O Reggae de Cachoeira

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 196

Brbara Falcn

O REGGAE
DE CACHOEIRA
PRODUO MUSICAL EM
UM PORTO ATLNTICO

1 edio
Pinana Editora
Salvador 2012

2012 by Brbara Falcn


Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida, sejam quais forem os meios
empregados, sem a expressa autorizao.
Editor
Gustavo Falcn
Editora-assistente e Curadora
Brbara Falcn
Capa, Projeto Grfico e Editorao
Lucas Kalil
Ilustrao
Luiz Fernando Pereira da Silva
Produo Grfica
Carolina Dantas
Reviso
Clara Vieira

Ficha catalogrfica elaborada por Solange Mattos CRB5/758


F181 Falcn, Brbara.
O reggae de Cachoeira: produo musical em um porto Atlntico / Brbara Falcn.
- Salvador: Pinana, 2012.
192 p. - (Sons da Bahia, v. 3).
ISBN 978-85-65792-03-5
1. Reggae - Cachoeira (BA). 2. Msica e sociedade - Cachoeira (BA). 3. Indstria
cultural - Cachoeira- (BA). 4. Identidade social - Cachoeira (BA). I. Ttulo. II. Srie.

CDD 781.646098142 20.ed.

O site oficial do projeto disponibiliza contedo indito e verses digitais dos livros.
www.sonsdabahia.wordpress.com
Direitos desta edio reservados Pinana Ideias Integradas Ltda., para distribuio gratuita.
(71) 3624-1048 l www.pinaunaeditora.com.br

Recncavo, pela libertao do homem negro


na Amrica e pelo repdio do homem branco
na frica, vamos lutar pela libertao, vamos
lutar, avante irmo.
Recncavo, Edson Gomes

Nas margens do Paraguau, em plena Amrica


do Sul, s remanescente ficar...
Remanescentes, Nengo Vieira & Tin Tim Gomes

Dedico este livro a toda famlia do reggae espalhada pelo mundo!

AGRADECIMENTOS
Agradeo aos msicos entrevistados, pela generosidade e pela lio
de vida a cada conversa que tivemos. Devo confessar que temi pela responsabilidade do pioneirismo em abordar o tema tratado nas prximas
pginas, mas sinto-me recompensada em poder contar um pouco das
suas trajetrias. Espero que, aps a leitura deste livro, mais pessoas venham a ter interesse em estudar suas obras.
Manifesto aqui imensa gratido a minha orientadora, a Prof. Dr.
Angela Lhning, pelo estmulo intelectual e, principalmente, pela simplicidade e cumplicidade. Os encontros com ela, com toda certeza, foram
a bssola que orientou toda a estrutura desse trabalho. Meus sinceros
agradecimentos aos professores Livio Sansone, Cludio Pereira e Osmundo Pinho. bibliotecria Solange Mattos pela solidariedade. Aos
colegas do Ps-Afro, pela convivncia estimulante e pela amizade. Agradeo em especial ao colega Fabricio Mota, pelas conversas e materiais
trocados, e por ter embarcado, junto colega Sueli Borges, na minha
viagem. Aposto que os nossos trabalhos tero maior alcance sendo lanados juntos e que sirvam de estmulo para que mais pessoas estudem a
msica negra da Bahia. Ao casal Carol Dantas e Lucas Kalil, que to generosamente ofereceram sua nova casa para abrigar estes trs filhos
que acabam de nascer.
Finalmente, agradeo a todos que colaboraram para a pesquisa que
originou este livro. FAPESB pela bolsa de estudos que possibilitou a
realizao desta obra. Em Cachoeira, a Mica e a Csar. Aos meus pais
Gustavo e Din, aos meus irmos Ernesto e Clara, o amor de vocs
essencial em minha vida. Aos meus tios e tias, primos e primas, amigos e
amigas, o meu mximo respeito! Ao meu companheiro, Jorge Dubman,
pelo carinho, compreenso e generosidade. Suas contribuies musicais
acabaram ecoando nesta trilha tambm.

PREFCIO
O trabalho de Brbara Falcn, que tenho agora a alegria de prefaciar,
nos permite abordar de forma elegante e informada a gnese e o desenvolvimento de uma rica e expressiva tradio esttica da modernidade
negra, o reggae em Cachoeira, o belo porto colonial s margens do imponente Paraguau. To extraordinariamente local em sua urdidura histrica, o processo em questo se explica, ao mesmo tempo, pela interface de
reconexo experincia dos povos colonizados do mundo e s correntes
globais de som e sentido que, como culturas viajantes, reinterpretam,
do ponto de vista local/particular, a prpria histria global da dispora
negra, colorida pelo cenrio local de tradio, cultura e tecnologia.
O modo sensvel com que Brbara trata o tema, nos permite reconhecer, nos agentes desse processo, sujeitos plenos e modernos,
inventores de uma tradio, que reinterpretam o prprio passado, ao
processar informaes diversas, reordenadas no dilogo com as prvias
tradies presentes na paisagem cultural do Recncavo, estaleiro colonial/transatlntico. A secular e rica histria dos sambas e batucadas, e
a fractal histria do reggae, encontram linguagem comum, ou ponto de
intercesso, no mbito da tradio poltica de resistncia discursiva anticolonial as multicolores mensagens pan-africanas e revolucionrias
da retrica reggae; e a religio, ou transcendncia, fonte espiritual de
uma tica insurgente. Estes elementos, presentes no contexto e atuados
pelos agentes, lhes permitem justamente constituir/fazer sentido a partir dessas (re)interpretaes ou tradues, que organizam o passado,
sintetizando uma verdadeira revoluo musical.
Fiel abordagem de Paul Gilroy, o trabalho nos permite interrogar
a criao de uma verso local da cultura negra do Atlntico, sem incorporar nessa abordagem nenhum tipo de devoo hierrquica, que
reporia uma hierarquia Global/Local, na medida em que a cultura negra do Atlntico feita de diversas localizaes, sendo assim justamente
fractal, como diz Gilroy. De tal sorte que as estaes (portos) da cultura

negra global esto reinterpretando-se constantemente. O reggae na Jamaica um n dessa rede, que continua a ser tecida e refeita na Inglaterra, na Colmbia, na frica do Sul. E tambm em Cachoeira/So Flix.
O mais interessante, entretanto, na discusso da autora, o modo como
essas questes ganham vida atravs de prticas sociais objetivas, levadas
adiante por agentes concretos muitos deles ainda circulantes nas ruas e
praas da Herica Cachoeira: Edson Gomes, Geraldo Cristal, Tin Tim
Gomes, Nengo Vieira, Sine Calmon e outros tantos heris populares da
nossa dispora domstica.
A autora, com muita acuidade, discute ainda o verdadeiro trabalho
de representao em torno do significante frica, pea-chave na retrica
emancipatria negra global, produzida localmente. Tal inveno opera
como interveno esttico-politica, que apoiada, como diria Bhabha, na
ciso do sujeito colonial, produz a diferena, como um dispositivo de
enunciao ativo na linguagem, um movimento poltico e que ganha, no
contexto colonial, o carter de ruptura com as formas de representao
dominantes (para a tradio cultural racializada).
A periferia (ou a margem/fronteira), podemos dizer assim, o novo
paradoxo que pode representar o povo, o prprio novo, por meio da
identificao de todas as contradies da representao negra no mercado, movimento por meio do qual os nativos, agentes conscientes de
uma revoluo cultural, mobilizam a prpria transfigurao identitria.
Ardendo, todavia, radiante, no corao dessa revoluo musical, queima
a ideia de resistncia, categoria-chave na autopercepo desses agentes, jovens guerreiros, remanescentes no Terceiro Mundo, no terceiro espao, na terceira margem do Recncavo baiano.
Osmundo Pinho
Antroplogo. Professor adjunto no Centro de Artes, Humanidades e Letras (CAHL) da Universidade
Federal do Recncavo da Bahia (UFRB), campus de Cachoeira.

SUMRIO
APRESENTAO, 13
CAPTULO I
A MSICA NEGRA DO ATLNTICO, 19
MSICA, IDENTIDADE E ETNICIDADE NA AMRICA, 21
A ONDA BLACK NA BAHIA, 35
A TRILHA DO REGGAE, 44
CAPTULO II
UM PORTO AFRO-BRASILEIRO, 63
NOTAS MUSICAIS SOBRE CACHOEIRA, 65
DO SAMBA AO AFROCANTO, 71
NO BALANO DO REGGAE, 81
CAPTULO III
O ENREDO DO REGGAE NA TERRA DO SAMBA, 95
DAS MARGENS DO PARAGUAU, 97
BOTANDO FOGO NA BABILNIA, 105
RASTAS DE CRISTO, 128
CONSIDERAES FINAIS, 141
REFERNCIAS, 145
ANEXO 1. CRONOLOGIA DO REGGAE CACHOEIRANO, 154
ANEXO 2. ANTOLOGIA DO REGGAE DE CACHOEIRA, 156

APRESENTAO
O meu interesse em tentar compor o enredo do reggae na cidade
de Cachoeira vem sendo gestado desde 1998, ano em que o primeiro
disco do gnero gravado no Brasil, o Reggae Resistncia, do cachoeirano Edson Gomes, completou uma dcada de lanado. Nesse mesmo
ano, Sine Calmon, conterrneo de Edson, conseguiu um feito indito
no carnaval de Salvador importante vitrine da produo musical no
estado teve sua msica Nayambing Blues eleita como a mais tocada nos trios eltricos.
De l para c, os fatos ligados a esta trama continuaram a chamar
minha ateno. Em 2001, resolvi entender melhor o tema e fiz uma pesquisa para o curso de graduao em Cincias Sociais, sobre o grupo
Remanescentes, formado em Cachoeira no final da dcada de oitenta.
Nesta demonstrei o pioneirismo dos cachoeiranos na adoo do ritmo
e da esttica rasta, trabalhando o reggae de forma coletiva. Retomei o
tema na pesquisa que desenvolvi para o mestrado, que a base deste
livro, em que busquei investigar a trajetria do reggae em Cachoeira,
identificando artistas e descrevendo grupos que passaram, a partir da
dcada de oitenta, a adotar o ritmo como expresso esttica preferencial.
Meu objetivo era tratar do processo de troca simblica e material desta
verso local da cultura negra do Atlntico, centrando a anlise no processo de construo de identidade destes indivduos, tendo uma conexo
com a indstria do lazer e da msica.
Em 2007 comecei a fazer entrevistas, sendo a primeira delas realizada
em Salvador, no ms de julho, com o produtor musical Wesley Rangel,
proprietrio da gravadora WR. A segunda entrevista foi feita no Guaruj/
SP, com um dos precursores do reggae em Cachoeira, o msico Nengo
Vieira. Em Salvador, realizei em novembro entrevistas com os msicos
Marco Oliveira e Geraldo Cristal. Em junho de 2008 foi feita, em So Flix, cidade vizinha Cachoeira, entrevista com o msico Edson Gomes,
em sua residncia. Gomes um dos personagens mais importantes nes-

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 13

ta trajetria, por se tratar do regueiro cachoeirano cujo trabalho obteve


maior repercusso nacional. No mesmo ms, foi entrevistado seu irmo
Tin Tim Gomes, tambm na cidade de So Flix. Todas as entrevistas
seguiram um roteiro semi-estruturado e foram gravadas, sendo posteriormente transcritas.
Os depoimentos foram de grande utilidade para anlise do discurso
dos entrevistados. Durante a pesquisa, foi reunida boa parte da discografia produzida em torno do reggae de Cachoeira (lbuns e coletneas).
Algumas fotografias de acervo pessoal dos artistas foram disponibilizadas
e digitalizadas. Tambm foram colecionadas matrias de jornais e revistas, fotografias, alm de imagens das capas e encartes dos discos. Depois
de mais de vinte anos de produo musical, alguns artistas e grupos cachoeiranos tornaram-se comercialmente bem sucedidos no mercado fonogrfico, tendo registrado suas obras e atingindo nmeros considerveis
de vendagem na Bahia e em estados como Pernambuco e So Paulo.
A produo cultural realizada em torno do gnero por artistas cachoeiranos vem tornando-se considervel, pois rene discografia de diversos
msicos, totalizando at o fechamento desta pesquisa, em 2009, 22 discos (alguns lanados ainda na fase do vinil), alm de outros meios fsicos,
como o DVD. Artistas como Edson Gomes, Nengo Vieira e Sine Calmon
ainda fazem uma mdia de cinco shows por ms, percorrendo, inclusive,
alguns estados brasileiros. Em 2008, o msico Nengo Vieira esteve em
turn brasileira, pela segunda vez em dois anos consecutivos, com o grupo californiano Christafari. Em Salvador, houve uma rara oportunidade
de acompanhar esse show na casa de espetculos Estao Ed Dez.
Para que fosse feita uma anlise do discurso desses indivduos, foi
considerada a importncia da cultura local em suas vidas e a influncia
desta em suas produes. O Recncavo se notabilizou pela legio de
poetas e cantadores que nascem h tempos em suas cidades histricas,
formadas a reboque da cultura do fumo e da cana-de-acar. A riqueza
afro-brasileira fez do seu povo especialista na tradio oral, transformada
em toda sorte de manifestao. L, a msica, nascida nas senzalas dos
engenhos de cana-de-acar, deu origem a chula, ao samba de roda e
ao lundu. Desta mistura, emergiu na regio forte veio lrico responsvel
14 l Brbara Falcn

pelo aparecimento de talentos como Castro Alves, no campo erudito e


Cuca de Santo Amaro, na literatura de cordel; alm de muitos annimos
ilustres, que mantm viva a cultura local.
O Recncavo do Brasil Colnia e Imprio transformou o sofrimento da escravido em substrato potico singular, com versos simples
acompanhados de batuques e palmas, sempre carregados de musicalidade. A msica, elemento presente no cotidiano de Cachoeira,
foi fortemente abraada pela populao como forma de expresso e
afirmao identitria, numa cultura onde a riqueza musical celebrada durante todo o ano, sendo incorporada nas mais diversas ocasies.
O samba de roda, a capoeira e a esmola cantada, por exemplo, so
manifestaes que resistiram ao tempo e ocorrem durante todo o ano,
em diferentes festejos. A famosa festa de Nossa Senhora dAjuda um
desses momentos especiais, em que msicos das filarmnicas locais
se misturam em meio aos mands e travestidos para promover um
verdadeiro carnaval na cidade.
Destaco aqui o papel que as filarmnicas tm desempenhado, desde 1870 (quando foi fundada a Lyra Ceciliana primeira filarmnica
de Cachoeira e segunda mais antiga da Bahia), verdadeiros centros
culturais de formao musical e cidadania. Fundadas e formadas basicamente por msicos negros, tiveram participao intensa na campanha abolicionista. O Maestro da Abolio, Manuel Tranquilino Bastos, foi uma figura de destaque nos movimentos em favor da liberdade
dos escravos, tendo arrastado ao som do seu Hymno Abolicionista
(composto em setembro de 1884) mais de duas mil pessoas, a maioria
recm-libertos, pelas ruas de Cachoeira, na noite de 13 de maio de
1888. Temos assim, em Cachoeira, desde o sculo XIX, a msica como
instrumento tanto de entretenimento como meio de protesto, traduzindo aqui e ali a problemtica social.
Dando um salto no tempo, indo para o sculo XXI, temos o Tincos
como um dos mais importantes grupos vocais negros do Brasil, que traz
para a msica brasileira a fora da ancestralidade africana. Mateus, Dadinho e Badu a penltima formao do grupo divulgaram, nos anos
70, no Brasil e na frica, a sacralidade ancestral. Nas suas adaptaes
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 15

dos cnticos de candombl e sambas de roda, deixaram a marca daquilo


que produziram como pioneiros.
Considerando o momento histrico e as influncias mundiais e locais
que chegam a Cachoeira, temos, nos anos 80, uma novidade nesse cenrio. Um conjunto de mudanas culturais, especialmente vividas pela
populao jovem, inaugura um perodo de revalorizao de elementos
negros e de sintonia com um ritmo recm-chegado da Jamaica, o reggae.
J em meados dessa dcada, surgem na cidade os primeiros trabalhos
influenciados por esse ritmo jamaicano. Artistas como Nengo Vieira e
Edson Gomes, que j traziam nas suas composies o lamento do povo
negro, rearranjaram suas msicas no compasso do reggae. Ambos foram
responsveis pela produo do primeiro disco do gnero gravado no
Brasil, o Reggae Resistncia (1988). Isto porque o disco que lanou Edson Gomes no mercado fonogrfico incluiu repertrio com msicas dele
majoritariamente arranjadas por Nengo.
Assim, a identidade poltico-existencial com a mensagem rasta aproximou jovens cachoeiranos do ritmo jamaicano, recriado entre os regueiros
locais; numa cultura onde a msica est presente na religio, sendo importante nas procisses e ritos de transe do candombl, viva nos folguedos e serviu, principalmente, para a juventude falar de seus problemas e
buscar ascenso no quadro de uma economia estagnada. Em Cachoeira,
o discurso contra o establishment deu o tom ao reggae, chamando ateno da juventude local que embarcou em peso numa viagem que levaria
a libertao simblica atravs da msica.
Neste livro, discutimos esse fenmeno sociomusical, tomando como
referncia a riqueza cultural de uma cidade afro-barroca que durante
muito tempo foi importante porto brasileiro na dispora negra. Trata o
reggae como o vetor disseminador da palavra do oprimido e como
ponte simblica entre a Jamaica e o Brasil, apresentando a msica
como principal elemento de identificao entre os povos. Em suma,
busca entender como se deu o processo de acolhimento do ritmo em
Cachoeira e como esse fenmeno foi interpretado dentro de um contexto local to peculiar.

16 l Brbara Falcn

No primeiro captulo do livro, A Msica Negra do Atlntico, apresento o contexto em que surge o reggae no cenrio internacional e o
caminho que ele percorreu at chegar ao Brasil. Nele, analiso a produo e o consumo deste gnero musical, entendendo que no se trata
de um fenmeno isolado, visto que acontece em conexo com outros
movimentos socioculturais, com ressonncias e determinaes histricas.
O segundo captulo traz Notas Musicais sobre Cachoeira, onde esto
personagens e cenrio que compem o quadro estudado. Nesse captulo
descrevo o ambiente musical que influenciou os msicos que acabaram
adotando o reggae como ritmo preferencial, mostrando o impacto na
conscincia individual e coletiva destes indivduos.
No terceiro bloco est O Enredo do Reggae na Terra do Samba,
que contm relatos dos regueiros de Cachoeira. O captulo rene trechos
de entrevistas dos msicos, que trazem uma descrio das suas trajetrias, deixando que suas vozes transcritas sejam aqui ouvidas. Sete,
ao todo, foram realizadas entre 2007 e 2008, na Bahia e em So Paulo,
a maioria nas cidades de Salvador e So Flix. A esto os precursores
do movimento na cidade estudada, msicos reconhecidos pela grande
mdia na Bahia e alguns reconhecidos nacionalmente. Nesse captulo,
analiso a produo em torno do reggae de Cachoeira, bem como fao
uma descrio do pblico observado durante a pesquisa de campo. Trato
tambm da importncia do componente religioso cristo na formao do
reggae cachoeirano.
A pesquisa etnogrfica inclui observao participante em diversos
shows e cultos em igrejas, o que possibilitou tanto a compreenso do
pblico que consome a produo destes artistas, quanto a maneira como
este pblico percebe e recebe o discurso veiculado nas letras das msicas.
A discografia reunida foi exaustivamente analisada, tendo como foco o
que h de comum nas letras e msicas destes artistas. O cruzamento dessas fontes facilitou a reconstituio dos fatos e a anlise do discurso dos
personagens entrevistados.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 17

CAPTULO I

A MSICA NEGRA DO ATLNTICO


No texto a seguir ser discutido o papel da msica no processo de
construo de identidades, na Amrica Negra, tentando criar uma conexo com o caso que estudo. A partir da literatura pertinente so tratadas
questes sobre cultura e identidade, associadas ao fenmeno da globalizao e da influncia que a msica exerceu neste contexto em toda a
Amrica. Examinar a importncia dos movimentos musicais e como estes estiveram ligados a movimentos sociais de diferentes procedncias
o objetivo central deste captulo. Na segunda parte do texto, busco trazer
essa discusso para o contexto da Bahia, onde, a partir da dcada de 70,
um processo de reafricanizao possibilitou uma conexo entre msica e
movimentos sociais. O terceiro bloco retoma a trajetria do reggae, desde a sua origem na Jamaica at a sua expanso para o mundo.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 19

MSICA, IDENTIDADE E
ETNICIDADE NA AMRICA
Mr. Stevie Wonderful, a onda voc, cantando um rock, um reggae, um
rhythmnblues. Ainda que os altos falantes da frica do Sul, no sintam
as emoes da nossa alma blues, alma blues...
Gueto, Nengo Vieira & Carlito Profeta

Na atualidade, a complexidade das trocas simblicas geradas


pelo processo de globalizao tem colocado em cheque as formas
tradicionais de temporizao e espao nas relaes sociais. A acelerao e o crescimento do fluxo dessas trocas, em todo mundo, levaram a sociedade a tal grau de complexidade que s possvel tratar
de contextos locais e globais se for levada em conta o fenmeno
da desterritorializao. Paul Gilroy assinala que os estados-naes
foram eclipsados por uma nova economia do poder que atribui
cidadania nacional e s fronteiras nacionais um novo significado
(GILROY, 2001, p. 90). Em termos como globalizao, est contida
a ideia de uma internacionalizao, que quase sempre foi colocada
no polo oposto do estado-nao.
Os estados nacionais, por sua vez, foram consolidados com base
em um ideal de unidade de identificaes culturais. No campo da etnicidade, as identidades de hoje tendem a exibir um grau mais elevado
de desterritorializao. Livio Sansone argumenta que os grupos tnicos
sempre viajaram, mas que hoje h mais oportunidades para a existncia de etnicidades com laos relativamente frouxos com um grupo ou
uma comunidade sociologicamente definidos baseados num territrio
especfico, ou originrios dele (SANSONE, 2004). Ele argumenta tambm que, ao longo das ltimas dcadas, parece ter evoludo um mundo
caracterizado pela diversidade cultural para uma nova situao, que
se caracteriza pela diferena tnica dentro de um contexto de relativa
homogeneizao cultural.
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 21

Nesse sentido, o socilogo Albert Melucci aponta que a modernizao exerceu influncia direta entre a posio ocupada dentro das
relaes produtivas e as culturas dos vrios grupos sociais durante a
fase do capitalismo industrial. Para ele, a multiplicao de contatos
e o constante fluxo de mensagens destruram a homogeneidade das
culturas individuais, trazendo modelos culturais estandardizados. Essas
culturas, no passado, foram caracterizadas como culturas de classe
e, paradoxalmente, nestes contextos, as classes subordinadas gozavam
de certa autonomia, sendo capazes de desenvolver prticas e formas
de comunicao qualitativamente diferentes daquelas da cultura dominante (MELUCCI, 1996, p. 367).
Contraditoriamente, nesse cenrio que emerge a heterogeneidade
simblica e sociocultural dos povos, permitindo que marquem posies
diferentes frente ao etnocentrismo ocidental, por meio de inmeras dinmicas de identificao cultural que vieram conectar populaes de diversas partes do planeta, formando novas redes de significaes e fortalecendo, de algum modo, as singularidades nacionais. Tais redes tornaram
ainda mais complexa a ambiguidade identitria, prpria dos discursos
de sntese. As diversas expresses de identidades negras na dispora
so prova disto, pois mostram que os sculos de escravido e colonizao no foram capazes de apagar o legado da civilizao africana. Para
uma anlise do processo de (re)construo dessas identidades em toda a
Amrica deve se levar em conta os novos usos e sentidos simblicos do
termo frica, dentro do contexto da globalizao. Alm disso, devemos
levar em conta que o prprio conceito de globalizao vem se tornando
cada vez mais impreciso, uma vez que o modelo de centro-periferia vem
se tornando bastante questionvel.
Embora reconhecendo que a ps-modernidade continua extremamente desigual e que no tenha se constitudo em uma nova era, o
modernismo nas ruas que lhe prprio, atravs da cultura de massas,
constata Stuart Hall, representa grande mudana no terreno da cultura rumo ao popular rumo a prticas populares, prticas cotidianas,
narrativas locais, descentramento de antigas hierarquias e de grandes
narrativas (HALL, 2003, p. 337). Para ele, as lutas em torno das di22 l Brbara Falcn

ferenas produzem novos sujeitos e novas identidades na poltica e na


cultura. Inauguram um novo tipo de poltica cultural que vale no apenas para a raa, mas tambm para outras etnicidades marginalizadas,
assim como o feminismo e as polticas sexuais no movimento gay e de
lsbicas (ib. idem, p. 338).
O campo da poltica foi ampliado pelo campo da cultura, inaugurando
a ps-modernidade, quando novas identidades culturais surgem e impem
novos arranjos sociais. Renato da Silveira, em seu ensaio Etnicidade,
destaca a diversificao do movimento social a partir da dcada de 70
antes sindical e operrio propiciando o surgimento de ideologias particulares, lutando por causas especficas e destaca a ascenso da cultura
e da etnia como estimuladoras de mobilizao poltica e agregadoras de
novas lideranas. Segundo ele, naquele momento, o grande movimento
social globalizado havia colocado na ordem do dia a questo da etnicidade e da cultura tradicional (SILVEIRA, 2005, p. 38).
Para Stuart Hall, as manifestaes contraculturais dos anos 60 foram
um marco do descentramento ps-moderno. Houve um alargamento
do campo das identidades e uma proliferao de novas posies de identidade, juntamente com um aumento de polarizao entre elas (HALL,
2002, p. 84). Hall identifica a emergncia de novas identidades, de
uma nova postura poltica, agora centrada nas diferenas e na consolidao de novos movimentos sociais afinados atravs da identidade social
de seus militantes (ib. idem, p. 21) e pontua a abertura para a contestao poltica de arenas inteiramente novas de vida social: a famlia, a
sexualidade, o trabalho domstico, a diviso domstica do trabalho, o
cuidado com as crianas, etc. (ib. idem, p. 45).
Nos anos 60 e 70, boa parte do Ocidente vivencia a contracultura,
que acaba por influenciar no s a cultura, mas a poltica, dando origem
a novas identidades na contemporaneidade. A onda da contracultura
trouxe para a poltica questes de gnero, de raa, e questes individuais, que transcenderam as questes de classe. Foi nessa poca que a
indstria cultural se consolidou, atravs da televiso, dos discos e do rdio fazendo com que essa gerao se comunicasse e se expressasse, sem
barreira de lnguas. No por acaso, a msica foi pea-chave nesse jogo,
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 23

em todo o mundo. Atravs dela a juventude experimentou novas possibilidades criativas, levando para essa forma de produo e consumo,
temticas inovadoras no campo social, como as de cor e classe.
E a Bahia no ficou de fora desse processo. A formao de algumas
de suas identidades ps-modernas est associada a esse momento, pois
sua recente reafricanizao1 um desses casos. O contexto mundial
era favorvel e os tempos eram de consolidao de uma classe mdia e
de uma elite operria na regio metropolitana de Salvador. A insero
da Bahia na evoluo da economia nacional, via Petrobras, rodovia RioBahia e Centro Industrial de Aratu, trouxe para a classe mdia a estabilidade para consumir e repensar o seu papel na sociedade. Coincidia
tambm que aquele era o momento de independncia das ex-colnias
portuguesas na frica.
Assim, em meados de 70 e incio da dcada de 80, a juventude baiana produziu uma resposta planetarizao promovida pelo desenvolvimento dos meios de comunicao e pela internacionalizao da indstria
cultural, em um momento de quebra de fronteiras entre alta cultura
e cultura de massa. Em grande medida assimilando as inquietaes
de jovens americanos e europeus, estimulados pela contracultura, que
termina por provocar nos jovens baianos o interesse pela cultura afrobrasileira, produzindo internamente uma releitura do movimento Black
Power. E, sobretudo, construindo uma nova atitude do negro baiano
diante de sua cor e do seu jeito de ser.
Esta produo cultural foi, portanto, um processo de traduo entre
mundos, linguagens e estticas, que aponta para a reinveno da frica
como elemento poderoso e subversivo. A frica foi reinventada na Bahia,
no sendo mais a do presente, nem a do passado, mas uma frica mtica,
uma metfora. Para Bacelar (1989), a dcada de 70 apresentou uma conjuntura que possibilitou o desenvolvimento desse sentido da negritude na
juventude baiana. Dentre os fatores determinantes, que propiciaram esse
quadro, esto o momento poltico brasileiro, o surgimento da contracultura, o desenvolvimento dos meios de comunicao e a disseminao da
msica popular massiva atravs dos discos, do rdio e televiso, e ainda a
ascenso educacional do negro e sua mobilidade social.
24 l Brbara Falcn

nesse contexto que surgem os grupos informais, a despeito dos blocos afro, que foram delineando uma nova esttica no carnaval baiano.
Um olhar retrospectivo aqui mostra que a esttica musical das organizaes carnavalescas o resultado de mesclas formadas pelo candombl,
pelo samba e pelas referncias internacionais chegadas dos EUA, frica
e Jamaica. importante frisar a relevncia desse movimento e da sua
natureza etnicizante, pois a disseminao da cultura negra permitiu a
segmentos da populao que jamais haviam aparecido o contato e
conhecimento dessa cultura, abrindo passagem para a sua conscientizao de natureza tnica (BACELAR, 1989, p. 96).
Destaco o importante papel da msica, que conseguiu romper a barreira das lnguas com muito mais facilidade que qualquer outra forma
de expresso, viabilizando a universalidade de uma nova conscincia.
Para Sansone, os msicos, a indstria cultural e o consumo de msica
funcionam como repetidores do processo de globalizao. Ele afirma que
enfocar aspectos da msica de forma comparativa pode oferecer novas
perspectivas para o estudo do intercmbio entre globalizao e etnicidade, e sugere uma reviso de muitas generalizaes da socioantropologia
sobre a cultura juvenil, baseadas na situao dos pases mais industrializados (SANSONE, 1997, p. 221).
Assim, com referncias jamaicanas, americanas e africanas, veiculadas pela mdia, e ao mesmo tempo somando as informaes locais, os
blocos afro encabearam o movimento de negritude local, aliando as
matrizes rtmicas ao discurso poltico. A msica que embalou o primeiro
desfile do Il Aiy em 1975 resume a metamorfose entre o black e o afro,
o soul e o ijex, o funk e o afox que escandalizou parte dos folies no
carnaval daquele ano:
Somo crioulo doido, somo bem legal, temo cabelo duro, somo black power
(Trecho da cano Que Bloco Esse de Paulinho Camafeu, 1975).

Sob as bnos da Ialorix Me Hilda Jitol, que realizou um ritual


religioso com banho de pipoca, o Il saiu pelas ruas da Liberdade afrontando parte da comunidade do prprio bairro para colocar o bloco na
rua. Vov, fundador e lder do bloco, fala sobre isso:
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 25

A matriz musical do bloco no o funksoul, mas nasce revestida pela


mesma atitude dos blacks. [...]. Pensamos em batizar o bloco de Black

Power ou Mundo Negro. S depois decidimos por uma referncia africana (Vov do Il em entrevista ao CORREIO DA BAHIA, 29/05/ 2007).

Sobre o primeiro desfile do Il, o jornal A Tarde publicou reportagem


controversa, com o ttulo Bloco Racista, Nota Destoante:
Conduzindo cartazes onde se liam inscries tais como black power e
mundo negro, o bloco Il Aiy, apelidado de bloco do racismo, proporcionou um feio espetculo nesse carnaval. Alm da imprpria explorao do
tema e da imitao americana, revelando uma enorme falta de imaginao
[...] os integrantes do Il Aiy todos de cor chegaram at a gozao dos
brancos e demais pessoas [...]. No temos felizmente problema racial. Esta
uma das grandes felicidades do povo brasileiro (A TARDE, 12/02/1975).

Em rplica ao texto do jornal, a discriminao do clube de elite e, um


tempo depois, dos blocos de carnaval de classe mdia, Vov desabafa:
As pessoas viam o bloco assim no incio porque no aceitavam a manifestao do negro e ns proclamamos o separatismo mesmo. S saa negro e
cantando eu sou nego. Isso foi um choque mesmo. Na dcada de 80 a
polcia pegava, levava preso e do nada o negro desaparecia. Ns conseguimos resgatar um pouco isso de o negro ter mais espao, de admitir que a
Bahia era racista(Vov do Il em entrevista ao site Ibahia, 18/03/2009).

Depois do primeiro desfile do Il, os blocos afro e afoxs2 se multiplicaram. Mutu, Filhos do Congo, Olodum, Mal Debal, atualmente so
mais de 803. O Filhos de Ghandi, fundado em 1949, tambm ressurgiu
em meados dos anos 70, sob a batuta de Gilberto Gil, que empresta sua
imagem frente do tapete branco. O afox Badau, criao de Moa do
Catend, em 1979, traz um dos mais aclamados danarinos das rodas de
black music, Negrizu, antes Rei do Brown ou Azulo:
De Rei do Black Soul a Anjo Barroco e Exu, titula matria do jornal A
Tarde, no princpio da dcada de 90. Pusemos azeite de dend no black,
diverte-se Negrizu, vencedor do concurso Moo Lindo Badau, em 1981
(CORREIO DA BAHIA, 29/05/2007).
26 l Brbara Falcn

Para o pesquisador e etnogrfo Osmundo Pinho (2005), essa juventude negra reinventou uma visualidade e corporalidade a partir de releituras
da cultura Soul norte-americana. Ele define a reafricanizao como um:
[...] marco, aberto e policntrico, de referncia dessas lutas polticas
pela representao em torno do negro, do corpo negro e da atualizao
local de padres mundiais de reconfigurao identitria afrodescendente. Essa reafricanizao pode ser considerada como uma mquina de
guerra que institui seu prprio teatro de operaes discursivas e sociais
(PINHO, 2005, p. 128).

A msica, uma das mais evidenciadas manifestaes da cultura popular, tem desempenhado uma importante funo no processo de construo de identidades na sociedade moderna. No por acaso, o papel
que a mesma desempenha nesse processo tem sido sempre destacado.
A produo musical reafirma sentimentos de pertencimento e diferenciao, colocando em jogo a elaborao de uma identidade multicultural.
Sobre esse aspecto, Pinho diz que:
[...] no contexto do processo referido como reafricanizao, a juventude
negra de Salvador em busca de afirmao cultural e modernidade entrou
em conexo com a onda mundial da msica negra norte-americana. James Brown e a msica funk tornaram-se, a partir dos anos 1970, mais
um dos elementos da cultura negra baiana, com uma diferena: agora
esta tambm poderia se reconhecer como internacional, falante de ingls,
jovem, corporal, articulada na relao com os bens de consumo e com
a mdia. A msica negra norte-americana comps a trama dos contradiscursos diaspricos discutida por Paul Gilroy em The Black Atlantic.
Em Salvador, esses discursos caram em solo umedecido pelas tradies
locais de interao entre brancos e negros e pelas formas tradicionais de
resistncia africana na cidade (PINHO, 2005, p. 131).

O socilogo ingls Paul Gilroy (2001) divulgou o termo Black Atlantic que hoje mais empregado por quem tenta refletir sobre a dinmica
cultural dessa dispora. O Atlntico Negro no apenas um novo rtulo
para um fenmeno antigo, tambm uma nova maneira de entend-lo.
At recentemente, a maioria dos estudos sobre tradies negras era
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 27

prisioneira da ideia de razes. Os pesquisadores tentavam encontrar


no continente americano, e onde mais comunidades negras se estabelecessem, as sobrevivncias de costumes de povos africanos, que seriam julgadas autnticas ou no a partir do grau de fidelidade com que
a origem era preservada, com a sua raiz. O conceito Black Atlantic
deixa de lado a procura dessa raiz original e navega no fluxo e refluxo
intercontinental (VIANNA, 2003).
Na verdade, desde que o primeiro navio negreiro saiu da frica, o
Black Atlantic vem se formando. O antroplogo J. Lorand Matory
(1999) mostrou, em estudos conduzidos nas costas ocidentais e orientais
do Atlntico, como complicado falar de iorubs ou de jejes antes da escravido. A moderna identidade iorub, por exemplo, no foi inventada
em um local preciso da Nigria, mas no trnsito entre Lagos e Salvador,
entre If e Havana (MATORY, 1999, p. 60). Os ex-escravos que depois
da libertao voltaram da Amrica para a frica e os outros proto-iorubs que atravessaram o oceano vrias vezes, foram fundamentais para
a criao das identidades tnicas que so foras polticas e culturais na
frica de hoje. Assim como no mais possvel dizer se determinada msica, da maneira como ela atualmente tocada na frica, foi inventada
no continente negro ou na Amrica.
Para Paul Gilroy4, a msica e as prticas culturais e sociais de origem africana na dispora negra so portadoras de um mundo melhor e
de uma crtica selvagem ao capitalismo e ao Ocidente (GILROY, 1987,
p. 39). Neste contexto, a msica negra seria uma das expresses mais
importantes para determinadas populaes e mais, em algumas situaes bem delimitadas, a expresso adequada ao nvel sociocultural e s
caractersticas de algumas comunidades no seu esforo de reconstruo
identitria.
Na opinio de Stuart Hall, a relao entre as culturas e suas disporas no pode ser adequadamente concebida em termos de origem
e cpia, ou de fonte primria e reflexo plido. Com Hall, argumento
que a proliferao e a disseminao das novas formas musicais hbridas e sincrticas no devem mais ser apreendidas pelo modelo centro/
periferia ou baseadas simplesmente em uma noo nostlgica e exti28 l Brbara Falcn

ca. A histria da produo da cultura e de novas msicas tem de ser


compreendida como a relao entre uma dispora e outra claro,
aproveitando-se de materiais e formas de muitas tradies musicais
fragmentadas (HALL, 2003, p. 31).
Segundo Hall, a produo diasprica obedece a seguinte lgica:
transplante sincretizao diasporizao. Ele chama a ateno
para alguns aspectos que caracterizam essa lgica, tais como: ausncia das ideias de origem, razes e nao; desconstruo da dicotomia
centro-periferia; hiperfragmentao de elementos e diversidade de
estilos (ib. idem, p. 41).
As tradies inventadas de expresso musical so muito importantes no estudo dos negros na dispora e da modernidade porque elas
tm ajudado a entender, atravs de experincias especficas, a crise da
modernidade e dos valores que esta produz, e, mais especificamente,
questes ligadas problemtica da identidade. Para citar exemplo de
um pesquisador brasileiro, temos o antroplogo Hermano Vianna, que
compe um quadro sobre musicalidade e identidade, onde o Atlntico
uma grande rede, com ritmos e identidades conectadas. Tendo a msica
popular como um dos principais eixos do debate cultural no Brasil, ele
delineia um cenrio que permite a elaborao e a ressignificao de discursos sobre a identidade nacional.
Vianna (1995) enfatiza os intercursos tnicos e as negociaes transculturais entre diversos atores sociais na elevao do samba como smbolo nacional. dele a citao abaixo:
A inveno do samba como msica nacional foi um processo que envolveu muitos grupos sociais diferentes. O samba no se transformou em
msica nacional atravs dos esforos de um grupo social ou tnico especfico, atuando dentro de um territrio especfico (o morro). Muitos
grupos e indivduos (negros, ciganos, baianos, cariocas, intelectuais, polticos, folcloristas, compositores eruditos, franceses, milionrios, poetas e
at mesmo um embaixador norte-americano) participaram, com maior
ou menor tenacidade, de sua fixao como gnero musical e de sua
nacionalizao (VIANNA, 1995, p. 151).
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 29

Hermano Vianna identifica traos da cultura negra naquilo que existe de mais contemporneo no cenrio musical a msica eletrnica
mencionando que o jungle, um estilo musical britnico, que contaminou todo o pop mundial, uma criao negra, inventada a partir
da releitura que DJs negros, muitos de origem caribenha, fizeram do
hip hop, que na Inglaterra se encontrou mais uma vez com o reggae,
e se hibridizou com o house e com o tecno (todos estilos negros),
produzindo uma sonoridade nunca ouvida em nenhum outro lugar do
mundo (VIANNA, 1999, p. 01).
Inspirada na ideia do Black Atlantic de Paul Gilroy (2001), a antroploga baiana Goli Guerreiro fala de uma rede atlntica, para tentar
dar conta de um processo de trocas culturais. Guerreiro inspira-se tambm em textos de intelectuais como Stuart Hall e Hermano Vianna para
desenvolver sua discusso acerca das conexes que se desenvolvem no
mundo atlntico. Segundo ela:
A rede atlntica promissora como unidade de anlise na medida
em que aponta para uma perspectiva transnacional, transtnica e
intercultural. [...]. A amplitude dessa rede nos permite explorar diversos campos artsticos. H uma produo atlntica no cinema, no
teatro, na literatura, etc. H um vastssimo acervo a ser investigado
(GUERREIRO, 2006, p. 05).

A expresso rede atlntica remete a um contexto transnacional, um


espao hbrido, onde h negociao e conflito. O espao atlntico engloba o local e o global, permitindo uma viso geral e, ao mesmo tempo,
detalhada do processo de produo cultural a engendrado. Segundo
a pesquisadora, este espao permite compreender melhor a configurao contempornea do mundo ocidental, assim como os elementos que
constituem a produo cultural que gerada nessa rede. A pesquisa desenvolvida pela antroploga teve como de partida um estudo realizado
sobre o meio musical de Salvador, mais especificamente sobre a inveno do samba-reggae. O referido estudo perseguiu pistas que acabaram
por desenhar a imagem da rede atlntica, tendo o samba-reggae como
exemplo de produo cultural hbrida. Segundo Guerreiro:

30 l Brbara Falcn

Alm das recriaes estticas que deram origem ao samba popular


urbano, elemento bsico do samba-reggae, a segunda pista so as
referncias internacionais, que vm dos Estados Unidos, da frica
e da Jamaica e se somam s informaes produzidas em Salvador.
Esse processo que est na base da inveno do ritmo, representa a
formao de uma negritude [...] (GUERRREIRO, 2000, p. 65).

A antroploga faz importantes consideraes em sua pesquisa sobre o


samba-reggae, ritmo que serviu de base para outras diversas sonoridades
na atual produo musical da Bahia5. A exemplo de outros movimentos
da musicalidade, a inveno do samba-reggae foi alm do desenvolvimento artstico local, pois trouxe uma srie de aes sociais para bairros
como o Curuzu e o Pelourinho, criando uma verdadeira Revoluo dos
Tambores6. Um dos personagens principais dessa trama, o percussionista Neguinho do Samba, integrou o Olodum durante 11 anos, pertenceu
a escolas de samba, ao bloco de ndio Apaches do Toror e ao Il Aiy.
Para o mestre da percusso, Neguinho do Samba:
A Bahia inicialmente no tinha um ritmo. Fazia um som tipo escola
de samba. De repente ns conseguimos fazer um barulho com a
cara da nossa terra, que o samba-reggae. Depois da bossa nova e
da Tropiclia, s existiu o samba-reggae de novidade (CATLOGO
OURO NEGRO, 2009, p. 18).

O ritmo criado na Bahia caiu na rede atlntica e despertou o


interesse de astros internacionais, como o jamaicano Jimmy Cliff
e o americano Michael Jackson, que uniram suas canes s batidas do Olodum. Outro astro da msica internacional que gravou
com o grupo foi Paul Simon, que acabou levando o grupo pra uma
apresentao com ele no Central Park em Nova Iorque, em 1990.
Simon tambm gravou um videoclipe com o Olodum no Pelourinho, cantando a faixa Obvious Child. A hibridao, a mistura e as
trocas (inter e transculturais) constituram-se em prticas das populaes transplantadas. Uma marca baiana, presente na capoeira, no
samba, no acaraj e principalmente nos candombls. Todos, cones
nacionais, mas naturalmente no h como sustentar nisto uma pureza estrutural. No h condies para propor um projeto essenciaO REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 31

lista, nuclearizador de uma identidade cultural, que no seja fruto


de constantes reconfiguraes. O ritmo atual no permite separar
negociao de acomodao quando a questo gira em torno de interesses econmicos, polticos e religiosos. Todos os dias, a ordem do
dia reinterpretar singularidades simblicas e existenciais (SODR,
1999, p. 167), desenvolvendo estratgias que possam alterar o equilbrio, deslocando o poder.
A modernidade lquida, como afirma Zygmunt Bauman (2005),
coloca a identidade em um processo de transformao que provoca
fenmenos como a crise do multiculturalismo. Bauman fala de identidades lquidas, e diz que, em um ambiente de vida lquido-moderno,
as identidades talvez sejam as encarnaes mais comuns, mais aguadas, mais profundamente sentidas e perturbadoras da ambivalncia.
[...] esto firmemente assentadas no prprio cerne da ateno dos
indivduos lquido-modernos e colocadas no topo dos seus debates
existenciais (BAUMAN, 2005, p. 38).
Para Livio Sansone (2004), as identidades nas sociedades modernas,
antes que unificadas, substancializadas, so fluidas, mltiplas, consoante
o capital social e cultural acumulado pelos indivduos. O autor afirma que
alguns aspectos da globalizao, em vez de criarem a homogeneidade,
acabam sendo teis para a criao de variedades locais da cultura negra
jovem (SANSONE, 2004, p. 208).
O processo de abertura Ocidental contracultura de dispora, ocorrido aps o surgimento do movimento Black Power, durante a Guerra
Fria, causou em toda a Amrica uma espcie de agitao cultural. Na
Amrica do Norte, o Manifesto Negro de James Forman, de 1969 (no
editado no Brasil), exigia uma indenizao pela escravido e defendia
a instalao do Poder Negro. Parte do Movimento Negro da Amrica
assumiu esta postura, num esforo de reconstruo de sua identidade
e adequao material. O Manifesto de Forman, sem dvida alguma,
trouxe um avano sociocultural substancial para os negros. Segundo Jeferson Bacelar, o avano atingido pelos negros norte-americanos entre
1950 e 1980, do ponto de vista dos direitos polticos, e sua participao
sem precedentes no crescimento econmico do pas, so inegavelmente
32 l Brbara Falcn

um corolrio das duas tendncias de ao. Para ele, sem o equilbrio dos
integracionistas e sem a radicalidade do nacionalismo negro, jamais teria
sido modificada a questo racial na sociedade americana (BACELAR In:
A Tarde, 08/05/1999).
A busca da africanidade marcou por um longo perodo os conflitos
tnicos, polticos e culturais, fortalecidos com a experincia da conquista
da independncia dos pases africanos. A dispora africana pelo hemisfrio ocidental d lugar histria de futuras disperses, tanto econmicas
quanto polticas, pela Europa e pela Amrica do Norte. Estas jornadas
secundrias tambm esto associadas violncia e so um novo nvel da
disjuno disporica, e no apenas reviravoltas ou impasses.
Para Paul Gilroy, os mecanismos culturais e polticos no podem
ser compreendidos sem que se atente para o tempo da migrao forada e para o ritmo quebrado no qual artistas e ativistas deixem regimes ditatoriais para trs e encontrem asilo poltico em outro lugar.
Para ele a histria da msica jamaicana, cubana e brasileira no sculo
XX pode ser facilmente construda atravs dessas linhas cosmo-polticas (GILROY, 2001, p. 21).
No Brasil, a cordialidade construda pelo mito da democracia racial, passa a dar lugar a adoo de traos polmicos. Neste sentido, o
reggae propiciou que artistas como Bob Marley e Jimmy Cliff passassem a influenciar profundamente os movimentos de revitalizao da
msica afro-baiana e a msica popular afro-maranhense. Os afoxs e
blocos afro da Bahia podem ser considerados importantes nesse perodo, tanto quanto as radiolas em So Lus do Maranho7. Tais manifestaes representavam uma possibilidade de mobilizao poltica
e uma tomada de conscincia da juventude negra brasileira. Durante
toda a dcada de 80, o reggae aparece no repertrio da msica baiana nas letras de compositores como Jorge Alfredo, Chico Evangelista,
Moraes Moreira, Bu Machado e Antonio Risrio.
Mapeando a interao dessa rede, Risrio (1981), tratando mais propriamente do campo esttico cultural, destaca trs movimentos marcantes para a
juventude negro-mestia: a onda black surgida com a soul music, que o Rio
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 33

de Janeiro se encarregou de irradiar para todo o pas; a projeo internacional do reggae jamaicano e sua influncia resplandecente entre os brasileiros;
o renascimento dos afoxs e o nascimento dos blocos carnavalescos afros
da Bahia (referncia bsica da negritude brasileira), com o consequente
reflorescimento de uma forma musical africana o ijex. Para ele, tanto
na soul music quanto no reggae e no ijex pode-se encontrar o compacto
trinmio homogneo que constitui a mnada e medula da musicalidade
negroafricana: canto/ ritmo/ dana (RISRIO, 1981, p. 115).
Na dcada de 70, com o aparecimento da soul music, a esttica
negra passa a ocupar um lugar central no cenrio musical jovem em
todo o mundo. Embalados pelo som de Ike e Tina Tuner, James Brown e Stevie Wonder, os jovens negros norte-americanos adotam um
novo black american way. O documentrio Wattstax (1973) mostra a
influncia decisiva que a msica teve nesse novo jeito de ser do negro
nos Estados Unidos. As letras das msicas traziam tona o cotidiano
dos guetos metropolitanos e das lutas pelos direitos civis. No Brasil a
soul music chega a partir do Rio de Janeiro, onde eclodiu o movimento black-jovem:
Do Rio, o black-jovem ganhou o Brasil dos chics-shows da moada
paulista aos jovens dos bairros proletrios em Salvador, adquirindo caractersticas prprias em cada regio cultural do pas. O resultado mais
positivo e culturalmente fecundo do movimento black-jovem esteve no
fato da identificao do preto brasileiro com o preto norte-americano ter
se dado principalmente no terreno da negritude. Com o black-jovem,
o negro brasileiro ficou mais negro, acabando por se voltar para a cultura
negra brasileira (RISRIO, 1981, p. 28).

O Rio de Janeiro acabou gestando o embrio da exploso black no


Brasil, j que foi l que chegaram os primeiros discos de forma quase
clandestina. Em entrevista ao Correio da Bahia, Asfilfio de Oliveira Filho, o Dom Fil, um dos responsveis pelo chamado movimento Black
Rio conta como se dava a exportao das mercadorias:
Era tudo acertado com as tripulaes dos avies. Atravs dos pilotos e aeromoas comprvamos os discos e tambm os perfumes
34 l Brbara Falcn

Lunkcaster, o mais usado entre os blacks. Durante as festas tambm


projetvamos nas paredes as imagens dos lderes negros americanos (Dom Fil, entrevista ao CORREIO DA BAHIA, 29/05/2007).

A conexo de pessoas como Dom Fil com alguns amigos na Bahia


fez com que alguns LPs chegassem a Salvador. As equipes de som, como
a Soul Grand Prix, divulgaram a msica que se transformou numa febre
nacional. Assim o movimento que se iniciou no Rio acabou fortalecendo
as relaes afro-baianas, possibilitando a constituio de novas formas
de sociabilidade, lazer, produo e consumo da juventude local.

A ONDA BLACK NA BAHIA


Em 1977, os amplificadores das equipes chegam Bahia e agitam
os grandes bailes de Salvador, em sales que facilitam a criatividade corporal. a que a febre black submete a prpria arquitetura das residncias populares de Salvador. O danarino Jorge Watusi menciona o fato
em depoimento a Antnio Risrio:
As casas que foram construdas nessa poca, l no Curuzu, tm uma
coisa muito curiosa: os quartos, a cozinha, todos os cmodos eram pequenos, mnimos, mas as salas eram enormes, por causa dos bailes
(RISRIO, 1981, p. 32).

Como os sales facilitavam a criatividade corporal, em pouco tempo


as pequenas festas, realizadas em residncias, perderam a fora. Concederam espao a grandes celebraes embaladas por diversificado
aparato tecnolgico. Foi neste contexto que surgiu o Black Bahia, hospedado no Esporte Clube Periperi em 1979, simbolizando o auge do
movimento Black em Salvador. Feito aos moldes dos bailes estadunidenses, sobreviveu com o mesmo nome at os anos 2000, j descaracterizado pelas outras expresses musicais. O Periperi foi o ltimo grande espao a abrir as portas para aqueles sujeitos de roupas coloridas e
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 35

cabelos ouriados. Antes disso, como j mencionado, em 77, o Clube


dos Comercirios acolheu o primeiro grande baile Black de Salvador.
Na ocasio, a equipe de som carioca, Soul Machine, apresentou ao
pblico local uma parafernlia ensurdecedora. Coutinho, responsvel
pela contratao da equipe, relembra o impacto no pblico presente:
O pessoal ficou impressionado com o nmero de caixas de som. Fizemos um verdadeiro paredo sonoro (Raimundo Coutinho Sobrinho/ DJ
Tat, entrevista ao CORREIO DA BAHIA, 29/05/2007).

Nesse mesmo baile, o danarino do grupo carioca, Nelson Triunfo, apresentou na Bahia passos originais de uma dana desconhecida,
atraindo olhares estupefatos pela cabeleira que no aparava desde 1972.
A simples presena de figura to respeitada em sales baianos excita
ainda mais o movimento Black Power:
As pessoas pediam para eu mostrar se tinha rodinhas debaixo dos meus
sapatos. Tudo por causa do passo de dana batizado de moon-walk, que
voc escorrega o p como se tivesse danando na lua. A coisa estava
engatinhando por aqui quando fizemos tudo. Foi a primeira festa com
toca-discos de qualidade e equipamentos acsticos de ltima gerao
(Nelson Triunfo, entrevista ao CORREIO DA BAHIA, 29/05/2007).

Aps o baile, a equipe de DJs, danarinos, iluminadores e eletricistas


obtm destaque da prpria mdia local, antes avessa ao movimento. Nelson Triunfo e o lder da Soul Machine, Tadeu da Silva, ganharam participao especial no programa local do Big Ben, da TV Itapoan. Quando
o grupo retornou para o Rio, Raimundo Coutinho assumiu o posto de
responsvel pelas festas, tendo montado equipe de som prpria. Chegou a
ir para So Paulo buscar referncias, pesquisar novos ritmos e bandas.
Nesse perodo, comeou a circular pela juventude brasileira um moderno ritmo africano, produto da sntese do rhythmnblues, da soul music e de
outros ritmos da Jamaica, como o mento. Nascido nos guetos de Kingston,
o reggae universalizou os dramas e esperanas do povo negro, sintetizados
nas letras de protesto e de apelo espiritual. A origem do ritmo no pode ser
vista separada dos processos de urbanizao e industrializao ocorridos

36 l Brbara Falcn

na Jamaica a partir da dcada de 50. Tanto a industrializao quanto a


urbanizao foram responsveis por um duplo fluxo migratrio, algo que
acabou sendo crucial para a projeo mundial do reggae.
O intenso xodo rural e o alto ndice de desemprego na cidade de
Kingston fizeram com que os jovens migrantes se concentrassem em guetos, sobretudo em Trench Town, onde surgiram os rude boys. O filme
Rockers: Itss Dangerous (1977), estrelado por msicos jamaicanos como
Burning Spear e Gregory Isaacs, traz a atmosfera e o cenrio em que os
rude boys agiam na cidade de Kingston. neste contexto que o reggae
aparece como uma criao esttica nascida da necessidade de responder
s novas realidades sociais de uma vida urbana, que se desenrolava nas
condies miserveis e desumanas dos guetos (BARROW, 1993, p. 15).
Todos esses acontecimentos contriburam tambm para que uma nova
religio fosse adotada, o rastafarianismo.
importante ressaltar que nesse contexto houve uma nova dispora, principalmente em direo aos EUA e Inglaterra. Bob Marley
foi um dos imigrantes que assistiu de perto nos EUA os conflitos
causados pela luta dos direitos civis. Guiado por Martin Luther King
e outros lderes, o movimento pelos direitos civis tornou-se a mais
bem sucedida aplicao da desobedincia civil da histria norteamericana. Com a dispora, o reggae ganhou o mundo e se popularizou entre estrelas do rock como Eric Clapton e Mick Jagger. Bob
Marley tornou-se o primeiro astro internacional do Terceiro Mundo,
o que se constitui em um passo importante para a superao do
complexo de inferioridade cultural dos terceiromundistas. No Brasil, logo no incio, a juventude se identificou com o reggae e com a
esttica dos artistas jamaicanos, que foi adotada atravs das tranas
dreadlocks:
Tranas jamaicanas dreadlocks foram adotadas; rostos de Marley
e Tosh enfeitaram blusas e camisetas pelo pas afora; kaya e ganja;
denominaes jamaicanas para a maconha consumida ritualmente
pelos rastas, viraram grias entre os curtidores locais da cannabis (RISRIO, 1981, p. 115).

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 37

A msica foi, sem dvida alguma, um elemento de identificao


entre as duas culturas, a jamaicana e a brasileira. O elemento musical
se constitui assim como uma ponte simblica ligando povos distintos e distanciados geograficamente. O antroplogo Antonio Godi sugere que as afinidades de longa-distncia podem ser explicadas pelo
fato de ambos os movimentos, jamaicano e brasileiro, terem nascido
de condies poltica, cultural e histrica similares. Para ele, as discusses sobre globalizao cultural contempornea e o fenmeno de
contatos de longa-distncia e identificaes podem ser discernidas no
reggae, onde questes relativas ao poder e dominao so consideradas em uma nova dimenso caracterizada pelo relacionamento entre
conexes local e global (GODI, 2001, p. 213).
Alm dos traos em comum entre as duas culturas, outro ponto
relevante a ser discutido a contribuio do negro para a formao
musical do Brasil. Os negros contriburam fundamentalmente para a
criao e a evoluo da msica brasileira. A maioria das narrativas
de viajantes estrangeiros do perodo colonial registra essa relao
entre negros e msica. As telas pintadas neste perodo trazem negros cantando, tocando e danando. Durante sua estadia no Brasil
(1816-1831) Jean-Batiste Debret registrou usos e costumes brasileiros
dos primeiros anos do sculo XVIII, incluindo imagens de negros tocando instrumentos como o berimbau. A relevncia destes registros
est diretamente ligada ao fato de no termos registros fotogrficos e
tampouco fonogrficos da poca. Em 1826, Debret visitou a Bahia e
descreveu o que ele viu:
Vi, durante minha permanncia, certo carnaval em que alguns negros
mascarados e fantasiados de velhos europeus imitaram-lhes muito jeitosamente os gestos ao cumprimentar direita e esquerda as pessoas
instaladas nos balces: eram escoltados por alguns msicos, tambm
de cor e igualmente fantasiados (DEBRET, 1978, p. 220).

Os relatos dos viajantes e cronistas trazem observaes importantes


sobre a cultura negra, principalmente no que se refere s expresses musicais. Contudo, h que se problematizar essas tradues estrangeiras da
cultura brasileira, limitadas inclusive por prestarem servio a corte local.
38 l Brbara Falcn

Outro ponto a ser realado que tais manifestaes nem sempre eram
bem vistas e aceitas pelos poderosos da poca. Joo Reis aponta que:
O Conde da Ponte adotou uma srie de medidas para fazer frente ao que considerava excessiva liberalidade dos senhores com seus
escravos. [...]. Foi estabelecido um toque de recolher para escravos
circulando nas ruas sem passes assinados pelos senhores. Os batuques
e danas, feitos de dia ou de noite, foram terminantemente proibidos
(REIS, 1990, p. 104).

Adotando uma estratgia diferente do seu antecessor, o Conde dos


Arcos apostava na ttica de dividir para dominar:
Ele acreditava que se deveria permitir aos africanos a prtica de suas
religies, msica e danas tradicionais, pois a livre expresso das tradies africanas, segundo ele, aprofundaria suas diferenas tnicas. [...]
Alm disso, escreveu ele, que os deixassem se divertirem para esquecer,
durante algumas horas, a sua triste condio (REIS, 1990, p. 105).

O processo de aceitao das tradies africanas nunca foi algo permitido, mas sempre negociado, quase sempre conflituoso. Reis o entende como
um campo de poder minado de significaes, onde operavam escravos, senhores, autoridades militares, civis e eclesisticas e o povo livre em geral
(REIS, 1996, p. 03). No Brasil, como nas demais colnias, os negros foram
apresentados s formas artsticas e culturais europias em voga e passaram
a manejar com desenvoltura instrumentos, elementos e linguagens de uma
outra cultura musical. Inevitavelmente, deram a sua contribuio injetando
a musicalidade negroafricana nos cdigos da msica ocidental. Criaram novos gneros musicais, novos modos de execuo instrumental, introduziram
novos instrumentos e formas de dana. Segundo Joclio Teles dos Santos,
desde o sculo XVIII, h uma participao bastante expressiva dos negros
em atividades culturais atravs das manifestaes populares.
A participao tnica era expressiva visto que multides de negros
de um outro e de outro sexo, das diversas naes africanas, falavam,
danavam e cantavam, ao som de atabaque, em lnguas diversas
(SANTOS, 1997, p. 17).

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 39

A presena ativa do elemento negro na cultura brasileira e sua


contribuio para o surgimento de uma identidade tnico-nacional
foi decisiva para nossa formao como povo. Tal quadro leva a crer
que os negros brasileiros, depois de anos de disperso cultural, conseguiram reconstruir sua fisionomia e reinventar sua histria atravs de
vrios mecanismos, dentre os quais os processos culturais permitidos
pela msica e a dana. neste sentido que se pode falar da msica
como um instrumento essencial de afirmao da identidade e contestao social, transcendendo barreiras e amenizando a desigualdade,
muitas vezes de forma sutil.
Atravs das performances musicais, as identidades so experimentadas de maneiras diferentes, nos gestos, expresses corporais, vesturio e
vocabulrio. Segundo Sansone (1997, p. 155), as tradies musicais, a
cultura e o habitus em torno da msica so permeveis e receptivos aos
sons, estilos e letras de outros lugares, mas tambm mostram aspectos
tenazmente locais. A tradio musical popular de Salvador e do Recncavo, e os discursos cultos e populares em torno da musicalidade baiana
representam o filtro pelo qual as influncias de fora so percebidas,
reinterpretadas e, eventualmente, absorvidas. Talvez por isso o reggae
tenha sido um ritmo bem absorvido pela cultura brasileira.
Tratando-se de uma msica com um discurso poltico-existencial voltado
para o negro, houve um fator importante para a adoo do ritmo no Brasil.
O discurso tico e filosfico contra o establishment foi embutido de forma
brilhante na melodia desta msica. O antroplogo Jos Jorge de Carvalho
(1995) diz que o movimento rasta e a revoluo musical do reggae so,
com toda justia, um desenvolvimento contemporneo de uma longa luta
de autodeterminao e dos anseios de liberdade dos negros jamaicanos, inspirados, sobretudo, nas lutas dos Maroons8 e estabelecidos no sculo XVIII.
Fundamentados neste discurso, os jamaicanos passaram a abandonar a
marca de escravos coloniais e buscaram reconstruir suas identidades. Assim,
a libertao simblica veio atravs da msica.
No final dos anos 70, o ritmo jamaicano comea a circular na Bahia
e, no final da dcada, surgem os primeiros trabalhos que o tomam como
referncia. Em Cachoeira, msicos como Nengo Vieira, Edson Gomes,
40 l Brbara Falcn

Eddie Brown, Tintim Gomes e Geraldo Cristal passam a adotar o reggae


e a esttica rasta como referenciais. As composies destes artistas trazem
uma novidade em relao ao que estava sendo produzido na Bahia at
ento, visto que passam a incorporar em suas letras um discurso poltico
social. J em 1988, a gravadora EMI lana o primeiro disco de Edson
Gomes, intitulado Reggae Resistncia, considerado um trabalho pioneiro
no gnero em todo o Brasil.
Conhecido pelo grande pblico e alcanando um relativo sucesso
comercial, tendo duas msicas, do referido disco, veiculadas nas rdios
locais, Edson Gomes passou a se apresentar em todo o Brasil e a ser
considerado o maior representante do gnero, at meados dos anos 90,
quando surgem inmeros grupos de reggae em todo o pas. Nessa dcada, tambm os cachoeiranos Sine Calmon e Nengo Vieira, do extinto
grupo Remanescentes, seguiram carreira solo. Assim, o reggae na Bahia
desponta como uma das expresses do negro oprimido, que passa a contar a sua realidade atravs das letras de protesto e lamento. Para Nelson
Maca, essas:
Vozes no-cordiais que denotam nitidamente a transgresso da fala
que se instala no Brasil, fruto da imparcialidade racial de uma ptria
mulata, oferecem uma imagem do negro oposta integrada e sorridente (GONALVES, 1999, p. 04).

O desenvolvimento tecnolgico possibilitou que elementos dessa


contracultura alcanassem fronteiras inimaginveis. O rap nasceu deste
mesmo sentimento e percorreu um caminho semelhante ao do reggae,
subvertendo a ordem musical atravs dos sound systems. Os sistemas
ambulantes de sonorizao foram uma das solues encontradas por negros em vrias partes do mundo como forma de propagar a sua msicamensagem e de se divertirem em meio a uma cultura pr-estabelecida.
importante citar que a migrao e o desenvolvimento tecnolgico
permitiram que o reggae9 se renovasse, dando origem a variadas vertentes, a despeito do dub e do dancehall. A produo musical jamaicana, na
Jamaica e fora dela, em pases como Estados Unidos e Inglaterra, tambm
deu origem a outros movimentos musicais como o Hip Hop. Em 50 anos
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 41

de produo, o reggae conseguiu uma projeo extraordinria, se considerarmos que a Jamaica no passa de uma ilha do Caribe, com uma
populao de 2,7 milhes de habitantes, sendo 85% deles descendentes
de escravos (MINISTRIO DAS RELAES EXTERIORES, 2007).
O mais interessante de tudo que muito do que existe na msica popular
hoje comeou na Jamaica: as verses de dub, os remixes, o rap e outros
tantos efeitos eletrnicos. Neste amplo sentido, o reggae um trao da cultura cosmopolita, extrapolando os limites nacionais e se universalizando em
sua expanso. Nele foram incorporados elementos da tradio negra e da
cultura de massa global, expressos em canes de forte contedo polticoreligioso. Apesar de ter um discurso especfico em cada regio, foi a partir
do elemento negro que se nacionalizou o reggae no Brasil. Foi atravs das
reminiscncias da transplantao violenta, da experincia da escravido, do
presente miservel, da violncia policial e da discriminao racial que o negro brasileiro se identificou com esse trao da contracultura da dispora.
Para o jamaicano Stuart Hall, as identidades sociais dos negros so
estabelecidas por dois eixos: o da similaridade e o da continuidade, onde
h uma busca de identidade originria africana, perdida pela dispora e
pela colonizao; e o da diferena e ruptura, que faz as particularidades
culturais das diversas comunidades negras. Neste sentido, a msica e a
dana nada mais so, antes de tudo, meios de comunicao inventados
e reinventados pelas populaes ps-escravas, num esforo de reconstruo de suas identidades (HALL, 1996, pp. 68-74).
Gilroy considera que a msica tem sido refinada e desenvolvida propiciando um modo melhorado de comunicao para alm do insignificante poder das palavras faladas ou escritas. Segundo ele, a msica e
seus rituais podem ser utilizados para criar um modelo pelo qual a identidade no pode ser entendida nem como uma essncia fixa nem como
uma construo vaga e extremamente contingente a ser reinventada pela
vontade e pelo capricho de estetas, simbolistas a apreciadores de jogos
de linguagem (GILROY, 2001, p. 209).
Autores como Homi Bhaba (1998) e Stuart Hall (1996, 2002 e 2003)
adotam o termo hibridizao e buscam nele uma abordagem crtica ao
42 l Brbara Falcn

princpio colonial, a pureza ou homogeneidade tnica. Eles criticam o


nacionalismo cultural fundado no mito de pureza racial e abordam o
hibridismo como a penetrao mtua dos polos renegados pelo discurso
colonial: centro e periferia, oprimido e opressor, foras hegemnicas e
foras subversivas. Assim, o hbrido no seria um elemento, mas sim um
processo resultante do encontro/intercmbio da periferia com o centro
e da periferia com as diferentes periferais. A partir deste encontro/intercmbio surgem novas identidades produzidas por um processo de negociao cultural, onde h um dilogo entre tradio e modernidade.
Em contraponto crtica de viso de cultura popular e tradio como
algo que precisa ser preservado e mantido, Hall sugere que a cultura
popular um dos locais onde a luta a favor ou contra a cultura dos poderosos transcorre (HALL, 2003, p. 337). E isso diz muito sobre possibilidades de transformao no contexto mundial atual. O processo dialtico da
cultura popular, em relao contnua com a cultura dominante, destacado pelo autor como ponto a ser considerado nos estudos e compreendido nos processos histricos, no como culturas inteiramente isoladas
ou paradigmaticamente fixadas, mas como um processo dinmico de
reorganizao e recriao permanente.
Inquirir sobre a lgica do mundo social exige dar conta da riqueza
cromtica produzida pelos atores que permanentemente esto negociando smbolos e representaes reguladoras. Ainda que a ideologia dominante seja a da classe dominante, a hegemonia que lhe legitima pressupe a existncia do outro. mais que isto, pois o exige como pea do
jogo. O poder econmico e poltico exigem uma hegemonia no campo
cultural, sobretudo, pois o tecido social resulta de um permanente jogo
de foras, disputado simultaneamente em vrios campos. Este jogo empurra tudo que no provm da classe dominante para uma periferia, que
vem se tornando, cada dia, mais complexa e heterognea. Mas nessa
periferia que os indivduos esto mais dispostos e disponveis para transformaes, que do origem a novas formas de expresso. E esta tem sido
a verdadeira arma da periferia, a ferramenta de combate mais bem
usada no embate contra o poder hegemnico (ALMEIDA, s. d.).

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 43

A TRILHA DO REGGAE
E nasceu l na Jamaica, se expandiu pelo mundo
Mas o Deus Criador, Jah, mandou chamar Marley
Mas a gente que ficou no vai deixar morrer
A bela msica, a bela msica reggae
Rastafary, Edson Gomes, 1988

O reggae, como diversos ritmos contemporneos, nasceu da mistura


de estilos musicais, da Jamaica e do mundo, sendo resultado de uma
srie de acontecimentos histricos e de influncias, locais e globais. Os
meios de comunicao e difuso cultural desempenharam um importante papel nesse processo, em especial os discos e o rdio. Atravs das
ondas das rdios de Miami e Nova Orleans, muito populares no Caribe
aps a Segunda Guerra Mundial, os jamaicanos tiveram acesso s novidades da indstria cultural norte-americana e souberam transformar formas de cultura estrangeira em algo nico e do seu prprio jeito, tornando
o reggae uma msica transnacional e diversificada.
O socilogo jamaicano Orlando Patterson considera o ritmo como
uma das mais bem sucedidas criaes do Terceiro Mundo, sendo o seu
desenvolvimento uma prova da complexidade da interao cultural global
(PATTERSON, 1994, p. 04). Uma das principais causas apontadas por
Patterson para a manuteno dessa complexa rede foram, sem dvida,
as disperses geogrficas. Segundo ele, as migraes de jamaicanos para
outros pases, que acontecem desde o sculo XIX, possibilitaram a troca
de vrias culturas que eram reproduzidas localmente quando retornavam
para a Jamaica. Para que se tenha uma dimenso disso, em 1880, cerca
de 1.000 jamaicanos por ms migravam para pases da Amrica Central
como Cuba e Panam (CHANG & CHEN, 1998, p. 13).
Para Patterson, a Jamaica sempre teve uma rica tradio musical, originada principalmente na msica africana trazida pelos escravos, mas sendo
44 l Brbara Falcn

tambm influenciada pelos europeus (ib. idem, p. 04). Ritmos que antecederam o reggae, a exemplo do calypso trazido de Trinidad e Tobago e
do mento, eram produzidos atravs de instrumentos de origem europia,
como o banjo e o violo. Segundo Chang e Chen, o mento foi a msica
que dominou a Jamaica do final do sculo XIX at os anos de 1930, especialmente em reas rurais, onde teve importncia at os anos 50.
Na primeira metade dos anos 50, aconteceu uma migrao considervel da populao do interior para as grandes cidades e o estilo, associado com as durezas da vida no campo, no conseguiu manter seu lugar
entre os jamaicanos. Mesmo assim, deixou uma contribuio importante,
j que o crdito da primeira gravao jamaicana vai para um medley de
canes de mento10 cantado por Lord Fly (Bertie Lyons) e lanado pelo
selo MRS (Mottas Recording Studio) em 1951 (ib. idem, p. 14). Carlos
Benedito da Silva afirma que o mento demonstra o desenvolvimento
musical na Jamaica a partir de ritmos estrangeiros:
Influenciados pelo calypso de Trinidad e Tobago e pela rumba cubana, a
diversidade foi ganhando forma e os jamaicanos comearam a desenvolver
seu prprio ritmo, como o mento [...]. Paralelamente, nos Estados Unidos
estava acontecendo a expanso do rhythm and blues [...]. A juventude jamaicana captava o som produzido pelos black de Miami e New York [...].
Comearam ento a incrementar suas bandas com a introduo de solos
de trompetes que mais tarde dariam origem ao som instrumental, danante, alegre e agitado do ska [...] (SILVA, 2007, pp. 96-97).

Na Jamaica, desde 1945, ritmos como o rhythm and blues, swing,


bebop e soul foram adotados da cultura popular americana e adaptados,
fazendo com que estes elementos fossem usados para fins prprios. A
batida do rhythm and blues apresentada aos jamaicanos pelos americanos que formaram base na ilha durante a Segunda Guerra tornou-se
uma importante influncia para o reggae, tendo correspondncia com
as palmas que acompanham as msicas nas igrejas e no mento, todas
com uma nica origem: a msica de plantation (GILROY, 2001, p. 162).
Temos, ento, a msica jamaicana como uma reinveno da tradio,
que passa por transformaes que incorporaram elementos de outras
culturas, isto ligado a interesses de determinados grupos.
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 45

Em meados dos anos 50, o jazz tornou-se musicalmente influente,


principalmente em pases com tradio musical africana11, como o caso
da Jamaica. Os clubes de jazz garantiram durante muito tempo a diverso na ilha, gerando tambm um bom negcio para os seus proprietrios
e msicos. Com o nascimento dos sound systems, a msica e a dana migraram dos clubes para a rua, arrastando verdadeiras multides. Como
a grande maioria dos trabalhadores jamaicanos no tinha condies de
comprar discos importados, passou a frequentar esses bailes.
A histria moderna da msica jamaicana se inicia com os sound systems,
que surgiram de forma criativa para driblar a necessidade econmica. Ironicamente, o business gerado em torno dos sounds acabou por transformar
a histria social jamaicana. Durante anos, os sistemas de som direcionaram os negcios gerados em torno das gravaes na Jamaica. Isto porque
para tornar um sistema de som lucrativo era necessrio lanar sempre novas msicas. Assim, a produo musical per capita da Jamaica tornou-se
mais extensa do que em qualquer outro pas do mundo. Com o surgimento
das companhias de manufatura e distribuio, foram criadas oportunidades
para os produtores individuais. Ento, qualquer um que tivesse dinheiro suficiente para encomendar 500 discos para prensar, podia comear um selo
(BLACKWELL, 1993, p. 03).
Os jamaicanos conservaram sua individualidade e mantiveram uma
sociedade organizada atravs da msica, produzindo e consumindo
uma cultura criada por eles. Para Orlando Pattersson (1994, p. 07), a
Jamaica se constitui como um exemplo contrrio da homogeneizao
da cultura no mundo e do modelo de dominao centro-periferia, pois
mesmo sofrendo forte influncia da cultura norte-americana conseguiu
gerar novas formas musicais, que propiciaram maior escolha e estmulo
cultura local.
A transmisso do reggae da periferia jamaicana para o centro americano
no s ilustra a complexidade da interao cultural global, mas funciona
tambm como precursora de um processo muito mais complexo que j
integrou partes dos Estados Unidos com outros pases, to ou mais profundamente do que estas partes que esto integradas com outras regies
da prpria Amrica. Este aspecto da globalizao da cultura, o que resul46 l Brbara Falcn

tou no desenvolvimento de cosmos regionais, inteiramente novo. Na


verdade, surgiu apenas em torno das ltimas duas dcadas, em grande
parte porque era dependente da revoluo do transporte de massa barato (PATTERSON, 1994, p. 07).

Alm disso, a msica popular jamaicana antecipou mudanas na


sociedade. Precedendo a independncia e afirmando valores culturais
locais, numa poca em que a Jamaica fervilhava de talentos musicais,
surgiu o ska, com uma batida marcada e danante, que misturava
elementos africanos com o rhythm and blues de Nova Orleans. O ska
levou os msicos de jazz para as sesses de gravao em estdios,
trazendo para os discos excelentes solistas, como Don Drummond
(The Skatalites).
A pirataria cultural foi engrossando o caldo musical jamaicano, criando um denso corpo de trabalho que atuou com grande
dinamicidade. A produo e o consumo dessas formas musicais no
podem ser considerados sem que se leve em conta outros processos,
como os de circulao e mutao. Entender os fluxos de migrao
que envolveram a sociedade jamaicana uma das peas-chave para
entender a diversidade musical do pas. Desde o sculo XIX, quando
a Jamaica ainda era uma colnia inglesa, comeou a receber imigrantes chineses, que chegaram ilha at mais ou menos a dcada
de 4012. Em 1946, um censo realizado no pas contabilizou a segunda maior populao chinesa do Caribe (a primeira estava em Cuba).
De forma surpreendente, os chineses se envolveram a fundo com a
cultura local e tornaram-se relevantes para a cena musical da ilha.
Ainda no incio dos anos 50, Thomas Wong foi responsvel pelo
primeiro sound system jamaicano apesar de Coxsone reclamar
o pioneirismo que executava blues e soul, na poca, preferncia
da maioria da populao. Byron Lee, lder do The Dragonaires,
ajudou a tornar o ska at ento considerada msica dos guetos
jamaicanos uma mania nacional e mais tarde internacional. Tambm foi incentivador do carnaval jamaicano, sendo responsvel
pela popularizao da soca no pas. Para os pesquisadores jamaicanos Chang e Chen:

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 47

Byron Lee esteve envolvido em todos os aspectos da msica jamaicana


desde os seus primrdios, como lder da banda, promotor, produtor e dono
do estdio. Embora alguns neguem a sua importncia, muitos tambm o
depreciam por haver transformado a msica em um produto para o consumo da Cidade Alta. Em sua defesa, ele diz que ningum da Cidade Alta
sabia do que a msica tratava, portanto eles no poderiam se identificar
com ela. Pode-se dizer que fomos responsveis por mover a msica do
oeste de Kingston para as classes alta e mdia que poderiam se dar ao luxo
de comprar discos e apoiar a nossa msica. Em seguida, as estaes de
rdio comearam a executar nossa msica e ela estourou. Lee est parcialmente ressentido por ele ser de ascendncia chinesa e estar em uma terra
cuja maioria de negros e que enriqueceu a partir de uma msica que ele
no fez nada para ajudar a criar, enquanto seus verdadeiros originadores
acabaram pobres(CHANG & CHEN, 1998, p. 210) [tradua nossa].

A presena chinesa abordada por vrios artistas jamaicanos, como


o cantor Yellowman, que em uma de suas msicas falava que queria
pegar a filha do chins. J Prince Buster, em Black Head China Man13,
caoa do seu amigo Derrick Morgan, que copiou um solo de sax produzido por Lester Sterling e enviou para Leslie Kong:
You done stole my belongings and give to your China man
God in heaven knows, He knows that you are wrong
Are you a China man are you a black man?
It dont need no eye glass to see that your skin is black
Do you prefer your China man to your fellow blackman?

Foi Leslie Kong, produtor chins, dono do selo Beverlys, que descobriu
talentos como Jimmy Cliff e Bob Marley. Outro mito descoberto por Kong
foi Desmond Dekker, que gravou o hit Poor me Israelite, primeiro single
jamaicano a chegar no Top Ten no Reino Unido e Estados Unidos, em
1969. Vale lembrar tambm que Kong produziu o The Jamaicans, grupo
de rocksteady responsvel pelo sucesso Ba-Ba Boom de 1966. Alm de
msicos e produtores, chineses tornaram-se ativos em todas as frentes musicais na Jamaica. Uma das melhores histrias da msica jamaicana tambm
foi escrita por dois jamaicano-chineses, os pesquisadores Kevin Chang e
Wayne Chen, pela Temple University Press, na Philadelphia, em 1998.
48 l Brbara Falcn

Outro fluxo de migrao importante para compreender a evoluo


da msica jamaicana foi o xodo de msicos locais para outros pases.
No incio dos anos 60, houve a primeira fase da migrao, para a GrBretanha. Com o advento do sound system, as big bands foram sendo
substitudas pelos DJs, o que levou msicos jamaicanos, como Prince
Buster, a migrarem para o Reino Unido, para tentarem a sorte por l.
Esses msicos passaram a se apresentar em clubes londrinos, onde surpreendentemente o ska foi bem recebido pela juventude, tornando-se
popular entre punks e skinheads. A aceitao do gnero na Inglaterra
e Estados Unidos levaram criao de subgneros, como o ska punk.
J em meados da mesma dcada, houve a segunda fase da migrao,
dessa vez para os Estados Unidos. Durante esse perodo, iniciou-se um
importante processo de interao cultural, onde a perifrica Jamaica
consegue atravs de seus msicos, influenciar para sempre a histria
da msica americana.
DJs14 jamaicanos introduziram em Nova Iorque o toasting15 um
novo estilo de apresentar as msicas tocadas nas festas, uma espcie
de canto falado16, que originou o rap. Toasting, chatting ou deejaying
o ato de falar ou de orar sobre um ritmo ou uma msica, atravs
do improviso ou de letras pr-escritas. Na Jamaica, os toasters atuavam como autnticos mestres de cerimnia que comentavam, nas suas
intervenes, assuntos como a violncia das favelas de Kingston e a
situao poltica da ilha, sem deixar de falar de temas mais prosaicos,
como sexo e drogas. O rimar rtmico dos toasters jamaicanos e os DJs
acabaram por influenciar o desenvolvimento do Hip Hop americano,
tanto que um dos pioneiros do movimento nos Estados Unidos foi o DJ
jamaicano Kool Herc (PATTERSON, 1994, p. 07). Nascido na Jamaica,
ele imigrou, em 1967 (aos 12 anos de idade), de Kingston para Nova
Iorque, trazendo seu conhecimento sobre a cena sound system e o toasting. Em meados de 73, ele chamou a ateno como DJ no Bronx, no
incio usando o equipamento de som de seu pai. Depois construiu seu
prprio equipamento, autodenominado de Herculords.
A origem do Hip Hop se deu em block parties, festas que aconteciam em blocos abandonados no Bronx, como mostra o filme Beat Street

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 49

(1984). Seguindo a cultura sound system, Kool Herc tocava reggae e


outros ritmos jamaicanos, alm do soul e do funk, enquanto falava algumas frases para fazer as pessoas danarem e dar-lhes boas vindas. Aos
poucos, Herc desenvolveu uma tcnica revolucionria de girar os pratos
dos toca-discos, com dois aparelhos tocando dois discos iguais, que originou o break beat, fundamento musical do rap. Assim, os deslocamentos,
voluntrios ou no, acabaram provocando a troca de informaes entre
diversos continentes, gerando uma rede de comunicao em torno da
msica e dos movimentos de musicalidade da juventude. O desenvolvimento do reggae, talvez mais do que qualquer outra forma musical,
ilustra a complexidade da interao cultural mundial. A Jamaica sempre teve uma rica tradio musical, originada principalmente da frica
Ocidental, mas tambm foi influenciada na sua lrica e linhas meldicas
pelos britnicos. Para Paul Gilroy:
A circulao e a mutao da msica pelo Atlntico negro explode a estrutura dualista que coloca a frica, a autenticidade, a pureza e a origem em
crua oposio s Amricas, hibridez, crioulizao e ao desenraizamento (GILROY, 2001, p. 371).

importante frisar que essas trilhas sonoras, deslocadas dos seus


lugares de origem e das condies que as fizeram surgir, foram reelaboradas e passaram a ocupar espaos clandestinos, alimentando uma
nova metafsica de negritude. Hermano Vianna considera a msica afroamericana um circuito intercontinental de tradies, onde todos os ritmos
e identidades esto conectados na grande rede atlntica. Para ele:
A msica afro-americana tambm no possui uma nica raiz fincada em
algum descampado subsaarino, mas criou uma malha de tradies interconectadas de tantas maneiras e com tantos curtos-circuitos internos, que
faz com que qualquer ritmo seja simultaneamente pai, filho, me, primo de
todos os outros ritmos (VIANNA, 1999, p. 03).

O reggae, criado nos guetos de Kingston, surgiu a partir de diversas


influncias, em especial da msica americana, da igreja e do culto rastafri. Segundo Linton Kwesi Johnson (1993, p. 05), a igreja foi uma
grande influncia para o gnero, em ambos os termos, vocais e lricos,
50 l Brbara Falcn

pois diversas canes rasta foram tiradas de seus hinos. Adiante, ser visto como o comprometimento com a denncia, transformaes sociais e
mensagem religiosa se tornaram os fundamentos do reggae. De maneira
curiosa, o rastafarianismo inspirado pela profecia do pastor jamaicano
Marcus Garvey, que previa que logo na frica surgiria um rei negro, o
225 descendente da linhagem de Menelik, o filho do rei Salomo e da
rainha de Sab, que libertaria a raa negra do domnio branco se propagou entre o proletariado de Kingston como uma reao influncia
ocidental (PATTERSON, 1994, p. 05), pois pregava o retorno dos negros
para a frica, numa espcie de repatriao espiritual. A religio rastafri
foi muito divulgada atravs do reggae, mas a sua expanso se deve,
principalmente, a cantores e grupos como Big Youth e The Ethiopians,
que antes mesmo de Bob Marley j haviam influenciado a juventude dos
guetos jamaicanos.
O rocksteady representou a primeira msica jovem da gerao
ps-independncia, entre 1966 e 1968. Neste perodo, a cultura
popular jamaicana comea a refletir isso, pois as influncias norteamericanas se tornam notadamente jamaicanas. Agora, os temas sociais aparecem em discos de protesto; como Israelites de Desmond
Dekker, mostrando a preocupao com a temtica, o que passou a ser
uma constante da por diante. Basicamente, o rocksteady se difere do
ska por tratar-se de um ritmo mais lento, com a linha de baixo mais
proeminente, riffs de guitarra tocados por apenas algumas cordas e
incorporao do piano em detrimento dos metais da era do ska.
importante lembrar que o ritmo surgiu na Jamaica em um momento
de intenso xodo rural, o que provocou um aumento da populao
dos guetos urbanos de Kingston, tendo uma influncia direta no comportamento da juventude local (JOHNSON, 1993, p. 05). Muitos dos
jovens migrantes tornaram-se rude boys e apreciadores do rocksteady
e, no por acaso, eles prprios eram tema das letras desta msica, que
tratava de problemas sociais, mas que tambm falava de amor.
Muitos fatores foram determinantes na evoluo do rocksteady para
o reggae, como novos ciclos de imigrao e a modernizao dos estdios
jamaicanos. No final dos anos 60, msicos e arranjadores das principais

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 51

gravaes realizadas em torno do rocksteady, como o pianista Jackie Mitto


(The Skatalites) e o guitarrista Lynn Taitt, partiram para o Canad para
escapar agitao social e poltica que assolava a Jamaica. O ano de 1968
considerado oficialmente como o do nascimento do reggae, tendo como
ponto de partida a gravao da msica Do The Reggay, do Toots and
The Maytals. Para Lo Vidigal, professor da UFMG e pesquisador do Centro de Estudos Caribenhos do Brasil (CECAB) da Universidade Federal de
Gois, o ano de 1968 marcante para este estilo de msica:
1968 marcou a emergncia e a difuso de uma perspectiva anticonformista e transformadora que encontrou no reggae um veculo privilegiado,
contribuindo para a conscientizao da humanidade em geral, tendo sido
particularmente atuante nas lutas anticolonialistas no continente africano
e para a afirmao do povo negro como capaz de direcionar sua prpria
histria (VIDIGAL apud BRAGA & CARVALHO, 2008, p. 05).

At meados da dcada de 70, o reggae esteve restrito Jamaica e


s comunidades jamaicanas formadas nas capitais inglesa, americana e
canadense, onde artistas comearam a produzir msica, principalmente
em Londres. A conexo inglesa se tornou uma importante ponte para
o mercado internacional, pois foi sob a batuta do produtor ingls Chris
Blackweel que o ritmo jamaicano se tornou uma msica internacionalmente reconhecida. Em 1972, o The Wailers estava na Inglaterra para
promover um single e Bob Marley resolveu ir aos estdios da Island
Records, onde foi recebido por Blackwell. O produtor ingls fez uma
proposta irrecusvel para o grupo, adiantando uma generosa quantia
para que gravassem um disco pelo selo, com acesso as mais avanadas
tcnicas de gravao da poca. Alm disso, a Island promoveu uma
turn do grupo na Inglaterra e nos Estados Unidos, o que era uma
completa novidade para uma banda de reggae.
Antes dessa proposta, as gravadoras achavam que um grupo desse
gnero s poderia vender singles ou compilaes com outras bandas. A
falta de conhecimento e a exotizao dos artistas jamaicanos se refletia
at nas capas dos discos. O antroplogo Hasse Huss (1998) realizou uma
pesquisa sobre a representao dos msicos jamaicanos nas capas das
primeiras compilaes que visavam o mercado internacional. Depois de
52 l Brbara Falcn

realizar pesquisa de campo em Kingston e Londres, ele observou que a


imagem de rastas revolucionrios no estava alinhada com os interesses mercadolgicos e padres estticos esperados. Huss argumenta que:
At hoje os discos de reggae so, na sua maioria, compilaes de

singles, geralmente produzidos e projetados no Reino Unido ou nos


EUA. Estas compilaes muitas vezes carregam informaes que no
refletem as prioridades e as sensibilidades do pblico-alvo, quer seja
na Jamaica ou na dispora. Ao longo dos anos, continuamente representados nas capas de uma srie de discos de reggae como rastafris
revolucionrios de olhos grandes, muitos, talvez a maioria, artistas e
produtores de reggae parecem jurar lealdade a uma esttica totalmente diferente. Conscientes do papel do extico, outro que eles foram
forados a adotar vtimas da exotizao tanto interna quanto externa
muitos artistas de reggae tm tentado explorar formas alternativas
independentes, buscando incorporar temas visuais e musicais que no
estejam restritos queles que podem ser percebidos pela fantasia do
pblico europeu e norte-americano (HUSS, 1998, p. 185).

O primeiro lbum dos Wailers, o Catch A Fire (1974) quebrou


todas as regras, sendo muito bem produzido, promovido e embalado
(a capa do disco tinha um provocante formato de isqueiro). Durante
as gravaes, Blackwell pediu que fossem incorporados solos de guitarras que lembrassem clulas do rock, para que os apreciadores do
estilo pudessem se identificar com o ritmo. O grupo acatou algumas
modificaes, mas as letras militantes vieram sem cortes e com total
contraste ao que estava sendo feito at ento, pois continham mensagens de cunho espiritual e poltico. Um ponto importante a ser tocado
nessa trajetria o comprometimento dos artistas jamaicanos com as
causas sociais e polticas. No por acaso, muitos deles sofreram exlio,
perseguies e atentados.
Msica e poltica nunca estiveram separados na Jamaica, e o produtor Edward Sega um exemplo disso, pois chegou a ser Primeiro Ministro em 1980 (BARROW, 1993, p. 25). Os anos 70 foram um momento
crtico na poltica jamaicana, onde existia uma rivalidade muito grande
entre a JLP (Jamaica Labor Party) e o PNY (Peoples National Party). O
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 53

JLP, partido da direita Jamaicana, era apoiado pelos Estados Unidos


e liderado por Edward Seaga, enquanto que o PNY era liderado por
Michael Manley, eleito Primeiro Ministro no ano de 1976. Os dois partidos rivais instituam uma verdadeira guerra civil na capital jamaicana,
travada principalmente entre jovens que eram recrutados para lutar
pelos interesses polticos de cada um. Muitos discos lanados nesse ano
refletem a violncia vivida nos guetos jamaicanos, War in a Babylon de
Max Romeo e Police and Thieves de Junior Murvin so dois exemplos
clssicos desse perodo (ib. idem, p. 25).
Com o reconhecimento internacional, cresceu a importncia poltica
de Bob Marley dentro e fora da Jamaica, pois sua msica alcanava
forte ressonncia na juventude. Para Paul Gilroy, a vida e o trabalho de
Marley nos ajudam a perceber o funcionamento de circuitos culturais
complexos que transformaram um padro de disperso simples e unidirecional em uma rede.
A sua performance histrica na cerimnia de independncia do
Zimbbue, em 1980, simbolizou o religamento parcial com as origens
africanas que permeia o anseio na dispora. Assim como muitos outros, ele tambm optou por um comprometimento cosmopolita mais
difcil e uma forma diferente de solidariedade e identificao que
no requeria a presena fsica naquele continente, tal como muitos
outros pan-africanistas proeminentes o fizeram antes e desde ento
(GILROY, 2004, p. 160).

Gilroy afirma ainda que a estatura global de Marley teve por base o
trabalho rduo e exigente dos circuitos transcontinentais, assim como as
qualidades poticas investidas na linguagem do sofrimento e da moderao que ele conseguiu tornar universal (ib idem, p. 161). Concluindo,
ele acrescenta que a imagem transnacional de Bob um convite para
mais uma rodada de reflexes sobre o status da identidade, onde noes
sobre uma identidade fixa devem ser tiradas de foco.
Ainda nos anos de 1970, outros subgneros surgiram com a mesma
preocupao de contedo, a despeito do dub poetry, que teve como
fundador o jamaicano Michael Mikey Smith. Mutabaruka foi o poeta
54 l Brbara Falcn

que mais popularizou o estilo no mundo. O dub poetry se caracteriza


tambm pelo uso da palavra falada, mas que se difere do toasting pela
mtrica e por ter um texto previamente preparado, sendo a maior parte
de natureza poltica e social. Curiosamente, Toronto tem a segunda concentrao de dub poetrys no mundo, precedida pela Jamaica e seguida
pela Inglaterra. O msico, poeta e escritor Linton Kwesi Johnson, que
gravou seu primeiro disco na Inglaterra em 1977, atualmente tem sua
prpria gravadora, que lana discos dele e de outros poetas do dub.
Segundo Chang e Chen:
Linton Kwesi Johnson, que emigrou da Jamaica para a Inglaterra, quando tinha 11 anos de idade, provavelmente o dub poetry mais famoso e
de ilibadssima reputao. O melhor trabalho de LKJ foi Dread, Beat an

Blood. Segundo o The New Trouser Record Guide Press; Dread, Beat
an Blood foi uma chamada s armas, uma comemorao no escuro da
perseguio policial e represso social dos negros contada de uma forma
contundente, mas estranhamente sem rancor. Recitando seus poemas sobre o pulsante e absolutamente impecvel reggae, Johnson usa o Patu
das ruas para falar com seu pblico, chamando ateno para a fraternidade e a vigilncia. A msica limpa, flexvel e vibrante e suas letras incisivas
e pontiagudas o transformam numa declarao poltica poderosa e inesquecvel (CHANG & CHEN, 1998, p. 74) [traduo nossa].

O dub um subgnero que merece especial ateno, pois um


exemplo de como os intelectuais orgnicos desenvolveram formas de
fazer e pensar msica. Nascido nos anos 60, quando os DJs comearam a remover as letras e melodias das msicas e acrescentando
ecos e efeitos, evoluiu nos anos 70 por conta dos recursos tecnolgicos produzidos em estdios e da genialidade de tcnicos como King
Tubby. Atravs do dub, os jamaicanos ensinaram ao resto do mundo
uma maneira diferente de se relacionar com os sons, como se eles
fossem peas de um quebra-cabea que pudesse ser desmontado e
remontado de diversas maneiras, sem se preocuparem com uma linearidade. Hermano Vianna considera o dub uma revoluo conceitual,
to importante para a msica pop como foi o aparecimento da msica
concreta para o campo erudito:

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 55

Tanto o dub quanto o reggae so produtos de uma mesma corrente


de energia alternativa que sempre resistiu a ser submissa intelectualmente, com a desculpa de ser pobre, em relao ao resto do mundo.
A Jamaica poderia pensar/executar o que o resto do mundo nunca
pensou/executou, o que o resto do mundo seria obrigado a copiar.
[...]. Nenhum outro pas do Terceiro Mundo tem presena to marcante e influente no cenrio da nova cultura popular globalizada
(VIANNA In: Folha de So Paulo , Caderno Mais!, 09/11/2003).

No incio dos anos 80, a Jamaica, como outras ilhas do Caribe, comeou a experimentar os efeitos do comrcio de drogas entre pases como a
Colmbia e Estados Unidos. Assim, a cocana chegou aos guetos trazendo
resultados desastrosos, promovendo guerra de gangs pelo controle do trfico local de drogas e armas. O filme Shottas (2002), protagonizado por
Kymani Marley (filho de Bob), retoma a histria do trfico na ilha e tem
trilha sonora representativa desse perodo. A msica, como um espelho
do que acontece na sociedade, passou a refletir tudo atravs das letras,
da nova forma de cantar o raggamuffin e de tocar o dancehall. Em
meados dos anos 80, a msica digital invade a Jamaica, que passa, apesar
das limitaes econmicas, a adotar novas tecnologias nos estdios.
Se por um lado a msica entra na era da tecnologia, por outro os
ritmos eram baseados em religies como etu, pocomania e kumina, que
influenciaram a msica de artistas como Shabba Ranks e Buju Banton.
Com a descoberta da gravao digital, um extremo minimalismo emergiu, pois mesmo com a tecnologia usada a msica tornava-se cada vez
mais prxima das suas razes, como na Jamaica rural. A proeminncia no
uso de teclados e sintetizadores so a marca da nova msica jamaicana,
que compensa a falta de recurso com a originalidade e sinceridade das
letras (JOHNSON, 1993, p. 05).
Assim, o deslocamento de signos provocado pelo circuito de informao tecnolgico como discos, filmes, crenas e danas, possibilitou
uma rede de comunicao na dispora negra que se intensificou com
a globalizao. Atravs das conexes estabelecidas por essa rede, os
repertrios culturais de cidades como Kingston, Londres, Nova Iorque,
Nova Orleans, Londres e Toronto foram ampliados e diversificados.
56 l Brbara Falcn

Nesse contexto, o reggae continuou se renovando e disseminando em


todo o mundo, inclusive no Brasil, onde as diversas formas de reggae
so consumidas de norte a sul. Para Lo Vidigal, este gnero tem, ainda
hoje, um papel importante:
O reggae um gnero musical que vem constituindo laos afetivos
como poucos hoje em dia. Mesmo com um envolvimento limitado
de intermedirios culturais, como as gravadoras, ele inspira manifestaes espontneas por parte de admiradores e divulgadores de
sua mensagem, alm de incitar a dana e o divertimento. Para a
Jamaica, o reggae uma expresso musical que serve como autoreferncia e como referncia para o mundo sobre a cultura praticada
na ilha (VIDIGAL apud BRAGA & CARVALHO, 2008, p. 05).

A presena da msica jamaicana confere um toque especial a toda


sorte de sons inventados e reinventados no planeta. No Brasil, desde
a dcada de oitenta, o ritmo serviu de inspirao para composies de
cones como Gilberto Gil e Moraes Moreira. Ainda ao final dessa dcada,
grupos como Paralamas do Sucesso e Tits gravaram algumas de suas
composies nesse ritmo, anunciando o que estaria por vir nos anos 90.
Na dcada seguinte, diversos grupos apresentam ao pblico trabalhos
declaradamente influenciados pelo reggae. Tribo de Jah, Cidade Negra,
O Rappa, Skank e Planet Hemp foram nomes de destaque numa cena
nacional que foi crescendo at o final dos anos 90, quando surge o Nativus, que posteriormente tornou-se Natiruts. Abro um parntesis para
falar desta banda brasiliense, que atualmente vem trabalhando de forma
totalmente independente, alcanando um estrondoso sucesso nos eventos que vem produzindo por todo o Brasil.
Na Bahia, de maneira surpreendente, o ritmo vem influenciando artistas h mais de trs dcadas, na capital e no interior do estado. Conforme retoma Mota (2008), desde meados dos anos 80, artistas como
Lazzo, Dionorina, Gilsan, Jorge de Anglica e Ubaldo War passaram
a se envolver com o reggae, que se tornou tambm um forte referencial
para os blocos afro, como o Male Debal e o Muzenza, alm de bandas
como a Terceiro Mundo. Em 1988, Edson Gomes lanou o primeiro
disco exclusivamente influenciado pelo gnero e, a partir da, outros traO REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 57

balhos surgiram em um mercado que vem se mantendo firme at os


dias de hoje. Nos anos 90, Sine Calmon, Nengo Vieira, Tin Tim Gomes,
Jorge de Anglica e Ado Negro conseguiram lanar seus primeiros discos. Ainda na dcada de noventa surgiram inmeras bandas de reggae
em toda a Bahia, consolidando a insero desta msica e de toda uma
cadeia produtiva em que se estabelecia em torno dela.
Em Salvador, as bandas constituram um circuito alternativo para
apresentaes no centro da cidade, em espaos no Pelourinho, como
o Hotel Pelourinho, Creole Cajun, Novo Tempo e Rocinha, e posteriormente em Itapu, o Espao Verde. Sine Calmon formou um pblico
apreciador do seu trabalho no bar Novo Tempo. Artistas como Alumnio
e Garimpeiro, e bandas como Shamyim Zion e Dystoro revezavam
apresentaes na Rocinha, localidade do Pelourinho, frequentado por
jovens de classes populares. O Espao Verde ainda mantm uma programao com bandas de reggae que costumam se apresentar l desde
a dcada de noventa, a exemplo da Semente da Paz, Moa Anbesa, Red
Meditation e Tribo do Sol. Em meados de 2010, Sine Calmon ainda
realizava apresentaes nesse local.
A partir de 2005, em Salvador, surgem grupos e coletivos influenciados por diversas vertentes do reggae, que vo do dub ao dancehall. O
MiniStereo Pblico, por exemplo, um coletivo que possui um sistema
de som nos moldes dos sound systems jamaicanos17, com DJs que tocam cada um a sua especialidade e toasters que atuam como mestres
de cerimnia. J o Dubstereo uma banda que toma como referncia clssicos riddims18 jamaicanos, tentando aliar efeitos de samplers e
scratchs reproduzidos por um DJ, com efeitos orgnicos produzidos por
um power trio de teclados, bateria e baixo. Tanto o MiniStereo quanto o Dubstereo produzem festas frequentadas por um pblico jovem de
classe mdia, que vem lotando as casas onde se apresentam.
Em conexo com a rede internacional formada pelo reggae, esses
grupos j trouxeram a Salvador atraes como Zion Train (UK), Mad
Professor (UK), Ranking Joe (JAM), Eaka-a-Mouse (JAM) e os brasileiros
Buguinha Dub (PE) e Lei Di Dai (SP). Alm disso, o MiniStereo Pblico
realiza o projeto Mutiro Mete Mo, que leva a parafernlia do sound,
58 l Brbara Falcn

palestras e graffiti para as ruas de bairros populares de Salvador (Castelo


Branco, So Lzaro, Bairro da Paz e Cajazeiras); e, eventualmente, cidades do interior, como Feira de Santana e Cachoeira, onde tive oportunidade de acompanhar a caravana durante dois dias.
Os DJs do MiniStereo tambm protagonizaram um vdeo produzido
pela Kabum!, com roteiro de Goli Guerreiro Terceira Dispora (2009)
onde tecem comentrios interessantes acerca da rede de influncias
musicais que se teceu em todo o Atlntico Negro. Na cidade de Feira de
Santana j existem dois sounds, o Roa Sound e Os Rur. Isso demonstra o flego e a capacidade de renovao do reggae, que em mais de 40
anos de produo continua alcanando resultados surpreendentes.
fato que desde os anos 80, tanto na capital baiana como em cidades
do interior principalmente em Cachoeira e Feira de Santana o ritmo acabou influenciando uma gerao de artistas que passou a identific-lo como
um veculo para tornar conhecidas as suas mensagens, em um momento
de afirmao da cultura negra em todo o mundo. A anlise da obra e do
discurso de todos esses artistas se constitui em universos bastante diferenciados, que denotam suas experincias de vida e vises de mundo; o que por si
s resultaria em uma extensa pesquisa. Alm disso, para que se tenha uma
dimenso de todo o aparato que est por trs desses universos, seria necessrio fazer uma anlise da cadeia produtiva e do pblico consumidor, considerando diferentes perodos. De uma forma bastante generalizada, esses
discursos incluem letras que falam de poltica, religio, etnicidade, natureza
e ganja, mas cada um com a sua especificidade sonora e lrica sem contar
com as performances, que dariam um captulo parte.
Alguns estudos j foram feitos nessa direo, como o do historiador
Fabricio Mota, no livro Guerreir@s do Terceiro Mundo, que integra a srie
Sons da Bahia. Em sua pesquisa, ele retoma a discografia desses artistas
para traar um estudo sobre as manifestaes tnico-identitrias da juventude nesse perodo. Utilizando discos e outras fontes impressas e iconogrficas, Mota analisa a produo de novos referenciais identitrios, a partir
da produo e circulao do reggae no estado. Seguindo a trilha dele, esse
trabalho pretende suprir uma lacuna existente sobre a cena reggae no Recncavo baiano, porto de escravos, hoje novo porto do reggae.
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 59

NOTAS
Em Carnaval Ijex (1981), o antroplogo Antonio Risrio examina o
processo de reafricanizao da juventude da Bahia, mostrando as influncias que sobre ela exerceu o movimento Black dos Estados Unidos,
descrevendo a ao catalisadora da chamada msica soul, que conquistou a juventude negra brasileira, e o modo especfico da reao baiana
ao fenmeno, na passagem do black-soul ao afro-ijex.
1

O afox Embaixada da frica foi a primeira manifestao negra a desfilar pelas ruas da Bahia, em 1885. No ano seguinte, surgiu o afox Pndegos da frica.
2

A Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, atravs do Programa Ouro


Negro, cadastrou mais de 80 entidades que se declararam como blocos
afro. Para saber mais, consulte o Catlogo Ouro Negro, editado pela
SECULT (2009).
3

GILROY, Paul. There arent no Black in the Union Jack: The Cultural
Politics of Race and Nation. Londres: Hutchinson, 1987.

GUERREIRO. Goli. A Trama dos Tambores: A Msica Afro-Pop de


Salvador. So Paulo: Ed. 34, 2000.
5

A pesquisadora sueca Ellen Stokland realizou um estudo sobre as estratgias de comunicao do Olodum chamado The Revolt of Drums (2004).
6

Para Carlos Benedito Rodrigues da Silva (1995), o reggae constituise como instrumento importante de mobilizao de negros urbanos que
no esto presos s tradies africanas. Tambm reflete uma capacidade
de se apropriar de informaes veiculadas pela indstria cultural, como
msicas, danas, formas de comportamento, para organizar o lazer da
negritude na sociedade moderna.
7

Segundo Carvalho (1995, p. 32), a Jamaica um dos pases que registram nmeros elevados de sublevaes de escravos no Novo Mundo.
8

60 l Brbara Falcn

No Brasil, os sistemas de som so usados pelas culturas funkeira, regueira e tecnobrega em cidades como Rio de Janeiro, So Lus e Belm,
onde tambm so conhecidos como radiolas e aparelhagem. A cultura sound system, nos moldes jamaicanos, um fenmeno recente, mas
crescente, em todo o Brasil.
9

Segundo Braga e Carvalho (2008), a grande contribuio do mento na


Jamaica foi impulsionar a criao da indstria fonogrfica na ilha, j que
os primeiros discos lanados por l foram deste estilo.
10

Segundo Hobsbawn, no h dvida de que, se no fosse por fatores


polticos, o jazz teria se espalhado ainda mais (1990, p. 82).
11

Para saber mais sobre a imigrao chinesa na Jamaica ver TORTELLO,


Rebecca. Out Of Many Cultures. The People Who Came. The Arrival Of The
Chinese. http://www.jamaica-gleaner.com/pages/history/story0055.htm.
12

13

BUSTER, Prince. The Original Golden Oldies. Volume 01, 1963.

14

Os DJs tambm ficaram conhecidos como seletores.

A influncia dos toasters jamaicanos chegou a Salvador dcadas depois, sendo um fenmeno recente, com pouco mais de cinco anos.

15

No Brasil, existem mais de 60 tipos de canto falado, um deles o


repente.
16

A partir da dcada de 90, surgem diversos sound systems no Brasil, a


exemplo do Dubverso (SP) e Interferncia Sistema de Som (RJ).
17

Riddims jamaicanos so bases instrumentais criadas para que vrios


MCs gravem verses com letras diferentes. No Brasil, o grupo QG Imperial (SP) tornou-se especialista em riddims jamaicanos, servindo com
banda de base para artistas nacionais, a exemplo de Lei Di Dai e Jimmy
Luv; e internacionais em apresentaes no pas. Na Bahia, o Dubstereo,
criado no final de 2007, foi a primeira banda a adotar os riddims jamaicanos como referncia, influenciando outros msicos.
18

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 61

CAPTULO II

UM PORTO AFRO-BRASILEIRO
O captulo a seguir traz um histrico das principais formas de
expresso musical que influenciaram, direta ou indiretamente, o ambiente
cultural do Recncavo baiano. O cenrio desta histria a barroca
cidade de Cachoeira, situada no territrio do Recncavo regio que
floresceu sob o crivo da cultura da plantation. Fao aqui uma tentativa
de compor o quadro histrico-social em que surgiram as diversas formas
de expresso musical que aportaram na cidade, suas transformaes e
como algumas se tornaram mais evidentes e (re)conhecidas ao longo
dos anos. Tento reconstituir a gnese do reggae cachoeirano, contada
atravs das falas dos precursores do movimento e de fontes diversas,
como discos e matrias de jornais. O objetivo fixado o de analisar a
presena dos elementos culturais que acabaram compondo a musicalidade e identidade dos msicos locais.

NOTAS MUSICAIS SOBRE


CACHOEIRA
Fui chamado de cordeiro, mas no sou cordeiro no
Preferi ficar calado que falar e levar no
Meu silncio uma singela orao
Cordeiro de Nan, Os Tincos, 1977

Erguida s margens do Rio Paraguau, localizada na regio do Recncavo baiano, Cachoeira deve sua origem a um povoado indgena e
posteriormente a fundao de um engenho. Devido a sua localizao
estratgica, como entroncamento de importantes rotas que se dirigiam
ao Serto, s Minas Gerais ou a Salvador, logo passou a enriquecer e,
em 1693, tornou-se Vila de Nossa Senhora do Rosrio do Porto da Cachoeira. Por conta da explorao da mo-de-obra escrava, ocupou lugar
de destaque na vida econmica, poltica e cultural do pas at o final do
sculo XIX (MARQUES, 2008, p. 132). O desenvolvimento do cultivo de
cana-de-acar e, posteriormente, do fumo, da minerao de ouro no
Rio das Contas e a intensificao do trfico pelas estradas reais e da navegao do Rio Paraguau, colaboraram para o rpido desenvolvimento
econmico da regio a partir do sculo XVIII.
Cachoeira foi um importante porto na rede que se teceu no Atlntico,
tendo de l chegado e partido, grande variedade de povos e culturas.
Durante todo o sculo XVIII foi um dos principais pontos do trfico negreiro e do comrcio baiano, posio que ocupou at o primeiro quartel
do sculo XIX, quando se iniciaram as primeiras rebelies escravas. Joo
Reis aponta que os engenhos de acar do Recncavo prosperaram
muito nesse perodo, em sua maioria, como decorrncia da revoluo
escrava do Haiti, que acabou destruindo a agricultura aucareira. Com
o aumento da produo, houve tambm um aumento do trfico de escravos nessa regio, o que Reis estima que fosse, em 1814, uma mdia
de 40.800 escravos espalhados por 408 engenhos, sendo uma mdia de
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 65

100 por engenho. A maioria desses escravos era de africanos (60%), vindos em grande parte da Repblica do Golfo do Benin, na maioria nags,
jejes e haus, egressos de sociedades guerreiras e muitos adeptos do Isl
(REIS, 1990, p. 101). No por acaso, Cachoeira tambm ficou conhecida
como a Meca da Bahia, pela forte influncia mal na cidade19.
Localizao Geogrfica de Cachoeira

rea: 395 km (IBGE)


Populao estimada: 33.781 habitantes

No sculo XIX, Cachoeira teve projeo na histria poltica nacional,


pela sua decisiva participao nas lutas pela independncia do Brasil.
Segundo Luiz Henrique Dias Tavares (1982), foi de l que ecoaram os
primeiros gritos contra a opresso portuguesa, visando a criao de um
movimento organizado em prol da independncia. De acordo com o historiador, em 22 de junho de 1822, uma canhoneira portuguesa que protegia o Rio Paraguau abriu fogo contra o reduto independentista baiano,
deixando vrios mortos. No dia 25 de junho de 1822, a Cmara Municipal
de Cachoeira proclamou D. Pedro II Prncipe Regente do Brasil. Depois
66 l Brbara Falcn

disto, a cidade foi capital nacional por um dia e capital da Bahia durante 16 meses. Tambm, em 1837, durante a Sabinada, ela voltou
a ser capital estadual. Por todos esses acontecimentos e por toda sua
representatividade e atuao, em 2007, foi criada uma Lei Estadual
10.695/07, que transfere, nos dias 25 de junho, a sede do governo da
Bahia para o Municpio.
A vida cultural de Cachoeira se desenvolveu sob influncia da trade
frica, Europa e Amrica, mas desde sempre houve uma forte presena
negra em toda sorte de manifestaes populares, mesmo em meio represso ou liberdade vigiada. L, como em todo o Brasil, foi atravs
do sincretismo que os negros puderam aos poucos inserir signos de uma
cultura estigmatizada, que foi progressivamente se afirmando e ganhando espao. sabido que o Conde dos Arcos no s aprovava como
incentivava os batuques negros, acreditando que a festa servisse para
aprofundar as diferenas entre as naes africanas e conter a ameaa
de uma revolta unificada. Por este motivo, durante algum tempo, a festa
foi o nico espao concedido para que os negros pudessem mostrar sua
capacidade de organizao e mobilizao, sugerindo uma importante
conquista de espao de barganha sob a escravido. Para Joo Reis:
Alm da barganha relacionada vida material e ao trabalho, os
escravos e senhores, negros, forros, livres e homens brancos, digladiavam-se para definir os limites da autonomia de organizaes e
expresses culturais negras. Entre as instituies em torno das quais
os negros se agregaram de forma mais ou menos autnomas, destacam-se as confrarias ou irmandades religiosas, dedicadas devoo
de santos catlicos (REIS, 1996, p. 10).

Assim, os escravos se aproveitavam do calendrio cultural dos seus


senhores para praticarem suas prprias tradies culturais, entre as quais
a tradio, freqentemente reinventada, de se organizarem segundo a sua
origem tnica. No interior das irmandades, dedicadas a diversos santos catlicos, africanos de diversas naes, alm de crioulos e pardos, desenvolveram prticas identitrias e enfrentaram situaes relativas s diversidades
tnicas e at mesmo alianas intertnicas (REIS, 1996, p. 09). Temos ento
um caso de inverso de poder, onde as irmandades idealizadas pelos seO REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 67

nhores como possveis caminhos para uma catequizao e abrandamento


do esprito africano, passam a servir como um instrumento de identidade e
solidariedade coletivas. Atravs da aproximao com a igreja catlica surgiu o sincretismo, artifcio que permitiu a continuidade do culto aos orixs
em terras brasileiras.
A recriao das identidades tnicas dentro dessas instituies revela
uma dinmica de alteridade, pois dentro desse corpus a comunidade
negra exercia um relativo grau de autonomia e organizao, realizando
suas assemblias, eleies, festas e funerais. Em Cachoeira, uma confraria de mulheres negras tornou-se notvel por essa associao entre
religio de matriz africana e catolicismo. Para Luiz Cludio do Nascimento (2008), a Irmandade da Boa Morte se difere do modelo formal das
irmandades religiosas que existiram no Brasil, por no possuir um compromisso ou estatuto, ou qualquer outro documento, que normalmente
era exigido pelo poder eclesistico para legalizar essas instituies. Tratase de um grupo de mulheres economicamente emancipadas, conhecidas
com negras do partido alto, que se reunia para celebrar seus ancestrais,
mascarado sob o culto da assuno e morte de Nossa Senhora, ou Maria.
Nascimento afirma que a Irmandade exerceu uma importante funo
poltica, viabilizando a formalizao do candombl e resgatando sacerdotisas do cativeiro.
No caso da Boa Morte, como no de outras irmandades e confrarias,
a assistncia mtua prestada denota um censo de solidariedade coletiva
que comprova a formao de uma famlia ritualstica, com identidade
social significativa. Roberto Moura analisa esse fenmeno no livro Tia
Ciata e a Pequena frica no Rio de Janeiro:
Se as famlias e as etnias de origem representavam a ossatura da vida social,
religiosa e de trabalho dos negros, no Brasil, os membros de um candombl se
consideram pertencentes a uma mesma famlia, a famlia de santo, substituta
da linhagem africana desaparecida com a escravatura. Assim, no candombl
e nas habitaes coletivas que se espalham em Salvador, nas juntas de alforria
j no sculo XIX, que o negro exerce sua personalidade profunda, seus ritmos e
valores ligados ao inconsciente coletivo africano (MOURA, 1995, p. 59).

68 l Brbara Falcn

Com suas missas e procisses, os ritos pblicos da Irmandade da Boa Morte ecoam aspectos da religiosidade brasileira do sculo XIX. Os cnticos fazem
parte do cancioneiro catlico popular, tanto que boa parte do pblico que
acompanha a missa e as procisses une-se s irms em um s coro. A programao em homenagem a Nossa Senhora inclui ainda uma festa profana,
nos ltimos trs dias, regada a muita comida e samba de roda (MARQUES,
2002)20. Observa-se, portanto, a incorporao da msica tanto na parte sagrada quanto na parte profana dos festejos, com influncias que denotam a
negociao21 em torno dessa zona de poder repleta de significaes.
O conceito de nao, ligado a princpio a elementos como a lngua, cantos, danas e instrumentos dos povos chegados da frica, deu lugar ao conceito de nao limitado ao mbito das prticas religiosas e das congregaes
organizadas em torno delas. Fica ntida ento a importncia do valor simblico que era atribudo religio e aos elementos que estavam estritamente ligados a ela, como o caso da msica. No candombl, a msica assume um
papel crucial, j que atravs do transe causado pelos toques dos atabaques
que os orixs se manifestam. Para a pesquisadora Angela Lhning, a msica
se estende para alm da vida religiosa desses indivduos:
A funo primordial da msica fazer os orixs se apresentarem aos seus
descendentes, manifestando-se em seus corpos, e danarem. A msica no
danada nos rituais preliminares possibilita uma preparao para que isso tudo
se d nas festas pblicas. Porm, a msica tem tambm uma grande importncia fora das festas pblicas e cerimnias no-pblicas: ela faz parte da vida
cotidiana das pessoas iniciadas. Ela ultrapassa o momento da vida religiosa,
liga o ritual sagrado ao profano e expressa emoes muito fortes em momentos
agradavis e difceis. Assim, a msica se torna o corao do candombl, tanto
nas festas pblicas, em que no h orix sem dana (e que no h dana sem
msica), quanto na vida cotidiana das filhas-de-santo, em que a msica especialmente as cantigas de fundamento e as rezas expressa e alivia as emoes
mais fortes (LHNING, 1990, p. 115).

Em Cachoeira e em outras localidades do Recncavo, como em Santo


Amaro, apesar da represso j mencionada, os batuques sairam das casas e ganharam as ruas. Burlar a perseguio imposta pelos senhores de
engenho no foi uma tarefa fcil, mas em se tratando de um Recncavo
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 69

Rebelde(REIS, 1990), aos poucos as revoltas foram se organizando. Com


a expanso da economia aucareira nos fins do sculo XVIII, cresce a populao escrava e piora as condies bsicas de sobrevivncia desta.
Segundo Joo Reis, o controle da populao escrava se intensifica
aps uma rebelio em 1809 na cidade de Nazar das Farinhas, ocasio em que o Conde da Ponte adotou uma srie de medidas para fazer
face ao que considerava excessiva liberalidade dos senhores com seus
escravos (REIS, 1990, p. 104). Mesmo durante o governo do Conde dos
Arcos, foram adotadas medidas drsticas:
medida em que cresciam as tenses entre brasileiros e portugueses, estes
passaram a ser acusados por aqueles de insuflarem os escravos revolta. Vrias denncias foram recebidas nesse sentido pelo governo provisrio baiano
instalado no Recncavo, que em vista disso, em fins de novembro de 1822,
tomaria severas medidas de controle na regio. Em primeiro lugar ficaram
proibidas as reunies de escravos sob qualquer pretexto, inclusive as festas
religiosas e mundanas ao som de atabaques (REIS, 1990, p. 111).

Mesmo com a vigilncia do governo, os escravos souberam se aproveitar das incertezas polticas geradas pela incapacidade da elite dominante.
As dcadas de 1820 e 1830 foram agitadas por inmeras revoltas separatistas, movimentos de rua e rebelies escravas. Em Cachoeira, aconteceram em 1827 e 1828 grandes levantes no engenho da Vitria e no Iguape,
onde j existia uma composio tnica bastante peculiar, pois j no havia
entre os escravos um s homem africano (ib. idem, p. 114).
importante frisar que apesar do regime escravocrata ter se baseado
fundamentalmente na fora do chicote e em outras formas de coero, no
teria vigorado por tanto tempo se s usasse da violncia. Os senhores de engenho aprenderam desde cedo que era preciso combinar fora com persuasso, assim como os escravos entenderam que seria impossvel sobreviver
apenas na acomodao ou na revolta (REIS, 1996, p. 10). Apesar da luta
dos brancos pela imposio de limites, aos poucos os negros foram conquistando espaos que garantiam, alm da vida material, uma certa autonomia
em torno de suas organizaes e expresses culturais. Nessa histria, uma
rede de mediaes transculturais possibilitou o nascimento do samba.
70 l Brbara Falcn

DO SAMBA AO AFROCANTO
Seguindo uma trilha proposta por Sandroni (2006), optei neste captulo por ir alm das dedues que permeiam os debates sobre o samba
e a sua origem, que em muito se concentram na sua etimologia e na
polmica em torno de uma origem baiana ou carioca. Considerei aqui
o comportamento humano e os aspectos sociais que o cercaram no Recncavo baiano, especialmente em Cachoeira. L, o samba de roda foi
(e continua sendo) parte importante de eventos socioculturais, que integravam festas religiosas, em pequenas localidades e reas rurais. Neste
contexto, o samba torna-se mais do que um ritmo, sendo considerado
como o prprio evento, que exige um sentido de identidade de grupo e
discrimina indivduos competentes para que possam tomar parte dele,
seja da msica ou da dana. Roberto Moura retoma um depoimento de
Joo da Baiana que descreve esse aspecto da tradio sambista e de sua
influncia na cultura popular carioca:
As nossas festas duravam dias, com comida e bebida, samba e batucadas. A
festa era feita em dias especiais, para comemorar algum acontecimento, mas
tambm para reunir os moos e o povo de origem. Tia Ciata, por exemplo,
fazia festa para os sobrinhos dela se divertirem. A festa era assim: baile na sala
de visitas, samba de partido alto nos fundos da casa e batucada no terreiro.
A festa era de preto, mas branco tambm ia l se divertir. No samba s entravam os bons no sapateado, s a elite. Quem ia pro samba, j sabia que era
da nata (MOURA, 1995, p. 115).

importante frisar que o samba sempre esteve ligado famlia de


santo, fortalecendo o sentimento de pertencimento, dentro e fora do espao sagrado. Esse sentimento se expandiu com a dispora baiana para
o Rio de Janeiro, pois segundo Moura (1995) foi atravs de lideranas do
candombl e dos grupos festeiros que os baianos se impuseram no mundo carioca, ajudando a consolidar uma complexa rede de sambas22. O
samba de roda tido, de certa maneira, como um dos precursores diretos
do samba carioca, por conta desses migrantes que chegaram ento ca-

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 71

pital brasileira na virada para o sculo XX, no perodo ps-abolicionista.


Tanto l quanto c essa msica abriu espao num campo minado de
significaes, diluindo as fronteiras entre o sagrado e o profano, entre
ritos e rituais.
Assim, no Recncavo baiano, a msica foi se tornando mais que um
fenmeno acstico, que, a exemplo do samba, poderia produzir, mesmo que silenciosamente, movimentos interessantes. L, o cruzamento de ritmos possibilitou o uso de instrumentos de heranas diversas e
tambm diferentes maneiras de fabric-los e toc-los, o que reflete uma
utilizao da terminologia do colonizador ressignificada. O pesquisador
Tiago de Oliveira Pinto (1999) considera o samba, como outras manifestaes brasileiras com evidentes traos africanos, muito mais que um
fenmeno puramente acstico, pois esto vinculados a variadas formas
de expresso que denotam estratgias de sobrevivncia de determinados grupos sociais. Para ele:
Toda produo musical, em especial a afro-brasileira, obedece a processos
complexos, que so compostos por elementos sonoros, movimentos, interrelaes mltiplas, aconteam elas entre diferentes instrumentos, entre os
cantores e instrumentistas, entre o contexto e o prprio texto musical e
mesmo entre musicalidades e vises de mundo (PINTO, 1999, p. 90).

Pinto afirma que as caractersticas africanistas de se pensar e fazer


o samba de roda, expressas na msica e nos seus movimentos, tanto na
dana como na execuo instrumental, atestam a continuidade da estrutura e da performance musical africana:
No Recncavo baiano a tradio da viola de samba, o machete, reflete
esse processo. O instrumento de origem portuguesa assume a cor africana com a insero de sua sonoridade na prtica musical afro-brasileira,
desconsiderando, portanto, a pele branca daqueles que o introduziram
no Brasil (PINTO, 1999, p. 107).

O gnero chamou ateno do pesquisador americano Ralph Cole


Waddey, que na dcada de 80 desenvolveu um estudo pioneiro sobre
o samba de viola e a viola que compe este samba, conhecida como

72 l Brbara Falcn

machete. A pesquisa de Waddey resultou numa publicao lanada em


1980, considerada como um marco do estudo das tradies musicais do
Recncavo baiano. Junto com o acervo de Tiago de Oliveira Pinto, que
realizou importantes pesquisas sobre o samba de roda nos anos 1980 e
1990, o acervo de Ralph Waddey uma das mais importantes colees
etnogrficas sobre o assunto hoje existentes.
O samba de roda do Recncavo baiano foi declarado pela Unesco
em 2005, como Patrimnio Oral e Imaterial da Humanidade. Para propor a candidatura foi preparado em 2004 um dossi de registro coordenado pelo pesquisador Carlos Sandroni, que contou com a colaborao
de especialistas como Ari Lima, Josias Pires, Katharina Dring, Suzana
Martins e Francisca Marques que desde 2001 realiza estudos no Recncavo. Em Cachoeira, onde coordena o Laboratrio de Etnomusicologia, Antropologia e Audiovisual LEAA, Marques vem produzindo um
importante acervo, com gravaes em DAT, do samba de roda na festa
de Nossa Senhora da Boa Morte, alm de desenvolver um projeto de
educao comunitria que capacita jovens como pesquisadores em etnomusicologia e cultura popular. Tratando mais especificamente do samba
de roda de Cachoeira, a etnomusicloga observou algumas peculiaridades em sua pesquisa apresentada no Programa de Ps-Graduao em
Msica da UFRJ em 2003; dentre elas os tipos de samba, a exemplo
do barravento e do corrido, que trazem diferentes modos de tocar,
cantar e danar.
No primeiro, ningum samba enquanto se canta e quando termina a
parte cantada, s samba uma pessoa por vez no meio da roda, apenas
ao som das palmas e dos instrumentos, com destaque para a viola. Na
coreografia, o gesto mais tpico o chamado miudinho, feito, sobretudo, da cintura para baixo, num quase imperceptvel deslizar para frente
e para trs com os ps colados ao cho, com movimentao correspondente dos quadris. No samba corrido, o canto mais tipicamente responsorial, alternando-se rapidamente entre um ou dois solistas e a resposta
dos participantes. A dana acontece ao mesmo tempo em que o canto e
vrias pessoas podem sambar de uma s vez. Um diferencial dos grupos
de samba de roda de Cachoeira o uso de tabuinhas ou taubinhas na

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 73

padronizao rtmica das sambadeiras. Durante as festas religiosas que


acontecem na cidade so observados outros tipos de manifestaes que
incorporam msica, como a capoeira e a esmola cantada da Ladeira da
Cadeia, onde os participantes cantam e tocam hinos catlicos percorrendo as ruas em busca de donativos para a Festa da Santa Cruz. A esmola
cantada costuma comemorar nos dias de festa com samba de roda, mas
tambm j incorpora um bumba-meu-boi ao grupo.
De uma forma geral, o samba de roda acontece em dias do calendrio festivo, que tem como datas principais o 02 de Fevereiro, festa de
Iemanj; 13 de maro, aniversrio da cidade; a segunda quinzena de
junho, festejos juninos; a festa da Boa Morte, que acontece em agosto,
geralmente no final da primeira quinzena; a festa de Nossa Senhora do
Rosrio, em outubro e a festa de Nossa Senhora dAjuda, em novembro.
Vale ressaltar que durante a festa dAjuda h uma intensa participao
dos msicos das filarmnicas que acompanham de maneira mais informal, desagrupados das suas entidades e sem os tradicionais uniformes,
os ternos durante os embalos nas ruas de Cachoeira. Junto s filarmnicas, esses msicos apresentam-se em comemoraes cvicas, procisses religiosas e quando contratados para ocasies diversas.
Chamo ateno para a atuao das filarmnicas em Cachoeira, onde
sempre desenvolveram trabalhos de incluso social por meio da formao
musical dos indivduos. Os projetos sociais mantidos pelas entidades garantem o ensino gratuito para dezenas de crianas e jovens da comunidade,
auxiliando a insero destes no mercado de trabalho atuando como msicos
profissionais em Salvador e em outras cidades. No sculo XIX, surgiram as
primeiras sociedades filarmnicas em Cachoeira, a exemplo da Sociedade
Cultural e Orpheica Lyra Ceciliana, fundada em 1870, e da Sociedade Ltero Musical Minerva Cachoeirana, fundada em 1878. A produo musical
da cidade que durante a colnia ficou quase que restrita aos hinos religiosos
catlicos, aos cnticos de candombl e s msicas africanas em processo de
nacionalizao, se transformou a partir do contato com a msica europia
em voga. Isto porque a msica europia estava estruturada em forma de
cano, sendo registrada em pauta e usava instrumentos diversificados, que
iam do piano aos instrumentos de sopro, como o saxofone.
74 l Brbara Falcn

As filarmnicas catalizaram as diferenas e tendncias de tudo o que


acontecia na msica no Brasil e no mundo. importante frisar que o msico de filarmnica do Recncavo sobretudo o msico de instrumento
de sopro se inseriu mais recentemente no contexto do reggae e passou
a ser valorizado no mercado em todo o estado pela formao musical
nessas instituies. Interessante observar que a exemplo do que aconteceu na Jamaica, na Alpha Boys School23, internato para garotos rfos
digirido pela clebre Sister Mary Ignatius, onde estudaram msicos do
grupo Skatalites e artistas como Yellowman; as filarmnicas em Cachoeira se constituem como escolas profissionalizantes, que vm formando
msicos de destaque.
Para o pesquisador Juvino Alves (2003), as Sociedades Filarmnicas,
de Euterpe e Ltero Musicais, foram verdadeiros centros culturais de formao musical e cidadania em toda Bahia. Alves realizou uma rdua investigao sobre o maestro cachoeirano Manuel Tranquilino Bastos (18501935), responsvel pelo surgimento de mais de seis dessas sociedades,
sendo hoje algumas centenrias e outras extintas. Segundo Alves, a formao musical de Tranquilino foi tecida a partir da cultura musical do Brasil
de sua poca, em particular de Cachoeira, sua terra natal, em dilogos
com as culturas italiana, francesa, alem e espanhola, mas principalmente
das duas primeiras. A marca da pera na msica deste Mestre, e de muitos
outros, bastante presente e pode ser observada em suas obras.
Filho de uma escrava alforriada e de um portugus, o maestro Tranquilino foi um grande defensor da abolio da escravatura. Em 1870,
fundou a Lyra Ceciliana, composta na sua origem por operrios, atuantes no movimento abolicionista. De acordo com jornais da cidade, em
13 de maio de 1888, a Lyra, regida pelo seu Maestro fundador, uniu-se
a Orphesina Cachoeirana e a Euterpe Ceciliana, assumindo o comando
de uma histrica passeata com aproximadamente oito mil pessoas, para
celebrar a assinatura da Lei urea, conforme consta em ata da reunio
do Montepio dos Artistas Cachoeiranos. Em maio de 2009, para comemorar os 121 anos do fim da escravatura no Brasil, os cachoeiranos rememoraram essa passeata em um encontro da Orpheica Lyra Ceciliana
com a Ltero Musical Minerva Cachoeirana.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 75

Todos os segmentos da populao de Cachoeira e da vizinha cidade


de So Flix foram mobilizados saindo em passeata que refez o trajeto do
histrico 13 de Maio, at o Alto do Rosarinho, onde esto situados a Igreja
e o Cemitrio dos Nags. Alm da manifestao popular houve uma programao acadmica promovida pela Universidade Federal do Recncavo
(UFRB) por intermdio da PROPAE Pr-Reitoria de Polticas Afirmativas e
Assuntos Estudantis e da Superintendncia de Cultura e Desenvolvimento.
O historiador Walter Fraga, lembra que o 13 de Maio foi bastante festejado
na Bahia e em vrios pontos do Imprio e que o final da escravido resultou
de uma luta que envolveu escravos, livres, libertos, diversas camadas da
populao. Para Fraga, o fim da escravido foi uma vitria:
Havia o sentimento de que o Brasil pudesse dar um salto em termos de
transformaes sociais, a sensao de que se vivia o momento fundador
de uma nova era. A grande imprensa at hoje d pouca importncia a
esta data, que foi o grande movimento social que o Brasil testemunhou
no sculo XIX. [...] uma luta longa e difcil, mas que fez emergir novos
projetos de liberdade e cidadania (Walter Fraga, entrevista para o A
TARDE de 13/05/2009).

Antes da abolio, em 1858, outro cachoeirano, o compositor Joo


Manoel Dantas (1815-1874), tambm migrou para a capital carioca e fez
histria por l. Segundo o pesquisador Pablo Sotuyo Blanco (2007, p. 01),
Dantas foi um importante agente de disseminao da msica na Bahia, protagonista na transmisso e, possivelmente, inaugurao de prticas musicais
na segunda metade do sculo XIX, a partir de novas informaes biogrficas
e musicais, com destaque para a obra Viagem da Bahia para o Rio de Janeiro, composta para piano em 1858, sendo, talvez, a primeira msica programtica realizada por compositor brasileiro. No mbito da msica profana
brasileira de meados do sculo XIX, essa pea se destaca por no se tratar
de msica de dana, como a maioria das composies para piano que circulavavam no pas, nem ter relao direta com msica vocal ou com nenhuma
das peras em voga da poca (BLANCO, 2007, p. 06).
A abolio trouxe a liberdade e a esperana, mas trouxe tambm
grandes problemas, como a falta de trabalho e as pssimas condies
de moradia, o que motivou um fluxo de migrao do interior para a
76 l Brbara Falcn

capital e engrossou o fluxo de baianos para o Rio de Janeiro. L a


presena das tias baianas, dentre estas, uma cachoeirana, Tia Ciata,
teve um papel importante na formao do ritmo que mais tarde se
tornou smbolo de identidade nacional. Assim, baianos e seus descendentes foram incorporados pela sociedade carioca, atravs de laos de
solidariedade que passaram a estreitar-se nas relaes de vizinhana e
trabalho, criando mais tarde tambm um novo panorama no mbito da
indstria de diverses, que comeava a se formar no pas. A partir dos
anos 1930, artistas e gneros musicais das camadas mais populares,
antes limitados a grupos particulares, foram absorvidos pela indstria
cultural no Rio de Janeiro.
Tornando a tratar dos movimentos da musicalidade em Cachoeira, temos na dcada de 60 um interessante cenrio que precedeu e
influenciou a gerao de msicos entrevistada para esta pesquisa. No
final dos anos 50, surgiu em Cachoeira um trio de vocais, o Tincos,
que, a princpio, foi influenciado pelo rdio e pela informao que
recebia atravs de suas ondas. O primeiro disco do grupo, lanando
em 1960, teve como referncia o sucesso alcanado pelo bolero nas
duas dcadas anteriores, com o sugestivo nome O ltimo Bolero. A
partir da sua segunda formao e do disco Os Tincos, lanado em
1973, passaram a ser fortemente inspirados pela msica dos terreiros
de candombl, tendo como base apenas quatro instrumentos (violo,
atabaque, agog e cabaa) e coral.
O repertrio desse disco foi todo adaptado de canes populares da
regio com exceo de Canto pra Iemanj de autoria de Mateus e
Dadinho sendo alguns sambas de roda e outros cnticos de candombl,
criando um belo panorama da cultura do Recncavo. Gravado e lanado
pela Odeon, contou com produo musical do maestro Lindolfo Gaya,
tendo como resultado sonoro uma perfeita harmonia vocal do grupo,
que, pelo envolvimento com o tema e pesquisa nos terreiros, conseguiu
traduzir o sentimento e a musicalidade das canes interpretadas. Como
a temtica afro j vinha sendo trabalhada por outros artistas Clara Nunes e Martinho da Vila gravaram os maiores sucessos entre as msicas
com esse tema o LP, em pouco tempo, tornou-se recordista de vendas.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 77

O tropicalista Gilberto Gil afirma que a postura daqueles black powers


na capa do disco ajudou a despertar nele e em outros artistas uma conscincia racial e ritualstica:
Eu adorava Os Tincos, aquela melodia, aquela harmonia to prpria,
o peso da voz e o gosto deles em trabalhar a distncia entre os baixos profundos e os hiperagudos falsetes. Eu ainda no tinha proximidade com o
candombl, mas adorava aquele trao negro, os arranjos e o repertrio.
Eles foram pioneiros, anteriores a tudo. Sustentaram um compromisso
com a dimenso afro-baiana, ciosos do valor daquilo que faziam, e mesmo tendo o conflito com o convencionalismo dominante, demonstraram
cuidado com valores que, na poca, a gente nem estava atento (Gilberto
Gil, entrevista ao CORREIO DA BAHIA, 26/03/2006).

A partir do disco Gil Jorge Ogum Xang, lanado em 1975, Gil tambm passou a ter o candombl como referncia em seu trabalho, tanto na
capa do LP que tinha a imagem de dois bzios como nas letras das
msicas, a exemplo de Filhos de Gandhi.
Nesse mesmo ano, Os Tincos gravaram um compacto e tiveram a
faixa Banzo, no LP da trilha sonora da novela Escrava Isaura da Rede
Globo, de Heckel Tavares e Murillo Arajo. Neste disco o nome do trio
aparecia entre o de importantes intrpretes da msica brasileira, como
Elizeth Cardoso, Francis Hime e Dorival Caymmi. A msica Cordeiro de
Nan, de autoria de Mateus Aleluia e Dadinho, foi a mais gravada por
outros artistas, sendo Joo Gilberto e Gilberto Gil alguns deles. Recentemente ela pde ser ouvida na voz de Thalma de Freitas, como parte da
trilha sonora da telenovela Senhora do Destino (2005), que foi reprisada
pela Rede Globo no ano de 2009.
Os rapazes de Cachoeira fizeram vrias turns pelo pas e foram convidados a se apresentar em alguns pases da Amrica Latina, frica e
Europa. No Brasil, participaram de inmeros festivais de msica e programas de auditrio, e figuraram entre os primeiros colocados do Globo
de Ouro, programa da Rede Globo onde se apresentavam os artistas
cujas msicas estavam entre as mais pedidas e que tinha uma das maiores audincias da televiso brasileira na dcada de 70.
78 l Brbara Falcn

Diversos artistas brasileiros, a exemplo de Martinho da Vila, Joo Gilberto, Benito de Paula e Joo Nogueira gravaram msicas dos Tincos.
Recentemente Carlinhos Brown gravou Obalu, uma adaptao de
Mateus, Dadinho e Heraldo para um cntico de candombl24.
Obalua
(Adap. Mateus, Dadinho e Heraldo)

Obalua / Babalorixa- / Babalorix, atot / Babalorixa-


Nir, Nir / Nir, Nir / Babaolorum xex saleroj
Babaolorum xex saleroj / A nir, Nir / A nir, Nir
A nir, Nir / A nir, Nir / Meu padrinho obalu / Orix
Meu padrinho obalu / Orix / Nir, Nir / Nir, Nir
Babaolorum xex saleroj / Babaolorum xex saleroj
A nir, Nir / A nir, Nir / A nir, Nir / A nir, Nir

O msico Geraldo Cristal faz referncia ao grupo em entrevista realizada para esta pesquisa, destacando a influncia que a msica afro dos
Tincos exerceu em seu trabalho:
Eu gostava de tudo, quando eu comecei a me entender assim, por exemplo, eu me lembro de ouvir Tincos. Depois que eu passei a ter um entendimento melhor, Tincos foi a minha primeira influncia african pop
mesmo. uma msica que me arrepia at hoje, assim. Quando eles cantavam uma msica assim: h, Jesus, dai fora e luz aos orixs. Quando
eu ouvi isso, era a nica msica ali, todas as msicas deles: Embola,
embola, embola, minha nga, embola, embola que eu tambm quero
embolar. h, raposa. O que Guar? Voc t chupando cana dentro
do canavial. Ento tudo isso era o que eu j ouvia como uma referncia,
Mateus, Eraldo e Dadinho (Geraldo Cristal, entrevista em 29/11/2007).

De fato, a contribuio de elementos da cultura cachoeirana tem sido


considervel para a formao da msica brasileira; do samba de roda e
suas derivaes, passando pelas msicas dos terreiros de candombl
at o aporte do antolgico grupo Tincos.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 79

NO BALANO DO REGGAE
O reggae tem o mesmo gosto que vocs conhecem,
as mesmas razes e a temperatura que o samba tem.
Ns somos prximos.
Bob Marley, Jornal do Brasil, 21/03/1980

Como visto no captulo anterior, a partir dos anos 60, o reggae ganhou
projeo internacional. Em pouco menos de uma dcada, favorecido por
uma srie de acontecimentos e circunstncias, o ritmo passou a ser um
forte demarcador de identidades em toda a Amrica negra. No Brasil,
Cachoeira tornou-se um porto atlntico afluente para as sonoridades jamaicanas, que passaram a ecoar na produo musical de artistas locais a
partir dos anos 70. L, como em toda a Bahia, alguns fatores possibilitaram a identificao com o discurso e a musicalidade do reggae, a ponto
de torn-lo parte da cultura local. A chegada das novidades da indstria
fonogrfica, atravs do rdio e dos discos, num dado momento histrico,
onde a valorizao do negro aos poucos ia se tornando possvel, levaram
alguns jovens a essa identificao. Facilitada pela forte presena negra,
numa cidade onde a musicalidade afro se manteve em toda sorte de manifestaes culturais, conforme demonstrado nas pginas anteriores.
A insero do ritmo jamaicano em Cachoeira se deu basicamente por
um grupo de msicos que passou a t-lo como referencial musical em suas
composies depois de conhec-lo e decodific-lo. Segundo depoimento de alguns entrevistados, o reggae comeou a circular entre a juventude
do Recncavo ainda nos anos 70, quando um dos precursores do gnero
em Cachoeira, Nengo Vieira, foi apresentado msica de Bob Marley:
Em 77, eu tinha um colega que era msico tambm, o Beto Marques, e
ele me levou na casa dele em Muritiba, onde eu pude conhecer o trabalho
do Bob Marley pela primeira vez, o Rastaman Vibration. A principio no
me identifiquei muito com a musicalidade do Marley, porque eu tinha

80 l Brbara Falcn

outras influncias, de Beatles, que era uma coisa mais harmoniosa, de


melodias e de vocais. Mas depois, em 80, quando eu comecei a conhecer
com mais profundidade, eu vi a grandiosidade e a riqueza que tava no
trabalho de Bob Marley (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

O msico Tin Tim Gomes diz que antes conheceu o reggae de Jimmy
Cliff, durante festas nas casas de alguns amigos em So Flix. Ele ouviu
uma msica de Bob Marley25 pela primeira vez na Casa Paulo Dias Adorno que segundo Tin Tim funcionava nos moldes de uma organizao
no governamental onde a juventude cachoeirana se reunia informalmente para produzir e consumir cultura durante os anos setenta. Mas
ele afirma que conheceu melhor o trabalho de Bob Marley quando foi
estudar em Salvador, atravs de um amigo do bairro da Liberdade:
Quando eu fui morar em Salvador, foi que eu tive mais contato com o
reggae de Bob Marley e dos The Wailers. Tinha um colega meu mesmo,
chamado Carlos Augusto, que morava na Liberdade, e nessa poca eu
morava com minha irm no Pau Mido, em 1980. Eu tava curtindo muito
ainda Jimmy Cliff e tal, a ele falou assim: Rapaz, voc precisa prestar mais
ateno ao reggae de Bob Marley, porque Jimmy Cliff bom, mas quando
voc comear a ouvir Bob voc vai conhecer um outro reggae. A num
domingo de manh eu fui na casa do tio dele, que tinha muitos discos de
Bob Marley, praticamente a discografia toda, o Uprising, Survival, Kaya,

Rastaman Vibration, Live. [...]. Quando eu ouvi aquele reggae eu fiquei


louco (Tin Tim Gomes, entrevista em 07/06/2008).

Tin Tim Gomes relatou em entrevista que ele e outro irmo, o Eddie
Brown, j acompanhavam o irmo mais velho Edson Gomes, em apresentaes em Cachoeira e So Flix, e que mesmo indo morar em Salvador,
viajava nos finais de semana para essas apresentaes com os irmos. Em
uma dessas idas para So Flix, ele levou dois discos de Bob Marley que
havia pedido emprestado ao amigo Carlos, para que pudesse mostrar aos
irmos e amigos no interior. Nessa poca, Edson Gomes j era compositor
atuante em sua cidade, vencedor de dois festivais, um de msica estudantil
em 1973 (aos 17 anos) e outro de maior projeo, o Festival de Inverno
de Cachoeira em 1977. Com Edson, um contato maior com o reggae se
deu em 83, quando os msicos Nengo Vieira e Jair Soares, integrantes
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 81

da Studio 5 banda que acompanhou o cantor Lazzo26 na gravao do


seu primeiro disco, o Viver, Sentir e Amar (1983) assistiram uma apresentao dele e o convidaram para participar de um show em Salvador,
o Negritude Reggae. Vieira, que conhecia Gomes desde a infncia, por
serem conterrneos, fala desse reencontro em Cachoeira:
Eu vi Edson ali, trabalhando com o violo dele e com uma bateria de percusso, acompanhando ele, dois vocalistas, um deles era irmo dele. E ali
rapaz, foi uma coisa assim que eu fiquei extasiado de ver um compositor
maduro, um compositor j pronto, com a sua leitura da cano, da composio pronta, s faltava mesmo o conjunto, o acompanhamento. E a partir
desse reencontro, inclui no meu repertrio uma msica do Edson Gomes,
Na Sombra da Noite, com aquele arranjo que depois Sine Calmon gravou,
n? E a partir dali rapaz, nasceu um reencontro muito bacana. E nesse projeto, junto com Jair Soares, ns convidamos Edson Gomes pra participar desse
trabalho, intitulado Negritude Reggae, que foi um marco aqui na histria do
reggae da Bahia (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

Sobre o Negritude Reggae, Edson Gomes observa que foi a sua


primeira apresentao com uma banda e tambm sua primeira apario
em pblico cantando reggae:
Exatamente, eu lembro. Foi l no Forte de Santo Antonio, no Barbalho. Foi exatamente esse show que Nengo me convidou pra participar.
S que o repertrio de reggae era comigo. Ento foi a minha primeira apario em Salvador e tocando com banda tambm. Banda com
guitarra, baixo, bateria, foi a primeira vez tambm. Eu at me assustei
porque eu nunca havia sido acompanhado por uma banda, tocava sempre com o violo e o pessoal do sambo me acompanhando e essa foi
a primeira vez. Senti que apesar de no ter reunido um pblico grande, quem foi levou uma boa impresso. Pra mim tambm foi bacana,
porque foi a minha primeira experincia com reggae, com uma banda.
(Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

No incio dos anos 80, Gomes se apresentava com grupos de sambo, como A Balaiada e A Gatinhola em Cachoeira e So Flix, cantando algumas de suas composies que se tornaram conhecidas como
82 l Brbara Falcn

Hereditrio27 e Na Sombra da Noite28. Durante essa fase, em que


foi bastante influenciado pela msica negra brasileira, especialmente por
Tim Maia e Jorge Ben Jor, ele denominou o som que fazia intuitivamente
de balano:
Eu tive Tim Maia como referncia na rea de canto, aprendi muito com
ele. No foi tanto assim na rea literria no, mas na rea de canto, ele me
influenciou muito. Eu chamava a minha msica de balano. Porque era um
balano passando por Jorge Ben. Era uma mistura de Jorge Ben com Tim
Maia, entendeu? A com o reggae, eu transformei tudo que eu j tinha feito
em reggae. Malandrinha no era reggae, Samarina no era reggae, Sombra da Noite, Hereditrio (Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

O convite para participar do Negritude Reggae (1983) em Salvador


foi aceito por Edson Gomes, que teve suas msicas rearranjadas pela
Studio 5, sob direo musical de Nengo Vieira, que j vinha pesquisando
e querendo incluir mais reggae em seu repertrio29. A partir da, Gomes
entendeu que o reggae seria o veculo perfeito para suas composies:
Foi Nengo, que atravs de Amrica, de Jair, da Studio 5, que me viram
aqui me apresentando em Cachoeira, com sambo, o pessoal do sambo
me acompanhando, e viu que a letra no tinha nada de sambo. J era
protesto, j era Malandrinha, j era Viu, era Guerra, era Hereditrio,
Sombra da Noite. A que veio o convite de Nengo pra me apresentar no
show dele l em Salvador. Ento foi assim que eu penetrei no reggae e
passei a ter uma conscincia do reggae, que antes eu no conhecia essa
msica, o reggae. J tinha ouvido falar em Bob Marley, Peter Tosh, mas
eu conhecia mais Jimmy Cliff, que no era o reggae que depois eu vim a
conhecer atravs de Bob Marley. Porque Jimmy Cliff era aquele reggae j
diludo, entendeu? A ento, foi Nengo que me convidou pra participar do
show dele e o Nengo no era reggae, era uma outra histria, mas ele era
muito assim interessado. Ele pesquisava reggae, ento ele viu em mim o
reggae. Ele me introduziu no show dele com uma participao de reggae,
de cinco msicas. A ento eu passei um ms na casa dele ensaiando e ele
fez todos os arranjos do reggae. Ele colocou as minhas msicas pra reggae,
foi assim que aconteceu. E quando eu ouvi o reggae mesmo com o Bob
Marley, a que a coisa clareou pra caramba. [...]. Houve uma identificao
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 83

muito forte e a eu percebi que era a minha tambm, que era o meu veculo
tambm. Ento foi assim que se deu, os amigos me introduziram no reggae (Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

O reencontro de Nengo Vieira com Edson Gomes em 1983 desencadeou uma parceria que produziu alguns resultados importantes para
a histria da msica reggae na Bahia e que, posteriormente, acabou influenciando uma gerao de msicos em Cachoeira. Sobre este aspecto
Gomes comenta:
Ns mexemos com toda a cidade, mexemos com os jovens. Os jovens
se interessaram: Ah, se deu certo com eles, eu tambm posso. A a coisa
pegou, n? Quer ver uma coisa? Voc falou de Cristal. Cristal era adolescente, ele era adolescente. Todo show que eu fazia aqui ele ficava me
observando e acompanhava, e no era ainda o reggae, no era o reggae
ainda. Ele j acompanhava, ele e a irm dele, acompanhavam. Me pedia
pra me dele liberar ele pra ir pro meu show, eu ia l pedir. E hoje ele
regueiro tambm. Nengo tinha Sine como um espectador tambm, ele
tocava, Sine ficava ali olhando. Ento essa semente foi plantada aqui
(Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

O depoimento do msico Geraldo Cristal, que nasceu em Cachoeira


em 1967, reafirma o discurso de Gomes. Cristal fala da lembrana que
tem de Edson e da influncia que a msica dele teve em sua vida:
Eu lembro que, na poca, minha me j tinha uma casa na Fonte Nova
[localidade de Cachoeira], e ele em uma casa em frente, ele com o violo, e
logo depois ele comeou a aparecer, n? Acho que depois de uma viagem
que ele fez a So Paulo, a ele j voltou tocando. Edson tocando com voz
e violo, e com aqueles instrumentos do sambo. Ento eu costumo dizer
que o sambo reggae comeou em Cachoeira. Porque era um Edson com
um violo, com um bong, com um pratinho e sendo acompanhado por
aqueles instrumentos de samba, que eram tocados na praia [tucumtum

tuticum tucumtum tuticum]. Era aquele ritmo que ele no sabia muito bem
o que era, que no era um reggae. Era um pouco dessa influncia dele
tambm de Tim Maia, do soul, que depois foi chegando mais prximo da
batida do reggae. Ento, pelo que eu me lembro assim, a minha influncia
84 l Brbara Falcn

musical recheada dessas pinceladas. Assim, de tudo que eu pude perceber na dcada de 70, at quando eu comecei a ouvir o reggae mesmo, n?
(Geraldo Cristal, entrevista em 28/11/2007).

A voz marcante e as letras de Gomes chamaram ateno de Vieira,


que somou o seu trabalho como musicista e pesquisador ao interesse
que tinha em fazer reggae. A parceria e convivncia entre os dois duraram at o incio dos anos 90, quando Nengo retornou para Cachoeira
com o Remanescentes, emblemtico grupo que durou at meados da
mesma dcada. Antes disso, Nengo Vieira foi assistente de direo do
primeiro disco de Edson Gomes, o Reggae Resistncia (1988), gravado
nos estdios da WR, em Salvador, e gravou ainda os dois discos seguintes da carreira dele, onde tocou baixo, guitarra, percusso e fez os
arranjos. Junto com Jair Soares, ele tambm passou a integrar a banda
Co de Raa, que alm de gravar os trs primeiros discos, acompanhou
Gomes em algumas turns pelo Nordeste. Sobre a parceria que durou
alguns anos, Edson Gomes acredita que tenham realizado um trabalho
pioneiro no pas:
Eu creio que foi a primeira localidade no Brasil que se fez uma leitura
correta do reggae, sabe? Porque at ento no havia uma leitura correta
do reggae. Havia sempre uma tentativa, como o pessoal em Salvador,
como Lazzo Matumbi []. Ento ns conseguimos isso porque eu tinha
a letra e Nengo tinha o instrumental. Nengo era pesquisador de reggae,
ento tinha o instrumental, e esse casamento foi perfeito, ns fizemos a
melhor leitura. A melhor leitura que foi feita do reggae no Brasil inicialmente, foi aqui em Cachoeira, por dois cachoeiranos (Edson Gomes,
entrevista em 10/06/2008).

Em 1984, na cidade de Salvador, Gomes passou a se apresentar com


a Studio 5 em um projeto da prefeitura municipal, o Bairro a Bairro
(Folha do Reggae, n 02, 1997, p. 03), percorrendo alguns bairros populares da cidade. Sobre este momento inicial, Nengo Vieira afirma ter
percebido uma resposta imediata do pblico, antes mesmo do primeiro
disco ser lanado. O msico aponta o disco Reggae Resistncia como um
divisor de guas na msica baiana:

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 85

Comeamos a arranjar as msicas de Edson, a ilustrar as msicas do Edson Gomes, que at ento s tinha o canto e o contracanto prontos. A comeamos a botar os elementos, a bateria, o contrabaixo, a guitarra e foi a
que nasceu o Reggae Resistncia, que o primeiro disco de Edson Gomes.
Rapaz, no s o disco, mas a partir do momento que ns nos juntamos com
Edson, ns percebemos uma fora que era imbatvel. A nossa fora junto
com Edson era uma fora, assim tipo, que ningum poderia abater a gente.
Edson quando subia no palco pra cantar, cara, ele arrebanhava multides.
Dava um grito de guerra e a galera ia ao delrio. Era uma coisa viva, uma
coisa espontnea, uma coisa visceral, tribal, que ningum poderia deter,
que ningum poderia abafar. Eu percebi isso desde os shows e quando o
disco saiu teve essa resposta assim de imediato, com sucessos j consagrados, como Malandrinha, Sombra da Noite, Samarina, Co de Raa,
Rastafary, que foi sucesso na poca tambm; e foi um divisor de guas,
n? Paralelo a isso a gente sempre dava continuidade ao nosso trabalho
como Studio 5 (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

A primeira gravao de Edson Gomes se deu em 1985, depois de


vencer o Festival Canta Bahia30, com a msica que ele afirma ter sido sua
primeira composio concebida como reggae, a Rastafary, lanada em
um compacto. No ano de 1987, em Salvador, ele foi premiado com o
Trofu Caymmi como melhor intrprete, o que lhe rendeu um contrato
com a EMI e a possibilidade de gravar seu primeiro disco em 1988, nos
estdios da WR, em Salvador.
Gomes conta que a maioria das msicas gravadas no primeiro disco
foram rearranjadas e que Rastafary, seu primeiro reggae, foi feito em
homenagem a Bob Marley:
A primeira cano que nasceu reggae mesmo foi Rastafary. Bob Marley
j havia falecido e eu queria fazer uma msica que abordasse alguma coisa de Bob Marley, que falasse de Bob Marley, mas eu no queria fazer um
reggae como todo mundo fazia na poca, falando da Jamaica, do sol da
Jamaica, aquela coisa. A eu no queria aquela coisa, eu queria uma letra
que fosse um reggae que abordasse algum assunto, fizesse uma homenagem. Eu fao uma homenagem a Bob Marley como precursor do reggae.
Ento foi a primeira cano minha que nasceu j reggae. Agora, as outras
86 l Brbara Falcn

do Reggae Resistncia, a maioria delas, quase total, no era reggae, eu j


cantava muito ali no Beira Rio, n? No Beira Rio, um hotel que tem ali em
Cachoeira na beira do rio. Ento eu me apresentava muito ali. E tem um
fato curioso, que eu s me apresentava com as minhas msicas mesmo
e eu interpretava muito Tim Maia e o prprio pblico comeou a limar
(Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

importante frisar que o principal artista jamaicano a influenciar o


reggae de Cachoeira foi, sem dvida alguma, Bob Marley e os msicos
que formavam com ele a emblemtica The Waylers. Todos os msicos
entrevistados foram unnimes na indicao, o que comprova a preferncia ou identificao com a msica feita pelo grupo que tinha Marley
como lder. Edson Gomes, inclusive, confirmou que seu primeiro reggae,
Rastafary31 foi feito em homenagem ao Rei. Em entrevista revista
eletrnica Ritmo e Melodia (2007), Nengo Vieira fala dele como sua principal referncia musical:
Bob Marley e The Waylers minha maior influncia no reggae, apesar de
ouvir outros artistas. No reggae nacional no tenho influncia de ningum.
Como fomos precursores no movimento regueiro baiano, passamos a exercer uma influncia na cena reggae nacional de uma forma geral (Nengo
Vieira, entrevista revista Ritmo e Melodia, em 02/11/2007).

O msico Marco Oliveira, que integrou a segunda formao da banda


Studio 5 e posteriormente a Remanescentes, fala dessa influncia, que
tanto Bob Marley, quanto os precursores na Bahia tiveram sob a sua
iniciao no reggae:
Quando eu vi que isso j estava acontecendo na Studio 5, que o pessoal
gostou do reggae, eu entrei tambm, porque quando eu ouvi Bob Marley
eu entendi que o reggae era a evoluo musical de toda msica negra,
eu aderi total [...]. Porque eu traduzi essa musicalidade que j existia, j
confirmada, j produzida do reggae de Bob Marley, j pronta. Porque
Bob Marley, Peter Tosh e Bunny Wayler j tinham uma musicalidade
pronta. A forma essa e tal. S que o seguinte, isso traduzido as nossas
condies, traduzido ao nosso modo de viver, traduzindo todas as coisas
que a gente sabe (Marco Oliveira, entrevista em 22/11/2007).

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 87

No final de dcada de 80, os msicos que formavam a Studio 5 passaram a trabalhar mais com Edson Gomes, acompanhando seus shows
e gravando seus discos, como banda Co de Raa, nome do qual Gomes no abria mo32. Aos poucos foram deixando de tocar o repertrio
mesclado da Studio 5 e se focando mais no reggae e na Bblia, e assim
surgiu a Remanescentes, da convivncia na residncia do msico Nengo
Vieira, em Salvador. Em 1989, todos os msicos que formaram a Remanescentes passaram a morar em Cachoeira, o que segundo Nengo Vieira
ajudou a compor uma nova musicalidade baseada no reggae de Bob
Marley e na msica negra norte-americana:
Eu vim pra Salvador em 80 e fiquei mais ou menos at 89, no Alto das Pombas. Eu retornei pra Cachoeira. Comecei a ter famlia, comecei a ter meus filhos
com Valria e resolvi voltar pra Cachoeira, e o grupo todo j tava morando l
em Cachoeira, o prprio Sine, o Marquinho. Ento isso facilitava muito a gente ensaiar, facilitava todo mundo se ver e a, nesse momento, a gente comeou
a ter uma intensidade, a ter uma profundidade de convvio de relacionamento,
a passamos quase cinco anos juntos com essa intensidade de Bblia, de fumar,
de tocar o reggae, de ouvir a msica boa, a black music americana, o blues,
o funk, a soul music, o reggae de Bob Marley. E essa riqueza, essa polirritmia,
essa multiplicidade de escolas diferentes, enriqueceu esse grupo e esse grupo
comeou a produzir um trabalho inovador, que iria influenciar a histria do
reggae aqui na Bahia, a histria dos trabalhos recentes, dos trabalhos atuais
(Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

O msico Marco Oliveira, admirador confesso dos msicos da Motown


(tanto que, durante a entrevista, realizada em sua residncia, fez questo
de colocar um vinil de Marvin Gaye no toca-discos), tambm falou sobre
a influncia da msica negra americana no reggae de Cachoeira, em especial sobre a semelhana com o soul, por conta do seu instrumento de
trabalho, o contrabaixo:
Na verdade isso, por saber que a msica vem de toda musicalidade negra, a, como eu citei, Louis Armstrong, Ray Charles, Marvin Gaye, Stevie
Wonder, que experimentou ritmos, que deu toda musicalidade. O soul, por
exemplo, em geral, ele lembra o reggae, porque na verdade o baixo que deu
toda uma base pra o reggae (Marco Oliveira, entrevista em 22/11/2007).
88 l Brbara Falcn

Questionado sobre a receptividade que o reggae teve em Cachoeira,


o cantor e compositor Edson Gomes aponta alguns fatores sociais que
podem ter propiciado a exploso e a permanncia do gnero na regio:
Porque ns estamos aqui no Recncavo e no Recncavo a predominncia negra muito grande, entendeu? Juntamente com a pobreza, a
pobreza tambm muito grande no Recncavo. E no s o reggae, mas
ns alavancamos tambm instrumentistas, que passaram a ser muito valorizados instrumentistas de sopro, e fomos ns que introduzimos o sopro
formado aqui. T todo mundo trabalhando. Tem aquela coisa, que aqui
no Recncavo o primeiro incentivo foram os Tincos (Edson Gomes,
entrevista em 10/06/2008).

Em confluncia com o que foi dito pelos conterrneos mais velhos, o


msico Geraldo Cristal que Ogan e diz ter nascido em um terreiro de
candombl de Cachoeira fala um pouco de suas experincias musicais
com a soul music, mas tambm da influncia que a msica dos terreiros
e os blocos afro tiveram em sua vida artstica:
A minha primeira referncia, e eu costumo dizer isso sempre, foram realmente os tambores africanos, que vieram pra c com os africanos, que
vieram sequestrados da frica. Eu tinha essa referncia cultural, mas j
tinha tambm de vrios. Eu j ouvia tudo. [..]. Mas eu ouvia e danava
o James Brown, j tinha aquela influncia do funk, da soul music e, por
sinal, andei de cala boca de sino, dancei cocotinha, dancei guti guti.
Ento sempre fui uma pessoa bem antenada, usei black power, usei o ouriador. A msica de James Brown tambm teve muito a ver com a minha
histria tambm. Assim como o Toni Tornado, que era um cara tambm
da poca. O prprio Tim Maia, o Elvis Presley, que foi uma pessoa que
teve um momento que era de massificao, como o James Dean, at pra
desviar a histria do Black Power que tava acontecendo, do movimento. Como John Travolta, em Nos Tempos da Brilhantina. Tambm foi
colocado muito como isso, como uma forma de desviar, principalmente
a comunidade negra. Porque eles danavam como negros, mas no podiam aparecer como negros, mesmo porque eles no eram negros. O
Elvis tomou esse lugar de Chuck Berry. O John Travolta danava com
aqueles trejeitos, mas at ento no aparecia. Aparecia como discoteca. E
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 89

a discoteca era a histria do James Brown tambm, n? Porque toda aquela influncia da discoteca, era a influncia da soul music. Eu j era aquele
cara que tambm andava em blocos afro. Eu, em Cachoeira, eu era aquele
cara que vinha pra Salvador, buscava as danas e levava pra Cachoeira
(Geraldo Cristal, entrevista em 28/11/2007).

O baixista da banda Morro Fumegante, Vitor Hugo, argumenta que a forte influncia afro em Cachoeira, sobretudo do candombl, pode ter contribudo para uma inverso de hierarquias que facilitou a aceitao do reggae:
A gente ouve rock em japons e uma porcaria. Eu acho que voc tambm
acha rock em portugus ruim. Como bossa nova em ingls horrvel, parece
cool jazz, no parece bossa nova. Mas voc j percebeu que o reggae feito na
Bahia a nica msica de fora que a gente consegue fazer verso ou criao
que no parece msica estrangeira? O reggae baiano no parece uma msica
importada. Parece que nasceu em Cachoeira, voc entende? Eu acho que com
certeza essa influncia de linguagem, desse modo baiano de falar e principalmente de Cachoeira, n? E eu acho que isso tambm tem a ver com o negro
de Cachoeira. Porque tambm essa coisa da influncia negra muito marcante
l. E a concentrao de negros muito grande l e o pessoal do candombl
muito respeitado. Ento, por exemplo, Cristal um Ogan confirmado e tem
todo um orgulho de ser Ogan, de ter a hierarquia negra, independente de ter a
hierarquia branca. E respeitado l. Ento eu acho que isso tambm facilitou
muito pra essa aceitao (Vitor Hugo, entrevista em 10/04/2007).

Nengo Vieira tambm tratou da influncia africana em sua entrevista,


chamando ateno para o fato de que isso pde ter contribudo para a
receptividade e produtividade do reggae de Cachoeira:
Cachoeira uma nascente, um lugar rico, um lugar frtil, que nem o
Mississipi, banhado pela gua do Paraguau e ali as pessoas tm uma
influncia cultural muito grande dentro da cultura africana, n? (Nengo
Vieira, entrevista em 10/08/2007).

Conforme observado nos depoimentos sobrescritos, houve um conjunto de fatores que possibilitou o estabelecimento e o desenvolvimento
do reggae em Cachoeira. A relativa proximidade com a capital do esta-

90 l Brbara Falcn

do, Salvador, fez com que as novidades da indstria fonogrfica, neste


caso, discos dos artistas americanos e jamaicanos citados, chegassem at
os ouvidos desses jovens que, mesmo sem entender o idioma cantado,
acabaram se identificando tanto com a msica que buscaram traduzi-la
localmente. A bagagem musical e afetiva dos indivduos entrevistados
demonstra a identificao com o gnero e o conjunto de significados que
ele traz em seu repertrio referencial, dentre estes a sonoridade, os padres rtmicos e as temticas. importante frisar que o momento histrico, onde a valorizao do elemento negro na cultura baiana, conforme
visto anteriormente, contribuiu fortemente para a identificao tnicoidentitria dos msicos de Cachoeira com os elementos que ajudaram a
compor uma nova musicalidade regional, que acabou mexendo com a
cabea e os ps da juventude da cidade.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 91

NOTAS
Segundo Reis, todas essas caractersticas facilitaram a criao de laos
de solidariedade que acabaram gerando uma disposio para a luta, o
que levou a uma srie de levantes no incio do sculo XIX.
19

MARQUES, Francisca. Identidade, sincretismo e msica na religiosidade brasileira. Disponvel em: www.naya.org.ar/congresso2002/ponencias/francisca_marques.htm.
20

Usando um termo criado por Joo Reis em: REIS, Joo Jos & SILVA,
Eduardo. Negociao e Conflito: A Resistncia Negra no Brasil Escravista.
So Paulo: Companhia das Letras, 2005.
21

Para saber mais sobre a influncia baiana no samba carioca ver Moura
(1995), Sandroni (2001) e Vianna (2002).
22

Em recente turn pelo Brasil, alguns dos Skatalites ressaltaram a importncia do Alpha Boys e de Sister Mary Ignatius para a msica jamaicana. Para
saber mais ver: http://mtv.uol.com.br/jamaica/blog/yampm-entrevista-skatalites-e-te-mostra-o-pocket-show-na-integra-em-primeira-m%C3%A3o.

23

Atualmente, com a implementao das leis de Direitos Autorais e valorizao dos Mestres da cultura popular, que durante sculos desempenharam o importante papel de divulgar as culturas marginalizadas, h uma
discusso em torno da apropriao das letras e cnticos do candombl.

24

A msica que ele escutou foi No Woman no Cry, que chamou sua
ateno tambm pela nitidez da gravao, onde ele pde perceber todos
os instrumentos, o que no acontecia no som do rdio.
25

26

Para saber mais sobre Lazzo, acessar: www.lazzo.com.br.

As letras completas dessas msicas constam no Anexo II identificadas com os nmeros 6 e 7.

27 e 28

92 l Brbara Falcn

Apesar de pesquisar o reggae j h algum tempo, Nengo Vieira se


apresentava com a Studio 5, com um repertrio ecltico, que inclua
tambm outros ritmos como a salsa e o rock.
29

Nengo Vieira tambm foi vencedor desse mesmo Festival, em outra


categoria. Em 1986, Vieira venceu o festival Vem de Banda com a msica Gali Galinha.
30

31

Ver letra na ntegra no Anexo II identificada com o nmero 2.

Esses msicos gravaram apenas os trs primeiros discos de Edson Gomes, o Reggae Resistncia (1988), o Recncavo (1990) e o Campo de
Batalha (1991). A partir da a banda Co de Raa teve diversos msicos
em sua formao, mas nunca s de cachoeiranos, como a primeira.
32

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 93

CAPTULO III
O ENREDO DO REGGAE NA
TERRA DO SAMBA
Neste captulo, fao uma abordagem etnomusicolgica sobre o reggae cachoeirano, baseada nas falas dos artistas entrevistados e nas suas discografias.
necessrio frisar que, alm das fontes supracitadas, tanto as observaes em
shows como a anlise dos registros de apresentaes em vdeo ajudaram a
caracterizar o quadro estudado. Aqui, a produo musical de cada artista ser
analisada individualmente, em ordem cronolgica (Studio 5, Edson Gomes &
Co de Raa, Remanescentes, Sojah, Nengo Vieira & Uno I, Sine Calmon
& Morro Fumegante, Nengo Vieira & Tribo de Abrao, Dystoro, Tin Tim
Gomes & Manasss, Isaque Gomes e Jeremias Gomes) e em posterior ser
realizado um balano geral da produo, envolvendo uma discusso em torno
de conceitos como gnero, repertrio e consumo.
Na ltima parte discuto a relevncia do componente religioso na obra destes compositores, presente em grande parte das letras, e a opo pelo cristianismo em detrimento do rastafarianismo. O caso do msico Nengo Vieira, que
se tornou dicono da Bola de Neve Church, ser tratado em especial, pois
foram feitas observaes de campo em reunies nas sedes desta denominao religiosa nas cidades de Salvador (BA), Santos (SP) e Guaruj (SP). Com
base nessa etnografia, tambm caracterizo o pblico tanto de eventos seculares quanto de religiosos. Alm disso, destaco a insero deste artista dentro do
segmento gospel, onde vem se destacando na cena nacional e conseguindo
consolidar uma rede com artistas de considerada relevncia internacional.

DAS MARGES DO PARAGUAU


Em ordem cronolgica33, surgiu, em 1982, o grupo que pode ser considerado como a protoclula do reggae de Cachoeira ou, pelo menos, a
sua fase embrionria, o Studio 5, que apesar de no ser uma banda de
reggae, j inclua o gnero em seu repertrio. A primeira formao da
Studio 5, que tinha Rui de Brito como guitarrista, Tinho Santana como
contrabaixista (depois substitudo por Albertinho), Nengo Vieira como
guiatarrista e Jair Soares como baterista, gravou os primeiros discos de
Lazzo e Edson Gomes, tendo durado at a formao da banda Fogo
Baiano34, quando os dois primeiros msicos citados foram substitudos
por Sine Calmon e Marco Oliveira. Segundo Nengo Vieira:
O Rui de Brito saiu e formou a Fogo Baiano, Jair Soares viajou pra o Rio de
Janeiro em busca dos sonhos e realizaes dele e eu fiquei aqui, continuando a
trabalhar com Edson e com a Studio 5, foi quando eu reintegrei a Studio 5 com
outros componentes. Foi a que eu convidei o Tin Tim Gomes, que irmo de
Edson Gomes, convidei o Sine Calmon pra fazer guitarra no lugar de Rui de
Brito e o Marco Oliveira no contrabaixo, no lugar de Albertinho, que era baixista da Studio 5. A partir da nasceu o chamado grupo Remanescentes, j com a
proposta de fazer s o reggae (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

No final dos anos 80, os msicos que formavam a Studio 5 (Nengo


Vieira, Marco Oliveira, Sine Calmon e Tin Tim Gomes) passaram a
se dedicar mais ao reggae, por conta de terem se tornardo a banda
de base para o trabalho de Edson Gomes. Nesse perodo a residncia
de Nengo Vieira em Salvador, no bairro da Federao, apelidada de
53, servia como uma espcie de concentrao desses msicos, tendo ensaiado por l artistas como Lazzo, Gernimo35 e at o roqueiro
Raul Seixas. At meados de 1991, quando gravaram o terceiro disco
de Edson Gomes, os msicos da Studio 5 tambm se apresentavam
como banda Co de Raa. Depois de tentativas frustradas de incorporar Edson Gomes ao grupo, passaram a revezar os dois nomes nas
apresentaes. Segundo Vieira:

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 97

A Studio 5 tinha uma proposta muito aberta, porque era uma banda
de msicos, n? Fazamos funk, fazamos rock, salsa, fazamos o prprio
reggae e era um trabalho de msicos. E ele falou: O meu trabalho
mais um trabalho de compositor. A no deu certo, o convite no foi
concretizado. A ele seguiu a carreira dele como Edson Gomes & Co
de Raa, mesmo a Studio 5 acompanhando ele, os elementos da Studio
5 acompanhando ele, mas era s vezes Edson Gomes como Studio 5,
porque a gente tambm no abria mo do nosso nome e s vezes como
Co de Raa. At que gravamos o disco como Co de Raa, mas quem
gravou foram os msicos da banda Studio 5, eu, Rui de Brito, Jair Soares, o Albertinho (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

A convivncia estabelecida com a frequncia de ensaios, shows


e as gravaes dos discos possibilitou um salto maior em suas carreiras, a oportunidade de criar um trabalho coletivo, dentro do Remanescentes, grupo que j nasceu com o propsito de fazer reggae,
muito inspirado no The Wailers. As entrevistas realizadas com trs
dos fundadores do grupo, Marco Oliveira, Nengo Vieira e Tin Tim
Gomes, atestam que um dos principais ingredientes desse projeto era
a forma de compor, feita de maneira coletiva, o que demonstrava o
introsamento e a versatilidade dos msicos. Nas apresentaes em
pblico todos tocavam instrumentos diferentes e tambm cantavam,
como conta Nengo Vieira:
Ento, a partir da a gente comeou a formar o Remanescentes j com
uma viso de grupo, que nem um The Wailers, um grupo mesmo, da minha msica ser a msica de Sine, a msica do Sine ser a minha msica e
vice-versa, e ns conseguimos fazer isso. Era um grupo muito rico porque
no tinha s um cantor. Eu era o compositor mais antigo da banda, pelo
fato de ter mais experincia, eu tinha a maioria das composies, mas comeou a surgir parceria, eu com Tin Tim, eu com Sine, eu com Marco, e
os arranjos comearam a sair um pouco do meu domnio, se estendendo
pra os outros elementos, a fazer uma coisa mesmo de grupo, de ajuntamento. Ento eu cantava, o Sine Calmon cantava, o Marco Oliveira
cantava, Tin Tim Gomes cantava. [...]. Por exemplo, eu tava tocando guitarra e cantando, a Marco Oliveira ia cantar, a eu pegava minha guitarra

98 l Brbara Falcn

e dava a Sine, Sine pegava a guitarra dele e dava pra Marco, eu pegava
o contrabaixo de Marco, ento era essa troca, isso tudo era uma coisa
diferente que acontecia (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

Segundo os entrevistados, o retorno para a cidade natal tambm foi


uma deciso coletiva, uma maneira de driblar as dificuldades econmicas
e estarem mais prximos uns dos outros fazendo msica e congregando
com suas famlias, que passaram cada um a formar. Alm disso, Marco
Oliveira cita outro ingrediente importante nessa mistura, o espiritual:
Todo mundo se mudou pra Cachoeira pra isso. Todo mundo foi pra l, Nengo j tinha famlia l, eu tinha, Sine tinha, Tin Tim tinha, e a gente voltou
pra Cachoeira pra isso, estrategicamente, pela coisa socioeconmica mesmo.
Porm, como eu te falei, como era uma msica religiosa, a aceitao no foi
logo. Mesmo tendo o respaldo da gente, Nengo j era msico das antigas, Sine
tambm, eu tambm, todo mundo da cidade, com um certo nome, j tinha o
lance de dizer: P, Nengo toca mesmo. Cada um, individualmente, j tinha
uma carreira, onde tocar, banda de baile, banda de no sei que l, Nengo j
tinha um tempo aqui em Salvador. Ento a gente j tinha um certo patamar de
msico, mas tinha que conquistar ali, porque tinha a coisa nova da religio. E
na poca, tinha essa coisa, se hoje j difcil... Todo mundo confundia (Marco
Oliveira, entrevista em 22/11/2007).

A leitura da Bblia, que se tornou fundamental para os Remanescentes, foi uma prtica adquirida atravs do convvio com Edson Gomes, ainda em Salvador, no 53. Adiante ser discutida a importncia da Bblia e da religio na vida dos regueiros cachoeiranos, bem
como a influncia de suas msicas na converso de pessoas para o
evangelismo. Neste sentido, o trabalho pioneiro realizado pelos Remanescentes tornou-se um divisor de guas para o reggae baiano,
no somente pelas letras, que pregavam o evangelho de uma maneira
inusitada; mas tambm pela sonoridade. As apresentaes do grupo
eram sempre requisitadas em Cachoeira e cidades adjacentes, como
So Flix, Muritiba e Maragogipe, e os registros destas apresentaes,
geralmente feitos em fitas K7 eram disputados na regio. Sobre este
aspecto, Nengo Vieira comenta:

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 99

As pessoas nos respeitavam muito porque a musicalidade que existia no


grupo era muito grande, muito rica e era uma coisa muito singular, muito
original e muito verdadeira. As pessoas viam na gente uma coisa inusitada, diferente, que se viu com os Novos Baianos h tantos anos atrs, com
um histrico parecido, onde surgiu o que todo mundo j sabe. Ento com
Remanescentes foi a mesma coisa. E do Remanescentes surgiu todo esse

boom de nomes j famosos dentro da histria do reggae (Nengo Vieira,


entrevista em 10/08/2007).

O grupo chegou a gravar parte do seu repertrio, algo em torno de 12


msicas, nos estdios da WR, a convite do proprietrio, o produtor Wesley Rangel, que desde a gravao do primeiro disco de Edson Gomes,
viu um potencial nos msicos de Cachoeira:
O grupo Remanescentes, composto basicamente pelos msicos da banda de Edson Gomes, era uma forma de expresso mais independente
deste grupo que tinha e tem o reggae no sangue e na alma. Desses regueiros nasceram grandes intrpretes como Tin Tim Gomes que gravou,
em 1999, o CD Pedra Sobre Pedras; Nengo Vieira que lanou cinco CDs;
Sine Calmon, um sucesso, com quatro CDs produzidos e Marco Oliveira,
que lanou o CD independente Dystoro em 2006. Em quase todos esses trabalhos a WR esteve presente como parceira ou simplesmente como
estdio de locao, exceto nos trabalhos de Sine Calmon que gravou seus
discos em outros estdios (Wesley Rangel, entrevista em 27/07/2007).

O tape gravado na WR nunca foi lanado, ficando arquivado quando


os Remanescentes se separaram em 1994. Contudo, o albm intitulado
de Semente do Amor36 chegou a circular nas mos de colecionadores,
que o consideram uma referncia na histria da msica reggae da Bahia.
Em sua entrevista, o msico Marco Oliveira chegou a considerar a produo do grupo como um importante patrimnio cultural deixado para
futuras geraes:
Remanescentes hoje o maior patrimnio do reggae da Bahia, o Remanescentes hoje referncia, se transformou em escola tambm, como
o reggae de Bob Marley, porque voc v que o reggae de Bob Marley
no rola muito nas rdios, porm na verdade se transformou em escola,
100 l Brbara Falcn

exatamente por isso, porque todo mundo j conhece, todo mundo j sabe.
Quando voc quer tirar uma dvida, voc vai l no disco de Bob Marley e
pega uma mixagem, ou como fica o baixo em um volume, como o decibis, como voc quer o seu, ento virou escola. Ento, da mesma forma,
virou escola Remanescentes e, pra mim, com muito mais mrito, porque
como musicalmente j tinha sido inventado o reggae, o mrito da gente foi
colocar o reggae com a nossa cara, porm como o contexto religioso, filosfico e tal. Para mim, o maior mrito ainda isso, ter contagiado pessoas
a ler a Bblia, contagiado assim no sentido de se comportar, da forma que
tem um parmetro, da forma que Deus quer que a gente se comporte, n?
Sendo respeitador, sendo pessoas boas para com as nossas famlias, nossos
irmos. Ento, isso pra mim o maior mrito do Remanescentes, o mrito cultural, o patrimnio sociocultural que a gente conseguiu deixar para
as pessoas (Marco Oliveira, entrevista em 22/11/2007).

Outro aspecto importante a ser menciondo nesta pesquisa a contribuio dos Remanescentes para uma nova musicalidade baiana que
passou a se formar nos anos 90, sobretudo no uso de instrumentos e
tcnicas de gravao. O musicista Vitor Hugo, que participou da segunda
formao do Remanescentes, tratou desse aspecto em sua entrevista:
O disco foi muito bem feito pra poca e tambm foi muito chocante
nessa coisa do reggae na Bahia. E tambm tem uma coisa, na Bahia nunca do ao reggae a glria merecida. O primeiro disco de Edson Gomes,
por exemplo, foi gravado com bateria eletrnica, que era o que se usava
na poca com o ax. uma bateria com um som que no bateria, s
bateria porque chamam de bateria, mas no passa de um brinquedo
eletrnico. Ento eles gravavam o som com bateria eletrnica. Nengo
at produziu esse disco e tal. E talvez eles no tivessem, eles, os tcnicos,
no tinham condies de gravar com bateria acstica. Depois do disco de
Edson Gomes, eles viram a necessidade da bateria acstica. Voc pode
reparar, depois do primeiro disco de Edson Gomes, tudo foi feito, a maioria das coisas na Bahia foram feitas com bateria acstica. Veio o disco da
Remanescentes que no saiu, mas at Remanescentes voc no ouvia
o contrabaixo na msica baiana. Voc no ouvia. A a Remanescentes
fez o disco. Na poca que eles fizeram o disco, o contrabaixo ia tocar na

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 101

rdio, a no podia, era um grave muito estranho, soava estranho. Engraado que depois Sine lanou o disco dele com o contrabaixo mais grave
ainda e por ser uma linguagem mais aceitvel pra o pessoal da rdio, o
pessoal que conhecia mais o reggae aceitou. Ento, depois do disco da
Remanescentes, o contrabaixo foi ouvido no ax, o contrabaixo foi ouvido em toda msica baiana, em todos os discos de msica baiana. Ento,
o reggae sempre o primeiro a testar as coisas, mas nunca reconhecido
como pioneiro (Vitor Hugo, entrevista em 10/04/2007).

necessrio pontuar que alm da incorporao dos elementos musicais influenciados pelo reggae e do componente religioso, mais um ponto
pode diferenciar os Remanescentes em sua trajetria. As prticas desenvolvidas em grupo, muitas das quais estendida as suas famlias, geraram
polmica na poca, tanto em Cachoeira quanto em Salvador:
A gente comeou a ter alguns posicionamentos muito slidos, muito
consistentes, dentro daquilo que ns acreditvamos, dentro daquilo
que ns achvamos que era correto, entendeu? E usando a Bblia,
tendo a Bblia como nosso trilho, nossa bssola, a gente passou a ter
algumas atitudes. Por exemplo, os nossos filhos, ns no colocvamos
nas escolas, porque a gente achava, e na verdade, no fundo, no fundo
, uma lavagem, esse ensino da que as pessoas passam tanto tempo
aprendendo um bocado de coisa e paga pra estudar, paga pra aprender, um absurdo. Ento a gente achou melhor alternar isso, ensinar
os nossos filhos a coisa prtica, diria, que voc vive, fazer a conta,
voc multiplica, soma, divide e subtrai. E aprender a falar e ler. Ler
a palavra de Deus, que o fruto da vida. A passamos a criar nossos
filhos assim. Inclusive o meu filho mais velho, que hoje o meu baterista, j foi pra escola com quase 10 anos de idade, por causa dessa
atitude nossa. Ns no permitamos tirar foto nossa, fazer broche e reverenciar a gente como dolo porque a gente abominava idolatria. Ns
achvamos que isso era idolatria, fanatismo pela imagem. E a imagem
da gente escandalizava na aparncia. Minha aparncia hoje, hoje eu
t light, hoje eu t tipo fino, sabe? Era coisa tribal, minha barba batia
aqui [mostrando a mo na altura do trax], era um dreadlock com
aquele cabelo bem consistente. Ns vnhamos aqui pra o Sindicato

102 l Brbara Falcn

dos Msicos pra fazer o concurso pra trabalhar no carnaval, chegava


l a gente tomava conta do sindicato. P, chegou o Remanescentes.
A gente chegava e a nossa imagem, a nossa embalagem j intimidava
as pessoas (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

Dentre as prticas mencionadas nas entrevistas, estava tambm o uso


da ganja como instrumento de meditao para leitura da Bblia, um
grupo de estudos da palavra em suas residncias, que acontecia em
forma de rodzio; e a abolio de mtodos contraceptivos, o que acabou
ampliando as famlias de todo os msicos.
A convivncia, e principalmente o relacionamento familiar, que a gente
vivia como uma famlia mesmo, uma famlia. Todo mundo tomava caf
junto, estudava junto, lia a Bblia, coisa mesmo que se faz em famlia, entendeu? Orava, brincava, fazia churrasco, tomava cerveja, todo mundo
junto. Coisa que se faz com famlia, marcar no final de semana churrasco,
tomar uma cervejinha, era o que a gente fazia, sempre (Marco Oliveira,
entrevista em 22/11/2007).

Apesar do preconceito, muito por conta do visual, os Remanescentes


passaram a ter o respeito e admirao de boa parte da populao cachoeirana, sendo requisitados para tocarem nas principais festas da cidade,
como a Feira do Porto e Boa Morte. Sobre este aspecto o msico Nengo
Vieira observa:
As pessoas que gostavam da gente pela musicalidade, os nossos admiradores eram pessoas que tinham o maior carinho com a gente, com o
trabalho da Remanescentes. Porque ns ramos pessoas de bem, cara,
no fazamos mal a ningum. Ns ramos msicos, que acreditavamos
na Bblia, que queramos falar do amor de Jesus para as pessoas e fumvamos maconha, acabou. E tnhamos nossas famlias. Eu tinha a minha
famlia, Sine a dele, Marquinho a dele, Tin Tim a dele, entendeu? Brigas,
problemas? Todo mundo tem. Mas no era problema de danificar a vida
de ningum, de danificar o prximo. Ento as pessoas sabiam que a gente fumava e tudo, mas tinham o maior respeito com a gente. No Alto das
Pombas [localidade onde morou no bairro da Federao, em Salvador]
mesmo, a Polcia Militar sabia que l na sede todo mundo fumava, que

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 103

era um centro de todo mundo fumar, mas nunca tomamos baculejo, nunca tomamos blitz, nunca fomos abordados por policial (Nengo Vieira,
entrevista em 10/08/2007).

Dentro do repertrio do grupo havia canes que tratavam de temas


sociais, muitas das quais denunciando polticos e policiais corruptos. Algumas letras compostas pelos Remanescentes denunciavam extermnio,
injustia social, abuso de poder; que uma peculiaridade do reggae,
como diz Marco Oliveira:
Isso pra mim o principal, que o reggae a evoluo musical da msica negra e , na verdade, uma das coisas mais ricas de rica dos ltimos
tempos, porque pode se agregar valores, musicalidade, agregar filosofias,
agregar, principalmente, que eu acho que ela foi feita pra fazer, que
louvor a Deus e o contexto social. S que no se louva a Deus se no
se incomoda com o prximo, ento pra mim ela principal no contexto
social (Marco Oliveira, entrevista em 22/11/2007).

At meados de 1994, os Remanescentes, Nengo Vieira, Tin Tim Gomes, Marco Oliveira, Sine Calmon, Quinho, Beto, Wilson Toror, Valria
Leite e Joo Teoria trabalharam coletivamente, mas mesmo com o trmino do grupo, continuaram contribuindo uns com os outros, mesmo que
esporadicamente. Com a sada de Calmon e Oliveira, Vieira e Gomes
deram continuidade ao projeto por pouco tempo, chamando msicos
como Vitor Hugo e Csar Napole para substiturem os dissidentes. O
trumpetista Joo Teoria37 acompanhou Nengo Vieira por um longo perodo, tendo gravado todos os seus discos gratuitamente, mesmo depois
de ter se tornado um msico requisitado. O percussionista Wilson Toror
tocou na Morro Fumegante por alguns anos, bem como Valria Leite,
que foi convidada por Sine Calmon para fazer backing vocal na banda
durante algum tempo, tambm gravando em um dos seus discos. Desde
2007, Marco Oliveira reveza o contrabaixo com Vitor Hugo na Morro
Fumegante, alm de dar continuidade ao seu projeto, a banda Dystoro
e atuar como msico free lancer em outras bandas.
importante frisar que uma parte significativa do repertrio de Sine
Calmon, tanto em shows como em discos gravados, de autoria de Nengo
104 l Brbara Falcn

Vieira38. Tin Tim Gomes tambm gravou duas composies de Vieira em


seu disco Pedra sobre Pedras39 (1999), Guerreiro Mor e Pelo Amor de
Deus, ambas da poca dos Remanescentes. Nengo Vieira , incontestavelmente, o compositor mais requisitado dentre eles, pois possui maior
nmero de canes gravadas, inclusive pelos ex-companheiros de grupo
supracitados. Alm disso, Vieira um experiente arranjador e musicista,
tendo produzido, desde a dcada de 80, arranjos para lbuns importantes
para a discografia do reggae baiano, entre eles os primeiros LPs de Edson
Gomes, seus prprios discos, chegando tambm a gravar guitarra, contrabaixo e bateria em algumas faixas do disco Reggae na Estrada (1999), da
banda maranhense Tribo de Jah.

BOTANDO FOGO NA BABILNIA


Analisamos aqui o repertrio dos discos gravados pelos msicos de
Cachoeira, alm de tratar de sua produo e consumo. Retomando a
trajetria de artistas e grupos que formaram a cena estudada, sero considerados dois perodos produtivos: a primeira dcada que corresponde
aos anos entre 1988-1998 e a segunda dcada correspondendo aos anos
entre 1999-2009. Esta diviso se justifica pelos meios tecnolgicos em
que os discos foram lanados durante as trs dcadas estudadas e pelo
nvel de dificuldade que se tinha para fazer uma gravao, o que muitas vezes dependia de um contrato com alguma gravadora. Conforme
j mencionado, a produo musical em torno do reggae de Cachoeira
se inicia nos anos 80, quando Edson Gomes, com a colaborao dos
msicos da Studio 5, em especial de Nengo Vieira e Jair Soares, teve
seu repertrio rearranjado. Edson Gomes relatou em entrevista Revista
Musical On-Line que, antes de gravar seu primeiro disco, gravou duas
msicas por conta de premiao em festivais.
Em 1977, participei do Festival de Inverno de Cachoeira que j tinha
um prestgio e profissionalismo maior que os festivais estudantis e teve a

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 105

participao de artistas de outras cidades baianas que j tinham prestgio.


E fui o primeiro colocado tambm nesse Festival. Depois desse Festival, fiz
algumas tentativas profissionais que no tiveram sucesso no Rio de Janeiro e em So Paulo. Retornei para Cachoeira e em 1985, participei de um
Festival de Msica na cidade de Feira de Santana-BA, que era a segunda
maior cidade do interior do Nordeste. Fui premiado com o segundo lugar
e melhor intrprete. Em 1987, participei em Salvador-BA do Festival de
Msica Trofu Caymmi e fui premiado como melhor intrprete. Em
1985, tive a primeira experincia gravando em estdio e, em 1987, com
o Trofu Caymmi, tive a segunda. Em 1988, gravo meu primeiro disco
com o ttulo de Reggae Resistncia. Esse um breve resumo da minha
iniciao musical e profissional (Edson Gomes, entrevista Revista Mu-

sical On-Line, 2006).

Em 1988, portanto, Gomes gravou o primeiro disco de sua carreira,


o Reggae Resistncia, no estdio WR, em Salvador, por uma indicao
do radialista e produtor Cristvo Rodrigues. O disco foi produzido por
Wesley Rangel, proprietrio do estdio, que falou em entrevista sobre
esta experincia e da primeira impresso que teve sobre o trabalho de
Edson Gomes:
No segundo semestre de 1988, com a msica baiana entrando forte na
mdia nacional, a EMI Odeon, muito animada com as vendas da banda
Reflexus, que naquele perodo foi um fenmeno com mais de 1.000.000
de LPs vendidos, resolve apostar no reggae baiano por indicao de Cristvo Rodrigues, programador da Itapoan FM que apostou no trabalho
de Edson Gomes e me procurou para produzir seu primeiro disco. Ao tomar conhecimento do repertrio e da sonoridade de Edson, percebi que
se tratava de um grande talento, com grande expresso artstica, influenciado por Bob Marley, sem, entretanto, perder sua prpria personalidade
como intrprete e compositor que o capacitava a ser um dos maiores

reggaemans do Brasil (Wesley Rangel, entrevista em 07/07/2007).

importante ressaltar o pioneirismo desse trabalho, que apesar de ter


sido lanado como um disco solo, voltado para as composies de um nico
artista no caso Edson Gomes representava o resultado de uma pesquisa
coletiva sobre o reggae, feita h alguns anos pelos msicos da Studio 5.
106 l Brbara Falcn

O lbum Reggae Resistncia pode ser considerado o primeiro do gnero no Brasil, pois, antes do seu lanamento, nenhum outro artista ou
grupo conseguiu gravar um disco equivalente no pas. Esse trabalho de
Edson Gomes chama ateno pela unidade alcanada, tanto no padro
rtmico quanto na temtica tratada, voltada, sobretudo, para o discurso
tnico-identitrio. Segundo Carvalho (2000):
Um gnero musical, portanto, vem a ser muitas coisas ao mesmo tempo:
um padro rtmico sinttico, uma sequncia de batidas de tambor, um
ciclo ou uma seqncia harmnica precisa, ou pelo menos claramente
reconhecvel; algumas vezes um conjunto de palavras ou tropos literrios fixos que combinam com algum padro rtmico particular e com
algum tipo particular de harmonia e de movimento meldico, porque
aquelas palavras ou tropos evocam uma determinada paisagem social,
uma paisagem histrica, uma paisagem geogrfica, uma paisagem divina,
ou mesmo uma paisagem mental (CARVALHO, 2000, pp. 06-07).

Apesar de outros artistas, a exemplo de Jorge Alfredo e Chico Evangelista40, terem gravado algumas faixas com influncia do ritmo jamaicano, o lbum supracitado inaugurou nas prateleiras das lojas de disco do
pas o gnero nacional. Assinando um contrato com um selo importante,
o pioneirismo custou a Gomes uma reduo de investimento por parte
da gravadora, que preferia que ele mesclasse o repertrio:
Rangel gravou e negociou o tape com a EMI e chegou que pela EMI eu fiz
um contrato de trs discos, o Reggae Resistncia, o Recncavo e o Campo

de Batalha. Pronto, a o Reggae Resistncia, ele quando saiu foi um estrondo.


E eu acho que a gravadora no esperava algum no Brasil que se arriscasse
a fazer um disco com s um estilo, s reggae, eles no esperavam. Tanto que
eles tentaram me mudar no segundo, eu no aceitei, no terceiro tambm,
no aceitei, a eles no renovaram comigo mais, n? Ento aconteceu isso,
foi uma cartada assim, decisiva. De algum dizer: Vou me enveredar por
esse caminho, s reggae. A eles no acreditaram, tanto que eles concluram
o contrato, porm eles no investiram mais. Investiu no primeiro, mas no
segundo e no terceiro no houve investimento no. Porque eles no queriam
que eu trabalhasse com reggae, foi a contragosto, s com reggae (Edson
Gomes, entrevista em 10/06/2008).
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 107

O produtor musical Wesley Rangel produziu trs discos de Gomes,


dentre os quais, os dois primeiros de sua carreira. Rangel faz um balano
positivo da trajetria profissional do cantor cachoeirano, que, segundo
ele, procurou manter a originalidade do seu trabalho, mesmo com a presso da gravadora:
Nesse momento de incio de carreira no disco, Edson estava receptivo,
apesar de muito preocupado em manter a originalidade de seu trabalho.
Participei da produo, gravao e mixagem dos primeiros discos de Edson
Gomes alm de alugar o estdio para os demais trabalhos. O primeiro foi

Reggae Resistncia em 1988, com grande resultado de venda, consolidando a carreira desse artista que conquistou uma grande parcela do pblico
da Bahia e do Brasil inteiro. Em 1990, produzi e gravei o LP Recncavo
com sucessos como Lili, Fala s de Amor, Guerreiro do Terceiro Mundo
e outros. Em 1991, a EMI Odeon optou por convidar Perinho Santana
para produzir o disco Campo de Batalha que lanou o hit Criminalidade.
Em 1995, Joo Augusto da EMI convidou-me novamente para produzir
o trabalho Resgate Fatal com destaque para as msicas Resgate Fatal e
Isaac homenagem a seu filho, que hoje segue carreira na mesma trilha
do pai. Em 1997, Edson assina comigo a produo do CD Apocalipse com
os mega sucessos Perdido de Amor, Camel e Apocalipse. Em 2001, o
prprio Edson produziu, para a gravadora Atrao, o CD Acorde, Levante

e Lute com o hit de mesmo nome e regravando Malandrinha. Em 2005,


ainda pela Atrao, foi gravado um CD duplo Ao Vivo em Salvador (Wesley Rangel, entrevista em 07/07/2007).

importante frisar que, at incio dos anos 90, fase em que Edson
Gomes lanou seus trs primeiros lbuns, o caminho trilhado por um
artista para conseguir gravar um disco era bastante rduo, principalmente se forem levados em conta a dificuldade financeira e o preconceito
(ainda que tido como musical) relatado na pgina anterior. Deve ser
considerada tambm a cadeia produtiva que envolveu esse processo,
que vai desde as tcnicas de gravao, at os meios de distribuio do
produto final, neste caso, os LPs, pois exigiam investimento por parte das
gravadoras. Durante o perodo em anlise (1988-1991), houve um relativo crescimento do mercado fonogrfico na Bahia, muito por conta dos
108 l Brbara Falcn

precursores da ax music, que passaram a chamar a ateno dos grandes


selos com a venda de milhares de discos. Conforme entrevista de Wesley
Rangel, o sucesso de vendas dos discos destes artistas levou a gravadora
EMI Odeon a investir em novos talentos baianos. Assim, em 1988, Edson
Gomes assinou um contrato com o selo para produo de trs lbuns,
que foram essenciais para a consolidao da sua carreira no estado e em
boa parte da regio Nordeste.
O repertrio do primeiro lbum, o Reggae Resistncia41, inclui msicas
como Histria do Brasil, Sistema do Vampiro e Viu, que abordam
questes como o racismo, desigualdade social e violncia. J o segundo
lbum, o Recncavo42, traz canes com uma forte marca de protesto contra o racismo, a exemplo de Recncavo, Guerreiro do Terceiro Mundo,
Lili e Estrangeiro. O ltimo lbum da trilogia gravada pelos msicos
da Studio 5, o Campo de Batalha43, incluiu msicas que denunciam a violncia e o descaso social, a exemplo de Criminalidade e Somos Ns.
Sobre este forte veio social em suas letras, Edson Gomes comenta:
Mesmo antes de eu ter a relao com o reggae j existia em mim aquela
coisa de protestar. A veia de protesto j nasceu comigo, mesmo porque eu
sou oriundo de uma raa sofrida, de descendentes de escravos, n? Ento a nossa realidade at hoje uma realidade muito cruel, muito difcil.
A minha famlia grande, todo mundo pobre, todo mundo vive uma
vida difcil. Eu no queria cantar falando de amor, essas coisas assim e
tal, eu queria falar sempre de um assunto, de uma coisa assim. Ento eu
fui me especializando em escrever sobre essas coisas. tanto que eu no
sou muito de fazer canes de amor. Eu fao, mas no a minha especialidade no. A minha especialidade mais o social, mais o protesto.
Ento, essa necessidade mesmo de abordar as questes, a necessidade
de reivindicar direitos, isso me levou a optar por esse caminho (Edson
Gomes, entrevista em 10/06/2008).

A observao das capas e encartes dos discos citados tambm ajuda


a entender o quadro estudado, pois complementa tanto as letras quanto
as falas das entrevistas. O encarte do primeiro disco, por exemplo, continha a foto de uma Bblia, livro que para Gomes sempre foi um forte
referencial. Na capa, numa foto de busto para cima, o msico exibe outro
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 109

signo marcante, sua cabeleira rasta. O segundo disco traz na capa uma
foto do artista dentro de uma moldura nas cores da Etipia. No encarte,
uma foto de Edson Gomes com seus msicos e filhos (Isaque e Jeremias)
vestidos com uniformes de futebol, outra paixo do artista, que chegou a
almejar ser um jogador profissional.
Os signos adotados nas capas e encartes desses discos, alm de corroborarem com o discurso tnico-identitrio das letras, comprovam uma
afinidade de longa-distncia44 entre baianos e jamaicanos. O uso da
imagem da Bblia, a escolha das cores, cabelos e at mesmo o gosto pelo
futebol do conta afinidades que podem sugerir que ambos movimentos
nasceram em condies histrico-sociais similares, caracterizadas por um
fluxo de informaes gerado por conexes locais e globais, onde a msica foi o fio condutor de tudo. Em seus depoimentos, Nengo Vieira e
Edson Gomes, precursores do movimento em Cachoeira, afirmaram categoricamente que, para eles a msica foi o principal elemento de identificao entre as duas culturas, a jamaicana e a baiana:
[...]. E eu nunca quis, veja bem, nem traduzir as letras pra saber o que
os camaradas tavam falando. Eu sentia a vibrao, que aquilo ali era uma
coisa positiva. Porque a msica, a msica em si, ela j diz muita coisa. Ela
precisa da letra pra identificar, mas ela vibra, ela diz se ela sentimento, se
ela lamento, se ela tristeza, ela j vibra o que ela . Agora, a palavra vai
servir para identific-la. s vezes o compositor consegue identificar a letra
e, s vezes, no consegue identificar a msica, n? A msica uma coisa e
a letra outra (Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).
Exatamente, pelo fato de ser afrodescendente tambm, acima de todas
as coisas, n? Eu sou um hbrido de negro com branco, um tipo sarar.
Ento, o ritmo me toca muito, eu sou uma pessoa muito rica ritmicamente. E o trabalho do reggae um trabalho que tem um elemento rtmico
muito forte, muito presente o elemento do ritmo, n? E com isso eu tive
uma identificao muito grande. Depois eu vi a riqueza meldica que o
reggae traduz. Ento, a partir da eu comecei a ficar maravilhado, extasiado, de ver aquela coisa pronta com aquela densidade to profunda e a
foi uma ida sem retorno. (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

110 l Brbara Falcn

Voltando a tratar dos signos identificados nos discos pesquisados, o


msico Sine Calmon, em 1997, tambm usou a imagem da Bblia na
capa do seu primeiro lbum, o Fogo na Babilnia, dando destaque para
um trecho do livro (Mateus 12:20), que diz: No esmagar a cana quebrada e nem apagar o morro que fumega at que se triunfe o juzo.
A exemplo do que aconteceu com Edson Gomes, o produtor Cristvo
Rodrigues agenciou o contrato de Sine Calmon com uma gravadora,
para que o msico lanasse o primeiro disco da sua carreira. Rodrigues
tambm agenciou um contrato entre Calmon e a Mazana (produtora do
Chiclete com Banana) para apresentaes nas grandes micaretas do estado. Em 1996, antes do lanamento do disco, Calmon vinha sofrendo
perseguio policial por conta do nome da sua banda, Morro Fumegante, sendo intimado a depor na Delegacia de Txicos e Intorpecentes.
Policiais infiltrados na plateia em seus shows descobriram que, quando
ele cantava o refro Fogo na Babilnia, boa parte do pblico acendia
cigarros de maconha. Por conta disto, Sine chegou a ser condenado pela
juza Dayse Lago, da 1 Vara Privativa de Txicos, com uma pena de trs
anos em regime fechado por suposta apologia ao uso de drogas (Revista
Veja, 22/01/1997, p. 32). A capa do disco, onde ele est em foto de busto
para cima, com os punhos cruzados ao lado da Bblia, foi uma resposta
ao caso, que acabou sendo arquivado por falta de provas.
O fato chamou ateno da imprensa45 e acabou gerando uma boa
publicidade para o artista e para o disco, lanado pela gravadora Atrao
Fonogrfica, que a partir da passou a investir em trabalhos de outros cachoeiranos (ver, nas referncias, os discos de Nengo Vieira e Edson Gomes lanados pelo selo). Interessante observar que a msica Nayambing
Blues46 foi a mais executada durante o carnaval de Salvador em 1998,
o que acumula para o artista alguns mritos: o de conseguir adentrar em
um mercado restrito da indstria cultural da Bahia, que o carnaval de
Salvador (sua participao no trio do bloco Eva, junto com a cantora
Ivete Sangalo, foi televisionada em horrio nobre); e o que chama mais
ateno, com uma msica pertecente a um gnero internacional.
Nos anos seguintes, Sine Calmon foi requisitado para apresentaes
em todo o estado e em outras capitais do pas, mas uma apresentao

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 111

com o grupo mineiro de pagode S Pra Contrariar (SPC) marcou para


sempre sua carreira. Calmon foi contratado para abrir o show do SPC,
em evento realizado no Costa Verde Tnis Clube, em Salvador, em 1998,
mesmo ano em que alcanou destaque na mdia por conta da msica
Nayambing Blues. O show foi transmitido ao vivo por uma emissora de
rdio local, que apoiava a realizao do evento, e por conta disso foi gravado por muitos fs, que disponibilizam o arquivo em blogs na internet.
A apresentao tornou-se notria pelo mal comportamento de Calmon
no palco, considerado por produtores e artistas como inoportuno. Com
isso, ele perdeu um contrato que lhe renderia abrir todos os shows do
SPC, no Norte e Nordeste, bem no auge da carreira do grupo. De l para
c, Sine Calmon lanou mais trs discos (o ltimo em 2006), porm sem
investimentos por parte das gravadoras, consequentemente com pouca
repercusso na mdia e baixo nmero de vendas. Conforme mencionado
anteriormente, muitas composies do repertrio desses discos so de
autoria de Nengo Vieira, sendo que o ltimo lbum recebeu o ttulo de
uma cano deste compositor, Guerreiro Mor.
O msico Nengo Vieira tambm usou na capa do seu primeiro disco, Somos Libertos (1998), a imagem do personagem bblico Abrao.
Com o trmino do Remanescentes, em 1994, Vieira tornou-se evanglico, o que justifica o teor religioso de todos os discos gravados por
ele. Residindo em Salvador at meados de 2000, o artista, mesmo com
um produtor que agenciava sua carreira, recebia poucos convites para
apresentaes em eventos seculares (que no pertencem ao segmento
evanglico) e, mesmo no meio evanglico, os convites eram escassos.
Atendendo a um convite do Ministrio Bola de Neve47, em 2006, Vieira
foi fazer uma apresentao no Sul, mas logo passou a residir no litoral paulista, no Guaruj, onde atua como dicono e movimenta sua
agenda de shows em todo o estado e resto do pas. Com cinco lbuns
lanados, atualmente Nengo gerencia sua prpria carreira e banda, da
qual fazem parte sua esposa, Valria Leite; seu enteado, Felipe Moreno
e suas filhas, Ester e Sintique Vieira.
Em agosto do ano de 2008, Nengo Vieira gravou seu primeiro DVD,
lanado pelo selo Bola Music, contando com participaes de msicos
112 l Brbara Falcn

evanglicos, a exemplo de Lzaro Silva48, ex-vocalista do grupo Olodum


e de Zeider Pires, vocalista da banda de reggae paulistana Planta e Raz.
O msico Lzaro, em entrevista ao Site Bola de Neve, falou sobre a oportunidade de gravar o DVD com Nengo Vieira:
muito importante para mim esse momento, porque o Nengo um
grande amigo... Ele foi primordial na minha converso e foi uma das
pessoas que mais me exortou a seguir genuinamente o caminho do Evangelho (Lzaro Silva, entrevista ao Site Bola de Neve em 12/08/2008).

O msico disse tambm ao site que acredita que esse DVD, alm de
ser uma importante arma de evangelismo, que trar restaurao e salvao, ser tambm um grande impacto para a populao evanglica no
geral, entre elas os pastores, pois quebrar barreiras de religiosidade que
ainda possam existir. A observao feita por Lzaro, compositor baiano,
que foi fortemente influenciado pelo reggae e que se tornou evanglico,
sugere que as denominaes religiosas esto receptivas para a insero
do gnero em seu meio, principalmente para chamar a ateno da juventude. Vale ressaltar que a maior parte dos adeptos da Bola de Neve
de jovens, sendo que boa parte deles surfista (inclusive seu fundador,
pastor Rinaldo Seixas, o Rina). Para esclaracer esses vnculos, fizemos
detalhadas observaes em reunies de clula da denominao religiosa,
cultos e show na sede da igreja de Salvador. Sobre este aspecto, Nengo
Vieira explica a aproximao entre esses universos:
O reggae uma msica de gueto, de resistncia e de luta. Por mais que
tenha sido rejeitado na cena gospel, hoje Deus tem derramado um avivamento, um gs novo na sua igreja. E todos os seguimentos musicais, inclusive o reggae, tm sido muito utilizados em eventos evanglicos como
ferramentas atrativas para alcanar as almas (Nengo Vieira, entrevista
revista Ritmo e Melodia em 02/11/2007).

Em sua trajetria, Nengo Vieira tambm atuou como arranjador e


instrumentista tendo contribudo com trabalhos de artistas como Zez
Mota, Chico Evangelista, Lazzo, Edson Gomes e da banda Tribo de Jah.
Em contrapartida, teve colaborao em seus discos de msicos como o
bluesman lvaro Assmar e o percussionista Gabi Guedes (Rumpilezz).
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 113

Em sua carreira se destacam duas turns nacionais com a banda californiana Christafari, pioneira no reggae gospel, liderada pelo msico Mark
Mohr. No por acaso, Vieira o nico regueiro cachoeirano que gravou
msicas em outro idioma, no caso, em ingls49; em dois dos seus discos,
Mata Atlntica (2001) e Avivamente (2007).
Em Salvador, foi feita uma observao participante em um evento
relizado em julho de 2008 na Estao Ed Dez, onde esteve presente um
pblico estimado de 2.000 pessoas, evanglicas ou no. Durante o show
de Nengo Vieira, os msicos da Christafari50 fizeram uma participao
especial em duas msicas, sendo que, em uma delas, o vocalista Mark
Mohr cantou com Vieira, enquanto sua esposa, Avion Blackman, cantava com Valria Leite e Noemi Vieira.
Nesse primeiro perodo produtivo, considerados os anos entre 19881998, somente Edson Gomes, Sine Calmon e Nengo Vieira conseguiram
lanar discos, sendo que o nico a lan-los em Long Play (seus trs
primeiros lbuns) foi Gomes. Os primeiros lbuns de Calmon e Vieira j
foram lanados como Compact Disc, mas ainda em uma fase que, por
conta dos custos, ambos dependeram de contrato com uma gravadora para ingressarem no mercado fonogrfico. Interessante observar que
apesar de ter se tornado msico aos 12 anos de idade e de ter um trabalho solo desde a dcada de oitenta, o msico Nengo Vieira s conseguiu lanar seu lbum de estreia aos 39 anos. Atualmente, Nengo Vieira
cumpre uma agenda de shows e compromissos que lhe permite viver
nica e exclusivamente da msica, mas em Salvador passou por muitas
dificuldades. Ele revelou em entrevista revista Ritmo e Melodia que isso
pesou na sua deciso de ir morar no Sudeste:
Acho que o pouco espao que nos dado, fomenta uma necessidade
de sobrevivncia e com isso cada um busca caminhar com suas prprias
pernas, dificultando o processo de unio. Na verdade fui enviado por
Deus para trabalhar no processo de edificao das igrejas Bola de Neve
de Santos e Guaruj, resultando em uma amplitude maior em expor nosso trabalho aqui no Sudeste (Nengo Vieira, entrevista revista Ritmo e

Melodia em 02/11/2007).

114 l Brbara Falcn

Concluindo o balano desse perodo, temos mais dois lbuns de Edson


Gomes, o Resgate Fatal (1995) e Apocalipse (1998), lanados pela EMI,
com quem o artista assinou mais um contrato para dois discos. O primeiro
lbum de Gomes, lanado como Compact Disc (o quarto da carreira), j
no contou com a colaborao do msico Nengo Vieira e dos outros Remanescentes. Uma mudana significativa notada na linha de contrabaixo
e no andamento (mais acelerado) das msicas desse disco e de todos os
lbuns lanados posteriormente. Segundo o contrabaixista Osvaldo Filho
(que acompanha o artista desde a gravao desse lbum), as linhas de
baixo foram criadas a pedido de Edson, para que acompanhassem suas
nuances vocais (Apud MOTA, 2008, p. 62). Outro fato que chama ateno
nesse disco so as homenagens rendidas a Olinda (PE) e as suas meninas, observadas nas letras de Bela Cidade e Olinda; resultado de uma
aproximao com o pblico pernambucano.
Analisando o segundo perodo produtivo, que corresponde aos anos
entre 1999-2009, temos, alm dos lbuns lanados pelos msicos mencionados no perodo anterior, cinco artistas gravando discos, sendo a
maioria deles lanados de forma independente. O primeiro cachoeirano a lanar um disco independente foi Tin Tim Gomes, em 1999, produzido pelo seu irmo mais velho, Edson. O lbum Pedra sobre Pedras,
que foi gravado na WR, reuniu composies de Nengo Vieira, Peto e
do prprio Edson Gomes, com letras que falam de temas diversos51.
Em entrevista realizada para esta pesquisa Tin Tim, que chegou a se
apresentar em eventos como Repblica do Reggae, em Salvador e Feira
do Porto, em Cachoeira, revelou que tem realizado poucas apresentaes, principalmente em sua terra natal, por conta do boicote da atual
prefeitura. Desde a dcada de oitenta, todos os artistas do segmento
reggae eram contratados pela prefeitura para apresentaes nas principais datas festivas no municpio, como do aniversrio da cidade (13
de maro), So Joo (junho) e Boa Morte (agosto). Segundo o msico
Tin Tim Gomes, o atual prefeito, em sua segunda gesto, de certa forma, tem excludo os regueiros desses eventos, pois, das poucas vezes
em que foram convidados para apresentaes, foram oferecidos cachs
insignificantes como pagamento52.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 115

Como todos os artistas independentes, os irmos Gomes buscam alternativas para driblar as dificuldades encontradas e continuarem conduzindo suas carreiras de uma forma sustentvel. Durante os festejos
juninos de 2009, mais especificamente no dia 25 de junho, os irmos
Eddie, Tin Tim e Edson, alm dos seus filhos, Isaac e Jeremias Gomes,
promoveram um Arrasto do Reggae com venda de camisas e apresentao da Gomes Family em um trio eltrico, nas ruas da cidade
de So Flix. Interessante observar que o trabalho em torno do gnero
reggae j ocupa cinco membros de uma mesma famlia, sendo que dois
destes indivduos so de uma segunda gerao. O mesmo caso se nota
na famlia do msico Nengo Vieira, que tem esposa, filhas e enteado
envolvidos em seu trabalho53.
Em 1999, temos ainda o lanamento de mais um lbum de Sine Calmon, o Rosa de Saron54, que, pelo ttulo, j sugere o componente religioso presente em mais um trabalho dos regueiros cachoeiranos. Nesse
disco, Calmon gravou trs composies de Vieira, alm de canes de
Jorge Guedes, Miguel Souza e duas de Bob Marley, sendo uma destas
verso dele de Stir it Up. O repertrio do lbum inclui, alm dessas
faixas, msicas compostas pelo prprio Sine, como a Rosa de Saron e
Ravengar55, que pode ser considerada como causa de outra polmica
em sua trajetria artstica. Isso por conta do refro e do nome da msica,
que tem como ttulo o apelido do maior traficante de drogas da Bahia
nos anos 90, Raimundo Alves de Souza, que na poca residia no Morro
do guia, no bairro da Fazenda Grande do Retiro, em Salvador. O refro
de Ravengar, de Calmon:
Deso l do morro, no me canso de cantar
Deso l do morro, pois eu t na paz de Jah
Deso l do morro, no me canso de cantar
Deso l do morro, riba, passo logo em Ravengar.

Em 2001, o msico Nengo Vieira lanou seu primeiro disco independente, o Mata Atlntica, com repertrio diversificado, que incluiu
Shalon56, sua primeira cano em ingls. Outras canes desse disco
ficaram bastante conhecidas pelo grande pblico, como Roda Pio e
A Vida, sendo a ltima uma das finalistas do I Festival de Msica da R116 l Brbara Falcn

dio Educadora em 2003 (inclusa em um CD com as outras 13 finalistas).


Esse lbum, apesar de conter canes com contedo religioso, a exemplo
de Caminho e Rub-a-Dub de Jah57, tambm traz composies como
Reggae Music e Mata Atlntica, que tratam de outros temas58. A capa
desse disco dispensa qualquer componente que remeta a religiosidade
do msico, que na poca, por indicao do seu produtor, optou por fazer
uma foto com paisagem de natureza ao fundo (algo que poderia sugerir
sua relao com o ttulo do lbum). Apesar de se tratar de uma produo independente, o disco alcanou uma boa vendagem (sendo inclusive
distribudo na rede de supermercados Extra) e possibilitou ao artista uma
quantidade razovel de contratos para apresentaes na capital e interior da Bahia, alm de shows em outras capitais, a exemplo de Vitria
(ES), Rio de Janeiro (RJ) e So Paulo (SP), tanto em eventos evanglicos
como em eventos seculares.
Edson Gomes e Sine Calmon tambm lanaram lbuns em 2001, ambos pela Atrao Fonogrfica, mas no tiveram bons resultados de venda
e de divulgao com os respectivos discos, Acorde, Levante, Lute e Eu
Vejo. O baixo investimento por parte dessa gravadora desmotivou Nengo Vieira a renovar contrato com a mesma, fazendo com que recusasse
uma proposta que, segundo ele no correspondia as suas necessidades.
Interessante observar que apesar de ter lanado ainda um lbum ao vivo
pela Atrao, Edson Gomes declarou em entrevista ter um projeto para
que seu prximo disco seja lanado de forma independente:
Depois do Apocalipse eu j gravei independente, a foi produo minha
mesmo, o Acorde, Levante, Lute, foi produo minha, distribudo pela Atrao. J foi um negcio meu j, no ainda totalmente independente porque
as canes j haviam sido editadas e a precisava da distribuio de uma
gravadora pra distribuir e pra liberar as msicas. Pra jogar no mercado eu
teria que pagar os direitos. J pensou que viagem a pessoa fazer isso? Com
suas prprias canes, com a sua prpria obra. Mas eu quero fazer um disco
realmente independente para que possa chegar nas mos daquela galera em
um preo bacana. Porque a gravadora faz um trabalho comigo de reggae, eu
canto reggae pra galera carente, mas que no pode comprar o CD porque
caro. A fica essa contradio, n? Ento eu quero fazer um disco bonitinho,

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 117

com canes inditas. Ocorreu agora o CD ao vivo que tem umas quatro
msicas j conhecidas, como Barrados, Bibliotecas Pblicas, Ana Maria,
Tabuleiro, Lei do engano. Ento, essas canes, eu j editei com a minha
prpria editora. Ento, eu j posso fazer um disco independente e colocar
algumas msicas conhecidas pra no lanar um disco totalmente desconhecido. E principalmente que esse foi gravado ao vivo, ento eu posso colocar
elas de outra maneira em estdio. Entendeu? Mas uma cano que j vai
garantir assim a procura, o interesse pelo disco, com uma cano j conhecida. Ento esse o meu projeto, n? Um CD independente mesmo pra puder
vender barato pra galera (Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

O alto custo para lanar um CD independente no mercado e a dificuldade de negociao com as gravadoras so apontadas pelos artistas
entrevistados como as principais causas de um perodo de cinco anos de
decrscimo em suas produes. Entre os anos de 2001 e 2005, h uma
pausa na produo musical dos msicos de Cachoeira, que s retornam
a lanar lbuns em 2006. Edson Gomes lana um lbum ao vivo, j com
msicas editadas por ele, mas distribudo pela Atrao Fonogrfica, alm
do seu primeiro DVD com imagens do mesmo show gravado para ser
lanado em CD. Sine Calmon lana pela gravadora Kaskatas o lbum
Guerreiro Mor, at ento seu trabalho mais recente. A exemplo dos seus
outros discos, Calmon gravou duas msicas de Nengo Vieira, uma delas
intitula o lbum, que tambm traz uma verso de Roots, Rock, Reggae
de Bob Marley. Nengo Vieira lana em 2006 dois discos de forma independente, o Vem pro Caminho Reggar, gravado ao vivo, na Igreja Batista
Caminho das rvores (Salvador/BA), durante o evento Arrasto Gospel;
e o Chama59, considerado pelos fs como um dos melhores lbuns de
sua carreira. Atualmente, o primeiro disco mencionado encontra-se esgotado no mercado e o segundo distribudo pelo selo Bola Music, que
pertence a denominao religiosa Bola de Neve Church.
Tambm no ano de 2006, o msico Marco Oliveira consegue lanar o
lbum de estreia de sua banda, a Dystoro, um trabalho independente,
gravado nos estdios da WR em Salvador. Como a banda ficou desfalcada do baterista e do guitarrista pouco tempo antes da gravao, o disco
foi gravado com bateria eletrnica. Dentre as faixas gravadas, se destaca
118 l Brbara Falcn

Cidade Moleque, por ser classificada entre as 50 melhores do ano no


Festival de Msica da Rdio Educadora, garantindo sua execuo at os
dias de hoje na programao da rdio. A letra de Oliveira fala da musicalidade e de outros aspectos de Cachoeira:
Cidade moleque, cidade rebelde
Cidade que tem um certo som
Cidade moleque, cidade rebelde
Que tem tambm tudo de bom
Que cidade mais linda, meu irmo
Que tem em alto e claro som partculas de msica pelo ar
Tem tambm muita manha e muita malcia
Mas se voc bom de ginga vai se dar bem por l.

Em 2007, o msico Geraldo Cristal consegue finalmente lanar


Reggaessncia, de forma independente, seu lbum de estreia, depois
de quase vinte anos de carreira. Esse disco, que teve produo executiva do radialista Clvis Rabelo, tambm foi gravado com bateria e
percusso programadas, sendo que, em algumas faixas, Cristal pde
contar com a colaborao de um baterista. importante ressaltar que
o repertrio desse artista bastante diferenciado dos demais, pois
em suas composies predominam letras que tratam de problemas
sociais, como a violncia, desigualdade social e at de drogas como o
crack 60. Nengo Vieira lana, nesse mesmo ano, o seu quinto lbum,
o Avivamente, de cunho altamente religioso, sendo lanado pelo selo
Bola Music. Essse disco foi o primeiro da carreira do artista gravado
fora da Bahia, no caso, em So Paulo, mas contando com a presena
de msicos baianos que o acompanham desde o seu lbum de estreia.
Voltado para o segmento gospel, e de olho no mercado internacional,
Vieira inclui nesse trabalho duas composies61 em ingls, feitas em
parceria com a pastora Sheila Possi.
Finalizando o balano da produo cultural cachoeirana, temos mais
dois lbuns lanados de forma independente em 2008. Neste ano, Isaque Gomes, filho de Edson Gomes, estreia com o Negro Real, contendo composies prprias que falam de amor e de questes raciais, a
exemplo da faixa que d nome ao disco. Iniciando sua carreira solo,
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 119

Isaque j tinha feito participaes especiais nos shows de Edson, em


eventos grandes, realizados na Concha Acstica do Teatro Castro Alves e no WetnWild (Salvador/BA). Alm disso, Isaque Gomes realiza
exporadicamente apresentaes em casas noturnas de Salvador. Seu
tio, Tin Tim Gomes, tambm lana em 2008 um lbum gravado ao
vivo em Maragogipe, onde o artista costuma se apresentar em festas
locais, como a de So Bartolomeu, padroeiro da cidade. O repertrio
desse disco inclui msicas que ele cantava na poca da Remanescentes,
covers de Bob Marley, Jacob Miller, alm de msicas do seu primeiro
disco, o Pedra sobre Pedras (1999). Vale observar que entre uma msica e outra, Tin Tim sempre discursa para o pblico pregando palavras
de cunho religioso. Nesse mesmo ano, outro filho de Edson Gomes,
Jeremias, se lana como cantor. Como o seu irmo Isaque, primeiro faz
participaes em shows do seu pai, depois passou a se apresentar com
seu trabalho solo.
Ainda em 2008, o msico Nengo Vieira gravou o seu primeiro DVD,
na Bola de Neve Church de Perdizes, na capital paulista, onde estiveram
presentes cerca de duas mil pessoas. Durante o show, Vieira parou para
discursar e dar um testemunho da sua vida e trajetria profissional:
Antes eu me preocupava em fazer sucesso e ser exaltado pelos homens,
mas hoje isso pouco me importa, pois eu canto para que o nome de
Jesus Cristo seja exaltado. Hoje eu sei o que viver o melhor de Deus e
o que caminhar com Deus, coisa que eu no sabia quando gravei os
primeiros discos com a Tribo de Abrao. Deus nos deu uma promessa
h 12 anos atrs, mas hoje ela est se cumprindo. Essa gravao no
um projeto de homens, um projeto do Senhor (Nengo Vieira, entrevista ao site Bola de Neve, em 12/08/2008).

As estratgias de legitimao em aspectos textuais e musicais so


ainda referncias compartilhadas por este grupo de msicos. O discurso
de valorao em torno de sua produo, que inclui um repertrio com
sonoridades, padres rtmicos, clichs harmnicos e meldicos so bastante semelhantes. Na opinio de Edson Gomes, o diferencial em seus
trabalhos so as letras de cunho religioso:

120 l Brbara Falcn

Porque o seguinte, aqui acabou sendo uma escola, todo mundo passou
pelo mesmo lugar, eu, Nengo, Sine, Tin Tim. E quem vem atrs vai observando, se voc observa Sine, observa a gente l atrs. Olha o trabalho
do Sine, ele faz parte da escola. O diferente daqui Cristal. Cristal no
passou pela escola. E o outro ingrediente a parte literria, que todos ns
abordamos a questo espiritual focada em Deus, Jesus Cristo. Ento esse
um ponto em comum na nossa vida. Todo mundo fala de Deus, porque o
social j parte mesmo da raiz do reggae, n? Mas em nosso trabalho, se h
algo em comum, isso a (Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

Em outra fala, Edson elabora um discurso de pureza em torno de suas


composies, onde ele afirma nunca ter pesquisado a fundo o reggae
jamaicano e que por conta disso, no sofre influncia direta deste:
Eu no pesquiso nada, pra no sofrer essa influncia quando eu for
compor, de t olhando pra Jamaica. Ento, eu nunca componho olhando
pra Jamaica, eu nunca quis e uma coisa que me favoreceu foi a pobreza.
A pobreza me poupou disso. Eu no tinha material, no tinha nada, no
tinha disco, no tinha nada. Eu passei a ouvir quando fui para casa de
Nengo. Ento eu no ouvia nada, no tinha em casa. A pobreza me preservou disso. Ento eu nunca pesquisei. Eu no tinha material nenhum
em casa (Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

Para manter contato com o pblico, alm dos discos, vdeos e shows,
alguns dos artistas de Cachoeira tm pginas em redes sociais da Internet,
a exemplo do Facebook, Orkut e do Myspace, onde os prprios fs fundam
comunidades e perfis para trocarem informaes sobre eles. Os mais seguidos pelos admiradores nas redes sociais so Edson Gomes e Nengo Vieira,
que no por acaso tambm so campees em resultados de busca na web.
Atravs de uma pesquisa com os nomes deles podem ser encontrados links
de vdeos no You Tube, entrevistas e matrias em sites e revistas eletrnicas, alm de links para download de seus discos em blogs.
As observaes em shows foram essenciais para a qualificao desse pblico, bastante diversificado, dependendo do artista e do local da
apresentao. Nos shows de Edson Gomes so observados tanto jovens
quanto pessoas de meia idade, sendo que a maioria de homens, afroO REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 121

descendentes. Em locais para shows de grande porte, como o WetnWild


isso pode variar muito, pois geralmente oferecida ao pblico do reggae
uma grade de atraes que inclue artistas de outros estados e at de
outros pases, como o caso do evento anual Repblica do Reggae.
Durante uma apresentao de Gomes na Concha Acstica, no vero de
2008, observei um pblico heterogneo, mas na sua maioria formado
por jovens, de ambos os sexos, de classes mdia e baixa, e de composio tnica diversa. Depois de realizar pesquisa de campo em alguns
locais em que Edson se apresentou, pude concluir que a composio do
seu pblico pode variar a depender do local.
Acompanhando alguns shows de Sine Calmon, em Salvador e em
Cachoeira, me certifiquei que o pblico dele geralmente composto por
jovens, de classes mdia e baixa, de ambos os sexos, mas que costumam
frequentar determinados espaos, independente da atrao, como o
caso do Espao Verde. Fora isso, Sine tem se apresentado pontualmente
em grandes eventos, o que dificulta um pouco a caracterizao do seu
pblico, e em outros estados, como So Paulo e Santa Catarina, onde
Calmon costuma fazer shows com frequncia.
Com o msico Nengo Vieira, tive algumas oportunidades de observao durante o perodo desta pesquisa, em Salvador e no Guaruj, onde
ele reside atualmente. Claro que em se tratando do pblico da Bola de
Neve do Guaruj, a maioria constituda de jovens brancos, de classes
mdia e alta, de ambos os sexos. Uma nica ressalva sobre esse pblico
de fiis: composto por muitos surfistas. Primeiro por se tratar de uma
cidade litornea e segundo pelo fato da igreja ter sido fundada por um
pastor surfista, o Rina. Na Bola de Neve de Salvador, tambm pude perceber que boa parte do pblico era de surfistas, mas com uma proporo
bem menor em relao a So Paulo. Na igreja da Bahia, foram observados alguns pontos em comun, como a classe social, que era predominantemente mdia, e outros diferentes, como a composio tnica, que era
bastante variada. Fora da Bola de Neve, mas ainda dentro do segmento
evanglico, fui a um evento gospel na casa de shows Espetculo (Boca
do Rio), onde Nengo encerrou uma noite cheia de atraes locais. Durante esse evento observei um pblico de ambos os sexos, mas tendo
122 l Brbara Falcn

em sua maioria homens, jovens, afrodescendentes de classes mdia e


baixa. Na Estao Ed Dez, apesar de ser tambm um evento gospel, teve
um pblico misto de evanglicos e no evanglicos, em sua maioria de
homens, jovens, de classe mdia, afrodescendentes.
Uma anlise da produo cultural destes artistas no pode desconsiderar que o consumo de suas msicas, com toda certeza, se deve tambm ao discurso ideolgico. A anlise dos discursos dos cachoeiranos
permite ver que quase sempre englobam componentes polticos, religiosos e tnicos. O discurso poltico pode ser observado em composies
como Basta Man, Sistema do Vampiro e Carta ao Presidente:
Todo p rapado tem o mesmo direito, de comer, viver e trabalhar
Seja ele branco, preto ou amarelado, cada unidade nica a regar.
(Basta Man, Nengo Vieira)

Esse sistema um vampiro, ah, o sistema um vampiro! Vive


sugando todo o povo.
(Sistema do Vampiro, Edson Gomes)

Presidente no h nada bem vista, se tem coragem faa uma visita


s favelas de palafita e compare com a orla martima, toda enfeitada e
bonita, ao gosto do turista.
(Carta ao Presidente, Geraldo Cristal)

Diversas composies de Edson Gomes tm um carter tnico, onde


ele costuma fazer denncias contra a escravido e o racismo, que se perpetua atravs de geraes e causa a injustia social. As letras de Gomes
parecem se dirigir a um pblico negro:
Por isso que a gente no tem vez/ Por isso que a gente sempre est/ Do
lado de fora/ Por isso que a gente sempre est/ L na cozinha/ Por isso
que a gente sempre est fazendo/ O papel menor/ O papel menor/ O papel
menor/ Ou o papel pior.
(Histria do Brasil, Edson Gomes)

Ainda ontem no condomnio que moro


Uma senhora quando me avistou apertou a bolsa, ela escondeu sua bolsa

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 123

Apertou a bolsa, a branca segurou logo a bolsa


So cenas da minha cidade uma doena da sociedade.
(Barrados, Edson Gomes)

Eu ando aqui pela Babi, eles me chamam de brasileiro,


porm eu me sinto um estrangeiro.
(Estrangeiro, Edson Gomes)

Alm das letras que denunciam situaes de racismo, vemos em


algumas composies de Edson Gomes uma forte identificao com a
frica. A letra de Origens, gravada por Tin Tim Gomes (1999) traduz
esse sentimento:
frica/ frica, um continente/ frica, terra da gente/ No navio viemos de l/
Colonizar esse pas/ Na cana no engenho/ Na cana no engenho/ Na cana no
engenho/ Na cana no engenho/ Brasil, ou, ou, ou, ou, Brasil/ Colonizar esse
pas/ A saudade tambm mata/ E assim muitos morreram/ A distncia e a
angstia/ Inimiga desses homens.
(Origens, Edson Gomes)

A msica Gueto, parceria de Nengo Vieira e Carlito Profeta, gravada por Sine Calmon (1999), traz uma referncia ao regime sul-africano
apartheid:
Eu vim do Gueto/ Vim do interior do Gueto/ Eu
no trago dio pra voc
Eu, sim, meu preto/ Ando procurando um jeito
De tocar, cantar o que voc viver
Mr. Stevie Wonderful/ A onda voc/ Cantando
um Rock, um Reggae, um Rhythm and Blues
Ainda que os alto-falantes da frica do Sul/ No
sintam as emoes da nossa alma Blues
Alma Blues/ Alma Blues.
(Gueto, Nengo Vieira e Carlito Profeta)

Uma breve leitura da antologia do reggae de Cachoeira (Anexo


II) permite a identificao de traos polmicos em diversas composies gravadas em 20 anos de produo. Quantificando a produo
124 l Brbara Falcn

fonogrfica nos dois perodos estudados, temos um resultado significativo, ainda mais por se tratarem de artistas que vm de uma origem
humilde, afrodescendentes e nascidos em uma cidade do interior da
Bahia onde a economia manteve-se (e ainda se mantm, de certa
forma) estagnada. O nvel de dificuldade para que estes artistas conseguissem alicerar suas carreiras, pode ser considerado ainda mais
complexo quando se leva em conta o gnero musical escolhido para
desenvolverem suas produes, pois, alm de tratar-de de um gnero
internacional, tambm considerado como um gnero tnico, o que
com certeza provoca preconceito e dificulta a insero de suas canes no mercado. As letras destes artistas tambm podem se constituir
como uma barreira nesse sentido, pois tratam de problemas sociais
(etnicidade, poltica e religiosidade) que se constituem como tabu
para investidores e consumidores nesse mercado. Tratando de produo musical na Bahia, temos ainda um agravante, pois, durante um
longo perodo, a emergncia da ax music causou uma espcie de
invisibilidade aos demais gneros trabalhados.
Produo Fonogrfica em torno do Reggae de Cachoeira*

*As referncias fonogrficas tambm incluem informaes sobre coletneas individuais.

Ainda assim, o reggae feito pelos cachoeiranos chamou a ateno de produtores como Cristvo Rodrigues e Wesley Rangel, que
acabaram investindo em seus diversos projetos. Na opinio de Rangel, o reggae foi um forte referencial para toda msica produzida na
Bahia, a partir da dcada de oitenta, num movimento encabeado
pelos blocos afro, mas que chegou s estrelas da ax music, de
diferentes geraes.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 125

O reggae influenciou diretamente a msica baiana, tanto na composio


rtmica de algumas bandas como Olodum, Muzenza, Timbalada e vrias
outras bandas que tm em seu repertrio clssicos do reggae local, nacional
e internacional a exemplo de Luiz Caldas, Sarajane, Banda Mel, Banda
Beijo, Banda Cheiro de Amor, Araketu, Z Paulo, Daniela, Ivete, Netinho,
Bell Marques, Durval, Claudinha, Margareth, Jammil e a quase totalidade
das bandas baianas (Wesley Rangel, entrevista em 07/07/2007).

O msico Srgio Cassiano, vocalista da banda Ado Negro, declarou


em entrevista sua admirao pelos regueiros cachoeiranos:
Eu tinha um respeito muito grande porque eu via j que eram grandes
msicos. A Remanescentes chegou a gravar um disco na WR e tal. Eles
eram muito admirados por Rangel. At hoje ainda so. E Rangel, quando
a Remanescentes se separou, ele disse que a Remanescentes no se separou, a Remanescentes floresceu. Porque se a gente olhar Nengo, o trabalho
de Nengo um trabalho todo pronto, n? No perdeu nada. Sine, tambm,
no perdeu nada. Como Marcos Oliveira tambm. Musicalmente, este msico talvez seja o melhor executante de todos, Marcos Oliveira. E eu j tinha
uma admirao, ainda tenho por todos eles, individualmente, pelo trabalho
deles individualmente. De modo que eu acho isso. Eu, do Ado Negro, sou
o mais influenciado pela msica de Cachoeira, pelo reggae de Cachoeira
(Srgio Cassiano, entrevista realizada em 2002).

No balano produtivo que realizamos no foram consideradas as participaes em compilaes (coletivas) e coletneas individuais, pois s
o msico Edson Gomes tem cinco discos lanados por duas gravadoras
diferentes no perodo entre 1999 e 2003. Esses discos no foram includos no balano, bem como o disco Semente do Amor, gravado pelos
Remanescentes, pois ainda permanece indito no mercado fonogrfico.
Gomes tambm detm o maior nmero de msicas registradas e gravadas por artistas de outros segmentos. Alm dele, Nengo Vieira tambm
participou de coletneas, tanto no segmento gospel, quanto no segmento
reggae. Vieira tambm teve diversas canes gravadas por outros artistas,
principalmente por Sine Calmon e Tin Tim Gomes. Fala s de Amor
(Edson Gomes/ Nengo Vieira) foi a nica parceria gravada por Edson
Gomes, que j teve msicas suas gravadas pela Timbalada, Margareth
126 l Brbara Falcn

Menezes e Araketu. Ivete Sangalo chegou a gravar, em 1999, a msica


Nayambing Blues de Sine Calmon, quando ainda fazia parte da Banda
Eva. Anos depois, em 2005, a banda Ado Negro gravou a mesma msica em seu DVD, com participao especial de Calmon.
Em suma, a indstria cultural absorveu a produo musical realizada
em torno do reggae cachoeirano nesses mais de vinte anos, onde alm dos
produtos comercializados (discos, fitas, vdeos e mercadorias associadas),
tambm so vendidos shows, dentro e fora do estado. Em Salvador, todos
os grandes eventos do segmento contam com a presena de pelo menos
um cachoeirano, sendo que o mais requisitado deles ainda o reggaeman
Edson Gomes. Em sua entrevista, o msico Nengo Vieira teceu um comentrio acerca do espao destinado ao reggae na Bahia:
O reggae muitas vezes carece de espao pra escoar os seus shows, pra
mostrar suas apresentaes, uma dificuldade muito grande ainda. O
reggae t naquele nicho, assim, ao lado desse caldeiro de riqueza que
a Bahia, Salvador. Especificamente com a msica, voc v esse caldeiro
de ritmos, todo ano acontece uma banda nova, a ax music, o pagode,
a Timbalada, que rico pra caramba, muito diverso, e o reggae, que
uma msica que veio de fora, uma msica mundial, pra poder contracenar com essa msica regional, local, nativa, meu irmo, nadar contra a
mar (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

As emissoras de rdio locais, tanto em Cachoeira, quanto em Salvador, foram essenciais, pois, mesmo com a limitao imposta pelo jab,
ajudaram a divulgar, em diferentes momentos, o trabalho desses artistas.
Destaco aqui a colaborao de radialistas como Ray Company, Lino de
Almeida, Clvis Rabelo e Luiz Carlos Athayde, que, em seus programas
dedicados ao gnero, sempre deram destaque aos cachoeiranos. No
podemos deixar de considerar tambm a atuao dos camels, que atravs do comrcio informal e de uma lgica prpria de mercado, ajudaram
a divulgar essa produo na capital e no interior, inclusive em Cachoeira,
onde atuam, principalmente, na feira livre.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 127

RASTAS DE CRISTO
Deus usa vrias iscas, em vrias situaes pra ganhar vidas. Porque Deus
quer nossa vida, nosso corao. E na palavra ns somos referenciados
como peixes. Eu sou um tipo de peixe e Deus usou uma isca diferente
pra me conquistar. E Deus, hoje, atravs da minha vida, tem uma isca
fundamental muito forte envolvendo a gente, que o reggae.
Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007

No podemos deixar de pensar na histria que o reggae trilhou, inicialmente dentro de uma perspectiva religiosa, e de como esta msica
ajudou a disseminar uma prtica religiosa, o rastafarianismo. Nas letras
de artistas como Bob Marley e Peter Tosh, a Bblia foi usada para formular o pensamento contra-hegemnico, propagado pelos quatro cantos do
mundo, na melodia de suas msicas. Adeptos do rastafarianismo, essncia do gnero poltico-musical em questo, tornaram o livro do colonizador branco em uma espcie de teologia da libertao, onde Deus
negro e a sua ltima encarnao na Terra seria o imperador da Etipia,
Haille Selassi. Baseando-se neste discurso, os adeptos do Ras Tafari propem a destruio do sistema de Babilnia e o retorno para a frica,
refazendo o xodo bblico dentro de uma perspectiva tnica. Segundo a
pesquisadora Olvia Cunha:
O que chamamos rastafarianismo constitui um amplo conjunto de prticas
e ideias, que comearam a se esboar em movimentos poltico-religiosos e,
sobretudo, tnicos, na Jamaica desde o sculo XIX. Tais movimentos, intimamente relacionados com a luta contra a opresso da estrutura escravista
britnica, tinham vnculos com associaes religiosas, organizaes e igrejas
do sul dos Estados Unidos e do Caribe que, a partir de uma interpretao
tnica da Bblia, comearam a fazer junto aos negros jamaicanos pregaes
nas quais o paraso e a Terra Prometida se localizavam na Etipia/frica.
Tal territorializao do mito bblico permitiu uma ruptura radical com toda
uma ideologia colonial e protestante que durante sculos justificou a escravido apoiada em interpretaes religiosas (CUNHA, 2003, p. 122).
128 l Brbara Falcn

Desde a dcada de 70, algumas prticas do rastafarianismo como regras de alimentao e indumentria (incluindo os dreadlocks), bem como
a utilizao da ganja como uma erva sagrada ficaram conhecidas em
todo o mundo, atravs das msicas e do comportamento de astros jamaicanos difundidos pela cultura de massa. Na Bahia, bem como em outros lugares do pas, essas informaes e prticas chegaram de diferentes
maneiras e foram ganhando um novo sentido, possibilitando juventude
negra, novas experincias identitrias que resultaram em verses filiais
de uma cultura de matriz jamaicana (ib. idem, 2003, p. 122). No caso
desta pesquisa, estamos tratando da verso de um grupo de artistas da
cidade de Cachoeira, onde a msica foi o principal elemento de identificao entre duas culturas, possibilitando que jovens com diferentes estilos de
vida e vises de mundo, pudessem us-la na elaborao dos seus prprios
discursos. Nas palavras do msico Nengo Vieira:
Ns sempre fomos afeioados pelo reggae, nos identificvamos com a embalagem [grifo nosso] do reggae, com os cabelos, de fumar, de tocar a msica,
mas nunca nos identificamos com o contedo espiritual do reggae, ou seja,
com o rastafarianismo. Ento a gente abraou o evangelho, a causa do evangelho, de uma forma muito profunda e intensa. A passamos a compor msicas
com a proposta de falar do amor de Jesus para as pessoas. Ento isso tudo era
enriquecedor e a gente tinha uma proposta muito grande, foi quando entrou
a proposta de falar do amor de Deus, n? Da Bblia, que o nosso alvo, nossa
bssola. Ns tivemos o privilgio de conhecer a palavra de Deus e a palavra de
Deus foi semeada no nosso meio de uma forma inusitada. Ns fumvamos,
fumvamos, fumvamos e atravs do Edson, que primeiramente passou pra o
Tin Tim, depois Tin Tim foi morar no 53, no Alto das Pombas, e ele passou a
ser o nosso evangelista. Comeou a me evangelizar, a evangelizar Marquinho,
evangelizar Sine. Fumvamos pra ler a Bblia e a Bblia ali comeou a encontrar espao no nosso corao (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

Assim, o reggae feito por estes indivduos foi sendo destitudo da mensagem rasta, que foi substituda por um componente cristo-messinico.
O cantor Edson Gomes revelou em entrevista como se deu o seu primeiro
contato com a Bblia e de que maneira o Evangelho foi sendo pregado no
meio dos rastas cachoeiranos:

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 129

Quando eu trabalhava na fbrica de papel do Toror [localidade de


Cachoeira], um dia eu apanhei um Novo Testamento, a levei pra casa,
comecei a ler e comecei a gostar da leitura. Comecei a gostar tanto da
leitura que adquiri uma grande, uma maior e a comecei a introduzir no
nosso meio a palavra de Deus, a Bblia no nosso meio. Ento por isso
que ns no nos enveredamos pra esse lado de Ras Tafari, Selassie, essas
coisas, porque ns encontramos uma coisa, algo maior que isso, que j
vinha antes e maior que Selassie, n? Ento, essa uma filosofia jamaicana, alguns seguem, mas ns no seguimos, ns s seguimos o perfil, s
a aparncia [grifo nosso], ns nos vestimos de rasta, mas no cultuamos
a filosofia rasta. Tem essa viagem, ento eu no sou rastafri. Quando
conheci Bob Marley, eu j era leitor da Bblia, j lia a Bblia. E eu levei
essa leitura para os demais. Eu levei essa leitura pra Nengo, que por sua
vez passou para Sine, pra Marquinhos. Porque a gente tava no grupo e,
de repente, houve a necessidade da parte deles, de conhecer a palavra,
de fazer a leitura bblica (Edson Gomes, entrevista em 10/06/2008).

Tanto a fala de Vieira quanto a de Gomes atestam que a preocupao


com uma mensagem social e religiosa suprimiu uma conotao poltica,
pelo menos nos moldes jamaicanos, onde o binmio poltica/etnicidade
se tornou indispensvel. De acordo com os depoimentos dos msicos Tin
Tim Gomes e Nengo Vieira, a identificao com o reggae veio junto com
a opo pelo evangelismo, o que pode explicar a juno entre componentes oriundos de culturas diferentes:
Eu fui procurar saber o que era a coisa da religio deles, o rastafri, eu procurei saber o que significava. A eu vim saber que eles chamam um deus a,
Ras Tafari Selassi. A eu fui pesquisar sobre Selassi, mas antes de chegar at
esse ponto a, eu conheci a palavra. Ao mesmo tempo que ns conhecemos
o reggae, ns tambm conhecemos a palavra. Eu comecei tambm a ter uma
compreenso da palavra do Senhor e, a, comeou a ter uma transformao
em nossa vida, n? (Tin Tim Gomes, entevista em 07/06/2008).
Essa filosofia [religio] nunca foi minha ideologia. Sempre busquei conhecer
Deus atravs da Bblia. Evangelho poder, amor e toda a essncia de Deus
manifestado em ns atravs do amor do Senhor Jesus Cristo. Rastafri uma
filosofia onde aponta um rei da Etipia como o Cristo deles. Todas as profe130 l Brbara Falcn

cias da Bblia apontam para Jesus Cristo e no outra pessoa. Jesus veio para
salvar a todos independente de raa, credo ou cor... Salvar o mundo (Nengo
Vieira, entrevista revista Ritmo Melodia em 02/11/2007).

A anlise dos discursos feita at aqui, seja atravs das letras das msicas ou das falas das entrevistas, aponta para o uso (em diferentes escalas)
do trinmio etnicidade/poltica/religiosidade, numa alternncia que, de
certa forma, vem garantindo a propagao/perpetuao das mensagens
pretendidas, tendo o gnero em questo como principal fio condutor. No
caso do reggae de Cachoeira, temos o componente religioso como ponto
em comum entre os artistas pesquisados, visto que em toda a discografia
analisada, falar de Deus praticamente uma constante. De uma forma
geral, a questo racial aparece nas letras desses artistas, contudo, h uma
prevalncia do chamado religioso, tanto na voz de congregados quanto
de desligados de denominaoes religiosas, como o caso de Edson
Gomes, que apesar de no fazer parte de congregao alguma, atribui o
dom musical e todo o seu ganho material ao seu lder espiritual Jesus
Cristo. Segundo ele, as mensagens transmitidas atravs de suas canes
chegam a contribuir para a converso dos seus fs:
No meu trabalho eu sempre abordo, porque o meu lder espiritual, Jesus o meu lder espiritual, ento eu credito a ele a minha
existncia, eu credito a ele a minha proteo, essa condio que eu
tenho hoje, de vir do nada, de no ter uma especializao, de no
ter concludo meus estudos e consegui sobreviver atravs desse dom
musical. Ento, eu credito tudo a isso a Jesus Cristo, a Deus, porque
depois que eu passei a me relacionar com a palavra de Deus, ainda
que eu no seja congregado, no pertena a nenhuma congregao,
mas eu sinto que a partir desse momento houve um crescimento muito
grande em minha pessoa e continua. Toca pessoas que j conhecem
a palavra e que esto desligadas das congregaes, toca pessoas que
no tm ainda conhecimento. Tm pessoas que j se converteram ao
Evangelho por ouvir minha msica. Pessoas que usavam drogas, que
estavam metidos na droga, por ouvir essas canes deixaram. Eu fui
outro dia no Pelourinho, veio uma mulher atrs de mim correndo e
disse que vivia nas drogas e que ouvindo minhas msicas ela sentiu

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 131

desejo e fora pra sair das drogas. E me apresentou o marido, disse


que tava casada: Casei!. Ento isso maravilhoso (Edson Gomes,
entrevista em 10/06/2008).

Na opinio do dicono Nengo Vieira, o reggae se constitui como um


importante veculo de comunicao, que transcende barreiras sociais que
podem ser intransponveis em determinados contextos. Da mesma forma, Nengo acha que a palavra de Deus contida em sua msica tem uma
linguagem universal, que vai alm da questo tnico-racial, to presente
nas canes do gnero, em todo o mundo.
O reggae muito forte, uma msica de paz, que agrega as pessoas,
independente da classe social, do nvel intelectual de cada um, de condio financeira, social e econmica, ele abraa, porque ele atinge essa
questo, porque todo mundo tem sentimento, tem feeling. Por que anexamos a palavra de Deus? Porque ns no pertencemos a essa doutrina,
a essa religiosidade [se referindo ao rastafarianismo]. A palavra de Deus
uma coisa to grande e to profunda que ela no uma coisa de etnia,
no uma coisa racial. A palavra diz em Joo 3:16, que Deus amou o
mundo, Deus amou o mundo. Deus amou o preto, o amarelo, o asitico,
o europeu, o americano, os ndios, toda tribo, toda lngua, toda nao t
sendo evangelizada pelo amor de Jesus. Ento Deus amou o mundo. Ns
abraamos esse conceito, que muito mais abrangente do que voc lutar
por uma raa, lutar por uma raa branca, uma raa negra (Nengo Vieira,
entrevista em 10/08/2007).

Questionado acerca da sua posio sobre o espao que os negros


ocupam na sociedade brasileira e de como a msica reggae pode ser usada para transmitir palavras de incentivo a grande parte dessa populao,
que ainda tem seus direitos negados, ele afirmou que:
Eu sou negro, cara. Eu sou negro, amo o negro. A minha comida negra, o
meu ritmo negro, meu som negro, eu s no sou negro por causa dessa pele
clara, mas eu sou um sarar, eu tenho uma influncia do negro muito grande.
Minha msica, quem conhece minha msica vai ver que minha msica no
de branco, de branco vrgula, msica de laboratrio, de conservatrio, msica
de povo de rua, de suor, de sofrimento, de passar pela dificuldade, entendeu?
132 l Brbara Falcn

Eu sei que os negros tm a sua luta, que natural, de espao, e eu acho isso
horrvel, porque o Brasil um pas miscigenado e voc v o negro totalmente
discriminado. Isso uma realidade. O negro tem que lutar pelo espao dele?
Tem, mas no tem que lutar com essa coisa do apartheid, contra o branco,
porque vai virar o contrrio, a mesma coisa. Voc tem que lutar pelo seu espao pelo seu mrito, pelo valor que voc tem. Ento, voc tem que pegar o
seu histrico, que um histrico de atropelo, de tudo contra voc e reverter
isso. Mostrar que tem qualidade, que voc tem talento, que voc inteligente,
que voc tem capacidade, que voc forte, que voc bonito, que voc tem
o seu potencial. Tem que mostrar isso, na sua prtica, na sua vida e com uma
palavra, amor, perdo. Tem que combater o mal com o bem, porque tapa
de luva. O inimigo no tem mais fora sobre sua vida. Porque o inimigo foge
diante do amor de Deus (Nengo Vieira, entrevista em 10/08/2007).

Um aspecto chama ateno nessa fala de Vieira, quando ele assume


a importncia do elemento negro em sua vida e na musicalidade que
compem o seu som, que traz influncias da black music e da black
religious music, trilha sonora do cristianismo negro norte-americano.
Nascido no seio das igrejas negras dos Estados Unidos, o gospel nada
mais do que cnticos protestantes brancos adaptados e reinterpretados pelos negros em cantos de celebrao, de alegria, de exortao e
comunho entre o pregador (pastor) e sua congregao. Aos poucos,
esses cantos se impuseram em todo o mundo protestante anglfono e
foram se expandindo pelo planeta.
Segundo Antonio Risrio (2007), em termos lingusticos, black religious
music e msica religiosa negra querem dizer a mesma coisa. Culturalmente,
porm, apontam para realidades distintas entre si. Quando falamos black
religious music, estamos nos referindo ao spiritual e ao gospel. Quando se
diz msica religiosa negra, a dimenso referencial outra. a msica sacra
africana, tal como executada nos terreiros de candombl na Bahia. A este
respeito cabe uma observao. A princpio porque a msica sacra de bantos, jejes e nags, alm de litrgica, funcional, pois serve para conduzir
ao transe, como o caso do canto no gospel. Para o autor, estas tradies
esttico-religiosas africanas atravessaram sculos e no somente o Atlntico,
como se costuma dizer:

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 133

Podemos falar da releitura da Bblia a partir de uma perspectiva negroescrava. Mas logo procedimentos de extrao africana vieram luz. No
canto, na dana, no transe. Nas palmas, na cadncia marcada com os
ps, nos movimentos corporais. Na veemncia expressiva do culto. Na
exaltao para lembrar a palavra cara a Du Bois. A hinologia evanglica
foi reinventada. O salmo protestante branco se transfigurou no spiritual.
A forma responsorial e reiterativa se imps. Os negros inundaram, com os
dons de seus sons, as casas de orao (RISRIO, 2007, p. 142).

O gospel esteve confinado nas igrejas por muito tempo, mas no incio dos anos 1980, as orquestras ditas crists, ajudaram a expandir as
igrejas independentes. Pouco a pouco, o gospel se afirmou como msica
popular ao lado da msica profana, se adaptando s exigncias comerciais num mundo onde o rdio se transformou em importante ferramenta
de difuso. Esta passagem foi igualmente facilitada pelo fato de que os
afro-americanos, seguindo os africanos, nunca separaram o espiritual do
temporal. Prova disto que cantos de trabalho (labor songs) e de festas
tradicionais sempre se misturaram e se nutriram mutuamente.
Para Magali Cunha, a msica gospel msica de consumo, produto industrial, de qualidade meldica e potica passvel de crticas, pois
visa sastifao das demandas do mercado fonogrfico, mas tambm
consitui um alvio das tenses do cotidiano dos evanglicos. Alm disso,
pronuncia um discurso que tem embutidos traos componentes da matriz
religiosa brasileira, o que lhe permite extensas possibilidades de uma resposta positiva (CUNHA, 2007, pp. 199-200). Hoje, o gospel cantado
tanto em lugares de culto quanto no palco. Durante o perodo da minha
pesquisa, pude observar a performance do msico Nengo Vieira nos dois
ambientes, no sagrado e no profano, no espao do culto e em shows,
em eventos evanglicos e tambm seculares. Segue abaixo um trecho da
anotao de caderneta de campo, feita durante observao no culto de
domingo na Bola de Neve Church do Guaruj/SP:
O culto hoje se inicia s 19h30min, pontualmente. A noite est fria e
chove, mesmo assim a igreja est relativamente cheia. O lder da igreja,
Pastor Eric, que acaba de chegar de So Paulo, onde esteve no Congresso
de Batalha Espiritual, ministra o culto essa noite. Casado com a pastora
134 l Brbara Falcn

Suzana, com quem tem duas filhas, aparenta estar na faixa dos trinta
anos. De volta igreja, tambm o dicono Nengo Vieira, que comanda
a banda que est no altar, formada pelos mesmos integrantes do culto de
quinta-feira [um deles seu enteado Felipe, que toca bateria]. Como j
observado em outras ocasies, a msica assume um papel fundamental
no culto, tendo reservado um espao de pouco mais de uma hora. Dentre
os cnticos entoados, o reggae Caia Babilnia, que fala de algo como
destruir a Babilnia dentro de ns mesmos; e outra vez, Paraso [verso
de Nengo Vieira para Pimpers Paradise de Bob Marley, tambm tocada
no culto da quinta (Caderneta de Campo, Guaruj/SP, 05/08/2007).

Magali Cunha aponta pelo menos trs contribuies do gospel na


prtica musical. A valorizao e a insero na liturgia de uma variedade
de ritmos populares; a valorizao da expresso corporal na liturgia, tanto na forma de coreografias quanto de gestual; a facilidade de acesso a
uma variedade de composies e gneros musicais por meio da ampla
produo fonogrfica e sua comercializao (CUNHA, 2007, p. 200).
Durante outra observao, na Bola de Neve de Salvador, pude participar
do evento Balada do Rei, que reuniu apresentaes de Nengo Vieira e da
banda local Primcias Roots. Aberto ao pblico, que pagou o valor de dez
reais pelo ingresso e mais um quilo de alimento (para ser doado a obras
assistenciais), o evento contou com a presena de aproximadamente 300
pessoas, algumas evanglicas, outras no. Durante as apresentaes foram registrados alguns momentos da banda no altar e do pblico na audincia, nos dois pisos da igreja. Estes registros denotam a recepo por
parte do pblico da mensagem pretendida pelo artista, que nesse caso
ocupa um espao sagrado um altar que lhe investe de autoridade
para sermes.
Interessante observar que a relao entre msica e religio nunca foi
tranquila para os regueiros de Cachoeira, chegando inclusive a causar
conflitos em alguns deles por terem que negar suas tradies. Conforme
dito anteriormente, o msico Geraldo Cristal pode ser considerado como
um exemplo desta questo e, alm dele, Quinho, baterista da extinta Remanescentes. O depoimento de Vitor Hugo, que trabalhou por um tempo
com ambos, d uma ideia de como ocorre esse processo:

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 135

L em Cachoeira ainda tem outra coisa, que no sei se interessante pra


voc falar das pessoas que eram do candombl e ficaram em crise. Cristal,
por exemplo, um cara que ele tem os dois lados. Teve uma poca de
negar as tradies, negar a religio e por isso negar as tradies. Quinho
[baterista da Remanescentes] tambm teve esse problema. Porque eram
pessoas que tinham teoricamente um grande futuro dentro do candombl e, de certa forma, negaram isso. Cristal, por exemplo, tem a religio
dele, mas ele tem que negar a religio, sem negar a tradio. Porque se
ele tentar valorizar a tradio, ele tem que valorizar o candombl, a se
condena no lado evanglico ou rasta. Se voc for investigar, a Bahia o
nico lugar que tem rasta cristo, rasta que prega Jesus Cristo. Ento h
esse conflito. Mas esse conflito mostrado diretamente na msica. Voc
v que a msica de Cristal, por exemplo, as msicas mais antigas dele
no tm influncia nenhuma de candombl na msica. E Cristal quando
comeou a aceitar mais a histria da tradio comeou a incorporar os
elementos do candombl. O discurso continua o mesmo, porque a coisa
que a gente mais percebe. Pra msica explcito, n? De voc encaixar
um elemento de candombl dentro da msica ligado diretamente
aceitao ou no do candombl na vida, n? E isso entra em contradio
com o reggae (Vitor Hugo, entrevista em 10/04/2007).

Em confluncia com o que foi dito por Vitor Hugo, temos um trecho
do depoimento de Geraldo Cristal, que lana mo de uma metfora bblica para tentar traduzir os elementos que compem sua msica:
Ento, reggae unidade, reggae transformao de comportamento,
renovao de sentimento, a luta pela libertao do povo africano e consequentemente de todos os povos que vieram da frica, porque o homem
branco tambm veio da frica e ns somos todos descendentes de No.
No teve dois filhos, Cam e Jaf, e o povo de Jaf o povo hoje, os caucasianos, pra no dizer brancos, porque disseram que so brancos apenas
pra afirmar superioridade, porque branco tudo que limpo, tudo que
puro, e negro tudo que ruim. Ento, nos chamaram de negros e disseram que eram brancos e hoje em dia t essa separao. E hoje o reggae
vem desmistificar essas coisas, entre ns mesmo no conseguimos resolver essas questes, porque a mentalidade colonial, a mentalidade dia-

136 l Brbara Falcn

blica ainda muito forte no nosso povo, no nosso subconsciente e no


deixa que a gente realmente se converta e se cure, com nosso corao
endurecido. Mas ns estamos a, antes da fundao do mundo, estamos
resistindo, mesmo que tateando no escuro, mas estamos construindo uma
histria. Eu espero que as pessoas que estejam prontas ou no pra entender essa histria compreendam a nossa luta e faam por elas mesmas,
no esperem que ns faamos, porque a parte que ns fazemos, compete
a ns. S isso (Geraldo Cristal, entrevista em 28/11/2007).

O msico Joo Teoria, ex-Remanescentes e que tambm j foi evanglico, atualmente atua em trabalhos com forte influncia do candombl,
tanto como msico de Carlinhos Brown quanto como membro da orquestra baiana Rumpilezz, que traz no prprio nome uma referncia aos
tambores que conduzem ao transe nos terreiros. Mais uma vez, temos a
msica como o principal elemento de articulao entre estilos de vida
diferentes, onde suas representaes expressam elementos de diferentes
vises de mundo, modos de viver e pensar; passando por concepes
polticas, tnicas e religiosas (CUNHA, 2003, p. 121).
No caso em estudo, temos ainda a msica como elemento aglutinador de diferentes tradies, permeada de informaes que nem sempre
so percebidas ou sentidas, mas que, de uma forma ou de outra, refletem o desejo inconsciente de determinadas formas de expresso. O
processo das recentes transformaes no campo religioso serviu como
pano de fundo para a insero do gnero reggae, que assume uma nova
configurao, no apenas como movimento musical, mas tambm como
um novo modo de vida religioso. Em suma, o etipiopianismo militante
(GILROY, 2007, p. 160) dos rastas jamaicanos foi refeito no reggae de
Cachoeira, que foi sendo concebido dentro de um sistema de pensamento messinico-cristo, tornanado-o diferente do reggae feito em Salvador
e em outros lugares do Brasil.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 137

NOTAS
33

O Anexo I traz uma cronologia das bandas de reggae de Cachoeira.

A banda Fogo Baiano alcanou um relativo sucesso com a lambada


Vem Ver (verso de Yo Vouai Ou), gravada no disco Fogo Baiano
(1990), lanado pela Polydor.
34

O cantor, compositor e trombonista Gernimo baiano da Ilha de


Bom Jesus dos Pobres, teve formao ecltica e comeou tocando trompa e trompete na Filarmnica da ilha e percusso no trio eltrico de
Dod e Osmar. Para saber mais sobre Gernimo, acessar: http://www.
cliquemusic.com.br/artistas/geronimo.asp.
35

Ver algumas letras do albm no Anexo II, identificadas com os nmeros 48, 61, 85, 89, 122, 136 e 137.
36

Joo Teoria teve sua formao musical em uma filarmnica da cidade


de Muritiba. Com apenas 17 anos j fazia parte do Remanescentes, onde
iniciou sua carreira se destacando como trumpetista. Atualmente membro da orquestra Rumpilezz (www.myspace.com/rumpilezz) e da banda
de Carlinhos Brown (www.myspace.com/carlinhosbrown).
37

Ver no Anexo II algumas dessas letras identificadas com os nmeros


52, 72, 73, 85, 89, 95 e 97.

38 e 39

40

Chico Evangelista & Jorge Alfredo. Bahia Jamaica. Copacabana, 1980.

41, 42 e 43

Ver letras dos discos citados no Anexo II.

Usando um termo criado por Antonio Godi em: GODI, Antonio J. V.


dos Santos. Reggae e Samba-reggae in Bahia. A Case of Long Distance
Belonging. In: PERRONE, Charles & DUNN, Christopher (eds.). Brazilian
Popular Music & Globalization. Florida: University Press of Florida, 2001.
44

Por conta da repercusso do caso, Sine Calmon chegou e ser entrevistado no programa de J Soares, transmitido em todo o territrio nacional
pela emissora de televiso Rede Globo.
45

138 l Brbara Falcn

Segundo o site A Tarde On Line, Sine Calmon foi o vencedor do Trofu Dod e Osmar, na categoria Msica mais Executada, numa escolha da audincia. Ver no Anexo II a letra identificada com o nmero 44.

46

47

Para saber mais sobre a Bola de Neve Church acessar: www.boladeneve.com.

O msico Lzaro Silva bastante requisitado para shows no meio


evanglico, muito por conta do seu hit Eu sou de Jesus, verso para
I miss Her do Olodum.
48

49

No Anexo II, ver as letras identificadas com os nmeros 126, 150 e 153.

50

Para saber mais sobre, acessar: www.christafari.com.

Para ter uma amostra dos temas tratados, ver no Anexo II as letras
de Origens, Pelo Amor de Deus e Zenaide, identificadas com os
nmeros 83, 85 e 86.
51

O nico cachoeirano que continua se apresentando na Feira do Porto


Sine Calmon. Os demais alegam que o cach oferecido pela prefeitura no
coerente com o valor que eles costumam cobrar por uma apresentao ou
que no so convidados.
52

A esposa de Vieira, Valria Leite, e suas filhas, Ester e Sintique, atuam


como backing vocals em sua banda e seu enteado, Felipe Moreno, seu
baterista h dez anos.
53

54

Rosa de Saron um dos nomes atribudos a Jesus Cristo.

55

Ver letra na ntegra no Anexo II, identificada com o nmero 76.

56

Ver letra na ntegra no Anexo II, identificada com o nmero 126.

57

O disco inclui ainda uma verso dub dessa faixa.

58

No Anexo II, ver letras identificadas com os nmeros 124, 127, 128 e 129.

O site www.sonsdabahia.wordpress.com contm as capas dos lbuns


mencionados no texto.
59

60

No Anexo II, ver a letra de A Sacizeiro, identificada com o nmero 166.

No Anexo II, ver as letras de God Bless e John Tree, identificadas


com os nmeros 150 e 153.
61

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 139

CONSIDERAES FINAIS
Se canto reggae/
Que nos deixa leve/
Pra suportar toda situao
Pelo Amor de Deus, Nengo Vieira

Reggae msica essncia/


Reggae plena conscincia
Reggaessncia, Rogrio Gaspar e Geraldo Cristal

A produo intelectual em torno do debate sobre msica e identidade na Bahia vem se tornando considervel nos ltimos anos. Dos
tempos da minha graduao, em 2001, para c, j se passou mais
de uma dcada e muito coisa mudou. Lembro-me quo alentador
foi receber em mos livros como Carnaval Ijex (1981), de Antonio
Risrio e Ritmos em Trnsito: Scio-Antropologia da Msica Baiana, organizado pelos pesquisadores Joclio Teles dos Santos e Livio
Sansone (1997). A partir destas leituras tive a certeza de que poderia
me enveredar naquele caminho como pesquisadora e contribuir de
alguma forma para que outras pessoas seguissem nesta trilha.
O estudo aqui apresentado uma tentativa de compreender discursos contidos no repertrio de um grupo de msicos que foi fundamental para a instaurao, circulao e renovao do reggae no
estado da Bahia e, consequentemente, no Brasil. A pretenso deste
trabalho foi, justamente, de chamar ateno para a importncia da
obra destes indivduos, enquanto objeto de estudo, reunindo material que poder servir de estmulo para que outros pesquisadores lancem novas abordagens sobre o reggae cachoeirano. Sob as
lentes das Cincias Humanas, o tema ainda merece uma anlise
aprofundada sobre diferentes aspectos estticos, tnicos, polticos e
religiosos.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 141

A pesquisa que ora apresento traz um panorama geral do cenrio regueiro de Cachoeira, focado nas entrevistas realizadas e nas composies
de um grupo de artistas. Os discursos contidos nas letras e as melodias
produzidas a partir do referencial do reggae e sua linguagem potico-poltica atestam que atravs da conexo musical estabelecida com o universo
jamaicano, msicos cachoeiranos constituram diferentes vises de mundo,
que possibilitaram tambm estratgias de sobrevivncia. O contedo de
suas obras revela processos de afirmao de identidades, onde a msica
se destaca pela importncia na intermediao das relaes tnico-sociais,
e que, justamente por isto, encontra eco na juventude negra.
A pluralidade desses discursos denota conexes entre tradies locais e
influncias globais que chegam a desafiar nossa compreenso, principalmente
se forem examinadas dentro de uma interpretao exclusivamente religiosa.
J na primeira audio dos discos estudados revela-se a existncia de uma
relao intrseca entre a experincia religiosa dos msicos e suas composies.
importante frisar que esta pesquisa no pretendeu analisar tal relao, que
por si s mereceria um estudo detalhado. O texto de Cunha (1993) sobre
rastas, reggae e pentecostais em Salvador uma fonte referencial para quem
pretende faz-lo. Outra boa fonte, a tese de Danilo Rabelo (2006), traz uma excelente abordagem sobre a cultura Rastafri e suas relaes com a sociedade
jamaicana, sem deixar de abordar o papel do reggae nesta cultura.
A anlise da produo cultural em torno dos artistas pesquisados pode
contribuir tambm com os estudos de identidade na dispora, lanando uma
luz sob o funcionamento de circuitos complexos, que possibilitaram a transformao de determinados padres atravs de uma rede que liga pontos em
comum, em diferentes partes do planeta. Com o reggae, um gnero transnacional, estes indivduos puderam experimentar laos de solidariedade e identificao com uma cultura distante, mas ao mesmo tempo prxima, numa viagem com escalas conflitantes entre similaridades e subjetividades. No caso
em estudo, a msica foi o elemento aglutinador e veculo de comunicao que
possibilitou uma produo alternativa de conhecimento e a insero de seus
produtos culturais em uma sociedade, muitas vezes, segregacionista.
Stuart Hall apresenta um ponto de vista esclarecedor sobre essa dinmica de transformao da cultura e seu impacto quando para o uso
142 l Brbara Falcn

e difuso de ideologias. Ele chama ateno para a necessidade de se


entender o duplo movimento da cultura popular, pois esta envolve um
processo dialtico de conteno e resistncia. Para ele a identidade cultural no possui uma origem fixa qual podemos fazer um retorno final
e absoluto. [...]. Tem suas histrias e as histrias, por sua vez, tm
seus efeitos reais, materiais simblicos. O passado continua a nos falar
(HALL, 1996, p. 70). Em Hall, identidades culturais so pontos de identificao instveis, feitos no interior dos discursos da cultura e da histria.
No uma essncia, mas um posicionamento.
O caso em estudo demonstra a factualidade do pensamento de Stuart
Hall. Em Cachoeira, o reggae foi transformado dentro de um contexto local permeado de africanidades, possibilitando que indivduos exercessem
e/ou exercitassem cidadania, negritude, religiosidade e, principalmente,
expressassem tudo isso atravs das suas musicalidades. Neste sentido,
concordo com Paul Gilroy, quando ele afirma que a msica e as prticas
musicais e sociais de origem africana na dispora negra so portadoras
de um mundo melhor (GILROY, 1987, p. 39). Entendo a produo dos
regueiros cachoeiranos como uma expresso do esforo de reconstruo identitria, onde os intercursos tnicos e as negociaes transculturais possibilitaram a reinveno de um ritmo que, pela sua circulao e
absoro, tornou-se transnacional.
Atravs da adoo de signos e padres estticos diaspricos, estes
msicos puderam experimentar identidades e sentimentos de pertena,
que foram sendo remodelados conforme sugere, mais uma vez, o socilogo jamaicano Stuart Hall:
A experincia da dispora, como aqui a pretendo, no definida por pureza ou essncia, mas pelo reconhecimento de uma diversidade e heterogeneidade necessrias; por uma concepo de identidade que vive com
e atravs, no a despeito da diferena; por hibridizao. Identidades de
dispora so as que esto constantemente produzindo-se e reproduzindose novas, atravs da transformao e da diferena (HALL, 1996, p. 75).

A presena de traos de diferentes culturas identificados no discurso


das obras em anlise pode ser um indicativo desta hibridizao de que
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 143

fala Hall. Devemos levar em conta tambm que estamos tratando de


uma cidade que, em termos populacionais, uma das mais negras do
Brasil. Importante lembrar aqui que, apesar de estar h sculos submetida ao sistema das elites dominantes, a cultura negra, em Cachoeira, se
aninhou, refez e recomps de forma a legar a sucessivas geraes suas
estruturas culturais dinmicas.
Assim, a heterogeneidade cultural vivenciada no Recncavo possibilitou diferentes experincias, permitindo aos personagens entrevistados
uma srie de releituras coletivas e individuais que foram reproduzindo
e transformando referenciais estticos, tnicos, religiosos e polticos. A
msica, no caso, foi a mola mestra, em todos os sentidos, pois alm
de ter aproximado estes jovens que queriam e tinham algo a dizer para a
sociedade, foi a linguagem escolhida para que expressassem dor, indignao, tolerncia, amor, devoo, f e muito mais. As capas dos discos,
as fotografias destes artistas, seus prprios corpos e cabelos so, neste
caso, intervenes que podem transmitir/comunicar/expressar, servindo
tambm como espao de afirmao da diferena e mostrando que a cultura reggae alm de musical muito visual.
Um ponto de resistncia anti-colonial, um porto afro do Atlntico,
um n na rede que se teceu na dispora. Por tudo que foi apresentado,
Cachoeira pode ser considerada um celeiro do reggae na Bahia, tendo
nos trabalhos dos filhos da terra a expresso mxima de identificao,
absoro e renovao desta contracultura musical, que segue sendo interpretada e reinterpretada constantemente.

144 l Brbara Falcn

REFERNCIAS
BIBLIOGRFICAS
ALMEIDA, Armando. A Contracultura e a Reafricanizao Recente na Bahia. Salvador: Mimeografado, s. d.
BACELAR, Jeferson. Etnicidade: Ser Negro em Salvador. Salvador: Ianam, 1989.
________. Impacto no Corao do Racismo. Jornal A Tarde, Salvador,
08/05/1999.
________ & CAROSO, Carlos (orgs.). Brasil: Um Pas de Negros? Rio de Janeiro:
Pallas; Salvador: CEAO, 1999.
BAUMAN, Zigmunt. Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2005.
BARROW, Steven. The History of Jamaican Music. London: Mango, 1993.
BERND, Zil. O que Negritude. So Paulo, Editora Brasiliense, 1989.
BHABHA, Homi. O Local da Cultura. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1998.
BLACKWELL, Chris. Preface. In: The History of Jamaican Music. London:
Mango, 1993.
BRAGA, Julia & CARVALHO, Caroline. A Msica Tropical tem Incio no Ano que
no Acabou. In: Revista Ecltica. N 26. Rio de Janeiro: PUC, Jan/ Jun 2008.
BRIGHAM, Ciro. Canto Sagrado. Correio da Bahia, Salvador, 26/03/2006.
CARVALHO, Jos Jorge de. The Multiplicity of Black Identities in Brazilian Popular Music. Srie Antropologia. N 163. Braslia: UNB, 1994b.
________. O Quilombo do Rio das Rs: Histrias, Tradies, Lutas. Salvador: EDUFBA, 1995.
________. Transformaes da Sensibilidade Musical Contempornea. Srie
Antropologia. N 266. Braslia: UNB, 1999.
________. Um Panorama da Msica Afro-Brasileira. Dos Gneros Tradicionais
aos Primrdios do Samba. Srie Antropologia. Braslia: UNB, 2000.
CHANG, Kevin O Brien & CHEN, Wayne. Reggae Routes: The History of
Jamaican Music. Philadelphia Temple University Press, 1998.
CUNHA, Magali do Nascimento. A Exploso Gospel. Um olhar das Cincias Humanas sobre o Cenrio Evanglico no Brasil. So Paulo: Editora Mauad/
Instituto MYSTERIUM, 2007.
CUNHA, Olivia Gomes da. Fazendo a Coisa Certa: Rastas, Reggae e Pentecostais em Salvador. Revista Brasileira de Cincias Sociais. N 23. So Paulo:
out. 1993, pp. 120-137.
DEBRET, Jean-Baptiste. Viagem Pitoresca e Histrica ao Brasil. Belo Horizonte:
Itatiaia/ So Paulo: EDUSP, 1978.
FALCN, Gustavo. Um Guia para o Conhecimento. In: ROCHA, Ndia Maria
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 145

Dourado. Cachoeira e Cachoeiranos: Uma Bibliografia. Cachoeira: Centro


Cultural Joo Antonio Santana, 2001.
FALCN, Maria Brbara Vieira. O Reggae no Recncavo Baiano. Remanescentes do
Paraguau. Msica e Identidade Cultural em Cachoeira. Monografia de Concluso de Curso. Salvador: FFCH/UFBA/ Departamento de Antropologia, 2002.
_________. O Reggae de Cachoeira: Produo Musical em um Porto Atlntico. Dissertao de Mestrado. Salvador: FFCH/UFBA/CEAO, 2009.
FOLHA DO REGGAE. N 02. Salvador, 1997.
GILROY, Paul. O Atlntico Negro. Modernidade e Dupla Conscincia. So Paulo:
Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Candido Mendes, Centro Cultural de Estudos Afro-Asiticos, 2001.
_________. Entre Campos: Naes, Cultura e o Fascnio da Raa. So Paulo: Annablume, 2007.
_________. There arent no Black in the Union Jack: The Cultural Politics of Race
and Nation. Londres: Hutchinson, 1987.
GODI, Antonio J. V. dos Santos. Reggae e Samba Reggae in Bahia. A Case of Long
Distance Belonging. In: PERRONE, Charles & DUNN, Christopher (eds.). Brazilian Popular Music & Globalization. Florida: University Press of Florida, 2001.
GOMES, Tiago de Melo. Para alm da Casa da Tia Ciata: Outras Experincias
no Universo Cultural Carioca. Revista Afro-sia. Nmero 29/30. Salvador: UFBA/CEAO, 2003, pp. 175-198.
GONALVES, Nelson Maca. Preto Tipo A e Neguinho: de Mussum a Mano
Brown. In: A Tarde. Salvador, 08/05/1999, p. 4, Caderno Cultural.
GUERREIRO, Goli. Um Mapa em Preto e Branco das Msicas na Bahia: Territorializao e Mestiagem no Meio Musical de Salvador (1987-1997). In:
SANSONE, Livio & SANTOS, Joclio Teles dos (orgs.). Ritmos em Trnsito:
Scio-Antropologia da Msica Baiana. So Paulo: Dynamis Editora, 1997.
_________. A Trama dos Tambores: A msica Afro-Pop de Salvador. So Paulo:
Editora 34, 2000.
_________. O Drible do Candeal: O Contexto Sociomusical de uma Comunidade
Afro-brasileira. Revista Afro-sia. N 33. Salvador, 2005, pp. 207-248.
_________. A Rede Atlntica como Espao de Produo Cultural. Salvador: Universidade Federal da Bahia. Texto apresentado no II Encontro de Estudos
Multidisciplinares em Cultura. Salvador: ENECULT, 2006.
HALL, Stuart. Identidade Cultural e Dispora. Revista do Patrimnio Histrico e
Artstico Nacional. N 24. Rio de Janeiro, 1996, pp. 68-74.
_________. A Identidade Cultural na Ps-modernidade. Traduo: Tomaz Tadeu
da Silva & Guacira Lopes Lauro. 7 edio. Rio de Janeiro: DP & A, 2002
(Coleo Identidade e Cultura na Ps-Modernidade).
_________. Da Dispora: Identidades e Mediaes Culturais. Belo Horizonte, Braslia: UFMG, UNESCO, 2003.
146 l Brbara Falcn

HOBSBAWN, Eric J. A Inveno das Tradies. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
_________. Histria Social do Jazz. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990,4 edio.
HUSS, Hasse. The Zink Fence Thing: When will Reggae Album Covers be
allowed out of the Ghetto?. Black Music Research Journal, 1998.
JACON, Adriana. Matriarca do Samba. Correio da Bahia. Caderno Reprter.
Salvador, 03/12/2006.
JOHNSON, Linton Kwesi. Introduction. In: The History of Jamaican Music.
London: Mango, 1993.
LHNING, Angela. Msica: O Corao do Candombl. Revista USP. N 7.
So Paulo: USP, 1990, pp. 97-117.
_________. Msica no Candombl da Bahia: Cnticos para Danar. Curitiba:
Anais do IV Simpsio de Musicologia Latino-America, 2000.
LYRIO, Alexandre. Black in Bahia. Corrreio da Bahia. Salvador, 29/05/2007.
MARQUES, Francisca. Educao Comunitria como Prtica de Etnomusicologia
Aplicada: Reflexes sobre uma Experincia no Recncavo Baiano. Revista
USP. N 78. So Paulo: USP, junho/julho/agosto/2008, pp. 130-138.
MATORY, J. Lorand. Jeje: Repensando Naes e Transnacionalismo. In: Revista
Mana 5 (1). Rio de Janeiro: Museu Nacional, UFRJ, 1999, pp. 57-80.
MELUCCI, Albert. The Post-modern Revival of Ethinicity. In: HUTCHINSON, J. &
SMITH, A. D. Ethnicity. Oxford: Oxford University Press, 1996, pp. 367-370.
MOTA, Fabrcio dos Santos. Guerreir@s do Terceiro Mundo: Identidades Negras
na Msica Reggae da Bahia (anos 80/90). Dissertao de Mestrado. Salvador: FFCH/ CEAO/ UFBA, 2008.
MOURA, Roberto. Tia Ciata e a Pequena frica no Rio de Janeiro. 2 Edio.
Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, Dep. Geral de Doc. e Inf.
Cultural, Diviso de Editorao, 1995.
NASCIMENTO, Luiz Cludio Dias do. A Capela dAjuda j deu Sinal: Relaes de
Poder e Religiosidade em Cachoeira. Salvador: UFBA/ CEAO, 1995.
_________. Presena do Candombl na Irmandade da Boa Morte - Uma Investigao Etnogrfica Sobre Ritos Morturios e Religiosidade Afro-Baiana. Mimeografado, 2002.
PARS, Luis Nicolau. A Formao do Candombl: Histria e Ritual da Nao Jeje
na Bahia. So Paulo: Editora Unicamp, 2006.
PATTERSON, Orlando. Global Culture and the American Cosmos. In: The

Andy Warhol Foundation for the Visual Arts: Paper Series on the Arts,
Culture and Society. Paper Number 2, 1994.

PINHO, Osmundo de Arajo. Fogo na Babilnia: Reggae, Black Counterculture


and Globalization in Brazil. In: PERRONE, Charles A. & DUNN, Christopher (eds.). Brazilian Popular Music & Globalization. Florida: University
Press of Florida, 2001.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 147

PINTO, Tiago de Oliveira de. As Cores do Som. Estruturas Sonoras e Concepo Esttica na Msica Afro-brasileira. Revista frica. N 22-23. So
Paulo: USP, 1999, pp. 87-110.
RABELO, Danilo. Rastafari: Identidade e Hibridismo Cultural na Jamaica (19301981). Tese de Doutorado. Braslia: UNB, 2006.
REIS, Joo Jos. Rebelio Escrava no Brasil: A Histria do Levante dos Mals.
So Paulo: Brasiliense, 1986.
_________. Recncavo Rebelde: Revoltas Escravas nos Engenhos Baianos. Revista Afro-sia. N 15. Salvador: UFBA/ CEAO, 1990, pp. 100-126.
_________. Identidade e Diversidade tnicas nas Irmandades Negras no Tempo da
Escravido. Revista Tempo. Vol. 2. N 03. Rio de Janeiro: 1996, pp. 7-33.
REIS, Joo Jos & SILVA, Eduardo. Negociao e Conflito: A Resistncia Negra
no Brasil Escravista. So Paulo: Companhia das Letras, 2005.
REVISTA VEJA. 22/01/1997, p. 32.
RISRIO, Antonio. Carnaval Ijex. Salvador: Corrupio, 1981.
_________. A Utopia Brasileira e Os Movimentos Negros. So Paulo: Editora 43,
2007.
ROCHA, Ndia Maria Dourado. Cachoeira e Cachoeiranos: Uma Bibliografia.
Cachoeira: Centro Cultural Joo Antonio Santana, 2001.
SANDRONI, Carlos. Feitio Decente: Transformaes do Samba no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar/UFRJ, 2001.
_________ (org.). Samba de Roda do Recncavo Baiano. Braslia: IPHAN, 2006.
SANSONE, Livio. Funk Baiano: Uma Verso Local de um Fenmeno Global? In:
SANSONE, Livio & SANTOS, Joclio Teles dos (orgs.). Ritmos em Trnsito:
Scio-Antropologia da Msica Baiana. So Paulo: Dynamis Editora, 1997.
_________. Negritude Sem Etnicidade. O Local e o Global nas Relaes Raciais
e na Produo Cultural Negra do Brasil. Rio de Janeiro/ Salvador: Pallas/
EDUFBA, 2004.
_________. Os Objetos da Identidade Negra: Consumo, Mercantilizao, Globalizao e a Criao de Culturas Negras no Brasil. Revista Mana. Vol. 6.
N 01. Rio de Janeiro: UFRJ, 2000.
SANTOS, Joclio Teles dos. Divertimentos Estrondosos: Batuques e Sambas no
Sculo XIX. In: SANSONE, Livio & SANTOS, Joclio Teles dos (orgs.).
Ritmos em Trnsito: Scio-Antropologia da Msica Baiana. So Paulo:
Dynamis Editora, 1997.
SANTOS, Milton. Ser Negro no Brasil Hoje. Folha de So Paulo. Caderno
Mais! 07/05/2000.
SANTOS FILHO, Juvino Alves. Manuel Tranquillino Bastos: Estudo de Duas
Obras para Clarineta. Tese de Doutorado. Salvador: Programa de PsGraduao em Msica da Universidade Federal da Bahia, 2003.

148 l Brbara Falcn

SECULT. Catlogo Ouro Negro. Salvador: Secretaria de Cultura do Estado da


Bahia, 2009.
SILVA, Alberto da Costa. Um Rio chamado Atlntico. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2003.
SILVA, Carlos Benedito da. Da Terra das Primaveras Ilha do Amor. So Lus:
EDUFMA, 1995.
_________. Ritmos da Identidade: Mestiagem e Sincretismos na Cultura do Maranho. So Lus: EDUFMA, 2007.
SILVEIRA, Renato da. Etnicidade. In: RUBIM, Antonio Albino Canelas (org.).
Cultura e Atualidade. Salvador: EDUFBA, 2005.
SMITH, Anthony. The Ethinc Origins of Nations. Oxford: Blackwell Publishers, 1986.
SODR, Muniz. Claros e Escuros: Identidade, Povo e Mdia no Brasil. Petrpolis:
Vozes, 1999.
STOKLAND, Ellen. The Revolt of Drums. A Case Study of the Communication
Strategies of Olodum from Bahia, Brazil. Post-graduate Thesis in Media
Studies for the Cand. Polit. Degree University of Oslo, 2004.
TAGG, Philip. Black Music, Afro American Music and European Music. In:
Popular Music. 1989, pp. 285-298.
TAVARES, Luiz Henrique Dias. Independncia do Brasil na Bahia. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 1982.
VIANNA, Hermano. O Mistrio do Samba. Rio de Janeiro: Jorge Zahar; Editora
UFRJ, 2002.
_________. Filosofia do Dub. Folha de So Paulo, Caderno Mais!,
09/11/2003.

DIGITAIS
A TARDE ON LINE
Trofu Dod e Osmar. Disponvel em: http://info.atarde.com.br/trofeudodoeosmar/index.swf.
BANCO DE DADOS DA FOLHA DE SO PAULO
www1.folha.uol.com.br/folha/bd
BLANCO, Pablo Sotuyo. Joo Manoel Dantas: Pesquisa Biogrfica e Musical.
So Paulo: Anais do XVII Congresso da Anppom, UNESP, 2007. Disponvel em:
http://www.anppom.com.br/anais/anaiscongresso_anppom_2007/musicologia/
musicol_PSBlanco.pdf.
CONEXO JAMAICA
Y&M entrevista The Skatalites e te mostra trecho do pocket show em primeira mo.
Disponvel em: http://mtv.uol.com.br/jamaica/blog/yampm-entrevista-skatalites-ete-mostra-o-pocket-show-na-integra-em-primeira-m%C3%A3o.
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 149

CHRISTAFARI
www.christafari.com
ENCYCLOPEDIA OF MUSIC IN CANADA
Verbete: Jackie Mittoo. Disponvel em: <http://www.canadianencyclopedia.ca>.
FALCN, Gustavo. Boa Morte, uma Irmandade de Exaltao Vida! Aiy Orun.
Disponvel em: http://www.geocities.com/wellesley/4328/historico.htm.
GILBERTO GIL
www.gilbertogil.com.br
IGREJA BOLA DE NEVE
www.boladeneve.com
IL AIY
www.ileaiye.com.br
LAZZO MATUMBI
www.lazzo.com.br
MARQUES, Francisca. Identidade, sincretismo e msica na religiosidade brasileira. Disponvel em: http://www.naya.org.ar/congresso2002/ponencias/francisca_marques.htm.
MINISTRIO DAS RELAES EXTERIORES
Dados Bsicos e Principais Indicadores Econmicos-Comerciais da Jamaica.
Brasil, 2007. Disponvel em: http://www.braziltradenet.gov.br/IndicadoresEconomicos/INDJamaica.pdf.
MYSPACE
www.myspace.com/bandaqgimperial
www.myspace.com/buguinhadub
www.myspace.com/carlinhosbrown
www.myspace.com/dubstereosound
www.myspace.com/echosoundsystem
www.myspace.com/edsongomesofficial
www.myspace.com/interferenciasistemadesom
www.myspace.com/nengovieiraetribodabraao
www.myspace.com/madprofessor
www.myspace.com/ministereopublico
www.myspace.com/rumpilezz
www.myspace.com/ziontrain
PHILIP TAGG
www.tagg.org
PINHO, Osmundo. Etnografias do Brau: Corpo, Masculinidade e Raa na
Reafricanizao em Salvador. Estudos Feministas. Florianpolis, v. 1, Selected Edition 2006 . Available from <http://socialsciences.scielo.org/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0104026X2006000100001&lng=en&nrm=is
o>. Access on 02 June 2012.

150 l Brbara Falcn

REVISTA RITMO E MELODIA


www.ritmomelodia.mus.br
SELO BOLA MUSIC.
www.bolamusic.com.br
SOLOMON, Maynard. Biography. Grove Music Online. Laura Macy ed. Disponvel em: http://www.grovemusic.com.
SONS DO BRASIL
www.sonsdobrasil.org
TORTELLO, Rebecca. The People Who Came. The Arrival Of The Chinese. Disponvel em: http://www.jamaica-gleaner.com/pages/history/story0055.htm.
VIANNA, Hermano. Msica afro-americana um circuito intercontinental de tradies. Disponvel em: http://www1.uol.com.br/fol/brasil500/dc_7_3.htm.

DISCOGRFICAS
1. Reggae de Cachoeira
BROWN, Eddie. Eddie Brown. Paradoxx Music, 1998.
CALMON, Sine. Fogo na Babilnia. Atrao Fonogrfica, 1997.
CALMON, Sine. Rosa de Saron. Atrao Fonogrfica, 1999.
CALMON, Sine. Eu Vejo. Atrao Fonogrfica, 2001.
CALMON, Sine. Guerreiro Mor. Kaskatas, 2006.
CRISTAL, Geraldo. Reggaessncia. Independente, 2007.
GOMES, Edson. Reggae Resistncia. EMI Odeon, 1988.
GOMES, Edson. Recncavo. EMI Odeon, 1990.
GOMES, Edson. Campo de Batalha. EMI Odeon, 1991.
GOMES, Edson. Meus Momentos 1. EMI Odeon, 1994.
GOMES, Edson. Meus Momentos 2. EMI Odeon, 1994.
GOMES, Edson. Resgate Fatal. EMI Odeon, 1995.
GOMES, Edson. Apocalipse. EMI, 1998.
GOMES, Edson. Srie Bis (Coletnea/ Duplo). EMI, 1999.
GOMES, Edson. Preferncia Nacional (Coletnea). Copacabana, 1998.
GOMES, Edson. Para Sempre (Coletnea). EMI, 2001.
GOMES, Edson. Acorde, Levante, Lute. Atrao Fonogrfica, 2001.
GOMES, Edson. Srie Identidade (Coletnea). EMI, 2002.
GOMES, Edson. Samarina (Coletnea). EMI, 2003.
GOMES, Edson. Ao Vivo em Salvador (Duplo). Atrao Fonogrfica, 2006.
GOMES, Isaque. Negro Real. Independente, 2009.
GOMES, Tin Tim. Pedra sobre Pedras. Independente, 1999.
GOMES, Tin Tim. O Poo. Independente, 2008.
OLIVEIRA, Marco Oliveira. Dystoro. Independente, 2006.
REMANESCENTE. Semente do Amor. WR, 1993 (indito).
VIEIRA, Nengo. Somos Libertos. Atrao Fonogrfica, 1998.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 151

VIEIRA, Nengo. Mata Atlntica. Independente, 2001.


VIEIRA, Nengo. Ao Vivo. Independente, 2006.
VIEIRA, Nengo. Chama. Independente, 2006.
VIEIRA, Nengo. Avivamente. Selo Bola Music, 2007.
2. Outros Discos e Coletneas
ADO NEGRO. Ado Negro. Independente, 1998.
BOB MARLEY & THE WAILERS. Catch a Fire. Island Records, 1974.
BOB MARLEY & THE WAILERS. Exodus. Island Records, 1977.
BOB MARLEY & THE WAILERS. Kaya. Island Records, 1978.
BOB MARLEY & THE WAILERS. Survival. Island Records, 1979.
CARTAS MUSICAES. Manuel Tranquilino Bastos. Braskem Cultura e Arte, 2002.
CHICO EVANGELISTA & JORGE ALFREDO. Bahia Jamaica. Copacabana, 1980.
CIDADE NEGRA. Lute para Viver. Sony, 1991.
DIAMBA. Ningum est a Salvo. Independente, 2000.
DIONORINA. Msica das Ruas. Stalo Discos,1994
FOGO BAIANO. Fogo Baiano. Polydor, 1990.
GILBERTO GIL & JORGE BEN. Gil Jorge Ogum Xang. Universal, 1975.
JORGE DE ANGLICA. Sopa de Papelo. Independente, 1998
LAZZO. Viver, Amar e Sentir. Pointer Discos, 1983.
MANGO. The History of Jamaican Music. Mango, 1993.
O RAPPA. O Rappa. Warner, 1994.
OS TINCOS. O Africanto dos Tincos. RCA Victor, 1975.
OS TINCOS. Os Tincos. Som Livre, 1973.
OS TINCOS. Os Tincos. RCA Victor, 1977.
PLANET HEMP. Sony BMG, 1995.
PRINCE BUSTER. The Original Golden Oldies. Volume 01, 1963.
SKANK. Skank. Independente, 1992.
TERCEIRO MUNDO. Marley Vive. EMI Odeon, 1988.
TRIBO DE JAH. Roots Reggae. Indie Records, 1995.
TRIBO DE JAH. Reggae na Estrada. Indie Records, 1999.

VIDEOGRFICAS
1. Reggae de Cachoeira

Edson Gomes. Ao Vivo em Salvador-Bahia. Salvador, Atrao Musical, 2006.


Edson Gomes. Show na Noite da Beleza Negra. Salvador, TVE Bahia, 2006.
Nengo Vieira. Show no Projeto Msica no Parque. Salvador, TVE Bahia, 2006.
Nengo Vieira. Avivamente. So Paulo, Bola Music, 2009.
2. Outros Filmes e Documentrios

Afoxs Entre o Sagrado e o Mundano. Salvador: TVE, 2009.


Ado Negro: Ao Vivo na Repblica do Reggae. Atrao, 2005
Beat Street. Stan Lathan, 1984.
152 l Brbara Falcn

Dub Echoes. Bruno Natal, 2007.


Dub Stories. LHistoire Du Dub Raconte Par Ses Acitivistes. Nathalie Valet, 2006
Eu vi Boa Morte Sorri. Salvador: TVE, 1996.
Fela Kuti Music is the Weapon. Universal, 2004.
Heartland Reggae. Canada Offshore, 1980.
Land of Look Behind. Alan Greenberg, 1982.
Peter Tosh Stepping Razor: Red X. Canad: Cinemavault Releasing, 2002.
Recncavo na Palma da Mo. Salvador: TVE, 2002.
Rockers: Its Dangerous. Theodorus Bafaloukos, 1977.
Roots, Rock, Reggae: Inside the Jamaican Music Scene. Jeremy Marre, 1977.
Shottas. Sony Pictures, 2002.
Terceira Dispora. Canal Futura/Kabum!, 2009.
The History of Jamaican Music. Programme 1. Forward March. Srie BBC.
The History of Jamaican Music. Programme 2. Rebel Music. Srie BBC.
The History of Jamaican Music. Programme 3. As Raw as Ever. Srie BBC.
Wattstax. Stax Films/ Wolper Pictures, 1973.

ENTREVISTAS
1. Nengo Vieira. Entrevista concedida no Guaruj-SP, 10/jul/2007.
2. Wesley Rangel. Entrevista concedida em Salvador-BA, 07/jul/2007.
3. Marco Oliveira. Entrevista concedida em Salvador-BA, 22/nov/2007.
4. Geraldo Cristal. Entrevista concedida em Salvador-BA, 28/nov/2007.
5. Tin Tim Gomes. Entrevista concedida em So Flix-BA, 07/jun/2008.
6. Edson Gomes. Entrevista concedida em So Flix-BA, 10/jun/2008.
7. Vitor Hugo. Entrevista concedida em Salvador-BA, 10/abr/2007.
8. Srgio Cassiano. Entrevista concedida em Salvador-BA, 2002.
Outras Fontes
1. Bob Marley. Jornal do Brasil, 21/mar/1980.
2. Dom Fil. Correio da Bahia, 29/mai/2007.
3. Edson Gomes. Musical On-Line, 2006.
4. Gilberto Gil. Correio da Bahia, 26/mar/2006.
5. Lzaro Silva. Site Bola de Neve, 12/agos/2008.
6. Luiz Cludio Dias do Nascimento. Jornalismo Impresso, 24/agos/2008.
7. Nelson Triunfo. Correio da Bahia, 29/mai/2007.
8. Nengo Vieira. Ritmo Melodia, 02/nov/2007.
9. Raimundo Coutinho. Correio da Bahia, 29/mai/2007.
10. Vov do Il. Site Ibahia, 18/mar/2009.
11. Walter Fraga. A Tarde, 13/mai/2009.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 153

ANEXO I
CRONOLOGIA DO REGGAE
CACHOEIRANO

1982
STUDIO 5
1. FORMAO: Nengo Vieira (vocal/guitarra), Ruy de Brito (guitarra), Jair Soares
(bateria), Tinho Santana (contrabaixo).
DISCOS GRAVADOS: Viver Amar e
Sentir (LAZZO, 1983).
2. FORMAO: Nengo Vieira (vocal/guitarra), Ruy de Brito (guitarra), Jair Soares
(bateria), Alberto (contrabaixo).
3. FORMAO: Nengo Vieira (vocal/guitarra), Marco Oliveira (contrabaixo), Jair
Soares (bateria), Sine Calmon (guitarra),
Tin Tim Gomes (vocal), Valria Leite
(vocal).

1988
EDSON GOMES &
CO DE RAA
1. FORMAO: Nengo Vieira (guitarra),
Ruy de Brito (guitarra), Jair Soares
(bateria), Alberto (contrabaixo), Tin Tim
Gomes (vocal) e Amrica Branco (vocal).
Discos Gravados: Reggae Resistncia
(EDSON GOMES, 1988).
2. FORMAO: Nengo Vieira (guitarra),
Marco Oliveira (contrabaixo), Jair Soares
e Joo Teoria (bateria), Sine Calmon
(guitarra), Tin Tim Gomes (vocal).
DISCOS GRAVADOS: Recncavo
(EDSON GOMES, 1990) e Campo de
Batalha (EDSON GOMES, 1991).

154 l Brbara Falcn

OUTRAS FORMAES
DISCOS GRAVADOS: Resgate Fatal
(EDSON GOMES, 1995), Apocalipse
(EDSON GOMES, 1998), Acorde,
Levante, Lute (EDSON GOMES, 2001),
Ao Vivo (EDSON GOMES, 2006).
1989
REMANESCENTES
1. FORMAO: Nengo Vieira (vocal/
guitarra), Marco Oliveira (vocal/contrabaixo), Quinho (bateria), Sine Calmon
(vocal/guitarra), Tin Tim Gomes (vocal),
Valria Leite (vocal), Wilson Toror (percusso) e Joo Teoria (trompete).
DISCOS GRAVADOS: Semente do Amor
(REMANESCENTES, 1994).
2. FORMAO: Nengo Vieira (vocal/
guitarra), Vitor Hugo (guitarra), Csar
Napole (contrabaixo), Felipe Moreno (bateria), Tintim Gomes (vocal), Valria Leite
(vocal) e Joo Teoria (trompete).

1994
SO JAH
FORMAO: Sine Calmon (vocal/guitarra), Marco Oliveira (vocal/contrabaixo), Quinho (bateria) e Wilson Toror
(percusso).

1995
SINE CALMON & MORRO
FUMEGANTE
1. FORMAO: Sine Calmon (vocal/
guitarra), Vitor Hugo (contrabaixo), Raimundo Athade (bateria), Srgio Cassiano
(guitarra), Wilson Toror (percusso) e
Cristiane Calmon (vocal).
2. FORMAO: Sine Calmon (vocal/
guitarra), Vitor Hugo (contrabaixo),
Raimundo Athade (bateria), Kennedy
(guitarra), Artur Cardoso (teclados) e
Samurai (percusso).

3. FORMAO: Sine Calmon (vocal/


guitarra), Vitor Hugo (contrabaixo), Raimundo Athade (bateria), Milan Gordilho
(guitarra), Artur Cardoso (teclados),
Samurai (percusso), Kleber Thuck
(saxofone), Joo Teoria (trompete) e
Valria Leite (vocal).
DISCOS GRAVADOS: Fogo na Babilnia (SINE CALMON, 1997), Rosa
de Saron (SINE CALMON, 1999), Eu
Vejo (SINE CALMON, 2001) e Guerreiro Mor (SINE CALMON, 2006).
4. FORMAO: Sine Calmon (vocal/guitarra), Vitor Hugo (contrabaixo) e Marco
Oliveira (contrabaixo), tila Coutinho
(bateria), Tiago Dionei (teclados) e Naama Calmon (vocal).
1995
NENGO VIEIRA & UNO I
FORMAO: Nengo Vieira (vocal/guitarra),
Josivaldo (guitarra), Csar Napole (contrabaixo), Felipe Moreno (bateria), Valria
Leite (vocal), Augusto Junior (teclados) e
Joo Teoria (trompete).

Valria Leite (vocal), Sylvia Pacheco


(vocal), Augusto Junior (teclados) e Joo
Teoria (trompete).
Discos Gravados: Somos Libertos
(NENGO VIEIRA, 1998).
2. FORMAO: Nengo Vieira (vocal/
guitarra), Carlos (guitarra), Csar Napole
(contrabaixo), Felipe Moreno (bateria), Valria Leite (vocal), Ana Paula
Albuquerque (vocal), Augusto Junior
(teclados) e Marcos Jones (percusso).
Discos Gravados: Mata Atlntica (NENGO VIEIRA, 2001), Chama (NENGO
VIEIRA, 2006), Ao Vivo (NENGO
VIEIRA, 2006) e Avivamente
(NENGO VIEIRA, 2007).
3. FORMAO: Nengo Vieira (vocal/
guitarra), Carlos (guitarra), Csar Napole
(contrabaixo), Felipe Moreno (bateria),
Valria Leite (vocal), Ester Vieira (vocal),
Sintique Vieira (vocal), Augusto Junior
(teclados) e Marcos Jones (percusso).

1996
TIN TIM GOMES & MANASSS
1996
DYSTORO
1. FORMAO: Marco Oliveira (vocal/
contrabaixo), Ricardo Reina (vocal/guitarra), Eloy (guitarra) e Edna Oliveira (vocal/
teclado).
2. FORMAO: Marco Oliveira (vocal/
contrabaixo), Eloy (guitarra) e Edna
Oliveira (vocal/teclado).

Formao: Tin Tim Gomes (vocal), Bira


(bateria), Moiss (contrabaixo), Peto (guitarra), Alessi (guitarra), Sinval
(teclados), Vinicius (saxofone), Dinho
(trompete) e Tim (trombone).
Discos Gravados: Pedra sobre Pedras
(TIN TIM GOMES, 1999) e O Poo
(TIN TIM GOMES, 2008).

DISCOS GRAVADOS: Dystoro


(DYSTORO, 2006).

1996
NENGO VIEIRA & TRIBO
DABRAO
1. FORMAO: Nengo Vieira (vocal/guitarra), Josivaldo (guitarra), Csar Napole
(contrabaixo), Felipe Moreno (bateria),
O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 155

ANEXO II

1988
EDSON GOMES
REGGAE RESISTNCIA // VINIL // FITA
K7 // CD // EMI

ANTOLOGIA DO REGGAE
DE CACHOEIRA

1 Viu
(Edson Gomes)

O Anexo II traz uma antologia das composies gravadas pelos artistas cachoeiranos,
em ordem cronolgica, listadas pela autoria, nome do lbum, indicao dos meios
em que foram lanados e da gravadora
(ou se foi lanado de forma independente,
como o caso de alguns deles). As msicas
contidas neste anexo foram classificadas em
ordem crescente e identificadas no texto da
dissertao com a mesma numerao. Segue abaixo um ndice para facilitar a localizao das composies por discos.

Viu,vamo acabar com tanta violncia /


Viu,vamo acabar com toda essa dor /
Viu,vamo acabar com tanta sofrncia /
Viu,vamo acabar com toda essa tristeza
/ Todo mundo precisa de um lugar pra
morar / Todo mundo precisa de viver em
paz / Todo mundo precisa respirar o ar /
Todo mundo precisa se alimentar

REGGAE RESISTNCIA 154

E nasceu l na Jamaica/ Se expandiu pelo


mundo/ Mas Deus criador Jah / Mandou
chamar Marley/ Mas a gente que ficou no
vai deixar morrer/ A bela msica / A bela
msica Reggae

RECNCAVO 156
CAMPO DE BATALHA 157
RESGATE FATAL 159
FOGO NA BABILNIA 162
APOCALIPSE 164
SOMOS LIBERTOS 166
ROSA DE SARON 169
PEDRA SOBRE PEDRAS 171
EU VEJO 173
ACORDE. LEVANTE, LUTE 174
MATA ATLNTICA 180
CHAMA 182
GUERREIRO MOR 185
AVIVAMENTE 185
REGGAESSNCIA 187

156 l Brbara Falcn

2 Rastafary
(Edson Gomes)
Reggae msica/ Reggae som, beleza
pura/ Rastafary/ Reggae som, Bob
Marley

3 Samarina
(Edson Gomes)
Voc j pensou / Em minha situao?/
Imagine s como deve estar meu corao/
Por que no vem? / Diga logo, meu bem/
E se no vem/ Olha, no vou conseguir ser
nigum/ E a ento/ S vai me restar a solido/ E a ento/ Vai ficar to triste, o meu
corao/ E a ento/ Eu te peo, ah, no
me deixe nessa solido/ No me deixe,
no/ somente teu, meu corao/ Samarina/ Samarina linda, meu amor/ Samarina/
Onde quer que voc v, eu vou
4 Sistema do Vampiro
(Edson Gomes)
Esse sistema um vampiro/ Ah! O sistema
um vampiro/ Esse sistema um vampiro/
Todo povo ficou aflito/ Vive sugando todo
povo/ Vem c, meu Deus, desa de novo/
Oua meu grito de socorro/ Pai, escuta a
voz desse teu povo/ Que clama, um cente-

nrio de falsa libertao/ Cativeiro mental/


Estamos metidos nos buracos/ Estamos
jogados nas favelas da vida/ Pendurados
l no morro/ Velho pai, s nos resta teu
socorro/ Ah, sim! / Estamos largados nas
caladas/ Ns no temos nem morada/
No temos nada!
5 Malandrinha
(Edson Gomes)
H muito tempo que eu queria ter/ Um
grande amor como voc/ Que demorou
mas chegou / E minha vida se tranformou/
Todo tormento j passou/ Em minha vida
tudo amor/ No esperava que um dia/
Viesse ser feliz assim/ E nem sonhava que
um dia/ Voc viesse me querer assim/
Pois no havia chance alguma/ De um dia
voce ser minha/ Malandrinha estou na tua/
Estais na minha, malandrinha/ Malandra
minha/ Estou na tua/ Estais na minha,
malandrinha/ Malandra minha
6 Hereditrio
(Edson Gomes)
Era assim, era assim, sim, sim, sim/ No
nascer do dia meu pai ia l/ E na morte do
dia ele vinha/ Ele trazia sempre o suor no
rosto/ O corpo cansado e nada no bolso/
Era assim, era assim, sim, sim, sim/ Hoje
eu que saio/ Sou eu que trabalho/ Conheo a dureza/ De toda essa vida/ Pai de
famlia, pai de famlia/ Hoje assim, hoje
assim, sim, sim
7 Na Sombra da Noite
(Edson Gomes)
Na sombra da noite acontecem coisas/ Na
sombra da noite acontecem coisas
E quem madruga quem pode ver/ Quem
perambula quem pode ver/ Quem no tem
sono quem pode ver/ Certas coisas que
acontecem/ Bem, bem l em cima/ Bem,
bem l em cima/ E os caretas passam olhando/ s vezes passam censurando/ Vezes
passam se ligando/ T ligando, t ligando/
Bem, bem l em cima/ Bem, bem l em cima

8 Histria do Brasil
(Edson Gomes)
Eu vou contar pra vocs/ Certa histria do
Brasil/ Foi quando Cabral descobriu/ Este
pas tropical/ Um certo povo surgiu/ Vindo
de um certo lugar/ Forado a trabalhar
neste imenso pas/ E era o chicote no ar/
E era o chicote a estalar/ E era o chicote a
cortar/ Era o chicote a sangrar/ Um, dois,
trs, at hoje di/ Um, dois, trs, bateu
mais de uma vez/ Por isso que a gente
no tem vez/ Por isso que a gente sempre
est/ Do lado de fora/ Por isso que a gente sempre est/ L na cozinha/ Por isso
que a gente sempre est fazendo/ O papel
menor/ O papel menor/ O papel menor/
Ou o papel pior
9 Co de Raa
(Edson Gomes)
E mais uma vez o caso tornou-se um drama/ A seca est a e o povo bebendo lama/
Por culpa de tamanha incompreenso/
A seca arrasa, devora o serto/ Eles bem
sabem qual a maneira/ De exterminar
de uma vez com essa seca/ Enquanto eles
pensam o povo cumpre sua sina/ E vive
esperando a providncia divina/Agora todo
mundo quer opinar/ Palavras, palavras
so soltas no ar/ Promessas, promessas,
palavras perdidas/ O que o povo quer mesmo uma sada/ soluo/ Co de raa/
Co de raa
10 Leve Sensao
(I Shot the Sheriff, Bob Marley // Verso:
Edson Gomes)
Vai vai mudar, tudo isso vai mudar/ Vai vai
mudar, a gente vai se transformar/ Sempre
quando venho a rua, me assalta uma ideia/
Que vou encontrar uma dessas feras, bem
disposta a me golpear/ Uma leve sensao
que sempre me ocorre/ Eu sinto sempre
um par de olhos/ O tempo todo a me
vigiar/ Eu sinto sempre um par de olhos
o tempo todo a me vigiar/ Eles to a maquinar, esto armando armadilhas/ Esto
querendo me conquistar, esto querendo

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 157

me conquistar/ Sempre penso que sou sim,


que sou um intruso/
Que no fao parte desse mundo/ Eu no
fao parte desse mundo
Uma leve sensao que sempre me ocorre/
Eu sinto sempre um par de olhos/ O tempo
todo a me vigiar/ Eu sinto sempre um par
de olhos o tempo todo a me vigiar
1990
EDSON GOMES
RECNCAVO // VINIL // FITA K7 // CD
// EMI
11 Guerreiro do Terceiro Mundo
(Edson Gomes)
Surge mais um guerreiro do terceiro mundo/ Surge mais um guerreiro do terceiro
mundo/ Levantando suas armas/ Com seu
grito de alerta/ Pondo sua vida em jogo,
lutando pelo povo/ Que vive to desesperado/ Sem ter o que comer/ De manh,
tarde e noite/ Sem saber o que fazer/
Surge mais um guerreiro do terceiro mundo/ Surge mais um guerreiro do terceiro
mundo/ Levantando suas armas/ Com seu
grito de alerta/ Pondo sua vida em jogo,
lutando pelo povo/
Estamos enchendo as caladas/ Superlotando as prises/ As favelas no suportam
mais/ Tanta gente em aflio/ Surge mais
um guerreiro do terceiro mundo/ Surge
mais um guerreiro do terceiro mundo/
Levantando suas armas, com seu grito de
alerta/ Pondo sua vida em jogo, lutando
pelo povo/ Sei que vai chegar o dia/ Em
que tudo mudar, oh, Jah/ O alimento no
faltar jamais/ E a moradia sobrar/ Estamos enchendo as caladas/ Superlotando
as prises/ As favelas no suportam mais/
Tanta gente em aflio
12 Recncavo

livre/ Por uma frica liberta/ Por uma frica


unida/ E todo apoio a Nelson Mandela/
Pelo extermnio do Apartheid/ Sistema
nazista, sistema do diabo/ Somos a voz da
libertao/ Vamos luta avante/ Somos a
voz da libertao/ Vamos luta avante
13 Lili
(Edson Gomes)
Vamos amigo lute/ Vamos amigo lute/
Vamos amigo lute/ Vamos amigo ajude
seno/ A gente acaba perdendo o que j
conquistou/ A gente acaba perdendo o que
j conquistou/ Vamos levante lute/ Vamos
lavente ajude/ Vamos levante grite/ Vamos
levante agora/ Que a vida no parou/ A
vida no para aqui/ A luta no acabou/ E
nem acabar/ S quando a liberdade raiar/
S quando a liberdade raiar/ Liberdade/
Liberdade/ Teu povo clama lili/ Dona lili
14 Fala S de Amor
(Edson Gomes/ Nengo Vieira)
At mesmo um guerreiro/ Tem o seu
momento/ Pra falar do seu amor/ Do seu
sentimento/ E agora/ Fala s de amor/ Todo
mundo tem um amor/ Fala s de amor/
Todo mundo tem um amor/ Fala s de
amor/ Olha todo mundo tem um amor/ Fala
s de amor/ Eu tambm tenho o meu amor/
Por mais forte que seja o homem/ Sempre
chega o momento/ De cair diante de um
sentimento/ E agora/ Fala s de amor/ Todo
mundo tem um amor/ Fala s de amor/
Sei que a gua, a gua mole/ E a pedra
dura/ Eu sei que a gua, gua mole/ E
a pedra dura/ Mas j fala o ditado/ Tanto
bate at que fura/ Fala s de amor/ Todo
mundo tem um amor/ Fala s de amor/
Olha todo mundo tem um amor/ Fala s de
amor/ Eu tambm tenho o meu amor/ Fala,
fala nego/ Todo o dia o negro fala/ Chora,
chora nego/ Todo o dia o negro chora

(Edson Gomes)

15 Filho da Terra

Recncavo/ Pela libertao do homem


negro na Amrica/ E pelo repdio do
homem branco na frica/ Vamos lutar pela
libertao/ Vamos lutar/ Avante irmo/ Vamos lutar pela libertao/ Por uma frica

Naturalmente/ Eu transo a mente, o corpo,


o esprito/ Eu transo a mente, o corpo, o
esprito/ Venha comigo/ Transar a mente,
o corpo, o esprito/ Transar a mente, o

158 l Brbara Falcn

(Edson Gomes)

corpo, o esprito/ E ser/ Natural/ Filho da


terra/ Natural/ Filho da terra/ Mas voc
resiste/ Algum te agride/ Algum torce, a
trilha, agora, hora/ hora de ir, embora,
agora, hora/ hora de ir, a trilha, agora,
/ hora de ir, oh children/ No existe cor/
S voc sabe que no existe cor no/ No
existe cor/
S voc sabe que no existe cor no/ No
existe, ah
16 Capturados
(Edson Gomes)
Somos filhos dos escravos/ No temos
vergonha, de assumir/ Somos filhos dos
capturados/ No temos vergonha de admitir/ Somos filhos dos escravos/ E estamos
afim, de tirar essa mscara/ Revelando a
histria/ De um povo roubado, adulterado,
e negado a ser feliz/ Um povo castrado, lesionado, e negado a ser feliz/ Somos filhos
dos escravos/ E estamos afim, de arrancar
essa mscara/ Revelando a histria/ De
um povo que habita, l dentro do gueto/
Capital da misria/ Crianas que vivem,
circulando os sinais/ So, aprendizes de
marginais/ E estamos afim, de arrancar
essa mscara/ Revelando a histria/ Crianas que vivem, circulando os sinais/ So,
aprendizes de marginais/ Somos filhos dos
escravos/ Somos filhos dos capturados/ Somos filhos dos escravos/ Somos filhos dos
escravos, somos, somos, somos e somos
17 Louvar a Jah
(Edson Gomes)
Vou louvar a Jah/ Forever Jah/ Vou louvar
a Jah/ Por ele ter me protegido/ Por ter me
dado seu abrigo/ Quando eu estava ferido/
Quase mesmo destrudo/ Olha, a vida feita
pra se viver eternamente/ Somente o tolo
no compreendeu, no compreendeu/ Ouviu a palavra e no entendeu/ Nada, nada,
nada/ Ou no deu ouvido a voz de Deus
18 Guerra
(Edson Gomes)
Eles continuam promovendo a guerra/
Guerra, guerra, guerra

Eles continuam destruindo a Terra/ Terra,


terra, terra
Eles continuam promovendo a guerra/
Guerra, guerra, guerra
Eles continuam assustando a Terra/ Terra,
terra, terra
Em cada rosto o desespero, em ver a tristeza se espalhar/ Saudade em cada lar
Em cada rosto o desespero, em ver o sangue derramar/ Lgrimas em cada olhar
Fundindo a cuca das pessoas, fundindo a
cuca das pessoas
Que nao tem nada a ver, que no tem
nada a ver, que no tem nada a ver
Em cada rosto o desespero, em ver a tristeza se espalhar/ Saudade em cada lar
Em cada rosto o desespero, em ver o sangue derramar/ Lgrimas em cada olhar
Sacrificando as pessoas, sacrificando a
cuca das pessoas
Que nao tem nada a ver, que no tem
nada a ver, que no tem nada a ver
19 Estrangeiro
(Edson Gomes)
Estou aqui/ Estou bem distante do teu
convvio/ Eu estou aqui/ Estou bem
distante, mas estou sabendo/ Que o que
se passa contigo/ o Mesmo que se passa
comigo/ Eu ando aqui pela Babi/ Eles me
chama de brasileiro/ Porm eu me sinto
um estrangeiro/ Trabalho, trabalho e nada
nada no/ Eu vivo aqui num submundo/
Buracos, favelas, guetos imundos
Eles me chamam de brasileiro/ Porm eu
me sinto um estrangeiro
1991
EDSON GOMES
CAMPO DE BATALHA // VINIL // FITA K7
// CD // EMI
20 Somos Ns
(Edson Gomes)
Sim, somos ns que estamos nas caladas/
Sim, somos ns que estamos nas prises/
Nos alagados/ Sim, somos ns os marginais/ Sim, somos ns brutalizados/ Os
favelados dos pores do inferno/ O inferno

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 159

aqui/ Sim, somos ns os sem direitos/


Sim, somos ns os imperfeitos, somos os
negros/ Sim, somos ns filhos de Jah/ Sim,
somos ns os perseguidos/ Os habitantes
dos pores do inferno/ O inferno aqui
21 Traumas
(Edson Gomes)
O amor foi a pedra que faltou no alicerce
da nao/ Esse amor s a pedra que
sobrou nessa nossa construo/ E o amor
que os cantores cantam/ No junta a famlia/ No soma,no junta a famlia/ Filhos e
filhas contraindo traumas/ Sexo e drogas,
fama e dinheiro/ Assunto principal/ Sexo e
drogas, fama e dinheiro/ Notcias do jornal
Juventude toda perdida/ Uma juventude
mal dirigida/ E mesmo protegido pela polcia/ Ns no estamos livres da violncia/
A juventude toda perdida/ Uma juventude
mal concebida/ Mesmo protegidos pela polcia/ Ns no estamos livres da violncia/
Que no soma, nem junta uma famlia/
No soma, no junta, a famlia
22 Perigo
(Edson Gomes)
Volta pra casa essa menina/ No entorte
a minha cina/ Tem cuidado nessa vida,
menina/ Olha o perigo nas esquinas/ Voc
no sabe, voc precisa/ Voc precisa saber/
Que a vida bela/ Mas muito louca, pensa
direito garota/ Voc no sabe, voc precisa/ Voc precisa aprender/ No v embora/
Voc precisa, ter o seu homem agora/ Tem
muitos mistrios por a/ J vi tantas coisas
que voc no viu/ Vem e sossega menina/
Pra depois no voltar chorando/ Mundo
velho, mundo cruel/ cruel
23 Reviravolta
(Edson Gomes)
Agora amigo a gente fala o que quiser/
Agora amigo a gente vive como quiser/
Pois os ditadores j no moram aqui/ E
aqueles infratores j sumiram por aqui/
Parece que a gente pode sair/ Parece que
a gente j pode ir/ Pois os caadores esto
adormecidos/ Parece que a gente no

160 l Brbara Falcn

corre mais perigo/ Porm convm amigo,


ficar de olhos abertos
Esteja prevenido, esteja sempre atento/
Pois nunca se sabe o que vir depois/ A
gente nunca sabe, no, a gente nunca
sabe/ Quem sabe eles pretendam retornar/
Quem sabe eles promovam reviravolta/ E
os velhos caadores, venham despertar/
E a gente volte ento a correr o mesmo
perigo
24 Ovelha
(Edson Gomes)
H dias na vida que a gente pensa que
no vai conseguir/ H dias na vida que
a gente pensa em desistir/ H dias na
vida que a gente pensa em sumir/ E a
turma l em casa j est apavorada com a
minha deciso/ que no ligo mais nada/
Nem mesmo a namorada, que me deu o
corao/ Eu gostaria de ficar com voc um
pouco mais/ Vou por a, vou mesmo assim,
vou por a/ Vou por a, vou mesmo assim,
vou caminhar/ E a turma l em casa j est
apavorada com a minha deciso/ que
no ligo mais nada
Nem mesmo a namorada, que me deu
o corao/ Eu gostaria de ficar com voc
um pouco mais/ Eu tambm sou a ovelha
negra da famlia
25 Dance Reggae
(Edson Gomes)
Dance essa msica/ E Reggae msica/
Dance essa msica/ E Reggae msica
Oh, essa msica que a gente canta/ Essa
msica que a gente dana/ Oh, essa msica que revolucionou/ Dance essa msica/
E Reggae msica/ Dance essa msica/ E
Reggae msica
Oh, essa msica que a gente transa/ Essa
msica, que balana, que balana/ Oh,
essa msica que Peter Tosh cantou/ Dance
essa msica/ E Reggae msica/ Dance
essa msica/ E Reggae msica/ Oh, essa
msica, Reggae/ Feita pra mim e pra voc/
frica la Jamaica/ Msica da raa

26 Campo de Batalha
(Edson Gomes)
O campo de batalha cheira a morte/ No
campo de batalha a morte mais forte/
Algum vencer, algum vencer, algum
morrer,enfim/ Vais matar a quem nunca
viu/ Vais matar a quem no te fez nada/
Vais morrer por nada, por nada/ Derramar
teu sangue, em favor de que? De que?
E a famlia te espera, toda a famlia desespera/ Lgrimas nos olhos, tristeza na face/
O peito apertado pois sabe, pois sabe/ Que
algum vencer, algum vencer, algum
morrer enfim
27 Criminalidade
(Edson Gomes)
tanta violncia na cidade/ Brother, tanta
criminalidade/ As pessoas se trancam em
suas casas/ Pois no h segurana nas vias
pblicas/ E nem mesmo a polcia pode
impedir/ s vezes a polcia entra no jogo/
A gente precisa de um super-homem/ Que
faa mudanas imediatas/ Pois nem mesmo
a polcia pode destruir/ Certas manobras
organizadas/ tanta violncia na cidade/
Brother, tanta criminalidade/ A lua j no
mais dos namorados/ Os velhos j no
curtem mais as praas/ E quem se aventura
pode ser a ltima/ E quem se habilita pode
ser o fim/ A gente precisa de um super-homem/ Que faa mudanas imediatas/ Pois
nem mesmo a polcia pode destruir/ Certas
manobras organizadas/ No tudo um dia
vai passar/ Sei que tudo um dia vai mudar
28 Adultrio
(Edson Gomes)
Rastafari, se desligando desse sistema/ E
da coisa imunda que nos envenena
E que adultera a nossa sina/ Rastafari,
cantando o Reggae em cada esquina
Ah coisa linda que nos alucina/ E que faz
ficar to boa a vida
Eles querendo mudar nossa sina/ Nos
injetando a inconscincia/ Dizendo que a
democracia
Grande piada, conto de fada, eh/ Rastafari/

Ai, disso sabemos/ Rastafari/ Rastafari, pois


isso vivemos/ Eles querendo mudar nossa
sina/ Nos injetando a inconscincia/ Dizendo que a democracia/ Grande mentira,
conto de fada, eh/ Rastafari/ Ai, eu estou
sabendo,
Rastafari/ A violncia em toda cidade/
Ningum jamais viu a liberdade/ Ningum
jamais a viu
29 rvore
(Edson Gomes)
Vem me regar me / Vem me regar/ Vem
me regar me, a/ Vem me regar
Todo santo dia/ Pois todo dia santo/ E
eu sou uma rvore bonita/ Que precisa ter
seus cuidados
Vem me regar me / Vem me regar/ Vem
me regar me, a/ Vem me regar
E ando sobre a terra/ E vivo sob o sol/
E as, e as minhas razes/ Eu balano, eu
balano, eu balano/ Vem me regar me
/ Vem me regar/ Vem me regar me, a/
Vem me regar
1995
EDSON GOMES
RESGATE FATAL // CD // EMI
30 Sociedade Falida
(Edson Gomes)
Nossas vidas nas ruas j no valem nada/
ningum sabe se est vivo na prxima parada/ Tanta lama, tanto vcio, tanto oportunismo/ Ningum sabe se estar vivo no prximo domingo/ Essa vida aqui na Terra j no
faz sentido/ L em Brasilia ningum cumpre
compromisso/ So tantos gatos, tantos ratos
corroendo os partidos/ Novamente Braslia
ningum tem compromisso, ningum/ Sociedade falida/ Os bons costumes falidos/ Os
trabalhadores falidos/ Aposentados falidos/
Nossa segurana falida, nossa segurana/ A
nossa educaao falidas/ Professores falidos/
Salas de aulas falidas/A juventude falida/ A
nossa previdncia falida/ Significa que nossa
sade est toda ofendida/ As ruas andam
cheias de hipcritas

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 161

31 Zumbi dos Palmares


(Edson Gomes)
Zumbi rei dos Palmares/ Um grito de dor,
liberdade/ Zumbi rei dos Palmares/
Um lutador, lder de valor/ Voc o nosso
precursor/ De l pra c, outro no se viu/
De l para c, ninigum assumiu/ Voc,
um grande lutador/ A nossa luta no acabou/ Eis aqui a retomada/
Vamos ento encher a praa/ Gritar de
novo, gritar com raa deliberada
Sou o Zumbi dos Palmares/ o Zumbi
dos Palmares/ o Zumbi dos Palmares/
Sou o Zumbi dos Palmares/ o Zumbi dos
Palmares/ Zumbi at mesmo o sol/ Se eles
pudessem a gente vagaria/ Zumbi at mesmo a chuva/ Se eles pudessem a gente vagaria/ No temos como enxugar/ E a cada
dia mais difcil se alimentar/ No temos
onde trabalhar/ E a cada dia mais dificil se
alimentar/ Voc, um grande lutador
A nossa luta no acabou/ Eis aqui a retomada/ Vamos ento encher a praa
gritar de novo, gritar com raa deliberada/
Sou o Zumbi dos Palmares/ o Zumbi dos
Palmares/ o Zumbi dos Palmares/ Sou o
Zumbi dos Palmares
o Zumbi dos Palmares
32 Meretriz
(Edson Gomes)
Se voc ouve a Babilnia (Babylon,
Babylon)/ Se voc vive Babilnia/ Fez
pacto com Babilnia (Babylon, Babylon)/
Se voc segue a Babilnia/ Se deleita com
Babilnia (Babylon, Babylon)/ E se voc
sonha com Babilnia/ Ento voc vai se
perder, ento voc vai se perder/ E nunca
mais vai se achar na vida/ Se voc ouve
a Babilnia (Babylon, Babylon)/ Se voc
vive Babilnia/ Fez pacto com Babilnia
(Babylon, Babylon)/ Se voc segue a Babilnia/ Se deleita com Babilnia (Babylon,
Babylon)/ E, se voc sonha com Babilnia/
Ento voc vai se tornar, ento voc vai se
tornar/ Aquela que no honra o seu corpo/
Aquela que tornou-se a meretriz/ Aquela
que cumpre o compromisso/ Aquela no

162 l Brbara Falcn

sustenta o que diz/ Ela, no sustenta/ Ela,


no sustenta/ Aquela que no sustenta o
que diz
33 Resgate Fatal
(Edson Gomes)
Voc precisa saber/ De toda verdade que
est no ar/ Se voc ainda no leu/ Sobre a
verdade de Deus/ Agora est aqui, agora
est/ No h mais tempo a perder
No, No h/ Agora est aqui, agora est/
No h mais tempo a perder
No/ O mundo tem fim, sim/ E todos
seguiro/ Espero que venha ser homem
natural/ Por que agir assim/ Se todos tem
o mesmo fim/ Por que no vem pra ser
um homem normal/ Voc precisa saber/
Sobre o resgate que j se deu/ Mas est
sempre a dormir, negro/ Por isso no sabe
o que aconteceu/ Agora est aqui, agora
est/ No h mais tempo a perder/ No,
No h/ Agora est aqui, agora esta/ No
h mais tempo a perder, no/ Foi alma
por alma, foi sangue por sangue/ Resgate
Fatal/ O mundo tem fim, sim/ E todos
seguiro/ Espero que venha ser homem
natural/ Foi alma por alma, foi sangue por
sangue/ Resgate Fatal/ O mundo tem fim,
sim/ E todos seguiro /Espero que venha
ser homem natural/ Foi alma por alma, foi
sangue por sangue
Resgate Fatal/ Por que agir assim/ Se todos
tem o mesmo fim/ Por que no vem pra
ser um homem normal
34 Meus Direitos
(Edson Gomes)
Oh, mame frica / Oh, mame frica/
Tanto tempo que a gente est aqui no
Brasil/ Tanto tempo que a gente est
assim no Brasil/ Sem ter educao/ Sem
ter oportunidade/ Sem ter habitao/ Sem
ser membro da sociedade/ Somos alvo da
incoerncia/ Vtimas da prepotncia
Dos racistas, dos racistas, dos racistas/
Quero meu direito de crescer na vida/
Quero sim / Quero meu direito de vencer
na vida/ Quero meu direito de crescer na
vida/ Quero sim/ Quero meu direito de

vencer na vida/ Oh, mame frica/ Oh,


mame frica/ Oh, mame frica/ Oh,
mame frica/ Quero ter o direito de ser/
O que eu quiser ser
35 Luz do Senhor
(Edson Gomes)
com a luz do Senhor baby/ Eu estou na
luz do Senhor/ E com a luz do senhor a
gente vence/ Babilnia est aflita/ Vai se
coroendo aos poucos/ Tem raiz apodrecida/
Mesmo assim busca me destruir/ com a
luz do Senhor baby/ Eu estou na luz do Senhor/ E com a luz do senhor a gente vence/
Babilnia est caindo/ Se afundando pouco
a pouco/ Teu poder no vale nada,
diante,diante da minha espada/ Pois o
Deus de Abrao, sempre esteve e sempre
estar comigo/E no vai deixar no, no
vai,no vai,no vai/ E no vai deixar no,
no vai, no vai, no vai/ com a luz do
Senhor baby/ Eu estou na luz do Senhor/ E
com a luz do senhor a gente vence/ Ela agora est querendo/ Denegrir minha imagem/
Dizendo que sou um ex-presidirio/ Um
condenado um homem marcado pela
justia,
Um procurado, um homem marcado pela
justia/ Assim no vai no/ No vai, no
vai, no vai/ com a luz do Senhor baby/
Eu estou na luz do Senhor/ E com a luz do
senhor a gente vence
36 Fato Consumado
(Edson Gomes)

Pel/ Por todo esse leite derramado/ Nas


pedras do Pel/ E por esse fato consumado/ Agora nao h tempo pra voltar atrs/
No h/ Agora no h tempo pra voltar
atrs/ No h/ Quando Deus vier vai eliminar/ O mal pela raiz/ Quando Deus vier
vai separar/ O joio do trigo/ E o homem
de boa vontade reinar/ O homem de boa
vontade governar a nao
37 Bela Cidade
(Edson Gomes)
Bela cidade/ Lindo prespio/ Filho de
Deus, Menino
Bela cidade/ Lindo prespio/ Filho de
Deus, Menino
Ponha sua mo nessa represa/ Que o
homem falvel/ sempre falvel
E a gente que nunca tem nada a ver/ Vive
pagando sem merecer
38 Olinda
(Edson Gomes)
Estava louco de saudade/ Das meninas de
Olinda/ Eu estava louco/ Muito louco/
Novamente estou aqui/ Pra sentir o teu
calor/ Eu sinto saudade/ Dessa cidade/ Ei,
voc me alucina/ Oh, mina, mina, mina,
mina/ Mina, mina, mina, mina, linda/ O
teu jeito me fascina/ Oh, linda, linda, linda,
linda, Olinda/ Eu estava louco/ Muito louco/ Pra ver, suas meninas, suas meninas,
suas meninas/ Suas meninas, suas meninas/ Suas meninas, suas, Olinda

Toda misria que o povo passa/ Quem vai


pagar?/ Toda essa fome que o povo passa

39 Calamidade Pblica

quem vai pagar?/ Por todo esse sangue


derramado nas pedras do Pel/ De cada
homem chicoteado/ Nas pedras do Pel/
Por todo esse sangue derramado/ Nas
pedras do Pel/
De cada homem chicoteado/ Por essa
indigncia que o povo vive/

Nasci no fim do mundo/ Vivo no fim do


mundo/ Aqui nesse fim de mundo/ Vivo
como um condenado/ Pois nada sobrou
pra mim/ Quando as casas caem/ Sinto-me
triste demais/ Pois no meio dos escombros/
Bem que eu poderia estar com minha
famila, com os meus amigos

Quem vai pagar?/ Por todo esse lixo que


o povo divide/ Quem vai pagar?/ Por todo
esse leite derramado/ Nas pedras do Pel/
Por esse fato consumado/ Nas pedras do

A minha famlia estava l/ Todo ano isso


ocorre/ sempre o mesmo corre-corre/
Todo ano a hipocrisia/ Faz parte dessa
agonia/ Demagogos, oportunistas/ Vejam

(Edson Gomes)

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 163

as vtimas/ De toda a inoperncia/ Da


brutal ganncia/ Quando a chuva cai/
um sacrifcio a mais
A gente j no vive em paz/ E quando essa
chuva cai/ Piora tudo aqui e a gente fica
assim
Pedindo clemncia, correndo risco/ Tudo
perigo/ Correndo risco, a morte pulsa mais/
Queremos ajuda, mas no tem ajuda/ No
temos culpa de sermos to pobres assim/
calamidade pblica/ Queremos ajuda!/
Moro no fim do mundo/ Vivo nesse fim de
mundo/ Rastejo aqui no fim do mundo/ E
sinto um desgosto profundo/ E muito mais/
Minha famlia, os meus amigos/ Agora
esto soterrados, estavam l/ Chuva, l
vem ela
Chuva, l vem ela e vem sem d/ L vem,
l vem, l vem, l vem, l vem
40 Devoluo

bem crescido/ Em suas margens no vejo


nada/ S uma paisagem apagada/At mesmo o vapor que navegava em suas guas
no navega mais/ E eu no vejo mais/
Todo mundo trabalhando/ Todo mundosuando/Trabalho humilde, mas era trabalho/
Hoje no se v mais/ S lembrana de
um tempo que no volta mais/ Hoje no
se v mais/ S lembrana de um tempo
que ficou pra trs/ Hoje eu estou bem
crescido em suas margens no vejo nada/
S uma paisagem apagada/ At mesmo o
vapor que navegava em suas margens no
navega mais/ E eu no vejo mais/ Todo
mundo trabalhando/ Todo mundo suando/
Trabalho humilde, mas era trabalho/
to triste meu Paraguau/ To triste est
meu Paragua/ Hoje no se v mais, s
lembrana de um tempo que no volta
mais/ Isso eu j sabia, inclusive o meu pai/
O meu pai trabalhava/ Isso eu j sabia,
inclusive o meu pai/ O meu pai me falava

(Edson Gomes)
Cad nossos ndios, Cad nossos ndios/
Nossos ndios esto morrendo, Desaparecendo/ Sendo exterminados/ Pela ganncia/
Pela prepotncia/ Daquele que diz ser o
melhor/ Aquele que diz fazer tudo perfeito/
Aquele que diz fazer tudo direito/ Aquele
que diz ser o melhor/ Ento devolva as terras desses homens/ Ento devolva as terras/
Para que tudo fique direito/ Para que tudo
se torne perfeito/ E a alegria retorne quele
lar/ Enfim a paz se restabelea/ Aquele que
diz fazer tudo perfeito/ Aquele que diz fazer
tudo direito/ Aquele que diz ser o melhor/
Ento devolva as terras desses homens/
Devo, devolu, devo, devoluo
41 Lembranas
(Edson Gomes)
s vezes eu fico pensando em meu pensamento/ Me leva para um mundo distante/
Me leva para minha infncia/ Quando eu
brincava na margem do rio/ E via repleto
de embarcaes, era lindo/ Muito bonito/
Uma paisagem que embelezava/ Este
gigante rio/ E eu via/ Todo mundo trabalhando/ Todo mundo suando/ Trabalho
humilde, mas era trabalho/ Hoje eu estou

164 l Brbara Falcn

1997
SINE CALMON
FOGO NA BABILNIA // CD // ATRAO
FONOGRFICA
42 Andava Sozinho
(Sine Calmon)
J andei por tantos caminhos/ Quanto
tempo andei sozinho/ Viver sem razo
por qu? Por qu?/ Se em Jesus t todo
o poder/ Sinta agora mesmo em voc/
Nunca sers abalado/ Encontrei o amor
em voc/ E tudo mais que eu procurava/
No tem mais dvida/ J desceu, j desceu
por gua/ Encontrei o amor em voc/ E
tudo mais que eu procurava/ No tem mais
dvida/ O Senhor minha morada
43 Mississipi Blues
(Sine Calmon)
Sei que um dia vou pro cu/ Ao encontro
do Senhor
Sei que nunca vou morrer/ Pra viver
eterno amor
Somos remanescentes/ Neste mundo to
pendente

Venho pra lhes dizer/ Que a salvao no


vem da gente, no
Mas se quiser cantar/ Abre a boca e diz
assim com a gente
Mas se quiser louvar/ Toque um blues do
Mississipi assim
44 Nayambing Blues
(Sine Calmon)
Peguei o trem do amor/ A jerusalm/ Na
mala no levo a dor, no
E nem cabe no trem/ Cantando e tocando
eu vou/ Vou para o alm/ E o anjo condutor, meu Deus/ msico tambm/ Canta
Bahia Reggae
Nayambing blues para voc, meu rei/ Canta
Bahia Reggae, now/ Rabi vai ouvir mais
uma vez/ A tristeza vai embora/ Alegria toda
hora/ Eu sei, que a semente j vai brotar
J sei, como grande a vontade de cantar/
Eu sei, the legalize no vai negar/ legalize no vai negar/ Fogo na babilnia!
45 O Maluco que Sabia
(Sine Calmon)
Era um maluco, um maluco que sabia/ E
que andava pelas ruas da Bahia/ E falou
forte do Pelourinho, falou/ A tocha acesa
do morro que fumegou/ Andava sem
medo, com f, sem aflio/ Com pacincia
a esperar na estao/ Pra viver em paz
nessa cidade to bonita/ Rua da Feira, na
Fonte da Capapina/ Ou ento seja l na
Fonte da Pechincha
46 Sinta e Kaya
(Rui de Brito)
Eu disse pra o irmo no viver de bobeira/
Eu disse para o irmo que no quer se
tocar
Falei do passado sem falar na cor/ E mostrei para o irmo que o sol vai brilhar
Se o lance t na cor, a coisa essa/ Sinta
Reggae, Reggae, Reggae
Se o lance t na cor, a coisa essa, essa,
essa/ Cantando, Reggandopra quem
quiser ver

Eu disse pra o irmo no viver de bobeira/


Eu disse para o irmo que no quer se
tocar
Falei do passado sem falar na cor/ E mostrei ao irmo que o sol vai brilhar
Mas o amor do bom Deus que vem dar/
No dia seguinte, pra gente sacar/ A fora
que tem nesse nosso cantar/ Bahia, Jamaica, cantando Reggae
47 War
(War, Bob Marley // Verso: Sine
Calmon)
Its a war, rumors of a war/ Enquanto os
irmos na Terra/ Morrerem de fome e de
sede/ Haver querra, exploso/ O grande
vulco, assolao/ No caia no, Reggae/
armadilha/ Haver muitas guerras/ War,
rumors of a war/ Mas o Senhor da luz/ Pela
palavra traz harmonia/ Silenciosamente/
Com alegria/ E ningum tem poder pra
destruir/ Nossas primcias, nossas msicas/
Obras de grande poder/ Its a war, rumors
of a war/ Enquanto homens maus ficam
pra trs/ Eu peo a Deus,/ Jerusalm, a
grande cidade/ Cidade do grande rei/ Eu
boto fogo na Babilnia/ Sem filosofia
48 Demais
(Sine Calmon)
demais por meu corao/ demais essa
cano, to linda, a vida/ Vem
Que eu quero viver/ Que eu quero levar/ Que
eu quero sentir/ Que eu quero te dar/ Eu sei
que o amor lindo/ E sinto que ele est to
vivo/ E espero que um dia o amor/ E espero
que o amor v imperar/ vem, vem nos dar
sorriso, vem/ vem, vem nos dar abrigo, vem
sim/ O amor sempre est comigo/ Por isso
estou aqui a te esperar/ Te tocarei de guitarra
49 o Eu Sou
(Sine Calmon)
o Eu sou/ O cultivador da semente
do amor da vida/ No estou, na estrada
sozinhonem um passarinho, vive de bobeira/
No plantam, mas colhem das primcias do
vero/ Voam o mundo inteiro interpretando
a cano/ Como boas novas, notcias a che-

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 165

gar/ O alfa, o mega, o incio e o fim/ Tocha


viva acesa, a eternidade t pra mim/ Sou
doido pro mundo e me portarei assim/ Livre
e sem medo, Jesus, bombom bota pra mim
50 Fonte de Luz
(Sine Calmon)
Voc no sabe a fora que tm/ Precisa da luz
pra poder se guiar/ A luz est na porta dizendo
que vem/ Sinta to forte, s se ligar/ Na luz,
na luz/ O homem anda cansado procura de
algum/ Reflita consciente, no olhe pra trs/
O mundo, o homem ameaa tambm
Est to distante do seu habitat/ Da luz, da
luz/ Precisamos beber da gua da fonte de
luz/ Precisamos chamar o esprito da vida,
Jesus/ Precisamos encontrar com o esprito
de Deus, Pai
Vamos encontrar com a paz/ Dentro da luz
voc vai habitar/ Dentro da luz voc vai se
encontrar

52 Roda Pio
(Nengo Vieira)
Roda, roda, pio/ Na roda da vida
Roda tudo que ele poderia ter
Fora o mundo que ele tem pra merecer
Erguer com trabalho e a dureza da servido
Sobrevive permanente na escravido
Perde a vida pra poder ganhar o po
Ningum liga se ele vai mudar ou no
Vem, Roda, roda, pio/ Na roda da vida
Trabalhador com muito amor/ Vive na paz
de Deus
Na luz do Senhor que alivia a dor/ Que
forte demais
Mas a pureza e a beleza do seu corao
mais que tudo, que qualquer dinheiro/
Da grande nao
1998
EDSON GOMES

51 Morro Fumegante

APOCALIPSE // CD // ATRAO FONOGRFICA

(Sine Calmon)

53 Perdido de Amor

Estou mais uma vez aqui/ Cantando pra


vocs/ As coisas lindas/ Que h l no fundo
do mar

(Edson Gomes)

Estou mais uma vez aqui/ Cantando pra


vocs/ As coisas lindas/ Que h l no cu
e no ar
Meu amigo, h cincia, eu sei/ Mas o
mundo, o Criador que fez/ A criao, testa
Dele com harmonia/ E da guitarra sai
lindas melodias, assim/ Hoje vou tocar/ Ao
p da fogueira
Do fogo do morro fumegante que h/
Hoje dia/ dia de lua cheia/ Tenho
vontade de sair para pescar/ Todo dia eu
canto para o meu Deus/ Ele a luz dos
olhos meus/ Seja manh, tarde, noite
ou dia/ Ele mesmo traz pra mim/ Lindas
melodias, assim/ Por isso estou aqui alegre
a cantar/ Cantar para o leo da tribo de
Jud/ Por isso vem/ Vem, vem, vem viver
essa luz/ Essa luz est em Jesus

166 l Brbara Falcn

Fiquei louco de amor/ Vem me namorar,


girl/ Estou perdido de amor/ Vem me
namorar cu
Preciso segurar essa onda / Que quer me
afogar / Preciso segurar essa onda/ Que
quer me afogar
Foi no beijo que a morena me deu / Foi no
beijo que a morena me deu / Foi nesse beijo que aconteceu / No abrao que a morena me deu / Foi no abrao que a morena
me deu / Foi nesse abrao que aconteceu/
Menina bacana que rola na cama, me
namora / Me namora, me namora,
me namora, me namora / Menina bacana
que rola na cama, me namora/ Me namora, me namora, me namora, me namora /
Fiquei louco de amor / Vem me namorar,
girl / Estou perdido de amor/ Vem me
namorar cu

54 Isaac
(Edson Gomes)
Isaac, vamos danar esse Reggae/ Isaac,
vamos cantar esse Reggae
O povo precisa de uma voz amiga/ Que
fale,que lute por uma verdade/ O povo
precisa da realidade/ Mas tenha cuidado
com as gentilezas/ Vov j dizia/ Beleza
no faz a mesa
Isaac/ existem mil formas de viver, eu sei
/ Isaac/ existem mil formas de fazer, eu
sei/ Isaac
Mas precisa assumir o compromisso/ Isaac/
E se for preciso morra por isso/ E fale que
o povo anda morto de fome/ E fale que
o povo anda passando fome/ Meu filho,
vamos danar esse Reggae/ Isaac, vamos
cantar esse Reggae
55 Acorde, levante e lute
(Edson Gomes)
Proprietrios, latifundirios/ Ningum
nesse mundo pode te mudar/ Porm no
espere por esse direito/ Acorde, levante,
lute/ Pois tu s o filho da natureza/ Ao longo dos anos sempre foi assim/ Agora no
pode ser adulterado/ D cinco, my brother,
estou do teu lado
E tens o direito de ser livre/ Ningum nesse
mundo pode impedir/ Porm no espere
por esse direito/ Acorde, levante, lute/
Homem da mata, no queira apito no/ A
sua tribo corre perigo
Homem da mata, no queira apito no/
Sinta no cheiro, a cor do perigo
56 Querida
(Edson Gomes)
meu bem/ Os meus cabelos no devem
servir/ Para impedir o nosso amor
meu/ A cor da minha pele tambm/ No
vai impedir o nosso amor
Diga pro seus pais/ Que nada queremos/
Diga pro seus pais/ No vou incomodar
S queremos desfrutar/ Desse nosso amor/
J que podemos sustentar sem danos

vem amor/ Querida, vem amor/ Querida,


vem amor
Querida, vem amor/ Vem my darling
57 Inquilino das Prises
(Edson Gomes)
Quando eu morava na casa de satans/ Eu
era o seu prisioneiro, e fazia tudo
por dinheiro, eu andava sempre no agrado
dele/ Eu fumava maconha, cheirava p/
Eu bebia cachaa, uma desgraa s/ Eu
fumava maconha, cheirava p/ Eu bebia
cachaa, uma desgraa s/ Eu era perigoso
inimigo da sociedade/ Eu era maginal, eu
era maginal, eu era maginal/ Eu seqestrava, eu estrupava e eu robava, eu matava/
Eu era inquilino das prises e liderava as
rebelies/ Agora estou retornanado pra
casa do meu pai/ Na casa do meu pai, no
tem mais dor, no tem mais sofrer/ Na casa
do meu pai, l tudo amor sem restrino
de cor/ Na casa do meu pai, l mora o
Senhor/ Majestoso Senhor, que me tem
amor/ E que muito me amou, que me tem
amor e que j me salvou/ O inquilino das
prises que liderava as revelies/ Agora
estou convivendo na casa do meu pai
58 Serpente
(Edson Gomes)
Se eu soubesse (ah, se eu soubesse antes)/
Que voc era assim, to ruim, to sagaz/
Teu veneno cruel, s uma cobra, s fatal/
Quem te toca, sempre quer, ta querendo
sempre mais/ E no se importa, com o
que acontea/ s uma cobra, s a serpente
prpria/ A serpente gerou o mal
s a serpente prpria/ A serpente gerou o
mal,venenosa tu s/ s a serpente prpria,
Jararaca/
A serpente gerou o mal, venenosa tu s/ s
a serpende prpria, Cascavel/ A serpente
gerou o mal,venenosa tu s/ s a serpente
prpria, Jaracuu/ A serpente gerou o
mal,venenosa tu s
s a serpente prpria, a Naja/ A Serpente
gerou o mal

Sem traumas, sem sacrifcios/ Ento oh,


O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 167

NENGO VIEIRA

61 Basta Man

SOMOS LIBERTOS // CD // ATRAO


FONOGRFICA

(Nengo Vieira)

59 Divino
(Nengo Vieira)
A saudade tambm mata, eu sei/ Quando
se tem o amor/ quando quer se dar
At se dividir/ Se sentindo to forte quanto
o sol/ Mas a msica me faz sentir
Bate no corao/ At sobe a razo/ De no
mais suportar
A dor, a dor oh/ A dor, a dor, a dor oh
Chora, meu bem/ Chora, meu bem
Chora, meu bem/ Chora, meu bem/ Chora
A saudade tambm mata, eu sei/ Quando
se valor, sim
quando quer se dar/ At se dividir/ Se
sentindo to forte quanto o sol oh oh
Mas a msica me faz sentir/ Bate no corao/ At sobe a razo
De no mais suportar/ A dor, a dor oh/ A
dor, a dor, a dor oh
Divino dividir/ Divino dividir/ Dividindo
h de vingar
60 Aliana
(Nengo Vieira)
A primeira vez que eu te vi desejei te ver
mais
Nunca mais vou esquecer tanto bem que
voc faz
Ento deixa, deixa nascer o amor/ Deixa,
deixa fluir como uma flor
Numa nova aliana, na total confiana/ Eu
quero sempre estar pra viver
Quando acordo ao teu lado tudo fica
normal/ Quando sinto tua ausncia, a
tristeza total
Ento deixa, deixa nascer o amor de Deus/
Deixa... deixa fluir nos olhos teus
Numa nova aliana, na total confiana/ Eu
quero sempre estar pra viver
Quando acordo ao teu lado tudo fica
normal/ Quando sinto tua ausncia, a
tristeza total
Ento deixa, deixa nascer o amor/ Deixa,
deixa fluir como uma flor
Numa nova aliana, na total confiana/ Eu
quero sempre estar pra viver

168 l Brbara Falcn

Vamos regar, vamos brincar/ Vamos cantar, vamos danar


Vamos tocar, i i i/ Caia na dana
Salvador
Basta man, basta man, / Caia man,
caia man,
Todo p rapado tem o mesmo direito de
comer, viver e trabalhar
Seja ele branco, preto, amarelado/ Cada
unidade nica a regar
Basta man, basta man, / Caia man,
caia man,
Segue sua vida sempre atravessando/ As
dificuldades sem se lamentar
Lamentos, palavras, pedaos de vida/ E
sem falar na lida dura de amargar
Basta man, basta man, / Caia man,
caia man,
62 Chegada
(Nengo Vieira)
Todo dia amanheo s pensando em voc,
meu bem
Nunca mais eu me esqueo tanto bem que
voc, me fez
Ainda ontem voc quase me abandonou,
no faa assim
Eu no aguento esse frio sem o leve calor,
da tua presena
Na chegada do avio/ Corro logo pra te
encontrar
A saudade me aperta aqui/ Quero logo te
abraar
63 Colheita
(Nengo Vieira)
O que passou j passou no / Ah, meu
Jesus chama quem quiser
Basta somente, sim aceit-lo/ E eu vou
seguindo no meu caminho
Ah, no, no, no me sinto sozinho/ ,
meu Jesus j me libertou
Por isso cante, dance que ele te diga sim/
Que Jesus a nica sada
Clame, chame no corao/ Jesus Cristo
a salvao
Por isso cante, dance que ele te diga sim/
Que Jesus a nica sada

Clame, chame no corao/ Jesus Cristo a


salvao/ a salvao!
E quando o Senhor Jesus chegar/ Na sua
colheita vai separar
O trigo do joio na terra/ Basta ser trigo pra
perceber
Que em Jesus ns vamos romper/ Todas
amarras da maldio
No, no, no queira ser joio no/ Trazendo em si a condenao/ Pra aqueles que
no aceitarem
Por isso cante, dance/ Que ele te diga sim/
Que Jesus a nica sada
Clame, chame no corao/ Jesus Cristo
a salvao
Por isso cante, dance/ Que ele te diga sim/
Que Jesus a nica sada
Clame, chame no corao/ Jesus Cristo a
salvao/ a salvao!
64 H Pai
(Nengo Vieira)
H pai, h pai/ Diga o que que voc quer
H pai, h pai/ Diga o que que voc quer
Que voc ande em direo da palavra de
Deus
Que voc tenha compreenso do que ele
prometeu
H pai, h pai/ Diga o que que voc quer
H pai, h pai/ Diga o que que voc quer
Pra que seus anjos venham aqui e acampem em redor
Pra nos livrar, pra proteger/ Pra dar do
teu amor
H pai, h pai/ Diga o que que voc quer
H pai, h pai/ Diga o que que voc quer
65 Juzo Final
(Nengo Vieira)
Como bom saber que o dia do Juzo
Final
Vem como ladro precedido pelos seus
sinais
E vem para destruir, tudo aquilo que o
homem plantou
Vem como ladro acredite se voc quiser
Mas sei que tambm, Deus sempre estar
A teu lado a lutar/ Seja ele quem for/ Seja
ela qualquer/ Sempre vai te ajudar

Ento passe a saber o dia do Juzo Final


Vem como ladro precedido pelos seus
sinais
E vem para destruir, tudo aquilo que o
homem plantou
Vem como ladro acredite se voc quiser
Mas sei que tambm/ Deus sempre estar
A teu lado a amar/ Seja aonde for
Seja onde estiver/ Sempre vai te amparar
66 Mundo Vo
(Nengo Vieira)
Deixa esse mundo vo e vem servir de
corao
A quem nos deu a vida e eterna salvao
Ah, Jesus Cristo amado vem, pro Santo
Salvador
A quem transforma a vida e nos enche
de amor
Deixa esse mundo vo e vem servir de
corao
A quem nos deu a vida e eterna salvao
Ah, Jesus Cristo amado vem, pro Santo
Salvador
A quem transforma a vida e nos leva pro
Senhor
Eu quero estar nos braos do meu Senhor
(Jesus)
O eterno amado, o Santo Salvador
Deixa esse mundo vo e vem servir de
corao
A quem nos deu a vida e eterna salvao
A Jesus Cristo amado vem pro Santo
Salvador
A quem transforma a vida e nos leva pro
Senhor
Eu quero estar nos braos do meu Senhor
(Jesus)
O eterno amado, o Santo Salvador
67 Pra Provar
(Nengo Vieira)
Pra provar devemos estar contentes/ Contentando com o que temos
E pra provar devemos estar atentos/ No
amor de Jesus, que transforma nossa luz
Revestindo de poder e amor/ Desistir
nunca, jamais (oh Lord!)
Que a cada dia, cada hora sim/ Falarei do

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 169

Senhor/ Sem medo e sem temor


Em qualquer distncia que eu me encontrar/ Pra provar devemos estar alegres
Anunciando a verdade no amor/ Na palavra de Deus
Que consola todos meus sentimentos e
temores assim
68 Somos Libertos
(Nengo Vieira)
Caminhar em direo,/ Caminho a salvao.
Que essa luz, que Jesus,/ E ele vem pra
nos dizer,
Como se faz pra viver,sim como se faz pra
sentir/ E amar, e unir, os irmos
S jesus a salvao/ O caminho, a
redeno
Essa luz, que Jesus, nosso amor...
Quanta gente no percebe/ Que o trabalho
desses homens/ Est longe do amor de
Deus
Eu me sinto to contente, em cantar eternamente,
Pro meu Deus que fez a terra e o cu
Pelo sangue de Jesus/ Pelo sangue de Jesus
Ns somos libertos/ Somos libertos, somos
libertos.
Pelo sangue dessa luz,/ Pelo, pelo sangue
de Jesus
Somos libertos, somos libertos, somos
libertos
69 Tribos de Abrao
(Nengo Vieira)
Desde muito tempo, desde a eternidade ns
J, j existimos desde as tribos de Abrao/
Nos tempos de No, fez Deus/ A arca pra
salvar
Os filhos seus/ De uma gerao to corrompida, to adulterada
S restaram oito almas que creram, almas
marcadas/ Oito almas marcadas
E assim vamos vivendo/ E assim vai caminhando ns...
Em busca da verdade, deixando a vaidade
atrs
Que s pelo caminho/ E Deus.../ Jesus
quer o meu destino/ E o seu
Pra solucionar e acabar todos problemas/
E destruir de uma s vez todo sistema/

170 l Brbara Falcn

Todo esse sistema/ E s pelo caminho/ E


Deus/ Jesus quer o meu destino/ E o seu
Pra solucionar e acabar todos problemas/
E destruir de uma s vez todo sistema
Todo esse sistema
70 Uno
(Nengo Vieira)
Abra seus olhos para luz/ Doce palavra me
conduz
Me faz saber que o amor venceu/ A esperana que encontrei
to real capaz de me ensinar/ A lei que
Deus deixou
Sim, vou pratic-la na eterna f/ Caminha,
fica sempre de p
Pra receber a uno de Jesus/ E permanecer na graa de Deus
Buscar a presena do Senhor/ E ser renovado no seu amor
H quanto tempo procurei/ E somente
agora encontrei
A paz total, o amor real/ Pra alimentar meu
corao
Na viva vida da uno/ Que vem do cu/
Foi Deus quem deu
Sim, sim somos um na mesma uno/ Na
esperana da salvao
Santificar nossos coraes/ Permanecer na
graa de Deus
Buscar a presena do Senhor e ser renovado no seu amor
Sim, vou pratic-la na eterna f/ Caminha,
fica sempre de p
Pra receber a uno de Jesus/ E permanecer na graa de Deus
Buscar a presena do Senhor e ser renovado no seu amor
71 Vem Menina
(Nengo Vieira)
Vem menina/ Vem menina com o teu
carinho
Vem menina/ Joga na dana neste swing
Vem menina/ Vem dizer que t tudo bem
Vem me dar carinho tambm/ Vem dizer
que o frio bom pra ns dois
Vem menina/ Vem menina com o teu
carinho
Vem menina/ Joga na dana neste balano

Vem menina/ Se eu j sei que tudo


normal
O destino sentir o real/ Mas um dia voc
vai sentir!
Vai menina/ Joga na dana neste swing
Vem menina/ Vem menina com o teu
carinho
Vem menina/ Joga na dana neste swing
Vem menina/ Vem dizer que t tudo bem
Vem me dar carinho tambm/ Vem dizer
que o frio bom pra ns dois
Vem menina/ Vem menina com o teu
carinho
Vem menina/ Joga na dana neste balano
Vem menina/ Vai menina/ Vem menina

Bate no corao/ At sobe a razo/ De no


mais suportar
A dor, a dor/ A dor, a dor, a dor
Chora, meu bem/ Chora, meu bem/ Chora, meu bem/ Chora, meu bem/ Chora
A saudade tambm mata, eu sei/ Quando
se valor, sim
quando quer se dar/ At se dividir
Se sentindo to forte quanto o sol oh oh/
Mas a msica me faz sentir
Bate no corao/ At sobe a razo/ De no
mais suportar
A dor, a dor/ A dor, a dor, a dor
Divino dividir
Divino dividir/ Dividindo h de vingar
74 Gueto

1999
SINE CALMON
ROSA DE SARON // CD // ATRAO
FONOGRFICA
72 Natural
(Nengo Vieira e Jair Soares)
O controle t na mente, sim, s pra quem
sabe onde est
T na mente de quem sente, todo mundo
enfim transformar
Deus e Msica vm depressa e faz, toda
gente cantar
O controle t na prtica, todo dia trabalhar/ Todo dia trabalhar
Todo dia msica tambm/ Seja reggae,
rock ou ska (3x)
Natural, essa msica que Deus fez j/ Em
sementes pra ter sempre o natural sumo
que h
Trabalhando sem bandeira/ O reggae, o
rock ou ska
O controle t na prtica, todo dia trabalhar/ Todo dia trabalhar
Todo dia msica tambm/ Seja reggae,
rock ou ska (3x)
73 Divino
(Nengo Vieira)
A saudade tambm mata, eu sei/ Quando
se tem o amor
quando quer se dar/ At se dividir
Se sentindo to forte quanto o sol/ Mas a
msica me faz sentir

(Nengo Vieira e Carlito Profeta)


Eu vim do Gueto/ Vim do interior do Gueto/ A vida no tem preo pra viver
Eu, sim, meu preto/ Ando procurando um
jeito/ De tocar, cantar o que voc viver
Mr. Stevie Wonderful/ A onda voc/ Cantando um Rock, um Reggae, um Rhythm
and Blues
Ainda que os alto-falantes da frica do
Sul/ No sintam as emoes da nossa alma
Blues/
Alma Blues/ Alma Blues
Eu vim do Gueto/ Vim do interior do Gueto/ Eu nao trago dio pra voc
Eu, sim, meu preto/ Ando procurando um
jeito/ De tocar, cantar o que voc viver
Mr. Stevie Wonderful/ A onda voc/ Cantando um Rock, um Reggae, um Rhythm
and Blues
Ainda que os alto-falantes da frica do
Sul/ No sintam as emoes da nossa alma
Blues/
Alma Blues/ Alma Blues
75 SOS Ecologia
(Daniel Gomes de Souza)
Deixe a semente do amor brotar em ti/
Deixe a raiz crescer
Desperte a natureza de Deus que h em
voc
SOS Ecologia interior
As crianas sofrem abandono, carncia e
incompreenso

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 171

A esperana j no existe/ No meu jardim


morre o boto
Pois no regam nem do proteo/ Se no
cultivar as flores, ervas crescero
De mal vai a pior/ Dos sonhos e temores,
das alucinaes de um momento foi
Cristo tem o ar, tem o trigo verde tem
SOS Ecologia interior

Vem povo, vem povo, vem povo


Cantar com a gente pra se brindar
F no Senhor que ele vai voltar
Pras as nossas lgrimas enxugar
Vem povo, vem povo, vem povo
Cantar com a gente a nova cano
Que l no fundo do corao
Pois o amor no se apaga, no

76 Ravengar

78 Rosa de Saron

(Sine Calmon)

(Sine Calmon)

Deso l do morro/ No me canso de cantar


Deso l do morro/ Pois eu t na paz de Jah
Deso l do morro/ No me canso de cantar
Deso l do morro, riba/ Passo logo em
Ravengar
Quem pensa que o amor se acaba num
instante
No cr no Senhor, nem enxerga mais
distante
A Rosa de Saron pra melhor te dar o tom
Harmonia no mal/ Guitarra ou timbau
Quem pensa que o amor se acaba num
instante
No cr no Senhor, a estrela mais brilhante
Estrela de Davi, resplandecente na manh
Coisa igual nunca vi/ O brilho total

Eu sei que voce foi feita pra mim/ Nosso


amor nunca ter fim
Fomos feitos um pra o outro sim
Rosa de Saron que anda nos Vales
Que no sai do tom, todos os lugares, enfim
Eu vi o menino que falava besteira
Tire a touca, no marque bobeira
Pode vir, mas no vem de saci
Eu sei que no amor nao existe barreira
Tem sucesso na carreira
Atropelo na moral de Deus

77 Jogo Rpido
(Sine Calmon)
Dana, que eu quero ver/ Balana, que eu
quero ver
Suinga, que eu quero ver/ Com toda essa
multido
Dana, que eu quero ver/ Seleciona, que
eu quero ver
Cantando para viver/ Com toda essa
multido
jogo, jogo, jogo
jogo rpido pra danar
jogo simples de se jogar
jogo bom para ganhar
Dana, que eu quero ver/ Balana, que eu
quero ver
Suinga, que eu quero ver/ Com toda essa
multido
Dana, que eu quero ver/ Seleciona, que
eu quero ver
Cantando para viver/ Com toda essa
multido

172 l Brbara Falcn

79 Redemption Song
(Bob Marley)
Old pirates yes they rob I
Sold I to the merchant ships
Minutes after they took I from the bottom
less pit
But my hands was made strong
By the hand of the almighty
We forward in this generation triumphantly
All I ever had is songs of freedom
Wont you help to sing these songs of
freedom
Cause all I ever had redemption songs,
remdeption songs
Emancipate yourselves from mental slavery
None but ourselves can free our minds
Have no fear for atomic energy
Cause none a them cant stop the time
How long shall they kill our prophets
While we stand aside and look
Yes, some say its just a part of it
Weve got to fulfill the book
Wont you help to sing these songs of
freedom
Cause all I ever had redemption songs,
remdeption songs

80 Saia da Maresia
(Stir it Up de Bob Marley // Verso: Sine
Calmon)
Stir it up, little darling, stir it up
Para compor reggae assim, preciso
harmonia, amor
Para viver de boa, sim, e sair da maresia
Stir it up, little darling, stir it up
Para compor reggae assim, preciso
harmonia, amor
Para viver de boa, sim, e sair da maresia
Stir it up, little darling, stir it up
81 T A
(Sine Calmon)
T a pra todo casal, morro espiritual
Eu sei, no tem nada igual
Fogo na Babilnia, mais uma vez
Fogo na Babilnia, todos vocs
Eu vi um grande sinal
E sei que a vida legal
Jesus, o amigo total
82 Alm do Rio (O Rio Jordo)

Na cana no engenho/ Na cana no engenho/ Brasil, ou, ou, ou, Brasil/ Colonizar
esse pas/ Na cana no engenho/ Na cana
no engenho/ Na cana no engenho/ Na
cana no engenho
84 Primeira Bola
(Jorge Ax)
Queria saber se a saudade mata/ Queria
saber se vou suportar/ Eu queria saber
se vou ser bem chegado/ Se vou ser bem
chegado/ Por onde eu pisar/ Se vou conseguir tudo que quero/ Se vou mesmo meus
sonhos realizar/ No quero que seja pelo
contrrio/ Tenho muito medo de regressar/
Reviver tudo aquilo do passado/ Reviver
tudo aquilo que me fez chorar/ Mas vou pisar firme na estrada/ no quero pensar em
fracassar/ Vou entrar em campo de cabea
erguida/ E a primeira bola que vier vou
chutar/ Na primeira bola que sobrar vou
marcar o gol/ E a primeira bola que vier
vou chutar/ Na primeira bola que sobrar
vou marcar o gol

(Jorge Guedes)

85 Pelo Amor de Deus

O rio Jordo eu atravessarei

(Nengo Vieira)

Para as terras aonde os anjos esto a me


esperar

Pelo amor de Deus deixe o povo em paz/


No agenta de tanto penar/ Tanta histria
pra contar/ Nesse mundo co/ Nessa vida
quem vai sobrar?/ Pelo amor de Deus deixe o povo em paz/ No agenta de tanto
penar/ Tanta histria pra contar/ Nesse
mundo co/ Nessa vida quem vai pagar?/
Se canto Reggae/ Que nos deixa leve/ Pra
suportar toda situao/ Por todo tempo/
Em qualquer momento/ Te louvarei meu
Deus, de corao/ Mas um dia a vida vai
ento mudar/ Mas um dia a vida vai ento
mudar

Eu j posso ouvir um coro angelical cantar


Aleluia, mas o rio Jordo, eu vou atravessar
TIN TIM GOMES
PEDRA SOBRE PEDRAS // CD // INDEPENDENTE
83 Origens
(Edson Gomes)
frica/ frica, um continente/ frica, terra
da gente/ No navio viemos de l/ Colonizar
esse pas/ Na cana no engenho/ Na cana
no engenho/ Na cana no engenho/ Na
cana no engenho/ Brasil, ou, ou, ou, ou,
Brasil/ Colonizar esse pas/ A saudade
tambm mata/ E assim muitos morreram/
A distncia e a angstia/ Inimiga desses
homens/ Que no navio vieram de l/
Colonizar esse pas/ No navio vieram de l/
Colonizar esse pas/ Na cana no engenho/

86 Zenaide
(Peto/ Tin Tim Gomes)
Zenaide segura a onda/ Eu sei no comeo
foi maravilha/ Os dias esto passando/ E
a crise sempre aumentando/ Sou digno/
De boa famlia/ Com o tempo/ Vo se
ajeitando as coisas/ E trabalhando por dia
melhor/ Na minha boca eu sinto o suor/
O suor no rosto e eu trabalhando/ No fim

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 173

do dia eu sinto desgosto/ O suor no rosto


e nada no bolso/ Mas trabalhando por dia
melhor/ i Zenaide

cegos/ No sabem pra onde vo/ No, no,


no, no/ Com o guerreiro mor

87 Pedra Sobre Pedras

(Peto/ Carlos Reis)

(Edson Gomes)

Vem ver dentro de mim/ O meu sentimento/ E o meu desejo/ Voc no ouve minha
carncia/ Lcida e louca/ Teme morrer/ No
vazio da solido/ Vem e quebra a barreira/
Do desconhecido/ Me deixa beijar tua
imaginao/ Tudo sentimento/ Te levo
ao infinito/ Na imensido

Vai chegar o dia do juzo final/ Vai chegar o


dia do pai celestial/ Vai chegar o dia onde
no ficar/ Pedra sobre pedras/ Pedra sobre
pedras/ Ele vir/ Oh Jah/ Sobre uma nuvem/ Oh Jah/ Ele vir/ Oh Jah/ E descer/
Ele vir/ Oh Jah, O Cristo vir/ Ele vir/
Oh Jah/ E reinar/ Caiu sobre mim toda
uma cidade/ Oh people/ Toda envenenada
pela sociedade/ Caiu sobre mim toda uma
cidade/ Oh people/ Caiu a cobia, caiu a
maldade/ Mas vou vivendo na retido/ Jah,
Jah, Jah/ Proferindo as palavras vindas do
corao, meu Deus/ Help, Help
88 Dreads
(Peto/ Edson Gomes/ Tin Tim Gomes)
Na face do sol eu vejo o formato do teu
rosto/ E sinto logo na minha boca o teu
gosto/ E o sol derrama sua lgrima sobre
meu corpo/ Mas que pena/ As minhas dreads o que empata/ Que pena tua famlia
relata/ Que por voc me apaixonei/ Sei
que por voc me apaixonei, baby!/ Sei que
por voc me apaixonei/ Sei que por voc
me apaixonei, baby!
89 Guerreiro Mor
(Nengo Vieira)
Com o guerreiro mor/ Vamos sair na batalha/
No com sangue/ Mas com esprito/ E toda
babilnia a sistematizar/ Dragando tantas
almas/ Pra se alimentar/ Mas o redentor/ A
nos proteger/ Vem nos conduzir/ Vem nos
dar saber/ Pois o mundo hoje no sabe o que
faz/ Presos nos deleites/ Mortos so carnais/
E estes homens cegos/ No sabem pra onde
vo/ No, no, no, no/ Com o guerreiro
mor/ Vamos sair na batalha/ No com sangue/ Mas com esprito/ Se todo o meu querer/
Vem do nosso Senhor/ Pois sua fina flor/ o
seu amor/ Para nos remir/ Dessa maldio/
Nos trazendo a paz/ No seu corao/ Pois o
mundo hoje no sabe o que faz/ Presos nos
deleites/ Mortos so carnais/ E estes homens
174 l Brbara Falcn

90 Lenda

Com o corpo e a alma despidos/ Amanh


seremos lenda/
Amanh seremos lenda/ Amanh seremos
lenda
91 Por um Minuto
(Edson Gomes)
E a garota que era louca/ Louca por mim/
Fazia tudo pra ter/ Um pouco do meu
carinho/ E a garota que era louca/ Louca
por mim/ Fazia tudo pra ter/ Um minuto do
meu tempo/ Brinquei demais/ Ah, eu no
vi, no entendi/ No compreendi/ Tempo
passou ento eu vi/ Eu compreendi e dei
valor/ Era to bom, lembrar/ Recordar,
voltar atrs/ Mas o tempo passou/ E a
saudade ficou/ Mas o tempo passou/ S
lembranas deixou
92 Homem do Gueto
(Edson Gomes)
O homem do gueto/ Ras, Rastaman/ Sou o
homem do gueto/ Reggae/ Por isso eu canto
as coisas/ Nossas coisas, so nossas coisas/
Aonde quer que eu v/ Meu pensamento
est sempre l/ o meu povo, meu povo,
o meu lado/ Sempre o meu povo/ Sempre
o meu povo/ Sempre o meu lado/ Nossas
crianas esto sozinhas/ E nossas mulheres labutam tanto/ As nossas casas esto
caindo/ o meu povo soterrado/ o meu
povo, meu povo, o meu lado/ Sempre
o meu povo/ Sempre o meu povo/ Sempre
o meu lado/ Nossas crianas desnutridas/ E
as nossas mulheres desesperadas/ Os nossos
velhos abandonados/ O ganho foi pouco
quase nada/ o meu povo, meu povo,

o meu lado/ Sempre o meu povo/ Sempre o


meu povo/ Sempre o meu lado/ O homem
do gueto/ Ras, Rastaman/ Sou o homem do
gueto/ Reggae

Basta man, basta man, / Caia man,


caia man,

93 Bandeira Seca

Seja ele branco, preto, amarelado/ Cada


unidade nica a regar

(Peto/ Carlos Reis)


Como posso dormir em paz/ Se a fome
crucifica/ O sorriso em gemido/ Como posso dormir em paz/ Se a ignorncia ainda
cala/ A expresso dos meus irmos/ Oh,
no/ Como posso dormir em paz/ Bandeira
seca racha de sede/ Por justia/ Bandeira
seca no mais verde/ Injustia/ Bandeira
seca racha de sede/ Guerreiro faminto atira/ Guerreiro faminto no acredita na paz

Todo p rapado tem o mesmo direito de


comer, viver e trabalhar

Basta man, basta man, / Caia man,


caia man,
Segue sua vida sempre atravessando/ As
dificuldades sem se lamentar
Lamentos, palavras, pedaos de vida/ E
sem falar na lida dura de amargar
Basta man, basta man, / Caia man,
caia man,
96 Lils

2001

(Djavan)

SINE CALMON

Amanh outro dia, lua sai ventania/ Abraa uma nuvem que passa no ar

EU VEJO // CD // ATRAO FONOGRFICA


94 Me Oua
A solido chegou at voc
trazendo desespero e aflio
de mais carinho e amor voc precisa
ao teu redor ningum te estende a mo
algum te abandounou perante a Vida
deixou sangrando assim teu coro
huumm yah yah...
Me oua um verdadeiro amor nunca
esquece
porm tudo suporta tudo padece
e sempre est presente pois o prprio amor
me oua o exemplo desse amor to claro
como a luz
o mundo todo viu
patente numa cruz
vertendo sangue puro de Jesus!
95 Basta Man
(Nengo Vieira)
Vamos regar, vamos brincar/ Vamos cantar, vamos danar
Vamos tocar, i i i/ Caia na dana
Salvador

Beija, brinca e deixa passar/ E no ar de


outro dia, meu olhar surgia
Nas pontas de estrelas perdidas no mar/
Pra chover de emoo trovejar
Raio se libertou ou clareou muito mais/ Se
encantou pela cor lils
Prata na luz do amor, no cu azul/ Eu
quero ver o por do sol
Lindo como ele s/ E gente pra ver e viajar
No seu mar de raios
97 Chegada
(Nengo Vieira)
Todo dia amanheo s pensando em voc
meu bem
Nunca mais eu esqueo tanto bem que
voc, me fez
Ainda ontem voc quase me abandonou,
no faa assim.
Eu no agento esse frio sem o leve calor
da sua presena to!
Na chegada do avio/ Corro logo pra te
encontrar a saudade me aperta aqui
Quero logo te abraar/ E beijar

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 175

98 Jeov Jir
(Sine Calmon)
As portas do cu vo se abrir e a natureza
ir sorrir/ Quando voc chegar amor/
Eu sei que a vida faz brilhar/ O alfa e o
mega no ar/ Fortalece o meu cantar
Mais uma vez/ Vou cantar/ De uma s vez/
Vou chegar, vou chegar
Cheguei, cheguei, cheguei
As flores brincam em meu quintal e as borboletas no varal/ Me faz lembrar voc amor
Eu sei que belo o caminhar/ E a palavra
do verbo amar/ Amo voc, amor, amor.
Mais uma vez/ Vou cantar/ De uma s vez/
Vou chegar, vou chegar
Cheguei, cheguei, cheguei
As portas do cu vo se abrir e a natureza
ir sorrir/ Quando voc chegar amor/ Eu
sei que belo o caminhar/ E a palavra do
verbo amar
Amo voc, amor, amor
Mais uma vez/ Vou cantar/ De uma s vez/
Vou chegar, vou chegar
Cheguei, cheguei, cheguei

nunca me querer
Mas agora no quero saber/ E sabe
muito tarde pra voc
Tarde, tudo morreu/ Tarde/ Tarde, tudo
morreu/ Tarde
Agora ento no quero mais saber de voc
no/ Eu no tenho mais tempo pra perder
Agora ento no quero mais saber de voc
no/ Eu no tenho mais tempo pra perder
No tenho tempo, eu no tenho tempo
Todo mundo aqui sabia/ De todo aquele
amor que eu tinha
S voc no quis saber/ Fingindo no ter
nada a ver
Olhe eu sei do seu desejo/ Eu sempre
soube do seu peito
Mas agora no quero saber/ E finja sempre
nunca me querer
Mas agora no quero saber/ E sabe
muito tarde pra voc
Tarde, tudo morreu/ Tarde/ Tarde, tudo
morreu/ Tarde
Agora ento no quero mais saber de voc
no/ Eu no tenho mais tempo pra perder
Agora ento no quero mais saber de voc
no/ Eu no tenho mais tempo pra perder
No tenho tempo, eu no tenho tempo
100 Vibrao Positiva

EDSON GOMES

(Edson Gomes)

ACORDE, LEVANTE, LUTE // CD //


ATRAO FONOGRFICA

Oh, people, oh Babilnia/ Escute nossa


melodia Reggae
Escute a msica nativa/ Vibrao positiva
Rasta/ Reggae music / Reggae Rasta/ Reggae music/ Reggae frica
Oh people, oh Babilnia/ Escute nossa
melodia Reggae
Esculte a msica nativa/ Vibrao positiva
Rasta/ Babilnia praga
Natty dread, natty dread, natty dread
Babilnia praga
Rastaman, Rastaman, Rastaman

99 Tarde
(Edson Gomes)
Quando fiz voc minha rainha/ E te dei
todo amor que tinha
Voc no quis compreender/ Fingindo no
ter nada a ver
Quando te falei da situao/ Quando te
falei do meu corao
Voc no quis compreender/ Fingindo no
ter nada a ver
Todo mundo aqui sabia/ De todo aquele
amor que eu tinha
S voc no quis saber/ Fingindo no ter
nada a ver
Olhe eu sei do seu desejo/ Eu sempre
soube do seu peito
Mas agora no quero saber/ E finja sempre

176 l Brbara Falcn

101 Sandra
(Edson Gomes)
Fica to calada/ Zangada assim
Passa e nem me fala oi/ Fica to calada
Zangada assim/ Passa e nem me olha
Mudou minha msica/ Tornou-se musa
nica
Minha inspirao/ Dona do meu corao

Sandra, minha namorada/ Sandra, minha


namorada
Assim voc me mata/ Assim voc me
acaba
Me destri/ Assim vc me mata/ Assim vc
me acaba
102 Sangue Azul
(Edson Gomes)
Eles queriam um mundo s de azul
S de azul, s de azul, s de azul
Eles queriam, e como eles queriam
Eles queriam que fossemos apenas objeto
sexual/ Objeto Profissional
Eles queriam, e como eles queriam
Mas o poder, que vem do alto/ No planejou assim
E ns crescemos, nos espalhamos/ E aqui
vamos ns, caminhando
Em cada esquina, em cada praa, nos
becos da cidade
Mesmo que o rdio no toque, mesmo que
a TV no mostre
Aqui vamos ns, cantando reggae,
aleluia Jah!
103 Me Abrace
(Edson Gomes)
Deixe disso menina/ Chegue junto minha
filha
Me d um sorriso, me abrace/ Me abrace
Sei que estive muito longe/ Quando estou no
reggae
Eu fico longe/ Eu estive muito longe
Quando estou no reggae/ Eu fico longe
(longe)
Mas agora estou aqui (bem perto)/ Bem
pertinho pra sentir (my love)
Pra voc no reclamar/ Vou lhe dar o meu
carinho ( justo)
Vou cuidar/ Vou chegar junto de vez
Pra voc se orientar, baby/ Pra voc se ajustar
Sei que estive muito longe/ Quando estou no
Reggae
Eu fico longe/ Eu estive muito longe
Quando estou no Reggae/ Eu fico longe
(longe)
Nosso amor tem tanto tempo (muito tempo)
No podemos nos perder, no/ Voc vive a
reclamar

Eu tambm estive muito tenso (muito tenso)/


Melhor ento eu dar um tempo
Pra voc se relaxar, baby/ Namorar e delirar
Eu estive muito longe/ Quando estou no
Reggae
Eu fico longe/ Sei que estive muito longe
Quando estou no Reggae/ Eu fico longe
104 Mundo Perdido
(Edson Gomes)
Nossas vidas nas ruas j no valem nada
Ningum sabe se est vivo na prxima
parada
tanta lama, tanto vcio, tanto oportunismo
Ningum sabe se estar vivo no prximo
domingo
Essa vida aqui na terra j no faz sentido
L em Braslia ningum cumpre compromisso
So tantos gatos, tantos ratos corroendo
os partidos
Novamente Braslia/ Ningum tem compromisso, ningum
Sociedade falida, os bons costumes falidos,
os trabalhadores falidos
Aposentados falidos, nossa segurana
falida, nossa segurana
A nossa educao falida, os professores
falidos, salas de aulas falida.
A juventude falida, a nossa previdncia
falida
Significa que nossa sade est toda
ofendida
As ruas andam cheias de hipcritas
105 O Pas Culpado
(Edson Gomes)
No existe nenhum lugar, pra ir/ S Jesus
pode nos salvar
Somos senhores das favelas/ Somos
senhores da pobreza
Falta alimento em nossas mesas/ Concluso, o pas culpado
Quando o Mestre ento voltar/ Quando o
Mestre nos resgatar
Enquanto no vem/ Somos senhores das
caladas, enquanto no vem
Somos senhores das sinaleiras, enquanto
no vem

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 177

Superlotamos as penitencirias, concluso,


o pas culpado
Somos sobreviventes do tempo/ Somos
filhos da santa esperana
Somos passivos resistentes/ Mergulhados
em toda essa lama
A razo do nosso viver, meu Deus/ Teu
Filho, que vem nos salvar
Enquanto no vem/ Somos os analfabetos,
enquanto no vem
Orgulhosos, indiscretos, enquanto no
vem/ Grandessssimos idiotas
Concluso: o pas culpado!/ O pas
culpado!
O pas culpado, sim!/ O pas culpado!
O pas culpado, sim!/ O pas culpado!
106 Inverso
(Edson Gomes)
Eu fui carneiro, eu sou leo/ De domador,
virei a fera
Eu fui as lgrimas, eu sou o riso/ Eu fui a
gua, eu sou a pedra
Ontem eu queria, eu sou querido/ E se
amava, eu sou amado
Eu fui o palco, eu sou plateia/ Eu fui o
alvo, sou o atirador
De domador, virei a fera/ De caador, virei
a caa
De pescador, virei a pesca
Eu fui a gua, eu sou a pedra
So as coisas da vida, so as coisas do
mundo
So as coisas da vida, elas modificam tudo
107 Ira
(Edson Gomes)
H confuso na cidade/ H confuso na
cidade
Violncia, conflitos/ Mercenrios, ripocritis
Hipcritas, ripocritis/ Hipcritas
Profetas, religiosos/ Promessas de polticos
Todos visam, o capitalismo, o capitalismo
O capitalismo, o capitalismo
Vigaristas disfarados/ Homem sutis,
ripocritis
Hipcritas, ripocritis/ Hipcritas
So vistosos, so queridos/ So artistas,
inimigos

178 l Brbara Falcn

Eles visam tambm, o capitalismo


O capitalismo, o capitalismo/ O capitalismo, o capitalismo
Me sinto fraco, envelhecido/ E, corro perigo
Os inimigos querem me destruir/ Dizem,
que falo demais
Os inimigos querem acabar comigo
Oh, Deus dos justos/ Por favor venha me
socorrer/ Oh, Deus dos justos/ Oh Deus...
Toque apenas, com as pontas dos teus dedos/ E tudo se resolver, tudo se resolver
E tudo se resolver, o povo se acalmar/
Senhor Deus
Toque apenas, com as pontas dos teus dedos/ E tudo se resolver, tudo se resolver
E tudo se resolver/ A ira ento passar/
Senhor Deus
Oh, Deus dos justos/ Por favor venha me
socorrer/ Oh, Deus dos justos/ Oh Deus...
Toque apenas, com as pontas dos teus dedos
E tudo se resolver, tudo se resolver/ E
tudo se resolver
O povo se acalmar/ Senhor Deus
Toque apenas, com as pontas dos teus
dedos
E tudo se resolver, tudo se resolver/ E
tudo se resolver
A ira ento passar/ Senhor Deus
Toque apenas, com as pontas dos teus
dedos
E tudo se resolver, tudo se resolver/ E
tudo se resolver
O povo se acalmar/ Senhor Deus/ Toque
apenas
108 Linda
(Edson Gomes)
Democracia vem libertar esse povo
brasileiro, democracia (vem libertar, vem
libertar)
(Aqui tu existe mas) Nunca saiste do papel
(Aqui tu existe) Porm ningum nunca te viu
(Aqui tu existe mas) Nunca saiste do papel
(Aqui tu existe mas) Onde ests? Onde
ests? Prisioneira
Quero fazer greve e no posso (no posso-o)/ Quero sonhar e no posso sonhar
Eu Quero gritar e no posso/ Revindicar eu
no posso (no posso-o)
Me rebelar, eu no posso me rebelar/ Eu
quero contestar e no posso

(Aqui tu existe mas) Nunca saiste do papel


(Aqui tu existe) Porm ningum nunca te viu
(Aqui tu existe mas) Nunca saiste do papel
(Aqui tu existe mas) Onde ests? Onde ests?
E l no papel tu s linda, s to bonita/ L
no papel tu s linda, s to bonita
E l no papel s linda, s linda, linda
109 Etipia
(Edson Gomes)
Quando Mussolini invadiu a Etipia/ Aquela batalha to brutal
Sim o general invadiu a Etipia/ Batalha
sangrenta desigual
Ah, Etipia dos etopes, massacrada./ Ah,
Etipia dos etopes
L na escola no contaram nada/ Fizeram
questo de esconder
Hoje eles passam como filhos do Deus bom/
A gente vai passando como filhos do mau
Ah, Etipia dos etopes, brutalizada/ Ah,
Etipia dos etopes
Quando Mussolini invadiu a Etipia/ Foi o
rolo compressor esmagador
Com seu exercito poderoso/ Contra inofensivos guerreiros nativos
Ah, Etipia dos etopes, fuzilada/ Ah, Etipia dos etopes, Mussolini
Conquistador da Etipia (Mussolini)/ Rolo
compressor da Etipia
110 Fogo na Babilnia
A Babilnia anda aflita/ Anda muito mais
do que aflita
Agora eu boto fogo de vez/ Eu sou o
incendirio do sistema
Eu sou o incendirio do sistema/ Olha,
minha querida,
No tenha medo/ Olha, minha querida,
No tenha medo/ Aquele mesmo Senhor
Que tantas falei/ Ele sempre estar aqui
Ele sempre estar comigo/ Olha, minha
querida,
No tenha medo/ Olha, minha querida,
No tenha medo/ Se por acaso o sistema
(sistema, sistema)
Quiser tirar minha vida/ Talvez at possa
conseguir

Porm, minha alma, nunca (never)/ Porm, minha alma, nunca (never)
Eu sei, eu sei, eu sei/ Eu sei, eu sei, eu sei
Toda a brutalidade vir (brutality)/ A brutalidade vir/ Sei
Toda a brutalidade vir (brutality)/ A
brutalidade vir
Eu toco fogo/ Eu toco fogo/ Eu toco fogo
Eu ponho na Babilnia
Eu toco fogo/ Eu toco fogo/ Eu toco fogo
Eu ponho na Babilnia
Se por acaso o sistema (sistema, sistema)/
Quiser tirar minha vida
Talvez at possa conseguir/ Porm, minha
alma, nunca (never)
Porm, minha alma, nunca (never)/ Eu sei,
eu sei, eu sei/ Eu sei, eu sei, eu sei
Toda a brutalidade vir (brutality)/ A brutalidade vir/ Sei
Toda a brutalidade vir (brutality)/ A
brutalidade vir
Eu toco fogo/ Eu toco fogo/ Eu toco fogo/
Eu ponho na Babilnia
Eu toco fogo/ Eu toco fogo/ Eu toco fogo
Eu ponho na Babilnia
111 Homens Lixo
(Edson Gomes)
Ao longo dos anos sempre foi assim/ Homens malditos, homens lixo
Levando o povo ao desespero/ E ficando
louco pelo dinheiro
Quem deveria saber nos conduzir/ Hoje
nem sabe como prosseguir
Os homens do mundo agora piraram, eu
acho/ E ralam as caras na graxa do tacho
Na minha tica, eles no passam de lixo/
O compromisso, nunca zelaro por isso
Por isso que a gente passa o que passa/
Por isso que a gente paga altas taxas
Mas uma luz um dia vai brilhar/ Pra renascer a esperana
Pois vejo o povo na rua sem graa/ Velhos
semblantes sentados na praa
Mas com certeza o quadro vai mudar/ Com
a pura certeza eles vo pagar
Mas pensam que podem fugir do castigo,
meu pai/ Eles pensam que podem conter
o perigo

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 179

112 Barrados
(Edson Gomes)
Ando meio cansado (no desisto) / Por vrias vezes barrados no baile (ainda insisto)
Acredito em tudo aquilo que fao / E
persisto em tudo aquilo que fao
Acredito naquele que vem do espao /
Ainda ontem no condominio que moro
Uma senhora quando me avistou/ Apertou
a bolsa, ela escondeu sua bolsa
Apertou a bolsa, a branca segurou logo a bolsa
So cenas da minha cidade uma doena
da sociedade
Cenas da minha cidade uma doena talvez
incurvel e
Voc a como passa/ Voc a o que acha e
Voc a como passa/ Voc a o que acha disso
Somos barrados no baile, todos barrados no
baile/ Eles dizem que s para gente bonita
Somos barrados no baile, todos barrados no
baile/ Eles dizem que s para gente bonita
So cenas da minha cidade, uma doena
da sociedade
Cenas da minha cidade, uma doena
talvez icurvel
E voc a como passa/ Voc a o que acha
E voc a como passa/ Voc a o que acha
disso
Somos barrados no baile, todos barrados no
baile/ Eles dizem que s para gente bonita
Somos barrados no baile, todos barrados no
baile/ Eles dizem que s para gente bonita
Acredito em tudo aquilo que fao / E
persisto em tudo aquilo que fao
Acredito naquele que vem do espao/
Deus de Abrao, Jac, Issac vir
E nele toda minha esperana de paz, sade e alegria/ Oh, Jah, Jah, Jah, Jah, Jah
113 Bibliotecas Pblicas
(Edson Gomes)
As bibliotecas pblicas andam cheias de
coisas que nunca irei usar
Os seus livros andam cheios de histrias,
so contos que nunca irei contar
Porque, brother, eu no quero/ Porque,
brother, no eu no quero
Quero saber porque o povo vive assim/ Eu
quero saber porque a lei tanto oprimida-a
Preciso saber porqu na mesa falta a
180 l Brbara Falcn

comida/ E quero saber se a gente vai ser


feliz na vida
De que vale tanto saber, de que vale o
homem ter tanto saber?
114 Camel
(Edson Gomes)
Sou camel, sou de mercado informal/
Com minha guia sou, profissional
Sou bom rapaz, s no tenho tradio/ Em
contrapartida sou, de boa famila.
Olha doutor, podemos rever a situao/
Pare a polcia, ela no a soluo, no
No sou ningum, nem tenho pra quem
apelar/ S tenho o meu bem que tambm
no ningum
Quando a polcia cai em cima de mim/ At
parece que sou fera
Quando a polcia cai em cima de mim/ At
parece que sou fera
At parece, at parece
115 Alma
(Edson Gomes)
Eles dizem, que quando a gente morre vai
pro cu
E vai bem pra perto do senhor
Fazendo as oraes consegue o cu
A alma vai pra junto do senhor
So mentirosos hipcritas/ So mentirosos
hipcritas
Dizem que os mortos falam com os vivos/
Que vem pra dizer como esto
Mesmo eles dizendo ningum quer/ Mesmo
sabendo ningum quer
Pro cu, pro cu, pro cu ningum quer
ir no
Pro cu, pro cu, pro cu/ Pro cu, pro
cu, pro cu/ Pro cu, pro cu, pro cu
Fique atento meu amigo, fique/ Para as
coisas que eles dizem,
Fique atento e olho vivo (olho vivo)/ Eu
insisto e tambm fico
So mentirosos hipcritas/ So mentirosos
hipcritas
116 Amigo
(Edson Gomes)
Amigo/ Meu amigo/ Olha o mundo como
esta/ Todo perdido

Em conflitos de geraes/ Olha o mundo


como esta cheio de inimigos
Violentos e esto sedentos/ Olha como
estao correndo/ Em busca do sangue
Dos inocentes/ Irmos da gente/ Estado
contra estado/ Nao contra nao
Todos correm perigo/ Irmos contra irmos
Filhos matando pai/ Fome, calamidade,
peste/ O mundo do co
Tudo me faz sentir/ Tudo me leva a cr/
Tudo me faz sentir/ Tudo me leva a cr
A destruio do mundo j est aqui, a
Tudo me faz sentir/ Tudo me leva a cr/
Tudo me faz sentir/ Tudo me leva a cr
Olha o fim do mundo baby j esta aqui, a
Em conflitos de geraes/ Olha o mundo
como esta cheio de inimigos
Violentos e esto sedentos/ Olha como
esto correndo
Em busca do sangue dos inocentes/ Irmos
da gente
Estado contra estado/ Nao contra nao
Todos correm perigo/ Irmos contra irmos
Filhos matando pai/ Fome, calamidade,
peste/ O mundo do co
Tudo me faz sentir/ Tudo me leva a cr
Tudo me faz sentir/ Tudo me leva a cr
A destruio do mundo j est aqui, a
Tudo me faz sentir/ Tudo me leva a cr
Tudo me faz sentir/ Tudo me leva a cr
Olha o fim do mundo baby, j est aqui a...
117 Amor Perdido
(Edson Gomes)
Esse amor que logo me esqueeu/ No
quero mais saber, no
Eu no quero mais viver, no/ Esse amor
que logo me esqueeu
No quero mais saber, no/ Eu No quero
mais viver, no
Tudo j passou, baby, j era nosso amor
Tudo terminou, baby, j era , j passou
Esse amor perdido/ Amor sem compromisso
Esse amor perdido/ Amor sem compromisso
Baby, voc no tem razo/ Baby, rasgou
meu corao
Baby, voc no tem perdo/ Baby, feriu
meu corao
Se voc voltar, baby, no vai mais me
encontar

Se voc voltar, baby, vai ter outra em


seu lugar
118 Ana Maria
(Edson Gomes)
Sinto saudade de voc/ Sinto Saudade de
voc
Meu eterno amor/ Eu gostaria de ficar
Com voc um pouco mais/ Mais amanh
bem cedo eu tenho que parti
Amanha bem cedo eu tenho obrigaes a
cumprir
Eu gostaria de ficar com voc um pouco
mais/ Mais essa cidade tranqila
Ela morta demais/ Eu gostaria que ela
fosse um pouco mais movimentada
Que ela tivesse muitas fbricas/ Cheia de
chamins
Cheia de chamins / Cheia de chamins
Eu sei que ela seria poluda/ Mais em
compensao seria mais tranqilo, meu
corao
Que sofre por ter que ficar mais tempo
longe de voc/ Sem falar, menina sem falar
Na grama de senta e fica leve/ Na grama
de senta e fica leve
Ana Maria, meu bem / O nosso amor s no
ms que vem
Ana Maria, meu bem / O nosso amor s no
ms que vem.
Eu liquido as prestaes, e tranqilizo
nossos coraes.
Eu liquido as prestaes, e tranqilizo
nossos coraes.
Ana Maria, Ana Maria / Eu volto logo pra voc
Ana Maria, Ana Maria / Eu volto logo pra voc
Eu sei que ela seria poluda/ Mas em
compensao seria mais tranqilo, meu
corao
Que sofre por ter que ficar mais tempo
longe de voc/ Sem falar, menina sem falar
Na grama de sempre, Fica leve/ Na grama
de sempre, Fica leve
Ana Maria, meu bem / O nosso amor s no
ms que vem
Ana Maria, meu bem / O nosso amor s no
ms que vem.
Ana Maria, Ana Maria / Eu volto logo pra voc
Ana Maria, Ana Maria / Eu volto logo/ Ana
Maria, Ana Maria

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 181

119 Arca da Fuga


(Edson Gomes)
No posso perder o trem, que vai pro
alm, no,no,no
Eu no posso perder meu bem, e o trem
j vem
Se voc vem,vem,vem,vem agora
Se tem olhos, veja/ Se voc vem, tenha
pressa, corra
Se tem ouvidos, oua (a trombeta)/ No
sei o dia, no sei a hora
O momento pode ser agora / No sei o
dia, no sei a hora
O momento pode at ser agora (Jah!)/
Voc est brincando, est distrado
Assim como esteve o povo antigo/ Deus
avisou, No construiu
A arca da fuga, seu povo viveu/ Foram
oito almas salvas
Voc est bebendo, est se drogando/
Assim tambm era no mundo antigo
Deus avisou, No construiu/ A arca da
fuga, desperta Brasil!
Para no ser pego de surpresa!
120 Babylon Vampire
(Edson Gomes)
Oh yeah, now (Oh yeah, now)/ Babylon
Vampire
Moro na Babilnia/ Mas no sou daqui
Vivo na Babilnia/ Mas no sou daqui.
No dobro meus joelhos/ Diante de
imagens
No sigo seus conselhos/ Nem meu Deus
estrangeiro.
No creio que eles/ Possam me ajudar/
No creio que eles/ Possam me salvar
Um dia encontrei/ Um certo Senhor/ Que
muito me falou
Tantas coisas me ensinou/ No matai,
filho/ No roubai, filho/ No condenai,
filho/ No julgai
Oh yeah, now (Oh yeah, now)/ Babylon
Vampire
Moro na Babilnia/ Mas no sou daqui
Vivo na Babilnia/ Mas no sou daqui
Mesmo que, eu venha parecer/ Mesmo
que, parea ser assim
Mesmo assim, no v se confundir
Jesus luz, luz, luz, luz/ ( luz, Jesus
182 l Brbara Falcn

luz) Oh now!
Jesus luz, luz, luz, luz/ ( luz, Jesus luz)
Moro na Babilnia/ Mas no sou daqui/
Vivo na Babilnia mais no sou daqui
Mesmo que eu venha parecer/ Mesmo que
parea ser assim
Mesmo assim no v se confundir/ Eu no
sou, no, no, no
No sou/ No sou da Babilnia/ No, brother
121 500 Anos
(Edson Gomes)
H 500 anos que/ Eu no tenho vida/ H
500 anos que/ A alma est ferida
No tenho dvidas, dvidas/ Minha conduta a fulga/ H 500 anos que vivemos
de mentira
H 500 anos que a mesma mentira/ No
tenho dvidas, dvidas
Minha conduta a fulga/ O corpo do ndio
tomba/ O corpo do negro dana
A espada se levanta/ Transpassando as
crianas/ Os ndios em desgraa
Os negros em mancadas/ H 500 anos
que/ Estou fora dos planos
H 500 anos que/ Eu venho mendigando/
E mesmo assim as migalhas
E mesmo assim so migalhas/ Meu corao
se aperta
Meu corao desperta/ Meu corao deseja/ Meu corao peleja
Por minha liberdade/ Total nessa cidade
H 500 anos eu/ Trabalho para os brancos
H 500 anos eu/ Vivendo nesse engano
Sobrevivncia dura/ Na resistncia pura /
Quero provas/ Eu quero provas
Sou a prova/ Eu a prpria prova
NENGO VIEIRA
MATA ATLNTICA // CD // INDEPENDENTE
122 Roda Pio
(Nengo Vieira)
Roda, roda, pio/ Na roda da vida
Roda tudo que ele poderia ter
Fora o mundo que ele tem pra merecer
Erguer com trabalho e a dureza da servido
Sobrevive permanente na escravido
Perde a vida pra poder ganhar o po

Ningum liga se ele vai mudar ou no


Vem, Roda, roda, pio/ Na roda da vida
Trabalhador com muito amor/ Vive na paz
de Deus
Na luz do Senhor que alivia a dor/ Que
forte demais
Mas a pureza e a beleza do seu corao
mais que tudo, que qualquer dinheiro/
Da grande nao
123 A Vida
(Nengo Vieira)
A vida l fora, no!/ No presta pra ficar legal
Luxria, vaidade sim/ Quer tomar conta
desse lugar
Dance Reggae Music / Dance Reggae Music Now/ Dance Reggae pra ficar bem
Ento venha e conhea sim/ Do fruto da
vida que vem de Deus
O perdo faz bem sim/ Quando libera no
corao, vem!
124 Caminho
(Nengo Vieira)
Vem pro caminho cantar/ Vem pro caminho danar, Reggae!
Deixe tudo agora e vem/ No, no olhe
para trs
Jesus pode mudar voc tambm/ A luz
pode brilhar
Voc meu bem, yeah!/ Tira do Egito sim/
Te transporta pro Jardim
Pro reino celestial do seu amor/ Pro reino
celestial do seu amor
Ento vem cantar assim
125 To Bom
(Nengo Vieira)
Tudo bem/ Sem voc no vivo s, meu
bem
H quem diga que o amor no vai vencer
essa dor/ Que eu sinto por voc
Passam frios, tempestades/ Mas a f no
vai passar
Pois o Deus da criao/ Nunca me desamparou
Se voc no viveu, se voc no sacou/
Esse Deus de amor, esse Deus de f
Nunca me abandonou, nem me desampa-

rou/ Sempre deixa-me em p/ Na certeza


da f
to bom, que bom bom/ Que bom/ to
bom, que bom bom /Que bom/ to bom!
126 Shalon
(Nengo Vieira/ Brbara Falcn)
Do you say love, yeah/ If you have love
in Jah
Cry so baby/ But Im happy loving Jah/
Jah, Jah, children, yeah
But dont forget when I say/ Dont forget
when you know
If you have love in Jah/ Jah, Jah, Jah
children, yeah
Jesus my love, yes/ Jesus my life, this is
my lord
Shalon, sha la la, Shalon
Do you say yes/ If you have love in Jah/
Cry so baby
But Im happy happy loving Jah
So dont forget when I say/ Dont forget
when you know
If you have love in Jah/ Jah, Jah, Jah
children, yeah
Jesus my love, yes/ Jesus my life, this is
my lord
Shalon, sha la la, Shalon
127 Rub-A-Dub de Jah
(Nengo Vieira)
Assim como Daniel desceu na cova dos
lees/ Assim como Davi venceu Golias das
naes
Assim como Elias fez descer fogo do cu/
Assim como Sanso julgou o povo de
Israel
Assim como o Senhor criou a terra, os rios,
os mares/ Derramou na cruz o preo da
sua vida
S pra te fazer um dia vencedor/ Tirou
aquele que andava pelas densas trevas
Transportou pra luz que agora ele enxerga/
a luz de Deus que plena e total!
128 Mata Atlntica
(Nengo Vieira)
No, no, no mate as matas/ No, no
desmate as matas no
No, no, no mate a mata atlntica/

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 183

Quando Cabral chegou e aqui ele encontrou


Prata beleza ouro, Pau Brasil/ E sem falar
do ndio dono desse lugar
Homem da nossa Terra no tem onde
morar
Oh, homem/ Enquanto voc destri e consome/ Todos recursos naturais / Da Terra
Que clama por socorro/ E chora em agonia
/ Biodiversidade, ar puro, gua potvel
E sem falar das plantas de uso medicinal/
Micos leo-dourados, macucos, onas
pintadas
Todos correm perigo de sua extino / Oh,
homem/ Enquanto voc destri
E consome/ Todos recursos naturais / Da
Terra/ Que clama por socorro/ E chora em
agonia

transformar/ Que hoje dia de alegria


Hoje dia de vitria/ Olha a vida aqui
presente /S no v quem ainda no
sente, yeah!
Por isso/ Chama no apaga no/ Chama
no apaga no
Comer do fruto do trabalho que satisfao/
Viver na alegria que meu Deus nos deu
ento!
Meu Deus j veio pra nos lavar/ E aqui
quer te avisar/ Que hoje dia de alegria
Hoje dia de vitria/ Olha a vida aqui
presente/ S no v quem ainda no
sente, yeah!

129 Reggae Music

Nessa mar mansa a gente pode se dar


bem
Nesse sol brilhante/ A gente pode recomear
No diga que o nosso amor/ Que um dia
se acabou/ Que a gente no pode mais
viver
Se o mundo ja tem paz/ Com Deus voc
capaz /De tudo novo recomear
Nessa mar mansa a gente pode se dar
bem
Nesse sol brilhante/ A gente pode recomear
Agora tudo mudado, voc sempre ao meu
lado/ Sorrindo pra gente se amar
Se a noite uma criana/ Pra quem tem a
esperana
De ver a vida e um mundo melhor
Nessa mar mansa a gente pode se dar
bem
Nesse sol brilhante/ A gente pode recomear

(Nengo Vieira)
Reggae, Reggae, Reggae Music/ Reggae,
Reggae, Reggae Music Now
Reggae, Reggae, Reggae Music/ Reggae,
Reggae, Reggae Music Now/ Now, now,
now, now
Que bom cantar Reggae/ A msica de
Deus/ Que bom cantar Reggae
A msica do amor/ Para esquecer a dor
desse sistema
E seus problemas, meu bem/ Que tanto
oprime a gente assim
Por isso eu canto, dano/ Canto, canto,
canto, dano
Por isso eu vou cantando/ Vou regando no
balano
No balano do Reggae/ Pra cantar Reggae,
Oh Lord!/ Pra cantar Reggae

131 Mar Mansa


(Nengo Vieira)

2006

132 Oh, Yes

NENGO VIEIRA

(Nengo Vieira)

CHAMA// CD // INDEPENDENTE // SELO


BOLA MUSIC

Tudo o que quisera ter/ Um dia eu terei


Nem que seja um cantinho/ L no meu
serto
Pra plantar amor e colher/ Da terra o feijo
Saciar a sede e viver/ De boa vibrao e
eu/ Tudo o que eu quiser colher
No esperarei acontecer/ Vou botar a mo
na massa e fazer/ Desfrutando a paz de Deus
Resgatando os filhos seus/ Na doura da

130 Chama
(Nengo Vieira)
Chama no apaga no/ Chama no apaga
no
Essa alegria acesa e viva no meu corao/
Trazendo boas novas pra tirar voc do cho
A luz j veio pra iluminar/ E aqui quer te
184 l Brbara Falcn

palavra amor, Oh, Yes


Atravs da nossa cano/ Acorde pra
ver/ Maravilhas que Deus criou/ Desde o
amanhecer
Chuva vento neve vapor/ A Lua e o mar/
At meu benzinho mandou/ Pra me confortar e eu
Tudo que eu quiser colher/ No esperarei
aoontecer /Vou botar a mo na massa e fazer
Desfrutando a paz de Deus/ Resgatando
os filhos seus/ Na doura da palavra Amor/
Oh, yes
133 Ol Amigo
(Nengo Vieira)
Ol,/ Ol amigo/ Como voc tem vivido
nessa vida curta aqui?
Ol,ol,ol/ Ol,amigo/ O que voc tem
sentido pra fazer voc feliz?
Veja a cidade / Cercada de medo nas ruas
/ S desespero/ Violncia todo dia
Nossos polticos no valem nada mais /
Quantas promessas / Que jamais foram
cumpridas
Que sinal voc me traz?/ Que esperana
capaz?/ De lhe dar a chance pra voc
vencer
S o Senhor pode clamar/ S Jesus Cristo
vai te dar/ Vida abundante pra voc viver
134 Paraso
(Pimpers Paradise, Bob Marley // Verso: Nengo Vieira)
O amor chegou/ Trazendo boas novas por aqui
Nos libertou das potestades das trevas, sim
Com muito amor/ Suportou dores, enfim
Mas para isso preciso amor/ Pro seu
paraso/ Vai nos levar/ Pro seu paraso/ Vai
nos guiar
Todo dia ora sempre a Jesus/ Todo dia ora
sempre na luz
135 Paz e Amor
(Nengo Vieira)
Para viver a gente que trabalhar/ Para
comer a gente tem que semear
Para vencer teremos muito que lutar/ E
quando o Sol se despertar
A gente vai se encontrar/ Pra tomar banho
nesse mar azul

O sol no cu nos aquecer/ Nesse dia que


prazer
Deus criou pra gente desfrutar / Nesse
lugar/ A gente tem que trabalhar
Para comer a gente tem que semear/ Para
vencer teremos muito que lutar
E quando a noite vem chegando/ E o dia
terminando
As aves do cu se recolhendo/ As estrelas a
brilhar/ Vem a Lua iluminar
Nosso cu to lindo igual no h/ Pra
namorar a gente tem que se amar
Para viver a gente tem que semear/ Para
vencer teremos muito o que lutar
Guerra nunca mais no/ Guerra nunca mais
dor/ Guerra nunca mais/ S Paz e Amor
136 Pelo Amor de Deus
(Nengo Vieira)
Pelo amor de Deus deixe o povo em paz/
No agenta de tanto penar/
Tanta histria pra contar/ Nesse mundo
co/ Nessa vida quem vai sobrar?
Pelo amor de Deus deixe o povo em paz/
No agenta de tanto penar/ Tanta histria
pra contar/ Nesse mundo co/ Nessa vida
quem vai pagar?
Se canto reggae/ Que nos deixa leve/ Pra
suportar toda situao
Por todo tempo/ Em qualquer momento/
Te louvarei meu Deus, de corao
Mas um dia a vida vai ento mudar/ Mas
um dia a vida vai ento mudar
Mas um dia a vida vai ento mudar/ Mas
um dia a vida vai ento mudar, de vez!
137 Remanescente
(Nengo Vieira/ Tintim Gomes)
Das margens do Paraguau/ Em plena
Amrica do Sul
S remanescente ficar/ S remanescente
ficar
Das margens do Paraguau/ Em plena
Amrica do Sul
S remanescente ficar/ S remanescente
ficar
a semente do amor que brota nesta
gerao/ Buscando a luz, a paz, a vida e
a unio
a semente do amor que brota nesta

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 185

gerao/ Buscando a luz, a paz, a vida e


a unio
E o Senhor j diz em sua palavra e com
sua autoridade
S remanescente ficar/ S remanescente
ficar
E o Senhor j diz em sua palavra e com
sua autoridade
S remanescente ficar/ S remanescente
ficar, meu Deus!
a semente do amor que brota nesta
gerao
Buscando a luz, a paz, a vida e a unio
E o Senhor j diz em sua palavra e com
sua autoridade
S remanescente ficar/ S remanescente
ficar/ S remanescente ficar/ S remanescente ficar, meu Deus!
138 Tempo de Adorar
(Nengo Vieira)
Tempo que t tudo mudado/ Tudo agora
ta transformado no amor, no amor
Vento que traz o avivamento/ Sopro do
Esprito Santo chegou e soprou
Tempo de abraar o seu irmo/ Tempo de
anunciar a salvao/ Tempo de viver em paz
Novo nascimento j nos deu/ Tempo de
adorar agora a Deus/ Tempo de glorificar
Tempo de adorar/ Tempo de adorar/ Tempo de adorar/ Tempo de adorar
Tempo que t tudo mudado/ Tudo agora
t transformado no amor, no amor
Vento que traz o avivamento/ Fruto do
Esprito Santo soprou, chegou
Tempo de abraar o seu irmo/ Tempo de
anunciar a salvao/Tempo de viver em paz
Novo nascimento j nos deu/ Tempo de
adorar agora a Deus/ Tempo de glorificar
Jesus, Senhor dos senhores/ Jesus, Rei dos
reis/ Jesus, Leo de Jud/ Jesus... yeah!
Tempo de adorar/ Tempo de adorar (o Rei
Jesus!)/ Tempo de adorar (o Salvador!)
Tempo de adorar (Libertador!)/ Tempo de
adorar (Jesus meu rei!)/ Tempo de adorar
(ele Deus!)/ Tempo de adorar (ele
Rei!)/ Tempo de adorar ( o meu Senhor!)/
Tempo de adorar (o Rei dos reis!)/ Tempo
de adorar (tu s digno!)/ Tempo de adorar

186 l Brbara Falcn

(tu s digno, Senhor!)/ Tempo de adorar


(tu s digno, Senhor!)
139 Verdade
(Nengo Vieira)
Foi-se o tempo onde a gente/ Podia sentar
no jardim
Violncia, urbanismo/ Guerras sociais no
tem fim
Se todo eu peo pra Deus/ Acabar de vez
essa dor/ Cruel, Letal
Na verdade eles querem/ Destruir de vez
nossa paz/ Insensatos, homens cruis
Comem o povo e no satisfaz/ Se todo dia
eu peo pra Deus
Acabar de uma vez com essa dor/ Cruel,
mortal
E as crianas, no conseguem mais/ Estudar as sua lies
Nas escolas, as guerrilhas/ Tomam contam
da educao/ Se todo eu peo pra Deus
Acabar de vez com essa dor/ Cruel, fatal
140 Verde Vermelho
(Nengo Vieira)
Nada nunca me faltou/ Nada nunca faltar/
Pois tenho crido
Naquele que me fortalece/ Olha Deus ja
por ns/ Nada vai nos abater
Mesmo que a terra/ E os montes mudem
de lugar/ Olha meu bem
No, no brincadeira no/ Quanta gente
no tem/ Casa ou alimentao
Vivem sem a esperana/ De que um dia
tudo vai mudar
E esses homens que prometem no vo
realizar/ Diga que pas esse?
Com um verde grande natural/ Mas a cada
dia cresce o sangue vermelho nos jornais
141 Direitos Iguais
(Nengo Vieira)
Quando eu vim/ Para esse mundo
S pensava que os Direitos eram Iguais/
Mas logo fui percebendo
As mentiras so expostas nos jornais/ Teu
dinheiro pode at comprar
O mundo inteiro/ S no compra a Espe-

144 Lindo Dia

rana que Deus nos deu


A verdade que Deus nos tirou desse
cativeiro/ Nos libertando com muita F
E muito Amor, pois , vem!/ Preso logo na
mo de Deus/ Seguro logo na mo de Deus
Confio logo na mo de Deus/ Pra nos livrar
Preso logo na mo de Deus/ Seguro logo
na mo de Deus/ Tranquilo logo na mo
de Deus/ Pra nos Salvar/ Mas o tempo foi
se passando/ E a mentira cada dia/ Ficando maior/ Evidente tudo to claro/ Que
os Direitos no so Iguais/ de fazer d

(Thank You Jah, Rita Marley // Verso:


Sine Calmon)
Hoje o cu amanheceu to lindo/ As crianas brincando as frutas caindo, caem
Quando caem espalham as sementes pela
a terra/ Logo vai subir um verde lindo
Agora s regar, s regar/ Esquea a dor
passado
Pois Deus t do seu lado/ Venho de jipe
mais de corao
harmonia, alegria se combinam

SINE CALMON

2007

GUERREIRO MOR // CD // KASKATAS

NENGO VIEIRA

142 Guerreiro Mor

AVIVAMENTE // CD // SELO BOLA


MUSIC

(Nengo Vieira)
Com o guerreiro mor/ Vamos sair na batalha/ No com sangue/ Mas com esprito/
E toda babilnia a sistematizar/ Dragando
tantas almas/ Pra se alimentar/ Mas o redentor/ A nos proteger/ Vem nos conduzir/
Vem nos dar saber/ Pois o mundo hoje
no sabe o que faz/ Presos nos deleites/
Mortos so carnais/ E estes homens cegos/
No sabem pra onde vo/ No, no, no,
no/ Com o guerreiro mor/ Vamos sair
na batalha/ No com sangue/ Mas com
esprito/ Se todo o meu querer/ Vem do
nosso Senhor/ Pois sua fina flor/ o seu
amor/ Para nos remir/ Dessa maldio/
Nos trazendo a paz/ No seu corao/ Pois
o mundo hoje no sabe o que faz/ Presos
nos deleites/ Mortos so carnais/ E estes
homens cegos/ No sabem pra onde vo/
No, no, no, no/ Com o guerreiro mor

145 Deus de Abrao


(Nengo Vieira)

143 Viu

O Deus de Abrao est nesse lugar


O Deus de Abrao ns vamos adorar
Vamos adorar a Deus/ Vamos adorar ao
grande Deus
Vamos adorar a Deus/ Vamos adorar ao
vivo Deus
O Deus de Abrao, de Isaac e de Jac/ O
Deus de Abrao, de Isaac e de Jac
Deus, o grande Deus/ Deus, o grande Deus
Deixe que Jesus vai te falar/ Deixe que
Jesus vai te dizer
Deixe que Jesus quer te tocar/ No seu
corao
Te dar a salvao/ Fazer voc sorrir,
Amar e perdoar/ S Deus, o grande Deus/
S Deus, o grande Deus
O Deus de Abrao est nesse lugar
O Deus de Abrao ns vamos adorar

(Edson Gomes)

146 Tu s Santo

Viu,vamo acabar com tanta violncia /


Viu,vamo acabar com toda essa dor /
Viu,vamo acabar com tanta sofrncia /
Viu,vamo acabar com toda essa tristeza
/ Todo mundo precisa de um lugar pra
morar / Todo mundo precisa de viver em
paz / Todo mundo precisa respirar o ar /
Todo mundo precisa se alimentar

(Nengo Vieira)
Tu s santo/ Tu s santo Senhor
Tu s santo/ Tu s santo Senhor
Toda terra cheia da tua glria/ Em Jesus
ns temos a vitria
J nascemos para te louvar/ Viveremos pra
te adorar, pois
Tu s santo/ Tu s santo Senhor
Tu s santo/ Tu s santo Senhor

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 187

Tua palavra o nosso sustento/ O nosso


po, nosso alimento
Nossa sede vamos saciar/ E no teu rio
poder mergulhar, pois
Tu s santo/ Tu s santo Senhor
Tu s santo/ Tu s santo Senhor
Santo, santo, santo/ Santo, santo, santo

voc entender
O amor do meu senhor Jesus/ Jesus,
minha razo e viver
Jesus, minha cano te louvar/ Jesus,
minha razo de viver/ Jesus, minha cano
te louvar

147 Estou Apaixonado

(Nengo Vieira/ Sheila Possi)

(Nengo Vieira)
Trago no meu peito/ Tua esperana
Meu corao jamais vai te esquecer/ Lava
o meu ser e torna-me criana
O meu prazer pra sempre te louvar/
Estou apaixonado por ti Jesus
Estou apaixonado por ti Jesus/ No me
apartarei diante dos teus olhos
A tua luz me alegra/ Me faz cantar
Eu quero o teu colo, quero o teu carinho/
Pra sempre minha vida te adorar
Estou apaixonado por ti Jesus/ Estou
apaixonado por ti Jesus
Estou apaixonado por ti Jesus/ Estou
apaixonado por ti Jesus

Raise your hands and get the felling/ Close


your eyes and praise the Lord
I wanna get to know/ I wanna get you
know better/ I wanna get to know
I wanna get you know deeper/ Just believe,
says the Lord/ Ill not let fight alone
Lord I want to enter your river tonight/
Sink in your move/ Oh spirit of God
I wanna tell you Lord I need you/ I wont
forget oh God
All you have been giving to me through
your son/ This awesome love/ That rescued
my soul
Ill tell the world I need you/ Come together now

148 Escabelo

151 Deus Fiel

(Nengo Vieira)

(Nengo Vieira)

Que a paz de Jesus esteja em seu corao/


Que a paz de Jesus se transforme em
cano
Que a paz de Jesus esteja em seu corao/
Que a paz de Jesus se transforme em
beno
A terra o escabelo dos seus ps/ E o cu
o cu
A terra o escabelo dos seus ps/ E o cu
o cu
Assim disse Jesus, ento venha para c/
Assim disse Jesus, ento venha se salvar
E em nome de Jesus, ento venha conhecer/
Viver o amor, viver o amor, o amor de Deus

Olha meu amigo a vida bela/ Quando


a gente deixa Deus mandar/ Veja quanta
coisa se revela

149 Graa

Com o guerreiro mor/ Vamos sair na batalha/ No com sangue/ Mas com esprito/
E toda babilnia a sistematizar/ Dragando
tantas almas/ Pra se alimentar/ Mas o redentor/ A nos proteger/ Vem nos conduzir/
Vem nos dar saber/ Pois o mundo hoje
no sabe o que faz/ Presos nos deleites/
Mortos so carnais/ E estes homens cegos/

(Nengo Vieira)
Quando amanhece/ Ainda sinto seu amor
Quando anoitece/ Buscarei na madrugada
teu consolo.
Tua graa me basta, teu consolo,Tua graa
me basta
Todo bem que eu sempre quis/ Foi fazer
188 l Brbara Falcn

150 God Bless

Onde a gente no consegue enxergar/


Porque o sol ao vai te molestar, no!/ Nem
as trevas vo poder te encobrir, now!/ A
verdadeira sensao do teu eterno amor/
Deus vida, Deus paz/ Cristo nos salvou/
Deus fiel/ Pra te mostrar/ Deus fiel/ E
quer te tratar com carinho/ Deus fiel, meu
Deus fiel/ Deus fiel, meu Deus fiel
152 Guerreiro Mor
(Nengo Vieira)

No sabem pra onde vo/ No, no, no,


no/ Com o guerreiro mor/ Vamos sair
na batalha/ No com sangue/ Mas com
esprito/ Se todo o meu querer/ Vem do
nosso Senhor/ Pois sua fina flor/ o seu
amor/ Para nos remir/ Dessa maldio/
Nos trazendo a paz/ No seu corao/ Pois
o mundo hoje no sabe o que faz/ Presos
nos deleites/ Mortos so carnais/ E estes
homens cegos/ No sabem pra onde vo/
No, no, no, no/ Com o guerreiro mor
153 John Tree
(Nengo Vieira/ Sheila Possi)
Hear what I will say/ I known its gonna be
good for you
Open up your heart/ I known its gonna be
good for you

Para levantar de vez voc do cho


Para libertar os presos, os oprimidos de
corao
Para levantar de vez voc do cho
A glria do Senhor chegou/ A glria do
Senhor brilhou
A glria do Senhor Salvador
A glria do Senhor, salve, salve o Salvador
A glria do Senhor Salva
A glria do Senhor Salva
GERALDO CRISTAL
REGGAESSNCIA // CD// INDEPENDENTE
155 Reggae do Trabalho
(Geraldo Cristal)

Now I got to go/ I hope this word has been


good for you

Trabalho uh uh/ Trabalho uh uh uh uh/


Trabalho uh uh/ Uh oh oh/ D muito
trabalho/ Well, well, well, well/ Todo
dia a procura de trabalho/ Eu olho nos
classificados dos jornais/ Pedem trabalho/
quando a grana/ quando a grana/ A
grana compra muitas almas/ A grana sobrepuja a calma/ A grana pode corromper
a causa/ Que nosso trabalho/ Por um
digno salrio/ Para quem/ Para o padeiro,
pedreiro/ Gari, sapateiro, domstica, msicos/ E todos obreiros do trabalho/ Por um
digno salrio/ Precisamos de boa casa para
morar/ Precisamos de assistncia mdica
e dentria/ Precisamos de boa comida/
Precisamos nos educar/ Precisamos de liberdade de expresso no trabalho/ Por um
digno salrio/ Trabalho, trabalho, trabalho/
D muito trabalho/ Trabalho, trabalho,
trabalho/ D muito trabalho/ Trabalho,
trabalho/ Na, na, na, na e etc

154 Salvador

156 Reggaessncia

(Nengo Vieira)

(Rogrio Gaspar e Geraldo Cristal)

A glria do Senhor chegou/ A glria do


Senhor brilhou

Reggae msica essncia/ Reggae


plena conscincia/ Reggae msica que
nos revela/Que h uma bela vida a nossa
espera/ No h por qu destruir/ O nosso
pacto de paz/ hora de hei revitalizar o
amor/ Enfim os nossos sonhos de criana/
Vo se realizar/ Olho pro mundo e vejo
tudo perturbado, tudo isso foi profetizado/

Gotta try this love (amazing, amazing)


Give up your disguise (surrender, surrender)
Jesus told the jew Nicodemus/ You heve to
be born again (again)
If you wanna enter in the reign of God
Let spirit come take you and them you
will be
Like the wind that blows
But no one knows where it comes from
Neither where it goes
The wind just bloes where it pleases
For God soloved the world
That he geve his only son
So that whoever believes him
Shall not perish/ But have eternal life

A glria do Senhor chegou/ A glria do Senhor brilhou na minha vida, no meu viver
Na minha vida, no meu viver
Para libertar os presos, os oprimidos de
corao

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 189

hora de hei revitalizar o amor/ Na,


na, na, na, na, na, na, na/ Rai, na, nai,
nai, ns (bis)/ Reggae msica reggae
essncia/ E a paz alimenta o esprito/ Os
nossos ps agora fortes/ Esto quebrando
todos os espritos/ Rompemos barreiras
imorais/ Atravessamos fronteiras mentais/
hora de hei revitalizar o amor/ Olho pro
mundo e vejo tudo perturbado/ Tudo isso
foi profetizado/ hora de hei revitalizar
o amor/ O bom deus Jah amou o amor/
Jesus Cristo amou o amor/ Ns temos
mais que amar o amor/ amar o prximo
amor, amor/ Amor, amor, amor, amor/ S
o amor, s o amor
157 Babilnia pra baixo
(Geraldo Cristal)
Reggae leve, leve/ Leve a babilnia pra
baixo/ Leve a babilnia pra baixo/ Leve
a babilnia pra baixo uh uh oh/
uuih iah/ uuih mama sei Uh uh
oh/ Well el vewel/ El el el uooh uo ooha/
Negros guerreiros que vinham no cavalo
branco/ Falavam da cidade profana e dos
seus enganos/ E dos seus encantos/ Em
africano, em esperanto/ Os mercadores
da terra, as multinacionais/ A besta, os
falsos profetas, no/ No queriam ouvir
o povo cantando reggae/ Reggae babilon
go down/ Down, down, down/ Reggae
babilon go down/ Reggae babilon/ Reggae
leve, leve, leve/ Leve a babilnia pra
baixo/ Leve a babilnia pra baixo/ Leve a
babilnia pra baixo/ Leve a babilnia pra
baixo/ Uooh uooh oh uuieh uieah mama/
Sei uooh uooh oh well e vewell el ele l
uooh uo ooh
158 Carta ao Presidente
(Geraldo Cristal)
Favela de palafitas/ Aparentemente nada
bem a vista/ Fome e misria/ E marginalizados perseguidos/ Pela polcia/ As crianas no lixo morrendo desnutridas/ Falar
fcil mas no temos grana/ Pra fazer o que
sentimos/ Pelas pessoas drogadas e viciadas/ Por semi-curandeiros em drogarias/
Babilnia anarquia/ Muitos reis na mesma
dinastia/ Cristo disse que viria e a espada

190 l Brbara Falcn

da verdade ergueria/ Que horror que eu


vejo/ Que horror, que horror, que horror/
Ei rei ei rei/ Presidente no h nada/ Bem
vista/ Se tem coragem faa uma visita/ As
favelas de palafita/ E compare com a orla
martima/ Toda enfeitada bnita/ a gosto
dos turistas/ E temperada pros banhistas/
Na soberba, ambio e imundcie/ E
interrogao/ Que horror que eu vejo/ Que
horror, que horror, que horror/ Ei rei ei
rei/ Lai, lai, lai, lai, lai, lai, lai/ Ei rei ei rei/
Presidente no h nada/ Bem vista/ Se
tem coragem faa uma visita/ As favelas de
palafita/ E compare com a orla martima/
Toda enfeitada e bonita/ A gosto dos
turistas/ E temperada pros banhistas/ Na
soberba, ambio e imundcie/ E interrogao/ Ao, ao, o nosso povo precisa
de ao
159 Saindo de Quem
(Geraldo Cristal)
Eles esto invadindo nossa rea/ Trazendo
paz e segurana com suas armas/ AR-15,
granadas e eles (bis)/ Eu t com medo da
polcia/ Eu t cabreiro com ladro/ Eu tenho
medo que a misria/ Transforme-se em
revoluo/ Eu t com medo da poltica/ Da
danada corrupo/ Eu lhe digo que eles no
esto com nada/ Eu t saindo do lalau/ Eles
no esto com nada/ Eu t saindo de quem
me engana/ Eles no esto com nada/ Eu
sou mais famlia real/ Eles no esto com
nada/ Eu estou saindo de quem/ Pai no,
Pai uoh, uoh, no, no, uoh, uoh, no, etc.
160 Ser Diferente
(Geraldo Cristal)
Dias to tristes quando no te vejo/ Rostos nas ruas lembram voc/ Agora o que
fao tirado a apaixonado/ Eu quero
um abrao/ Um afago/ Sorver seu desejo/
Um beijo/ Ouvir seus gemidos/ Lamber
seu suor/ Mas no me deixe s hoje
noite/ No me deixe nunca mais/ Amor/
S, somente s, somente, eu e voc/
S, somente s, somente, eu e voc/ S,
somente s, somente, eu e voc/ Quero
que voc me provoque/ Sensaes em
estado de choque/ At enlouquecer/ E

tudo ser diferente/ Todo dia ser diferente/ Toda noite/ S, somente s, somente,
eu e voc/ S, somente s, somente, eu
e voc/ S, somente s, somente, eu e
voc/ S, somente s, somente, eu e
voc/ Todo dia/ Ser diferente/ Toda noite/ S, somente s, somente, eu e voc/
S, somente s, somente, eu e voc/ S,
somente s, somente, eu e voc/ S,
somente s, somente, eu e voc/ Da pra
melhor/ Da pra melhor
161 Cincia do Esprito
(Geraldo Cristal)
o amor, oh Senhor, eu li/ Alelujah/
Alelujah/ Bom/ Bom louvar ao Senhor/ E
cantar louvores em seu nome/ Ao altssimo
Jah em Jesus Cristo/ E pela manh anunciar a paz de verdade/ E a tarde um orvalho
de felicidade/ E a noitinha orvalho de
tranqilidade/ Sobre um instrumento de seis
cordas/ Um agog ou um atabaque/ Um
berimbau com som solene/ Pois tu Senhor
me mostraste/ E com teus feitos/ Exultarei/
Com as obras da sua mo meu rei ei ei/
Eu li/ Um homem brutal no entende isso/
Um homem sem f no entende isso/ Um
homem banal no entende a cincia/ Do
Esprito Santo/ Alelujah/ Bom louvar ao
Senhor com danas/ Bom louvar, louvar
ao Senhor com palmas, Amm
162 de Boa
(Geraldo Cristal)
to bom estar contente/ O amor a me
procurar/ demais estar com a gente/ O
amor est no ar/ de boa estar contente/
O amor a me procurar/ demais estar
com a gente/ O amor est no ar/ Olho pra
multido/ Tudo parece to tranqilo/ Sai,
sai solido/ Quero ficar na paz de esprito/
Olho pra multido/ Estou cantando e me
divertindo/ Sai solido/ A minha vida tem
sentido/ to bom, to bom/ de boa,
demais/ Olho pra multido/ Tudo parece
to tranqilo/ Sai solido, sai solido/
Quero ficar na paz de esprito/ Olho pra
multido/ Estou cantando e me divertindo/
Sai solido/ A minha vida tem sentido

163 Jahlivia
(Geraldo Cristal)
Voc me olha assim desse jeito/ Tento
identificar seus sinais/ Todo amor tem
seu preo/ Pago ver a diferena que voc
faz/ Posso lhe dar emoo/ Tocar fundo
no seu corao/ Com essa cano/ Voc
disfara/ Finge que no liga/ Mas l no
findo/ Sabe o que preciso/ Jahlivia/
lindo/ Eu me delicio/ Mergulhar nesse
amor/ Esse amor me mantm vivo/
Como negar um sentimento/ Fazer que
no est entendendo/ Sou o calor no seu
recanto/ O alcance daquilo que est pretendendo/ A praia voc o mar/ Chegando como no quer nada/ Ocupando meu
corao/ De areia/ Seu castelo sereia/ Pra
lhe amar/ Como negar um sentimento/
Fazer que no est entendendo/ Sou o
calor no seu recanto/ O alcance daquilo
que est pretendendo/ A praia voc o
mar/ Chegando como no quer nada/
Ocupando meu corao/ De areia/ Seu
castelo sereia/ Pra lhe amar
164 Libertao
(Geraldo Cristal)
Uouoh, uouoh, ooh, oh/ Uuuuuooh/
Tomara que chegue, tomara que chegue/
Antes que seja tarde/ A libertao dos
negros africanos/ Espero que chegue
antes que seja tarde/ A libertao dos
negros africanos/ Eu olho o sofrimento
do meu povo/ Nas ruas a servido dura
irmo/ A cada instante uma captura/ Trs
marcas na cabea/ Sela um pacto com a
besta/ Que est a sua procura irmo/ No
mais comigo, no/ Sistema do branco
mantm o negro nesta condio/ E na
opresso/ O negro vira as costas ao seu
passado/ Onde espiritualmente enraizado/ pra uma futura soluo/ Que futura
soluo eu acredito/ Eu acredito mesmo
na determinao/ De dar o bem que se
d, irmo/ Em um gesto de corao/ Ser
negro, ndio ou branco/ O ser que estou
procurando/ O ser que estou procurando,
irmo/ Tomara que chegue antes que seja
tarde/ A libertao dos negros africanos/
Espero que chegue antes que seja muito

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 191

tarde/ A libertao dos negros africanos/


Seres, seres, seres humanos/ Sereis humanos sem ndio/ Sem negro, sem branco/
Oh, oh sereis humanos/ Sem ndio, sem
negro/ A ao ao sereis humanos sem ndio/
Tomara que chegue, espero que chegue,
tomara que chegue/ Espero que chegue,
tomara que chegue, espero que chegue,
Sereis humanos
165 Vaidades
(Geraldo Cristal)
Nos corredores da cidade/ Tudo acontece
num instante/ Como se no acontecesse/
Como se ningum ligasse/ O pegar na grana,
o jogo rpido na cidade/ O viver na lama/
H jogo limpo na soaite?/ O vai e vem nas
ruas/ A sedenta cobia/ Nos prazeres da
carne/ Invadindo os olhos/ E reagindo na
vontade/ E cada vez mais insacivel/ Mais
e mais insacivel/ O pegar na grana, o jogo
rpido na cidade/ O viver na lama/ H jogo
limpo na soaite?/ Vaidade de vaidades/ Disse o pregador Eclesiastes/ O que vi embaixo
do sol/ Vaidade de vaidades/ O que vi nos
templos materiais/ Vaidade de vaidades/
Digo-lhe, digo-lhe, digo-lhe/ Digo e digo-lhe/
Vaidade de vaidades, Eu lhe digo, lhe digo/
Lhe digo, lhe digo/ Vaidade de vaidades

192 l Brbara Falcn

166 A Sacizeiro
(Geraldo Cristal)
Na TV anunciaram/ Um produto novo no
mercado/ E no ms seguinte/ O estrago
tinha comeado/ principio ningum
ligava/ A cilada estava armada/ A peste se
alastrava/ E os primeiros da lista/ Crianas
de rua/ Que cheiravam cola/ Agora ratos
atrs do queijo/ Como queijo/ Sua cabea
vai ficar/ Cheia de crateras/ Cheia de seqelas/ Se voc no se tocar/ A sacizeiro,
cochilou/ O cachimbo cai/ A sacizeiro/
E voc vai logo atrs (bis)/ Neurtico,
descontrolado/ Olho esbugalhado/ Pele e
osso/ Todo chupado/ Os caras trabalharam
errado/ Saia dessa cara de coisa/ Saia
dessa cara de pedra/ V se, se v/ V se, se
enxerga/ D o segundo passo/ O salvador
j deu o primeiro/ E ele est do seu lado/
A sacizeiro/ Cochilou o cachimbo cai/ A
sacizeiro e voc vai logo atrs

Foto: Carol Garcia

SOBRE A AUTORA

Brbara Falcn produtora cultural, antroploga, mestre em Estudos


tnicos e Africanos (CEAO/UFBA) e especialista em Produo Cultural
e Mdias (UNIJORGE). Como pesquisadora se especializou na rea de
Etnomusicologia e Cultura Popular. Como produtora cultural atua em
diferentes segmentos (msica, dana, teatro e literatura), tendo acumulado em seu currculo participaes em eventos nacionais e internacionais,
como organizadora e diretora de produo. Desenvolveu, ao longo de
uma dcada, vasta experincia em elaborao, gesto e formatao de
projetos, tendo colaborado para instituies como o Teatro Vila Velha,
Secretaria de Cultura da Bahia e Cidade do Saber. Atualmente pesquisa
a influncia jamaicana na nova msica brasileira.

O REGGAE DE CACHOEIRA - PRODUO MUSICAL EM UM PORTO ATLNTICO l 193

Este livro foi composto em


Souvenir LT BT com impresso
da Grfica Viena, em papel
offset 90g/m2, para Pinana
Editora em julho de 2012. Tiragem: 1.000 exemplares

Você também pode gostar