Sintese de Mariologia

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Dogmtica | Doutrina

Sntese de Mariologia
Pe. Jair Cardoso Alves Neto
Quando chegou a plenitude dos tempos, mandou o seu Filho, nascido de mulher para que
recebssemos a adoo de filhos (Gl 4,4-5). Constantemente na histria da salvao, Deus
manifesta o seu amor de Pai junto a seu povo. O amor revelado por meio de uma eleio:
uma jovem separada para que por meio dela o Filho de Deus pudesse assumir a
humanidade decada com o pecado. Assim como por meio de uma mulher (Eva), o pecado
entrou no mundo, Deus separa uma mulher para que por meio dela chegue a Salvao:
d-se uma nova criao. H um novo Ado e, do seu lado tirada a mulher, a nova Eva; um
novo povo constitudo.
Maria a Mulher do sim. O sim dado ao Amor. A obedincia dada por amor. A entrega dada
no amor. Desta maneira, Maria tem uma grande importncia na histria da salvao e na
vida de muitos cristos e sua figura tradicionalmente reconhecida na Igreja Catlica.

5.1 MARIA NO NOVO TESTAMENTO


Certamente, a Virgem tem na Bblia um lugar discreto. Ela a representada toda em funo
de Cristo e no por si mesma. Mas sua importncia consiste na estreiteza de seus laos com
Cristo.
Maria est presente em todos os momentos de importncia fundamental na histria da
salvao: no somente no princpio (cf. Lc 1 2) e no fim (cf. Jo 19,27) da vida de Cristo,
mistrios da Encarnao e da morte redentora, mas na inaugurao de seu ministrio (cf. Jo
2) e no nascimento da Igreja (cf. At 1,14). Presena discreta, na maior parte das vezes,
silenciosa, animada pelo ideal de uma f pura, e de um amor pronto a compreender e a
servir aos desejos de Deus e dos homens (cf. Lc 1,38-39.46-56; Jo 2,3) (BOFF, 2004).
Esta presena revela seu sentido total, e com toda a Escritura se a recolocarmos nos grandes
quadros e correntes da teologia bblica onde eles se situam, Maria aparece no trmino da
histria do povo eleito como correspondente de Abrao: Ela se apossa, pela f, da promessa
que ele havia recebido na f. Ela o ponto culminante onde o povo eleito d nascimento a
seu Deus e se torna a Igreja. Se alagarmos a perspectiva da histria de Israel histria
csmica, segundo as insinuaes de Joo e de Lucas, se compreendermos que Cristo
inaugura uma nova criao, Maria aparece no incio da salvao, como restaurao de Eva:
Ela acolhe a promessa de vida onde a primeira mulher havia acolhido a palavra de morte e
se torna perto da nova rvore da vida a me dos vivos (LAURENTIN, 1965).
5.1.1 Maria no Evangelho de Marcos
O Evangelho de Marcos se constitui em duas questes fundamentais: Quem Jesus de
Nazar? Como ser discpulo de Jesus, o Cristo? Questes que Maria, me de Jesus, como
todos de sua famlia e todos da comunidade crist, inclusive Marcos buscam entender.
No Evangelho de Marcos a pessoa de Maria aparece em duas passagens: Mc 3,31-35 e Mc 6,
3-4. Nestes textos Maria a me biolgica de Jesus que busca entender o filho juntamente
com seus familiares. A mulher maternalmente solcita pela sorte do filho. Mas, que tambm

convocada a ser discpula na busca de compreender Jesus e sua misso e acolher sua
proposta. Ela tambm podia estar entre os primeiros a nutrir preocupaes ainda muito
humanas pela misso e a obra de Jesus.
Marcos indica que a verdadeira famlia de Jesus no a de ordem carnal e que a ela
pertencem todos os filhos do Reino. Assim, Maria, Me de Jesus fundamental testemunho
dos verdadeiros laos que criam comunho com Jesus. Depois de ter levado Jesus, seu filho
no ventre, era preciso que ela o gerasse no corao, cumprindo a vontade de Deus (cf. Mc
3,35), que se manifestava naquilo que Jesus dizia e realizava. Neste sentido, a figura de
Maria me se harmoniza e se completa com a figura da discpula (SERRA, 1995).
5.1.2 Maria no Evangelho de Mateus
No Evangelho de Mateus a pessoa de Maria aparece em dois momentos: nos relatos da
infncia (cf. Mt 1-2) e no ministrio apostlico de Jesus ( cf.Mt 12,46-50; 13,54-58). O
primeiro composto por relatos prprios de Mateus; o segundo est em dependncia de
Marcos, mas Mateus toma diante dele tal liberdade que capaz de transformar seu sentido e
seu ensinamento (ALVAREZ, 2005).
No Evangelho da Infncia em Mateus, Jesus, como todos os meninos, no chega ao mundo
sem um pai e uma me. Mateus fala de Jos, esposo de Maria (cf. Mt 1,16) e de Maria
esposa de Jos (cf. Mt 1,24). Maria, por sua vez no tem existncia sem Jos, do qual
esposa, e sem Jesus, do qual me. Maria aquela que gera e me, ao passo que Jos
somente o pai legal.
Mt 1,3 fala sobre a concepo de Jesus, diz que esta se realizou para que se cumpra o
orculo do Senhor, por meio do profeta [] e cita Is7, 14, aplicando a Jesus a realidade do
Emanuel e a Maria a de virgem. (Mateus quando) Ao falar do nascimento de Jesus,
Mateus recorrendo ao texto de Isaas, no somente assume a interpretao dos LXX, mas ele
mesmo interpreta teologicamente esse nascimento: Jesus o Emmanuel e nasce de Maria
Virgem. Neles dois se realiza plenamente o orculo do profeta: Jesus o Messias, e Maria
a Me-Virgem e, este fato maravilhoso somente pode ser entendido como a obra do Esprito
Santo (ALVAREZ, 2005).
A unio de Maria com seu Filho , ento, ntima, total e permanente. Desde a concepo
virginal, Maria est expressamente unida a Jesus e inseparvel dele. Por isso, os escritores
eclesisticos aprofundam nesta realidade, dizendo que no podemos entender Jesus sem
Maria e entender Maria sem Jesus.
Podemos notar, finalmente, como que um contraste nas expresses de Mateus: Enquanto
Jesus o Emmanuel de Deus, Deus conosco, Maria a Me que est sempre junto do seu
Filho. Ela a resposta permanente presena sempre atual do Senhor na histria.
Quanto ao ser discpulos de Jesus significa cumprir a vontade do Pai no cu, realizar seu
plano. Para Mateus, o discpulo integra, ento, a escuta da Palavra e sua ao (cf. Mt
5,19;Mt7,24-25), o estar junto de Jesus e sob a sua proteo (cf. Mt 12,49-50). E Maria,

com perfeita discpula e famlia dele em um nvel muito mais forte e firme do que o dos
laos fsicos de gerao (ALVAREZ, 2005).
Portanto, o Evangelho de Mateus nos fala que Maria est intimamente ligada ao seu Filho
Jesus Cristo, desde antes do nascimento e, uma vez nascido para o mundo, est unida a ele
nos momentos fundamentais de sua vida e de seu ministrio. Assim, Maria aparece, mesmo
sem palavras, como testemunha da graa abundante de Deus para seu povo, mas tambm
como me que cuida e acompanha o Filho de suas entranhas (ALVAREZ, 2005).
5.1.3 Maria no Evangelho de Lucas
De todos os Evangelhos, Lucas o que mais nos fala de Maria. Primeiramente nos relatos da
infncia, onde ela tem um papel mais ativo do que o que vimos em Mateus; em seguida, no
marco da atividade apostlica de Jesus, com quatro textos, dois dos quais coincidem com as
tradies de Marcos e de Mateus (cf. Lc 4,16-30 e 8,19-21) e outros dois que pertencem
tradio prpria de Lucas (cf. Lc 3,23 e 11,27-28); por ltimo, no comeo dos Atos dos
Apstolos, quando se inicia a histria da Igreja (cf. At 1,14) (ALVAREZ, 2005).
A primeira coisa que temos de afirmar, ao entrar na anlise dos textos lucanos sobre Maria,
dentro do chamado Evangelho da infncia (Lc1-2), que os textos so fundamentalmente
cristolgicos e mariolgicos. Maria no tem uma identidade e uma vocao prpria, mas
dentro e a servio da cristologia. Ela tudo para Jesus e se transforma e se enriquece
plenamente por e para Jesus. Para isto, temos alguns ttulos que ilustram esta to grandiosa
discpula: Filha de Sio, Virgem e Me, Cheia de Graa, Morada de Deus, Cheia do Esprito,
Serva e mulher de f e Portadora da santa presena. Temos tambm textos bblicos que
falam da sua experincia como Me do Salvador: Lc1, 26-28 (o anncio do Anjo); Lc1-39-45
(a visita a Isabel); Lc1, 46-55 (o cntico da libertao). Assim sendo, Maria surge em Lucas
como a primeira mensageira do Evangelho de Deus: leva a Notcia da paz, da felicidade e da
salvao, desde a Galilia at a regio de Jud. Mas Maria a primeira mulher que acolhe o
Evangelho e o comunica a seus irmos, trazendo-lhes o gozo escatolgico, quer dizer, a
alegria e a segurana da salvao definitiva (cf. Lc 1,44) (ALVAREZ, 2005).
Em Lucas percebemos a participao e a cooperao de Maria no plano da salvao, desde a
anunciao at o incio da Igreja: todos estes unnimes, perseveravam na orao com
algumas mulheres, entre as quais Maria, a me de Jesus, e com seus irmos (At 1,14)
(ALVAREZ, 2005).
Portanto, no Evangelho de Lucas vimos que Maria apresentada como a Me do Salvador e
esta em Atos exerce a funo de Me da comunidade, pois, ela se encontra reunida com esta
comunidade nascente para receber em orao a Promessa do Esprito; com esta comunidade
reunida com os seus para orar e esperar de seu Filho o presente dos tempos novos. ,
finalmente, irm na comunidade e discpula do Senhor exaltada, que permanece em
Jerusalm em cumprimento da Palavra do Mestre (cf. At 1,5-8) (ALVAREZ, 2005).
5.1.4 Maria no Evangelho de Joo
O quarto Evangelho oferece-nos a histria de Cristo, num esforo de memria viva que
parte da f pascal (cf. Jo 2,17.22;12,16;13,7;20,9) e realizada por obra do Esprito, o
Parclito, que testemunha fiel e o hermeneuta qualificado da vida e da obra do Cristo

jonico (cf. Jo 14,15-17;15,26;16,7-11.13.15). O quarto Evangelho do final do sculo I e


expressa a situao de duas igrejas, primeiro na Sria e depois na sia Menor (ALVAREZ,
2005).
A figura de Maria aparece no quarto Evangelho em duas ocasies, no comeo e no final do
Evangelho. Em ambas, Maria chamada a Me de Jesus (cf. Jo 2,1.3.5;19,26), e em
ambas a palavra do Mestre vai dirigida a ela com o nome de mulher (cf. 2,3;19,26), mas
nunca aparece o nome prprio de Maria. No Evangelho de Joo Maria chamada por dois
nomes: Me de Jesus e Mulher. Enquanto a expresso Me de Jesus um ttulo que
contrasta com a outra afirmao, filho de Jos, o termo mulher comum em Jesus para
dirigir-se s mulheres (cf. Mt15, 28; Lc13, 12; Jo4, 21; 8,10; 20,13). Contudo aqui, dito
sua Me tem uma conotao especial: o termo mulher dirigido por Jesus um termo
jonico que aparece em duas ocasies (em Can e na cruz) e forma uma espcie de
incluso. A mulher est presente no comeo e no fim da vida pblica, no momento em que o
Messias inicia suas obras e na hora da morte, quando consuma sua obra (ALVAREZ, 2005).
Maria aparece no Evangelho de Joo, sobretudo em 2,1-12 como intercessora e
evangelizadora. Como intercessora Maria apresenta simplesmente a Jesus, a necessidade
dos que participam da festa de bodas: No h mais vinho (Jo 2,3). J como
evangelizadora, a segunda palavra de Maria que encontramos no quarto Evangelho
significativa no s pelo que diz, mas tambm por aqueles aos quais a diz: Fazei o que ele
disser (Jo 2,5) (ALVAREZ, 2005).
Se em Can, Jesus lhe disse que ainda no havia chegado sua Hora e iniciou seus sinais,
aqui, na cruz, na Hora da Pscoa, Jesus realiza seu ltimo e definitivo sinal da salvao, a
morte por todos e a entrega do Esprito (cf. Jo 19,30). Assim, Maria chamada novamente
com dois ttulos de Can: a Me de Jesus e a Mulher. Maria tambm a testemunha por
excelncia da Pscoa de Jesus diante da comunidade (cf. Jo 19,35; 21, 24). E esta
comunidade, ao entender o gesto de seu Senhor, a recebe entre seus bens mais preciosos:
Maria passa a ser um bem precioso com que Jesus Cristo presenteia a Comunidade, um dom
da Pscoa de inaprecivel valor; mas tambm a Me de todos acolhida como tal (ALVAREZ,
2005).
A viso do quarto Evangelho nitidamente teolgica contribui para realar o papel de Maria
no mistrio de Jesus. Assim, o Evangelho de Joo articula os trs elementos, Maria Me de
Jesus, Maria Mulher e Maria Me dos discpulos, segundo uma graduao teolgica:
partindo de Maria Me de Jesus para chegar a Maria Me dos discpulos, com uma
maternidade nova.

5.2 OS DOGMAS MARIANOS


Os quatro dogmas marianos: Maternidade Divina = Me de Deus (Theotkos), e Maria
Virgem = Virgindade, so antigos e esto estreitamente ligados entre si e inseparveis da f
em Jesus Cristo e a sua formulao histrico- dogmtica. Os dogmas da Imaculada
Conceio e Assuno de Maria so mais recentes e esto baseados na dignidade e no
significado de Maria Virgem e Me de Deus.

5.2.1 A Maternidade Divina e Virginal


Julga-se que o ttulo Theotkos, Me de Deus, aparece pela primeira vez, na literatura crist,
nos escritos de Orgenes (250). Foi solenemente proclamado pelo Conclio de feso (431)
(BETTENCOURT, 2004).
Em que sentido Maria a Me de Deus? Toda me me de uma pessoa. A Pessoa que
nasce de Maria a segunda Pessoa da Santssima Trindade, que dela assumiu a carne
humana. Maria, porm, no me apenas da carne humana, mas de toda a realidade do seu
Filho, o Verbo encarnado. Da dizer-se que Maria Me de Deus, mas enquanto Deus feito
homem.
Deus escolheu Maria, por benevolncia ou gratuidade, para ser Me Santa. Portanto, encheua de graa. Maria correspondeu fielmente ao dom de Deus, dizendo-se e fazendo-se a serva
do Senhor (cf. Lc 1,38. 44). Maria foi escolhida como filha de Sio ou como membro de um
povo chamado a gerar o Messias. Isto quer dizer que o Sim de Maria o Sim de uma
coletividade; o Sim de todo o gnero humano, chamado a se prolongar na Igreja atravs
dos sculos (BETTENCOURT, 2004).
Maria concebeu o Filho de Deus de maneira livre e generosa. Para isto, devia ter certo
conhecimento do dom e da misso que lhe eram propostos (no se tratava de conhecimento
pleno; (cf. Lc 2,50). Maria privilegiada, mas ela se intitula servidora de Deus e dos
homens (cf. Lc 2,38. 48). O prprio Jesus ensinou que o maior deve ser como aquele que
serve (cf. Lc 22,26; Jo 12,13-15).
Desde remota poca a Igreja professa que Maria sempre virgem (no sentido fsico). Esta
verdade pertence ao patrimnio da f, como declarou, em conformidade com a Tradio, o
Papa Paulo V (aos 7/08/1555): A bem-aventurada Virgem Maria foi verdadeira Me de
Deus, e guardou sempre ntegra a virgindade, antes do parto, no parto e constantemente
depois do parto (DS 1880 [993]).
A doutrina da concepo virginal de Maria comea a ter sentido quando abordada de modo
contemplativo no contexto da encarnao. As narrativas da infncia de Mateus e Lucas so
as nicas fontes que falam da concepo virginal de Jesus. Elas testemunham que Maria
concebeu Jesus pelo poder da sombra do Esprito Santo sem interveno masculina (cf. Lc
1,26-38; Mt 1,18-25). Os dois autores esto indicando o interesse na concepo virginal
como sinal de escolha e graa divinas. A descrio extraordinria do nascimento de Jesus
entra no discernimento cristolgico de que Jesus Filho de Deus, o Messias, desde o
nascimento.
Assim, a doutrina da virgindade de Maria indicativo das origens de Jesus no mistrio de
Deus que no se explicita apenas por ascendncia humana, mas pela iniciativa criadora de
Deus. Maria virgem e me. Maria Virgem porque se guardou ntegra para Deus. Virgem por
guardar ntegra a Palavra de Deus: Faa-se em mim. Por isso tambm a sempre
virgem Maria: avanou ntegra na penumbra da no-viso; avanou em peregrinao de
f (LG 58).
5.2.3 Imaculada Conceio
O dogma da Imaculada Conceio significa que, no primeiro instante de sua conceio, a
Bem-aventurada Virgem Maria foi, por graa e privilgio singulares de Deus onipotente e em

vista dos mritos de Jesus Cristo, Salvador do gnero humano, preservada de toda mancha
da culpa original (DS 2803 [1641]).
Esta verdade, solenemente definida por Pio IX em 08/12/1854, foi aos poucos aflorando
conscincia da Igreja. Durante muito tempo, os telogos perguntavam como poderia Maria
ter sido salva por Jesus Cristo se nunca tivesse pecado. Finalmente, Joo Duns Scoto, O.F.M.
(1308) props a frmula decisiva: pertence perfeio do Redentor no somente purificar
do pecado, mas preservar do pecado a mais dileta dentre as criaturas (BETTENCOURT,
2004, p.06).
Maria, portanto, foi isenta do pecado original em previso dos mritos de Cristo; assim, ela
foi remida de maneira mais perfeita do que as outras criaturas.
Maria nunca contraiu pecado pessoal, nem a mais leve culpa. A razo pela qual o Senhor
Deus quis outorgar tal privilgio a Maria, se deriva da graa da maternidade divina: no
convinha que aquela mulher chamada a ser tabernculo do Altssimo ou Me de Deus feito
homem estivesse, por um momento sequer, sujeita ao domnio do pecado e de Satans. O
anjo declarou Maria cheia de graa (Lc 1,26) o que sugere que desde o incio da sua
existncia ela gozou da plenitude do favor divino.
A riqueza de graas em Maria no impediu que ela vivesse de f e de esperana, em meio a
lutas e dores. A sua f inspirou-lhe a obedincia incondicional a Deus, que lhe pedia cada vez
mais generosa. Maria no compreendeu desde o incio a grandeza da obra que Deus nela
realizaria; tambm se sentiu perplexa, mais de uma vez, diante do procedimento de seu
Filho (cf. Lc 2,49s), mas abandonou-se a Deus sem reservas.
5.2.4 Assuno de Maria
Desde remota poca (sculos IV e V), os autores cristos julgaram que Maria teve um fim de
vida terrestre singular; em seus sermes e em escritos apcrifos, professaram a glorificao
corporal de Maria, logo aps a sua morte na terra. Esta crena foi-se transmitindo at que o
Papa Pio XII em 1950 houve por bem proclam-la solenemente como dogma de f (FIORES,
1995).
Com efeito, Maria, que no esteve sujeita ao imprio do pecado para poder ser a santa Me
de Deus, no podia ficar sob o domnio da morte que entrou no mundo atravs do pecado
(cf. Rm 5,12). Por isto, no conheceu a deteriorao da sepultura, mas foi glorificada no
somente em sua alma, mas tambm em seu corpo (FORTE, 1985).
A carne da me e a carne do filho so uma s carne. Por isto, a carne de Maria devia tocar a
mesma sorte que tocou a carne de Jesus: ambas foram glorificadas no fim desta caminhada
terrestre. Existe uma tendncia a empalidecer o significado da glorificao corporal de Maria
mediante a tese da ressurreio de todo indivduo logo aps a morte: o caso de Maria seria
um entre outros pares (BETTENCOURT, 2004).

A Assuno da Virgem Maria uma participao singular na Ressurreio de seu Filho e uma
antecipao da ressurreio dos outros cristos (CIC 966).

5.3 MARIA NOS DOCUMENTOS DO VATICANO II: LUMEN


GENTIUM E MARIALIS CULTUS
A figura de Maria foi de suma importncia para o Vaticano II: o Papa Joo XXIII abriu o
Conclio na festa da Maternidade Divina de Maria (11 de outubro de 1962) e o Papa Paulo VI
o concluiu na viglia da Imaculada Conceio (07 de dezembro de 1965). O Conclio, todavia,
abre perspectivas de um novo tempo, nos deixando o Captulo VIII da Lumem Gentium.
Depois do Conclio Vaticano II, temos a exortao de Paulo VI (02 de fevereiro de 1974)
(FURLANI, 2005).
5.3.1 Maria no Captulo VIII da Lumen Gentium
O captulo VIII da Lumem Gentium integra o mistrio da Me de Deus no mistrio de Cristo e
da Igreja. Este documento d destaque fundamentao bblica e tradicional da doutrina
mariana, levando em conta a exegese recente, os Padres da Igreja e dos telogos
posteriores.
No seu contedo, representa a doutrina clssica em termos modernos: Maria, a Me de Deus
e tipo de Igreja vista como pessoa que se oferece livre e conscientemente graa de Deus.
A devoo aparece como incentivo para a f e amor de Jesus. E favorece ao dilogo
ecumnico, assumido no Conclio. O Papa Paulo VI na promulgao da Constituio Lumem
Gentium, terminou sua alocuo proclamando Maria Me da Igreja, ttulo que no aparece no
documento conciliar, mas foi acrescido s Ladainhas lauretanas (FIORES, 1995).
5.3.2 Marialis Cultus
A Exortao Apostlica do Papa Paulo VI (02/02/ 1974), parte da renovao litrgica,
decidida pelo Conclio Vaticano II, para explicar o lugar de Maria no ciclo geral e o sentido
das festas propriamente marianas (FIORES, 1995).
A Exortao segue o que orienta o Conclio: [] promovam generosamente o culto,
sobretudo o litrgico, para com a Bem-Aventurada Virgem Maria; dem grande valor s
prticas e aos exerccios de piedade recomendados pelo magistrio [] (LG 67). Neste
ensinamento, Paulo VI articula a questo da cultura e da inculturao do culto devido a
Maria, como a Mulher que soube viver no seu contexto e inserir-se no mistrio de Cristo,
porque foi uma mulher que acreditou naquilo que o Senhor lhe disse.
A Exortao especifica as caractersticas e evidencia elementos teolgicos e espirituais do
culto e de uma devoo mariana para o nosso tempo. Portanto, no seu contedo doutrinal, o
mistrio de Maria deve ser compreendido como um mistrio trinitrio, cristolgico,
pneumatolgico e eclesial; em relao devoo mariana dever seguir quatro orientaes:
bblica, litrgica, ecumnica e antropolgica, para tornar mais vivo e mais inteligvel o
vnculo que nos une a me de Cristo e me nossa na comunho dos santos (MC 29).

O cunho bblico em toda forma de culto princpio e fato reconhecido pela piedade crist e
tambm pela piedade mariana. O contedo bblico, portanto referencial para alimentar o
amor para com Maria e o culto que a ela se presta (MC 30).
Na caracterstica antropolgica, mostra que o mundo moderno requer uma nova imagem de
Maria. Os cristos devem fazer ver em Maria o modelo de pessoa humana, da mulher
responsvel e co-responsvel, em conformidade com a realidade bblica e levando em conta
as exigncias do fenmeno da libertao da mulher e do reconhecimento dos seus direitos na
sociedade moderna (MC 35).
Na questo do ecumenismo a Marialis Cultos orienta que se mantenham os sentimentos de
unidade de todos os cristos pois: [] todos aqueles que confessam abertamente que o
filho de Maria o Filho de Deus e Senhor nosso, Salvador e nico Mediador (cf. 11Tm
2,5), so chamados a serem uma s coisa entre si, com Ele e com o Pai, na unidade do
esprito Santo (MC 32).
O lugar de Maria na liturgia se insere na celebrao da obra salvfica do Pai: o Mistrio de
Cristo. Neste mistrio inseriu-se a memria de Maria como Me de Cristo, celebrando-se de
forma explcita a ntima ligao que a Me tem com o Filho de Deus (MC 3-4). Na celebrao
dos eventos dos mistrios da salvao, Maria aparece associada ao Filho em primeiro lugar
na Celebrao Eucarstica, quando se invoca a memria da sempre Virgem Maria, Me de
Deus e Senhor Jesus Cristo (Orao Eucarstica I) e as memrias incorporadas pela liturgia
da Igreja e aquelas que nascem da experincia de f das comunidades crists. Da tradio
perene e viva da f da Igreja colhem-se as mais significativas expresses da piedade e
devoo marianas (MC 9-15).
Referncias Bibliogrficas
ALVAREZ, Carlos G. Maria Discpula e Mensageira do Evangelho. So Paulo: Paulus,
2005. (Coleo do Celam).
BETTENCOURT, Estevo Tavares. Escola Mater Ecclesiae: curso de iniciao teolgica por
correspondncia. Rio de Janeiro.
DENZIGER, Hnermann. Compndio dos Smbolos, definies e declaraes de f e
moral. So Paulo: Paulinas/Loyola,2007.
FORTE, Bruno. Maria, a mulher cone do Mistrio. So Paulo, Paulinas, 1985.
FURLANI, Maria Aparecida. Apostila de Mariologia: ad usum studentium.- Vrzea
Grande, MT,2006.
Lumen Gentium. In: Documentos do Conclio Vaticano II. So Paulo: Paulus, 1997.
PAULO VI, Papa. Marialis Cultus. In Documentos de Paulo VI. So Paulo: Paulus, 1997.

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