Dissertação Abrigamento de Idosos... PDF

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CINCIAS HUMANAS


ESCOLA DE SERVIO SOCIAL
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM SERVIO SOCIAL

ROSANETE STEFFENON

Abrigamento de idosos: situaes documentadas no Ministrio Pblico


do Estado do Rio de Janeiro

RIO DE JANEIRO
2013

ROSANETE STEFFENON

Abrigamento de idosos: situaes documentadas no Ministrio Pblico


do Estado do Rio de Janeiro

Dissertao de mestrado apresentada ao Programa de PsGraduao em Servio Social, Escola de Servio Social,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial
obteno do ttulo de mestre em Servio Social.

Orientadora: Profa. Dra. Myriam Moraes Lins de Barros

RIO DE JANEIRO
2013

S816

Steffenon, Rosanete.
Abrigamento de idosos: situaes documentadas no Ministrio
Pblico do Estado do Rio de Janeiro / Rosanete Steffenon. Rio de
Janeiro: 2013.
141f.
Orientadora: Myriam Moraes Lins de Barros.
Dissertao (mestrado) Universidade Federal do Rio de Janeiro,
Escola de Servio Social, Programa de Ps-Graduao em Servio
Social, 2013.
1. Idosos - Brasil. 2. Idosos Poltica governamental. 3. Assistncia
velhice Brasil. 4. Velhice - Aspectos sociais. I. Barros, Myriam
Moraes Lins de. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Escola de
Servio Social.
CDD: 305.26

Rosanete Steffenon

Abrigamento de idosos: situaes documentadas no Ministrio Pblico


do Estado do Rio de Janeiro

Dissertao de mestrado apresentada ao Programa de Ps-Graduao


em Servio Social, Escola de Servio Social, Universidade Federal do
Rio de Janeiro, como requisito parcial obteno do ttulo de mestre
em Servio Social.

Aprovada em 10 de maio de 2013

______________________________________
Myriam Moraes Lins de Barros
Doutora em Antropologia Social
Escola de Servio Social UFRJ

______________________________________
Andrea Moraes Alves
Doutora em Antropologia Social
Escola de Servio Social UFRJ

______________________________________
Clarice Ehlers Peixoto
Doutora em Antropologia Social
Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ

Dedico esta dissertao aos meus pais Erico e Lourdes,


e aos demais idosos(as).

Agradecimentos

"[...] e aprendi que se depende sempre de tanta, muita, diferente gente. Toda pessoa
sempre as marcas das lies dirias de outras tantas pessoas" (Gonzaguinha).
Ao final desta etapa so muitas as pessoas a quem eu agradeo, apesar de mencionar
aqui apenas algumas.
Gratido aos meus pais que embora distantes geograficamente e das discusses deste
trabalho, repetiram semanalmente as perguntas: como vo os estudos? Falta muito pra
acabar? Dessa forma, no somente me lembraram de que eu tinha que levar a cabo o que
comeara, mas tambm me incentivaram a continuar.
De maneira muito especial agradeo a professora Myriam Moraes Lins de Barros, a
quem desde a graduao eu devo muito pelo aprendizado. Foi com muito conhecimento e
simplicidade que me orientou na elaborao desta dissertao, e que anteriormente contribuiu
para que eu gostasse de pesquisar.
Minha gratido s professoras Andra Moraes Alves e Clarice Ehlers Peixoto, pelas
contribuies na ocasio da qualificao do projeto e da apresentao desta dissertao.
Obrigada tambm s professoras Maria das Dores Campos Machado e Carla Almeida pela
disponibilidade.
Aos demais professores da Escola de Servio Social UFRJ , que de diferentes
modos contriburam para o aprendizado aqui colocado.
Ao Ministrio Pblico do Estado do Rio de Janeiro, gratido pela autorizao que
permitiu a realizao da pesquisa documental. E, aos seus funcionrios que foram solcitos em
possibilitar o acesso ao material necessrio.
s colegas assistentes sociais que atuam no Centro de Apoio Operacional s
Promotorias de Justia de Proteo ao Idoso e Pessoa com Deficincia e no Centro de Apoio
s Promotorias de Justia Cveis, pela troca de ideias que favoreceu o aprofundamento das
questes aqui desenvolvidas. Alm disso, pela convivncia que incentivou e cooperou no
desenvolvimento deste trabalho e da prpria atuao profissional.
Agradeo a Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES),
pela bolsa concedida durante o mestrado.
Aos colegas de ps-graduao, por compartilharmos de situaes que tornaram esta
elaborao menos solitria.

Aline e Josy, com quem durante a escrita deste trabalho no dividi apenas a casa,
mas tambm alegrias e preocupaes.
Gratido aos demais amigos (as), que cada um (a) a seu modo tornam a vida bonita e
leve.
Enfim, a todos (as) que de diferentes formas e mesmo sem saber, contriburam para o
resultado deste trabalho.

Resumo
STEFFENON, Rosanete. Abrigamento de idosos: situaes documentadas no Ministrio
Pblico do Estado do Rio de Janeiro. Dissertao (Mestrado em Servio Social) Escola de
Servio Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2013.

O processo de transio demogrfica e outras mudanas sociais, econmicas e


polticas tornam visveis situaes vivenciadas por idosos e as colocam na pauta das
intervenes institucionais. Embora haja modos distintos e desiguais de envelhecer e
heterogneas velhices, as aes pblicas esto voltadas prioritariamente para idosos com
condies de participao em atividades culturais, de lazer e de convivncia comunitria.
Desse modo, a velhice dependente tem ficado ao encargo da proteo familiar, controlada
pelo Estado. Com base nesses aspectos, e por meio da discusso de situaes de abrigamento
de idosos, apresentadas ao Ministrio Pblico do Estado do Rio de Janeiro, que esta
dissertao debate a forma de organizao das relaes sociais e suas instituies. Neste
sentido, argumenta que h pressupostos legais e morais que se condicionam reciprocamente.
Ao tratar dessa temtica, apresenta uma discusso da trajetria das aes pblicas voltadas
aos idosos, da construo de termos classificatrios da velhice e de instncias de defesa dos
direitos do idoso, com enfoque na instituio Ministrio Pblico. Alm de aportes tericos,
utilizou-se de pesquisa documental e de observaes e registros etnogrficos realizados em
dois tempos da prtica profissional estagiria e assistente social na citada instituio. A
pesquisa documental imps tambm uma reflexo sobre o sentido desses documentos e seus
percursos. A partir da descrio dos andamentos documentais decorrentes de trs demandas
apresentadas ao Ministrio Pblico foi possvel ainda, debater os pressupostos legais e morais
que se mostraram no fluxo dos mesmos e que retratam a forma da sociedade se organizar e
responder as necessidades que se colocam no processo histrico. Alm disso, o abrigamento
apresentado sob a tica de diferentes envolvidos nessa demanda, inclusive a viso dos
prprios idosos sobre o mesmo. Assim, se constitui esta dissertao que pretende contribuir
para a reflexo sobre a necessidade de avanos no campo das polticas sociais, com maior
participao do Estado na execuo de servios sociais.
Palavras-chave: idosos, abrigamento, famlia, Ministrio Pblico, polticas sociais.

Abstract
STEFFENON, Rosanete. Abrigamento de idosos: situaes documentadas no Ministrio
Pblico do Estado do Rio de Janeiro. Dissertao (Mestrado em Servio Social) Escola de
Servio Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2013.

The process of demographic transition and other social, economic and political
changes have evidenced the situations experienced by the elderly and put them on the agenda
of institutional interventions. Despite the existence of different and uneven ways of growing
old and of heterogeneity in aging, public actions are mainly directed to the elderly who have
conditions to engage in cultural, leisure and community-based activities. Dependent aging,
though, has been a duty of the family, controlled by the State. Based on these aspects and by
means of the discussion of assumptions the situations for elderly sheltering submitted to the
Public Prosecutors Office of the State of Rio de Janeiro, this thesis discusses the way social
relations and their related institutions are organized. In this respect, the argument herein is
that have legal and moral assumptions which are conditioned to each other in a reciprocal
way. Our approach to this issue presents a discussion of the history of public actions directed
to the elderly, of the construction of classificatory terms to old age and of instances for the
defense of elderly rights, with focus on the Public Prosecutors Office. Besides theoretical
contributions, we have used documental research and observations from ethnographic records
from two periods of professional practice as an intern and as a social assistant in the
aforementioned institution. The documental research also led to the reflection about the
meaning of these documents and the course taken by them. By describing the progress of
three demands submitted to the Public Prosecutors Office, it was also possible to discuss the
moral and legal assumptions which arose during the process and which show the way society
organizes itself and meets the needs of the historical process. Furthermore, sheltering is
presented according to the perspectives of different agents, including the elderly themselves.
Thus, this thesis is constituted as and aimed at being a contribution to the reflection on the
need for advancements in the field of social policies, with increased participation of the State
in the execution of social services.
Key words: elderly, sheltering, family, Public Prosecutors Office, social policies.

Lista de abreviaturas e siglas


ATI Academias da Terceira Idade
AVD Atividades da Vida Diria
BPC Benefcio de Prestao Continuada
CAOIPD Centro de Apoio Operacional s Promotorias de Justia de Proteo ao Idoso e
Pessoa com Deficincia
CAOP Centro de Apoio Operacional s Promotorias de Justia Cveis
CAP(s) Caixas de Aposentadorias e Penses
CEPEDI Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa
CRAS Centro de Referncia de Assistncia Social
CREAS Centro de Referncia Especializado de Assistncia Social
DEAPTI Delegacia Especial de Atendimento s Pessoas de Terceira Idade
EI Estatuto do Idoso
ESF Estratgia Sade da Famlia
GAP Grupo de Apoio ao Promotor
GATE- Grupo de Apoio Tcnico
IAP(s) Institutos de Aposentadorias e Penses
ILPI(s) Instituies de Longa Permanncia para Idosos
INPS Instituto Nacional de Previdncia Social
INSS Instituto Nacional de Seguro Social
LOAS Lei Orgnica da Assistncia Social
LOPS Lei Orgnica da Previdncia Social
MGP Mdulo Gesto de Processos
MP Ministrio Pblico
MPAS Ministrio da Previdncia e Assistncia Social
MPRJ Ministrio Pblico do Estado do Rio de Janeiro
NEAPI Ncleo Especial para Atendimento s Pessoas da Terceira Idade
OCDE Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico
PAI Programa de Assistncia ao Idoso
PA(s) Procedimentos Administrativos
PIB Produto Interno Bruto
PJPIPD Promotorias de Justia e Proteo ao Idoso e a Pessoa com Deficincia

PNAS Poltica Nacional de Assistncia Social


PNDH Plano Nacional de Direitos Humanos
PNI- Poltica Nacional do Idoso
SBGG Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
SESC Servio Social do Comrcio
SESQV Secretaria Especial do Envelhecimento Saudvel e Qualidade de Vida
SMAS Secretaria Municipal de Assistncia Social
SUS Sistema nico de Sade
UPA Unidade de Pronto Atendimento

Sumrio
Introduo.............................................................................................................................

12

A realizao da pesquisa documental...................................................................................

17

Captulo I: Velhice como questo e configurao de polticas voltadas aos idosos no


Brasil
1.1 Mudanas na estrutura populacional .............................................................................

22

1.2 Elaboraes sobre velhice..............................................................................................

24

1.3 Construo social de termos classificatrios da velhice................................................

27

1.4 Panorama histrico das aes e proposies pblicas voltadas aos idosos...................

33

Captulo II: Intervenes estatais na rea do idoso com direitos violados


2.1 Instncias de defesa dos direitos do idoso na cidade do Rio de Janeiro........................

50

2.2 Ministrio Pblico Promotorias do Idoso e da Pessoa com Deficincia....................

55

2.3 Localizao e espao fsico das Promotorias do Idoso e da Pessoa com Deficincia

61

2.4 Situao de risco como parmetro de atuao...........................................................

65

2.5 Populao que busca atendimento nas Promotorias do Idoso e da Pessoa com
Deficincia....................................................................................................................

71

Captulo III: Documentos retratos de momentos da vida e que sobre ela intervm
3.1 A lgica dos documentos...............................................................................................

81

3.2 Etnografia dos documentos............................................................................................

92

3.3 Etnografias de trs casos estudados...............................................................................

97

3.4. Concepes de idosos sobre abrigamento.....................................................................

117

Consideraes finais...........................................................................................................

127

Referncias bibliogrficas.................................................................................................. 131

12

Introduo
As questes que suscitaram a elaborao desta dissertao se constituram ao
longo do meu processo de formao e prtica em Servio Social.
Assim, a construo textual apresenta elementos inicialmente observados
durante a realizao de estgio em Servio Social realizado junto s Promotorias de
Justia de Proteo ao Idoso e Pessoa com Deficincia, pertencentes ao Ministrio
Pblico do Estado do Rio de Janeiro, que foram aprofundados com pesquisa documental
e atuao como assistente social na mesma instituio.
Mediante a experincia de estgio em Servio Social foi que inicialmente atentei
para elementos da realidade social at ento por mim ignorados, dentre os quais,
situaes de abrigamento de idosos.
Para que eu os observasse contribuiu o conjunto de conhecimentos apreendidos
ao longo da graduao e mestrado, dentre eles, a experincia de iniciao cientfica no
Ncleo de Pesquisa Cultura Urbana, Sociabilidade e Identidade Social (NuSIS), nos
projetos Relaes intergeracionais e de gnero em famlias de camadas mdias
urbanas e Perspectiva dos jovens adultos sobre as mudanas sociais, por meio dos
quais as discusses sobre famlia, relaes intergeracionais, gnero, entre outras,
trouxeram elementos para a anlise da realidade social 1.
Atravs dos referidos projetos observaram-se mudanas sociais no modo da
famlia se reorganizar, na tendncia de flexibilidade dos domiclios para processos de
sadas e retornos, nas tenses e negociaes que conjugam rupturas e conciliaes, bem
como projetos individuais e papis familiares. Essas dinmicas tm relao com
movimentos contemporneos mais amplos de redefinio da juventude e da velhice, de
mudanas no curso da vida e nas relaes de gnero e de gerao que, entre outras
1

A participao como bolsista de iniciao cientfica PIBIC/UFRJ, com recursos do CNPQ foi realizada
durante dezoito meses da graduao, sob a orientao da professora doutora Myriam Moraes Lins de
Barros. No primeiro projeto citado, as histrias de vida de trs geraes de mulheres de diferentes
famlias foram base para a anlise das relaes intergeracionais e de gnero e da percepo das mudanas
e continuidades relativas aos valores e prticas sociais, onde foram analisados de modo inter e
intrageracional variados temas. As trajetrias de vida da primeira gerao trouxeram aspectos para pensar
tambm a velhice na atualidade. O lugar da gerao intermediria entre pais idosos e filhos jovens
adultos, em situao de dependncia financeira e coabitao, foi importante para a discusso do tema da
autonomia feminina, entre outros. A gerao jovem, ento estudada, suscitou questes sobre os processos
de construo da autonomia e independncia, a flexibilidade das unidades residenciais, a convivncia
intergeracional, os projetos de vida e os sentidos atribudos famlia, ao trabalho e escolarizao, entre
outros, que foram impulsionadores para a construo e realizao do projeto de pesquisa posterior, no
qual foram includos tambm rapazes.

13

situaes, repercutem na reconstituio do cotidiano familiar circunstanciado pelas


separaes e recasamentos, adiamento da sada dos jovens de casa, aumento da
expectativa de vida, coabitao de diferentes geraes, entre outros aspectos.
A discusso desses elementos foi importante para provocar a observao de
outros na prtica profissional, os quais tm relao com as mediaes que se
estabelecem entre famlia e outras instituies, entre elas se destaca aqui o Ministrio
Pblico pelas suas recentes atribuies e intervenes em face dos direitos do idoso, do
que participa tambm o Servio Social. No entanto, para a anlise das especificidades
do tema aqui dissertado encontrei dificuldades no que tange a outras produes
bibliogrficas semelhantes, com as quais eu pudesse estabelecer dilogo. No decorrer do
mestrado, contedos de algumas disciplinas contriburam para direcionar o
desenvolvimento desta dissertao. Essas trouxeram temas sobre famlia, polticas
voltadas aos idosos, violncia e sistemas de justia, que de acordo com a possibilidade
de interlocuo foram agregados a este trabalho. As demais disciplinas foram utilizadas
como pano de fundo para o entendimento da formao e desenvolvimento do Estado, da
prpria sociedade e do Servio Social.
Alm de limites para a interlocuo com estudos especficos sobre o tema, h
que se considerar que recente a atuao do Ministrio Pblico em face da tutela
individual de idosos em situao de risco 2, o que tambm traz limites para uma
anlise histrica. Essa atribuio institucional provocada pela Lei Federal n
10.741/2003 Estatuto do Idoso , sendo que na cidade do Rio de Janeiro a primeira
Promotoria especfica foi instituda em 2005.
Dentre as vrias questes apresentadas ao Ministrio Pblico, a escolha da
apreciao de demandas de abrigamento de idosos se deu na observao de que essas
trazem em seu bojo elementos importantes para pensar a sociedade de modo mais
abrangente. Ademais, constituem desafios para as polticas sociais, que se mostram no
cotidiano profissional do Servio Social.
Neste sentido, a partir do estgio em Servio Social realizado junto s
Promotorias do Idoso e da Pessoa com Deficincia da Capital, no perodo de julho de
2009 a julho de 2010, se mostraram algumas questes em atendimentos sociais e em
visitas domiciliares e institucionais feitas com as assistentes sociais do 3 Centro de

O que ser debatido em tpico especfico frente.

14

Apoio Operacional das Promotorias de Justia Cveis 3 CAOp Cvel3. A minha


observao e anlise foi ampliada por meio da atuao como assistente social a partir de
julho de 2012, quando aps um processo seletivo fui nomeada para trabalhar junto ao
referido Centro. Neste, as demandas de atuao do assistente social em sua maior parte
voltavam-se populao idosa e em decorrncia desse volume de solicitaes, em
setembro do mesmo ano, foi institudo o Centro de Apoio Operacional das Promotorias
de Justia de Proteo ao Idoso e Pessoa com Deficincia CAOIPD. A equipe de
Servio Social foi dividida entre os dois Centros de apoio e passei ento a exercer
minhas funes no recm-criado.
A experincia enquanto estagiria e como profissional, compreendem no s
dois momentos da minha trajetria profissional, mas tambm parte do movimento de
estruturao do trabalho voltado aos idosos no Ministrio Pblico. Ademais, nessa
instituio a dinmica de alteraes organizacionais permite pensar que a interveno
voltada ao idoso oriunda de um campo aberto de provocaes, que forjam respostas
institucionais, ainda em construo.
Dentre as vrias demandas e situaes de violaes de direitos do idoso
apresentadas ao Ministrio Pblico, o abrigamento de idosos chama tambm a ateno
por mostrar diversos entendimentos, que so apresentados pelos prprios, por
familiares, por instituies, profissionais, entre outros.
De acordo com o Estatuto do Idoso, as Instituies de Longa Permanncia para
Idosos ILPIs so legalmente obrigadas a diligenciar no sentido da preservao dos
vnculos familiares (EI, Art. 49, I), bem como comunicar ao Ministrio Pblico
situaes de abandono moral ou material por parte dos familiares, proceder a estudo
social e pessoal de cada caso e manter arquivo de informaes sobre cada idoso, entre
outras obrigaes (cf. EI, Art. 49).
O Ministrio Pblico, enquanto rgo fiscalizador da poltica de atendimento ao
idoso instaura procedimentos administrativos PA(s) relativos aos idosos abrigados e
requisita documentao s instituies. Assim, podem ser tambm notificados os
responsveis pelo idoso a fim de explicarem as razes do abrigamento.
Alm das questes acerca dos idosos em ILPI, durante o estgio, me chamava
ateno os pedidos de abrigamento e os decorrentes encaminhamentos, que em parte
3

Trata-se de rgo de apoio do Ministrio Pblico e que ser retomado frente, bem como ser exposto
sobre as Promotorias do Idoso e da Pessoa com Deficincia e seu funcionamento.

15

dos casos se tornava conhecido pelo retorno dos PA(s) para novo atendimento social.
Nas intervenes relativas aos idosos em ILPI e naquelas que solicitavam o
abrigamento, os comunicantes relatavam situaes comuns. Dessa forma, acionavam
aspectos familiares e sociais para explicar a necessidade de institucionalizao.
O meu maior questionamento se deu em face de comunicaes que envolviam
pedidos de abrigamento, porque tambm apresentavam relatos de que o acesso s
instituies de acolhimento pblicas e conveniadas somente seria efetivado aps
determinao do MP, o que em parte se deve a insuficincia de vagas. Assim, antes de
chegar s Promotorias parte dos comunicantes j haviam acionado outros servios
pblicos, dentre eles a Central de Recepo de Idosos, vinculada a Secretaria Municipal
de Assistncia Social, abrigos e Defensoria Pblica. H casos relatados em que os
comunicantes percorriam todas essas instituies. H outros em que profissionais da
Secretaria Municipal de Assistncia Social e da Secretaria de Envelhecimento Saudvel
e Qualidade de Vida encaminharam demandas de abrigamento de idosos ao MP para
que o autorizasse, embora o acolhimento institucional pblico seja de execuo do
municpio.
Alm disso, durante o estgio em Servio Social foram atendidos familiares
notificados que anteriormente haviam procurado o MP para solicitar o abrigamento do
idoso. Parte deles fora chamada para tomar cincia de que a famlia deveria viabilizar o
abrigamento. Assim, era lhes fornecida para consulta uma listagem de ILPIs privadas,
filantrpicas e conveniadas com o municpio e ou Estado para que de posse dos
endereos providenciassem a institucionalizao.
Diante disso, os atendidos narravam outras problemticas, entre elas, o fato de
idosos serem responsveis por outros idosos e questionavam quem assegurava o seu
prprio direito. Ademais, houve casos em que, pela demora e dificuldades em
concretizar o abrigamento pblico, alguns familiares se reorganizavam de diferentes
formas para resolver a situao, por vezes aceitando o idoso para residir com eles,
mesmo avaliando no terem condies para tal.
Neste sentido, considerei pertinente analisar o contedo desses documentos,
percebendo, entre outras questes: o perfil desses idosos; como os aspectos individuais,
familiares e sociais so acionados; de que forma os servios pblicos so provocados; o
que informa o prprio idoso e os demais comunicantes; como o abrigamento
compreendido pelos envolvidos.

16

Assim, no trabalho dissertativo utilizei de pesquisa documental de comunicaes


apresentadas ao Ministrio Pblico, que traziam de forma direta ou nas entrelinhas
demandas de abrigamento de idosos.
No perodo da insero como assistente social, a pesquisa e elaborao dessa
dissertao j estavam de certo modo avanadas. Dessa forma, embora alguns pontos
tenham sido retomados e aprofundados com o olhar no s de ex-estagiria e de
pesquisadora, mas tambm de profissional, o trabalho j tinha uma estrutura bsica, isto
, se pautava pelo material de pesquisa documental realizada.
A presente dissertao constituda por um tpico inicial sobre a metodologia
utilizada na realizao da pesquisa e est estruturada posteriormente em trs captulos.
No primeiro, apresento como a velhice se torna uma temtica a ser discutida e um
problema social a ser contemplado em polticas e aes especficas. Neste sentido, de
modo mais detalhado e qui exaustivo, apresento a trajetria das aes pblicas
voltadas aos idosos. Isso para mostrar que ideias de velhice as perpassam e entender que
os idosos com dependncia no so alvo de polticas pblicas efetivas.
No segundo captulo, menciono instncias de defesa dos direitos do idoso e de
maneira explicativa apresento as Promotorias de Justia de Proteo ao Idoso e Pessoa
com Deficincia. Nisso abordo a utilizao da definio de idoso em situao de risco
social como delimitador da interveno dessas Promotorias. Junto com isso e por meio
de informaes obtidas na pesquisa realizada e em observaes, descrevo o espao
fsico da instituio e um grupo representativo da populao que solicita interveno.
E por fim, no terceiro captulo desenvolvo uma discusso em torno da lgica dos
documentos institucionais. Por meio da utilizao da etnografia realizo uma descrio
densa dos percursos documentais intra e interinstitucionais e ainda de trs casos
estudados, para com isso debater como se conformam as demandas e situaes de
abrigamento de idosos e as concepes que as conduzem.
Com essa formatao possvel observar como as relaes sociais se
desenvolvem em dado perodo histrico e em processo, e nisso como a sociedade se
organiza para responder as necessidades que se apresentam.

17

A realizao da pesquisa documental


Na trajetria de construo das questes, em meados de agosto de 2011 me
dirigi ao 3 CAOp, onde em conversa com as assistentes sociais me foram perguntadas
questes metodolgicas da pesquisa, das quais eu tambm ainda no tinha clareza.
Naquela ocasio, sugeriram que no pesquisasse documentos muito antigos, nem muito
recentes, pois com relao aos primeiros, provavelmente parte significativa j teria sido
encaminhada ao arquivo ou s Varas de Justia. J em relao aos novos PA(s) haveria
ainda poucas informaes neles. Assim, foi definida a pesquisa de PA(s) constitudos no
segundo semestre de 2010, para possibilitar a leitura e anlise de procedimentos
administrativos no decorrer de no mnimo um ano, contemplando as aes decorrentes
da demanda inicial e os aspectos invocados para realiz-las.
Para a viabilizao da pesquisa, solicitei previamente autorizao ao MP, por meio
de texto redigido por mim e entregue no protocolo geral da instituio no dia 30 de
agosto de 2011. Esse gerou um procedimento administrativo (sob o n MPRJ
2011.00982976) e foi encaminhado Chefia de Gabinete, que o enviou ao 3CAOp no
dia 05 de setembro. O pedido foi recebido na secretaria desse rgo de assessoramento
no dia oito do mesmo ms. Quatro dias depois, foi analisado pela promotora que
ocupava o cargo de subcoordenadora do rgo e que considerou ser necessrio
encaminh-lo s Promotorias do Idoso da Capital, com a observao de eu ter sido
lotada nelas como estagiria. Essa informao havia sido mencionada por mim no texto
que redigi e pode ter favorecido a aceitao para a realizao da pesquisa. No perodo
entre 15 e 29 de setembro, o PA passou pelas secretarias das quatro promotorias e pelos
respectivos promotores que o assinaram com a inscrio sem oposio. Em meados
de outubro, foi encaminhado s assistentes sociais do 3CAOp que me deram cincia
sobre a permisso para a pesquisa. Assim, extra cpia do referido PA, cujo original foi
arquivado naquele setor, e pude iniciar o trabalho de campo.
Dentre os variados documentos que compem os PA(s), escolhi comear a
anlise pelo que chamado de representao 4, uma das formas de dar a conhecer ao
Ministrio Pblico dada situao.

Denomina-se representao a ao por meio da qual algum em nome alheio defende interesse e direito
alheio. Trata-se de elaborao escrita que apresenta dada situao e solicita a interveno institucional.

18

As representaes estudadas foram elaboradas em atendimentos sociais e


apresentam uma formatao comum, que privilegia os mesmos pontos a serem
registrados, dentre os quais, o vnculo do comunicante com o idoso.
A pesquisa foi iniciada em novembro de 2011 na sala do Servio Social das
Promotorias, onde fiz a leitura das cpias das representaes constitudas no segundo
semestre de 2010 e separei as que abordavam o abrigamento. Foram encontradas
dezessete, que de modo direto ou nas entrelinhas expunham a necessidade dessa
medida. Essas representaes se referem a dezoito idosos, uma vez que uma delas
relatava a situao de um casal. As informaes extradas desses documentos foram
inicialmente tabeladas considerando como dados principais a data da representao e
o nome do idoso, para a posterior localizao dos PA(s).
No ms de dezembro, com a autorizao da coordenadora das Secretarias das
Promotorias, pesquisei na intranet do Ministrio Pblico, no Mdulo de Gesto de
Processos MGP, o nmero de cada um dos PA(s), a secretaria de qual Promotoria
pertencia, o nmero atribudo nessa, bem como a sua localizao at aquela data. Nisso,
identifiquei que, das 17 representaes iniciais, onze ainda tramitavam nas
Promotorias, quatro haviam sido arquivadas e duas encaminhadas para Varas de Justia.
Dessa forma, para a realizao da minha pesquisa o acesso parte dos documentos
estaria inviabilizado por no estarem mais no MP.
Posteriormente, elaborei novas tabelas com as informaes obtidas e, em janeiro
de 2012 retornei s Promotorias para iniciar a leitura dos onze PA(s) que estariam em
andamento. Na ocasio, foi identificado que restava a possibilidade de acesso a oito
procedimentos, pois um fora encaminhado Vara de Justia e dois a outras sedes do
Ministrio Pblico, estes devido mudana de endereo do idoso.
Com isso, dei continuidade pesquisa com a leitura e anotaes dos oito PA(s)
restantes. Novas tabelas foram constitudas a partir dos seguintes eixos: a) dados
bsicos: nmero do PA, data da representao, gnero, idade, vnculo do comunicante
com o idoso; b) forma de apresentao da situao pelo comunicante, membros do MP e
terceiros; c) percursos institucionais e intervenes anteriores representao no MP
e via esta instituio; d) condies relatadas convivncia familiar e comunitria,
sade, moradia, econmicas.
No caso das Promotorias, o documento representao difere da comunicao feita Ouvidoria por
constar a identificao do comunicante, podendo na Ouvidoria ser sigiloso.

19

Desses aspectos, uma parte foi possvel obter em relao aos dezoito idosos,
considerando as informaes registradas no texto da representao de cada um. Com
relao aos oito casos ainda em andamento foram agregadas as informaes extradas da
leitura dos PA(s), isto , relativas aos encaminhamentos posteriores s representaes
que os originaram. O trabalho de campo foi feito at agosto de 2012 e alguns aspectos
includos posteriormente mediante a atuao profissional.
Ao optar pelo estudo de parte das representaes com pedidos de abrigamento
de idosos, redigidas no atendimento social das Promotorias, necessrio se faz considerar
que esses documentos so produzidos na interao entre profissional e atendido
(famlia, idoso e outros). Ou seja, o discurso escrito uma produo e no um dado,
pois pr-fabricado e construdo pela interao que o atravessa (BLANCHET e
GOTMAN, 1992). De modo semelhante, so constitudos os relatrios sociais presentes
nos procedimentos administrativos, os quais tambm devem responder ao despacho do
Promotor que os solicitou, ou seja, h uma direo do que documentar e o modo de
faz-lo, que esto definidas a priori.
Neste sentido, so pertinentes os apontamentos de Vianna (2002), que afirma
que esses documentos, enquanto bens administrativos registram aspectos parciais da
realidade, que resultam da converso das falas em depoimentos escritos e desses em
peas para a produo de uma deciso administrativa e ou judicial. As condies de
constrangimento das falas so dadas pela situao de estar perante profissionais e
especialistas com poder de avaliao e deciso. Nisso, h a escolha do que deixar
registrado ou do que silenciar ao longo do processo. Ademais, ao mesmo tempo em que
cada caso relatado em sua singularidade, tambm submetido a uma lgica comum,
dada pela elaborao padronizada e legal dos procedimentos adotados. A negociao do
contedo a ser registrado, se d entre os que so objeto do procedimento
administrativo e os profissionais que os atendem. Os procedimentos expressam, ainda, o
formato das relaes e das necessidades apresentadas e remodeladas legalmente e o
embate das concepes morais e simblicas capazes de definir uma famlia e um lugar
para o idoso.
Alm dessas consideraes, para realizar a anlise documental se estabelecem
critrios do que ser observado (SEVERINO, 2007). No que tange a esta elaborao,
foram considerados os aspectos acionados em face ao abrigamento, os demandantes

20

desse atendimento, os motivos apresentados, o acesso ou no s polticas sociais, entre


outras questes.
Por se tratar de estudo qualitativo, pode-se afirmar que a quantidade de
documentos a ser analisada menos importante que as particularidades que apresentam.
Eles revelam a heterogeneidade e a complexidade das questes, que permitem pensar o
abrigamento em diversos aspectos e sob variadas perspectivas. A quantidade de
documentos a ser analisada foi, inicialmente, demarcada pelo recorte temporal e
temtico. Posteriormente, na anlise dos dados e na escrita desta dissertao, foram
escolhidos trs casos para o relato dos percursos documentais e da vida desses idosos.
Alm disso, foram observados elementos relacionados ao abrigamento em outras
trajetrias de vida de idosos e de seus familiares, dos quais tomei conhecimento no
exerccio profissional, sendo alguns aspectos aqui includos.
Analisar o texto das representaes e os procedimentos administrativos que
tratam de situaes individuais, no significa, parafraseando Fonseca (1998), considerar
que cada caso um caso, mas sim atravs do particular abrir caminho para
interpretaes abrangentes, pois ao situar os sujeitos no contexto histrico e social h
como perceber os aspectos particulares e os que so compartilhados.
Ao utilizar como fonte de pesquisa os documentos produzidos na atuao do
Servio Social e de outros profissionais envolvidos, pondera-se o fato de, na sua
elaborao, se dar o confronto entre as prprias concepes profissionais, valores
culturais, conhecimentos especficos e condies de trabalho.
No que se refere aos registros e pareceres elaborados/documentados pelo
Servio Social, Fvero (2008) explica que o profissional pauta-se pelo que expresso
verbalmente e pelo que no falado, mas que se expressa aos olhos como integrante do
contexto em foco. Ele dialoga, observa, analisa, registra, estabelece pareceres,
apresentando muitas vezes, a reconstituio dos acontecimentos que levaram a uma
determinada situao (p. 27-28). Para tanto, segundo a autora, deve utilizar um saber
fundamentado histrica e teoricamente com base no compromisso com a garantia de
direitos.
Assim, a configurao dos documentos analisados neste estudo expressa
diferentes saberes e perspectivas. De modo semelhante, a escolha do tipo de anlise e de
coleta das informaes est subordinada aos objetivos da pesquisa e a formulao
terica que a norteia (BLANCHET e GOTMAN, 1992).

21

Cabe mencionar tambm que a discusso aqui apresentada incorpora uma


pesquisa que abarca um perodo e que agrega elementos de observao e atuao de
tempos distintos, ou seja, enquanto estagiria em Servio Social, pesquisadora, e
profissional. Essas inseres trazem em seu bojo desafios diferentes para o
estranhamento das questes. Alm disso, a realidade institucional tambm se modifica
no decorrer desse tempo e continua em movimento, o que significa considerar que este
estudo temporalizado e que as anlises aqui construdas no so definitivas, como,
alis, ocorre em qualquer anlise de processos sociais se observamos as relaes sociais
sob o ponto de vista dos contextos histricos e em situaes especficas.

22

Captulo I
Velhice como questo e configurao de polticas voltadas aos
idosos no Brasil

1.1 Mudanas na estrutura populacional


De acordo com a sntese de indicadores sociais (IBGE, 2009), a proporo de
idosos entre 1998 e 2008 passou de 8,8% para 11,1%, sendo o Rio de Janeiro (14,9%) e
o Rio Grande do Sul (13,5%) os estados com a maior proporo de idosos. Em 2008 o
contingente de pessoas com mais de 60 anos somava cerca de 20 milhes e o segmento
de pessoas com mais de 75 anos em torno de 5,5 milhes. No grupo etrio de 80 anos
ou mais, o crescimento relativo superou os demais, chegando a quase 70,0%.
Conforme os ltimos dados censitrios (IBGE, 2010), a populao idosa acima
de 60 anos soma 20.590.599, dos quais 9.527.354 se concentram na regio sudeste. Esta
e a regio sul apresentam evoluo semelhante da estrutura etria e se mantm como as
reas mais envelhecidas do pas. Juntas tinham, em 2010, contingente superior a 8,1%
de idosos acima de 65 anos.
As inflexes na pirmide etria indicam o impacto das sucessivas quedas da
fecundidade, que se iniciaram a partir da dcada de 1960. Segundo Moreira (2001), a
mudana na estrutura populacional atravs do tempo, se d basicamente por dois
processos: reduo da populao jovem (envelhecimento pela base) e reduo da
mortalidade nos grupos etrios mais velhos (envelhecimento pelo topo). De acordo com
a autora, o envelhecimento pelo topo ocorre nos atuais pases desenvolvidos que
continuam envelhecendo, a despeito dos seus baixos nveis de fecundidade. No Brasil,
embora estejam em curso ambos os processos, envelhecimento pelo topo e pela base, o
maior impacto se deve diminuio de nascimentos e em menor proporo pelo
aumento da expectativa de vida.
A reduo da fecundidade desencadeia mudanas profundas na distribuio
etria. A maior parte dos pases europeus levou quase um sculo para completar a
transio da estrutura etria. No Brasil, entre os anos 1970 e 2000, houve um declnio

23

da fecundidade equivalente a 60% e os efeitos na variao dos grupos etrios sero


sentidos nas prximas dcadas. Estima-se que, entre os anos 2000 e 2020, o tamanho da
populao abaixo de 25 anos diminuir em cerca de 5 milhes. O grupo etrio de 15 a
35 anos, que inclui as mulheres responsveis por mais de 90% dos nascimentos,
enfrentar taxas de crescimento negativas por todo o perodo 2011-2050. Com isso, o
nmero de nascimentos continuar declinando, mesmo se a taxa de fecundidade
continuar a mesma (WONG e CARVALHO, 2006).
Para a demografia, uma populao identificada como envelhecida quando a
proporo de pessoas acima de 65 anos oscila entre 8 e 10% da populao total
(MOREIRA, 2001). Essa proporo j existe no Brasil, conforme os dados expostos
acima. Recente relatrio do Banco Mundial sobre o envelhecimento populacional no
Brasil e o seu rebatimento em vrias reas, alerta para a velocidade do envelhecimento
populacional que em nosso pas
[...] ser significativamente maior do que ocorreu nas sociedades mais
desenvolvidas no sculo passado. Por exemplo, foi necessrio mais de um
sculo para que a Frana visse sua populao com idade igual ou superior a
65 anos aumentar de 7% para 14% do total. Em contraste, essa mesma
variao demogrfica ocorrer nas prximas duas dcadas (entre 2011 e
2031) no Brasil. A populao idosa ir mais do que triplicar nas prximas
quatro dcadas, de menos de 20 milhes em 2010 para aproximadamente 65
milhes em 2050 (BANCO MUNDIAL, 2011, p. 10).

Atravs de estudo comparativo entre Brasil e Frana, e guardadas as distines


do ponto de vista econmico e social, Peixoto (2000) afirma que:
[...] ao contrrio da Frana, no Brasil o processo de envelhecimento da
populao est no incio e os problemas relativos ao envelhecimento no
constituem pauta importante das polticas sociais: as penses de
aposentadorias so muito baixas, a sade pblica precria e no existe
nenhum tipo de assistncia social nem casas geritricas fundadas pelo Estado
do tipo das maisons de retraite francesas (PEIXOTO, 2000, p. 96).

O crescimento da proporo de idosos impe a necessidade de servios cada vez


mais complexos e especficos para esse segmento, pois o envelhecimento, no
problema, e sim vitria. Problema ser se as naes desenvolvidas ou em
desenvolvimento no elaborarem e executarem polticas e programas para promoverem
o desenvolvimento digno e sustentvel (BERZINS, 2008, p. 20).
H fatores que tendem a aumentar o nmero de idosos necessitados de cuidados
de longa durao. Um deles resulta na estimativa de nas prximas dcadas haver
crescimento do nmero de pessoas com idade acima de oitenta anos, e com isso
demandas na rea da sade, devido multiplicidade e natureza de suas patologias, j

24

que muitos desenvolvem doenas crnicas que tm impacto sobre a vida cotidiana
(IBGE, 2009). Em parte, a incapacidade funcional, conceito definido pela Organizao
Mundial da Sade OMS como a dificuldade devido a uma deficincia para realizar
as atividades tpicas e desejadas na sociedade, decorre dos processos de
envelhecimento, pois a sade produto das condies objetivas de existncia e
resultado das condies de vida (CAVALCANTI e ZUCCO, 2009, p. 70).
Outro fator que tender ao aumento do cuidado de idosos por outras instituies,
que no a famlia, refere-se ao:
[...] status da mulher e os valores familiares e sociais que passam por
transformaes e iro continuar a impactar na disponibilidade de ajuda
familiar. A baixa taxa de nascimentos e as complexidades da transio dos
jovens para uma maioridade moderna iro compor o cenrio. Estudos de um
amplo conjunto de pases em desenvolvimento revelam que pessoas mais
velhas esto se tornando menos confiantes em receber auxlio familiar.
Projees para o Brasil estimam o dobro de pessoas sendo cuidadas por nofamiliares em 2020, e cinco vezes mais em 2040, do que em comparao com
2008 (BANCO MUNDIAL, 2011, p 57).

Alm dessas questes, nas discusses polticas tendem a ganhar fora os


discursos favorveis s redues nos direitos previdencirios, sob a argumentao de
que os gastos com aposentadorias e penses iro dobrar para 22,4% do PIB em 2050.
Em um cenrio alternativo, projetamos uma srie de reformas que gradualmente
trariam os benefcios previdencirios no Brasil em linha com aqueles dos pases da
OCDE 5 (Idem, ibidem, p. 55).

1.2 Elaboraes sobre velhice


A velhice enquanto questo foi at pouco tempo um assunto sem valor
acadmico, passando a ter visibilidade atravs das transformaes sociais das ltimas
dcadas, nas relaes sociais desenvolvidas na famlia, no trabalho, nos espaos de
sociabilidade e com o movimento dos aposentados na dcada de 90 (LINS de
BARROS, 2004). Polticas especficas para os idosos tambm foram plasmadas nesse
perodo.

Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico.

25

Ao fazer um levantamento das teses e dissertaes se observa que a produo


acadmica sobre velhice ainda pequena e que a maior parte dos estudos refere-se
discusso da rea da sade, principalmente da enfermagem e psiquiatria 6. Pode-se
considerar que no Servio Social, ainda no h expressivo nmero de elaboraes sobre
idosos. No entanto, observa-se um aumento da demanda por interveno desse
profissional junto a idosos e suas famlias. Neste sentido, cabe citar a obrigatoriedade
das entidades que prestam servio de atendimento ao idoso em proceder a estudo
social e pessoal de cada caso (Estatuto do Idoso, Art. 50, XI), o que implica no
exerccio de uma atribuio privativa do assistente social7. Alm disso, no Estado do
Rio de Janeiro, as instituies prestadoras de servios de abrigamento aos idosos devem
dispor de equipe tcnica que, entre outros profissionais, tenha assistente social (Lei n.
3875/2002). Ao mesmo tempo, na atuao dessa profisso novas situaes vm sendo
colocadas. Uma parte delas exige respostas urgentes, para as quais o Estado ainda no
instituiu mecanismos de ao.
Na conjuntura de fragmentao e focalizao das polticas, de tendncia
responsabilizao dos sujeitos e individualizao dos problemas, torna-se necessrio
ao Servio Social, atravs da prtica profissional, impulsionar pesquisas e projetos que
favoream o conhecimento criterioso dos segmentos populacionais atendidos e dos
processos sociais, o que alimentar aes inovadoras, capazes de propiciar o
atendimento

efetivas

necessidades

sociais

(IAMAMOTO,

2008,

p.200).

Conhecimento, realidade e ao se articulam no exerccio profissional do Servio


Social, numa dinmica em que a pesquisa assume papel importante como prtica
investigativa de apreenso das facetas da realidade social e de sua anlise, ou seja, uma
atividade necessria e bsica do fazer profissional, tanto por seu papel destacado de
indagao

questionamento

permanente

das

aes

desenvolvidas,

como,

principalmente de construo da realidade (SARMENTO, 1999, p.107).


No mbito das Promotorias do Idoso, solicitado ao Servio Social a realizao
de estudo social, em geral com a determinao de visita domiciliar. As respostas aos
requerimentos das Promotorias so documentadas em relatrios sociais, que geralmente

Conforme leituras feitas por mim, de ttulos e resumos de publicaes divulgadas em sites de
universidades e no Scielo.
7
Segundo a Lei de Regulamentao da Profisso Lei n. 8.662/93, Art. 5.

26

se embasam em informaes obtidas por meio de visitas domiciliares e entrevistas8. De


acordo com Fvero (2008), o estudo social consiste na construo de um saber que pode
se constituir numa verdade. O relatrio social uma das formas de documentar e
apresentar com maior ou menor detalhamento a sistematizao do estudo realizado.
Via de regra deve apresentar o objeto de estudo, os sujeitos envolvidos e finalidade
qual se destina, os procedimentos utilizados, um breve histrico, desenvolvimento e
anlise da situao (FVERO, 2008, p.45). Embora na atuao das assistentes sociais
do 3CAOP Cvel e do CAOIPD esses aspectos sejam considerados, as profissionais
no utilizam a terminologia estudo social nos relatrios enviados como resposta aos
requerimentos dos Promotores. A no utilizao dessa definio se deve considerao
de que as informaes apresentadas so parciais e oriundas geralmente apenas de uma
visita social e ou entrevista, o que no permite caracterizar o resultado desse trabalho
como um estudo social aprofundado, no sentido que essa nomenclatura contm.
A visita domiciliar um meio para observar e conhecer a situao em que vive o
idoso e nisto compreender o contexto particular e as relaes sociais. Em parte dos
casos a visita tambm a nica forma possvel de contatar o idoso, e conforme as suas
condies, entrevist-lo sobre a situao em questo.
Com isso, por um lado, a interveno do Estado no espao domstico das
relaes sociais, atravs do assistente social, pode representar uma invaso de
privacidade. Por outro lado, ao desvelar a vida dos indivduos, pode oferecer subsdios
s decises, no sentido de abrir possibilidades de acesso aos direitos, alm de acumular
um conjunto de informaes sobre as expresses contemporneas da questo social,
pela via do estudo social (IAMAMOTO, 2004).
O relatrio um documento que apresenta
[...] de forma cristalizada pela escrita, as informaes colhidas e as
interpretaes realizadas iro intermediar a partir de um norte terico a
fala do sujeito, os demais dados obtidos e a anlise realizada, e aquele ou
aqueles que sero os leitores, os quais, geralmente, so os agentes que
emitiro uma deciso, ou participaro de uma deciso a respeito dos sujeitos
envolvidos (FVERO, 2008, p. 28).

Cabe lembrar que, ao longo do processo histrico do Servio Social, o estudo


social esteve presente no campo sociojurdico, onde a interveno tende a ser desviada
8

Conforme a finalidade a que se destina que so definidos os meios de realizao do exerccio


profissional. As visitas e entrevistas so instrumentos, dentre outros como, por exemplo, a anlise de
documentos, que possibilitam conhecer e clarificar situaes e consider-las em suas singularidades
inseridas na realidade social mais ampla.

27

para a direo da regulao caso a caso, do controle e do disciplinamento dos sujeitos


sociais (FVERO, 2008, p.38). Assim, na atuao do assistente social se coloca a
tenso entre prticas consideradas tradicionais no Servio Social, no sentido de que no
rompem com a imediaticidade e podem expressar uma prtica indiferenciada (NETTO,
1992) se comparadas s aes filantrpicas anteriores e centradas no indivduo, e o
desafio de construir e fomentar novas estratgias de interveno e de respostas
institucionais.

1.3 Construo social de termos classificatrios da velhice


De acordo com Hareven (1999), a preocupao com a velhice parte de uma
tendncia contnua segregao por idade. O envelhecimento e a idade esto
relacionados a fenmenos biolgicos, porm seus significados so determinados social e
culturalmente. No ocidente, faz-se referncia a estgios de vida como etapas de
desenvolvimento, que envolvem grupos etrios com caractersticas singulares. Com
relao velhice, a sua formulao pblica e institucional, como etapa distinta, se deu
na convergncia das elaboraes do campo gerontolgico, na proliferao de
esteretipos negativos sobre os velhos e no estabelecimento da aposentadoria
compulsria.
Desse modo, foi a partir do final do sculo XIX com a industrializao e
mudanas demogrficas, que, paulatinamente, comeou a ser desenvolvida uma maior
diferenciao entre os grupos de idade. Conforme Hareven (1999), a sociedade norteamericana passou de uma aceitao da velhice como processo natural para um perodo
caracterizado pelo declnio e dependncia. Foi no incio daquele sculo que se
assentaram as bases da geriatria como ramo especfico da medicina. Ao longo do sculo
XX, a industrializao e as demandas por proteo aos idosos provocaram o interesse
pelo significado do envelhecimento relacionado a questes sobre os limites da utilizao
da fora de trabalho. Assim, quando as particularidades so associadas a algum
problema social importante, as necessidades podem ser reconhecidas, integrar
legislaes e serem estabelecidas instituies para atend-las.

28

Segundo Peixoto (2007), a velhice se tornou um problema social a ser


reconhecido pelo Estado em consequncia de mudanas socioeconmicas, entre elas, o
advento da aposentadoria e a dificuldade das famlias em arcar com os custos de
manuteno dos idosos. A criao de categorias classificatrias na representao social
da velhice sofreu modificaes com o prolongamento da vida, que pressiona o
alargamento das faixas etrias mais jovens, e com as mudanas que reclamavam
polticas sociais para a velhice.
Neste sentido, a autora estabelece uma comparao entre Frana e Brasil.
Observa que, naquele pas do sculo XIX, o termo velho ou velhote designava as
pessoas com mais de 60 anos que no possuam condies econmicas de assegurar seu
futuro em decorrncia da diminuio de suas foras para o trabalho, o nico bem que
possuam. Os que tinham posses eram designados pelo termo idoso. No entanto, a partir
dos anos 60 do sculo XX, com uma nova poltica francesa para a velhice que elevou as
penses e aumentou o prestgio dos aposentados, se deu uma mudana nos termos de
tratamento, que transformou os problemas dos velhos em necessidades dos idosos.
Os aposentados passaram a reproduzir prticas sociais associadas s camadas mdias
assalariadas e se designou o vocbulo terceira idade para representar os jovens
aposentados. Contudo, foi necessrio distinguir os jovens idosos dos idosos velhos e,
assim, as pessoas com mais de 75 anos foram classificadas como pertencentes quarta
idade.
No que tange s denominaes da velhice no Brasil, os textos oficiais, anteriores
aos anos 60, utilizavam a expresso velho. No final daquela dcada, as mudanas da
imagem da velhice na Europa ecoaram no Brasil e, com isso, paulatinamente se passou
a utilizar o termo idoso.
O uso da categoria velho est associado decadncia, dependncia,
incapacidade e pobreza, que apresentam mais nitidamente as consequncias do
envelhecimento. A noo terceira idade mascara um grupo social heterogneo e
advm de um decalque francs adotado aps a implantao de polticas para a velhice
naquele pas, voltadas para atividades culturais, sociais e esportivas. Terceira idade
designa ento os jovens velhos, os aposentados dinmicos, consumidores de produtos
de beleza, de turismo e de especialidades mdicas, enquanto idoso se refere aos
velhos respeitados (PEIXOTO, 2007).

29

No entanto, diferentemente das intervenes voltadas s crianas e adolescentes


que se justificavam na preocupao de que a negligncia poderia torn-las adultos
perigosos ordem societria, os idosos receberam pouca ateno por no configurarem
uma possvel ameaa sociedade (HAREVEN, 1999).
Alm disso, conforme Bassit (2000), a modernidade, ao estar ligada ao
nascimento do Estado moderno e ao desenvolvimento do capitalismo, da cincia e da
tecnologia, provoca maior preocupao em registrar, regular e disciplinar a vida das
pessoas e passa a periodiz-la. Assim, por exemplo, se institucionalizam as passagens
da famlia para a escola ou trabalho, delimitando qual a idade ideal para esses e outros
eventos. Pode-se considerar que h uma transio para dentro e uma para fora da vida
adulta e a durao das diferentes fases (infncia, adolescncia, maturidade e velhice)
esto relacionadas e so determinadas historicamente.
Neste sentido, as categorias de idade so construes sociais, que mudam
historicamente, mas isso no significa dizer que no tenham efetividade. Essas
categorias so constitutivas de realidades sociais especficas, uma vez que operam
recortes no todo social, estabelecendo direitos e deveres diferenciais em uma
populao, definindo relaes entre as geraes e distribuindo poder e privilgios
(DEBERT, 2007, p. 53). Isso se deu na conjuntura de passagem de uma economia
domstica para o mercado de trabalho e no processo de transformao de questes,
antes consideradas da esfera privada e familiar, para a ordem pblica, tornando o Estado
a instituio que regula o curso da vida.
Ademais, a separao gradual entre trabalho e demais aspectos da vida, o
abandono da predominncia dos valores familiares em favor do individualismo e da
privacidade, a expulso dos mais velhos do trabalho e o declnio em suas funes
familiares devido substituio da orientao pautada na experincia pela informao
profissional, levaram diminuio de poder dos mais velhos na vida familiar. Parte das
funes antes concentradas no lar, entre as quais, o cuidado dos dependentes, foi
transferida para instituies especializadas (HAREVEN, 1999).
De acordo com Lins de Barros (2002), na modernidade, o curso da vida
pensado a partir da concepo individualista do ser humano, por isso se
institucionalizam periodizaes e se colocam questes como as crises de idade e os
conflitos entre geraes. Nessa conjuntura, as experincias individuais adquirem

30

relevncia como construtoras de significados para os sujeitos, e as mudanas culturais e


histricas so vistas como produtoras de conflitos e negociaes.
Na contemporaneidade, as aes direcionadas aos idosos trazem consigo a
ideologia individualista no trato com a velhice e na experincia do envelhecer (LINS
de BARROS 2004, p. 49). Nas ltimas dcadas, com o termo terceira idade se apresenta
uma nova forma de envelhecer e uma imagem menos negativa dessa fase da vida, sob
a ideia de que para viver bem o ltimo perodo da vida, bastaria nos engajarmos
nesta ideia e se no o fazemos, isto se deve mais a ns mesmos do que s condies
sociais e culturais (Ibidem; p. 49).
Nesta perspectiva, Debert (1999) discute como a velhice foi transformada de um
problema da esfera familiar e privada para uma questo do mbito da interveno
pblica, sujeita a legislaes e polticas especficas, ou seja, h uma socializao
progressiva da gesto da velhice. Ao mesmo tempo, nesse processo posta como um
problema individual, tendncia que a mesma autora denomina de reprivatizao da
velhice.
Conforme Simes (2000), no Brasil as mobilizaes dos aposentados
contriburam na produo de representaes sociais dos idosos. O movimento dos
aposentados ganhou alguma visibilidade durante a Assembleia Constituinte, na
elaborao de artigos relativos Seguridade Social, e adquiriu maior auge na dcada de
90, por meio das manifestaes que contestavam o reajuste das aposentadorias e
penses, em valor inferior ao ndice aplicado ao salrio mnimo. As mobilizaes
operaram com duas imagens polarizadas dos idosos.
De um lado, os aposentados foram identificados com o idoso carente,
dependente e abandonado pela famlia e pelo Estado, imagem que,
reiteradamente, tem servido para legitimar os direitos especficos dos mais
velhos proteo social e que, desta feita, tambm sustentou a relevncia
social e poltica das associaes e do movimento dos aposentados. De outro
lado, a ateno conquistada na mdia pelas manifestaes dos aposentados
acionou uma nova representao de idosos militantes, que encontravam na
luta poltica uma forma de combater os esteretipos e preconceitos da
inatividade e da perda de papis associados velhice (SIMES, 2000,
p.281).

Assim, nos discursos realizados nas mobilizaes e nas entrevistas, os


aposentados militantes procuravam se apresentar como lcidos e ativos, com saber
poltico e experincia de vida. Ao mesmo tempo, falavam dos seus direitos como
reinvindicaes particulares e como interpelao s novas geraes para que se
conscientizassem de seus destinos.

31

Cabe lembrar que, no plano econmico, a aposentadoria desde os seus primeiros


sistemas no marca necessariamente o envelhecimento fsico e cronolgico do
trabalhador, e sim sua incapacidade para o trabalho. No incio do sculo XX, com
alteraes na organizao da produo que visavam a sua maximizao, os
trabalhadores mais velhos passaram a ser discriminados por no se adaptarem o
suficiente s novas condies de trabalho e de produtividade. Com isso, criou-se uma
modalidade de envelhecimento profissional e a aposentadoria foi um dos meios para a
recomposio etria da fora de trabalho (SIMES, 1997). Na conjuntura atual, pode-se
observar que produzida uma dinmica inversa, que, junto com a difuso do
envelhecimento ativo e do direito do idoso ao trabalho 9, so favorveis a reformas da
previdncia que estendem os limites etrios para a aposentadoria e reduzem os valores
dos benefcios, uma vez que pensada a continuidade, o retorno ou nova insero do
idoso no trabalho.
Outro aspecto presente na construo do envelhecimento trabalhado por Koury
(2011), que atenta para a construo do envelhecimento no imaginrio de homens e
mulheres idosos. O morrer referenciado de forma implcita ou explcita como um
processo natural dos velhos, embora presente em todas as fases da vida de qualquer
pessoa, e se a
[...] imagem do idoso tem sido constantemente deslocada para uma idade
mais tardia, a partir do final dos setenta anos ainda so considerados jovens e
ativos, essa juventude e ativismo so vistos como um esforo pessoal de se
manter jovem e considerado pelo vis, seja como um modelo a ser seguido,
seja pelo preconceito: parece que esse velho (ou velha) no se enxerga
(KOURY, 2011, p.61).

Com isso, no processo de envelhecer se coloca a questo de como permanecer


ativo e resguardar um corpo saudvel, associado ao ser jovem, sem cair no ridculo. E
ao mesmo tempo, como se guiar em um mundo voltado para uma construo de
juventude e para interesses volteis de ser jovem quando o corpo e a mente exigem
outro tipo de insero cultural, social e psquica (Ibid.).
Assim, os valores dominantes, ao enfatizarem o envelhecimento saudvel, a
liberdade individual e a autonomia, tm deixado de lado a velhice frgil e dependente
(DEBERT, 1999). A transformao dos problemas da velhice em responsabilidade

Inclusive prevendo programas de estmulos s empresas para admisso de idosos e proibio de limite
mximo de idade, dando-se ainda preferncia ao de idade mais elevada nos casos de empate em concursos
pblicos (EI, Art. 26-28).

32

individual contribui, no contexto brasileiro, para a no proposio de polticas pblicas


que, de fato, viabilizem respostas s demandas dos vrios segmentos idosos,
principalmente daqueles que apresentam dependncia de cuidados.
Cabe ainda mencionar que a construo de termos classificatrios da velhice no
d conta da heterogeneidade que comporta os vrios grupos etrios que ela contm, nem
os modos de envelhecer. Ademais, ao contrrio da trajetria dos movimentos
feministas e tnico-raciais, no encontramos a constituio de uma memria coletiva
que sustente a definio de velhice como uma identidade social que conforme um
grupo minoritrio (LINS de BARROS e ALVES, 2012)
Os idosos no constituem grupo identitrio como os movimentos feminista e
negro, por exemplo, que se originaram em oposio ao outro: mulheres x homens,
negros x brancos. Com a ideologia do envelhecimento ativo, idosos no se opem a
grupos etrios mais novos e a velhice se apresenta de forma mltipla e fragmentada.
Desse modo, numa conjuntura em que se constituem polticas pblicas para
segmentos especficos, e, para tal, se estabelece uma suposta relao entre poltica de
reconhecimento e identidade (TAYLOR, 1998), cabe observar por quais meios e lutas
se configuram as polticas para os idosos.
Segundo Debert (1997), o discurso gerontolgico contribuiu para dar
visibilidade ao envelhecimento e transform-lo em uma questo poltica e para propor
prticas promotoras de uma velhice bem sucedida. A quebra do silncio no trato da
velhice no pas pode ser observada em torno de quatro aspectos: mudana demogrfica,
que exige gastos pblicos para atender os idosos; a crtica ao capitalismo, que torna a
misria e a excluso ainda mais amargas na velhice queles que no dispem de
condies para trabalhar e que so desvalorizados e abandonados pelo Estado e a
sociedade; a valorizao do jovem e o menosprezo da experincia e da memria; e, o
que diz respeito ao Estado, pois com o declnio da famlia extensa e um Estado incapaz
de resolver problemas bsicos da populao, a pobreza e a misria se tornam ainda mais
paradigmticas na velhice.
Ademais, conforme Camarano (2004), em parte do debate poltico e da literatura
sobre o envelhecimento se observam duas concepes polarizadas da experincia do
envelhecer: uma viso negativa, que a associa a problemas sociais e dependncia; e
outra, que a considera com condies de contribuir para o desenvolvimento
socioeconmico dos pases. Essas concepes influenciam na direo das polticas

33

sociais, pois podem conduzir a discriminaes no mercado de trabalho, estruturao de


polticas que reforam o aspecto da dependncia econmica, da sade e da autonomia,
e, alm disso, apresentar o idoso como improdutivo e consumidor de servios pblicos,
entre eles, os previdencirios e de sade.
No entanto, h que se considerar que, parte dos estudos, por exemplo, na rea
das cincias sociais, abordam a heterogeneidade das experincias do envelhecer e das
distintas necessidades da populao idosa. Conforme Debert (1997), no h como
afirmar em que medida o discurso de especialistas influencia nas prticas sociais e nas
polticas voltadas aos idosos. Entretanto, constata-se que, desde a dcada de 80, as
questes relativas velhice ocupam espao entre os temas que preocupam a sociedade
brasileira. Isso se evidencia em trs tipos de manifestaes: pesquisas acadmicas,
aberturas de espaos em organizaes governamentais e privadas para iniciativas
voltadas ao envelhecimento bem sucedido, e o tratamento mais amplo que o idoso e
seus problemas recebem na mdia.
A representao do avano da idade como um processo contnuo de perdas em
que os indivduos ficariam relegados a uma situao de abandono, de desprezo e de
ausncia de papis sociais, contribuiu para a universalizao da aposentadoria, leis
protetivas dos idosos e conferncias e planos de ao internacionais para o
envelhecimento (DEBERT, 2012).
Segundo a mesma autora, junto com as mudanas objetivas, necessrio um
processo de enunciao que as incorpore na luta poltica. Diferentemente de outras
categorias, os velhos nem sempre tm condies para a expresso pblica e suas
demandas so apresentadas por porta-vozes, os especialistas, que tem sua competncia
reconhecida por um campo de saber, por exemplo, a gerontologia.

1.4 Panorama histrico das aes e proposies pblicas


voltadas aos idosos
A discusso relativa ao abrigamento de idosos implica em observar como, ao
longo da histria, esse segmento populacional foi includo no que hoje se convencionou
chamar de sistema de garantia de direitos. Desse modo, cabe aqui explanar sobre as

34

legislaes e polticas sociais, no nvel nacional e municipal, e atentar para os nexos


com o plano internacional, bem como para as mudanas societrias que lhe so
inerentes. Isso tem como pano de fundo o fato de parte significativa das diretrizes legais
constitudas no mbito nacional serem decorrentes de documentos internacionais dos
quais o Brasil signatrio. Ademais, as polticas sociais se concretizam no mbito dos
muncipios, pautadas pelo princpio da descentralizao, que lhes confere a competncia
para execut-las.
Ao voltar o olhar para as polticas sociais, vale rememorar que elas foram
gestadas na confluncia dos movimentos de ascenso do capitalismo com a Revoluo
Industrial, das lutas de classe e do desenvolvimento da interveno estatal (BEHRING e
BOSCHETTI, 2007). Elas resultam de processos sociais e, desse modo, no se pode
indicar com preciso um perodo especfico do seu surgimento. O que se pode afirmar
que, as origens das polticas sociais so comumente associadas aos movimentos de
massa socialdemocratas e formao dos Estados-nao na Europa ocidental, nos fins
do sculo XIX. Ademais, a expanso das polticas sociais se d no ps II Guerra
Mundial, em um contexto de passagem do capitalismo concorrencial para o
monopolista.
Dessa forma, as polticas sociais surgem e se desenvolvem na perspectiva do
enfrentamento da questo social, isto , por um conjunto de expresses do processo
de desenvolvimento do capitalismo, da formao da classe trabalhadora e de seu
ingresso no cenrio poltico, exigindo do Estado e do empresariado respostas s suas
necessidades de sobrevivncia. Assim, dizem respeito diviso da sociedade em classes
e organizao dos trabalhadores, do Estado e do capital em torno da direo a ser dada
riqueza socialmente produzida.
Nas sociedades pr-capitalistas, o Estado assumia algumas demandas sociais ao
lado de aes filantrpicas e de caridade privada. As intervenes eram de cunho mais
punitivo do que protetivo. Nesse sentido, a literatura sobre a temtica, frequentemente
recorda as Leis Inglesas10, que antecederam a Revoluo Industrial e que se espalharam
pela Europa. Essas estavam fortemente associadas ao trabalho e a ele estavam obrigados
todos os que para tal apresentassem condies. A assistncia era mnima e com critrios

10

Exemplos disso so: Estatuto dos Trabalhadores (1349), Estatuto dos Arteses (1563), Lei dos Pobres
Elisabetanas (1531-1601), Lei de Domiclio (1662), Speenhamland Act (1795), Poor Law Amendment
Act (1834). Ver mais sobre as mesmas em: BEHRING e BOSCHETTI (2007).

35

seletivos e restritivos, visando induzir a todos a se manterem por meio do trabalho.


Alm disso, por intermdio da Lei dos Pobres, por exemplo, ao acessar aos direitos
sociais, os pobres deixavam de ser inteiramente cidados, porque na condio de
internados nas casas de trabalho no tinham o direito civil da liberdade pessoal, e,
consequentemente, tambm eram impedidos de exercer os direitos polticos
(MARSHALL, 1967). Desse modo, pode-se afirmar que, se dava um divrcio entre
direitos sociais e estatuto de cidadania. Assim, mulheres e velhos, por exemplo, eram
protegidos porque no eram considerados cidados. Isto, de certa forma, remete s
polticas sociais contemporneas que pela sua organizao pontual e fragmentada e
pelas condicionalidades que impem no acesso, tambm colidem na forma de
interveno e dificultam a consolidao de direitos.
Conforme argumenta Fleury Teixeira (1989), a natureza compensatria e
punitiva das polticas de assistncia social, que submetem os atendidos a rituais
comprobatrios de sua condio, faz com que o indivduo se relacione com o Estado
quando se reconhece como no cidado. pela percepo de sua incapacidade que o
indivduo recorre assistncia social e, na condio de necessitado, nas palavras da
mesma autora, estabelece com o Estado uma relao de cidadania invertida.
No entanto, h tambm que se considerar que dos primrdios atualidade, as
aes no campo das polticas sociais tm dupla face: por um lado, representam a busca
de estabilizao das relaes sociais, e, por outro, permitem o acesso a recursos,
servios, reconhecimento de direitos. Desse modo, as polticas sociais cumprem funo
ideolgica e so espaos de presso pela ampliao de direitos. O Estado incorpora
exigncias dos trabalhadores e as integra sua ordem, de modo que possa atender a
ambos (YASBEK, 1993).
Pode-se ponderar que, os idosos passaram a constituir uma categoria social
somente ao longo do sculo XIX, quando os grupos necessitados de cuidados
comearam a ser diferenciados. Com isso, poca, os mendigos e os velhos foram
considerados incapazes para o trabalho e os que no trabalhavam, sob a alcunha de
vadios, eram tratados como caso de polcia. No Brasil, em termos de legislao, h
como marco o decreto imperial de 1884, que regulamentou o funcionamento do Asilo
de Mendicidade, no qual quatro grupos de mendigos eram admitidos: os menores de 14
anos, abandonados e ociosos; os indigentes, os velhos e os incapazes; os que se
apresentavam espontaneamente provando sua indigncia; e os alienados, que no eram

36

recebidos no Hospcio Dom Pedro II (GROISSMAM, 1999 apud CHRISTOPHER,


2009).
O incio do sculo XX foi marcado por lutas operrias que se manifestaram por
intermdio de greves gerais dos trabalhadores (1905, 1907, 1917, 1919) que, em meio
reinvindicaes por questes salariais, incluram a proteo social da famlia, e nisso a
demanda por aposentadoria. No entanto, as respostas do Estado se centravam na
represso policial e a sua omisso perante as necessidades dos trabalhadores fazia com
que eles organizassem sistemas de Caixas de Aposentadorias e Penses com recursos
prprios, a fim de assegurar materialmente a si mesmos e suas famlias nas situaes de
desemprego, velhice, doena ou morte. Em 1923, as Caixas de Aposentadorias e
Penses foram normatizadas pelo Estado, por intermdio da Lei Eli Chaves.
Naquele perodo, as aes no campo da assistncia, em sua maior parte, eram
civis e com carter caritativo, como as Irmandades da Misericrdia, ligadas Igreja
Catlica, e que ofereciam servios de hospedaria, albergue e enfermaria. Essa
modalidade de atendimento se estendeu ao longo dos tempos, constituindo instituies
de acolhimento e convivendo com diferentes graus de interao com os sistemas
pblicos de proteo social (TEIXEIRA, 2008).
Na dcada de 1930, o processo de modernizao e as lutas dos trabalhadores
conduziram a ao do Estado na regulao entre capital e trabalho, o que levou a
instaurar direitos sindicais, trabalhistas e previdencirios. Em 1933, foram institudos os
Institutos de Aposentadorias e Penses (IAPs), que contavam com a participao estatal
na administrao e financiamento, porm mantinham a capitalizao por parte dos
trabalhadores. Em 1960, por meio da Lei Orgnica da Previdncia Social LOPS ,
foram uniformizados os direitos dos segurados, que, anteriormente, eram definidos de
acordo com as categorias ocupacionais, e ampliados os benefcios para todos os
trabalhadores regulados pelas leis do trabalho. No entanto, nesse perodo, os
trabalhadores rurais, os autnomos e as empregadas domsticas permaneceram sem
cobertura.
Dessa forma, para os idosos que no contavam com trabalho regulamentado
restavam apenas pontuais aes de assistncia, com carter filantrpico. Em 1942, foi
criada a Legio Brasileira de Assistncia (LBA), cuja presidncia era assegurada s
primeiras-damas e que, mesmo sob a interveno estatal, manteve caractersticas de

37

ajuda, relacionada ao mrito da necessidade e no ao direito do cidado (TEIXEIRA,


2008).
Nas dcadas de 1960 e 1970, no contexto ditatorial, a incorporao de demandas
do envelhecimento se deu por meio de iniciativas da sociedade civil, das associaes
cientficas e do Estado. Esse, contraditoriamente, ampliou a proteo social na
perspectiva de alcanar legitimidade.
No mbito da sociedade civil, foi criada, em 1961, a Sociedade Brasileira de
Geriatria (SBG), no Rio de Janeiro. Formada por mdicos, visava estimular iniciativas e
obras sociais de amparo velhice e cooperar com outras organizaes interessadas em
atividades educacionais, assistenciais e de pesquisa, entre outros objetivos
(CAMARANO e PASINATO, 2004). Em 1978, passou a incorporar outras categorias
profissionais e a ser denominada Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
(SBGG).
Outra iniciativa que marca a trajetria de aes voltadas ao idoso, data de 1963,
quando, em So Paulo, o Servio Social do Comrcio (SESC) passa a realizar trabalho
com idosos e a dar visibilidade social ao envelhecimento (CAMARANO e PASINATO,
2004; TEIXEIRA, 2008). Essa instituio desenvolveu atividades socioculturais e de
convivncia entre idosos, promoveu formao de tcnicos na rea de gerontologia, criou
centros de documentao, publicaes, seminrios e congressos envolvendo idosos e
profissionais, que contriburam para a constituio de polticas pblicas posteriores.
Na dcada de 1970, comearam a ser desenvolvidas aes do governo federal,
atravs do Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS) que executava o Programa
de Assistncia ao Idoso PAI, o qual congregava espaos de convivncia em seus
prprios centros sociais e em instituies conveniadas, bem como dispunha de
internao de aposentados e pensionistas do Instituto que apresentassem desgaste fsico
e mental, insuficincia de recursos e inexistncia de suporte familiar. De acordo com
Silva (2006), a incluso dos idosos nas instituies dependia de um laudo mdico e de
uma anlise do Servio Social, em que se avaliava o estado fsico e mental, a falta de
recursos do idoso ou de sua famlia e as circunstncias do abandono familiar.
Em 1971, foi estendida a aposentadoria para trabalhadores rurais chefes de
domiclio e a renda mensal vitalcia para trabalhadores urbanos e rurais idosos e, ainda,
para pessoas com deficincia e insuficincia de renda. Em 1972, as empregadas

38

domsticas foram incorporadas previdncia e, no ano seguinte, os trabalhadores


autnomos.
Ainda na dcada de 70, o Ministrio da Previdncia e Assistncia Social
(MPAS) organizou trs seminrios regionais, nas cidades de So Paulo, Belo Horizonte
e Fortaleza, com o tema A situao do idoso no pas. Esses foram preparatrios para o
seminrio nacional intitulado Estratgias de Poltica Social para o Idoso no Brasil. De
acordo com Teixeira (2008), as discusses dos seminrios indicaram a falta de uma
poltica social definida e a necessidade de conjugar aes entre famlia, comunidade e
poder pblico na ateno ao idoso.
Em 1977, o MPAS definiu a Poltica Social do Idoso, elencando aes de
atendimento institucionalizado e mdico-social, programas de pr-aposentadorias,
treinamento de recursos humanos, mobilizao comunitria, entre outros. No entanto,
devido a seu contedo abstrato, se tornou letra morta (GOLDMAN, 2000). Conforme
exposto, as polticas voltadas para a populao idosa se resumiam ao provimento de
renda para os segmentos de trabalhadores e de assistncia para os vulnerveis e
dependentes. Somente ao longo dos anos 1980 que comearam a ganhar espao outras
concepes de ateno ao idoso, as quais foram impulsionadas pelo debate
internacional, quando o Brasil foi signatrio do Plano Internacional de Ao para o
Envelhecimento (1982).
O referido Plano resultou da primeira Assembleia Mundial sobre o
Envelhecimento realizada em Viena, e que teve como marco de referncia a
Conferncia dos Direitos Humanos realizada em Teer, em 1968.
Dado o contexto poltico, econmico e social, admitiu-se que, pela
vulnerabilidade da populao idosa, esta deveria sofrer mais as
consequncias do colonialismo, neocolonismo, racismo e prticas do
apartheid. (...) No plano global, vivia-se um momento marcado pelas tenses
da Guerra Fria e, no regional, predominavam os regimes de exceo
(CAMARANO e PASINATO, 2004, p.255).

O Plano Internacional de Ao indicou aos pases a adoo de um conceito ativo


e positivo do envelhecimento e de aes que garantissem um envelhecimento saudvel.
Estava centrado no bem estar dos idosos dos pases desenvolvidos e voltado para
aqueles independentes e com poder de compra, bem como tinha uma viso de
medicalizao da velhice. Alm disso, no Plano foram elencadas recomendaes aos
pases, para, entre outras questes, prover penses, aposentadorias e assistncia sade,

39

porm, essas dependiam de alocao de recursos, que no foram previstos (Id.; Ibid.,
255-256).
Sob a influncia do debate internacional e por intermdio do processo
Constituinte, o Brasil incorporou o tema do envelhecimento na Carta Magna de 1988.
Assim, junto com o processo de redemocratizao do pas, vivenciado na mesma
dcada, organizaes da sociedade civil, incipientes em perodos anteriores, adquiriram
maior fora, entre elas as organizaes de aposentados e pensionistas que tiveram papel
relevante na luta por polticas pblicas para os idosos. Por intermdio do movimento
dos aposentados tornou-se favorvel a construo de uma concepo de idoso enquanto
ator poltico, apesar do grupo de aposentados no se restringir a pessoas com mais de 60
anos.
A Constituio de 1988 inovou ao apresentar a ideia de seguridade social com
integrao das polticas de assistncia, previdncia e sade, e princpios como
universalizao, equidade, participao, descentralizao. Para assegurar direitos
fundamentais, o texto constitucional comporta no captulo VII, que trata da famlia, da
criana, do adolescente, do jovem e do idoso, a viso de repartio de responsabilidades
entre famlia, Estado e sociedade.
Neste sentido, no que se refere ao idoso, a famlia, a sociedade e o Estado tm
o dever de amparar as pessoas idosas assegurando sua participao na comunidade,
defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito vida (Art. 230). E
ainda, os programas de amparo aos idosos sero executados preferencialmente em
seus lares (Art. 230, 1).
No que tange diviso de responsabilidades entre sociedade, Estado e famlia,
pode-se observar que, nas normativas, a ideia de proteo por parte da sociedade um
tanto inespecfica. Na realidade, a participao desta se torna visvel pela oferta de
servios de natureza privada e ou filantrpica e, mais do que pelo carter de proteo, se
mostra pela omisso, por exemplo, quando h violao de direitos. Alm disso, embora
se trate de repartio de responsabilidades, a falta ou precariedade de aes estatais na
promoo de servios sociais nem sempre devidamente apreciada. J sobre a famlia,
considerada no texto constitucional como base da sociedade (Art. 226) e cuja
natureza protetiva , tradicionalmente, considerada ontolgica, recaem julgamentos
morais e de responsabilidade legal.

40

A Constituio Federal explicita que os pais tm o dever de assistir, criar e


educar os filhos menores, e os filhos maiores tm o dever de ajudar e amparar os pais
na velhice, carncia ou enfermidade (Art.229). Nesse sentido, pode-se considerar que,
na prtica, o dever legal no configura exatamente reciprocidade geracional, pois, em
geral, os idosos demandam suporte dos filhos por mais tempo do que esses foram
assistidos por seus pais, bem como as necessidades de cuidados dos idosos tendem a ser
mais complexas e dispendiosas. Ademais, a depender do tipo de famlia e do momento
do ciclo vital domstico, a gerao adulta pode vivenciar, ao mesmo tempo, o dever
legal de suporte material e afetivo aos antecedentes e descendentes.
Alm disso, a Carta Magna no mesmo Captulo que trata do idoso especifica em
seu artigo 227, como dever da famlia, da sociedade e do Estado assegurar criana, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, um conjunto de direitos, entre eles a
vida, sade, educao, lazer, cultura, dignidade, respeito, liberdade, convivncia
familiar e comunitria, bem como salvaguard-los das formas de negligncia,
discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso. Chama ateno que, essa
normativa exclui o idoso, e disso denota que esse segmento populacional no era
considerado como sujeito de direitos e ainda, pode-se supor se no estaria como pano de
fundo uma viso que distingue os grupos etrios e considera que a criana, o
adolescente e o jovem tm potenciais a serem desenvolvidos, diferentemente do idoso,
que estaria na finitude da vida. Os direitos anteriormente elencados, somente em 2003
no Estatuto do Idoso, que foram afirmados como direitos fundamentais dos idosos.
A Constituio Federal de 1988 criou a gratuidade nos transportes coletivos
urbanos para os maiores de 65 anos (Art. 230,2) e, posteriormente, com o Estatuto do
Idoso (2003) incorporou o transporte semiurbano e a reserva de 10% dos assentos nos
veculos coletivos (Art. 39) 11. O EI prev, ainda, a reserva de duas vagas gratuitas nos
veculos interestaduais para idosos com renda igual ou inferior a dois salrios mnimos e
o desconto de 50% para os que excederem essas vagas (Art. 40). Com relao
educao, cultura, esporte e lazer, prev redues de 50% nos ingressos para eventos
artsticos, culturais, esportivos e de lazer, bem como o acesso preferencial aos
respectivos locais (Art. 23). Preconiza ainda, o apoio criao de universidade aberta
para a terceira idade e cursos com contedo voltado s tcnicas de comunicao,
11

Nos transportes urbanos cabe legislao local definir se o direito abranger os idosos na faixa etria
entre 60 e 65 anos.

41

computao e demais avanos tecnolgicos, para a integrao vida moderna (Art.


21).
Pode-se observar que no mbito das responsabilidades conferidas ao Poder
Pblico, em geral, as normativas no preveem penalidades caso no se concretizem.
Alm disso, as aes que so definidas de forma prtica e objetiva so pontuais e
voltadas ao transporte, educao, cultura, esporte e lazer, que na realidade contemplam
idosos independentes. Desse modo, as aes a serem desenvolvidas tm relao com
concepes positivas da velhice, o que converge com o Plano Internacional de Ao
para o Envelhecimento (1982).
Ainda retomando a dcada de 80, em 1989, foi promovido em Braslia, pela
Sociedade Nacional de Geriatria, fundada em 1987, o Seminrio nacional: O idoso na
sociedade atual, que foi antecedido por trs seminrios regionais 12, e que contaram
com a participao de idosos (CUNHA, 2008). Disso resultou o documento
Recomendaes: polticas sociais para a terceira idade nos anos 90, que em suma,
apresentou a necessidade de elaborao de polticas especficas para os idosos frente ao
processo de envelhecimento populacional.
Durante os anos 90, iniciou-se a criao de delegacias especializadas de
atendimento ao idoso. Elas so rgos estaduais, que para a sua criao dependem da
iniciativa do poder poltico dessa instncia e esto subordinadas Polcia civil. Em
1992, foi criada, em So Paulo, a Delegacia de Proteo ao Idoso (DEBERT e
OLIVEIRA, 2007); no Rio de Janeiro em 1993 por meio da Lei 2.200/93 foi instituda a
Delegacia Especial de Atendimento s Pessoas de Terceira Idade (DEAPTI).
Alm das Delegacias, foram criados servios de ouvidorias pblicas para receber
denncias de violao dos direitos do idoso. No Rio de Janeiro, por exemplo, foi
constitudo em 1999, o Ligue Idoso Ouvidoria, que inicialmente esteve vinculado
Secretaria de Esportes e Lazer do Governo do Estado do Rio de Janeiro e,
posteriormente, foi remanejado para a Secretaria de Estado de Ao Social e Cidadania
(PASINATO, CAMARANO, MACHADO, 2004).
Ainda nos anos 90 foram regulamentados diversos dispositivos constitucionais
relativos s polticas de previdncia e de assistncia social. No incio da dcada, o
MPAS organizou um grupo de trabalho para a elaborao da Poltica Nacional do Idoso,

12

Realizados em Goinia (GO), So Lus (MA) e Florianpolis (SC).

42

aprovada quatro anos depois. Em 1993, foi aprovada a Lei Orgnica da Assistncia
Social (LOAS), Lei n. 8.742, revista pela Lei n 12.435 de 2011, que apresenta, entre
seus objetivos, a proteo social, que visa garantia da vida, reduo de danos e
preveno da incidncia de riscos (Art. 2, I). Nisso compreende a proteo
famlia, maternidade, infncia, adolescncia e velhice; e a garantia de 1 (um)
salrio-mnimo de benefcio mensal pessoa com deficincia e ao idoso que
comprovem no possuir meios de prover a prpria manuteno ou de t-la provida por
sua famlia (Art. 2, I a, e). Segundo a LOAS, a famlia considerada incapaz de
prover a manuteno do idoso quando comprovar renda mensal per capita inferior a
(um quarto) do valor do salrio mnimo (Art. 20 3) 13.
Em 1994, foi aprovada a Poltica Nacional do Idoso, Lei 8.842, pautada no
princpio de que o idoso sujeito de direitos e deve ter suas necessidades atendidas de
modo diferenciado. No que tange discusso do abrigamento, a Poltica apresenta, entre
suas diretrizes, a priorizao do atendimento ao idoso atravs de suas prprias
famlias, em detrimento do atendimento asilar, exceo dos idosos que no possuam
condies que garantam sua prpria subsistncia; e, ainda, a priorizao do
atendimento ao idoso em rgos pblicos e privados prestadores de servios, quando
desabrigados e sem famlia (Art. 4, III e VIII, respectivamente).
Seguindo a mesma linha de argumentao, o Decreto n. 1948/96, que
regulamenta a Poltica Nacional do Idoso, elucida que entende-se por modalidade
asilar o atendimento, em regime de internato, ao idoso sem vnculo familiar ou sem
condies de prover sua prpria subsistncia de modo a satisfazer as necessidades de
moradia, alimentao, sade e convivncia social (Art. 3). Em seu pargrafo nico, o
mesmo artigo acrescenta que a assistncia na modalidade asilar ocorre no caso da
inexistncia do grupo familiar, abandono, carncia de recursos financeiros prprios ou
da prpria famlia. Alm disso, o referido dispositivo legal atribui ao MPAS:
estimular a criao de formas alternativas de atendimento no asilar (Art. 2, IV).
No bojo da Poltica Nacional do Idoso h mistura de elementos relativos
condio de sade e ao campo da assistncia, e no fica clara a delimitao de
responsabilidades das respectivas polticas, nem as formas de concretizao das aes,

13

De acordo com a LOAS, a famlia composta pelo requerente, o cnjuge ou companheiro, os pais e,
na ausncia de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmos solteiros, os filhos e enteados solteiros e
os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Art. 20 1).

43

tratando-se mais de um estmulo s intervenes do que uma obrigatoriedade. No que


concerne ao Benefcio de Prestao Continuada (BPC), na prtica se d certa confuso
entre previdncia e assistncia, uma vez que o benefcio assistencial, financiado
com recursos da Seguridade Social previstos no oramento do Ministrio da
Assistncia, porm executado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), rgo
responsvel pelos direitos previdencirios.
A Poltica Nacional do Idoso e o referido Decreto colocam o atendimento
familiar como prioritrio, mas mantm o abrigamento como possibilidade. Isso se
mostra num contexto em que, na rea da sade mental, se fortalece o debate sobre a
desinstitucionalizao e se amplia a implantao da rede extra-hospitalar 14.
No mbito internacional, a Assembleia Geral da ONU aprovou, em 1992, a
Proclamao sobre o Envelhecimento, que estabeleceu o ano de 1999 como o Ano
Internacional do Idoso e definiu parmetros para a elaborao de um marco conceitual
do envelhecimento. Este foi institudo em 1995 e apresentou quatro dimenses: a
situao dos idosos, o desenvolvimento individual continuado, as relaes
multigeracionais e a inter-relao entre envelhecimento e desenvolvimento social
(CAMARANO e PASINATO, 2004). Ademais, ao longo dos anos 90, os idosos
passaram a ser mencionados em fruns da ONU sobre populaes e gnero, entre
outros.
No Brasil, no ano de 1999, o Ministrio da Sade elaborou a Poltica Nacional
de Sade do Idoso (Portaria 1.395/99), tendo como foco a promoo do envelhecimento
saudvel e a manuteno da mxima capacidade funcional do indivduo que envelhece.
Essa poltica surgiu num contexto de busca de reduo de custos no tratamento de
idosos no mbito do SUS. Teve dois eixos: medidas preventivas e tratamento
multidisciplinar especfico. Em 2006 essa Poltica passou por reviso e atualizao e foi
publicada a Portaria n. 2.528, que revogou a anterior 15.

14

A discusso pela Reforma Psiquitrica se inicia no final da dcada de 70 e contempornea do


movimento pela Reforma Sanitria, favorvel a mudanas nos modelos de ateno e gesto nas prticas
de sade e que contribuiu para a construo do Sistema nico de Sade SUS. A Reforma Psiquitrica
buscou mudanas em vista da superao da violncia asilar e pela produo de outras formas de cuidado.
Na dcada de 90, comeam a ser regulamentados servios de ateno diria, entre os quais, hospitais-dia,
Centros de Ateno Psicossocial CAPS e Ncleos de Ateno Psicossocial NAPS.
15
Entre 1999 e 2006 outras portarias relativas sade foram revogadas e criadas, entre elas, a de n.
399/GM de fevereiro de 2006, mas que no sero aqui tratadas por no serem centrais temtica
desenvolvida.

44

Ainda na dcada de 1990, por intermdio da Poltica Nacional do Idoso e na


tica dos processos de democratizao e participao, foi prevista a criao dos
conselhos de direitos do idoso relativos s esferas nacional, estaduais, municipais e do
Distrito Federal. Na mesma Lei foi definido o seu carter, composio e competncias,
o que ser retomado frente.
Na ltima dcada, no mbito internacional foi realizada em Madri, 2002, a
segunda assembleia mundial sobre o envelhecimento. Diferentemente da primeira, nessa
houve participao da sociedade civil, atravs de mais de setecentas instituies no
governamentais. Alm disso, o Plano de ao atentou para o processo de
envelhecimento nos pases em desenvolvimento e fundamentou-se nos seguintes
princpios: participao ativa dos idosos na sociedade, no desenvolvimento e na luta
contra a pobreza; fomento da sade e bem-estar na velhice promoo do
envelhecimento saudvel; e criao de entorno propcio e favorvel ao envelhecimento
(CAMARANO e PASINATO, 2004, p. 259). Para a implementao do Plano, os rgos
regionais da ONU estabeleceram estratgias considerando as especificidades de suas
regies. Os documentos relativos Amrica Latina apresentam preocupao com a
proteo dos direitos humanos e proviso de necessidades bsicas, entre elas, renda,
sade, educao e moradia. Nos documentos de todas as regies, a famlia foi vista
como fonte de apoio natural para as pessoas idosas e como lcus da segurana
emocional (Ibid.; Id, p. 262).
Ainda em 2002, luz do Plano Internacional reuniram-se em Ouro Preto (MG)
especialistas da rea da sade, com o objetivo de discutir as desigualdades sociais e de
gnero e a sade dos idosos no pas. Do encontro resultou a Carta de Ouro Preto, que
aponta para o envelhecimento como processo e para a necessidade de aes que
reduzam a vulnerabilidade de todas as faixas etrias e permitam o direito de envelhecer
de forma digna e cidad. Assim, foi defendida uma agenda de aes que consolide o
acesso renda, sade e suporte social, entre outros, e que envolva diferentes setores da
sociedade.
Atentando para a temtica aqui desenvolvida, no que tange ao suporte social, a
Carta de Ouro Preto apresenta posio favorvel manuteno do idoso na famlia e
comunidade. Neste sentido,
[...] a transferncia do idoso para um servio de longa permanncia somente
deve ser considerado uma alternativa quando falharem todos os esforos
anteriores. Para que este objetivo se concretize necessrio garantir o

45

suporte social, aqui entendido como uma srie de medidas e aes que
reforcem e apoiem o cuidado familiar e domiciliar e previnam o isolamento
social (CARTA DE OURO PRETO, 2002, p. 08).

Dessa forma, o documento indica aes de apoio ao cuidador familiar,


implementao do Programa Nacional de Cuidadores de Idosos, preveno e
reabilitao de situaes de violncia e maus tratos nos ambientes domstico,
institucional e pblico.
Naquele mesmo ano, atravs da Portaria n 702, foram criados os Centros de
Referncia em Assistncia a Sade do Idoso, que consistem em hospital com condies
tcnicas, instalaes fsicas, equipamentos e recursos humanos especficos e adequados
para a prestao de assistncia sade de idosos de forma integral e integrada,
envolvendo a internao hospitalar, atendimento ambulatorial especializado, hospitaldia e assistncia domiciliar. Nos Centros de Referncia, por exemplo, so feitos
acompanhamentos de famlias que tm idosos com Mal de Alzheimer. Em suma, os
Centros devem ter condies de referncia para a rede de assistncia sade dos idosos.
Em 2003, foi sancionada a Lei n. 10.741 (Estatuto do Idoso) que se refere ao
idoso como portador de direitos fundamentais e de proteo integral. Assim, em seu
Artigo III, coloca como obrigao da famlia, da comunidade, da sociedade e do
Poder Pblico assegurar com absoluta prioridade, a efetivao do direito vida,
sade, alimentao, educao, cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho,
cidadania, liberdade, dignidade, ao respeito e convivncia familiar e
comunitria.
No que se refere ao abrigamento, no Estatuto do Idoso estabelecem-se as
mesmas disposies da Poltica Nacional do Idoso, ou seja, priorizao do
atendimento do idoso por sua prpria famlia, em detrimento do atendimento asilar,
exceto dos que no a possuem ou caream de condies de manuteno da prpria
sobrevivncia (Art. 3, V). Desse modo, entre as medidas de proteo, em casos de
violao ou ameaa dos direitos dos idosos, conforme o artigo 43, o Ministrio Pblico
ou o Poder Judicirio podero determinar o abrigo em entidade e o abrigo
temporrio (Art. 45, V e VI, respectivamente). No entanto, importante frisar que a
atuao do Ministrio Pblico somente se dar quando o prprio idoso no tem
condies de vindicar seus direitos e se encontra sem referncia familiar para faz-lo, o
que ser retomado frente na discusso sobre a interpretao da situao de risco.

46

Embora a Poltica Nacional do Idoso e o Decreto n. 1948/96 recomendem que o


MPAS estimule a criao de formas alternativas de atendimento no-asilar, entre as
quais, Centro de Convivncia, Centro de Cuidados Diurno, Casa-Lar, Oficina Abrigada
de Trabalho, atendimento domiciliar e outras iniciativas surgidas na comunidade 16 no
se impem obrigatoriedades para implementao.
A lgica familista tambm se mostra no modelo de proteo social que constitui
a Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS). De acordo com a mesma, a proteo
social deve afianar segurana de sobrevivncia, de acolhida e de convvio familiar. A
poltica de assistncia social tem como centralidade a matricialidade familiar, partindo
da concepo de que a famlia tem capacidade protetiva.
Prosseguindo o panorama histrico, em 2006, por meio da Portaria n. 2.528 foi
criada a Poltica Nacional de Sade da Pessoa Idosa, que revogou a Portaria 1.395/99,
porm manteve-se como objetivo central a busca pelo envelhecimento saudvel. Entre
as diretrizes apresenta a necessidade de articulao intersetorial para a implantao dos
centros-dia e centros de convivncia, previstos no Decreto 1.948/96, e de poltica de
ateno integral aos idosos em ILPI. Essa Poltica ligada Estratgia de Sade da
Famlia ESF e encontra, entre outros desafios, a escassez de estruturas de cuidado
intermedirio ao idoso no SUS, bem como de servios de cuidado domiciliar.
Ainda em 2006, por intermdio da Lei n. 11.433, foi institudo o Dia Nacional
do Idoso a ser celebrado no dia 1 o de outubro de cada ano. Em seu pargrafo nico, essa
lei explicita que os rgos pblicos responsveis pela implementao da Poltica
Nacional do Idoso ficam incumbidos de promover a realizao e divulgao de eventos
que valorizem a pessoa do idoso na sociedade.
Em 2006, foi realizada a primeira Conferncia Nacional dos Direitos da Pessoa
Idosa a qual teve o seguinte tema: Construindo a Rede Nacional de Proteo e Defesa
da Pessoa Idosa; a segunda conferncia foi realizada em 2009, com o tema Avaliao
da Rede Nacional de Proteo e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa: Avanos e
Desafios. A terceira conferncia, realizada em novembro de 2011 teve como discusso
O Compromisso de Todos por um Envelhecimento Digno no Brasil. Durante essa
Conferncia
[...] ser lanada uma campanha de valorizao pessoa idosa em parceira
com os Correios com destaque para a divulgao das aes do Disque 100

16

Conforme Art. 10, b da Poltica Nacional do Idoso e Art. 2 e 4 do Decreto n. 1948/96.

47

para este pblico especfico. Tambm ser assinado um Termo de


Cooperao Tcnica com a Frente Nacional de Prefeitos (FNP), que ter o
objetivo de promover e implantar a criao dos Conselhos de Direito dos
Idosos (previstos na legislao desde o ano de 2002) e incentivar a
implementao de um Fundo voltado s polticas pblicas para a populao
com mais de 60 anos (SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS, 2011).

Atualmente a Poltica Nacional do Idoso coordenada pela Secretaria Especial


de Direitos Humanos (SEDH), porm diferentemente das reas da infncia e juventude,
a do idoso ainda no tem uma subsecretaria para gerenci-la, ou seja, no h uma
estrutura especfica para a sua execuo17.
A partir de 2004, a referida Secretaria elaborou Planos de enfrentamento
violncia domstica contra a pessoa idosa, sendo o primeiro para o perodo 2004-2006 e
o segundo para 2007-2010. Este ratifica prioridades do anterior e inclui novas. O Plano
faz meno a dados demogrficos relativos ao envelhecimento, o fato de o Brasil ser
signatrio de Convenes internacionais, os custos da violncia para o SUS, a cultura de
conflitos intergeracionais e de negligncias domsticas e institucionais. Nas aes e
metas, se destacam a preocupao em promover o envelhecimento saudvel, discusses
com carter educativo e que abranjam a mdia, divulgao das formas de acesso ao BPC
e s polticas de assistncia, estmulo a campanhas de preveno de acidentes no
trnsito, promoo dos vnculos familiares e comunitrios, notificaes dos casos de
violncia contra o idoso, realizao de congressos e cursos de formao de cuidadores,
etc. No conjunto das aes pode-se observar que elas so prioritariamente de cunho
informativo e educativo.
De acordo com o Plano, no Brasil a famlia o lcus privilegiado de moradia e
de cuidados de todas as classes sociais, e por ser tambm espao de violncias
[...] merece ser foco de ateno em mltiplos sentidos: em termos de
mudana cultural na forma de conceber a relao com a pessoa idosa; na
preparao da casa para maior segurana; na formao de cuidadores
familiares para os idosos dependentes; na proteo do Estado para as famlias
que no tm condies de cuidar dos seus velhos (BRASIL,
SUBSECRETARIA de DIREITOS HUMANOS, 2005, p. 19).

O Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3)

18

apresenta como um

dos objetivos estratgicos a valorizao da pessoa idosa e promoo de sua


participao na sociedade. Com isso, nas aes programticas prev o fortalecimento
17

A Secretaria de Direitos Humanos da Presidncia da Repblica foi criada em 1977 dentro do Ministrio
da Justia, e alada ao status de ministrio em 2003. No ano de 2010 a Secretaria ganhou o atual nome.
18
Aprovado pelo Decreto n. 7.037, de 21 de dezembro de 2009 e atualizado pelo Decreto n. 7.177, de
12 de maio de 2010.

48

da convivncia familiar e comunitria, o acesso s polticas pblicas e servios e a


humanizao desses.
Ao fazer memria das aes pblicas em face dos idosos, observa-se que parte
significativa dos dispositivos legais e dos programas governamentais tem cunho mais
orientativo do que operacional. As definies mais claras so as que esto ligadas s
responsabilidades familiares e ao econmico, por exemplo, quanto ao BPC e ao
transporte gratuito.
Nesse sentido, no que se refere efetivao dos direitos, vale rememorar que h
diferena entre proclamar o direito e desfrut-lo efetivamente. A linguagem dos direitos
tem funo prtica, mas pode se tornar enganadora se obscurecer ou ocultar a diferena
entre o direito reivindicado e o direito reconhecido e protegido, pois o problema
fundamental em relao aos direitos no filosfico, mas sim poltico (BOBBIO,
1992).
Aps versar sobre a trajetria das aes e diretrizes relativas aos idosos no
mbito nacional e internacional, cabe elencar como essas se constituem no nvel
municipal, pois, seguindo os princpios de descentralizao e municipalizao das
polticas pblicas, nesse espao que devem ser concretizadas.
Desse modo, no mbito das polticas municipais especficas para idosos, no Rio
de Janeiro foi possvel levantar a existncia da Secretaria Especial de Envelhecimento
Saudvel e Qualidade de Vida (SESQV), que segundo informaes veiculadas no site
da mesma19, tem por objetivo: promover a qualidade de vida, disseminar os hbitos
saudveis e melhorar a condio de vida da populao da terceira idade. Junto a isso,
elenca os seguintes valores: integridade, respeito, comprometimento, iniciativa, bom
humor e valorizao das pessoas.
No que se refere s aes dessa Secretaria, de acordo com a mencionada fonte,
so elencados e especificados os seguintes programas e projetos: a) Academias da
Terceira Idade (ATI) equipamentos instalados em praas pblicas ou junto a Unidades
de sade; b) Idoso em famlia proporciona auxlio no valor de R$ 350,00 mensais a
121 famlias com renda familiar de at dois salrios mnimos, como contribuio no
cuidado domiciliar dos idosos no intuito de evitar a internao em ILPI; c) Agente
Experiente oferece bolsa-auxlio no valor de R$ 250,00 para um grupo de 190 idosos,

19

Conforme: http://www.rio.rj.gov.br/web/sesqv. Acesso em 15/11/2011.

49

que atuam em rgos do governo municipal e tambm nas ruas da cidade, informando e
promovendo o acesso dos cariocas a servios, programas e projetos, com o objetivo de
contribuir para a manuteno da autonomia dos idosos participantes; d) Sade Mvel
veculos adaptados para funcionar como miniconsultrios itinerantes, com profissionais
especializados e infraestrutura para a realizao de consultas, exames e pequenos
procedimentos, nas reas de clnica mdica, geriatria, oftalmologia e odontologia; e)
Qualivida aulas de ginstica em 120 ncleos da cidade; f) Rio Dignidade atende a
cerca de 500 idosos carentes da cidade do Rio, com mais de 70 anos, com um benefcio
de R$ 240,00 mensais; g) Casas de Convivncia e Lazer para Idosos funcionam em
seis espaos e oferecem atividades esportivas, informativas, de dana, ginstica,
artesanato, msica, etc.
Observa-se nessas aes que, alm da nfima abrangncia e irrisrios valores dos
programas que transferem recursos em espcie, o enfoque pautado na concepo de
envelhecimento ativo e saudvel. A ateno pensada para idosos que tenham suas
famlias, seus cuidadores e que tenham condies para frequentarem grupos de lazer e
sociabilidade (DELGADO e FLOR, 2012, p. 88).
De modo geral, as atuaes pblicas so pontuais e direcionadas principalmente
queles que ainda possuem alguma condio de busc-las por si prprios e ou tenham
famlias para faz-lo. Ademais, impem critrios restritivos de acesso, o que na prtica
configura uma atuao que no responde de forma efetiva s necessidades dos idosos.
Se existissem programas mais abrangentes e voltados para aqueles com dependncia de
cuidados, uma parcela dos casos de abrigamento seria evitada.

50

Captulo II
Intervenes estatais na rea do idoso com direitos violados

2.1 Instncias de defesa dos direitos do idoso na cidade do Rio


de Janeiro
O Estado e a sociedade se organizam para responder s necessidades sociais e,
com isso, so estruturadas instituies, atribudos papis e estabelecidas mediaes.
Neste sentido, abordo aqui instituies e servios existentes na cidade do Rio de Janeiro
que atuam na defesa e controle de direitos dos idosos.
Conforme o Estatuto do Idoso, dever de todo cidado comunicar
autoridade competente qualquer forma de violao a esta Lei que tenha testemunhado
ou de que tenha conhecimento (EI, Art. 6). Os profissionais de sade esto obrigados
a comunicar os casos de suspeita ou confirmao de maus tratos contra idoso, a
qualquer um dos seguintes rgos: autoridade policial, MP, Conselho do Idoso (EI, Art.
19).
Com isso, apresento brevemente atribuies que so conferidas s citadas
instituies e incluo o Ncleo Especial para Atendimento s Pessoas da Terceira Idade
(NEAPI), da Defensoria Pblica. Em um tpico especfico, enfoco posteriormente as
Promotorias de Proteo ao Idoso e a Pessoa com Deficincia, pertencentes ao
Ministrio Pblico.
A Delegacia Especial de Atendimento s Pessoas de Terceira Idade DEAPTI,
foi criada pela Lei 2.200/93 para atender exclusivamente aos cidados da terceira
idade, recebendo denncias, promovendo investigaes e encaminhando ao Ministrio
Pblico suas concluses (Art. 2). A mesma tem como objetivo
[...] registrar, apurar e dar solues aos crimes cometidos contra os cidados
idosos. Porm, alm de fazer ocorrncias policiais e instaurar inquritos,
serve, tambm, como um espao para dar outras orientaes aos que
necessitam. Casos de discriminao no comrcio e na sociedade, em geral,
recebem acompanhamento especfico, assim como as denncias de maustratos na famlia, em transportes coletivos, bancos e hospitais. Muitos idosos
procuram ajuda com problemas relacionados previdncia e s penses. Dos

51

problemas tratados, diariamente, apenas cerca de 30% so especificamente


policiais (MALAGUTI, 2000, p. 5).

Inicialmente, a DEAPTI funcionou no centro da cidade do Rio de Janeiro, junto


ao prdio da Central do Brasil, onde diariamente transitam milhares de pessoas que
utilizam servios de trem, metr e nibus municipais e da regio metropolitana. Em
2007, foi transferida provisoriamente para a estao de metr Siqueira Campos, em
Copacabana, e, em 2010 passou a ter sede prpria construda ao lado da referida
estao. A mudana de local se deu sob a justificativa de haver aumento no nmero de
crimes contra idosos e de Copacabana ser o bairro com a maior populao idosa

20

. No

foram localizados estudos sobre possveis mudanas na acessibilidade da populao


idosa ao novo endereo, nem comparativos dos nmeros de atendimentos entre a nova
sede e a anterior. Ademais, embora a informao veiculada pela mdia indique o
aumento do nmero de crimes contra idosos, no significa que esses ocorram mais em
Copacabana, onde h maior concentrao de idosos residindo.
Outro servio importante o das ouvidorias pblicas, que constituem espao de
comunicao de situaes de violao de direitos. No Rio de Janeiro, foi implantado,
em 1999 o servio Ligue Idoso Ouvidoria destinado a atender e encaminhar denncias
de maus-tratos, abuso e leso dos direitos do idoso, identificar situaes de risco e
combater a violncia fsica e psicolgica, explorao e discriminao (PASINATO,
CAMARANO, MACHADO, 2004). Este servio esteve vinculado Secretaria Estadual
de Assistncia Social e Direitos Humanos SEASDH. Atualmente, outros servios de
ouvidoria existem no estado do Rio de Janeiro, dentre os quais, o Al Idoso, da
Assembleia Legislativa, e a Ouvidoria do Centro Integrado de Ateno e Proteo
Violncia contra a Pessoa Idosa CIAPI, este conveniado com o Estado por meio da
obra social Rio Solidrio. Parte das denncias recebidas por esses servios por eles
encaminhada ao Ministrio Pblico.
Alm dessas ouvidorias especficas para comunicaes sobre os direitos dos
idosos, h o Disque Direitos Humanos, conhecido por Disque 100, da Secretaria de
Direitos Humanos da Presidncia da Repblica, que, em mbito nacional, recebe

20

Conforme informaes veiculadas na imprensa e encontradas,


http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI1955713-EI5030,00Crimes+contra+idosos+tem+aumento+de+no+Rio.html Acesso em 01/07/2012.

por

exemplo,

em

52

comunicaes sobre violao de direitos de todos os segmentos etrios 21. Esse servio
encaminha as denncias para vrios rgos, dentre eles, novamente ao Ministrio
Pblico.
As ouvidorias, por permitirem o anonimato da denncia, podem representar um
instrumento favorecedor da comunicao queles que so vtimas de maus tratos e
temem identificar-se. Por outro lado, so tambm acionadas para a comunicao de
situaes improcedentes, nas quais, por vezes, no relato h indicativos de serem feitas
por vizinhos e ou parentes que vivenciam algum conflito entre si. Isso foi tambm
observado durante a minha prtica profissional como assistente social e, de forma mais
visvel, se mostrou nas comunicaes feitas por meio da ouvidoria do Disque Direitos
Humanos, cujos textos das denncias foram encaminhados ao MP. Essa ouvidoria
provavelmente no solicita ao comunicante informao mais detalhada, pois conforme
tem se mostrado, em parte das denncias, o local dos fatos apresentado de modo
confuso e feita uma descrio que privilegia o violador de direitos, em detrimento de
informaes sobre aquele que necessita da interveno do Estado.
As ouvidorias recebem as denncias, realizam o registro, buscam solucion-las e
ou encaminh-las aos rgos competentes. Dessa forma, a mesma comunicao
geralmente encaminhada a mais de um rgo, bem como o/a denunciante pode
registrar a denncia em mais de uma ouvidoria, o que gera variadas intervenes. Essa
realidade foi observada em algumas das visitas domiciliares realizadas por mim e por
outras assistentes sociais do Ministrio Pblico, nas quais quem nos atende expe j ter
recebido visitas semelhantes. Nessas ocasies, verbalizam ideias confusas sobre o papel
de cada instituio e, recorrentemente, manifestam estarem fartos de visitas que os
levam a responder perguntas semelhantes e expor sempre os mesmos problemas, sem
ainda vislumbrarem uma interveno efetiva na realidade abordada. Houve ocasies em
que as visitas de diferentes instituies foram realizadas na mesma data.
Desse modo, se por um lado o uso da tecnologia permite comunicar por telefone
ou e-mail aos servios de Ouvidorias situaes de violaes de direitos e iniciar
intervenes, por outro lado, a tecnologia ainda no utilizada de maneira satisfatria
para a comunicao interinstitucional das aes desenvolvidas. Isso gera multiplicidade
de atuaes voltadas a analisar e esclarecer a situao comunicada. Para isso,
21

O Disque 100, nascido em 1999, se voltava violao de direitos de crianas e adolescentes e a partir
de dezembro de 2010 incorporou outras reas e passou a ser chamado Disque Direitos Humanos.

53

geralmente escolhida a metodologia da visita, que embora seja indicada em


considerao no clareza ainda das condies que dispem o idoso para se deslocar no
espao pblico, invasiva, por tratar-se de receber algum que no foi convidado e que
abordar situaes aparentemente particulares.
Em estudo realizado por ALVES (2001) junto ao Ligue Idoso Ouvidoria, foi
observado que, na metade dos casos comunicados, os idosos foram ouvidos mediante
presenas para prestar esclarecimentos ou visita domiciliar. Nessas dinmicas, as
denncias podem ser confirmadas ou negadas pelos envolvidos, o que se deve tambm
pela participao de agressores no jogo de verses. Neste sentido, cabe mencionar que,
nas visitas sociais realizadas, quem atende primeiramente ao profissional comumente
o denunciado, por morar com o (a) idoso (a) ou t-lo (a) sob os seus cuidados. Isso
impe dificuldades na abordagem, inclusive em algumas delas no somente para a
profissional ser recebida no domiclio, mas tambm para a escuta do idoso (a) em
questo, principalmente se ele apresenta alguma limitao de sade.
Alm disso, nota-se que em parte das comunicaes, que envolvem familiares e
que so feitas por esses ou pelo prprio idoso, h a expectativa de que o profissional, ao
realizar a visita e ou atendimento, advertir o suposto violador de direitos e lhe impor o
que deve ser feito. Embora isso no ocorra, h casos em que verbalizam sentirem-se
acusados e que se sentem forados a realizar mudanas em prol da assistncia do idoso.
Assim, o fazem a partir da crena de que a instituio pode exercer algum tipo de
autoridade moral sobre os indivduos (ALVES, 2001).
Alm das instncias citadas, os Conselhos de direitos do idoso, entre outras
atribuies, tambm podem receber comunicaes de violaes dos direitos e
encaminh-las. De acordo com a Poltica Nacional do Idoso (1994) os Conselhos so
[...] rgos permanentes, paritrios e deliberativos, compostos por igual
nmero de representantes dos rgos e entidades pblicas e de organizaes
representativas da sociedade civil ligadas rea (Art. VI). Compete aos
conselhos (...) a formulao, coordenao, superviso e avaliao da Poltica
Nacional do Idoso, no mbito das respectivas instncias polticoadministrativas (Art. VII).

Embora previsto em 1994, o Conselho Nacional dos Direitos do Idoso foi


implantado somente em 2002, atravs do Decreto 4.227

22

. No Rio de Janeiro, o

Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa CEPEDI , foi institudo
22

Conforme histrico disponvel em: http://www.direitoshumanos.gov.br/conselho/idoso/historico


Acesso em: 15/11/2011.

54

em 1996 pela Lei Estadual 2.53623. E o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa
Idosa foi criado somente em 02/12/2010 por decreto municipal, com estrutura de
funcionamento junto a SESQV 24.
Com relao defesa dos direitos do idoso, h ainda a Defensoria Pblica do
Estado do Rio de Janeiro, que dispe do Ncleo Especial para Atendimento s Pessoas
da Terceira Idade NEAPI , no qual so atendidas as situaes que envolvem
demandas jurdicas. A Defensoria atende queles que no tm condies financeiras de
contratar advogado e de pagar as despesas do processo judicial.
O NEAPI funcionava em regio central da cidade, em rua paralela s
Promotorias do Idoso do Ministrio Pblico, porm, em junho de 2012, foi transferido
para uma nova sede na zona sul da cidade, no Bairro Leblon, junto da qual funciona
outro rgo da Defensoria Pblica, o Ncleo de Atendimento Pessoa com Deficincia
(Nuped) 25. Assim, alm da Delegacia, o NEAPI mais um rgo de defesa dos direitos
do idoso que foi transferido da rea central da cidade para a zona sul. Entretanto, no
foram encontradas publicaes sobre os motivos da escolha dessa rea para a instalao
e sim apenas meno ao fato de a nova estrutura contar com rampa de acesso e
banheiros adaptados para cadeirantes.
Diferentemente da Defensoria Pblica em que figuram processos judiciais, nas
Promotorias do Idoso se constituem procedimentos administrativos PA(s) sobre
situaes que demandam medidas de proteo, mas a depender do caso podem ser
transformados em processo judicial. Alm disso, os PA(s) so restritos a situaes nas
quais nem o idoso, nem a sua famlia tem condies de atender e ou reivindicar seus
direitos em outras instncias, o que ser retomado frente.
Considerando os servios aqui listados, pontua-se a inexistncia de um fluxo
pr-definido, o que pode levar multiplicidade de uma mesma denncia e ao registro
dos fatos em mais de uma instituio. Em parte dos casos isso somente ser solucionado
ao chegar a juzo, passando-se a considerar apenas a denncia mais antiga e
incorporando no processo todas as demais. Ou seja, realizando a "juntada" solicitada
pelo promotor (SOUZA, et. al., 2008, p. 1157).
23

De acordo com informao veiculada em: http://www.nuppess.uff.br/index.php. Acesso em:


15/11/2011.
24
Segundo dados disponveis em: http://www.rio.rj.gov.br/web/guest. Acesso em 15/11/2011.
25
Conforme divulgado em: http://www.portaldpge.rj.gov.br/Portal/noticia.php?id_noticia=1054. Acesso
em 04/07/2012.

55

Ademais, nos canais de atendimento ao idoso circulam representaes da velhice


que se mostram nos processos de comunicao, registro e encaminhamentos. Assim, se
operam tipificaes e classificaes (ALVES, 2001) que podem entender a mesma
situao de diferentes formas e, em parte dos casos, sob um vis oposto. Isso tambm se
observa na pesquisa desta dissertao, em que, por exemplo, a assistente social registra
na comunicao inicial que o familiar do idoso com doena psiquitrica solicita ajuda
ao MP temendo pela integridade fsica dos familiares, o que no Mdulo Gesto de
Processos MGP da instituio foi registrado na categoria abandono familiar.
Com essa sucinta apresentao de parte das instncias de atuao voltadas aos
idosos com direitos violados, no Rio de Janeiro, passa-se a tratar, de forma detalhada,
das Promotorias de Justia de Proteo ao Idoso e da Pessoa com Deficincia PJPIPD
, constitudas a partir da Lei 10.741/2003. Assim, faz-se aqui um apanhado geral de
elementos da histria do Ministrio Pblico apresentando em que dimenso a atuao
voltada aos idosos se situa e qual a abrangncia.

2.2 Ministrio Pblico Promotorias do Idoso e da Pessoa


com Deficincia
A histria do Ministrio Pblico no Brasil tem relao com os regimes polticos.
Conforme Faria (2010), a depender da forma vigente observam-se oscilaes nos
documentos constitucionais que so relativas sua referncia e atribuies. Quanto
menos espaos democrticos a histria poltica do pas oferece, mais indefinido fica, na
concepo dos legisladores, onde situar o Ministrio Pblico, visto sua funo de fazer
prevalecer a legalidade das instituies e do prprio regime poltico.
Ainda segundo Faria (2010), no decreto presidencial de nmero 1030 de 14 de
novembro de 1890, que organizava a Justia no Distrito Federal, o MP colocado ao
lado do juiz para ser o fiscal da lei e representante da sociedade. Na dcada de 30, nas
discusses em torno da Constituio Federal de 1934, foi consensual a concepo de
que o MP como rgo fiscalizador deveria ter autonomia em relao aos outros poderes.
Nos documentos constitucionais dos perodos ditatoriais a instituio no teve espao

56

relevante. J na dcada de 80, o processo de abertura democrtica e a ampliao dos


direitos possibilitaram o crescimento institucional do Ministrio Pblico.
A Constituio Federal de 1988, em seus artigos 127 a 130, lhe instituiu as
atribuies e competncias. De acordo com informaes extradas do site do Ministrio
Pblico do Estado do Rio de Janeiro (2010),
[...] compete-lhe, dentre outras tarefas de indiscutvel benefcio para a
coletividade, (1) exigir dos poderes pblicos e dos servios de relevncia
pblica o respeito aos direitos elencados na Constituio, promovendo as
medidas necessrias sua garantia, (2) proteger os interesses difusos,
coletivos e individuais homogneos, dentre os quais se sobressai a defesa do
meio ambiente, do consumidor e do patrimnio pblico, (3) proteger os
direitos dos idosos, dos portadores de necessidades especiais e das crianas e
dos adolescentes e (4) exercer o controle externo da atividade policial.

O pressuposto constitucional compreende o MP como autnomo e legitimado


para agir em nome do sujeito coletivo sociedade (PAES, 2010). Os promotores
apresentam-se como defensores da sociedade e afirmam sua autonomia tambm com
relao ao Judicirio, porque se submetem apenas ao Procurador Geral de Justia, a
mais alta hierarquia do Ministrio Pblico.
De acordo com Simes (2009), o Ministrio Pblico

constitui-se,

operacionalmente, como um verdadeiro quarto poder de Estado, pois tem autonomia


funcional e administrativa diante dos outros poderes e assim pode ser fiscal da aplicao
da lei. No entanto, embora tenha autonomia funcional e busque afastar da instituio as
correntes polticopartidrias, a participao do poder Executivo na escolha dos chefes
dos MPs estaduais e do MP federal tende a favorecer nomeaes alinhadas com o
governo (PAES, 2010) 26.
Segundo Marrey (2010), embora o MP faa parte da estrutura do Estado ele
rgo da sociedade, que a representa em juzo e fora dele na defesa do regime
democrtico e dos interesses sociais.
Neste sentido, Paes (2010), analisa que o Ministrio Pblico opera com
diferentes concepes de sociedade.
Na rea cvel, h um discurso de valorizao da cidadania como ideal a ser
conquistado e construdo. Na rea de direitos difusos, o Ministrio Pblico
no trata os indivduos como sujeitos autnomos, mas os atribui a uma
posio de fraqueza, pois tutela os interesses da sociedade, representando os
indivduos e os grupos sociais como incapazes e hipossuficientes. J na rea
26

Os procuradores so nomeados pelos governadores a partir da apresentao de uma Lista Trplice com
membros eleitos pelos integrantes do prprio Ministrio Pblico. A nomeao deve ser aprovada pela
Assembleia Legislativa (PAES, 2010).

57

criminal, predomina a lgica de suspeio, de acusao e de expiao dos


conflitos sociais via a demanda de uma resposta punitiva com relao a certos
membros da sociedade (PAES, 2010, p. 123).

Ao Ministrio Pblico compete a iniciativa do processo judicial a partir da


elaborao da denncia de um crime e da acusao de um indivduo; e, a promoo dos
processos segundo critrios de representatividade funcional dos interesses da sociedade.
Na rea cvel, cabe ao MP avaliar, atravs de procedimento administrativo, a viabilidade
de abertura de processos. Assim, pode estabelecer acordos, propor obrigaes e
compromissos que sejam alternativos ao judicial. Na prtica os promotores operam
uma seletividade dos casos que iro ser processados ou no, exercem atividade de
acusao e parte nos processos, bem como velam pela legalidade dos procedimentos
constitudos e, assim, seu papel pode ser confundido com o dos juzes (PAES, 2010).
A organizao do Ministrio Pblico acompanha a forma federativa do Estado e
abrange os Ministrios Pblicos dos Estados e o Ministrio Pblico da Unio. Este
subdivido em Ministrio Pblico Federal, Ministrio Pblico do Trabalho, Ministrio
Pblico Militar e Ministrio Pblico do Distrito Federal e Territrios. Cada uma dessas
instituies autnoma em relao s demais, exercendo as atribuies estabelecidas
pela Constituio e demais legislaes.
No que se refere s PJPIPD, pertencentes ao Ministrio Pblico do Estado do
Rio de Janeiro, a sua criao se inicia em 2005, a partir das alteraes institucionais do
Parquet

27

e redistribuio das atribuies dos rgos de execuo do Ministrio

Pblico, considerando que a Constituio Federal confere essa instituio a tutela dos
interesses transindividuais das pessoas com deficincia e que a Lei Federal n 10.741/03
incumbe ao Ministrio Pblico, atribuies extrajudiciais e judiciais em prol da tutela
individual da pessoa idosa.
Assim, a criao das PJPIPD da Capital se realizou pelas seguintes resolues:
1 e 2 Promotoria Resoluo n. 1284, de 08 de maro de 2005; 3 Promotoria
Resoluo n. 1349, de 30 de novembro de 2006; 4 Promotoria Resoluo n. 1424,

27

Segundo Garapon (1997), a expresso Parquet se refere ao Ministrio Pblico e suas atribuies. O
termo decorre da trajetria simblica de delimitao dos locais judicirios. No Ocidente, a primeira
configurao de um espao de justia consistiu numa sebe de ramagens no exterior das cidades. Da
deriva a origem do termo Parquet, isto , o pequeno parque, recinto delimitado por barreiras e
gradeamentos, no seio do qual se sentavam todas as gentes dos reis como os oficiais de diligncias ou os
advogados. No Parquet reinava uma ordem especial e obrigatria, estando as deslocaes, discursos e
comportamentos sujeitos vigilncia da audincia. Atualmente nas salas de audincias, o Parquet,
geralmente o local reservado aos magistrados do MP e designa igualmente o grupo formado por eles.

58

de 29 de abril de 2008; e 5 Promotoria Resoluo n. 1737, de 17 de abril de 2012.


Em cada Promotoria h um promotor, e as cinco desempenham as mesmas atribuies,
dividindo entre si a atuao por reas de abrangncia geogrfica, na cidade do Rio de
Janeiro. A criao da 5 Promotoria visou redistribuio das reas de abrangncia da
2 e da 3 Promotorias e foi instalada em espao distinto das anteriores, que funcionam
no mesmo endereo. A localizao fsica das Promotorias ser retomada e debatida
frente.
No que tange ao idoso, as aes das Promotorias so pautadas pela Constituio
Federal de 1988, pela Lei federal n 8.842/94 Poltica Nacional do Idoso; pela Lei
Federal n 10.741/2003 Estatuto do Idoso; e pelas demais legislaes relativas
Seguridade Social.
Neste sentido, as Promotorias tm como atribuies: atender ao idoso em
situao de risco por ao ou omisso da famlia, da sociedade ou do Estado e em razo
de sua condio pessoal; atuar quando h violao de direitos coletivos de idosos;
estabelecer medidas de proteo; propor aes de interdio de idosos abrigados que
no possuam famlia, ou em caso de famlias omissas; fiscalizar Instituies de Longa
Permanncia para Idosos (ILPI(s)) e propor formas de regularizao; promover a
insero familiar de idosos abandonados em abrigos; atuar na rea cvel em assuntos
que envolvam idosos em situao de risco de acordo com as atribuies do Parquet;
assegurar e fiscalizar o cumprimento de direitos garantidos pela Constituio Federal,
sobretudo os relacionados Seguridade Social.
No que se refere s pessoas com deficincia, as aes das Promotorias so
orientadas pela Constituio Federal de 1988 e legislaes posteriores especficas a esse
segmento populacional. Entretanto, com relao a esse grupo a atuao das Promotorias
destinada a interesses coletivos e nisto se diferencia da atuao voltada ao idoso em
situao de risco, que tem carter de tutela individual.
As aes das Promotorias iniciam-se, principalmente, a partir de comunicaes/
denncias feitas atravs da Ouvidoria Geral do Ministrio Pblico 28 e, em menor
proporo, por meio de representaes
28

29

elaboradas atravs de atendimentos do

Pelo telefone 127 ou e-mail disponvel atravs do link da Ouvidoria, no site do Ministrio Pblico
(www.mp.rj.gov.br) ou pessoalmente na sede da mesma, na Avenida Marechal Cmara n 170, trreo.
29
Denomina-se representao a ao por meio da qual algum em nome alheio defende interesse e direito
alheio. No caso das Promotorias, difere da comunicao feita Ouvidoria por exigir a identificao do
comunicante.

59

Servio Social junto s Promotorias do Idoso. Parte das comunicaes proveniente dos
profissionais da rea de sade, que so obrigados a comunicar os casos de suspeita ou
confirmao de maus-tratos contra idoso (EI, Art. 19)

30

. Vale citar que, no decorrer

deste estudo, observou-se que parte das comunicaes de profissionais foi feita atravs
de relatos encaminhados por meio de fax ao Servio Social das Promotorias ou
diretamente s secretarias das mesmas para em ambos os casos serem apresentadas aos
Promotores.
No Ministrio Pblico, quando a comunicao protocolada analisada pelos
promotores como atribuio da instituio, constitudo procedimento administrativo
PA. Alm dessa instaurao, a partir das comunicaes/ representaes, as
Promotorias tm a tutela de todos os idosos que esto em ILPI, para os quais tambm
so gerados procedimentos administrativos individuais e, em decorrncia disso, o
acompanhamento de cada caso 31.
Para o seu funcionamento, as Promotorias solicitam informaes, estudos,
pareceres e avaliaes a profissionais vinculados a rgos de apoio da prpria estrutura
institucional, dentre os quais: a) Grupo de Apoio Tcnico Especializado (GATE).
Composto por profissionais de variadas reas

32

, sendo que as solicitaes das

Promotorias do Idoso comumente se voltam para a psiquiatria, quando se trata de casos


individuais, e para o servio social e outros profissionais quando demanda a avaliao
de ILPI; b) Grupo de Apoio ao Promotor (GAP), que formado por policiais militares
que so demandados a realizar diligncias com a finalidade de averiguar a veracidade
das situaes denunciadas; c) Coordenadoria de Segurana e Inteligncia CSI realiza
pesquisas relativas identificao de pessoas, documentos, endereos, reas de risco,
etc. A CSI formada por coronis e tenentes da Polcia Militar, submetidos a um
Promotor de Justia; d) Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justia de
Proteo ao Idoso e Pessoa como Deficincia CAOIPD. Criado em setembro de
2012, este centro de apoio atende solicitaes das cinco Promotorias do Idoso e da
30

A no comunicao por parte dos profissionais de sade e responsveis por ILPIs de casos de crime
contra o idoso consiste em infrao administrativa, punvel com multa (EI, Art. 57).
31
As ILPIs enviam ao Ministrio Pblico informaes individuais de todos os idosos abrigados, mesmo
daqueles que tm famlia e ou so independentes e para cada um constitudo um PA. No que tange a
situao de abandono material ou material por parte dos familiares, obrigatria a comunicao ao MP
(cf. art. 50, EI).
32
O GATE se subdivide em quatro reas: ambiental; instituies e direitos sociais; patrimnio pblico e
consumidor; sade. Agrega mdicos, assistente social, psiclogos, psiquiatras, contador, engenheiros
(civil, qumico, de alimentos, cartgrafa), arquitetos, historiador, bilogos, fsico nuclear, economista.

60

Pessoa com Deficincia e algumas advindas de outras Promotorias quando a matria


pessoa com deficincia em situao de risco 33.
No perodo compreendido entre 2005, quando da criao das Promotorias do
Idoso, at a recente instituio do CAOIPD, as solicitaes dos promotores eram feitas
ao CAOP Cvel, que as atendia. Ademais, esse centro operacional tambm
responsvel por responder a demandas das Promotorias de Justia de Famlia, e de
rfos e Sucesses, entre outras 34.
A criao de um rgo de apoio especfico para as Promotorias do Idoso se deve
ao aumento de solicitaes de avaliaes no s na rea do idoso, mas tambm na rea
cvel. Considerando isso, os promotores solicitaram a diviso da equipe de Servio
Social que compunha o CAOp Cvel argumentando a necessidade de especializao
na execuo do trabalho solicitado 35.
O CAOIPD formado por seis assistentes sociais e duas psiclogas. At o
perodo de elaborao deste texto, cinco assistentes sociais atuam em resposta
realizao de estudos sociais e uma em atendimentos junto s Promotorias do Idoso e
da Pessoa com Deficincia. As psiclogas foram nomeadas em julho de 2012 e tambm
pertenciam ao 3 CAOp Cvel, mas desde a sua nomeao atendem as demandas
encaminhadas ao GATE, em substituio a profissional de psicologia daquele rgo,
alm de responderem solicitaes das Promotorias do Idoso.
Alm das instncias internas ao MP, as Promotorias do Idoso solicitam
informaes e pareceres a outras instituies, dentre elas, as secretarias municipais de
sade e de assistncia social, considerando que atendem aos idosos em tela.
A insero do Servio Social nas Promotorias do Idoso se deu em 2006, a partir
da solicitao de uma Promotora de Justia em exerccio poca, por considerar

33

O Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Proteo ao Idoso e Pessoa com Deficincia
atende os rgos de execuo com atuao na defesa de interesses difusos, coletivos, individuais
homogneos de relevncia social e individuais indisponveis, em matria de proteo ao idoso e pessoa
com deficincia (Resoluo 1804, de 28 de janeiro de 2013, Art. 12).
34
O Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justia Cveis atende os rgos de execuo com
atribuio em matria cvel, empresarial, de famlia, de rfos e sucesses, de acidentes do trabalho, de
fundaes, de liquidaes extrajudiciais, de registro civil, de fazenda pblica, de registro pblico e de
Juizados Especiais Cveis. (Resoluo 1804, de 28 de janeiro de 2013, Art. 4).
35
Segundo exposio oral de Coordenadores dos citados rgos de apoio em reunio da equipe de servio
social, quando foi tambm defendida a diviso da mesma. Alm disso, conforme a exposio entendeu-se
por especializao a realizao de anlises que envolvam o mesmo segmento populacional e no uma
formao especfica.

61

importante o trabalho deste profissional no atendimento aos usurios, que anteriormente


era feito por tcnicos administrativos.
A equipe de assistentes sociais passou a atuar nos atendimentos na Promotoria,
mantendo tambm as atividades de visitas domiciliares e institucionais e de elaborao
de relatrios, solicitados pelos promotores atravs de ofcios ao 3 CAOp Cvel
Centro de Apoio Operacional. Somente a partir de meados de 2010 que foi designada
uma assistente social para atuar unicamente nos atendimentos nas Promotorias, o que
anteriormente era feito por toda a equipe em sistema de revezamento.
Em 2008, por solicitao da equipe de assistentes sociais e com o apoio de uma
promotora, foram criadas quatro vagas para estagirios de Servio Social. A minha
atuao enquanto estagiria se deu no perodo de julho de 2009 a julho de 2010, em
atividades realizadas na Promotoria e no 3 CAOP.
O Servio Social do CAOIPD recebe solicitaes dos promotores para
realizao de abordagem social que so respondidas e documentadas por meio de
relatrios sociais. No que tange atuao nos atendimentos ao pblico, este passou por
mudanas ao longo do tempo. Deixou de atender demandas espontneas,
representaes, complementaes de informaes, e, passou a atender aos que
comparecem em resposta a notificaes dos Promotores. A profissional que atua nesse
espao, a cada dia da semana atende, de forma pr-fixada, as notificaes de uma das
cinco Promotorias.
Pode-se pensar que, apesar de a atuao do MP junto ao idoso ser recente, a
forma de conduzi-la vem sendo repensada e organizada ao longo do tempo. Esses
processos abarcam mudanas no que tange aos recursos humanos para a atuao e
estruturao dos espaos fsicos, entre outras questes. Nisso, o Servio Social tambm
alcanado e, cabe lembrar que, a discusso aqui apresentada incorpora elementos de
um perodo histrico, em mudana.

2.3 Localizao e espao fsico das Promotorias do Idoso e da


Pessoa com Deficincia

62

A distribuio dos servios pblicos na cidade e a organizao fsica dos seus


espaos podem aparentar no ter nenhuma intencionalidade, mas no estaria por trs
disso um significado? o que, por intermdio da descrio, procurarei aqui retratar,
uma vez que o registro etnogrfico amplia a compreenso do funcionamento do espao
institucional. A descrio do ambiente interno das Promotorias do Idoso se pauta,
principalmente, em observaes feitas poca em que fui estagiria e, na medida do
possvel, agrega informaes sobre mudanas posteriores.
Neste sentido, cabe considerar que o espao descrito refere-se ao local onde
funcionam (funcionaram) quatro Promotorias do Idoso, no tendo sido agregado na
anlise o local de estabelecimento da 5 Promotoria, por esta ter sido criado no ano de
2012, quando a pesquisa dessa dissertao j estava em fase avanada, e ainda por
funcionar em espao distinto.
As quatro primeiras Promotorias do Idoso foram instaladas no mesmo espao
fsico36, o que, possivelmente, se deu pela necessidade de instaurao, porm sem ainda
contar com estrutura fsica para o funcionamento nas suas reas de abrangncia. A 5
Promotoria do Idoso foi estabelecida junto ao Frum do Mier, bairro da zona norte da
cidade. A instalao desta se deu de acordo com o que ocorre com as demais
Promotorias especializadas, que funcionam nas suas regies de atuao. Nessa
perspectiva, em janeiro de 2013, a 1 Promotoria foi transferida para a Barra da Tijuca e
h expectativa da 4 Promotoria passar a funcionar em Santa Cruz, quando da
construo da sua sede. Desse modo, provavelmente permanecero no espao central
apenas a 2 e a 3 Promotoria, que atendem bairros dessa regio e partes das zonas norte
e sul.
Na anlise aqui constituda, descreve-se a observao do espao fsico como que
pertencente s quatro Promotorias do Idoso, uma vez que a pesquisa foi anterior
ltima transferncia supracitada. Essas Promotorias esto situadas em rea central da
cidade do Rio de Janeiro, conhecida por Castelo, que oficialmente no um bairro, e
que abrange a regio entre a Avenida Rio Branco, uma das principais vias da cidade, o
Aeroporto Santos Dumont e a Praa XV de Novembro, que abriga um terminal de
nibus municipais e intermunicipais e d acesso a Estao das Barcas. A maior parte
dos edifcios da regio foi construda na primeira metade do sculo XX e comporta

36

Esto situadas na Avenida Marechal Cmara n. 186 4 Andar, Castelo.

63

sedes de instituies importantes como o Tribunal de Justia, o Palcio Tiradentes, o


Museu Histrico Nacional, a Santa Casa da Misericrdia, entre outros. Neste sentido,
cabe observar que, no obstante, se considere que a instalao das Promotorias do Idoso
no centro da cidade tenha decorrido da ausncia de estruturas fsicas nas suas reas de
abrangncia. O seu funcionamento na rea central, ainda que temporrio, converge com
a localizao de muitos rgos pblicos, como no passado quando esta cidade era a
capital do pas. Pode-se presumir que a escolha pela instalao de instituies e servios
nas reas centrais, onde so reaproveitadas estruturas j existentes, e, na zona sul, onde
foram construdas novas37, favorecem o deslocamento de determinados segmentos
sociais e dificultam os de outros. A distncia entre as Promotorias e o local de moradia
de uma parcela da populao foi exposta por alguns idosos visitados, os quais
verbalizaram que, por esse motivo, no desejariam ser notificados para comparecerem
nelas.
As Promotorias do Idoso funcionam em edifcio pertencente Federao dos
Bandeirantes do Brasil e situado na mesma calada do prdio principal do Ministrio
Pblico, da Defensoria Pblica e da Ordem dos Advogados do Brasil.
As quatro Promotorias ocupam um andar inteiro que composto por: a)
recepo, situada em frente sada dos elevadores e na qual a populao inicialmente
atendida pelo segurana que exerce o trabalho tambm de recepcionista. Neste primeiro
espao a populao se identifica e, em caso de comparecimento espontneo, preenche a
ficha preliminar de atendimento, na qual registra sua demanda que direcionada pelo
funcionrio ao setor responsvel; b) em espao paralelo, est uma sala de espera com
assentos suficientes para a demanda diria e com gua e caf disponveis. Nesta sala, a
populao aguarda o atendimento do Servio Social e ou dos Promotores; c) em frente
sala de espera h copa e cozinha equipadas, disponveis para uso dos funcionrios; d)
direita dessa e tambm de frente para a sala de espera h uma porta que d acesso ao
espao reservado ao Servio Social. Este composto por duas salas informatizadas e
com mesas e cadeiras para o atendimento. H um terceiro espao tambm informatizado
e com impressora, fotocopiadora, telefone, fax e armrios para guardar o material
necessrio prtica profissional; e) prximo a esse espao e com acesso sala de
espera, um funcionrio administrativo atende as demandas da populao relativas a

37

Como o NEAPTI e a DEAPTI tratadas em tpico anterior.

64

consultas de andamentos dos procedimentos administrativos, protocolo de novas


informaes entregue para serem anexadas aos PA(s), entre outros. Para isso tem mesa,
cadeira e computador disponveis; f) a sala de espera possui uma porta que d acesso
aos demais espaos, estando localizadas esquerda a 1, 3 e 4 Promotorias e mais ao
fundo a 2 Promotoria, com acesso por outra porta; g) direita h uma pequena sala
onde so guardados materiais necessrios ao trabalho das secretarias e ao lado dessa
uma sala reservada ao Promotor da 2 Promotoria; h) no fundo e direita h trs
banheiros sendo um adaptado para pessoas com deficincia e destinado ao pblico
atendido e os outros dois separados por uma porta que lhes d acesso e na qual est
afixado o aviso: reservado para funcionrios.
O espao das Promotorias em sua maior parte dividido por paredes mveis.
Nas secretarias h armrios e estantes onde so guardados os procedimentos
administrativos,

mesas

informatizadas

para

os

funcionrios

estagirios

desempenharem seu trabalho e espao reservado para os Promotores, onde esses


tambm realizam atendimentos/oitivas. Dentre os principais recursos materiais das
Promotorias e dispostos em quase todos os espaos, esto: papis, computadores,
impressoras e fotocopiadoras que so utilizados na composio dos PA(s).
Na sala de espera, no h viso externa e nem do espao reservado aos
atendimentos do Servio Social ou dos Promotores. Assim, a distncia da vida cotidiana
e apreenso que se cria na espera pelo atendimento deixam transparecer o quo
intimidante o protocolo da justia (MIRAGLIA, 2005), principalmente para aqueles
que comparecem a partir de notificaes e que desconhecem as razes da existncia dos
PA(s). E nisso cabe lembrar que compe o texto das notificaes, a observao de haver
possibilidade de conduo coercitiva, inclusive pela Polcia Civil ou Militar, em caso de
no comparecimento injustificado no prazo de dez dias (EI, Art. 74, V).
De modo semelhante ao que ocorre em outras instituies pblicas observa-se
que, enquanto os presentes na sala de espera aguardam o atendimento, mantm em suas
mos a documentao solicitada ou que julgam necessria fornecer instituio, como
instrumentos de prova.
Ao adentrar na sala de atendimento do Servio Social, o sujeito encontra como
cenrio uma mesa com computador e cadeiras disponveis para ele e seu possvel
acompanhante e para o profissional. Nessas salas, h vista externa e os usurios, por
vezes, verbalizam sobre, com afirmaes como as seguintes: ah, aqui melhor, tem

65

uma vista bonita [para a Baia de Guanabara], aqui d pra ver como o dia est
lindo, l na sala [de espera] no d pra ver nada.
O atendimento social redigido pelo profissional, posteriormente lido pelo
usurio e assinado por ambos. Nesse momento, por vezes se travam questionamentos
relativos ao contedo, so esclarecidas dvidas e negociados pontos que devem ser
considerados ou no no texto. Dessa forma, revises so possveis. Esse desenrolar do
atendimento se refere ao Servio Social, pois com relao aos dos Promotores no
foram feitas observaes ou participaes. Alm disso, a afirmao relativa aos
atendimentos sociais se refere ao tempo em que fui estagiria de Servio Social nas
Promotorias e participei da realizao de parte deles.
Ademais, no registro do atendimento o comunicante identificado e para tal
fornece seu documento de identidade, do qual tambm emitida fotocpia para anexar
via do atendimento que compor o procedimento administrativo.

2.4 Situao de risco como parmetro de atuao


O uso da noo de risco para arbitragem de situaes na rea do social coloca
perspectiva interessante para o entendimento do funcionamento das instituies na
contemporaneidade (MITJAVILA, 2002).
Neste sentido, com relao s Promotorias do Idoso a denominada situao de
risco condicionante da atuao institucional na qualidade de substituto processual do
idoso e na eleio de medida protetiva mais adequada. Nessa instituio, a expresso
situao de risco provoca debates e interpretaes que buscam defini-la por meio de
embasamentos nos instrumentos legais.
Dessa forma, os principais argumentos partem da Lei 10.741/2003, sobretudo do
seguinte:
[...] as medidas de proteo ao idoso so aplicveis sempre que os direitos
reconhecidos nesta Lei forem ameaados ou violados: I. por ao ou omisso
da sociedade ou do Estado; II. por falta, omisso ou abuso da famlia, curador
ou entidade de atendimento; III. em razo de sua condio pessoal. (EI, Art.
43).

66

Com isso, verificada qualquer das hipteses previstas no art. 43, o Ministrio
Pblico ou o Poder Judicirio, a requerimento daquele, poder determinar medidas
protetivas, dentre outras, as seguintes:
[...] I. encaminhamento famlia ou curador, mediante termo de
responsabilidade; II. orientao, apoio e acompanhamento temporrios; III.
requisio para tratamento de sua sade, em regime ambulatorial, hospitalar
ou domiciliar; IV. incluso em programa oficial ou comunitrio de auxlio,
orientao e tratamento a usurios dependentes de drogas lcitas ou ilcitas,
ao prprio idoso ou pessoa de sua convivncia que lhe cause perturbao;
V. abrigo em entidade; VI. abrigo temporrio. (EI, Art. 45).

Ademais, as medidas de proteo levaro em conta os fins sociais a que se


destinam e o fortalecimento dos vnculos familiares e comunitrios (EI, Art. 44).
Diante disso, em 2005 quando da criao das primeiras Promotorias do Idoso no
Rio de Janeiro, dezenove promotores e as coordenadora e subcoordenadora do 3CAOP
Cvel, participaram de uma oficina de trabalho sobre o tema situao de risco de
pessoa idosa, visando fixao de parmetros mnimos para sua caracterizao.
Assim,
[...] ao trmino dos debates, os Promotores de Justia presentes entenderam,
por maioria, que a atuao do Ministrio Pblico na tutela individual do
idoso apenas se justifica na hiptese deste no apresentar condies de
vindicar seus direitos pessoalmente ou atravs de familiares. Neste vis,
concluram que a caracterizao da situao de risco ensejadora da atuao
ministerial impe a presena do requisito previsto no inciso II do artigo 43 do
EI (falta, omisso ou abuso da famlia, curador ou entidade de atendimento).
(REIS e HOLLANDA, 2005, Ata de reunio).

Com base nessa delimitao as comunicaes que so apresentadas ao


Ministrio Pblico podero ser ou no entendidas como atribuio institucional. Assim,
nos casos em que o idoso e ou sua famlia tenham condies de vindicar (exigir
legalmente) seus direitos, devem faz-lo por meio de instituies como a Delegacia de
Polcia e a Defensoria Pblica. Ento, quando o prprio idoso e ou seus familiares
procuram o atendimento das Promotorias, na maioria das vezes, so orientados sobre a
atuao dessas e encaminhados a outros rgos. Nas demandas de abrigamento, por
exemplo, h casos em que, de imediato ou no decorrer dos PA(s), idosos e ou familiares
so orientados a buscarem por si mesmos as instituies, podendo no atendimento
receber informaes sobre perfil de idoso atendido, caractersticas gerais dessas e
respectivos endereos.
No que tange ao consenso estabelecido pelos promotores sobre a situao de
risco, observa-se que os incisos I (omisso do Estado e da sociedade) e III (condio

67

pessoal) do artigo 43 do Estatuto do Idoso, somente sero considerados quando houver


o inciso II. Portanto, a ao ministerial se d nas circunstncias de falta ou
descumprimento da lei por parte da famlia, curador e entidade de atendimento, o que
tambm remete a lgica de responsabilizao familiar e individual. Isso no est
descolado dos valores da ideologia neoliberal, que perpassa as relaes e organizaes
sociais, e se mostra tambm em outros dispositivos legais e institucionais
contemporneos.
Segundo Pereira (2004), na conjuntura neoliberal, a famlia redescoberta como
substitutivo privado do Estado na proviso de bens e servios sociais bsicos. O
contexto de mudanas estruturais utilizado como justificativa para a formao de um
modelo misto de proteo social, no qual a famlia responsabilizada em primeiro
plano. Com a defesa de um pluralismo de bem-estar conjuga-se a participao do
Estado, mercado, organizaes voluntrias e caritativas e da rede familiar. Ao Estado
compete o recurso do poder, da autoridade coativa; ao mercado, o recurso do capital;
sociedade, da qual a famlia faz parte, a solidariedade. Entretanto, a famlia no bloco
monoltico e passa por mudanas significativas, dentre as quais a insero das mulheres,
tradicionais cuidadoras, em atividades no mbito pblico, o que requer dificuldades para
a assistncia de familiares dependentes.
Ainda no que tange discusso de risco social como ensejador de atuao,
Vecinday (2005), afirma que ele conceito abstrato de um observador, um modelo
relacional de variveis. Por ser uma construo mental, tudo ou nada pode ser risco,
dependendo da perspectiva atribuda ao observador na situao. Neste sentido, a prpria
seleo de riscos e a negao de outros estaria assinalando modalidades de percepo e
categorizao que definem quais situaes so merecedoras de serem includas na
agenda das polticas sociais. Ademais, segundo a mesma autora, a ideia de risco usada
para manipular condutas e prescrever comportamentos que permitam a superao de
problemticas, ativando recursos da prpria famlia e comunidade, amortizando as
demandas que se apresentam ao Estado.
Durante o meu estgio em Servio Social e tambm na atuao como assistente
social, observo, que na prtica, h dificuldades em delimitar de forma objetiva e num
primeiro olhar, se h situao de risco e, ainda, a condio do idoso e sua famlia para
vindicar seus direitos. Dessa forma, h semelhantes demandas que ora so atendidas,

68

ora recusadas, a depender das interpretaes sobre as circunstncias apresentadas e da


forma como so relatadas.
Ao discutir a situao de risco social cabe aqui indagar de onde advm o uso
recorrente dessa expresso que se mostra, por exemplo, nos despachos dos Promotores
que solicitam a realizao de abordagem social, da qual comumente requerem a resposta
se h ou no situao de risco. Observa-se que essa denominao no est contida no
texto do artigo 43

38

do Estatuto do Idoso, que pauta as aes das Promotorias.

Entretanto, com base no referido artigo que a situao deve ser avaliada. Pode-se
ento, depreender que a ameaa ou violao de direitos que constitui um risco
social.
No texto do Estatuto do Idoso, a expresso risco se mostra nas seguintes
partes: a) da assistncia social acolhimento de idosos em situao de risco social
(Art. 36); b) da fiscalizao das entidades de atendimento na ocorrncia de infrao
que coloque em risco os direitos assegurados nesta Lei ser o fato comunicado ao
Ministrio Pblico (Art. 55, da 3); c) da apurao administrativa de infrao s
normas de proteo ao idoso risco para a vida ou sade (Art. 62-63); d) e do
Ministrio Pblico oficiar em todos os feitos em que se discutam os direitos de
idosos em condies de risco; atuar como substituto processual do idoso em situao
de risco, conforme o disposto no art. 43 desta Lei (Art. 74, II e III).
Embora no haja absoluta clareza sobre a definio da situao de risco, o que
se pode considerar que, nas Promotorias, seu uso serve para delimitar a interveno, e
sobre ela que buscarei trazer elementos da pesquisa documental que contribuam para
uma melhor compreenso.
A invocao da situao de risco utilizada como parmetro para o incio da
atuao das Promotorias, para a sua continuidade e tambm para justificar o
arquivamento de PA(s), quando considerada a sua inexistncia. Em quatro das dezessete
representaes analisadas na minha pesquisa so utilizadas expresses na introduo
do texto, como as seguintes: informar possvel situao de risco social, situao de
vulnerabilidade que vivencia. Nas demais representaes, as problemticas relatadas
foram denominadas por: negligncia, abandono, maus tratos, abrigamento foroso; ou

38

Citado no 3 pargrafo do subttulo 2.4.

69

deixa-se em aberto por meio de expresses como solicitar interveno desta


Promotoria.
Considerando o andamento dos PA(s), observei que o uso da terminologia
risco social se mostra em parte dos relatrios sociais. Quando nesses documentos
utilizada a expresso

situao

de risco,

geralmente acompanhada de

exemplificaes que buscam objetiv-la: o acesso ou no a direitos sociais bsicos


[citados], a existncia ou no de assistncia familiar, as condies de o idoso reclamar
seus direitos, elementos esses que, se existentes, denotam a no tutela do MP.
Uma das Promotorias do Idoso, ao solicitar aos assistentes sociais o estudo
social, pontua na solicitao que a resposta deve ser sobre o que denomina por
quesitos do Ministrio Pblico. Estes consistem nas seguintes perguntas, que seguem
na solicitao do Promotor, acompanhadas da observao que devem ser respondidas de
modo sucinto:
1) A pessoa idosa interagiu satisfatoriamente abordagem social? 2) Em caso
negativo, objetivamente, esclarecer as limitaes da pessoa idosa que
impediram ou dificultaram a realizao da entrevista pessoal. 3) A pessoa
idosa vem sendo assistida em suas necessidades bsicas de per si, por sua
famlia ou ainda por terceiros? 4) Em caso negativo, objetivamente,
esclarecer se entende como pertinente o abrigamento da pessoa idosa, ainda
que temporariamente, ou a aplicao de outra medida protetiva prevista no
Art. 45 do Estatuto do Idoso.

Esses quesitos reiteram a noo de que o idoso com suas necessidades bsicas
viabilizadas e que tenha indcios de condies de sade mental para seus atos no est
em situao de risco. Isso significa que as situaes adversas por ele vivenciadas no
comportam a atuao do Ministrio Pblico e devem ser viabilizadas por ele e sua
famlia via processo judicial, por exemplo.
Assim, o arquivamento de PA(s) realizado quando no se percebem elementos
para aplicao de medidas de proteo e ou na existncia de outra medida judicial que
contemple o mesmo objeto que os instaurou. Neste sentido, extraio de uma Promoo
de Arquivamento, documento que elaborado pelos promotores e encaminhado ao
Egrgio Conselho Superior do Ministrio Pblico 39, os seguintes fragmentos:
de se notar, que a atuao do Ministrio Pblico na tutela individual do
idoso s legtima quando efetivamente estiver caracterizada situao de
risco, que deve ser entendida de maneira restritiva, j que a vocao
constitucional do Parquet a tutela de direitos com dimenses coletivas, s

39

Formado por procuradores com maior tempo de experincia e de atuao no Ministrio Pblico. O
arquivamento de PAs somente ocorre com a concordncia deles.

70

se admitindo a tutela individual em casos de direitos indisponveis (e na


forma da lei).

Ademais, no mesmo documento consta o seguinte:


[...] a exegese a ser levada a cabo do art. 43 da Lei 10.741/03 deve levar em
conta dados objetivos que apontem o risco no sentido de violao de direito
indisponvel, como a vida e a sade. Alm disso, somente ocorrer a situao
de risco e a legitimidade extraordinria do Ministrio Pblico para a tutela do
direito individual indisponvel do idoso quando este no puder vindicar seus
direitos de per si ou por seus familiares (art. 1780 do Cdigo Civil), haja vista
40
a situao sofrida .

Desse modo, os documentos institucionais esclarecem que a existncia da


situao de risco ocorre quando o idoso no tem direitos assegurados e nem ele e a
sua famlia possuem condies de busc-los. Ou seja, a obrigao protetiva cabe,
primeiramente, ao prprio indivduo e sua famlia. E somente quando, por alguma
razo significativa, lhes faltem condies para garanti-la que se dar a tutela
individual por parte do Estado.
Ainda no que se refere noo de risco e atuao institucional, vale lembrar
que elas no so neutras. Os enunciados costumam ocultar, atrs de uma cortina de
termos tcnicos, um conjunto de crenas sociais, valores ou ideais polticos, que devido
sua inacessvel sintaxe, resistem a qualquer forma de contraposio.
(MITJAVILLA, 2002. p.134).
Nesse contexto, o abrigamento tambm pode receber distintas interpretaes que
so permeadas pelo que preconizam as legislaes e pelo debate dos direitos e das
polticas pblicas, podendo ser considerado abandono moral e material e ou medida de
proteo.
Na interpretao de Camarano (2010), a necessidade de cuidados de longa
durao por parte da populao idosa configura um novo risco social. Argumenta que a
perda das capacidades para as atividades da vida diria deve constituir-se em um risco
social a ser assumido pelo Estado brasileiro. Este reconheceu a perda da capacidade
laborativa pela idade avanada como um risco social e instituiu direitos previdencirios
e ou assistenciais. No entanto, ainda no reconheceu que o avano da idade acarreta
vulnerabilidades, entre elas, limitaes das capacidades funcionais bsicas e restries

40

Art. 1780 do Cdigo Civil: A requerimento do enfermo ou portador de deficincia fsica, ou, na
impossibilidade de faz-lo, de qualquer das pessoas a que se refere o art. 1.768, dar-se-lhe- curador para
cuidar de todos ou alguns de seus negcios ou bens. Art. 1768: A interdio deve ser promovida: pelos
pais ou tutores; pelo cnjuge, ou por qualquer parente; pelo Ministrio Pblico.

71

dos arranjos sociais, ou seja, a dependncia no se restringe aos aspectos mdicos, pois
h uma dimenso social que diz respeito necessidade de cuidados de longa durao.
Neste sentido, a referida autora defende que o reconhecimento do cuidado como
direito social fundamental para estabelecer polticas pblicas que possibilitem apoios e
alternativas de assistncia, que predominantemente tm sido realizados nas ILPI(s) em
sua maior parte filantrpicas e privadas.
A partir disso, cabe ainda uma observao sobre o termo cuidado. Constatei seu
uso em parte das recomendaes da rea da sade, como, por exemplo, Carta de Ouro
Preto, Estratgia Sade da Famlia, Programa de Cuidadores de Idosos, Plano de
Enfrentamento a Violncia Domstica. Nesses documentos utilizado em relao s
prticas realizadas no domiclio do idoso pela sua famlia e ou por terceiros, e se
assemelha ao sentido trabalhado por Camarano na discusso acima exposta.

Nas

demais legislaes e polticas voltadas aos idosos observa-se o uso dos termos ajuda e
amparo (CF, 1988, Art. 229 e 230), proteo, atendimento, amparo e assistncia (EI,
2003).

2.5 Populao que busca atendimento nas Promotorias do


Idoso e da Pessoa com Deficincia
A populao que procura atendimento nas Promotorias do Idoso e da Pessoa
com Deficincia composta por: idosos, pessoas com deficincia, familiares, vizinhos
ou outros que com eles tenham relao de proximidade; responsveis por instituies de
atendimento; advogados; entre outros. Cabe ressaltar que a maior demanda diz respeito
populao idosa, pois neste caso h atuao tambm na tutela individual, o que no se
realiza no caso das pessoas com deficincia, sendo nfima a procura de atendimento por
parte destas. Quando h essa busca, geralmente se refere a questes de acessibilidade,
sobretudo nos meios de transporte coletivos.
O atendimento solicitado a partir de encaminhamentos formais e informais de
outras instituies, indicaes de atendidos, por iniciativa prpria, e, para responder a
notificaes de promotores.

72

As demandas apresentadas pelos atendidos, em geral, so as seguintes:


representao, complementao de informaes, orientao e solicitaes com a
finalidade de agendar atendimento com os promotores, de explicaes sobre as razes
de arquivamento de procedimentos e explanao de motivos para desarquiv-los, acesso
ao contedo dos procedimentos e de cpia dos mesmos.
As complementaes de informaes em procedimentos j existentes,
geralmente, so solicitadas pelos prprios idosos ou comunicantes, e, em alguns casos,
por terceiros, que tenham acesso a esses documentos mediante solicitao previamente
atendida pelo promotor responsvel. Em geral, visam esclarecer o que fora apresentado
anteriormente ou acrescentar novas situaes.
A pesquisa documental realizada por mim retrata, em parte, quem so os
comunicantes que procuram as Promotorias do Idoso e a que situaes se referem. Nisto
importante lembrar que as Promotorias atendem a variadas situaes de violao de
direitos dos idosos, entretanto, o recorte da minha anlise documental se volta para
demandas que tenham relao com o abrigamento de idosos.
Na documentao relativa aos dezoito idosos, um primeiro dado chama ateno:
apenas dois comunicantes so do sexo masculino. Com isso, pode-se questionar se a
dimenso de gnero que tradicionalmente atribui o cuidado como tarefa feminina, no
delega s mulheres, conjuntamente, a responsabilidade de comunicar e ou solicitar ajuda
quando o cuidado por alguma razo falha.
Sobre os dois comunicantes do sexo masculino, um o prprio idoso, o outro
conselheiro consultivo do edifcio onde reside o idoso do qual ele apresenta a situao.
A idade do comunicante idoso era de 76 anos e a do conselheiro consultivo no consta
na documentao das Promotorias.
O prprio idoso buscou as Promotorias com encaminhamento da Defensoria
Pblica. Relatou que seu filho se apropriou de seu imvel e documentos, levando-o para
residir com ele. Ressaltava o desejo de no retornar para a moradia. Ento, de
imediato foi encaminhado com ofcio assinado pelo promotor Central de Recepo de
Idosos41 para proceder ao seu abrigamento pblico.
Sobre o outro idoso, de aproximadamente 80 anos, o membro do conselho
consultivo do edifcio relatou que vive sozinho, em condies sub-humanas, sem

41

Equipamento da assistncia social do muncipio.

73

recursos financeiros para o autossustento, alimenta-se com comida fornecida pelos


vizinhos, inexiste o apoio familiar, e no paga o condomnio h dois anos.
Com relao aos outros dezesseis idosos, se mostra a seguinte configurao das
comunicantes, conforme a recorrncia de casos: filha (casal e uma idosa), irm (3),
proprietria do imvel (2), amiga (2), sobrinha (1), vizinha (1), sndica acompanhada de
advogada (1), diretora de ILPI (1), assistente social (1), a prpria idosa (1). Foi possvel
encontrar a idade das comunicantes em oito PA(s) e nesses constatar que apenas duas
tm idade inferior a 50 anos (30 e 44 anos), duas tm 58 anos e quatro so idosas com
idades acima de 70 anos.
As comunicaes por parte das filhas referem-se a conflitos familiares que
envolvem abrigamento de idosos. No primeiro caso, a filha comunica ao MP que, no dia
seguinte, institucionalizar seus genitores em carter provisrio, at que consiga
meios legais de resolver a questo de conflito familiar. Informa que seus pais, 92 e 97
anos, residem sozinhos, em imvel prprio, com assistncia de duas empregadas e que
seu irmo os visita todos os dias, ocasies em que os agride verbalmente e subtrai
objetos e dinheiro. Acrescenta ainda ter feito tentativas de interveno na Delegacia
do Idoso, no Juizado do Idoso e na Delegacia de Polcia, entretanto no obteve
resposta positiva. No segundo caso, a filha solicita permisso para retirar a genitora,
84 anos, de ILPI, informando que foi abrigada pela irm por razo desconhecida e
que a idosa poder com ela residir, haja vista ser a vontade de ambas. De modo
semelhante, o caso da sobrinha que informa ter ocorrido abrigamento foroso da tia,
90 anos, feito por uma filha de criao e solicita autorizao para remoo da idosa a
uma ILPI mais apropriada, comprometendo-se com os custos. No caso das
comunicaes por parte das filhas e da sobrinha, nota-se que duas precisam de
autorizao para retirar as idosas de ILPI e a outra comunica o abrigamento. Com isso,
pode-se pensar que todas esto atreladas lgica dos dispositivos legais e tentam se
precaver de responsabilizaes posteriores.
No que tange comunicao por parte das irms, uma informa que a idosa, 86
anos, reside com o filho, est acamada, depende de cuidados de um enfermeiro que a
agride, no tem condies de higiene e recebe alimentao imprpria. Exps ter feito
denncia na Delegacia do Idoso. A idosa lcida e orientada e declarou a vontade de
ser removida para um abrigo particular. As outras duas irms solicitam interveno
do MP, uma por que seu irmo, 63 anos, doente psiquitrico, no aceita se submeter a

74

tratamento mdico e agride a seu genitor, 90 anos, e a outros familiares, o que leva a
temer pela integridade fsica de todos. A outra comunicante solicita interveno em
razo de ela, 58 anos, ter problemas psiquitricos e residir somente com sua irm idosa,
73 anos. Exps que, em circunstncias de surto, gasta incontrolavelmente seus
proventos e os da irm, que juntos totalizam mais de 40 mil mensais 42, porm devido a
emprstimos no suprem as necessidades bsicas de moradia, alimentao e sade.
Nesses dois casos no se trata de pedido de abrigamento e sim de apresentao de
limites para a assistncia familiar aos idosos.
Dessa forma, parte das representaes realizadas por parentes informam
conflitos e obstculos nas negociaes intrafamiliares, e com isso, a necessidade de uma
determinao externa, que valide o abrigamento ou o trmino dele. Em duas situaes,
se apresenta o pedido de interveno por um agente externo famlia, que seja capaz de
minimizar as consequncias decorrentes de doenas psiquitricas que dificultam a
convivncia e ou a sobrevivncia. Ademais, todas as comunicantes relatam ter buscado
outros meios antes do MP.
As representaes realizadas pelas proprietrias dos imveis onde as idosas
residem e pela sndica, acompanhada de advogada, apresentam histrias de duas idosas
e um idoso que moram sozinhos, so solteiro/as, sem filhos, sem qualquer
assistncia familiar, em total estado de abandono. As narrativas informam que uma
das idosas, 71 anos, est acamada em decorrncia de fratura do fmur, recebe um salrio
mnimo e reside em quitinete. Ela sempre residiu sozinha, no manteve contato e
vnculo com familiares, nem solicita a presena deles. A outra idosa, 72 anos, apresenta
indcios de desorientao, recolhe lixo e o guarda no apartamento. Deste modo, ambas
de alguma forma dependem de assistncia, que na ausncia da famlia passa a
incomodar a terceiros, especialmente a preocupar as proprietrias dos imveis. No caso
do idoso, h problemas de retardo mental e necessidade de acompanhamento para
AVD Atividades da Vida Diria. Este foi levado s Promotorias juntamente com a
comunicante, porm no consta se foi ouvido. Na ocasio da representao, o
promotor determinou o acolhimento provisrio em instituio pblica e o idoso foi
encaminhado de imediato Central de Recepo de Idosos. O acolhimento dele se

42

Ambas as idosas so pensionistas de coronel das Foras Armadas, recebendo disso quase 14 mil reais
cada. Uma das idosas tem tambm aposentadoria de cerca de quinze mil reais. Devido aos emprstimos
na ocasio da comunicao recebiam juntas cerca de 5 mil reais.

75

tornou permanente, passando posteriormente a residir em uma ILPI privada, conforme


observado na leitura dos trmites do PA.
Assim, a situao desses idosos solteiros remete discusso da configurao dos
lares e das modificaes no mbito simblico, que se manifestam em novos modelos de
famlia e estilos de relao familiar, os quais desafiam os papis familiares tradicionais
e impem novas provocaes e tenses. H novas formas de articulao entre os
gneros, geraes e instituies sociais na busca de relaes sociais baseadas nos
direitos das pessoas e em opes mais democrticas de convivncia, que sugerem a
necessidade de polticas que considerem essas realidades (ARRIAGADA, 2007). Ou
seja, coloca-se a necessidade de pensar polticas que contemplem o indivduo, pois, na
atual configurao, a pessoa que est deslocada da famlia mais propensa a viver
situaes de no assistncia. Embora na modernidade existam formas diversas de
organizao da vida e presena de projetos individualizantes, permanece o pressuposto
de que nas situaes que demandam algum tipo de assistncia h um familiar ou mesmo
um parente distante para exerc-la. A inexistncia configura um estranhamento e uma
valorao negativa do indivduo, que reconhecido mediante o seu pertencimento
familiar.
Com relao s comunicaes feitas por amigas, elas referem-se a um idoso, 63
anos, e a uma idosa, 73 anos. No que se refere a ele, a comunicante relata que, h quase
oito anos, esteve internado, o acompanhou, e ao receber alta mdica a famlia solicitou
que permanecesse na residncia [dela] temporariamente, mas continua na casa e a
comunicante no tem condies para assisti-lo. A outra situao refere-se a duas amigas
solteiras, ambas idosas, que viveram juntas por vinte anos. A comunicante, 77 anos,
explicou que sua amiga, 73 anos, foi institucionalizada aps agresses fsicas entre
ambas, decorrentes de surto da mais nova. A ILPI em que a idosa est exige cerca de
trs salrios mnimos mensais, porm a idosa tem aposentadoria no valor de um salrio
mnimo e a amiga no tem condies de mant-la.
Quanto representao feita pela vizinha, concernente idosa viva, 84
anos, me de uma nica filha falecida, residente em casa interditada pela prefeitura e
com indicao de demolio. A idosa perdeu todos os documentos em uma enchente e
no consegue obter a segunda via, nem acessar ao BPC. Devido ausncia de renda e
de documentao est impossibilitada de obter outra moradia.

76

J a comunicao realizada pela diretora de ILPI refere-se uma idosa, 80 anos,


que pretende deixar a instituio, porm, segundo a comunicante, que tambm mdica,
a referida no tem condies de residir sozinha e nem de procurar outra ILPI. Nesse
caso, vale observar que a ILPI onde a idosa vive privada, o que possivelmente
interfere na recusa da instituio em permitir a sada dela.
Dentre as comunicaes estudadas, h uma feita por assistente social de hospital
psiquitrico solicitando abrigamento pblico para uma idosa, 74 anos, com vivncia em
situao de rua alternada com internaes. A profissional de Servio Social relatou ter
realizado contato com a Fundao Leo XIII e a Central de Triagem de Idosos no
intuito de promover o abrigamento da idosa, porm no obteve xito.
Por fim, h tambm uma comunicao realizada pela prpria idosa, 80 anos, que
relatou ser aposentada com um salrio mnimo, no possuir recursos financeiros para
sua manuteno, devido a emprstimos para tratamento de sade e no ter como
pagar o aluguel. Informou ter um irmo idoso e dois sobrinhos e no ter vnculo afetivo,
nem contato com eles. A idosa solicitou ao MP o abrigamento pblico e informou o ter
buscado em um equipamento que tem essa finalidade e que pertence assistncia social
do muncipio, porm l foi orientada a procurar o MP, pois somente assim conseguiria o
encaminhamento para abrigar-se. Essa tem sido uma realidade vivenciada tambm por
outros idosos e seus familiares, que somente conseguem o abrigamento pblico ao
terem sua necessidade reconhecida e encaminhada pelo MP aos equipamentos da
assistncia social. Tal processo utilizado sob o argumento de que no h vagas
disponveis e funciona como mais um elemento dificultador para os que demandam essa
medida protetiva.
Ainda com base na documentao analisada, constata-se que as representaes
referem-se a doze mulheres e seis homens, cujas idades delas esto entre 71 e 92 anos e
as deles entre 63 e 97 anos. Embora o universo pesquisado seja pequeno, observa-se a
prevalncia de mulheres. Assim, ao feminino a quem tradicionalmente se delega o
cuidado familiar, quando na velhice, em comparao aos homens, demandam mais a
assistncia de outras instituies. Ademais, conforme as informaes levantadas, elas
passam a necessitar de assistncia em idade mais avanada que a dos homens.
Neste sentido, se percebe como os aspectos familiares so contemplados nos
documentos. Todos os idosos solteiros no tm filhos, o que de algum modo
ressaltado nos registros: no tem filhos, nem tampouco contato com familiares,

77

possui sobrinhos, tem s um irmo. Com relao aos idosos vivos, todos tiveram
filhos. Diferentemente das vivas, o idoso independente para a realizao de
atividades e o prprio solicitou o abrigamento, devido a conflitos com o filho, com
quem residia. J no que tange s quatro idosas vivas, so relatadas as seguintes
situaes: tem uma filha falecida e netos adolescentes que no podem lhe dar
assistncia; uma filha de criao, mas pela dependncia da idosa que est acamada
no tem como assisti-la; me de trs filhos, mas h conflitos familiares; informa
ter dois filhos, mas no os qualifica, nem dispe possveis contatos deles.
Desse modo, observa-se que no caso dos idosos solteiros invocada alguma
forma de pertencimento familiar, o que tambm ocorre no caso do/as vivo/as. Todavia,
em relao a estes, a exposio da situao acompanhada de certa justificativa por no
ter a assistncia dos descendentes.
A famlia trazida tona nos PA(s) em consequncia da lgica familista, que
estrutura as relaes sociais e se mostra na configurao das legislaes e polticas
sociais. Com isso, quando tm conhecimento de familiares, os comunicantes informam
os nomes, endereos e telefones. E, na ausncia dessa informao por parte daqueles
que vo s Promotorias, os promotores, posteriormente, podem solicitar ao GAP a
realizao de pesquisa para localizao e qualificao da parentela.
Outra dimenso a ser considerada a das condies materiais vivenciadas pelos
idosos. No que tange ao acesso ao direito previdencirio ou assistencial no grupo
estudado, foram documentadas as seguintes situaes: 7 so aposentados, dos quais 5
recebem apenas um salrio mnimo (3 mulheres, 2 homens); 1 idoso recebe BPC; 5 so
pensionistas (4 mulheres e 1 homem); 1 idosa aposentada e pensionista com
rendimento em torno de 29 mil reais, mas com emprstimos consignados que abrangem
quase a totalidade. A idosa que esposa de um idoso aposentado, que faz parte do
grupo estudado, no informou se recebe provento. H ainda 3 idosos que no tm
rendimentos (1 homem e 2 mulheres). Com relao a estes, constam os seguintes
relatos: o idoso h 2 anos no paga o condomnio onde reside e no tem recursos
financeiros para o seu autossustento, alimenta-se com comida fornecida pelos
vizinhos. Quanto s idosas, uma vivia em situao de rua e a outra no tem os
documentos necessrios para requerer direitos, e assim, sobrevive com cesta bsica
fornecida pela igreja local e benesses de vizinhos.

78

Dentre os cinco idosos que recebem apenas um salrio mnimo, constata-se que
2 mulheres e 1 homem moram sozinhos e dependem da ajuda de parentes para pagar o
aluguel; 1 idoso e 1 idosa residem com amigos, sendo que ela foi institucionalizada
posteriormente.
No que se refere sade, no grupo estudado so mencionadas situaes que para
3 homens e 9 mulheres, caracterizam dependncia parcial ou total para AVD. Dentre as
circunstncias, se destacam a impossibilidade e ou dificuldades para deambular e para o
exerccio da vida civil. Desse modo, 3 mulheres e 2 homens deambulam com auxlio de
equipamento de autoajuda e 3 idosas so acamadas. Problemas mentais so
apresentados por 5 idosas e 2 idosos e descritos como senilidade, retardo mental,
demncia, desorientao. Quatro idosos so curatelados. Com relao aos demais
problemas de sade relatados, na totalidade do grupo, se destacam os de hipertenso
arterial, cardacos, circulatrios e diabetes.
Sobre o atendimento sade, constam as seguintes informaes: 3 homens e 3
mulheres utilizam o SUS; 2 homens e 4 mulheres tm plano de sade; uma idosa conta
com servios privados; 1 idoso e 2 idosas fazem acompanhamento de sade, mas no
informaram por quais meios, sendo que uma delas por problemas de sade realizou
emprstimos consignados ao seu benefcio previdencirio. Duas idosas no fazem
nenhum acompanhamento e uma delas utiliza medicamentos sem prescrio mdica,
que lhe so doados por membros da igreja.
Um dado que chama ateno que apenas seis idosos do grupo estudado
informam utilizar os servios do SUS, mas no h dados suficientes que permitam
afirmar se esses usam exclusivamente o servio pblico de sade. Mesmo assim,
observa-se que sete idosos utilizam servios privados e, com isso, se mostra a
mercantilizao do atendimento s necessidades sociais e, nesse quadro, os servios
deixam de expressar direitos, metamorfoseando-se em atividade de outra natureza,
inscrita no circuito de compra e venda de mercadorias (IAMAMOTO, 2008) 43.
Neste sentido, considerando as demandas de abrigamento, embora a legislao
relativa aos idosos o defina como medida excepcional e, no Brasil, a assistncia a eles
se realize predominantemente pelas famlias, uma vez que cerca de 1% dos idosos esto
em ILPI, se observa aumento do nmero de instituies privadas que oferecem servios

43

Nessa discusso ver tambm Behring e Boschetti (2007), Mota (2008), entre outros.

79

de longa permanncia (CAMARANO, 2010), bem como o de solicitaes de


abrigamento em instituies pblicas. De acordo com o Ministrio Pblico (2010), h
urgncia na ampliao do nmero de vagas disponveis em abrigos para os idosos que
tiverem necessidade de abrigamento [...], hoje, seriam necessrias 500 vagas para
atender a demanda existente na cidade44.
Com relao aos critrios que validam a necessidade de abrigamento, o Decreto
n. 1.948/96, que regulamenta a Poltica Nacional do Idoso (1994) e o Estatuto do Idoso
(2003), definem que ele deve ocorrer nos casos de inexistncia de grupo familiar,
abandono, carncia de recursos financeiros prprios ou da famlia. Essas condies, que
aparentemente so objetivas, na prtica so perpassadas por interpretaes daqueles que
solicitam o abrigamento e dos agentes estatais que o validaro ou no. Conforme os
casos acima expostos h solicitaes feitas por familiares e pelos prprios idosos, as
quais embora contemplem as questes materiais, visto que so pedidos de abrigamento
pblico, elas no esto dissociadas das relaes familiares. Assim, junto com a
apresentao da situao do idoso/a, justifica-se a inviabilidade de contar com o suporte
familiar, o que se deve a conflitos, no manuteno dos vnculos, ausncia de condies
materiais para a permanncia de um cuidador, o que configura uma assistncia
inadequada.
Ao solicitar a atuao das Promotorias, os comunicantes apresentam em seus
discursos certa expectativa de que os direitos sero assegurados pelo Estado, o que nem
sempre se realiza, conforme se nota nos casos relatados acima em que nos percursos por
vrias instituies pblicas no obtm xito.
As Promotorias do Idoso, enquanto instncias legais so buscadas por diferentes
agentes na procura por justia e por algo que esteja acima, que tenha certo
distanciamento e conhecimento tcnico para solucionar os dilemas da vida privada.
No entanto, embora as instncias judicirias e estatais sejam pensadas para
serem regidas pela legalidade, impessoalidade e racionalidade, na prtica observam-se
variadas formas de tratamento e interpretao de questes semelhantes, de acordo com o
modo dos agentes procederem (MOREIRA, 2011, MELLO e BAPTISTA, 2011,
VIANNA, 2002). E assim, se colocam questes como estas: qual a viso de abandono

44

De acordo com notcia veiculada, no dia 06/01/2010, no site do Ministrio Pblico, sobre reunio entre
este e a Prefeitura do Rio de Janeiro.

80

para os que fazem a mediao entre lei e realidade? Quem deve ser responsabilizado? E
em que medida isso soluciona o problema do idoso?
As

situaes

apresentadas

Promotorias

constituem

procedimentos

administrativos e, em geral, so resolvidas nessas instncias sem encaminhamento para


a Justia Criminal. No entanto, a ideia de que o abandono do idoso ato criminoso paira
sobre o horizonte daqueles que esto envolvidos no litgio e, apesar de nem sempre
terem clareza dos direitos do idoso em termos legais, a tm no mbito moral (LEMOS,
2010). Com a atribuio de fiscalizar as ILPI(s) e tutelar os idosos que esto nelas, as
Promotorias do Idoso constituem procedimentos administrativos individuais e,
recorrentemente, notificam os familiares dos idosos para explicarem as razes do
abrigamento e, ainda, para assumirem responsabilidades a eles relativas. Desse modo,
quando notificados avaliam estarem sendo processados judicialmente e, embora
defendam suas posies e situaes, buscam assumir o que lhes proposto, nem sempre
questionando abertamente o papel que cabe ao Estado.
Dessa forma, nesses processos se do embates entre as interpretaes da lei, a
estruturao e focalizao das polticas sociais, os interesses do idoso e de seus
familiares e a interveno institucional, nesse caso as Promotorias do Idoso. Nessa
dinmica, um dos desafios o de considerar os direitos do idoso e a problemtica em
que vive para alm dele prprio, pois, muitas vezes, trata-se de famlias com direitos
violados.
nesse bojo que a situao do idoso junto s referidas Promotorias em sua
maior parte, analisada e decodificada nos relatrios de visitas domiciliares e
institucionais e nos atendimentos realizados pelo Servio Social, por meio dos quais so
registradas informaes e apontamentos sobre as condies do prprio idoso,
habitacionais, rede familiar e social, acesso ou no a polticas sociais, entre outros.

81

Captulo III
Documentos retratos de momentos da vida e que sobre ela
intervm

3.1 A lgica dos documentos


Os documentos exercem variadas funes, entre as quais, identificar e distinguir
pessoas, informar acontecimentos, construir argumentos, produzir e reproduzir
realidades, normatizar condutas, acessar direitos, firmar obrigaes, respaldar seus
agentes.
Neste sentido, eles facilitam o ato de contar, somar, agregar a populao (e
assim, taxar a riqueza e controlar a produo) e identificar o indivduo para fins de
conceder direitos e reclamar deveres (PEIRANO, 2006, p. 137). O indivduo que no
possui documentao tem impedimentos no seu reconhecimento social.
Nas Promotorias do Idoso, o atendimento prescinde de identificao daqueles
que o buscam. No se trata de um indivduo annimo, e sim do cidado, que para ter
acesso instituio estatal, precisa antes estar de acordo com a sua lgica. Isso se
mostra mediante a documentao fornecida e reconhecida pelo Estado e que deve
portar, pela vestimenta (pode no adentrar na instituio se vestido com bermuda e
chinelo) e pela postura adequada (do contrrio pode responder judicialmente por
desacato a funcionrio pblico). Assim, quanto documentao, ainda na recepo a
populao identificada por meio da apresentao de documento de identidade, com
foto. Posteriormente, no atendimento social o documento novamente apresentado e as
informaes nele contidas so redigidas como parte da qualificao do atendido. Dessa
forma, os documentos so necessrios porque os indivduos no podem provar, por
eles prprios, sua unicidade. Precisamos que os documentos digam quem somos (Id.
Ibid., p. 145).
Ademais, eles so tambm utilizados como formas de produo de uma verdade.
No mbito estatal h, em princpio, uma verdade sobre os grupos e espaos sociais, que
usada para direcionar e controlar prticas. No campo jurdico, a verdade tambm tem

82

uma operacionalidade e no se constitui como um mero reflexo do que se passa na


sociedade e em suas relaes. Ao document-la, o pensamento jurdico reconstri a
realidade e os fatos de acordo com uma interpretao prpria, que lhe permite ser
regulador (GARAPON, 1997).
Desse modo, a autoridade do Estado garantida de forma simblica, como
aparente pacificador da igualdade de todos perante a lei. Segundo Garapon (1997), no
esforo em se libertar do religioso, Estado e instncias de Direito constituem outras
formas de dominao simblica. Assim, desde a implantao do Estado moderno e de
uma concepo de nao e de indivduo, foram construdos papis legais para garantir a
igualdade formal. A grande diferena entre a idade dos deuses e a democracia, que
nesta j no de uma pessoa que encarna o interesse geral que se espera o esforo de
imparcialidade, mas sim de um procedimento que assume a forma de uma regra do
jogo, isto , de uma racionalizao do conflito (Id. Ibid. p. 237). Assim, as regras e
normas so apresentadas como se fossem imparciais e dissociadas das concepes dos
seus operadores.
Segundo Kant de Lima (2004), no Brasil a busca por um controle legal e
racional do Estado colide com a no aplicao igualitria da lei para todos e para cada
um. Assim, leis, regras e normas so vistas como algo externo, cuja aplicao depende
da interpretao particularizada e com resultados imprevisveis, porque distribudos de
modo desigual. Ademais, o sistema de controle social se pauta em decidir entre o certo e
o errado e, com isso, tende a culpabilizaes.
Desse modo, a estrutura da nossa sociedade oscila entre a igualdade formal,
horizontal, e a organizao hierarquizada, vertical, que distingue os iguais. Trata-se de
uma sociedade que, para no enfrentar o conflito que lhe inerente, o nega. Assim, o
trao hierrquico se expressa, por exemplo, no ritual Voc sabe com quem est
falando?, que busca colocar cada um no seu lugar social (Da Matta, 1997), e favorece
um sistema que oscila entre respeitar a lei ou a pessoa.
No sistema jurdico brasileiro, em que predomina a lgica do contraditrio, o
que validado no autoridade do argumento e sim o argumento da autoridade. Desse
modo, a busca do convencimento est por trs das provas que so submetidas ao
contraditrio. No se trata de buscar o consenso e sim de estabelecer um debate capaz
de, em dado momento, fazer com que uma das partes abra mo da discusso. Trata-se de
mtodo que, por ser constitudo de argumentao infinita, necessita de autoridade que o

83

interrompa. Este papel atribudo aos juzes e de modo parecido, em alguns aspectos
aqui analisados, pode se mostrar na atuao de promotores de justia, que definem, por
exemplo, quando deve findar a atuao em cada caso.
O sistema de justia brasileiro, alm de contraditrio, inquisitorial. Essa
afirmao parte da exposio de Kant de Lima (2004), segundo a qual, o processo
judicial se inicia pela denncia do promotor, que gera interrogatrio e defesa. Para alm
da estrutura do processo, o aspecto inquisitorial se mostra na disposio do espao do
Tribunal do Jri e de outras instituies que operam a Justia. Nelas, a acomodao
simblica do ambiente fsico e o comportamento que exigido do acusado tambm
exprimem a repartio de papis, de acordo com o ritual judicirio (GARAPON, 1997).
Conforme a argumentao de Figueira (2008), no sistema inquisitorial h
concepo de uma verdade a ser descoberta, porm esta j foi construda a priori.
Assim, no se trata de levantar o que aconteceu e sim o que aconteceu aos olhos do
Direito. A verdade no campo jurdico passa a ter uma operacionalidade, sendo a
realidade e os fatos reconstrudos conforme a interpretao que prpria dessa rea.
Com isso, o sujeito notificado tambm suspeito a priori. Nessa perspectiva, o que est
em julgamento pode no ser a conduta, e sim a pessoa. Provavelmente por isso, em
parte, os notificados ao comparecerem s Promotorias, se ressentem por sentirem-se
acusados.
Pode-se considerar que, nas Promotorias do Idoso, aspectos inquisitoriais se
mostram por meio das oitivas realizadas pelos promotores e de entrevistas feitas pelo
servio social ou outros profissionais, cujos textos compem os procedimentos
administrativos.
Dessa forma, mais do que um fluxo de registros documentais, os procedimentos
administrativos revelam aspectos da vida dos idosos e de sua rede de relaes que so
relatadas nas interaes entre agentes institucionais e outros envolvidos. Nisso, os
paradigmas institucionais, valores culturais, preceitos contidos nos cdigos legais e
formaes profissionais so utilizados para interpretar e categorizar situaes e pessoas,
bem como para pautar acordos, entendimentos e evidncias dos fatos.
As informaes que constituem os PA(s) so conduzidas em segredo, isto ,
tm acesso a elas o comunicante e o idoso. A consulta poder ser autorizada a terceiros
somente mediante pedido formal apresentado ao promotor. Entretanto, a depender das
informaes levantadas, os PA(s) so apresentados Justia e todos os elementos

84

registrados por escrito passam a formar os processos judiciais e ser submetidos ao


contraditrio. Com isso, as situaes documentadas constituem processos e adquirem
'estatuto de verdade para a sentena final (KANT DE LIMA, 2004, p.52).
A construo de procedimentos administrativos, assim como a de processos
judiciais, tambm uma forma e tentativa das instituies se constiturem como
instncias legtimas da produo e aplicao de regras para as situaes que lhe so
apresentadas e aceitas como atribuio institucional.
Neste sentido, por meio da pesquisa documental notei que, no conjunto dos
casos analisados h nas solicitaes dos promotores um direcionamento dos pontos a
serem contemplados, que uniformiza os PA(s). De forma geral, nos pedidos de estudo
social

45

a resposta deve ser dada sobre os seguintes aspectos: se h procurador

habilitado para o recebimento de benefcio previdencirio/assistencial; se h


emprstimos consignados; se o idoso vtima de violncia, de abandono familiar, abuso
financeiro, maus tratos e negligncia; se h necessidade de avaliao psiquitrica;
condies de habitao, higiene, alimentao, sade e salubridade do local.
Em relao aos idosos institucionalizados, as Promotorias solicitam s ILPI(s) a
elaborao de sumrio social

46

em resposta a aspectos como: data e motivo do

abrigamento; residncia anterior; nome completo e endereo dos parentes mais


prximos ou amigos (responsveis pelo idoso); frequncia da visitao e assistncia
familiar; valor do benefcio previdencirio ou assistencial; nome completo e endereo
do responsvel pelo recebimento e administrao dos valores, indicando se o mesmo
possui procurao cartorial; grau de dependncia; informaes sobre a sade fsica e
mental da pessoa idosa. Junto com o sumrio social, geralmente so solicitadas
cpias de documentos pessoais do idoso; atestado mdico que comprove se capaz de
exercer os atos da vida civil e apto para as atividades da vida cotidiana; cpia do
contrato de prestao de servios; informao se a pessoa interditada ou no; e,
quando interditada, indicar quem o curador.
Assim, os pontos a serem contemplados trazem no seu bojo uma ideia de velhice
e tambm de elementos a serem controlados para no violarem direitos dos idosos, por
45

Conforme anteriormente exposto, a elaborao de estudo social atribuio privativa dos assistentes
sociais.
46
Roteiro elaborado pelas Promotorias. Com esta nomenclatura no obriga as ILPIs a responder mediante
a atuao de um assistente social, por no ser considerado um instrumental privativo dessa profisso.
H, no entanto, controvrsias sobre isso, uma vez que as informaes a serem tratadas envolvem
conhecimentos inerentes ao Servio Social.

85

exemplo, a administrao dos seus proventos. Na padronizao das solicitaes, h ao


mesmo tempo, a ideia de tutela individual com as particularidades que apresenta e a
uniformizao dos pedidos dos promotores. Alm disso, cabe mencionar que, embora as
ILPI(s) encaminhem ao MP o denominado sumrio social, h casos em que os
Promotores solicitam as profissionais do CAOIPD a realizao de estudo social.
Dessa forma, alguns elementos j informados naquele instrumento so repetidos no
relatrio social.
A documentao que compem os PA(s) utilizada para pautar as decises dos
promotores. Essas, em alguma medida, so aceitas e legitimadas por parte dos
envolvidos. Isso ocorre porque subjaz a concepo de existir algo superior aos
envolvidos e que capaz de definir a luta entre o bem e o mal, certo e errado,
perdo e punio, compreenso e vingana (SCHRITZMEYER, 2001).
Desse modo, tais aspectos tambm no orientariam a procura pelo atendimento
nas Promotorias do Idoso como uma busca por justia? E nisso no estaria a
concepo de que, em dadas situaes de conflitos familiares, a interveno
institucional mais apropriada? Esses questionamentos que ora apresento, se pautam
em observaes de falas de atendidos nas Promotorias, quando nelas fui estagiria de
Servio Social, entre as quais, as que mencionam as seguintes intenes: eu quero
abrir um processo aqui e que vocs chamem ele/a aqui e/ou que faam uma visita l,
s para dar um susto. Ou ainda, ao final do atendimento quando de posse da cpia
impressa: s de eu levar esse papel e mostrar que eu estive aqui, ele/ela [suposto/a
violador/a dos direitos] vai mudar. Ao trmino de uma visita domiciliar por mim
realizada ocorreu uma situao em que a idosa solicitou que lhe deixasse por escrito o
telefone da instituio, o nmero do PA, a promotoria e meu nome por t-la visitado. De
posse do papel, verbalizou que o utilizaria para chamar a ateno da filha que a agredia
e que tinha expectativa de que ela ficasse intimidada, e assim, cessassem as agresses.
Desse modo, papis podem ter fins distintos e h uma lgica hierarquizada que perpassa
as relaes sociais e que corrobora o entendimento de que as instituies estatais so
para aqueles que no tm outros meios para solucionar os problemas que,
aparentemente, seriam do mbito privado. Ademais, junto com a seletividade e
focalizao das aes, nota-se tambm a concepo e expectativa da atuao das
instituies e de seus agentes como controladores de comportamentos e de situaes.

86

Neste sentido, cabem ainda observaes por mim feitas enquanto estagiria e
profissional em que os envolvidos em situaes diversas, ao serem orientados a
buscarem a Delegacia de Polcia e ou a Defensoria Pblica, geralmente expunham que
no o fariam por que no desejavam judicializar os fatos apresentados. Isso ocorria
principalmente quando envolvia familiares. Explicavam necessitar de um agente externo
famlia que interferisse na situao, mediasse algum conflito, contudo, sem ocasionar
consequncias negativas para os seus e, ainda, sem que os familiares soubessem quem
havia exposto a situao instituio.
Conforme Debert e Oliveira (2012), estudos realizados em Delegacias de Polcia
demonstram que, ao fazer uma comunicao/denncia, as vtimas no queriam a
punio de seus agressores por se tratarem de seus prprios parentes, e, por isso, no
davam prosseguimento aos procedimentos policiais e raramente queriam processar
penalmente seus agressores Assim, as vtimas esperavam que a polcia atuasse como um
freio conduta violenta, conciliando as partes, dando um susto, ou at
aconselhando o agressor para que se restabelecesse o vnculo familiar.
Situaes semelhantes me foram tambm expostas em visitas sociais realizadas.
Isso se mostrou, especialmente, em casos em que os prprios idosos apresentaram a
comunicao ao MP. Geralmente, junto com o relato das circunstncias das suas
situaes, verbalizaram problemticas que envolvem a vida dos seus. Exemplificam
isso, situaes como as seguintes: ocasies de conflitos entre idosos e descendentes na
diviso do espao domstico, quando h retornos desses casa, e, ao mesmo tempo o
desemprego ou insuficincia de renda para manuteno de mais de uma residncia; o
idoso se sente desrespeitado por no ter mais autoridade moral sobre os seus; violncias
fsicas perpetradas por familiares que fazem uso abusivo de lcool e outras drogas ou
ainda que tenham problemas de sade mental e, por outro lado, a no aceitao de
tratamento por parte desses e a ausncia de condies para viverem, se for determinado
o seu afastamento do lar.
Nessas circunstncias, geralmente os idosos demandam uma interveno porque,
embora parte deles seja independente para reivindicar seus direitos, no tem
condies de alterar a situao vivida. Assim, esperam que um profissional possa
estabelecer um acordo, orientar e, principalmente, convencer os envolvidos a mudarem
sua postura.

87

Ademais, quando se trata de circunstncias que envolvem dissenses entre os


filhos e que a comunicao foi feita por algum familiar ou vizinho, a maior parte dos
idosos afirma a veracidade da situao vivenciada e em que medida ela os afeta.
Entretanto, explanam ao assistente social que a interveno do MP pode potencializar os
conflitos, uma vez que os envolvidos entendem que situaes familiares deveriam ser
resolvidas neste mbito e no serem tornadas pblicas. Nessas situaes verbalizam que
o familiar denunciado pensar que o idoso reclamou com outros do que vivencia, e
afirmam temer, por exemplo, o seguinte: ele vai sentir raiva eterna de mim, se ele
for chamado [pelo MP] vai deixar de vir aqui [na casa do idoso], eu s tenho um neto
e no quero que por causa disso ele fique longe, eu no quero que ele/a seja tirado
de casa, por que vai viver aonde?, eu s tenho a ele/a, e se souber que foi
denunciado no vai mais me ajudar.
Diante disso, os idosos apontam a necessidade de uma interveno institucional,
porm desejariam que ela fosse feita de forma que os envolvidos no soubessem do que
o prprio idoso exps. Consideram que deva ser de forma a orientar o familiar e
pronunciam eu com essa idade no quero problemas, no quero brigas entre os
meus filhos, no quero que digam que estou reclamando.
H ainda comunicaes que so feitas pelo filho/a que se sente sobrecarregado
na assistncia ao idoso, o que se mostra, sobretudo, nos que o fazem ininterruptamente e
nos casos de idosos com Mal de Alzheimer ou com outras doenas mentais. Nessas
situaes, mencionam j terem comunicado a sua sobrecarga aos irmos e terem
solicitado ajuda e que esses, geralmente, usam o argumento de terem suas prprias
demandas. Aqueles que cuidam, pronunciam no terem um tempo para si e o desejo da
diviso do cuidado, mais do que o apoio econmico, embora no abdiquem dele. Desse
modo, ao tornar pblica a sua situao, os comunicantes temem que os familiares
interpretem que esto reclamando contra eles, se sintam acusados e as relaes
familiares fiquem conturbadas, gerando um afastamento ainda maior.
Conforme Engel (2012), os cuidados a idosos geralmente so atribudos
mulher cnjuge ou filha, que experimenta srias mudanas em sua vida pessoal com
perda de liberdade pessoal, a sada de sua atividade no mercado de trabalho. Isso
acarreta possveis conflitos familiares, com divergncias sobre o que de
responsabilidade de cada um e afastamentos entre os membros. A falta de apoio externo
faz com que o cuidado de idosos seja uma atividade bastante solitria, tanto na

88

configurao da famlia, como nas possveis relaes com o Estado e comunidade.


Assim, o cuidado domstico centrado em um sujeito (mulher) com pouco apoio
transforma uma situao de vulnerabilidade em duas: a do parente que necessita de
apoio e a do familiar que se dispe a cuidar.
Considera-se que os idosos com nmero maior de filhos teriam substancialmente
possibilidade de receber apoio em momento de necessidade, porm isso no nenhuma
garantia, tendo em vista que h uma tendncia de um esperar que o outro assuma a
responsabilidade, principalmente quando h conflitos entre eles. Geralmente, as
condies materiais e o curso de vida dos idosos e de sua relao com a famlia que
vo determinar a natureza da transferncia de apoio (LEMOS, OLIVEIRA e
ALMEIDA, 2012).
Alm do exposto, documentar a busca por um servio significa para o atendido
uma forma de se precaver de cobranas posteriores. Com isso, no perodo de estgio
junto as Promotorias, foram observadas e vivenciadas exigncias por um papel que
registrasse a busca pelo servio. Todavia, quando a demanda considerada no
atribuio das Promotorias no gera nenhum registro para os atendidos. Nesses casos
nenhum papel/documento lhes fornecido e a ficha preliminar de atendimento era
arquivada no setor. Dessa forma, pode-se pensar que de modo similar ao que ocorre em
outras instncias pblicas, a produo de parte significativa dos papeis/documentos tem
como funo primeira a de respaldar as instituies e seus agentes (PEIRANO, 2006).
Em vista disso, rememoro ainda a minha prtica em Servio Social em outras
instituies. Nelas observei recomendaes como as seguintes: anota tudo, deixa
escrito, por que se te cobrarem depois, voc tem como responder, se vocs no
deixam escrito como eu [gestor] vou preservar a instituio, na hora em que o juiz
cobrar alguma coisa?.
Assim, pode-se indagar se a ideia do respaldo documental no estaria a informar
as relaes entre indivduos e entre esses e instituies. Os agentes pblicos tambm
temem ser acusados por situaes no resolvidas no espao institucional. Por isso, em
parte, registram suas aes e as respostas obtidas ou no.
Outra indagao se refere s razes de portar um papel/documento que formalize
o encaminhamento de uma instituio para outra. Se h a demanda, o direito legalmente
constitudo e a instituio para execut-lo, por que prescindir de um documento de outra
instituio para acess-lo? Nas Promotorias foram observados encaminhamentos feitos

89

pela Defensoria Pblica e Delegacias de Polcia, nos quais geralmente consta o seguinte
texto: Sirvo-me do presente para encaminhar o Sr/Sra [nome completo] para
atendimento devido aparente situao de risco. Estaria como pano de fundo, alm da
preocupao com o respaldo institucional, a viso de que os indivduos encaminhados
podero no ser atendidos noutra instituio? Por outro lado, os usurios dos servios
pblicos tambm sabem que sem um papel para levar e mostrar podero no ter
xito no atendimento. Em parte dos casos, quando de posse de um papel timbrado ou
carimbado, ele parece se tornar um fetiche e adquirir vida prpria, tamanho poder
aparente contm.
Isso leva a considerar ainda quando em dado perodo fora demandado ao Servio
Social nas Promotorias o atendimento de notificaes de responsveis institucionais e
familiares para a entrega de cpias de documentaes. Posteriormente, aps constantes
exposies aos promotores de que essa atividade no exigia conhecimento profissional,
bem como no era atribuio do Servio Social, a mesma passou a ser realizada por um
tcnico administrativo. Nessa poca de transio, eu era estagiria em Servio Social e
vrios atendidos, principalmente familiares, solicitaram atendimento social reclamando
que o tcnico administrativo apenas lhes fornecia um papel constando que documentos
haviam sido entregues. Argumentavam que o fato de nesse papel no identificar quem
entregara os documentos e de no elenc-los no os precavia de novas notificaes com
os mesmos pedidos. Diante disso, afirmavam necessitar de um papel completo como
o que o Servio Social fornecia quando os atendia. Com o passar do tempo, os atendidos
pelo tcnico administrativo passaram a acatar o documento que lhes era fornecido sem
maiores reclamaes.
Em geral, nos documentos que acompanham os encaminhamentos institucionais
s Promotorias, h tambm uma espcie de argumentao que se expressa em evocaes
legais sobre a realidade do usurio a que se referem. Chama ateno que em textos
enviados por instituies de sade com comunicao sobre situaes de violncia contra
idosos, h certa padronizao da escrita que se refere ao idoso como sujeito de
direitos, com citaes de artigos do EI e por fim, que solicita-se atendimento para o
caso. Desse modo, tem-se a impresso que por um lado essa formatao busca se
adequar a escrita jurdica e por outro, argumentar por meio de elementos da prpria
legislao que a demanda do idoso deve ser contemplada.

90

Alm disso, das solicitaes protocoladas decorrem respostas formais e nesse


processo os retornos geralmente so demorados. A emisso de um novo
papel/documento est ligada realizao de outras aes e vice-versa. Isso faz lembrar
uma circunstncia da minha prtica profissional, em outra instituio, em que
acompanhei um adolescente cumprindo medida socioeducativa de internao a uma
audincia. Aps o juiz determinar a progresso da referida medida para a semiliberdade,
o adolescente voltou-se para ele e assim expressou: v se tem como liberar esse papel
hoje, pra no atrasar a minha vida. Sim, da liberao do papel iria decorrer a
liberao do prprio adolescente. senso comum que as instituies pblicas se
caracterizam pelo fazer burocrtico que retarda e impede aes. Esse conhecimento
popular tambm favorece o descumprimento de parte das normativas legais, como por
exemplo, evadir do pas antes de ser julgado ou preso, j que o andamento de papis de
um setor a outro demorado.
Nos procedimentos administrativos das Promotorias, observa-se que as
notificaes para familiares de idosos e parte das instituies tm tempo exguo para
aguardar a resposta, isto , prazo de dez dias. Por outro lado, as solicitaes aos rgos
de apoio da prpria instituio apesar de em alguns casos grifarem o carter de
urgncia, geralmente no demarcam tempo, em parte por que reconhecem a
incompatibilidade entre o nmero de profissionais e a quantidade de trabalho que lhes
atribudo. Alm disso, essa desigualdade tem relao com a forma hierrquica que
comanda as relaes e deixa transparecer que as responsabilidades entre Estado e
sociedade no so divididas de forma equnime.
Com isso, pode-se retomar o questionamento que subjaz no andamento dos
PA(s): a quem servem esses papis? Sim, dentre os casos analisados um deles
demandava autorizao por parte da sobrinha de uma idosa de 90 anos para transferi-la
outra ILPI, pois segundo ela, teria sido abrigada de forma forada pela filha de
criao. Os documentos solicitados ILPI, por exemplo, levaram seis meses para
serem juntados ao PA. Quase um ano aps a solicitao feita pela sobrinha, a idosa
faleceu. Durante aquele tempo e neste caso em especfico, as aes da Promotoria foram
basicamente de circulao de documentos.
Outra dimenso importante a ser considerada, refere-se ao contedo dos
registros documentais. Estes expressam fragmentos da realidade e pressupem escolhas
por parte de quem solicita, do atendido e do profissional, quer seja do que verbalizar,

91

quer seja do que escrever. Ademais, o discurso apresentado qualificado pela


autoridade interpretativa.
O registro escrito tem o poder de construir e reconstruir imagens e de
transformar informaes aparentemente desconectadas em uma histria bem contada.
Dependendo da forma como as problemticas so contextualizadas e textualizadas as
situaes so consideradas socialmente legtimas ou ilegtimas de interveno. Com
isso, so utilizadas categorias como a de idoso em situao de risco que assim como
as demais formas de classificao, tm como pano de fundo uma imagem idealizada de
sociedade. Dessa imagem, decorre a concepo de que as mazelas precisam ser
controladas, compreendidas, aceitas ou punidas com base em valores pretensamente
universais. A montagem social das narrativas dos operadores tcnicos contribui para a
sacralizao do monoplio estatal enquanto legtimo regulador de comportamentos
(SCHRITZMEYER, 2001, p. 117).
Neste sentido, ao discorrer sobre os desafios do assistente social na rea
sociojurdica, Iamamoto (2004), afirma que o Poder Judicirio carrega fortes marcas do
saber burocrtico. O esprito da burocracia o segredo de sua competncia, guardada
pela hierarquia, pelo carter fechado da corporao burocrtica. Inserida entre o
Estado e a opinio pblica, a burocracia prope-se a impedir a profanao do Estado,
tido como esprito supremo, coroa da cabea burocrtica (p.281).
Alm disso, no tratamento burocrtico que envolve atos, poderes e vontades, os
seres sociais no so tratados como so na realidade e sim de acordo com sua imagem
no mundo da burocracia (IAMAMOTO, 2004).
A forma de redigir os fatos revela uma relao entre quem atende e quem
atendido. Em geral, este responder aquilo que lhe for perguntado. As pessoas so
reconhecidas pelos lugares sociais que ocupam e nesta complexidade social no so
apenas as palavras que definem os discursos, mas tambm os significados que
imprimem para aqueles a quem so dirigidos. A seletividade sobre o que revelar e
ocultar aprendida e tem relao com o que aproxima ou distancia da responsabilizao
(MOREIRA, 2011).
Nas Promotorias do Idoso, a transformao do atendimento e da visita social em
registro documental processo no qual no se se trata de transcrio literal da oralidade
do atendido e sim de uma elaborao interpretativa por parte do profissional de Servio
Social. Essa elaborao apresenta a seleo de aspectos da realidade e no caso dos

92

atendimentos pode ser acordada entre profissional e atendido, uma vez que este toma
cincia do contedo documentado e o assina se com ele concordar.
A depender do tom que dado aos registros das narrativas e das informaes
que so agregadas aos procedimentos administrativos, a busca inicial por medida
protetiva, no caso o abrigamento de idosos, pode conduzir por outro lado a medidas que
responsabilizem principalmente os familiares acusados de negligncia e maus tratos.
Essa dinmica tem relao com a lgica que estrutura as legislaes e polticas sociais, a
qual incumbe prioritariamente famlia a assistncia aos seus dependentes.
Segundo Debert e Oliveira (2012), os novos objetos sobre os quais se debrua o
Poder Judicirio compem uma imagem das sociedades ocidentais contemporneas
como cada vez mais enredadas com a semntica jurdica, com seus procedimentos e
com suas instituies. H uma invaso do direito que no se limita esfera
propriamente poltica, mas tem alcanado a regulao da sociabilidade e das prticas
sociais em esferas tidas, tradicionalmente, como de natureza estritamente privada. A
famlia passa a ser percebida como uma instncia em que os deveres de cada um de seus
membros so claramente definidos, e as polticas pblicas devem criar mecanismos
capazes de reforar e estimular cada um deles no desempenho de seus respectivos
papis.

3.2 Etnografia dos documentos


Os papis e seus decorrentes percursos adquirem novo sentido ao serem
transformados em documentos institucionais. Por meio da etnografia desses documentos
que se buscar apreender o significado dos seus trajetos. Assim, sero descritas com
detalhes as movimentaes dos papeis nos espaos internos s Promotorias, por ser o
local em que foi possvel observar e conhecer, uma vez que ao transitarem noutras
instituies e rgos no h como olhar os seus percursos naqueles ambientes.
Nesta empreitada partirei do documento denominado representao, que
consiste em comunicao sobre idoso em possvel situao de risco. A
representao uma das formas de dar cincia ao MP de situao de violao de
direitos e de solicitar interveno institucional. Com a representao se iniciam as

93

aes das Promotorias ou a sua recusa. Aps a constituio desse documento,


funcionrios das secretarias pesquisam se h registros de procedimentos administrativos
relativos ao mesmo idoso, que esto em andamento ou que foram concludos e
arquivados. Nessas situaes a representao neles apensada.
O texto das representaes no perodo em que fui estagiria e no que abrange
o tempo da pesquisa era elaborado no atendimento social

47

e segue uma numerao

ascendente iniciada anualmente pelo nmero um. Aps a numerao, se inicia um


registro padronizado que segue os seguintes pontos: a) data, qualificao do
comunicante e seu endereo, grau de relao com o idoso, nome completo, idade e
endereo do idoso; b) relato da situao apresentada; c) informao de providncias
realizadas durante o atendimento, caso haja; d) documentos/provas apresentadas com
uma ressalva quando as cpias so anexadas na representao; e) o que o
comunicante requer da Promotoria; f) a seguinte formalidade direcionada aos
Promotores: colocamos o presente para apreciao de V.Exa; g) assinatura do
atendido, ao lado do item Ciente e de acordo; h) assinatura do profissional com
informao da funo e do nmero de registro profissional.
Ao final do atendimento social, o texto impresso em trs vias, que so
distribudas entre o atendido, o arquivo do Servio Social e como formalizao da
comunicao junto ao MP. As duas primeiras cpias tm como objetivo resguardar o
comunicante e o profissional, no sentido de assegurar a ambos que a demanda
apresentada foi registrada na instituio. Em possveis casos de no localizao do
documento pertencente ao MP, uma das vias anteriores fotocopiada e anexada junto a
novo atendimento do Servio Social. Em geral a ocorrncia disso se d quando o
comunicante retorna Promotoria para buscar informaes sobre o andamento da
representao anteriormente feita e no so localizados registros relativos. Ento, se
reinicia o percurso documental.
A via do documento representao que dar prosseguimento anlise do MP
depositada pelo Servio Social num armrio comum s Promotorias. Neste, h uma
prateleira reservada aos documentos que so diariamente encaminhados por agentes
administrativos ao Protocolo Geral da instituio.

47

Novamente cabe reiterar que as representaes pesquisadas foram elaboradas desse modo e que
posteriormente o Servio Social deixou de realizar essa atividade. Portanto, no se trata de uma tarefa
hodierna, embora o texto dissertativo trabalhe-a como se no tempo presente.

94

No Protocolo, a representao adquire outra numerao que antecedida pela


sigla MPRJ, cujo nmero inicia pelo ano e sua composio posterior segue a
sequncia numrica geral dos procedimentos da instituio.

por intermdio do

registro que a representao adquire status de procedimento administrativo. Alm


disso, cadastrada num sistema informatizado chamado Sistema Corporativo
Mdulo de Gesto de Processos, por meio do qual possvel aos funcionrios do MP
atualizar dados e realizar consultas de andamentos, evitando tambm a duplicidade de
procedimentos.
Aps o cadastro da representao no Protocolo, feita uma abertura de
vista a um Promotor responsvel pela primeira anlise, que julgar se pertinente a
continuidade. Em caso positivo, assinar e solicitar que seja encaminhada ao rgo
responsvel, e em caso negativo pedir que seja remetida a um Conselho superior,
composto por promotores. Este far uma segunda avaliao e definir se o pedido ser
ou no arquivado. O arquivamento ocorre quando a demanda avaliada como no
atribuio da instituio e tende a ser mais frequente com as comunicaes feitas
atravs de e-mail ou telefone Ouvidoria. As representaes decorrentes dos
atendimentos do Servio Social dificilmente so recusadas pelos Promotores,
provavelmente por que resultam de uma seleo prvia feita pelos profissionais e que
tende a estar de acordo com o que fora definido como atribuio do MP. Nos casos
contrrios, durante o atendimento social os comunicantes so orientados a buscar outros
rgos competentes, o que registrado na ficha preliminar de atendimento,
arquivada no prprio setor.
As situaes constantes nas representaes, que so entendidas como
atribuio do rgo, so protocoladas e devolvidas s Promotorias, com o registro geral
que as tornou procedimento administrativo. Nesse espao feito o direcionamento
respectiva Promotoria, que definida pelo endereo do idoso, visto que as Promotorias
dividem entre si os procedimentos por reas de abrangncia geogrfica.
Na secretaria da Promotoria a qual pertence, o procedimento adquire um novo
nmero, interno a essa, que segue uma sequncia anual, e designado pela sigla PA
(procedimento administrativo), seguida de nmero e ano. A numerao atribuda pelo
protocolo geral tambm mantida, porm por sua composio numrica ser maior que o
PA, no cotidiano das secretarias este mais utilizado.

95

Aps o cadastro na secretaria o PA encaminhado ao Promotor que iniciar as


primeiras solicitaes. Em geral, trata-se de requerimento de diligncias ao GAP para
averiguar a veracidade da denncia e de visita domiciliar e elaborao de estudo
social, com o objetivo de verificar in loco a situao do idoso. Este pedido
encaminhado por ofcio ao Centro de Apoio Operacional, no qual esto vinculadas as
assistentes sociais. Em alguns casos, h tambm solicitaes iniciais de documentos a
familiares ou outras instituies, dentre as quais, ao INSS.
Desse modo, trata-se de dar prosseguimento anlise da situao, por meio da
construo e apresentao de provas documentais, pressupondo com elas pautar as
decises dos Promotores.
A representao e parte dos documentos expem conjunturas comunicadas
verbalmente e que registradas adquirem carter de provas testemunhais. Geralmente so
os comunicantes que provocaram a representao que no decorrer dos PA(s) retornam
s Promotorias espontaneamente para complementar as informaes. Nessa dinmica h
tambm apresentao de documentos/provas para serem anexados. O comparecimento
dos atendidos pode ser feito tambm por notificao das secretarias, a pedido dos
promotores. Em parte dos casos, o prprio idoso tambm comparece.
Do mesmo modo que ao registro das representaes, os atendimentos sociais
so produzidos e distribudos em trs vias. A pertencente ao MP colocada em armrio
da respectiva secretaria, onde consta prateleira com a inscrio entrada.
Posteriormente o documento anexado ao procedimento pelos agentes administrativos
que tambm abrem vista ao promotor, pois h novos elementos a serem
considerados. Disso pode decorrer um novo encaminhamento pelo promotor e/ou a
reafirmao de que o procedimento est aguardando resposta de pedido anterior
encaminhado por notificao s famlias e ou por ofcio a outros rgos do MP (em
geral 3CAOP ou GAP) ou a outras instituies.
O tempo para aguardar a resposta das solicitaes e a forma de cobr-las difere
conforme a quem elas so solicitadas. Quando o prazo estipulado descumprido, so
feitas cobranas, via novos ofcios reiterando o pedido, por correspondncia com aviso
de recebimento ou entregues por tcnico de notificao e atos intimatrios. Em um dos
casos estudados, a resposta solicitada a uma secretaria municipal demorou cinco meses
para ser enviada. Em outro, passaram-se mais de sete meses at que a estratgia de
cobrana passou a ser a entrega de ofcio por tcnico de notificaes de atos

96

intimatrios, na qual consta o seguinte teor: Assevero que o descumprimento


injustificado do acima solicitado configura crime previsto no art. 100, inciso V, da Lei
n. 10.741/03, podendo implicar em conduo coercitiva. Assim mesmo continuou
sem resposta.
Para os rgos de apoio da prpria instituio o tempo de resposta geralmente
definido por critrios internos que buscam compatibilizar a quantidade de demandas
com o nmero de profissionais 48. As cobranas so feitas por intermdio das
coordenaes desses rgos.
Diante desses trmites, retorna o questionamento sobre a quem o documento
interessa, pois a certa altura o idoso pode at vir a falecer e os papis continuarem
circulando.
O fluxo dos PA(s) est ligado s entradas de novos papeis/documentos. Parte
deles adquire maior movimentao devido intensidade das respostas apresentadas,
uma vez que cada nova informao gera uma abertura de vista ao promotor.
Observou-se ainda, durante o estgio em Servio Social, que o comparecimento
espontneo dos comunicantes, quer seja para consultar o andamento ou para incluir
informaes contribua para uma movimentao dos procedimentos nas prateleiras e
armrios. Disso poderia decorrer uma sada dos papis para a mesa dos promotores ou
uma mudana na sua posio no interior dos armrios, caixas e prateleiras, isto , se os
procedimentos estavam colocados em baixo, aps uma observao do andamento dos
mesmos para dar uma resposta ao solicitante, poderiam ser colocados por cima e quando
de uma vistoria pelos funcionrios das secretarias tenderia por ateno primeira. Dessa
forma, por exemplo, em meio a tantos PA(s) se tornava favorvel nova cobrana de
resposta desses, caso o prazo para aguard-la houvesse se esgotado. Com isso, pode-se
indagar se uma maior ateno a determinados PA(s) estaria ligada intensidade das
informaes e movimentaes ou ao fato da situao do idoso/a ser mais urgente e
problemtica.
Em decorrncia do que apresentado na movimentao dos procedimentos que
se esperam decises e encaminhamentos dos promotores que conduzam a soluo do
caso. Quando o trabalho das Promotorias considerado concludo, h dois destinos para
os PA(s): a) o arquivo do rgo; b) as Varas de Justia, conforme a competncia para
48

No CAOIPD, por exemplo, atualmente o prazo de envio dos relatrios sociais de at dois meses a
contar da data da solicitao.

97

cada rea criminal, pois o PA se tornou processo judicial. O arquivamento de um


procedimento administrativo ou a sua configurao como processo judicial significa a
concluso da interveno das Promotorias, porm isso no quer dizer a soluo dos
problemas reais do idoso e demais envolvidos.
Com base nos dezoito casos estudados, observou-se que a menor durao do
andamento nas Promotorias se refere a trs PA(s) que foram encaminhados para Varas
de Justia no decorrer de pouco mais de um ms do seu incio.
As narrativas dos operadores tcnicos assumem uma montagem social
padronizada e redigida de acordo com a linguagem do judicirio. E assim, os registros
documentais tambm contribuem na construo de um tipo social, isto , do idoso
em situao de risco, cuja definio permite a continuidade da atuao institucional ou
a interrompe.

3.3 Etnografias de trs casos estudados


Os procedimentos administrativos no se reduzem a conjuntos de papis com
carter documental. Eles retratam e representam parte da vida das pessoas, por meio de
situaes individuais e coletivas. Neles tambm so expressos trajetos anteriormente
feitos por indivduos e ou por papis/documentos.
Estudo elaborado por Eilbaum (2006) apresenta a relao entre a produo de
documentao institucional escrita e as idas e vindas dos papis e dos personagens,
como que em interao. Entretanto, um corpo documental pode se configurar
independente da presena das pessoas concretas. Com base na referida autora, possvel
pensar que os PA(s) conformam um corpo escrito que constitudo ao longo da juntada
de papis/documentos. H momentos em que a oralidade dos envolvidos, que
comparecem s Promotorias ou so ouvidos em seus locais de moradia, agregada aos
PA(s) e assim se insere o corpo das pessoas. O corpo do PA como que a
personificao do prprio idoso em tela, e esse corpo de papis pode transitar de uma
Promotoria outra, acompanhando a mudana de endereo do idoso e ainda, de uma
instituio outra, quando a situao passa de procedimento administrativo a processo
judicial, por exemplo. Ao mesmo tempo, a construo dos PA(s) segue um

98

procedimento pr-definido e produz um conhecimento formalizado, que se mostra


despersonalizado. Essa padronizao acostuma o sistema e seus operadores a receber
um tipo determinado de histria (EILBAUM, 2006, p.291-292).
Desse modo, visando o aprofundamento do debate aqui iniciado apresento trs
percursos de vidas e de documentos. Dentre os oito PA(s) estudados, os trs foram
escolhidos pela diversidade que representam nos seus desfechos e ao mesmo tempo pela
similitude no que tange s responsabilidades atribudas a famlia e ao Estado.
As etnografias envolvem as situaes de duas idosas e de um idoso. Seus nomes
foram trocados por outros fictcios, visando resguardar sua identificao.

Idoso Roberto
A trajetria de Roberto passou a ser conhecida no Ministrio Pblico em meados
de 2010, quando ele tinha 76 anos e procurou atendimento mediante encaminhamento
formal da Defensoria Pblica do Estado do Rio de Janeiro.
No documento proveniente dessa instituio constava o seguinte relato: quer
que o imvel onde residia e que hoje est alugado seja desocupado, para que volte a
residir no imvel de sua propriedade e no mais com seu filho em uma casa alugada.
Quer ainda a devoluo de seus documentos de identificao.
Alm dessa informao na representao elaborada no atendimento social das
Promotorias do Idoso foram registrados pontos da trajetria de vida de Roberto. Ele
vivo, tem quatro filhos e residia sozinho em imvel prprio. Aps internao em
clnica psiquitrica sua casa foi alugada por um dos filhos e com a alta mdica passou a
morar com este, a nora e trs netos. Seus documentos pessoais foram retidos pelo filho.
Neste sentido, se por um lado a co-residncia pode beneficiar tanto as geraes
mais novas quanto as mais velhas, no que se refere s trocas de afeto, de servios e de
dinheiro (LINS de BARROS, 1987; ALVES, 2007; PEIXOTO, 2009), por outro lado,
[...] no se sabe, por exemplo, se do ponto de vista dos idosos os arranjos
familiares predominantes esto refletindo as suas preferncias ou se so
resultado de uma solidariedade imposta. [...] essa pode ser resultado de
presses econmicas, sociais e/ou de sade, seja de sua parte, seja da parte de
seus filhos. O mesmo se passa com os demais membros da famlia. Esse um
ponto importante a ser considerado porque pode ser um elemento
desencadeador de insatisfao e violncias domsticas. (CAMARANO, et
alli, 2004, p.145).

99

Diversos estudos revelam que nas denncias de violncia familiar contra


idosos o agressor sempre prximo, em geral filho(a) ou enteado(a)49. Isso no
significa que nas instituies de abrigamento haja integral proteo aos idosos e que
estejam imunes s violncias, mas sim que o carter valorativo de proteo atribudo
famlia tambm questionvel.
Retomando o caso de Roberto, o texto da representao informa que ele
aposentado com um salrio e meio. Apresenta dores reumticas e faz tratamento em
hospital pblico. Na sua ida a Promotoria aparentava situao precria de higiene.
Relatou ter se alimentado somente pela manh, no ter recursos para voltar para casa e
ressaltava o desejo de no retornar para a moradia.
Foram feitas tentativas de contato com familiar, que no foram exitosas. E
assim, diante da situao de vulnerabilidade social apresentada pelo idoso, foi
solicitada aplicao de medida protetiva. Com isso, aps o atendimento, o idoso foi
encaminhado para a Central de Recepo de Idosos, isto , um dos equipamentos da
assistncia social da Prefeitura.
Alguns dias se passaram e a pedido do promotor, a referida instituio enviou
Promotoria relatrio social informando que o filho foi para buscar o pai, mas este no
quis retornar para casa devido a conflitos entre ambos. Em atendimento o filho relatou
que o pai tem transtorno mental, que se recusa a fazer uso de medicao prescrita e que
administra os bens dele para proteg-lo. Segundo o filho, o benefcio previdencirio do
idoso fora bloqueado h oito meses, por no t-lo retirado durante trs meses
consecutivos. Disse ainda, ter dado entrada em processo de interdio judicial.
O idoso manifestou o desejo de residir com outro filho, todavia este se declarou
impossibilitado em receber o pai, pois ele e a esposa trabalham e no tem como assistilo. Outra filha do idoso tambm tem dificuldades relativas ao trabalho e se submeter a
uma interveno cirrgica.
Neste sentido, as situaes vivenciadas pelos demais membros da famlia
tambm so expostas para serem ponderadas. A assistncia ao idoso implica em
considerar no apenas laos sanguneos e afetivos, mas tambm a conciliao entre o
tempo para assisti-lo e a insero no trabalho, a estrutura habitacional, as possveis
situaes de dependncia e de doena de outros membros da famlia, os conflitos e

49

Conforme apontado por Minayo (2004), Debert (2009), Peixoto (2009), entre outros.

100

violncias, idosos responsveis por outros idosos, limites materiais de subsistncia,


entre outras situaes. Ademais,
[...] num contexto de enxugamento do Estado, uma das preocupaes que
surge com o menor nmero de membros na famlia, devido queda da
fecundidade, e a entrada da mulher no mercado de trabalho. Isso pode
implicar alteraes na funo tradicional da famlia de suporte e apoio aos
idosos, seja pelo menor nmero de membros na famlia para cuidar das
pessoas idosas, seja pelo menor tempo da mulher, tradicional cuidadora dos
dependentes. [...] Na medida em que uma pessoa se aposente em boas
condies de sade, essa preocupao pode ser minimizada. Por outro lado,
as tendncias crescentes de divrcio e separaes em quase todo o mundo
podem enfraquecer os laos familiares e reduzir o apoio aos idosos
dependentes. (CAMARANO, et ali, 2004, p.164-165).

Retomando a histria de Roberto, seus filhos sugeriram a institucionalizao


dele em ILPI privada a ser custeada com o seu provento, pois o nico filho que poderia
assisti-lo no foi aceito pelo pai.
Ao relatrio da Central de Recepo de Idosos foram anexadas cpias do pedido
de interdio do idoso, feita por meio da Defensoria Pblica; e de relatrio de
internao em hospital psiquitrico, ambos datados em 2010.
Um ms depois da representao, o idoso foi encaminhado outra Unidade de
acolhimento institucional da Secretaria Municipal de Assistncia, para aguardar
providncias de seus familiares.
Trs meses depois essa instituio informou promotoria que o idoso
continuava nela. Com este aviso, devido ao endereo do idoso o caso passou a ser
atribuio de outra promotoria e a ela foi encaminhado.
Na nova Promotoria, o membro do MP solicitou que a Unidade de Acolhimento
enviasse cpia do RG do idoso e sumrio social. Entretanto, a instituio informou que
o idoso foi encaminhado para uma ILPI filantrpica na regio da residncia dos
familiares.
Com isso, o PA retornou promotoria anterior, considerando novamente a
mudana de endereo do idoso. O promotor solicitou secretaria a verificao se o
idoso estava na referida ILPI. Recebida a confirmao documentada, foi solicitado
instituio o estudo social. Aps um ms, o promotor pediu informaes ao INSS sobre
o benefcio do idoso.
Transcorridos pouco mais de 20 dias, a ILPI enviou as seguintes informaes
sobre o idoso: nomes e endereos dos filhos; que recebe visitas eventuais do filho e da
nora com quem residia; seu benefcio previdencirio continua bloqueado pelo INSS.

101

Foram anexadas: cpia do contrato de prestao de servios onde consta como


contratante do abrigamento o prprio idoso; cpia de laudo mdico com a informao
idoso lcido e orientado. Mas, por que ento, ele seria interditado?
Decorridos quase trs meses foi juntada a resposta do INSS ao PA. Ela informa
ser o idoso aposentado por invalidez, ter emprstimos consignados e no dispor de
procurador habilitado para receber seus proventos.
Aps abertura de vista ao promotor, este solicitou que o Juizado informasse
sobre os procedimentos adotados em relao ao interditado. Nesse nterim foi feito
contato com a famlia. Com isso, a nora esclareceu ser a curadora definitiva do idoso e
se comprometeu a entregar a cpia da documentao em cinco dias.
Ao comparecer as Promotorias e entregar a referida documentao, a nora
informou que o idoso estava em outra ILPI, sendo essa privada e qualificou-a.
A instituio onde o idoso estava anteriormente enviou Promotoria cpia do
termo de desligamento (reinsero familiar), no qual consta o seguinte texto:
[...] declaro que estou retirando meu genitor nesta data (01/02/12) para
reinsero familiar. Declaro que estou fazendo esta retirada pelo motivo
acima descrito [reinsero familiar] e que no tenho nada a reclamar com
relao a estadia durante o perodo em que aqui ele residiu, bem como,
quanto aos funcionrios e tudo o mais que se refere sua convivncia. Estou
ciente que este ato de desligamento ser comunicado a Vara do Idoso e ao
MPRJ e que no ser permitido o seu retorno. Para tanto dato e assino o
presente termo de desligamento juntamente com as testemunhas para que
surtam os devidos e legais efeitos.

No ms seguinte, a secretaria justifica ao promotor que o procedimento ficou


tempo demasiado sem andamento, devido ao acmulo de servio e abriu nova vista ao
promotor.
Considerando as ltimas informaes documentadas, o promotor solicita que a
Vara de Famlia seja comunicada sobre a reinsero familiar do idoso e solicitada cpia
da ao de interdio do idoso. Ao cumprir esses itens o PA foi remetido ao promotor
para proceder ao pedido de arquivamento. Conforme a delimitao da atribuio
institucional e a respectiva interpretao da situao de risco, no caso de Roberto elas
deixaram de existir porque ele passou a estar sob a responsabilidade da famlia que
dever atender suas necessidades e administrar sua vida e seus bens por meio da sua
interdio civil.

102

Cabe aqui uma observao: a nora informou que o idoso fora encaminhado para
outra ILPI, mas prevaleceu a informao enviada documentalmente pela instituio da
qual ele saiu. Assim, concluiu-se que o idoso retornou ao convvio familiar.
Com isso, findou por ora o registro da histria de Roberto na Promotoria do
Idoso, na qual esteve no decorrer de vinte e um meses.

Idosa Laura
A escrita da histria de Laura nas Promotorias do Idoso teve incio em dezembro
de 2010, quando ela tinha 83 anos. A comunicao foi feita por uma vizinha.
No texto da representao foi registrado que a idosa mora em imvel alugado,
de dois cmodos, em pssimas condies de habitabilidade. [...] A rea foi interditada
pela Prefeitura, com indicao de demolio, e h ordem de despejo. Na residncia,
Laura acolhe um amigo.
Sobre a sua histria de vida, a vizinha contou que Laura viva, teve uma filha
que veio a bito, e tem dois netos (19 e 16 anos). Recebe visitas mensais do neto mais
novo. No possui qualquer provento, vive de benesses, e no consegue dar entrada no
BPC porque todos os seus documentos foram perdidos durante uma enchente.
A vizinha informou que a documentao da idosa foi solicitada junto a
Defensoria Pblica e que no foram obtidas respostas. Fez tambm buscas junto ao
TRE, Fundao Leo XIII, Detran e IFP, todas sem xito.
Laura no faz acompanhamento mdico. lcida e independente para a
realizao de atividades.
Junto representao foram anexadas cpias de atendimentos: da Defensoria
Pblica, onde em 2007 a idosa solicitou levantamento da certido de casamento e em
maro de 2008 requereu informao do nmero do RG e do RCN, tendo em vista o
extravio dos documentos pessoais; na Fundao Leo XIII que em 2009 solicitou
informaes ao oficial do cartrio de registro civil de uma cidade baiana sobre o RCN
da idosa.
O registro do caso de Laura nas promotorias, por meio da representao, foi
submetido anlise do promotor que solicitou estudo social, com a finalidade de
verificar se a idosa se encontra em situao de risco. Disso denota que as demandas
relatadas pela vizinha somente tero f pblica se contempladas nas palavras de
profissionais e tipificadas como situao de risco. Pode-se observar que o

103

encaminhamento de aes do caso somente se iniciar aps o relatrio do Servio


Social da instituio.
A secretaria elaborou ento um resumo da denncia que enviou junto com o
pedido de estudo social. Na interpretao da histria, parte dela foi modificada. Assim,
consta que a idosa j recebeu ordem de despejo por parte do Sr. [nome] a quem
acolhe, por falta de pagamento. Com isso, o amigo da idosa foi transformado em
proprietrio do imvel e a interdio da casa em falta de pagamento.
Passados trs meses foi juntado ao PA o relatrio da visita domiciliar. Nele
consta que a idosa no tem documentos, que informou sua data de nascimento e que
natural da Bahia. Laura no tem renda e recebe cesta bsica da igreja local.
A idosa recebe auxlio da vizinha com quem tem laos afetivos. No recebe
assistncia de familiares. Sua filha faleceu em 1995. Tem dois netos adolescentes, mas
no tem contato.
A idosa capaz de realizar as atividades bsicas e instrumentais da vida
diria, responsvel pela preparao da prpria alimentao e pela organizao da
casa. [...] utilizou de discurso objetivo. Tem problemas de hipertenso e cardacos,
mas no faz acompanhamento mdico. Usa medicamentos por conta prpria e que
recebe de um senhor que mensalmente os entrega na igreja local.
Laura vive em uma casa com dois cmodos em pssimas condies de higiene e
salubridade. O local possui uma pedra pela qual entra gua em dias de chuva, entrada
esta que tambm possibilita acesso de animais. Tem luz eltrica instalada, porm a
gua solicitada aos vizinhos.
A idosa manifestou o desejo de residir em outro local e citou que a associao de
moradores estaria providenciando nova moradia. [...] Verbalizou o desejo de no ser
encaminhada para uma instituio.
Ao final do relatrio, a assistente social sugere articulao com o CRAS para
que a idosa seja assistida e orientada em relao retirada de seus documentos e
includa no BPC a fim de exercer sua cidadania e garantir seus direitos. H
necessidade de acompanhamento mdico em Posto de Sade, [...] faz uso de medicao
por conta prpria.
Conclui o relatrio explicitando que a idosa vivencia situao de
vulnerabilidade, uma vez que reside em condies sub-humanas, no assistida pelos
familiares e recebe auxlio paliativo dos moradores.

104

A idosa tambm no recebe assistncia do Estado. No entanto, a afirmao final


do relatrio enfatiza o que solicitado nos pedidos de estudo social, ou seja, afirmar
se h risco/vulnerabilidade social por que disso que depende a continuao ou no da
interveno do MP.
O relatrio foi juntado ao PA e submetido a vista do promotor. Disso resultou
a seguinte observao e encaminhamento: Do relatrio fls 17 -19 [relatrio social],
depreende-se que a idosa, 83 anos, reside sozinha em condies insalubres, alm de
no perceber qualquer tipo de beneficio, no fazer tratamento de sade e no possuir
qualquer documento de identificao civil. O promotor parte da situao relatada pela
assistente social e depois fundamenta na letra da lei. Determino, com fundamento no
Art. 43, II do EI, a aplicao das seguintes medidas protetivas: a) Orientao seja
oficiada a SESQV, com envio de cpia de parte dos documentos, dentre eles do
relatrio social para que seja realizada visita domiciliar destinada a verificar se
pertinente o abrigamento e/ou incluso em algum programa social. As providncias
tomadas devem ser informadas em 20 dias; b) tratamento de sade, em regime
ambulatorial, hospitalar ou domiciliar, a ser determinado por profissional mdico
oficie-se a SMSDC, com as mesmas cpias enviadas a SESQV e resposta em 20 dias; c)
solicite-se a CSI (Coordenadoria de Segurana e Inteligncia, pertencente ao MP)
pesquisa sobre RCN da idosa, a fim de se avaliar se ser cabvel ao de registro tardio.
Diante dessas solicitaes, a resposta da CSI foi de no localizao de registro
nas bases do Detran e da Receita Federal.
Decorridos cinco meses aguardando resposta da SESQV e da SMSDC, o
promotor solicitou que fossem reiterados os pedidos. A polcia no foi buscar o Estado,
embora ele no tenha respondido no prazo e tratava-se de medida protetiva...
Aps o envio de novo ofcio a SESQV foi juntado um relatrio social enviado
por esta no mesmo perodo, isto , o novo pedido e o relatrio se desencontraram nos
seus percursos documentais.
O contedo desse relatrio social informa que [...] a idosa apresentou
informaes de acordo com o relatrio j enviado pelo servio social do 3CAOP. Nas
entrelinhas se colocou a indagao da razo de outro assistente social fazer nova visita.
Na descrio da casa acrescenta que h precria luminosidade e ventilao. Sobre a
possibilidade de acolhimento institucional, a idosa no aceitou a sugesto e afirmou

105

que precisa apenas regularizar sua documentao para requerer o BPC e ento pagar
um aluguel.
Esse relatrio social retoma a ausncia de documentao e os caminhos
percorridos sem xito pela idosa e sua vizinha e assim sugere respeitosamente, a
interveno da Promotoria para a regularizao da documentao da idosa em
referncia, a fim de que tenha seus direitos. Por fim, informa que a equipe de proteo
especial prosseguir com o acompanhamento e coloca-se a disposio para um trabalho
de interface.
A partir da anlise deste novo documento o promotor pontua o aguardo da
resposta da SMSDC e que a idosa seja notificada para comparecimento ao seu gabinete.
Define o dia e o horrio, bem como seja dada cincia assistente social da
promotoria, que se possvel, tambm se far presente.
Nesse nterim o Servio Social das promotorias estabeleceu contato telefnico
com a SESQV, que informou a possibilidade do Apoio Moradia, valor R$ 350,00,
associado ao BPC, desqualificando a necessidade de institucionalizao, conforme
desejo da idosa. Todavia, no h viabilidade ante a questo documental.
Com relao RCN, foi feito contato com a Fundao Leo XIII e no consta
xito na solicitao, principalmente, em razo da inexistncia de dados: localizao do
cartrio, livro, folha, termo e data do registro.
Laura no compareceu na data agendada pelo promotor, que um ms depois
reagenda e solicita que a idosa seja notificada com aviso de recebimento da
correspondncia.
Diante da ausncia de documentao, o promotor solicita a CSI uma nova
pesquisa para verificar se possui RCN. A resposta do rgo foi novamente de
nenhum registro encontrado.
Ademais, devido reiterao de ofcio e o desencontro dos documentos a
SESQV reenvia o mesmo relatrio do Servio Social, j anexado ao PA.
At aqui transcorreu um ano do incio da comunicao da situao da idosa ao
MP.
Passados dois meses desde a notificao idosa e a juntada de envelope com a
marcao dos Correios no item no procurado, o promotor solicita CSI busca de
eventual complementao de endereo. Obtm a resposta de nenhum registro para os

106

parmetros da busca. Diante disso, pede que a comunicao seja entregue via TNAI
(tcnico de notificao de atos intimatrios).
Diante dessa notificao, Laura compareceu Promotoria acompanhada pela
vizinha, a mesma que fez a comunicao inicial. No termo de declaraes consta que
ela viva, enfermeira, no possui qualquer tipo de documentao. filha de angolana
e portugus, no tem irmos vivos. Cita sua cidade de nascimento, na Bahia. Veio ao
Rio com sete anos de idade.
Na presena do promotor, a idosa expressou que a vizinha mais do que
filha, teve 14 filhos e nenhum est vivo, foi casada e matou quatro, tem netos
e nunca foi procurada por eles. Ademais, no tem documentos, gostaria de ter
benefcio para comprar comida, no gostaria de morar em abrigo. Onde reside
sobe muitas escadas e gostaria de ter uma casa na beira da rua. Sobre o no
acompanhamento mdico, a idosa relatou que no vai porque no sente nada, somente
toma remdio para a presso.
Na ocasio, a vizinha declarou que a idosa no porta documentos e tornou a
mencionar os caminhos percorridos sem xito para obt-los. Acrescentou que a idosa j
passou mal e ficou desmaiada dentro de casa e que lhe d comida, porque passa fome.
Aps ouvir a idosa e a vizinha, o promotor lhes entregou texto de
encaminhamento ao NEAPI, da Defensoria Pblica, no qual consta o seguinte:
Conforme foi constatado, trata-se de pessoa lcida e orientada, razo pela qual este
rgo ministerial no possui atribuio para atuar a seu favor. Assim, a idosa
retornaria aquela instituio e com a mesma demanda: falta de documentos pessoais.
Decorridos trs dias, o promotor define solicitar acompanhamento SESQV,
solicitando seja informada sobre a pertinncia de incluso da idosa em programa
social.
No mesmo perodo foi anexado ao PA, relatrio mdico enviado pela SMSDC,
com a data de cerca de cem dias antes. Nele h o seguinte registro:
[...] domiclio em pssimas condies de habitabilidade, ausncia de renda e
frgil rede de apoio familiar e social. Conta com suporte assistencial de uma
vizinha [nome]. Idoso frgil sob diferentes aspectos, apesar de apresentar
lcida e orientada [...]. O ltimo atendimento na rede SUS foi atravs da
UPA, no domiclio, quando teve queda do estado geral. [...] mora em rea
no coberta pela Unidade de Sade da Famlia. Um dos fatores que dificulta
frequentar a unidade de ateno bsica o difcil acesso de sua moradia
(parte mais alta da comunidade).

107

Esse documento foi anexado ao PA em maro de 2012 e em maio quando a ele


novamente tive acesso no havia nenhuma informao nova. No ms de julho quando
retornei s Promotorias para dar continuidade pesquisa, fui informada que o referido
PA fora encaminhado a outra Promotoria, devido a rediviso das reas de abrangncia
com a criao da 5 PJPIPcD. Diante disso, em janeiro de 2013 por meio de uma
funcionria da secretaria da Promotoria que o PA passou a pertencer, confirmou que ele
continuava em andamento e com o uso de scanner enviou-me por e-mail o que foi
agregado a partir do ms de maio, quando eu fizera a ltima leitura.
Na nova Promotoria, foi dado encaminhamento ao PA por meio de determinao
do promotor de envio de ofcios: ao Detran, para realizao de identificao
datiloscpica da idosa; a cartrios da Bahia para localizar a documentao da mesma;
Coordenadoria de Segurana e Inteligncia do MP para a localizao dos netos dela.
Observa-se assim, a existncia de interpretao distinta dos Promotores sobre o caso,
uma vez que na promotoria anterior a idosa teria sido encaminhada Defensoria para
que a prpria reivindicasse sua documentao. Alm disso, incluiu a busca dos netos
possivelmente para uma anlise mais completa se esses no teriam condies de
amparar a idosa.
Em junho de 2012 foi anexado ao PA um relatrio social enviado por
equipamento da proteo bsica da assistncia social (CRAS). Consta novamente a
ausncia de documentos, de vnculos com familiares, condies insalubres da moradia.
A assistente social sugere que a idosa seja avaliada por geriatra, pois apresenta
esquecimento. Alm disso, menciona que a vizinha que a assiste ir morar no nordeste e
com isso prope que a idosa seja encaminhada com urgncia para abrigamento. No
menciona se a idosa est de acordo com essa medida, afirma que deve ser feita com
urgncia 50, mas a justificativa apresentada no em si a distncia da vizinha e sim
para facilitar a equipe tcnica providenciar as documentaes, cuidado sade,
alimentao e moradia adequada, lazer e todos os direitos que se faa necessrio
dentre eles BPC

51

. Entende-se que por meio do parecer dessa assistente social, ela

buscou no s concluir o texto do relatrio, mas tambm exps uma ideia de soluo
para o caso. Apresenta a proposta de que o abrigamento viabilizar todos os direitos da
idosa, entretanto outros assistentes sociais j haviam apontado anteriormente a
50
51

Grifo do texto original.


Grifo do texto original.

108

necessidade do MP viabilizar a documentao da idosa para que a assistncia


posteriormente encaminhasse a incluso da idosa no BPC e em programas, e que desse
modo ela no necessitaria de abrigamento, visto que tambm a prpria discorda de tal
medida. Assim, denota-se que o argumento principal defendido pela profissional de
fato facilitar o trabalho dos profissionais.
Em junho tambm foi enviado Promotoria uma minuta proveniente de
equipamento da assistncia social, porm este da proteo social especial (CREAS). No
texto assinado por assistente social consta que foram feitas duas visitas sociais idosa,
uma em setembro de 2010 e a outra em junho de 2012. Na primeira visita a idosa teria
manifestado recusa ao abrigamento e na segunda foi informado que provavelmente no
ter mais o auxlio da vizinha que morar na regio nordeste do pas. Sugere que antes
de viabilizar o abrigamento, a idosa seja avaliada por mdico no que tange a sua sade
mental.
O Promotor solicita em setembro de 2012 que seja encaminhado oficio
requerendo a profissional psiquiatra do MP uma avaliao da idosa.
Em novembro do mesmo ano foi anexado ao PA um relatrio de visita
domiciliar realizada em agosto, por mdico de Centro Municipal de Sade CMS. O
profissional descreve a moradia da idosa e a prpria. Afirma que ela apresenta regular
estado geral de sade, que foi prescrito medicamento para presso arterial e coletado
material para exames. Adiciona que a idosa vive de doaes da igreja e de renda
eventual do compadre com quem mora, o qual no tem emprego fixo.
Em janeiro de 2013 o PA estaria aguardando resposta da avaliao psiquitrica e
dos rgos de pesquisa documental da idosa e a localizao de seus netos.
O caso de Laura est em andamento h mais de dois anos nas Promotorias e
retrata entendimentos distintos de agentes pblicos, promotores e assistentes sociais
sobre a situao em tela. Alm disso, embora todos reiterem a demanda inicial da
documentao e vrios profissionais e instituies relatem a situao da idosa, a
realidade dela no foi ainda alterada. O acesso da idosa a direitos sociais bsicos
inviabilizado devido ausncia de documentos pessoais, ou seja, ela no cidad,
inexiste para o Estado.

Idosa Maria

109

Parte da vida de Maria, 72 anos, comeou a ser conhecida pela Promotoria do


Idoso em novembro de 2010, por meio de comunicao feita pela proprietria do imvel
onde a idosa reside.
Conforme a comunicante, a idosa encontra-se em total estado de abandono e
sem condies de manuteno de sua prpria vida. Ela no possui filhos, nem
tampouco contato com familiares. Tem um irmo que nos contatos feitos se apresenta
de forma agressiva. Informa ento o nome e o telefone dele.
O relato da representao prossegue com as seguintes informaes:
[...] necessita ser assistida em carter de urgncia, pois se encontra com
feridas abertas nos membros inferiores e seu domiclio est infestado de
ratos, baratas e em condies precrias de higiene e salubridade. [...]
enorme a quantidade de lixo no interior do apartamento. [...] h anos junta
latas de refrigerante, garrafas, papelo, jornais, cascas de bananas, entre
outros. [...] a idosa oferece risco tambm aos moradores do prdio, pois deixa
o bico do gs aberto e quando realiza sua higiene pessoal deixa toda a gua
do banho escorrer pelo conjugado, o que afeta o andar de baixo, gerando
infiltraes.

Nesse texto se apresenta a ideia de risco vivenciado pela idosa no que tange
sua sade e de risco para os demais moradores do edifcio e os bens desses.
Maria funcionria pblica aposentada, mas deixou de pagar o aluguel h dois
anos e o caso est na Justia. Ela quebrou as pias do banheiro, cozinha, o box, e
uma janela. [...] o caso de gravidade.
A comunicante cita uma moradora que prestava assistncia, sobretudo
alimentcia, mas no tem mais condies de auxili-la. O porteiro quem presta socorro
idosa quando sofre quedas da prpria altura.
Por fim, a comunicante deixa como observao que gostaria de ser comunicada
quando da visita pela Promotoria, porm no informa as razes desse pedido.
Uma semana aps a abertura da representao, o promotor a analisa e escreve
no PA que os fatos narrados so de extrema gravidade. Desta feita, com urgncia,
solicite-se ao 10CRAAI diligncia do GAP52 ao local, com o intuito de verificar a
procedncia da notcia.
Entre o pedido do promotor e a chegada do relatrio do GAP passaram-se um
ms e vinte dias.

52

O GAP Grupo de Apoio ao Promotor formado por policiais militares, que entre outras funes, so
solicitados pelos promotores a realizarem diligncias a fim de verificar a veracidade da denncia.

110

O relatrio informa que o primeiro contato foi feito com o porteiro do prdio que
contou que o irmo da idosa a visita quase todos os dias, trazendo sempre algumas
coisas para a idosa comer. Essa parte do texto foi grifada com marca-texto,
possivelmente pelo leitor promotor.
O porteiro tambm exps que o apartamento realmente encontra-se precisando
de uma limpeza, pois a mesma junta lixo (restos de coisas), e que s vezes compra
comida para a idosa. O porteiro fez contato com Maria que no aceitou atender a
equipe e disse que recebe em seu apartamento apenas seu irmo. No informou o nome
dele ou telefone, que leva frutas e todo tipo de alimentao [...] que apesar da idade
avanada lhe presta todo tipo de auxlio, inclusive financeiro. A idosa informou ser
aposentada por rgo federal, no citando o nome.
O fato de Maria resistir s intervenes ser posteriormente reinterpretado, assim
como o porteiro mudar seu discurso sobre o irmo.
Decorridos dois meses da representao, a comunicante retornou s
Promotorias para acrescentar informaes e foi atendida pelo servio social. Ela
repetiu as informaes anteriores sobre a situao da idosa. Disse possuir cpias da
chave do imvel e com isso, disponibilizou-se a auxiliar na abordagem. Estaria assim,
sendo veiculada a ideia de que a idosa resistiria interveno. No se sabe se por outro
lado a comunicante teria interesse em acompanhar o que feito.
A comunicante tambm acrescentou que a idosa no realiza acompanhamento
mdico apresentando debilidades fsicas e cognitivas.
O atendimento foi juntado ao PA e analisado pelo promotor, num intervalo de
tempo de trs meses desde a primeira e anterior anlise feita. Com as novas informaes
o promotor assim decide solicite-se CSI dados sobre o irmo da idosa. Essa
coordenadoria envia resposta dizendo que para o parmetro de pesquisa [nome da
genitora] foram obtidos 237 registros. Para o parmetro [nome do genitor] foram
obtidos 64.172 registros. Solicito se possvel mais dados para uma melhor pesquisa.
Foi enviada ento a data de nascimento da idosa e o nmero do documento de
identidade.
Com a chegada da resposta fez-se vista ao promotor, que definiu cumpra-se
a portaria no que couber. Isto , a portaria de praxe. Esta consiste em: pedido de
estudo social e com o enunciado comum aos outros PA(s); informaes ao INSS sobre
existncia de beneficio, se h procurador habilitado e se h emprstimos consignados. E

111

ainda, pedido de visita domiciliar a ser realizada pela Secretaria Municipal de sade,
para verificar o atual estado de sade fsica e mental, bem como encaminh-la para
tratamento mdico adequado, se for o caso.
O INSS respondeu no ter encontrado benefcio com os dados fornecidos. A
nova informao foi submetida vista do promotor, que registrou ciente, aguardando
cumprimento da visita pela secretaria de sade.
Posteriormente, chegou secretaria da promotoria o relatrio de visita social
realizada por profissional do MP. Nele consta que a assistente social fez contato anterior
com a comunicante, considerando a observao desta no atendimento social. Na visita
foi recebida pela sndica, informou que a idosa no se encontrava no momento e que
acreditava que ela teria ido ao banco. Exps que a senhora [Maria] possui o hbito de
sair, pegar taxi e pedir para os porteiros e moradores pagarem a corrida. Relatou que
a idosa j urinou no cho do prdio e no elevador. A sndica chamou um funcionrio
do edifcio que disse ter socorrido a idosa vrias vezes, devido a quedas e que ela grita
muito. Esses informantes tambm relataram que a idosa usa roupas sujas, exala mau
cheiro e anda com um saco amarrado numa perna. A sndica chamou uma vizinha da
idosa que costumava prestar auxlio na alimentao dela e que ratificou as informaes
anteriores e disse que a idosa realiza emprstimos consignados. Posteriormente chegou
a proprietria do imvel e disse que a idosa guarda lixo na casa, que sofreu uma queda
na rua, que est inadimplente e a qualquer momento ter ordem de despejo.
Aps essas informaes, a proprietria foi verificar se a idosa estava na
residncia e solicitou que a assistente social no dissesse que era do MP.
Na residncia, quando a idosa percebeu que estvamos acompanhando a Sra.
[proprietria], apresentou comportamento alterado, principalmente por que a
proprietria solicitava que verificssemos as condies de residncia.
A assistente social pediu que a proprietria se ausentasse. Foi explicado idosa
que s entraria na residncia se lhe permitisse. A idosa se acalmou e passou a
interagir [...] embora de forma desconfiada e negando-se a responder algumas
perguntas. Apesar de Maria no permitir a entrada, do local em que a assistente social
estava, percebia-se ser um conjugado com baratas e teias de aranha [...] lixo como
sacos, latas, jornais amontoados por toda a parede.
A perna da idosa estava avermelhada e inchada. Maria disse ser erisipela e fazer
tratamento. Ela no informou nome de clnica ou de mdico que a acompanhe.

112

Afirmou ter uma cunhada mdica, no informou o nome, que lhe fornece os
medicamentos. Alm da erisipela, disse ter glaucoma e tratar com colrio.
A idosa contou ter sido funcionria dos Correios, no ter constitudo famlia.
Informou ter dois irmos [nomes], ambos doentes e que [nome de um deles] realiza
contatos telefnicos. Aps a visita foi feito contato telefnico com esse, que exps estar
impossibilitado de visit-la, porque fizera uma cirurgia na bacia, que sua esposa
esporadicamente vai v-la e que a idosa se nega a fazer qualquer tipo de
acompanhamento mdico, que a famlia j tentou lev-la a consultas e intern-la.
Informou que a idosa aposentada e que no sabe o valor. Quanto cunhada que
supostamente ajuda a idosa, disse ser a esposa de seu irmo [nome], que est internado
em casa de recuperao, pois teve problema neurolgico que acarretou na paralisia de
seus membros inferiores e que a cunhada no ajuda idosa, pois institucionalizou o
esposo para no lhe prestar cuidados. Informou ainda no poder permanecer com a irm
em sua casa, pois se trata de uma quitinete, no tendo lugar para a mesma se instalar.
Ademais, disse que a idosa uma pessoa difcil de conviver.
Nas consideraes finais, a assistente social pontuou as condies do imvel e
de sade da idosa e estabeleceu relao entre elas. Reiterou que a idosa no faz
acompanhamento mdico e que tem dificuldades para deambular. Ela est em situao
de vulnerabilidade social, e possivelmente no tem mais condies de permanecer
sozinha. Sugere avaliao por equipe mdica e indica como referncia uma unidade
municipal de sade no bairro onde a idosa reside.
O relatrio social foi juntado ao PA e submetido a anlise do promotor que
solicitou fosse reiterado o ofcio Secretaria de Sade.
Um ms depois foi agregado ao PA o relatrio mdico, em que consta o
seguinte: ao chegar ao local a mdica observou a idosa no hall de entrada discutindo
com os porteiros sobre o pagamento de uma conta de gs, alegando que entregava
dinheiro aos funcionrios do prdio para pagarem suas contas, mas a do gs no foi
paga e o servio foi cortado. Disse que pegou a erisipela da pessoa que administra o
apartamento e tinha ido visit-la. Ela me contaminou. A idosa no quis mostrar suas
pernas. Disse no precisar de mdico algum, que tem mdico na famlia sua cunhada.
Informou que seu irmo que a ajuda est paraplgico, que a cunhada s vezes a visita e
lhe leva comida. Mora sozinha. No permitiu ir at o apartamento e saiu do prdio
encerrando a conversa.

113

Os vizinhos e o porteiro disseram mdica que a idosa precisa de ajuda, no


tem mais a cabea boa.
Aps o relato consta o seguinte parecer:
[...] a paciente est parcialmente orientada no tempo e no espao, lcida,
bastante ansiosa, pensamentos com ideao tendendo a se tornar delirante,
humor tendendo exaltao. Memria parcialmente preservada e juzo crtico
comprometido. Parece-nos paciente que h algum tempo iniciou processo de
demncia senil e precisa ajuda: sugeriramos o contato com os familiares e
ainda acompanhante (algum que a ajude com higiene, medicao,
alimentao e a casa), alm de tratamento mdico geritrico e psiquitrico.

Ao analisar as novas informaes, o promotor solicita notificar o irmo da idosa


para comparecer em seu gabinete e define data e horrio. Ele dever comparecer
munido de cpia de comprovante de rendimentos da idosa, atestado mdico e
documento de identidade da mesma. Ademais, dever ser solicitado ao mdico que
complete o laudo, informando se a idosa capaz de praticar por si os atos da vida
civil.
Uma semana depois, as notificaes foram enviadas ao familiar e ao mdico.
Passado cerca de um ms, o promotor pede que seja oficiado o rgo federal no
qual ela trabalhou para informar se h benefcios em nome da idosa, se h emprstimos
e procurador.
O irmo da idosa compareceu na data agendada e declarou que ela de difcil
convivncia. No tem documentos dela, no sabe sobre seu beneficio previdencirio.
Ela paga seu aluguel e contas, tem luz e gs no imvel. A proprietria no fornece
recibo do aluguel e a idosa quer sair de l h cinco anos, mas no procura outro local.
Alm disso, o irmo apresentou documentos comprovando a realizao de sua cirurgia e
a dificuldade de locomoo.
Aps um ms e dez dias do envio da solicitao, o rgo no qual Maria
trabalhou respondeu com informaes do nmero da conta bancria e ficha financeira
com emprstimos consignados. No possui procurador, nem dependentes.
Com isso, o promotor pede para notificar o irmo para esclarecer por escrito a
tomada de emprstimos consignados em nome da idosa. Desse modo, aqui parece
haver a suposio de que a idosa vtima de abuso financeiro por parte de familiares.
Na oitiva com o promotor, o irmo da idosa disse no saber sobre o benefcio
previdencirio dela.

114

A notificao com pedido de complementao de laudo mdico foi respondida


pelo mesmo profissional que emitiu o anterior, com data de um ms e vinte dias aps o
envio da solicitao pela Promotoria. Neste laudo consta que ao momento do
atendimento a Sra [nome completo da idosa] no apenas no estava apta para os atos
da vida civil, como nos pareceu estar iniciando um quadro de demncia senil. No h
informao se a idosa foi novamente avaliada ou se o registro se pauta no que foi
observado anteriormente.
Decorridos dois meses entre a data que consta no laudo mdico e a abertura de
vista ao promotor, este define: aguardar notificao cumprida [pelo irmo da
idosa]. Na oportunidade, tambm deve ser orientado a ajuizar interdio.
Alguns dias depois, o irmo respondeu por escrito Promotoria. Esclareo
pelo presente no ter conhecimento das atividades financeiras da idosa [nome
completo], portanto, nada sei sobre emprstimos consignados tomados pela referida
idosa.
Nova vista foi aberta ao promotor que determinou: notifique-se para fins de
interdio.
No texto da notificao enviada ao irmo, consta que diante do teor do laudo
mdico constante nos autos, ajuze-se ao de interdio [...] para a devida
regularizao de sua representao. O texto cita o Cdigo Civil, art. 654, sublinhando
que somente pessoas capazes so aptas a outorgar procurao. Cita ainda o artigo 682.
Explica que todo idoso que no possua capacidade para os atos da vida civil est
inabilitado para outorgar procurao.
[...] A procurao se existir ser invlida, no podendo ser utilizada, razo
pela qual, a fim de ser regularizada a representao civil do idoso, este dever
ter sua interdio decretada, com a nomeao de um curador, que ser seu
representante legal. Fica o notificado ciente de que dever apresentar
Secretaria desta Promotoria de Justia no prazo de 45 dias, a contar do
recebimento desta, documentos que comprovem o ajuizamento da demanda.

Aps juntar cpia dessa notificao ao PA, foi apensado nele outro PA relativo
mesma idosa e pertencente mesma secretaria. Este PA iniciou quase oito meses aps o
anterior e partiu de comunicao feita por telefone a Ouvidoria do MP. Nele se d
repetio de aes do anterior, isto , h duplicidade de pedidos documentais e
intervenes sobre o mesmo idoso.
A comunicao Ouvidoria foi feita pelo porteiro do prdio, da seguinte forma:
ela est vivendo em situao de abandono e se encontra muito adoentada, com uma

115

ferida na perna direita e est muito debilitada por falta de alimentao. O porteiro
fala que o apartamento est cheio de lixo e alm das baratas e ratos, presentes em
comunicaes anteriores, acrescenta que h muitas moscas. Alm disso, a idosa est
correndo risco de morrer, devido ao seu estado grave de sade. Disse ter sido
orientado pelo Corpo de Bombeiros a fazer a denncia ao MP.
Aps essa comunicao Ouvidoria, consta no PA certido de pesquisa no MGP
e registro de no haver outro PA sobre a idosa, entretanto ele existia.
Iniciam-se ento as solicitaes do promotor que repetem s do PA anterior.
Assim, foi solicitada diligncia do GAP, oito meses aps a anterior. Neste relatrio feito
por outros dois policiais militares, consta que abordaram o vigia, o zelador e um
morador, que foram unnimes em informar que a idosa vive em condies precrias de
habitabilidade e higiene, pois tem grande quantidade de lixo e entulho no seu
apartamento. O zelador acompanhou os agentes at o apartamento da idosa porque
ela no abre a porta para estranhos. Observaram ser quitinete cheia de lixo e
entulho. A idosa apresentou lucidez e um pouco de desconfiana. Aqui foi
considerada lcida, mas no diz em que essa informao se embasa. Ademais, sobre
isso h o saber mdico.
A idosa informou que aposentada federal e recebe R$ 2000,00. Compra a
alimentao e recebe seu beneficio. Disse que recebeu visita de seu irmo. O zelador
confirmou que o Sr. [nome] visita a idosa esporadicamente e que no toma nenhuma
providncia para limpar o apartamento e melhorar as condies de vida dela. O
zelador e o vigia j tentaram realizar a limpeza no apartamento da idosa, mas ela se
recusa a receber ajuda. Desse modo, os responsveis pela situao em que a idosa
vive so a prpria e o seu irmo. Ela por no aceitar ajuda e o irmo por no assisti-la.
Ao relatrio foram anexadas quatro fotos do apartamento e uma da idosa (na
altura dos ombros). Elas retratam a pia com louas, potes e utenslios de cozinha
empilhados; sacos amontoados junto parede; e a idosa cabisbaixa e com cabelos
desalinhados.
A partir do relatrio o promotor pede que a CSI localize os irmos da idosa.
Solicita tambm que seja oficiada a SESQV, com cpia da denncia e do relatrio do
GAP para aplicao de medida protetiva de acompanhamento por seis meses. E
ainda solicite-se SMSDC a realizao de avaliao psiquitrica.

116

A CSI respondeu com informao dos nomes completos dos dois irmos da
idosa e seus endereos.
Decorridos quase dois meses uma nova denncia foi feita via Ouvidoria. Desta
vez, annima, com o seguinte relato: a idosa est apresentando distrbios mentais, seu
estado de higiene pessoal precrio, visto que costuma realizar suas necessidades
fisiolgicas pelo edifcio, ocasionando um forte mau cheiro. Cita que tem um irmo e
informa o telefone dele. Maria tem beneficio, no sabe o valor, nem quem recebe. Tem
feridas nas pernas e costuma sofrer tombos.
Chama ateno que duas informaes sempre se repetem: a idosa tem famlia
(um irmo) e tem renda. Nas denncias h nfase no incmodo provocado aos demais
moradores. Presume-se que isso no deveria ocorrer, uma fez que h renda e famlia,
porm elas se mostram insuficientes para solucionar a situao que a idosa vivencia.
Aps apensar a nova denncia e abrir vista ao promotor, este solicita
pesquisar porque h outro PA em nome da idosa. Algum elemento da histria da
idosa teria rememorado o caso ao promotor?
A secretaria localiza o outro PA e disso decorreu a juno de ambos. O promotor
define que o feito seguir pelo mais antigo. No abrir vista aqui.
Trs meses aps o pedido a SMSDC para realizao de visita para avaliao
psiquitrica enviada cpia do mesmo relatrio do PA mais antigo. Nele foi grifado
com marca-texto o seguinte: No quis mostrar em que estado estavam suas pernas por
conta da erisipela, alegando que j estava boa (usava calas compridas). Diz que se
recusa a ir ao mdico, no preciso, tenho mdica na famlia e fala de uma cunhada
que seria mdica. Consta ainda, informamos que ao momento do atendimento a Sra.
[nome da idosa] no apenas no estava apta para os atos da vida civil, como nos
pareceu estar iniciando um quadro de demncia senil.
Aps dois meses, quando juntado este relatrio ao PA e se fez nova vista ao
promotor, foi por este solicitado reiterar a notificao ao irmo e envi-la com aviso
de recebimento. Entre a primeira notificao ao irmo para que ajuizasse ao de
interdio e atual reiterao passaram-se quatro meses.
Um ms depois do reenvio da comunicao, anexado ao PA o aviso de
recebimento emitido pelos Correios.
E no intervalo tambm de um ms o caso foi enviado a Vara de Justia e deixou
de ser atribuio das Promotorias do Idoso.

117

No documento enviado juntamente com o PA e direcionado ao Juiz de Direito


consta o pedido de ao de interdio. No texto, o promotor apresenta o caso ao juiz e
informa que o pedido de ao de interdio foi encaminhado pelo MP devido ausncia
de resposta do irmo sobre o ajuizamento da referida ao. Interessante notar, que o
promotor se pauta nos relatrios mdicos contidos no PA e cita folhas desse, para
afirmar que a idosa encontra-se parcialmente orientada e no tem capacidade para
realizar os atos da vida civil. No pargrafo seguinte afirma que a idosa possui
referncia familiar, e alude que isso se verifica no relatrio social e no termo de
declaraes do irmo da idosa que compareceu a oitiva com o promotor. Cita os
nomes dos irmos e informa que um deles pessoa com quem ela manteria constante
contato e que ajuda a idosa, inclusive, levando, por vezes (com o auxlio de sua
companheira), alimentos anci. Dessa forma, dentre as informaes do PA sobre o
irmo da idosa o promotor elege quelas em que ele colocado como presente na vida
dela e suprime as que consideram a famlia omissa. Posteriormente, o promotor elenca
requerimentos do MP para a ao da interdio, dentre os quais, realizar percia mdicopsiquitrico e intimar a idosa e seu irmo, ocasio em que ele dever esclarecer se
aceita o encargo da curatela.
Com isso, o caso de Maria se encerra com a proposio de ter preferencialmente
um familiar que a tutelar e assim se responsabilizar por ela.

3.4 Concepes de idosos sobre abrigamento


As etnografias dos casos acima expostos revelam elementos presentes tambm
nas situaes de outros idosos. Observam-se singularidades nas vidas de Roberto, Laura
e Maria e um ponto em comum: nenhum deles solicita o abrigamento.
Roberto quer que a sua prpria casa seja devolvida e recusa-se a retornar
moradia do filho, com quem tem conflitos, porm no pede para ser abrigado. Essa
medida tomada pelo promotor diante da posio do idoso de que no voltar para casa.
Posteriormente Roberto sugere ir morar com outro filho, mas este informa no ter
condies de assisti-lo, bem como o faz outra filha que foi consultada. As dificuldades
se devem ao trabalho e com isso a ausncia de tempo para atend-lo e ainda problemas

118

de sade dos familiares. Situao semelhante se mostra no caso de Maria, que no teve
filhos, tem irmos idosos e doentes, alm da prpria no ter condies para morar
sozinha. No caso dessa idosa, no lhe proposto o abrigamento e sim apontada a
necessidade de suporte familiar, o que passa a ser invocado via interdio civil. Mas,
esse mecanismo legal no garante por si a proteo, ou seja, ele no soluciona os
problemas daqueles que no tm como assistir ao idoso.
Conforme enfatiza Jelin (2009), a famlia no instituio isolada e sim parte
orgnica de processos sociais mais amplos que incluem dimenses produtivas e
reprodutivas da sociedade, padres culturais e sistemas polticos. Os lugares e as
organizaes familiares se relacionam com o mercado de trabalho e a organizao de
redes sociais, e por isso aspectos como taxas de fecundidade, de divrcio,
envelhecimento so parte de processos sociais e culturais mais amplos que tambm
deveriam estar sujeitos a polticas pblicas.
As polticas sociais situam as famlias como foco e as colocam em posio
prioritria para o atendimento aos dependentes, o que se soma tambm a ausncia de
servios sociais efetivos. Assim, a famlia se v obrigada a assumir o encargo mesmo
que no tenha laos afetivos e condies para cumpri-lo. E para tanto, ainda prevalecem
nas polticas pblicas concepo familiar que se restringe a relaes de descendncia e
consanguinidade, pautadas por uma concepo naturalizada de famlia.
Tradicionalmente, a maioria das polticas governamentais concebida a
partir de um conceito de famlia funcional, em que h a presena de pai e
me vinculados por matrimnio, com perspectiva de convivncia de longa
durao, filhas e filhos prprios e os papis de gnero esto perfeitamente
definidos: as mulheres responsabilizadas pelos trabalhos domsticos e os
homens pelos extra-domsticos (ARRIAGADA, 2007, p.231).

No entanto, a famlia no segue uma narrativa linear padro, nem pode ser
reduzida a uma unidade natural, pois espao poroso perpassado por foras e relaes
que se estendem para alm da unidade domstica (FONSECA, 2007). Dessa forma, a
famlia no apenas conjunto de pessoas unidas por laos de consanguinidade ou
dependncia, mas unidade composta por indivduos que vivem no cotidiano um jogo
de poder que se cristaliza na distribuio dos direitos e deveres a cada um de seus
membros (COUTINHO, 2006, p. 96). A organizao ampliada das relaes familiares
pode se realizar para alm da famlia nuclear, incluindo parentes por considerao
(GUEDES e LIMA, 2006). Destarte, o pertencimento familiar tambm influenciado
pelas situaes. Em determinados momentos ou para determinados objetivos, os afins

119

podem ou no ser includos na trama (ao lado dos parentes naturais, de sangue). Em
casos extremos, alguns dos consanguneos podem ser excludos desse entrelaamento
(DUARTE e GOMES, 2008, p. 162).
Alm disso, conforme pontua Jelin (2009), para analisar a dinmica dos vnculos
familiares e de parentesco, especialmente em perodos de altas taxas de divrcio e de
padres migratrios altamente diferenciados, necessrio considerar a falta de
correspondncia entre lugares e famlias. Nessas condies, as responsabilidades e
obrigaes familiares podem estar a cargo de membros que no compartilham o mesmo
lugar. Tambm o amor e o cuidado podem ser oferecidos e recebidos sem convivncia
cotidiana. Somente um enfoque que privilegie as transies e os processos poder dar
conta desta dinmica. No entanto, h uma forte significao simblica e ideolgica da
famlia, cujos valores se expressam nas imagens de famlia normal e natural. Nas
polticas sociais ainda persiste essa ideia, o que comporta limites para considerar a
pluralidade de formas de vida privada e os diferentes arranjos familiares presentes na
realidade atual (GOLDANI, 2005).
De acordo com Arriagada (2007), na Amrica Latina as famlias cumprem
funes de apoio social e amparo diante das crises econmicas, do desemprego, da
enfermidade e da morte dos seus membros. E em alguns pases a famlia a nica
instituio de amparo diante de eventos traumticos.
Dessa forma, o cuidado no considerado direito social e no se articulam as
responsabilidades entre famlia, Estado e demais instituies. Isso se deve em parte
suposio implcita de que as famlias, e nelas principalmente as mulheres, no
incorrem em custos financeiros e ou emocionais para o cuidado dos dependentes.
Conforme Lemos, Oliveira e Almeida (2012), embora as configuraes
domsticas venham se modificando ao longo dos anos, em termos culturais h um forte
condicionamento na relao entre a funo do cuidado e a situao de gnero. Alm
disso, o carter informal e invisibilizado dos cuidados familiares tende a considerar a
questo como natural e orgnica do espao familiar, e de funo da figura feminina, o
que produz tambm acusaes frente s famlias/mulheres que no realizam esse
cuidado, por falta de possibilidades ou por escolha (ENGEL, 2012).
Estudos no mbito internacional e que estabelecem comparaes entre os pases,
com ressalvas s diferenas sociais, culturais, econmicas, polticas e da natureza do
contrato social vigente entre Estado e cidados, constatam que a preocupao com os

120

cuidados de longa durao nos pases com populaes mais envelhecidas surgiu como
uma necessidade de se separar os crescentes custos com o tratamento de longa durao
dos idosos dos demais gastos com sade (PASINATO e KORNIS, 2009, p. 12). Desse
modo, as decorrentes polticas buscam conjugar responsabilidades pblicas e privadas
no cuidado dos idosos; priorizar o atendimento aos idosos nos seus lares e ou
comunidades como forma de reduzir custos e de proporcionar o bem estar; e
desenvolver programas informativos e de apoio aos cuidadores informais,
principalmente aos familiares (Ibid., Id.).
No caso da idosa Laura, ela no invoca a ausncia dos familiares, nem reclama a
presena dos netos, que seriam seus parentes vivos mais prximos. Ela considera a
vizinha como sua filha e esta a assiste conforme lhe possvel. Entretanto, os problemas
so de outra natureza: trata-se de questes materiais. A idosa perdeu a documentao
em uma catstrofe ambiental e sem provar quem de fato no tem como acessar direito
previdencirio e assistencial. A situao primeiramente econmica, pois a idosa teve a
casa interditada e no possui outra. O abrigamento lhe proposto, mas ela quer seus
direitos bsicos garantidos: previdncia, moradia,... Quer uma casa na beira da rua,
isto , no com os limites de acesso por degraus como na comunidade onde mora
atualmente. A no resoluo dessas questes encaminha o acolhimento institucional
como soluo. Rejeit-lo pode ser interpretado como se ela se recusasse a ser atendida.
Alm disso, a idosa aparenta ter condies fsicas para reclamar seus direitos e ento
teria responsabilidade prpria para obt-los, por isso ela deve retomar a Defensoria
Pblica, embora a vizinha informe que isso j fora buscado sem xito. A idosa poderia
ser inscrita em alguns programas assistenciais, mas ela primeiro deve existir enquanto
cidad, isto , documentada.
Na medida em que o encargo individual e familiar se d em meio interveno
do Estado com parcas e fragmentadas polticas sociais, que impem ainda
condicionalidades restritivas do acesso a direitos, que se enfatizam por parte do
prprio Estado os aspectos controladores das aes familiares. Com isso, se coloca o
dilema entre a garantia do direito proteo e a garantia do direito privacidade
familiar. A presena do Estado, por meio de seus agentes na famlia, no possui
apenas uma face, ou uma inteno, pois, ao mesmo tempo em que protege, coloca em
movimento estratgias de controle (MIOTO, 2010, p.63).

121

Devido conjuntura neoliberal e a predominncia, em quase todo o mundo, de


um modelo de polticas sociais que privilegia o enxugamento do Estado, as famlias
esto sendo cada vez mais requeridas para cuidar dos seus segmentos vulnerveis.
(CAMARANO, et alli, 2004, p.138). E com isso independentemente de alteraes e
mudanas substantivas na composio e nos arranjos familiares, a famlia um forte
agente de proteo social de seus membros: idoso, doente crnico, dependentes,
crianas, jovens, desempregados (CARVALHO, 2007, p. 274).
De modo geral durante a prtica profissional observei nos atendimentos e visitas
domiciliares e institucionais que os envolvidos relatam dificuldades para o cuidado dos
idosos, devido carncia de recursos financeiros; ausncia de polticas de apoio;
conflitos intergeracionais, de consanguneos e afins; entre outras, que so permeadas
por constante responsabilizao da famlia que se v pressionada e obrigada a dar
respostas s novas situaes para as quais muitas vezes no est preparada e no conta
com apoios suficientes.
Nos trs casos descritos Roberto, Maria e Laura , a falta de outras polticas
efetivas de assistncia e cuidado, coloca nos idosos e em suas famlias a
responsabilidade. As possibilidades restringem-se s condies do prprio idoso,
famlia e na falta dessas apontado o abrigamento. Os Centros-Dia, por exemplo,
contribuiriam na manuteno desses idosos em suas casas, porm embora indicados
desde 1994, na Poltica Nacional do Idoso, no foram implementados de fato. Segundo
aponta o estudo de Lemos, Oliveira e Almeida (2012), a estrutura de atendimento desse
servio no abrange o nmero de idosos que o demandam e a ampliao dessa
modalidade seria uma possibilidade de manuteno dos vnculos familiares e no
institucionalizao dos idosos em ILPI(s). Alm disso, seria uma poltica de apoio s
famlias e que conjugaria responsabilidades dessas com as do Estado.
A situao econmica dos idosos outro fator limitador da busca de servios de
apoio por si prprios e suas famlias. Nas visitas sociais h idosos que verbalizam por
meio de falas como a seguinte: muito ruim ser um velho pobre e acrescentam o seu
temor frente possibilidade de sua situao de sade se agravar, do aluguel aumentar,...
As suas prprias necessidades em geral no so supridas com os nfimos recursos
advindos da aposentadoria, de penso ou do benefcio de prestao continuada.
Ademais, seus proventos na maioria dos casos so tambm utilizados por outros
membros do domiclio e ou do ncleo familiar. Com isso,

122

[...] nas camadas pobres, o idoso tanto pode ser um empecilho para a famlia
como pode ser a nica fonte de renda (em forma de aposentadoria ou
penso). H famlias, principalmente nos municpios mais pobres, em que os
idosos mantm as despesas familiares e so valorizados como uns dos poucos
consumidores locais com renda fixa (Goldman, 2004, p. 62).

Isso apresenta em parte o retrato das condies dos domiclios com idosos, cuja
informao da Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios - PNAD, revela que para
o conjunto do pas, 66% dos idosos estavam aposentados, 64,1% ocupavam a posio
de pessoa de referncia no domiclio, apenas 22,9% viviam em famlias com renda
domiciliar per capita superior a dois salrios mnimos e pouco menos de 12,0% tinham,
em 2009, uma renda inferior a salrio mnimo. (IBGE, 2010).
Na minha experincia profissional deparei-me com situaes de idosos morando
sozinhos ou que permaneciam a maior parte do tempo ss, com situao de sade
fragilizada, o que implicava em limitaes para o atendimento as prprias necessidades.
Em alguns casos, foram perguntados sobre a possibilidade de abrigamento e
manifestaram a recusa, em outros espontaneamente expuseram sua rejeio e
argumentos para tal.
Novamente as situaes referem-se a idosos que recebem parcos proventos e tm
limitaes econmicas. Esses no dispem de meios para remunerarem um cuidador
para permanecer com eles. Informam gastos elevados com medicamentos, uma vez que
a poltica de sade pblica se mostra cada vez mais precarizada e no dispe de servios
como fisioterapia, neurologia, entre outros, em Unidade de sade e que possa tambm
atend-los em seus domiclios. A isso se soma tambm a demora na realizao de
exames clnicos, por meio do SUS. Geralmente esses idosos contam com a ajuda
voluntria de vizinhos, mediante aes como comprar a alimentao. No entanto,
quanto maior a dependncia de cuidados, menos possvel contar com essa eventual
assistncia. Ela pode se dar de forma mais sistemtica, se o idoso repassa alguma
remunerao acionando, por exemplo, uma vizinha para lavar suas roupas, outra para
preparar a alimentao, qui uma terceira para limpar o imvel. Essas configuraes de
redes de apoio so sempre femininas e possveis quando o idoso tem algum vnculo de
vizinhana e de amizade estabelecido h mais tempo, e recursos financeiros para
remunerar o servio.
H idosos que moram sozinhos e tm problemas de sade que lhes dificultam,
por exemplo, deambular, enxergar, sofrem quedas da prpria altura, ou seja, tem limites

123

para permanecerem ss no domiclio e no tm recursos para remunerar algum que os


auxilie, entretanto recusam a possibilidade de abrigamento. Argumentam com falas
como as seguintes: asilo lugar triste por que tem muito velho, gente com problemas,
um implica com o outro, e sempre morre algum; eu tenho a minha casa, as minhas
coisas, no vou deixar isso aqui; eu prefiro ir frente de um nibus pra me atropelar
do que ir para um asilo; aqui t ruim, mas o meu cantinho, eu tenho a minha
casa.
H idosos que informam a inteno de ir para uma ILPI, e nesses casos, que so
raros, geralmente trata-se de situaes em que convivem com um nico familiar que os
agride, ou que faz uso de drogas e rejeita a possibilidade de tratamento. Isso se mostra
quando consideram a impossibilidade de reverter a situao e esta lhes coloca em risco a
vida, no que tange a segurana e agravamento dos problemas de doena. Nesses casos,
os idosos avaliam que se o familiar for afastado do lar, este no ter outro local para
morar e assim preferem buscar o prprio abrigamento. Entretanto, informam que se trata
de uma escolha forada.
Nos aspectos acima abordados esto presentes no s concepes sobre
abrigamento, mas principalmente a ausncia de outras possibilidades. No que tange s
falas dos idosos, mostra-se a ideia de que as ILPI(s) so depsitos de velhos, e que
misturam esses com pessoas problemticas, loucas, com mendigos sem casa e sem
recursos, como nas primeiras configuraes das instituies.
A resistncia em entrar para uma ILPI pode ser entendida como medo que
alguns velhos tm de no poder mais decidir sobre seu destino, suas vontades
e seus desejos, de perder a liberdade, de ficar isolado da famlia quando ela
existe e do mundo exterior. Mas no s. A reputao dessas instituies
negativa, pois elas so herdeiras das representaes sociais dos antigos asilos
e abrigos para velhos: lugares repugnantes, ambientes mrbidos, abusos de
poder e maus-tratos. A imagem desses estabelecimentos e a internao
involuntria significam, para muitos velhos, o equivalente a uma morte social
que poder se traduzir em uma morte real (Bill 2005 apud PEIXOTO,
2011).

Alm disso, a entrada em uma instituio significa um rito de passagem que


implica em desfazer-se de seus bens pessoais (a comear pela casa e objetos) para entrar
em um cenrio de vida com regras e ritmos (PEIXOTO, 2011), que interferem na
privacidade e na liberdade de ir e vir.
Os cuidados institucionais voltados aos dependentes (principalmente crianas e
idosos) so carregados de preconceito, uma vez que h forte cunho moral e cultural que

124

valoriza o cuidado familiar. Assim, com a norma social que atribui aos descendentes o
cuidado da gerao mais velha, reforada pelo aparato legal, recorrer a instituies de
longa permanncia atitude polmica e carregada de preconceitos, e quando a deciso
pela institucionalizao tomada pela famlia a valorao negativa mais forte
(CAMARANO, 2007).
Neste sentido, conforme analisa Goldani (2005), vale atentar para a dificuldade
em romper com os papis atribudos a homens e mulheres, pois persiste a ideia de que
cuidar tarefa familiar e feminina, o que se refora nos mecanismos legais e nas formas
de implementao das polticas sociais. Isso remete tambm a questo da queda da
fecundidade, cujas argumentaes correntes em geral centram ateno apenas na
entrada da mulher no mercado de trabalho, ocultando que essa entrada veio
desacompanhada de suporte para o cuidado dos filhos.
A poltica de assistncia social preconiza aes especficas para os idosos. Na
proteo social bsica, alm do BPC, previsto o Servio de Fortalecimento de
Vnculos e o Servio de Proteo Bsica no Domiclio. O primeiro basicamente
realizado por meio de grupos de convivncia de idosos, o que significa o atendimento
queles que tm condies de transitar no espao pblico. O segundo viabilizado por
intermdio de visitas domiciliares e visa contribuir para o acesso a outras polticas
pblicas e desenvolver aes de apoio, informao, orientao e encaminhamento, com
foco na qualidade de vida, exerccio da cidadania e preveno do isolamento. Em estudo
elaborado por Delgado e Flor (2012), na cidade de Salvador, constatou-se que
principalmente o Servio de Proteo Bsica no Domiclio no estava ocorrendo de
forma efetiva, em parte por que no h repasse financeiro para que esse seja realizado.
De modo semelhante, pode-se presumir que no Rio de Janeiro ele tambm no seja
viabilizado, uma vez que os idosos visitados por assistentes sociais do Ministrio
Pblico informam desconhecer a existncia do referido servio. Desse modo, seria um
meio de viabilizao dos direitos do idoso, todavia praticamente inexistente.
H que se destacar que se por um lado, a legislao relativa aos idosos apresenta
o abrigamento como medida excepcional, por outro cresce o nmero de solicitaes de
abrigamento em instituies pblicas e de instituies privadas que oferecem servios
de longa permanncia.
Diante disso, observa-se que as Promotorias do Idoso atuam concomitantemente
sob duas lgicas distintas. Por um lado, conforme preconizam as legislaes, defendem

125

que os idosos sejam cuidados preferencialmente em seus lares; por outro lado, h o
reconhecimento da necessidade de cuidados institucionais. Essas duas posies so
tensionadas e no h ainda um dispositivo claro sobre o que se poderia chamar de
poltica de cuidado, isso em parte por que o Estado tem se preocupado mais com a
regulamentao e fiscalizao da assistncia, quer seja familiar ou institucional, do que
com a proviso de recursos e servios.
Observa-se ainda na atuao profissional que devido insuficincia de vagas
para abrigamento pblico, ele somente efetivado pelas instituies municipais perante
o pedido do MP. Desse modo, instaura-se um mecanismo dificultador e com ele outros
critrios de elegibilidade podem ser acrescidos. Uma vez que o atendimento asilar
previsto quando h carncia material, as legislaes colocam questes que
novamente recaem sobre a famlia. O acesso dos idosos ao beneficio previdencirio ou
assistencial pode descaracterizar a ausncia de condies financeiras de subsistncia e
dificultar o seu abrigamento em instituies pblicas. Embora o sistema de seguridade
social tenha sido pensado para funcionar de forma integrada, na prtica h separao das
aes e dificuldade de articulao que se traduzem em focalizao e fragmentao das
polticas com imposio de condicionantes que podem gerar desproteo ao considerar
pontualmente as necessidades do indivduo.
Em meio a isso, o idoso com acesso a benefcio previdencirio ou assistencial,
que tenha referncia familiar e avalie que o melhor viver em uma instituio de longa
permanncia, provavelmente no ser atendido em instituio asilar pblica, bem como
ter dificultado o acesso a entidades privadas que em geral exigem valores superiores
aos seus proventos. Ademais, cada entidade institui um perfil de idoso a ser atendido e
corresponder a tais critrios nem sempre possvel.
H condies diferenciadas de institucionalizao. Os elementos acima
apontados referem-se a instituies pblicas e ou conveniadas com o Estado, visto que
os idosos no possuem recursos para o pagamento de mensalidades em ILPI de natureza
privada.
Cabe apontar que na prtica profissional foram visitados idosos em ILPI e que
so favorveis institucionalizao. Esses casos so espordicos e se referem queles
que solicitaram o abrigamento por conta prpria ou pediram aos familiares para fazlos. O acolhimento desses geralmente se observou em instituies que lhes oferece
quartos individuais. Alm disso, eles mantm vnculos com familiares e amigos.

126

Dessa forma, a questo de classe social interfere diretamente tanto no acesso


quanto na qualidade dos servios, pois os que detm maior poder aquisitivo dispem de
opes quer seja em instituies de atendimento, quer em suas prprias casas com
acompanhamento especializado.

127

Consideraes finais
O trmino desta elaborao dissertativa no significa o esgotamento da
discusso, mas sim considerar que foram alcanados alguns dos aspectos que
provocaram a pesquisa e a construo textual. Os principais argumentos desta
elaborao foram apresentados ao longo do texto e sero aqui recolocados como pontos
importantes para serem aprofundados e repensados ao longo do processo histrico
sempre em mudana. Desse modo, no se trata de uma elaborao definitiva e sim de
uma discusso que pretende contribuir para a reflexo sobre as aes voltadas aos
idosos e a necessidade de avanos na forma de a sociedade organizar suas instituies e
os papis que lhes atribui.
Neste sentido, que esta dissertao mesclou olhares de estudante pesquisadora
e de dois tempos distintos da prtica profissional estagiria e assistente social. Assim,
ao final desta elaborao e ao rel-la, observo que ao mesmo tempo em que o trabalho
como assistente social trouxe elementos para a sua construo, transparece na escrita
um estilo impregnado pelo lado profissional com inquietaes sobre demandas
presentes nesse cotidiano. Isso significa que houve um olhar de perto e de dentro que
permitiu captar sutilezas, mas ao mesmo tempo exigiu um olhar mais distanciado, que
complementasse a anlise e produzisse um sentido novo (MAGNANI, 2002; 2009).
Assim, se imps o esforo de avanar no conhecimento das questes, atravs do
movimento de estranhar o familiar (VELHO, 2003).
O uso da etnografia contribuiu para apresentar espaos, prticas institucionais e
trajetrias de vida, entendendo que esses no so apenas cenrios onde ocorre a ao
social, mas tambm resultados das intervenes de diferentes atores em interao, trocas
e conflitos, cujos resultados esto sempre em processo (MAGNANI, 2009).
A dissertao no pretendeu discutir a instituio Ministrio Pblico e sua
prtica, todavia fez-se necessrio apresent-las para o entendimento da temtica aqui
desenvolvida, quer seja, demandas relativas ao abrigamento de idosos e os pressupostos
que as perpassam.
Considera-se que junto com o abrigamento h pressupostos morais e legais, que
se influenciam reciprocamente. Assim, a moralidade que atribui famlia a proteo
social como sua tarefa primordial colocada nas legislaes como dever. E este, por sua

128

vez, aceito por que alicerado em valores familistas que so socialmente


compartilhados. As leis so reflexos e ao mesmo tempo guias para as prticas. Isso
contribui para o entendimento de que existe abandono quando um idoso no conta com
o suporte familiar e quando ele abrigado, entre outras situaes, o que reporta
famlia o cuidado e no a outras formas de faz-lo. Esses pressupostos perpassam
tambm concepes idealizadas e normatizadas das instituies e seus papis. De certo
modo, com o entendimento que a famlia deve cuidar e que o Ministrio Pblico
estaria fiscalizando esse cuidado, que indivduos se dirigem a esta instituio para
comunicar violaes, justificar aes e avisar sobre alguns encaminhamentos, como por
exemplo, o caso da filha que d cincia ao MP que colocar seus pais em uma ILPI e
apresenta as razes para isso.
Ao mesmo tempo em que se mantm aspectos culturais e de cunho moral que
so reportados para o aparato legal e para as prticas sociais h dificuldades para o
cumprimento da tarefa atribuda famlia. Essas decorrem de mudanas demogrficas,
nos arranjos familiares, nos modos de insero no trabalho e de organizao domstica e
da forma de atuao do Estado que se configura mnimo para o social, entre outras.
Alm disso, a ideologia do envelhecimento saudvel responsabiliza os
indivduos pelo processo do envelhecer e os prprios a darem respostas s demandas
que a velhice apresenta. A heterogeneidade desta mascarada e as aes e polticas se
voltam prioritariamente para idosos com condies de participao no espao pblico e
que possam se integrar a grupos de convivncia, ao trabalho e ao lazer. Sob a ideia de
melhor idade, se esconde a necessidade de aes para a velhice dependente.
Assim, indivduos e suas famlias so vistos como principais responsveis pela
prpria assistncia. A ao da sociedade e do Estado prevista apenas quando
comprovada a incapacidade individual e familiar, ou seja, esgotadas todas as
possibilidades de ajustar indivduo e famlia ao que definido e consolidado como
atribuies deles. O embasamento familista e de expectativa de reciprocidade geracional
corrobora tambm para a interveno mnima do Estado no que se refere a recursos
pblicos para o atendimento das necessidades sociais.
Pode-se afirmar que h uma desigualdade na diviso entre famlia, sociedade e
Estado da to apregoada responsabilidade pela consolidao dos direitos do idoso. A
instituio famlia deve garantir a proteo primeiramente e as demais atuam para

129

contribuir e controlar as aes dela. Trata-se de uma configurao que tambm desenha
hierarquicamente o que deve ser feito por cada uma dessas instituies.
Parte das demarcaes de papis pode ser observada, por exemplo, na
delimitao da situao de risco como parmetro para a atuao ou no do Ministrio
Pblico. Desta feita, entende-se como situao de risco no apenas a violao ou
ausncia de algum direito social, mas sim a incapacidade do idoso e sua famlia
reivindic-lo por meios prprios. As leituras e releituras dessas situaes so feitas por
funcionrios desse espao estatal e no esto imunes de valores familistas e legalistas,
que definiro no apenas se demanda a ser contemplada ou recusada pela instituio,
mas tambm quais aes so necessrias e o modo de oper-las. A concluso de parte
dos casos se d na interdio civil do (a) idoso (a), o que conjuga as duas lgicas:
legalista e moral/familista. Assim, se ele (a) no tem condies de buscar seus direitos
ter algum legalmente constitudo para faz-lo e geralmente um familiar.
Uma parcela daqueles que procuram o MP tem clareza de que a situao
apresentada no coaduna com a funo dessa instituio, porm o fazem na expectativa
de evitar a judicializao e que a autoridade institucional promova mudanas de conduta
dos violadores de direitos, e ainda tem uma ideia de que as solues sero em curto
prazo. Todavia, h uma dissonncia entre expectativa e realidade e parte dos casos
depois de variadas aes e andamentos de papis/documentos so arquivados sem a
soluo esperada pelos que a demandaram.
Ademais, poderamos questionar a lgica da responsabilidade individual e
familiar, presente na forma de atuarem as Promotorias do Idoso, o que converge com o
modo das demais instituies sociais definirem suas intervenes. Entretanto, mais do
que isso, se faz necessrio reconhecer que dentre outros papis, o MP tem como funo
institucional a defesa de direitos coletivos e assim a atuao individual deve ser
limitada. Na prtica ao atuar com inmeros casos individuais tutelados, observa-se que
essas Promotorias de certo modo provocam o Estado na operacionalizao de polticas
como a de sade e assistncia, porm os retornos so dados sobre os casos individuais e
no se observam avanos no sentido de melhoria e ampliao desses servios. Ou seja,
as respostas dessas instituies e equipamentos que as operacionalizam, se resumem
geralmente a relatrios que expem a realidade vivenciada pelo indivduo idoso (a),
raramente informando qual ser a interveno e se ela existir. Desse modo, trata-se
muitas vezes de circulao de papis entre instituies reiterando as mesmas

130

informaes sobre a situao vivenciada pelo (a) idoso (a) indivduo, j apresentada
pelo comunicante ao MP e por profissionais desta instituio, sem construo por parte
do Estado de respostas/solues para o risco social, que abrange de modo similar a
todos (as) os casos em andamento.
Constata-se que embora diferentes estudos indiquem o aumento do nmero de
pessoas idosas no cuidadas por familiares, o Estado continua pensando em famlias
funcionais e no avana na construo de polticas de apoio. A constituio e
ampliao de formas diversas de atendimento, como por exemplo, a implementao de
Centro-Dia, previsto desde 2004 na Poltica Nacional do Idoso, conduziria ao no
abrigamento de uma parcela significativa de idosos.
Dentre outros aspectos desta dissertao, destaco que nos documentos estudados
e na prtica profissional constata-se que geralmente o abrigamento no desejado pelos
idosos. Trata-se de uma aceitao forada frente necessidade de assistncia e a
ausncia de outras possibilidades.
Ademais, se por um lado o olhar do Ministrio Pblico em face do idoso (a) no
sentido de tutela individual, por outro lado, na constituio dos procedimentos
administrativos constata-se uma padronizao que direciona o olhar. Desse modo, h
um script prvio do que ser observado e de que tipo de histria ou no aceita na
instituio. As singularidades das questes que envolvem o (a) idoso (a) muitas vezes
so secundarizadas e parte delas ocultadas, pois no so interessantes aos olhos da
interveno institucional.
No que se refere atuao do Servio Social, embora no tenha sido o foco da
discusso desta elaborao, no h como ignorar que parte significativa dos
procedimentos administrativos constituda por documentos elaborados por assistentes
sociais. Trata-se de relatrios de visitas domiciliares e ou institucionais, registros de
atendimentos, ou outras metodologias, escritos por assistentes sociais da prpria
instituio e de outras. Alm disso, observa-se que algumas sugestes e apontamentos
feitos por esses profissionais subsidiam a deciso dos promotores e so acatados por
eles.
Por fim, se nas intervenes voltadas aos idosos h contradies, lacunas e
limites h conjuntamente possibilidades que devem ser plasmadas e fortalecidas, para
que no processo histrico seja contemplada a heterogeneidade dos sujeitos que
envelhecem e efetivados seus direitos.

131

Referncias bibliogrficas
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