs, a detoxificao de xenobiticos (substncias qumicas estranhas ao meio
biolgico) no organismo pela via metablica do sistema citocromo P450 pode formar metablitos na forma de
radicais livres. Estes podem reagir com o oxignio molecular e formar radicais livres de oxignio.

11.1.3. Stios Fisiolgicos de Formao das Espcies Reativas de Oxignio


Os principais stios fisiolgicos de gerao de EROs no organismo humano so:
. Cadeia de transporte de eltrons na mitocndria.
. Metabolismo de cidos graxos no peroxissoma.
. Via metablica catalisada pelas enzimas Citocromo P450 nos microssomas.
. Via da NADPH oxidase nas clulas fagocticas.
. Via de sntese das prostaglandinas.
A cadeia de transporte de eltrons considerada o principal stio fisiolgico de gerao de EROs.
Estima-se que 2-4% do total de oxignio presente na clula resulta na formao de radicais livres.
Na Tabela 11.1 apresenta-se um resumo de informaes gerais sobre as principais Espcies Reativas
de Oxignio e Espcies Reativas de Nitrognio de importncia biolgica.

192
Tabela 11.1 - Caracterizao das principais Espcies Reativas de Oxignio e Espcies Reativas de Nitrognio
formadas in vivo

Intermedirio Comentrio

Radical superxido: O2 - Formado a partir da reduo parcial do oxignio molecular por 1 eltron
Perxido de hidrognio: H2O2 Formado a partir da reduo parcial do oxignio molecular por 2 eltrons

Radical hidroxil : OH Formado a partir da reduo do oxignio molecular, por 3 eltrons nas
reaes de Fenton e Haber-Weiss, catalisada por metais
Oxignio molecular Simpleto: Primeiro estado excitado do Oxignio Molecular com nvel de energia de
(1gO2) 22 kcal/moL acima do estado fundamental ou oxignio tripleto (3O 2)
xido ntrico: NO Formado a partir de arginina em reao catalisada
pela enzima xido ntrico sintase
Peroxinitrito : ONO2 Formado a partir da reao com o radical superxido

Fonte: Bergendi et al. (1999), Sies (1985) e Halliwell e Gutteridge (1990).

11.1.4. Mecanismos Antioxidantes de Proteo do Organismo Contra os Efeitos Deletrios das


Espcies Reativas de Oxignio
Como comentado anteriormente, as espcies reativas de oxignio apresentam funes fisiolgicas
especficas e importantes, mas, em razo de sua reatividade, devem permanecer dentro dos limites fisiolgicos.
Se h aumento delas em nveis suprafisiolgicos, h prejuzos ao organismo, pois as EROs podem reagir com
protenas, carboidratos, cidos nuclicos, xido ntrico e, conseqentemente, prejudicar o equilbrio das
clulas, alterando a funo dos tecidos.
Para evitar os danos oxidativos das EROs, o organismo dispe de mecanismos de defesa antioxidante,
os quais atuam intracelular e extracelularmente e mantm o equilbrio redox da clula, assegurando que o
aumento das EROs seja transitrio.
Existem dois mecanismos antioxidantes: o enzimtico e o no-enzimtico, os quais agem
cooperativamente para manter o equilbrio dos radicais livres no organismo.
Mecanismo antioxidante enzimtico: a primeira linha de defesa do organismo contra danos
oxidativos. O sistema constitudo por um conjunto de enzimas que catalisam reaes para a eliminao das
espcies reativas e para a recuperao de molculas biolgicas oxidadas. Dentre elas, citam-se: superxido
dismutase, glutationa peroxidase, glutationa redutase, catalase, tiorredoxinas, peroxirredoxinas e inmeras
outras redutases.
Mecanismo antioxidante no-enzimtico: constitudo por grande nmero de compostos de baixo
peso molecular, ingeridos pela dieta (nutrientes e no-nutrientes) ou sintetizados no organismo. Esses
compostos funcionam como redutores ou antioxidantes biolgicos e podem eliminar os radicais livres ou
alterar a expresso de genes, cujos produtos agem aumentando a defesa antioxidante celular. Antioxidante
biolgico definido como uma substncia que quando presente em baixas concentraes, em comparao
com a concentrao do substrato oxidvel, diminui significantemente ou impede a oxidao daquele
substrato.
Vrias substncias contidas nos alimentos podem apresentar a funo antioxidante no organismo
humano quando ingeridas e so denominadas antioxidantes da dieta.

11.1.5. Estresse Oxidativo Causado pelo Aumento das Espcies Reativas de Oxignio
Se h desequilbrio entre a formao de EROs e a atuao das defesas antioxidantes, em conseqncia
do aumento da produo de radicais livres ou da diminuio das defesas, instala-se o estresse oxidativo. Nessa
condio, ocorrem srias conseqncias para os tecidos, em decorrncia da oxidao de protenas, lipdios,
carboidratos e cidos nuclicos. Pode ocorrer ainda a alterao da expresso de genes, cujos produtos esto
envolvidos em mecanismos de morte ou de proliferao celular. Dessa forma, o estresse oxidativo causa
alteraes na estrutura e integridade funcional da clula e pode induzir respostas imunes, que culminam com
mecanismos inflamatrios crnicos ou ainda sinalizam uma resposta de proliferao celular fora do controle. O
estresse oxidativo est associado s doenas crnicas no-transmissveis, e a hiptese oxidativa tem sido uma
das mais atraentes dentro da medicina, nas ltimas dcadas, para explicar mecanismos de doenas.

193
11.2. Antioxidantes da Dieta

11.2.1. Definies
Antioxidante da dieta uma substncia presente no alimento que diminui os efeitos adversos de
espcies reativas de oxignio (ERO) e de nitrognio (ERN) sobre as funes fisiolgicas normais em
humanos. A definio de antioxidante da dieta na rea de Nutrio Humana considera os seguintes critrios:
i) a substncia encontrada na dieta humana; ii) o teor da substncia pode ser determinado em alimentos
comumente consumidos; e iii) a substncia diminui os efeitos adversos da ERO e ERN in vivo.

11.2.2. Substncias Antioxidantes Nutrientes e No-Nutrientes Presentes nos Alimentos


Diversos compostos naturais apresentam potencial para atuarem como antioxidantes biolgicos,
incluindo substncias presentes em alimentos de origem animal e vegetal, sem considerar os antioxidantes
adicionados, propositalmente, em alimentos industrializados. Entretanto, sob o aspecto do mecanismo
envolvido na funo antioxidante, h trs classes de compostos que contribuem para a proteo de
biomolculas contra os danos induzidos por estresses oxidativo e nitrativo in vivo:
- Antioxidantes preventivos, os quais suprimem a formao de radical livre;
- antioxidantes que eliminam os radicais livres, inibindo a sua reatividade; e
- antioxidantes envolvidos em processos de reparo.
Muitas molculas que apresentam caractersticas estruturais de um antioxidante podem induzir
respostas fisiolgicas ao agirem como pr-oxidante na clula e fazem que esta responda de maneira a
maximizar os seus mecanismos antioxidantes. Entretanto, esse um conceito novo e muito pouco explorado
ainda.
De maneira geral, a viso clssica sobre antioxidantes da dieta de que a capacidade para reciclar
molculas biolgicas oxidadas e eliminar fortes oxidantes do meio biolgico ou com eles reagir, reduzindo o
seu potencial de reatividade, atribui s substncias presentes no alimento a propriedade antioxidante.

11.2.3. Ao Sinergstica dos Antioxidantes


A ao de antioxidantes in vitro e in vivo apresenta o fenmeno do sinergismo, que pode ser definido
como a ao cooperativa entre as vrias substncias com propriedades antioxidantes para proteger um alvo da
oxidao.
O sinergismo ocorre por efeito co-antioxidante, que envolve mais de um antioxidante com potenciais
de reduo diferentes, os quais participam de reaes de oxirreduo, em um sistema que est sob condio
pr-oxidante at que se forme um produto no-reativo, estabilizando o meio. O efeito sinrgico resulta na
recuperao das molculas antioxidantes e na formao de um produto estvel, e esse parece ser o princpio da
proteo do organismo por molculas antioxidantes endgenas e exgenas. O efeito pr-oxidante, observado
em alguns estudos quando se utiliza um nico antioxidante, pode ser a conseqncia da impossibilidade de
efeitos co-antioxidantes ou sinrgicos, por causa da desproporo entre as concentraes de molculas
antioxidantes.

11.2.4. Substncias Antioxidantes Presentes na Dieta


Alm dos nutrientes antioxidantes (ascorbato, tocoferol, -caroteno e alguns minerais), numerosos
outros antioxidantes no essenciais so consumidos diria e freqentemente, em concentraes que excedem
os nutrientes antioxidantes. So exemplos de substncias antioxidantes no-nutrientes: compostos fenlicos de
plantas (incluindo fenis simples, cidos fenlicos, derivados do cido hidroxicinmico e os flavonides) e
compostos presentes em alimentos de origem animal: cido linolico conjugado, carnosina, anserina,
pirroloquinolina quinona, etc. Muitos outros compostos naturais presentes nos alimentos sero identificados
como molculas com potencial antioxidante no organismo humano.
Esta abordagem enfoca aspectos relevantes relacionados funo antioxidante das molculas de
ascorbato, tocoferis, carotenides e compostos fenlicos. Antioxidantes presentes em alimentos de origem
animal no foram objetivos deste captulo.

Ascorbato
O ascorbato, ou vitamina C, um potente antioxidante hidrossolvel, porque a molcula pode doar
um tomo de hidrognio e formar um radical livre ascorbil, relativamente estvel, com meia-vida de
aproximadamente 10-5 segundos. O radical ascorbil pode ser reduzido a ascorbato ou se oxidar, formando
desidroascorbato.
O efeito antioxidante do ascorbato est relacionado com a sua capacidade para eliminar as Espcies
Reativas de Oxignio (EROs), podendo reagir com o radical superxido, o perxido de hidrognio, o radical
hidroxil e o oxignio simpleto. Tambm elimina Espcies Reativas de Nitrognio (ERNs), prevenindo a
nitrao de molculas. Acredita-se que o ascorbato participa da regenerao de tocoferol, e isso explica o
sinergismo do efeito antioxidante dos dois nutrientes (Figura 11.1). considerado um antioxidante protetor de

194
compartimentos solveis da clula, mas auxilia a manuteno de tocoferol no estado reduzido, sendo, portanto,
considerado um nutriente economizador de vitamina E.
Ao participar de reaes como agente redutor, o ascorbato oxida-se, formando desidroascorbato, que
pode ser regenerado por sistemas enzimticos que utilizam glutationa reduzida (GSH). A eficincia do
processo de reciclagem do ascorbato depende do ambiente redutor no meio biolgico.

Figura 11.1 - Ao sinergstica de ascorbato e tocoferol. Este reduz radicais peroxil (R) e se converte no
radical semiquinona, que pode ser reduzido pelo ascorbato, recuperando a molcula de tocoferol na
forma ativa e convertendo ascorbato no radical ascorbil.

Tocoferis
O tocoferol, ou vitamina E, considerado o principal antioxidante lipossolvel do meio biolgico e o
mais eficiente antioxidante em altas concentraes de oxignio.
H um grupo de compostos que recebem a denominao de vitamina E, os quais so sintetizados por
plantas a partir do cido homogentsico. Esses grupos incluem tocoferis e tocotrienis.
O tocoferol est includo na classe dos antioxidantes convencionais que apresentam estrutura
fenlica e pode reagir com radicais peroxil, protegendo membranas contra danos oxidativos. A etapa inicial da
reao antioxidante pelo tocoferol envolve uma rpida transferncia do hidrognio fenlico para o radical
livre, formando um produto radical (Figura 11.2). Este estabilizado por ressonncia, sendo relativamente
pouco reativo com oxignio e lipdios, impedindo reaes em cadeia. Por isso, freqente caracterizar a
propriedade antioxidante do tocoferol como chain-breaking ou interruptor de reaes em cadeia.

195
Figura 11.2 - Reaes do tocoferol com perxidos, formando radicais tocoferil. Uma molcula de tocoferol
pode reduzir duas molculas de radicais (ROO) derivados de perxidos (de hidrognio ou de
lipdios), formando o radical quinona tocoferil.

O radical tocoferil no apresenta atividade antioxidante. Assim, para a molcula manter tal
propriedade, ela deve ser regenerada, ou seja, convertida em tocoferol, pois a concentrao da molcula
presente nas membranas 103 vezes menor que a quantidade do substrato potencialmente oxidvel. O tocoferol
encontrado nas membranas, principalmente dentro da bicamada fosfolipdica, estando numa proporo com
os fosfolipdios de 1:2000 molculas. Isso evidencia a necessidade de regenerao do tocoferil. Uma parte da
quinona tocoferil eliminada pela urina, ou bile, aps reaes de conjugaes, e a outra pode ser regenerada
pelo ascorbato e por outros sistemas antioxidantes, presentes no organismo humano.

Carotenides
Centenas de carotenides esto presentes na natureza, mas poucos so encontrados nos tecidos
humanos, sendo os principais: -caroteno, lutena, licopeno, -criptoxantina e -caroteno. O -caroteno a
principal fonte de pr-vitamina A da dieta, porm existem aproximadamente 50 carotenides com atividade
antioxidante. Estima-se que em pases desenvolvidos o consumo de licopeno proveniente de tomates, lutena
(espinafre, brcolis, milho) e zeaxantina (milho), quantitativamente semelhante ingesto de -caroteno,
somando-se ainda a ingesto de -criptoxantina, que encontrada principalmente em frutas.
Por serem molculas lipoflicas, os carotenides distribuem-se nas regies apolares do meio
biolgico, incluindo as membranas, as partculas de lipoprotenas (LDL e HDL) e o soro, ligados a uma
protena de transporte.
O -caroteno apresenta dois anis de seis carbonos, separados por 18 tomos de carbono na forma
de duplas ligaes conjugadas, o que tambm comum nos demais carotenides. O sistema de duplas ligaes
conjugadas responsvel pela propriedade antioxidante dessas molculas.
Os carotenides so eficientes eliminadores (quenching) de Espcies Reativas de Oxignio,
especificamente oxignio simpleto e radicais peroxil. Afirma-se que os carotenides so eficientes
desativadores de oxignio simpleto, em baixas concentraes de oxignio. A desativao de oxignio simpleto
ocorre por dois mecanismos distintos: fsico e qumico. A desativao fsica ocorre por transferncia de
energia do oxignio simpleto para o carotenide, formando o carotenide excitado. Essa energia dissipada
atravs de interaes vibracionais com o solvente, para recuperar o carotenide no estado fundamental, o qual
permanece intacto, podendo participar de outros ciclos de desativao de oxignio simpleto. A desativao
qumica contribui pouco nesse processo (menos que 0,05% do total), mas o evento responsvel pela
destruio da molcula, e a interao qumica do radical carotenide com os radicais peroxil leva desativao
dos radicais. Esses mecanismos explicam os efeitos protetores dos carotenides contra as doenas relacionadas
ao estresse oxidativo. Entretanto, a modulao gnica parece ser o efeito mais relevante dos carotenides
descoberto nos ltimos anos, o qual pode ser um dos mecanismos adicionais da citoproteo contra alguns
processos patolgicos.

196
Os carotenides formam no organismo produtos de clivagem oxidativa. Sugere-se que estes possam
ativar o promotor do gene do receptor de cido retinico, o qual intensifica a comunicao gap junctional das
clulas. A comunicao intercelular adequada proporciona a regulao do ciclo celular nos diversos tecidos,
permitindo mais tempo para que ocorram mecanismos de reparo que destroem clulas anormais.

Compostos fenlicos de vegetais


Neste grupo incluem-se os flavonides e demais polifenis, que constituem um grupo extenso de
substncias amplamente distribudas em vegetais (frutos, folhas, caules, sementes). Fenlicos de plantas
constituem um grupo quimicamente heterogneo. Todos os compostos contm um grupo fenol - funo
hidroxil em um anel aromtico. Ocorrem freqentemente como derivados na forma de steres, teres,
glicosdios ou misturas e so subdivididos em grupos, incluindo milhares de compostos, com base na estrutura
qumica. Vrios destes compostos tm sido investigados como bioativos da dieta: cidos fenlicos, cidos
hidroxicinmicos (ferlico, cafico), xantonas (mangiferina), flavonides, cumarinas, lignanas, ligninas, etc.
A classe dos compostos fenlicos mais explorada, atualmente, a dos flavonides, que ocorrem
naturalmente como glicosdios. Contm vrios grupos hidroxila fenlicos nas estruturas em anel, designadas
de A, B e C. Variaes estruturais nos anis dividem os flavonides em famlias ou subclasses (Tabela 11.1).
Os compostos fenlicos so ingeridos na dieta sob a forma de agliconas e glicosdios. Estima-se
uma ingesto de at um grama por dia. Acreditava-se, inicialmente, que a absoro desses compostos, com
nfase para os estudos com flavonides, era desprezvel por estarem na forma de gliconas. Entretanto, estudos
mais recentes mostraram que a sua biodisponibilidade relevante. Pesquisas realizadas com quercetina, na
forma de aglicona e de glicosdios, mostraram que os glicosdios de quercetina foram absorvidos mais
eficientemente do que a forma aglicona.
O potencial dos compostos fenlicos para atuarem como antioxidantes est relacionado facilidade
com a qual um tomo de hidrognio de um grupo hidroxil aromtico pode ser doado a um radical livre e a
estabilidade do produto aromtico para suportar um eltron desemparelhado, como resultado da estabilizao
por ressonncia. Outro determinante estrutural importante da capacidade antioxidante de flavonides a
posio dos grupos hidroxilas no anel B. Os grupos carboxlicos presentes em numerosos compostos fenlicos
podem inibir a oxidao de lipdio, por quelao de metais.

Tabela 11.1 - Subclasses de flavonides.

Subclasses Estrutura Exemplos de Compostos Posies das hidroxilas nos anis


3 5 7 3 4
Flavan-3-ol Catequina OH OH OH OH OH

Flavanona Taxifolina OH OH OH OH OH
Naringenina - OH OH - OH

Flavona Luteolina - OH OH OH OH
Apigenina - OH OH - OH

Flavon-3-ol Quercetina OH OH OH OH OH
Kenferol OH OH OH - OH

Isoflavona Genistena - OH OH - OH
Daidzena OH OH

197
A aceitao definitiva para as propriedades antioxidantes dos constituintes fenlicos da dieta, in
vivo, justificada por trs razes: i) sua capacidade de reagir, in vitro, com as Espcies Reativas de Oxignio
(EROs) e Espcies Reativas de Nitrognio (ERNs), funcionando como eliminadores, e/ou sua capacidade para
prevenir a formao de EROs, atravs da quelao de metais; ii) a evidncia de sua biodisponibilidade em
humanos; e iii) sua bioatividade in vivo.
Mecanismos de absoro de compostos fenlicos ainda esto sob investigao. Alguns fatores
influenciam a extenso e a velocidade de absoro destes compostos: ocorrncia de interaes no intestino
delgado, potencial para serem metabolizados pela flora bacteriana do clon e a subseqente absoro dos
metablitos, bem como a excreo biliar aps a sua biotransformao heptica. A absoro em nvel de
intestino delgado influenciada pelo peso molecular, lipofilicidade, solubilidade, pKa, e fatores fisiolgicos
tais como, tempo de trnsito gastrointestinal, pH do lmen e outros. H evidncias de que algumas classes de
fenlicos so absorvidas no intestino delgado e outras no clon, aps a degradao prvia por enzimas da
microflora. Existem sugestes de que no intestino delgado, alguns compostos na forma de glicosdios,
principalmente os ligados glicose, podem ser absorvidos intactos atravs de transporte ativo. Um outro
mecanismo alternativo proposto envolve a presena de enzimas no lado externo da membrana da borda em
escova, as quais hidrolisam os glicosdios e, subseqentemente a estrutura fenlica absorvida por difuso.
Os compostos fenlicos, especialmente flavonides, podem atuar como antioxidantes, eliminando o
nion superxido, o radical hidroxil e os radicais de lipdios. Existem evidncias do efeito protetor de
compostos fenlicos sobre a oxidao de LDL induzida por ons cobre e macrfagos, do efeito em inibir
enzimas que catalisam reaes geradoras de EROs, alm da possibilidade de regenerar antioxidantes de
membranas, como -tocoferol. Uma caracterstica interessante de muitos compostos fenlicos a sua natureza
anfiflica, podendo atuar como antioxidante em regies polares e apolares do meio biolgico.
Alm de seus efeitos como antioxidantes, os compostos fenlicos podem exercer outras aes
fisiolgicas benficas, entre as quais se incluem: modulao de enzimas da via de biotransformao de
xenobiticos, inibio de enzimas envolvidas em respostas celulares a fatores de crescimento, incluindo
protena quinase C, tirosina quinase, 3-fosfatidil-inositol quinase, modulao da expresso de genes de
protenas antioxidantes ou supressoras de tumor, como a p-53.
Apesar do suporte cientfico apontando os efeitos benficos dos compostos fenlicos, alguns estudos
tm mostrado que molculas aromticas com substituintes diidroxi na posio orto da estrutura catecol
apresentam propriedade qumica pr-oxidante. Esta estrutura est presente em hidrocarbonetos aromticos e
em metablitos de estrgenos, sendo formada, por ativao metablica em ciclo redox, durante sua
biotransformao. Esta tem sido uma explicao plausvel para o mecanismo responsvel pela ligao entre a
exposio ao estrgeno administrado e o desenvolvimento de cncer. A converso desses compostos
aromticos contendo a estrutura catecol na via da NADPH citocromo redutase-P450 gera intermedirios
reativos (radicais livres), que participam de ciclo redox com o oxignio molecular, formam EROs e produzem
metablitos que fazem adutos com protenas, DNA e RNA, causando efeitos celulares deletrios.

Alguns nutrientes maximizam a resposta antioxidante enzimtica:


Minerais
Os minerais, selnio, ferro, cobre, zinco e mangans so freqentemente includos no grupo de
nutrientes antioxidantes por serem constituintes de enzimas antioxidantes.
As superxido dismutases so isoenzimas que catalisam a reao de converso do nion superxido
em perxido de hidrognio, formado em vias metablicas nos vrios compartimentos celulares. Isoenzimas
presentes no citosol contm em sua estrutura cobre e zinco e a forma mitocondrial apresenta o tomo de
mangans. A presena dos minerais na estrutura da enzima constitui um determinante essencial para a catlise
da reao, cujo mecanismo envolve a transferncia de eltrons.
Perxidos (de hidrognio e de lipdios) formados no organismo so eliminados enzimaticamente
atravs da reao catalisada pela glutationa peroxidase, a qual contm selnio e constitui o principal
mecanismo de proteo de membranas celulares contra o estresse oxidativo. O selnio constituinte de muitas
outras enzimas que catalisam reaes envolvidas na defesa antioxidante in vivo, como por exemplo, as
tioredoxinas, que catalisam reaes de reduo de grupamento sulfifrila (SH) de protenas.
O ferro est presente na estrutura da catalase, enzima que catalisa a decomposio de perxido de
hidrognio no peroxissoma. Entretanto, o excesso de ferro livre (no quelado) pode apresentar efeito pr-
oxidante no organismo, ao participar das reaes de peroxidao de lipdios.
Assim, cobre, zinco, mangans, ferro e selnio so considerados minerais essenciais para a otimizao
da resposta antioxidante enzimtica, quando consumidos em quantidades adequadas para suprir as
necessidades do organismo.

Vitaminas do complexo B
A niacina constituinte do NADH e NADPH os quais so equivalentes redutores, no meio biolgico,
em reaes de oxirreduo que protegem o organismo contra o estresse oxidativo.

198
A flavina um cofator da glutationa redutase, uma enzima chave na manuteno dos nveis de
glutationa reduzida (GSH), a qual um substrato utilizado em reaes redutivas. Deficincias dessas vitaminas
limitam a defesa antioxidante enzimtica.

A controvrsia sobre o efeito dos antioxidantes da dieta na preveno de doenas


A questo do efeito potencial benfico dos antioxidantes da dieta sobre a sade dos indivduos insere-
se na polmica sobre os compostos bioativos da dieta.
Enquanto h evidncias cientficas crescentes da bioatividade de componentes da dieta e inmeras
pesquisas epidemiolgicas que apontam o hbito alimentar como um importante fator preventivo de doenas
crnicas, ainda existem dvidas e incertezas sobre quais indivduos podero se beneficiar de tais efeitos. Em
relao aos efeitos dos antioxidantes, acrescentam-se ainda os resultados de pesquisas in vitro e in vivo com
animais, que mostram resultados conflitantes e a questo de qual seria os nveis de ingesto para se conseguir
proteo contra doenas especficas.
Uma interessante abordagem sobre essa questo enfatizou o papel da nutrigentica na associao entre
dieta e preveno do cncer. Nutrigentica a interao nutrio e genoma, a qual determina a resposta
individual diante de diferentes padres de dieta, por causa de polimorfismos. As interaes nutrio e genoma
podem ocorrer em vrios nveis: transcrio, traduo e metabolismo. A perspectiva de que, pesquisas nessa
rea iniciaro uma nova discusso, envolvendo epigenmicos nutricionais, transcriptmicos nutricionais,
efeitos protemicos e metabolmicos, cujas definies so:
- epigenmicos nutricionais: alteraes induzidas pela nutrio na cromatina e metilao do DNA;
- transcriptmicos nutricionais: alteraes induzidas pela nutrio na expresso gnica;
- efeitos protemicos: efeitos da nutrio na formao e/ou bioativao de protenas;
- efeitos metabolmicos: efeitos da nutrio nos constituintes celulares de baixo peso molecular.
A abordagem anterior pode ser vlida para os efeitos protetores de bioativos antioxidantes da dieta,
relacionando outras doenas e no apenas o cncer. A expanso do conhecimento sobre as semelhanas e as
diferenas nas respostas micas entre os tecidos e os indivduos possibilitar a predio de respostas
individuais e tecido-especficas e o uso adequado dos antioxidantes, a fim de se obter respostas desejadas sobre
a sade humana.

11.3. CONSIDERAES FINAIS


- Os nutrientes do grupo das vitaminas: ascorbato, tocoferol e -caroteno possuem funes diversas no
organismo, incluindo o efeito antioxidante, que protege contra o estresse oxidativo e funcionam como
reguladores fisiolgicos reguladas pelo estado redox celular;

- Outros carotenides no-precursores de vitamina A so ingeridos em quantidades relativamente altas na dieta


e podem desempenhar importantes efeitos antioxidantes no organismo humano;

- Os compostos fenlicos apresentam propriedades antioxidantes definitivas in vitro, como eliminadores de


radicais livres e como quelantes de metais. In vivo, podem ainda ter bioatividade, envolvendo efeitos sobre a
atividade de enzimas.

- So necessrios estudos para melhor compreenso do sinergismo entre ascorbato, tocoferol, carotenides e
compostos fenlicos da dieta, com nfase no apenas na proteo contra o estresse oxidativo, mas tambm em
seus possveis efeitos txicos.

- A presena de antioxidantes no-nutrientes no organismo deve ser considerada em estudos que objetivam
estabelecer recomendaes nutricionais de nutrientes que apresentam funo antioxidante.

- O nvel de recomendao para a ingesto diettica de nutrientes que tm funo antioxidante depende da
funo co-antioxidante dos no-nutrientes e da exposio do organismo condio oxidante;

- O conhecimento da estrutura da molcula uma etapa imprescindvel nos estudos que testam o efeito
antioxidante de compostos fenlicos, em decorrncia da relao estrutura-atividade e da influncia sobre a
partio da molcula antioxidante, entre os compartimentos biolgicos, hidroflico e lipoflico;

- Considerando que a suscetibilidade para sofrer as conseqncias do estresse oxidativo tecido-especfica,


pesquisas sobre antioxidantes da dieta devem explorar vrios parmetros ou marcadores, e nesse sentido, a
biologia estrutural uma importante ferramenta de estudo.

199
- Antioxidantes da dieta um tema complexo e exige uma abordagem multidisciplinar para a sua
compreenso; os conhecimentos sobre o assunto apresentam uma aplicao direta em reas diversas: nutrio,
medicina, farmacologia e indstria de alimentos.

11.4. BIBLIOGRAFIA

BERGENDI, L.; BENES, L.; DURACKOV, Z.; FERENCIK, M. Chemistry, physiology and pathology of
free radicals. Life Sciences, v. 65, n. 18/19, p. 1865-74, 1999.

BERGER, M. M. Manipulations nutritionnelles du stress oxidant: tat des connaissances. Nutrition Clinique
et Mtabolisme, v. 20, n.1, p. 48-53, 2006.

BOLTON, J.L.; PISHA, E.; ZHANG, F. et al. Role of quinoids in estrogen carcinogenesis. Chemical
Research in Toxicology, v. 11, n.10, p. 1113 27, 1989.

BURRI, B J. Carotenoids and gene expression. Nutrition, v.16, n.7-8, p. 577-78, 2000.

DAVIS, C.D.; MILNER, J. Frontiers in nutrigenomics, proteomics, metabolomics and cancer prevention.
Mutation Research, v.551, n.1-2, p.51-64, 2004.

DIPLOCK, A. T.; CHARLEUX J.L.; CROZIER-WILLI, G.et al . Functional food science and defense against
reactive oxidative species. British Journal of Nutrition, v. 80, n.1, p. s77-s112, 1998.

GALATI, G.; OBRIEN, P. J. Potential toxicity of flavonoids and other dietary pehenolics: significance for
their chemopreventive and anticancer properties. Free Radical Biology & Medicine, v. 37, n. 3, p. 287-303,
2004.

HALLIWELL, B. Vitamin C and genomic stability. Mutation Research, v. 475, n. 1-2, p. 29-35, 2001.

HALLIWELL, B.; GUTTERIDGE, J. M. C. Role of free radicals and catalytic metal ions in human disease: an
overwiew. Methods in Enzymology, New York, v. 186 - Part B, p. 1-85, 1990.

HEYLAND, D. K.; DHALIWAL, R.; SUCNER, V. et al. Antioxidant nutrients: a systematic review of trace
elements and vitamins in the critically ill. Intensive Care Medical, v. 31, n. 3, p. 321-37, 2005.

IOM, 1998 Institute of Medicine. Dietary Reference Intakes: Proposed definition and plan for review of
dietary antioxidants and related compounds. Disponvel em: www.nap.edu. Acesso em: 25/04/2006.

JACKSON, M. J.; PAPA, S.; BOLAOS, J. et al. Antioxidants, reactive oxygen and nitrogen species, gene
induction and mitochondrial function. Molecular Aspects of Medicine, v. 23, n. 1-3, p. 209 5, 2002.

JENNER, A. M.; RAFTER, J.; HALLIWELL, B. Human fecal water content of phenolics: the extent of
colonic exposure to aromatic compounds. Free Radical Biology & Medicine, v. 38, n.. 6, p. 763-72, 2005.

LOO, G. Redox-sensitive mechanisms of phytochemical-mediated inhibition of cancer cell proliferation.


Journal of Nutritional Biochemistry, v. 14, n. 2, p. 64-73, 2003.

LOPACZYNSKI, W.; ZESEL, S. H.; Antioxidants, programed cell death and cancer. Nutrition Research, v.
21, n.. 1-2, p. 295-307, 2001.

NORDBERG, J.; ARNR, E. S. J. Reactive oxygen species antioxidants, and the mammalian thioredoxin
system. Free Radical Biology & Medicine, v. 31, n. 11, p. 1287-1312, Dec. 2001.

ROBAK, J.; GRYGLEWSKI, R.J.; Flavonoids are scavengers of superoxide anion. Biochemical
Pharmacology, v. 37, n.5, p. 83-8, 1988.

ROSS, J. A.; KASUM, C. M. Dietary flavonoids: bioavailability, metabolic effects, and safety. Annual
Review Nutrition, v. 22, p. 19-34, 2002.

SIES, H. Oxidative stress. London: Academic, 1985. 507 p.

200
SORG, O. Oxidative stress: a theoretical model or a biological reality? Comptes Rendus. Biologies, v. 327, n.
7, p. 649 62, 2004.

WANG, W.; GOODMAN, M.T. Antioxidant property of dietary phenolic agents in a human LDL-oxidation
ex-vivo model; interaction of protein binding activity. Nutrition Research, v.19, n.2, p. 191-202, 1999.

YEUM, K.; RUSSEL, R. M. Carotenoid, bioavailability and bioconversion. Annual Review Nutriton, v.22, p.
483-504, 2002.

VALKO, M.; RHODES, C. J.; MONCOL, J.; IZAKOVIC, M.; MAZUR, M. Free radicals, metals and
antioxidants in oxidative stress-induced cancer. Chemico-Biological Interactions, v. 160, n. 1, p.1-40, 2006.

201

Você também pode gostar