Psicopatas
Psicopatas
Psicopatas
PREFCIO
A taxonomia das entidades clnicas em psiquiatria oferece um espectro
amplo de dificuldades tanto doutrinrias quanto tcnicas. Quando
procuramos identificar, particularizar ou classificar os transtornos
mentais, encontramos questes e problemas advindos da histria da
medicina e da psiquiatria, da ideologia, da maneira de pensar, do
ambiente social, da cultura vigente e at das opes polticas. Tal se d,
entre outras razes, pela dificuldade de aplicao do modelo biomdico
nos transtornos mentais.
Na individuao das enfermidades ou doenas temos duas maneiras
bsicas de classificao: o modelo biomdico e o modelo psicossocial.
O modelo biomdico exige para a taxonomia das enfermidades que
possamos determinar com clareza e segurana qual a etiologia da doena,
ou seja, qual sua causa morfopatolgica ou fisiopatolgica, causa esta que
deve ser nica para aquela doena. Deve ser estabelecida tambm a
patogenia o mecanismo pelo qual a causa produz a doena: como as
alteraes anatomopatolgicas ou fisiopatolgicas levam ao
estabelecimento dos sinais, sintomas ou indcios clnicos da enfermidade.
A histria natural tambm deve ser instituda: como a doena vai evoluir
e o que ela vai causar em seu padecente, as manifestaes fsicas,
psquicas e sociais. Esse modelo plenamente aplicado nas doenas
fsicas ou somticas. Tomemos como exemplo o diabetes. Sabemos
claramente sua causa alteraes no metabolismo dos glicdios , como
tais alteraes produzem os sintomas e como a doena evolui.
J com as doenas mentais, no temos tal facilidade. Com exceo das
demncias e das oligofrenias moderadas, graves e profundas, o modelo
biomdico a de difcil aplicao. Tanto que tais entidades podem ser
consideradas mais neurolgicas que psiquitricas. Nas psicoses,
particularmente nas antigamente chamadas endgenas esquizofrenia e
psicose manaco-depressiva (transtorno bipolar do humor), ele pode ser
aplicado, mas com adaptaes e pressupostos, o que torna tal objetivo
sujeito a contestao e dificuldades de verificao emprica.
EMERGNCIA
DE UM GRANDE
HOSPITAL,
MADRUGADA
Paula, 27 anos, acaba de dar entrada na emergncia. Sofreu um acidente
ao dirigir bbada e em alta velocidade. O motivo o de sempre: brigou com
o namorado, aps flagr-lo flertando com outras mulheres numa balada.
Ela fez um escndalo e ele avisou que no aguentava mais seus altos e
baixos, pondo fim ao relacionamento. A famlia da garota avisada e chega
ao hospital. O pai, Marcos, executivo de uma multinacional.
Extremamente metdico, detesta mudanas e est irritado por ter que sair
da rotina de ver seu seriado favorito na madrugada de sbado para
socorrer a filha. A me surge como um furaco. Aos 48 anos, Sandra,
sensual e exuberante, faz da vida um palco. O fato de estar na recepo de
um hospital no afeta seu jeito espalhafatoso. Grita por Paula e, com gestos
teatrais, conta a todos sobre sua dedicao famlia, que, segundo ela, no
retribui com a mesma ateno. Diante da cena, a irm gmea de Paula,
Fernanda, tenta passar pelo saguo sem ser notada. Herdou a beleza da
famlia, mas, ao contrrio da irm inquieta e da me dramtica, tmida e
sente-se rejeitada por todos. Dedica-se a escrever poemas e a levar uma
vidinha caseira, sem grandes emoes. A famlia recebida pelo mdico
Eduardo, o chefe da emergncia. Jovem, boa-pinta, teve uma ascenso
meterica. Para os superiores, ele o cara que consegue resultados rpidos
e sem grandes esforos. Os subalternos, porm, no se acostumaram com
seu jeito de culpar o grupo pelos erros e guardar os elogios s para si. A
enfermeira Snia aceita calada as humilhaes. Afinal de contas, ela
acredita que conseguir um emprego no fcil, mesmo para algum com
um currculo to impecvel quanto o seu. E, aos 40 anos, ainda conseguiria
atrair a ateno de um homem to interessante quanto o doutor Eduardo.
numa festa ou mesmo na casa de algum. Bastam cinco minutos para voc
identificar a instvel, o inflexvel, a teatral, a insegura, o arrogante, a
submissa, a luntica, o desconfiado, o misantropo e o transgressor.
claro que estas podem ser apenas caractersticas individuais, que no
preenchem critrios para um diagnstico psiquitrico. Mas tambm
podem estar presentes em pessoas que, por seu comportamento
repetitivo, peculiar e capaz de gerar prejuzo, causam danos fsicos e
psicolgicos a si mesmas ou aos que esto ao seu redor. Elas nos
seduzem, manipulam, surpreendem, espantam, assustam, sufocam. Tudo
em seu comportamento exagerado: amor demais, carncia demais,
desconfiana demais, controle demais, raiva demais. Invariavelmente,
passam a impresso de que alguma coisa est fora da ordem.
E est mesmo. A partir do fim da adolescncia, os indivduos com essa
natureza apresentam um jeito de ser caracterizado por um padro de
comportamento inflexvel e repetitivo, que causa prejuzo significativo na
maneira como se relacionam afetivamente, em sociedade, no trabalho ou
na famlia. Podemos cham-los de psicopatas do cotidiano. preciso
deixar claro que, neste livro, psicopatia se refere atual classificao
mdico-psiquitrica denominada transtornos especficos da
personalidade Pessoas com esses transtornos, com frequncia e sem
perceber, causam intenso sofrimento a quem convive com elas. Elas no
perdem o juzo da realidade ou sofrem com surtos, delrios e alucinaes.
A maneira como interagem com o mundo que as torna de difcil
convivncia. Mas, ateno: ao contrrio do senso comum dos ltimos
anos, popularizado na mdia e na cultura pop, o transtorno de
personalidade no uma condio necessariamente associada a crimes
brbaros e cruis.
Somos bombardeados, diariamente, com notcias sobre crimes sexuais,
casos de assdio moral, assassinatos por motivo torpe ou ftil, violncia
domstica, maus tratos a animais. O psicopata do cotidiano tanto pode ser
um lder mstico que convence seus seguidores ao suicdio coletivo
quanto um garoto que depreda patrimnio pblico e posta foto de seu ato
na internet. Mas seus traos de personalidade tambm aparecem nos
motoristas que perdem a cabea no trnsito, nos vizinhos que vo parar
na delegacia aps uma discusso no condomnio ou nos pais e nas mes
que fazem chantagem emocional com os filhos at lev-los a tomar
atitudes contrrias s suas vontades.
Em maior ou menor grau, esses indivduos deixam marcas em nossas
vidas. Compreend-los e aceit-los parte de um simples princpio: eles
JEITO
DE
SER
O TIPO SANGUNEO socivel, expansivo e otimista. Por outro lado, tambm irritvel,
disperso e impulsivo.
O TIPO FLEUMTICO sonhador, pacfico e dcil, mas pode se tornar preguioso, preso a
hbitos e distante das paixes.
O TIPO COLRICO determinado, ambicioso e dominador. Em contrapartida, tem propenso a
reaes abruptas e explosivas.
O TIPO MELANCLICO, por sua vez, tende a ser introspectivo, sensvel e reflexivo. E, pelo lado
negativo, pessimista, rancoroso e solitrio.
PERTURBADOS E
PERTURBADORES
causa sofrimento, mas no acha que seu infortnio tem relao com o
jeito de ser. Acredita que tudo se resolveria caso no tivesse que carregar
o mundo nas costas e os outros mudassem suas atitudes.
Em outro ponto da definio dos transtornos, a OMS menciona
desvios extremos ou significativos. H quase trs sculos, esses desvios
despertam o interesse dos cientistas. Uma das categorias diagnsticas
precursoras para a atual classificao de transtornos de personalidade foi
a do psiquiatra alemo Kurt Schneider. Em 1923, ele publicou o livro As
personalidades psicopticas, em que as descreveu retomadas aqui no
ttulo Psicopatias do cotidiano como variaes estatsticas da mdia
normal, com a peculiaridade de sofrer ou causar sofrimento sociedade
com sua anormalidade. Desde ento, a classificao dos TPs passou por
um avano que culminou nas normatizaes atuais da OMS 10
Classificao Internacional de Doenas (CID-10) e da Associao
Americana de Psiquiatria, em seu Manual Diagnstico e Estatstico de
Transtornos Mentais (DSM-5).
PERTURBADOS E
PERTURBADORES: ISSO
LOUCURA?
Vader perde o contato com a realidade. Ele tem conscincia de seus atos
e, com frequncia, se martiriza por no conseguir controlar os acessos de
raiva. Revela um medo inexplicvel de ser abandonado e, por causa desse
sentimento, torna-se capaz de maldades incalculveis. Numa frase, seu
mentor, Mestre Yoda, resume bem o que se passa na mente de um
indivduo com essa natureza: O medo o caminho para o lado negro. O
medo leva raiva. A raiva leva ao dio. O dio leva ao sofrimento.
O sofrimento tambm est presente na trajetria de Zelig, personagem
criado por Woody Allen no filme homnimo. Com traos tpicos dos TPs
evitativo e dependente, Zelig vive sombra de qualquer pessoa a quem
queira agradar e por quem gostaria de se sentir amado. Quando se
encanta por algum, ele assume o jeito de ser daquele indivduo ou
daquele grupo , tal sua necessidade de se sentir includo. Na cena
inicial do filme, o personagem est numa festa. Enquanto circula em meio
aos convidados, age e fala de maneira esnobe. Ao entrar na cozinha,
assume a postura e o vocabulrio de algum menos refinado. Uma
psiquiatra tenta ajud-lo, mas a habilidade camalenica torna Zelig uma
celebridade. E, como toda pessoa que tem o trao evitativo, ele no
suporta os holofotes e desaparece. O fato que, para disfarar seu medo
de rejeio e seu sentimento de inadequao, Zelig fica invisvel: veste a
personalidade do outro para permanecer escondido.
Esse jeito inflexvel de ser, perturbado e perturbador, nos leva
definio de transtorno de personalidade. E quanto chamada psicopatia,
numa traduo livre do grego, alma sofredora? Tanto o DSM-5 quanto a
CID-10 no a consideram uma condio mdica. Apesar de muito debate,
a hiptese mais aceita hoje de que se trata de um transtorno grave de
personalidade antissocial.
Por muitos anos, o conceito de psicopatia caiu em desuso. luz da
psicanlise, no incio do sculo XX, essas perturbaes mentais eram
consideradas no espectro das neuroses. Em 1941, o psiquiatra americano
Hervey Cleckley, em seu livro A mscara da sanidade, listou dezesseis
caractersticas para a psicopatia, e o conceito passou a ser vinculado ao
denominado transtorno antissocial da personalidade, segundo as
classificaes atuais. Dcadas depois, o psiclogo canadense Robert Hare,
baseado na classificao de Cleckley, criou a Escala PCL-R, que usa o
conceito de psicopatia para classificar as pessoas com caractersticas de
um estilo antissocial grave, marcado por uma pontuao alta em traos
ligados a mentira, manipulao, estilo de vida parastico, ausncia de
remorso e culpa, falta de empatia, frieza, insensibilidade, prazer em
GRUPO A
Estou cansada, cada vez mais incompreendida e insatisfeita
comigo, com a vida e com os outros. Diz-me, por que no
nasci igual aos outros, sem dvidas, sem desejos de
impossvel? E isto que me traz sempre desvairada,
incompatvel com a vida que toda a gente vive...
FLORBELA ESPANCA
ESQUIZOIDE: NO LEVARIA
NINGUM PARA UMA ILHA
DESERTA.
DIAGNSTICO
A prevalncia do transtorno de personalidade esquizoide maior no sexo
masculino. Os traos aparecem a partir da infncia. A criana brinca
sozinha no recreio, tem poucos amigos e um rendimento escolar abaixo
da mdia. As caractersticas tornam o indivduo um alvo fcil para
provocaes.
Na avaliao do trao esquizoide, importante levar em considerao
que fatores sociais e culturais influenciam em comportamentos que
podem ser confundidos com as caractersticas do transtorno. Imagine
uma pessoa criada numa cidade pequena do interior e que se muda para
uma metrpole. A adaptao ao novo ambiente, algumas vezes, cria um
isolamento emocional, que se manifesta em atividades solitrias, na
dificuldade de compartilhar sentimentos e na falta de comunicao de
modo geral. Aos olhos dos outros, o sujeito parece hostil, frio e
indiferente. Nesse caso, porm, estamos falando de uma manifestao
temporria, que tende a passar medida que o indivduo se adapta ao
novo ambiente.
O transtorno de personalidade esquizoide diferente de outras
patologias transtorno delirante, transtorno bipolar, transtorno
depressivo ou esquizofrenia , que se caracterizam por um perodo de
sintomas psicticos persistentes, com delrios e alucinaes. Tambm
precisamos considerar que no incomum indivduos solitrios
apresentarem facetas de comportamento esquizoide. Mas o diagnstico
do transtorno de personalidade depende de esses traos causarem
prejuzo ou sofrimento significativo ao paciente ou s pessoas que o
rodeiam.
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
A estranheza, o mal-estar e o constrangimento que um esquizoide pode
causar no convvio social so frutos de uma srie de caractersticas desse
estilo. Essa pessoa tem uma afetividade embotada e uma clara falta de
interesse e prazer por quaisquer atividades do trabalho ao sexo, nada
parece realmente chamar sua ateno.
Essa indiferena cria um distanciamento que, aos olhos dos outros, soa
como desprezo e frieza emocional. A consequncia a tendncia ao
isolamento, que pode significar sofrimento tanto para ela quanto para os
que esto ao seu redor.
ESQUIZOTPICO: NO LIMITE.
DIAGNSTICO
Os primeiros sintomas do transtorno de personalidade esquizotpico
podem aparecer na infncia e na adolescncia. So crianas e jovens
solitrios, com poucos amigos, fraco rendimento escolar e sensibilidade
excessiva, que usam uma linguagem peculiar e descrevem fantasias
anticonvencionais. Como parecem estranhos, podem sofrer bullying.
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
Do script de um esquizotpico podem sair caractersticas que causam
desconforto e mal-estar, tanto para ele quanto para as pessoas que o
rodeiam. Indivduos com essa natureza so desconfiados e incoerentes,
podendo ter crenas estranhas e ideias de perseguio. Sua ansiedade
social o outro fator de incmodo para quem convive com eles. Os
relacionamentos tambm so difceis, porque o indivduo demonstra seus
sentimentos de maneira peculiar e pouco convencional.
PARANOIDE:
DE OLHOS BEM
ABERTOS.
que querem elimin-lo por causa de suas denncias, mas nada comprova
essa tese. A trama em crculos tipifica bem o indivduo com essa natureza.
Sua expectativa de traio e rejeio costuma deflagrar reaes em
quem tem o mesmo transtorno, o que contribui para ele confirmar com
mais nfase suas suspeitas iniciais.
Se o Big Brother previsto por George Orwell em 1984 tornou-se quase
realidade, com o mundo sob vigilncia constante, o indivduo desse tipo
encontra terreno frtil para dar vazo a sua natureza. Afinal de contas,
para ele, desconfiana leva a controle. Estar rodeado de cmeras e de
equipamentos de segurana facilita a vida de quem anda sempre atento
aos perigos reais ou, na maioria das vezes, imaginrios. Em traduo
livre, a letra da msica Every breath you take, da banda The Police,
explica bem a questo. So indivduos que a cada respirao, a cada
movimento, a cada passo, esto observando voc. Por voc, neste caso,
leia-se qualquer um que os rodeie.
Na fico ou na vida real, o paranoide vive em estado de observao,
vigilncia e controle. Num blog, o funcionrio de uma loja revela que
largou o emprego, cansado de, diariamente, ter que prestar contas ao
chefe, que no acreditava no baixo nmero de vendas e desconfiava de
que estivesse sendo roubado.
Pensar em vigilncia em nveis to extremos caracterstica tpica dos
indivduos com esse trao. Eles avaliam as pessoas antes de se
envolverem com elas e relutam em confiar nos outros, porque temem
fornecer informaes que possam ser maldosamente usadas contra si
mesmos. Portanto, precisam manter um elevado controle daqueles ao seu
redor. Num primeiro instante, so reservados e cautelosos e parecem
mais tmidos do que antipticos. Depois que firmam laos, tendem a
respeit-los, pois valorizam bastante a fidelidade e a lealdade.
No espere, porm, que um indivduo com essa natureza se entregue
por completo nos relacionamentos mais ntimos: ele faz questo de
manter sua independncia e autonomia. Dificilmente algum consegue
ultrapassar a blindagem afetiva imposta aos outros pelos paranoides.
A blindagem tem ainda outro efeito: as pessoas que tm esse trao no
se expem, nem mesmo no anonimato das redes sociais. Eles at criam
grupos para discutir seus problemas, mas conseguir acesso a esses
grupos requer pacincia e habilidade. Provavelmente, exigiro provas de
que voc no ir tra-los. Na avaliao de algum com trao forte de
desconfiana, sempre h um inimigo pronto para prejudic-lo. Na minha
cabea, as pessoas me odeiam e me julgam pelas minhas costas, afirma
um paciente paranoide.
Outro aspecto a ser ressaltado so as suspeitas infundadas de que
esto sendo trados por cnjuges ou parceiros sexuais. No toa que,
quando se envolvem numa relao amorosa, as pessoas com esse trao
tendem a exagerar no cime. Vasculho os bolsos, o celular, a carteira da
minha mulher. Sei que ela est me traindo, mas ainda no consegui a
prova, declara uma pessoa diagnosticada como paranoide. A msica
Meu cime, de Roberto Carlos, ilustra at que ponto esse sentimento
pode chegar:
Sua ausncia aumenta a imaginao
E o pior que acredito
em coisas sem razo
Mas tudo fantasia
o meu cime.
Outra paciente conta que o namorado j tomou seu celular, obrigandoa a manter escondido um telefone para falar com a famlia. O infundado
medo de traio levou o rapaz a proibir a namorada at de fazer contato
com outras pessoas.
Em famlia, pessoas com traos marcantes e persistentes de
desconfiana acentuada podem exagerar na tentativa de manter o
controle, o que se manifesta de variadas formas. Tendem a evitar novas
amizades e intimidade com estranhos. provvel que equipem a casa
com muitos dispositivos de segurana. Frequentemente se interessam
por aprender a manejar armas de fogo e chegam at a colecion-las.
Tambm podem demonstrar preocupao excessiva com doenas
imaginrias.
Com os filhos ou outras pessoas prximas, o indivduo de estilo
paranoide pode assumir o papel de inquisidor, fazendo perguntas
capciosas e excessivas, parecendo se esquecer do sentido da palavra
privacidade. No filme As tartarugas ninja, a divertida histria juvenil, o
rato mutante Mestre Splinter responsvel pelos heris adolescentes
Leonardo, Donatelo, Michelangelo e Rafael. Para proteger seus meninos,
ele os mantm num subterrneo do metr, rodeado por equipamentos de
segurana e sob vigilncia 24 horas por dia. Subir superfcie, nem
pensar. Lgico que o quarteto o desobedece, e o desespero de Splinter ao
ver que fugiram de seu controle bem caracterstico das reaes de um
DIAGNSTICO
O transtorno de personalidade paranoide mais comum em homens. Os
traos podem aparecer na infncia e adolescncia, com relatos de baixa
sociabilidade, rendimento escolar sofrvel e ansiedade social. Muitas
vezes, as crianas so tachadas de estranhas ou excntricas.
Para a Associao Americana de Psiquiatria, o diagnstico est relacionado a sete
caractersticas:
Suspeita, sem embasamento, de estar sendo explorado, maltratado ou enganado;
Preocupao injustificada com a lealdade de amigos e scios;
Incapacidade de confiar em quem quer que seja;
Percepo de significados ocultos em qualquer situao;
Guarda rancores;
Acredita sofrer ataques a seu carter ou a sua reputao que no so percebidos pelos
demais;
Tem dvidas constantes sobre a fidelidade do parceiro.
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
Na bagagem emocional do indivduo com transtorno de personalidade
paranoide no faltam elementos para causar danos a si prprio ou s
pessoas de sua convivncia. Ele desconfiado, rancoroso, agressivo e
ciumento. Tem um comportamento hostil e, como acredita estar sendo
perseguido, facilmente revida assumindo o papel de perseguidor. Quando
acha que foi trado mesmo que no tenha uma prova sequer , pode se
tornar vingativo. Suas ideias paranoides tambm o levam s raias do
fanatismo.
GRUPO B
Este um fenmeno totalmente novo na histria da
humanidade: importante aparecer em pblico. A
importncia de se exibir, at agora, era exclusiva de alguns
assassinos em srie, que queriam chamar a ateno dos
jornais e da polcia. Agora, so as pessoas comuns que tm
essa necessidade. como compartilhar uma colonoscopia
com o mundo.
UMBERTO ECO
ANTISSOCIAL:
OS FINS
JUSTIFICAM
OS MEIOS.
DIAGNSTICO
O transtorno de personalidade antissocial mais comum entre homens, e
h estudos indicando que ter um parente de primeiro grau com o
transtorno acarretaria uma predisposio ao problema. comum que
indivduos com essa natureza tambm apresentem caractersticas dos
TPs narcisista, borderline e histrinico. No h tratamento ou remdio
que auxilie quem tem esse transtorno, mas, com o passar do tempo, os
traos podem se suavizar.
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
Listar as armas que um indivduo com estilo antissocial usa para atingir o
outro no simples. Ele se mostra abusador e agressivo, mas astuto o
suficiente para que seu jeito controlador e arrogante no parea to
evidente quanto seu comportamento sedutor e manipulador.
Imprudente e impulsivo, o indivduo com esse trao tende a mentir
para enredar suas vtimas. Como bom parasita social, est sempre em
busca de algum para explorar. um legtimo predador, que no para de
rondar possveis presas.
Eis a outro trao dos indivduos borderline: como lidam mal com a
palavra no, podem reagir com violncia quando contrariados. Uma
simples discusso no trnsito chega rapidamente s vias de fato. Assim
como o jovem Holden Caulfield, o indivduo com esse transtorno tenta, a
todo custo, preencher o vazio existencial que o incomoda, seja em famlia
ou nos relacionamentos amorosos. Pula de galho em galho, procura de
algo que sequer consegue explicar direito o que .
Porm, preciso tomar cuidado para no confundir as coisas.
Adolescentes e jovens adultos com problemas de identidade em
especial quando embalados pelo uso de lcool e drogas tendem a
apresentar, transitoriamente, comportamentos similares ao estilo
borderline. So episdios caracterizados por instabilidade emocional,
dilemas existenciais, incertezas sobre a orientao sexual ou a carreira
profissional.
Na vida do indivduo com esse trao, episdios assim tambm
acontecem, mas repetidamente ou com frequncia, e no apenas em
situaes de estresse. Quem convive com pessoas com estilo borderline
sabe que elas avaliam a prpria imagem de maneira inconstante, com
mudanas sbitas e dramticas de opinio. O mesmo vale para o trabalho,
a identidade sexual e o afeto pelos outros. E no se espante se, de uma
hora para outra, a tristonha vtima assumir o papel de vingador de
sofrimentos passados. Esses indivduos costumam sentir um contnuo
mal-estar, aliviado apenas em raras e honrosas ocasies.
Ousados e com necessidade de adrenalina, muitos deles viram
praticantes de esportes radicais ou levam seu organismo ao extremo
seja usando drogas, levando uma vida sexual promscua e desprotegida
ou dirigindo perigosamente. Monotonia uma palavra que no cai nada
bem no dicionrio de quem apresenta esse trao.
Na vida real, os relacionamentos com pessoas de estilo marcadamente
borderline tambm costumam ser desastrosos. Amy Winehouse, em
Tears dry on their own, cantava:
Eu no entendo
por que estresso um homem
quando h coisas to mais importantes
poderamos no ter tido nada.
DIAGNSTICO
Para diagnosticar algum com esse transtorno, a Associao Americana de Psiquiatria aponta
nove traos:
Esforos desesperados para evitar o abandono real ou imaginado;
Padro de relacionamentos interpessoais intensos e instveis;
Perturbao da identidade, com instabilidade da percepo sobre si mesmo;
Impulsividade em pelo menos duas reas autodestrutivas (consumismo, abuso de lcool e
drogas, sexo sem proteo);
Recorrente comportamento suicida ou automutilante;
Instabilidade afetiva;
Sentimento crnico de vazio;
Raiva intensa e difcil de ser controlada;
Ideao paranoide em momentos de estresse.
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
Dentro do vulco prestes a entrar em erupo representado pelo estilo
borderline, encontramos uma lista de elementos explosivos. Acima de
tudo, os indivduos com essa natureza so autodestrutivos e impulsivos.
Nas relaes interpessoais, mostram-se ciumentos, possessivos,
chantagistas, dramticos e instveis. Tambm so irresponsveis e
manipuladores, e tm tendncias suicidas.
A vida de Sandra sempre foi um palco. Pelo menos, assim que ela
pensa, e azar de quem no teve a sorte de ser to encantador quanto ela.
Desde o fim da adolescncia, usa a seduo para conseguir o que quer.
Quando a estratgia d errado, apela para outros argumentos com pelo
menos dois ex-namorados, ameaou suicdio. Bastou retomarem o
relacionamento para que ela dispensasse os rapazes. Fantica por boa
forma e beleza, bate ponto diariamente na academia e muda de atividade
fsica a cada modismo que surge. Tem uma prateleira repleta de cremes
caros, faz todo tipo de tratamento com a dermatologista e seu guardaroupa poderia muito bem ser o de uma estrela de Hollywood. Seu marido,
Marcos, executivo de uma multinacional, no se lembra de t-la visto de
cara lavada at na maternidade e no resguardo dos trs filhos contratou
uma maquiadora, para receber a contento as visitas. Em qualquer
ambiente que chega, Sandra deseja ser o centro das atenes. Quer faz-la
feliz? Arrume um convite VIP para um camarote badalado. Quer irrit-la?
Tente roubar sua cena. Em famlia, quando isso acontece, ocorrem crises
de choro, chantagem emocional, mal-estares sbitos e a velha histria de
que ningum a compreende, a ama nem valoriza o afeto que dispensa. Os
filhos at desconfiam de que tudo no passa de faniquito, mas melhor no
contrariar. Entre as amigas, quem ousa aparecer mais bonita, mais
arrumada ou ser melhor anfitri, por exemplo, est condenada a uma
falsidade que encobre sua frieza glacial. Mesmo proclamando aos quatro
ventos seu amor por Marcos, continua jogando charme para todos que a
rodeiam. 100% sexy, diz uma camiseta que adora usar. Dona de gestos
teatrais, tem sempre uma histria para contar, naturalmente melhor,
mais impressionante ou mais dramtica que a de seu interlocutor. Nas
redes sociais, publica fotos de seu armrio com roupas de grife, de seu
carro, do prato delicioso que comeu no restaurante da moda e das frias
que passou numa praia paradisaca. Gosta de se vangloriar de ter milhes
de amigos, embora inclua nessa categoria pessoas que nem de longe
privam de sua intimidade.
diz a letra, interpretada pela estrela que parece seguir risca a ideia
falem mal, mas falem de mim e tem sua vida exposta diariamente nas
revistas de fofocas.
Pessoas com traos de personalidade histrinica, como Sandra, uma
das personagens da histria que abre este livro, so intensas,
extrovertidas, teatrais. Esto sempre em busca de ateno, pouco importa
se positiva ou negativa. No senso comum, so aqueles indivduos que,
para atrair os holofotes, penduram uma melancia no pescoo ou simulam
um desmaio, quando contrariados. O importante que todos os olhares
estejam voltados para ele. Querem protagonizar a cena dos eventos
cotidianos, que tratam de valorizar e glamorizar. Nas relaes
interpessoais seja em casa, no trabalho ou em sociedade , investem
tempo, dinheiro e energia para impressionar o outro, sendo hbeis em
seduzir com sua atitude e aparncia. Se preciso, usam a sensualidade
como arma. Em geral, tm um humor peculiar, o que pode lhes garantir
muitos aplausos, gargalhadas e curtidas, seja na vida real, seja nas redes
sociais. Em resumo, os indivduos com esse trao fazem de tudo para
aparecer.
Vivemos um momento cultural propcio para o desabrochar desse
estilo. a chamada civilizao do espetculo, na definio do escritor
Mario Vargas Llosa. O leitor ou consumidor abdica de um esforo
intelectual maior, em busca do prazer instantneo e barato, que dispensa
DIAGNSTICO
De acordo com a Associao Americana de Psiquiatria, a avaliao feita a partir das seguintes
caractersticas:
Desconforto em situaes em que no o centro das atenes;
Comportamento sexualmente sedutor e exagerado;
Mudanas emocionais rpidas;
Discurso grandiloquente, mas carente de detalhes;
Dramatizao das emoes;
Uso excessivo da aparncia fsica para atrair olhares;
Personalidade sugestionvel;
O indivduo acredita que as relaes pessoais so mais ntimas do que de fato so.
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
So comuns ameaas ou tentativas de suicdio, episdios de chantagem
emocional e crises explosivas de cimes. Mentira, dramatizao e
manipulao dos fatos tambm so traos comuns. No raras vezes,
ocorrem episdios de somatizao, fazendo surgir sintomas de
determinada doena. Acima de tudo, a seduo a maior arma para
enredar o outro em suas demandas emocionais.
Da minha vida
eu falo muito
mas quando querem conversar comigo
eu nem escuto.
DIAGNSTICO
Essa patologia mais comum entre os homens. Os traos de
personalidade podem piorar com a idade, e o profissional precisa tomar
cuidado para no confundir as facetas do narcisista com episdios de
mania ou hipomania (alterao de humor fora do convencional).
A Associao Americana de Psiquiatria indica oito caractersticas que devem ser levadas em
conta para o diagnstico:
Sensao grandiosa quanto prpria importncia;
Fantasias de sucesso ilimitado, na vida profissional e na amorosa;
Crena de ser algum nico e especial;
Demanda excessiva por ateno;
Certeza de possuir direitos exclusivos;
Carncia de empatia;
Tendncia a ser explorador nas relaes interpessoais;
Comportamento arrogante e insolente;
Propenso a ter inveja e se sentir alvo de inveja.
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
Na mente da pessoa com o transtorno de personalidade narcisista, no
faltam ferramentas para tornar miservel a existncia do outro.
Arrogante, abusador, desdenhoso e dominador, o indivduo com essa
natureza egocntrico e frio diante do sofrimento alheio.
Seu sentimento de grandiosidade fora do convencional, e ele fica
irritado com qualquer situao em que no receba o destaque que julga
lhe ser de direito. Alm de tudo, invejoso: est sempre de olho grande
GRUPO C
Sofremos muito com o pouco que nos falta e gozamos pouco
o muito que temos.
WILLIAM SHAKESPEARE
DEPENDENTE:
POR VOC EU
LARGO TUDO.
SIMBIOSE
luz da biologia, trata-se de uma relao mutuamente vantajosa entre
organismos vivos. Na esfera do comportamento humano, essa palavra
perfeita para definir o que se passa na mente do indivduo com
transtorno de personalidade dependente. Seja nas relaes familiares, no
trabalho ou com amigos, o indivduo com esse trao precisa do outro para
florescer. A seiva de sua vida no est em si prprio, mas em algum que
se torna o ar que ele respira, o brilho de seus olhos, a razo de sua
existncia. Se pudesse, ele estaria gravado na pele de seu objeto de
interesse. Na msica Tatuagem Chico Buarque canta:
Quero ficar no teu corpo
feito tatuagem
DIAGNSTICO
Para o diagnstico do transtorno de personalidade dependente, a Associao Americana de
Psiquiatria relaciona oito fatores:
Dificuldade para tomar decises cotidianas sem um aconselhamento excessivo;
Terceirizao da responsabilidade sobre as principais reas de sua vida a outras pessoas;
Raras manifestaes de desacordo, para no perder apoio ou aprovao;
Falta de iniciativa para comear novos projetos ou fazer coisas por conta prpria;
Ida a extremos para obter carinho e amparo;
Sentimento de desconforto quando sozinho, por se acreditar incapaz de cuidar de si mesmo;
Medo irreal de ser abandonado prpria sorte;
Busca urgente de outra relao como fonte de cuidado aps o trmino de um relacionamento
ntimo.
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
Ao contrrio de outros transtornos de personalidade, em que os
indivduos parecem bombas-relgio prestes a explodir, o dependente tem
um estilo mais introspectivo, embora igualmente danoso. Carente,
dependente e inseguro, ele se torna asfixiante para quem vive a seu lado.
O medo excessivo de ser abandonado faz com que sempre se anule
perante o outro, e essa passividade pode ser constrangedora. O
pessimismo arraigado tambm o leva a se considerar vtima o tempo
todo.
EVITATIVO:
NA MOITA.
exige enfrentar os prprios medos, coisa que esses indivduos nem ousam
tentar. Vocs conseguem deixar as pessoas se aproximarem? Quando
algum tenta conversar comigo e percebo que quer mesmo me conhecer,
instintivamente me afasto ou fico fria. Tenho medo que me critiquem, me
julguem ou me rejeitem quando descobrirem a minha vida vazia, explica
uma jovem identificada com esse transtorno. De fato, sua conduta
temerosa e tensa pode provocar o ridculo e o deboche por parte dos
outros. Essa reao acaba confirmando seu sentimento de inadequao.
Se no fosse tmido, teria tido uma vida melhor, admitiu, numa
entrevista, o cineasta Woody Allen, que, em seus filmes, traduziu muitas
das caractersticas de indivduos com traos evitativos. Seus personagens
sofrem por amor, j que no conseguem vencer o medo de sofrerem
rejeio. Preocupam-se excessivamente com a opinio alheia, a ponto de
paralisarem suas aes quando criticados. Muitas vezes o diretor escala
outro ator para interpret-lo quase sempre um gal. Pense no mgico
de Scoop O grande furo, no jornalista esportivo de Poderosa Afrodite ou
no advogado de Contos de Nova York. Todos vivem s voltas com
relacionamentos platnicos, relaes familiares aparentemente
inabalveis e carreiras que no deslancham. S h um tipo de amor que
dura: o no correspondido, disse o cineasta, numa de suas clebres
tiradas.
Enfrentar o universo das relaes amorosas , em geral, um grande
desafio para os indivduos com esse trao. Eles desejam aceitao e
afeio e podem fantasiar relacionamentos idealizados. Em famlia, mal
ou bem, h alguma tranquilidade. Quando se sente protegido, o sujeito
desse tipo consegue deixar fluir sua criatividade. Poetas, escritores,
msicos... O mundo das artes est repleto de personalidades que, de uma
forma ou de outra, retrataram em sua obra alguma caracterstica do tipo.
Chico Buarque, por exemplo, criou a Carolina, para quem o tempo
passou na janela e s ela no viu.
A arte um esquivar-se a agir, ou a viver. O que no temos, ou no
ousamos, ou no conseguimos, podemos possu-lo em sonho, e com esse
sonho que fazemos arte, afirmou Fernando Pessoa tambm no Livro do
desassossego. Expressar-se pela arte um dos caminhos que muitos
acabam escolhendo. Em versos ou desenhos, conseguem falar de si e de
seus sentimentos sem precisar encarar o outro.
Ficar vontade... Que misso difcil para algum com estilo evitativo.
Mas viver preciso, e esses indivduos acabam bolando estratgias para
superar, ainda que timidamente, o temor, quase sempre infundado, de
DIAGNSTICO
O comportamento evitativo costuma dar seus primeiros sinais na
infncia. Crianas tmidas, isoladas e com medo de desconhecidos ou de
novidades podem desenvolver o transtorno na vida adulta. Porm, isso
no significa que a timidez em crianas ou adolescentes seja,
necessariamente, um indcio de problema futuro. Muitas vezes, trata-se
de atitudes normais do desenvolvimento.
Para fazer o diagnstico, a Associao Americana de Psiquiatria aponta sete caractersticas:
Evitam atividades profissionais que incluam contato interpessoal significativo;
No se envolvem com outros sem a certeza de que sero bem recebidos;
So reservados nos relacionamentos ntimos, por vergonha ou medo do ridculo;
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
No perfil do indivduo com o estilo evitativo, algumas caractersticas
podem tornar a convivncia bem complicada. Ele se revela
excessivamente ansioso e autocrtico, o que causa mal-estar a si mesmo e
aos outros. Alm disso, tambm fbico, inseguro e medroso. Sem falar
que, pela total falta de autoconfiana, tende a agir e pensar de forma
pessimista.
reservado.
A ajuda de profissionais especializados tambm pode ter efeitos
positivos. Um dos objetivos do tratamento dar ferramentas ao paciente
para lidar melhor com as situaes que lhe causam ansiedade. Ele
levado a se expor com quem se relaciona melhor e, aos poucos, pode se
mostrar mais para os indivduos com quem tem menos intimidade. A
terapia cognitiva comportamental vem se mostrando til, por meio de
recursos que envolvem treinamento social e desenvolvimento de
habilidades: como iniciar e manter uma conversa, falar em pblico, fazer
e aceitar elogios e crticas, expressar sentimentos e opinies e defender
os prprios direitos, entre outras aes importantes para uma
convivncia social sem maiores atropelos.
Acima de tudo, preciso respeitar o desejo de solido de indivduos
com essa natureza. A banda inglesa Depeche Mode, na msica Enjoy the
silence, canta:
Palavras so como a violncia
quebram o silncio
vm colidindo
dentro do meu pequeno mundo
OBSESSIVO-COMPULSIVO:
LINHA DURA.
rotina. Sabe aqueles amigos que sempre viajam para os mesmos lugares e
frequentam os mesmos restaurantes? Pois , so assim os indivduos com
essa natureza. Mesmo em momentos de lazer, a agenda fica cheia de
atividades. Alguns podem at levar tarefas do trabalho na viagem, para
no perder o contato com suas obrigaes.
Com os amigos, tambm preferem encontros em atividades
organizadas, como o tradicional futebol aos domingos. preciso entender
que, para essas pessoas, tudo precisa ser meticulosamente organizado e
planejado, seja um churrasco em famlia ou a apresentao de uma
proposta de trabalho. Preparo a festa de aniversrio dos meus filhos com
um ano de antecedncia, conta a me de duas crianas, de 8 e 5 anos,
diagnosticada com esse transtorno. Sei exatamente quantos docinhos os
convidados comeram em cada uma delas, completa.
Passatempos e atividades de lazer so levados realmente a srio.
Portanto, exigem organizao criteriosa e trabalho duro para serem
realizados, sempre visando a perfeio. Esses indivduos podem
transformar jogos e brincadeiras em tarefas estruturadas.
O perfeccionismo e os padres elevados de desempenho autoimpostos
acabam sendo fonte de desconforto e sofrimento para pessoas com
marcante trao obsessivo-compulsivo. Essa faceta costuma aparecer na
forma de dvidas incessantes sobre o que fazer, escolher, comprar e
falar, pois nada parece suficientemente perfeito.
Na fico, no faltam exemplos de personagens com estilo obsessivocompulsivo, como o detetive Hercule Poirot, criado por Agatha Christie.
Dotado da chamada memria fotogrfica por sinal, caracterstica
frequentemente atribuda pessoa do tipo , o detetive consegue
registrar a cena de um crime com tanto detalhe, que qualquer coisinha
fora de ordem identificada num primeiro olhar.
Esse talento, porm, tambm faz Poirot se irritar quando percebe, por
exemplo, que num restaurante os talheres no esto numa posio
simtrica em relao ao prato. Poirot gostava bem menos das outras
tradies relacionadas quele caf: ter de posicionar os talheres, os
guardanapos, o copo dgua corretamente, ao chegar e se deparar com
tudo desalinhado. Para as garonetes, bastava que os itens estivessem
em algum lugar qualquer um da mesa. Poirot discordava e fazia
questo de impor a ordem assim que chegava, diz um trecho de Os
crimes do monograma, livro escrito por Sophie Hannah, com o
personagem de Agatha Christie.
Na sociedade moderna e, em especial, no mundo corporativo , esse
DIAGNSTICO
O transtorno de personalidade obsessivo-compulsivo aparece duas vezes
mais nos homens do que nas mulheres. importante observar que
DIFICULDADES NA CONVIVNCIA
O senso crtico exagerado, consigo e com os outros, pode causar muitos
danos ao indivduo obsessivo-compulsivo e s pessoas a seu redor. Ele
tambm autoritrio e inflexvel. Perfeccionista ao extremo, acaba se
tornando indeciso: reluta em agir, justamente por medo de errar. Porm,
impiedoso e implacvel com o erro alheio.
Moralista, segue padres rgidos de comportamento e de rotina. Trata
o dinheiro com cuidado especial prefere abrir mo de um estilo de vida
condizente com seus recursos para poupar, pensando em possveis
problemas futuros.
SALVANDO A
PRPRIA PELE
Quem convive com algum psicopata do cotidiano precisa entender que
criar falsas esperanas sobre a mudana do outro pode ser uma
armadilha. A primeira modificao para a melhor convivncia, evitando
experincias traumticas, ter que acontecer em voc. Entenda nas
perguntas e respostas abaixo o ambiente ao seu redor para que voc
consiga administrar essa convivncia da melhor forma possvel:
O que personalidade normal?
Personalidade o resultado da combinao do temperamento e do
carter, ou seja, a combinao de fatores constitucionais e ambientais.
Temperamento a disposio emocional regulada biologicamente e
herdada. J o carter se forma ao longo do desenvolvimento, em
consequncia da interao com tudo que vivenciamos no ambiente. Uma
vez que a personalidade uma estrutura dinmica, a normalidade
torna-se intrnseca capacidade de flexibilidade e adaptao aos
diversos estmulos do cotidiano.
Um temperamento pode ser melhor do que outro?
Todos temos alguma variedade de temperamento. Mas possvel
identificar alguns tipos predominantes em meio a essa diversidade, cada
um com expresses positivas e negativas. Assim, observar o
temperamento desde a infncia, estimulando as manifestaes
construtivas e minimizando as destrutivas, mostra-se uma das mais
importantes profilaxias para a formao de personalidades saudveis.
Mau carter e bom carter? Isso existe?
Podemos falar em carter imaturo e amadurecido. O processo de
amadurecimento do carter est ligado ao reforo dos aspectos do que
O INFERNO SO
OS OUTROS
A essa altura, provavelmente, voc j identificou as Paulas, Rodrigos,
Ronaldos, Sandras e Marcos e tantas outras pessoas
perturbadas/perturbadoras que esto ao seu redor. Talvez tenha
compreendido por que alguns indivduos lhe causam contnuo mal-estar.
natural que surjam perguntas: ser que meu filho tem um trao desses?
Como identifico uma caracterstica patolgica de personalidade? H cura
para essas perturbaes?
Alguns traos incipientes comeam a aparecer na transio da infncia
para a adolescncia. o caso de esquizoides e esquizotpicos. Crianas
muito caladas, com dificuldade de interao, que usam um linguajar
incomum ou inventam palavras e preferem se vestir de maneira
pouco convencional, entre outras caractersticas, merecem um olhar mais
atento e a avaliao de um profissional. Outros indcios tornam-se
evidentes precocemente no estilo antissocial. Mentir demais, ser muito
agressivo com um histrico de brigas no colgio, por exemplo , ter
dificuldade para lidar com hierarquia e autoridade so indicativos de um
transtorno de conduta.
Uma frase do filsofo francs Jean-Paul Sartre ajuda a entender como
as pessoas com transtornos de personalidade enxergam o mundo: para
eles, o inferno so os outros. No dicionrio desses indivduos, no h
espao para palavras como flexibilidade e maleabilidade. So
emocionalmente rgidos e sedimentados. Invariveis em seus princpios,
criam expectativas alm do palpvel e transformam qualquer frustrao
normal da vida num obstculo intransponvel.
O predador s existe porque h uma presa. O jogo de caa e caador
tende a ampliar as consequncias nocivas da relao. Pessoas
constantemente perturbadas por algum e que no agem para salvar a
prpria pele acabam, em algum momento, se tornando perturbadores,
num traumtico efeito domin. O funcionrio humilhado pelo chefe