Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $9.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

O despertar do tigre: Curando o trauma
O despertar do tigre: Curando o trauma
O despertar do tigre: Curando o trauma
E-book356 páginas6 horas

O despertar do tigre: Curando o trauma

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Best-seller no Brasil e no exterior, este livro oferece uma visão revolucionária a respeito do trauma. Para Peter A. Levine, somos seres únicos, dotados de grande instinto. Porém, ao utilizarmos apenas nosso cérebro racional, deixamos de lado a capacidade curativa inerente ao nosso organismo. O autor parte da seguinte premissa: por que, embora sejam constantemente ameaçados na natureza, os animais não ficam traumatizados? Se compreendermos a dinâmica que torna esses animais imunes ao trauma, teremos pistas para compreender os mistérios do trauma humano. Nestas páginas, o leitor encontrará explicações biológicas, psicológicas e corporais sobre a consolidação do trauma na mente e no corpo. Então, por meio da Experiência Somática® — abordagem criada pelo autor — e de exercícios de conscientização, aprenderá a identificar os sinais do trauma, acolhê-los e transformá-los. Nessa viagem de autoconhecimento, ficará claro que nosso organismo tem uma sabedoria inata que precisa ser reconhecida e aplicada.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento5 de dez. de 2022
ISBN9786555490978
O despertar do tigre: Curando o trauma

Leia mais títulos de Peter A. Levine

Autores relacionados

Relacionado a O despertar do tigre

Ebooks relacionados

Psicologia para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Categorias relacionadas

Avaliações de O despertar do tigre

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    O despertar do tigre - Peter A. Levine

    Apresentação à edição brasileira

    É com grande prazer que temos a honra de apresentar o dr. Peter Levine e seu trabalho, Somatic Experiencing® (Experiência Somática), que traz uma mensagem de esperança para todos aqueles que já foram traumatizados e para nosso mundo atual, onde a violência, a guerra e o desrespeito à natureza fazem parte de um ciclo vicioso que revela a desconexão do ser humano com sua natureza amorosa e com a qualidade autorreguladora da própria natureza.

    Sua mensagem é: os efeitos do trauma podem ser curados. O ciclo vicioso e repetitivo que reflete a experiência traumática pode ser transformado.

    O trauma — incidente que sobrecarrega nossa capacidade de sobrevivência e deixa uma marca impressa em nosso sistema nervoso — faz parte da experiência humana individual e social. Os efeitos do trauma a longo prazo no corpo e na mente do ser humano podem ser avassaladores, ao passo que o trauma transformado pode levar a uma vivência quase de iluminação, trazendo a pessoa de volta à vida com mais flexibilidade, mais compaixão e um senso ampliado do significado da existência humana.

    Qual seria, então, a diferença entre uma pessoa que passa por uma experiência de tal forma extrema e sai fortalecida por ela e outra que sofre de uma série de sintomas cada vez mais desintegradores?

    Depois de trinta anos de estudo de neurologia, fisiologia, psicologia e de trabalho com pacientes traumatizados, o dr. Levine propõe uma resposta quando diz que o trauma está no sistema nervoso e não no fato gerador da experiência traumática.

    Animais selvagens, apesar de passarem por perigo de vida, frequentemente muitas vezes num mesmo dia, não mostram sinais de choque nem de estresse pós-traumático.

    Pelo estudo do animal selvagem e da fisiologia do comportamento de caçador e da caça, o dr. Levine desenvolveu seu método, uma abordagem bastante completa e eficiente para a cura do estresse pós-traumático.

    O método Somatic Experiencing® (SE) trabalha em nível fisiológico, mais especificamente com o comportamento do sistema nervoso autônomo (SNA). Busca compreender esse aspecto do ser humano quando existe ameaça, quando existe fuga à ameaça, quando há luta para enfrentar essa mesma ameaça ou quando existe congelamento diante do fato ameaçador. Lida com a ativação e a descarga do SNA diante de estimulações (ameaças) que podem ser bem ou mal resolvidas (ciclos de carga e descarga completos ou não).

    Assim como o trauma se estabelece no sistema somatoemocional por meio de padrões de resposta do SNA a essas situações avassaladoras bem ou mal resolvidas (ciclos que se completam ou não), é também pela fisiologia que podemos reverter esses padrões, nos salvando!

    Atualmente, as disciplinas que trabalham com a mente estão se aproximando cada vez mais das disciplinas que trabalham com o corpo, com o somático. Atletas olímpicos descobrem o valor da mente calma e do poder da visualização para melhorar seu desempenho no esporte. As descobertas recentes do papel dos neurotransmissores nas emoções dão uma dimensão bioquímica para nossos sentimentos e pensamentos.

    Nesta cena surge a Somatic Experiencing®, uma abordagem que pode ser usada como método em si, mas que antes de mais nada aparece como modelo para entender o trauma e o ser humano — modelo que tem aplicações muito abrangentes para médicos, equipes hospitalares, psicólogos, terapeutas corporais e assistentes sociais, mencionando apenas algumas áreas que podem se beneficiar com o uso dessa metodologia.

    Nosso mundo contemporâneo apresenta atitudes que estão arraigadas em traumas históricos, recalcados, transformados em comportamentos de violência, guerras, destruição de semelhantes. Essas atitudes se repetem revelando feridas sociais ocultas. Se não lidarmos com os efeitos dessas dicotomias dominação-submissão, abundância-pobreza, cuidando dos traumas subjacentes por elas gerados, não encontraremos uma forma de convívio social saudável.

    Em O despertar do tigre, Levine nos traz sua teoria de forma já digerida. O leigo em fisiologia e psicologia poderá acompanhar o texto, que se sugere de forma mântrica. Conceitos são apresentados de forma simples, compreensível, e o livro é escrito a fim de levar o leitor a ter uma experiência ao mesmo tempo conceitual e terapêutica. O texto, que por vezes pode parecer repetitivo, na verdade está conduzindo o leitor gradualmente a um aprofundamento no contato com suas sensações, reconectando-o com dimensões então dissociadas, o que torna essa obra ao mesmo tempo informativa e terapêutica.

    O título da obra é uma analogia poética do processo sugerido: resgatar as forças inerentes em cada um de nós, em que a natureza animal se mantém sabia. O herói conectado, trabalhando em direção ao reequilíbrio de suas forças inatas. Sua preocupação com o social aparece quando sugere, nos últimos capítulos, medidas preventivas para se lidar com traumas em crianças.

    Portanto, leitor, prepare-se para uma grande aventura, que o levará para o reino animal e para as profundezas e as alturas da experiência humana.

    Lael Keen

    ¹

    Pedro Prado

    ²

    1. Lael Keen, americana radicada no Brasil desde 1986. Rolfista desde 1984, instrutora de Rolfing® e Rolfing® Movimento do Rolf Institute, Boulder, Colorado. Professora de Somatic Experiencing®. Faixa preta 4o grau de Ki-Aikido.

    2. Pedro Prado, rolfista desde 1980, introdutor do Rolfing® no Brasil e instrutor de Rolfing® Estrutural e Rolfing® Movimento do Rolf Institute, Boulder, Colorado. Psicólogo clínico, mestre em psicologia de abordagem corporal pela Universidade de São Paulo (USP).

    Introdução

    Se você expressar o que está dentro de você,

    Então o que está dentro de você

    Será a sua salvação.

    Se você não expressar o que está dentro de você,

    Então o que está dentro de você

    Irá destruí-lo.

    — The gnostic gospels³

    Por mais de um quarto de século — metade da minha vida — tenho trabalhado para desvendar os vastos mistérios do trauma. Com frequência, colegas e alunos me perguntam como consigo permanecer imerso num assunto tão mórbido quanto o trauma sem ficar completamente esgotado. O fato é que, apesar de ter sido exposto a uma angústia de gelar os ossos e a um conhecimento terrível, me envolvi apaixonadamente e fui nutrido por esse estudo. O trabalho de minha vida passou a ser auxiliar no entendimento e na cura do trauma em suas múltiplas formas. As mais comuns são acidentes de carro, doenças graves, cirurgias e outros procedimentos médicos e dentários invasivos e assaltos, além de experienciar ou testemunhar violência, guerra ou variados tipos de desastres naturais.

    Sou infinitamente fascinado pelo assunto do trauma, e por sua relação intrincada com as ciências físicas e naturais, com a filosofia, a mitologia e as artes. Trabalhar com o trauma me ajudou a compreender o significado do sofrimento, tanto o necessário quanto o desnecessário. Acima de tudo, isso me ajudou a penetrar no enigma do espírito humano. Sou grato por esta oportunidade única de aprender, e pelo privilégio de testemunhar e de participar da profunda metamorfose que a cura do trauma pode trazer.

    O trauma é um fato da vida. Contudo, ele não precisa ser uma condenação perpétua. Não só pode ser curado como, com orientação e apoio adequados, pode ser transformador. Tem potencial para ser uma das forças mais significativas para o despertar e a evolução psicológica, social e espiritual. O modo como lidamos com ele (como indivíduos, comunidade e sociedade) influencia, em muito, nossa qualidade de vida. Em última instância, isso afeta o modo como sobreviveremos como espécie, ou mesmo se sobreviveremos.

    O trauma é tradicionalmente visto como um distúrbio clínico e psicológico da mente. A prática da medicina e da psicologia modernas, embora admita uma conexão entre a mente e o corpo, subestima, em demasia, a profunda relação que ambos têm na cura do trauma. A unidade fundida de corpo e mente que, ao longo dos tempos, formou as bases filosóficas e práticas da maioria dos sistemas tradicionais de cura do mundo infelizmente está faltando em nossa compreensão e tratamento modernos do trauma.

    Durante milhares de anos, os curadores orientais e xamânicos não só reconheceram que a mente afeta o corpo, como a medicina psicossomática reconhece; eles também reconheceram que cada sistema orgânico do corpo tem uma representação no tecido da mente. Os recentes desenvolvimentos revolucionários na ciência neurológica e na psiconeuroimunologia têm estabelecido evidências sólidas da intrincada comunicação mútua entre a mente e o corpo. Ao identificar os complexos mensageiros neuropeptídios, pesquisadores como Candice Pert descobriram muitos caminhos pelos quais a mente e o corpo se intercomunicam. Essa pesquisa de vanguarda ecoa aquilo que a sabedoria antiga sempre soube: cada órgão no corpo, inclusive o cérebro, emite seus próprios pensamentos, sentimentos e alertas e ouve os de todos os outros órgãos.

    A maioria das terapias do trauma aborda a mente pela fala e as moléculas da mente com drogas. Essas duas abordagens podem ser úteis. Contudo, o trauma não é e nunca poderá ser plenamente curado até que nós também levemos em conta o papel essencial representado pelo corpo. Precisamos entender como o corpo é afetado pelo trauma e sua posição central na cura de suas consequências. Sem essa base, nossas tentativas de dominar o trauma serão limitadas e unilaterais.

    Além dessa visão mecanicista e reducionista da vida, existe um organismo que tem sensações e sentimentos, que conhece e vive. Esse corpo vivo, condição que compartilhamos com todos os seres sencientes, nos informa de nossa capacidade inata para nos curar dos efeitos do trauma. Este livro trata do dom de sabedoria que recebemos em consequência de aprender a utilizar e a transformar as energias surpreendentes, primordiais e inteligentes do corpo. Superando a força destrutiva do trauma, o nosso potencial inato agora nos transporta a novos níveis de domínio e de conhecimento.

    Peter Levine

    Escrito no Amtrak Zephyr,

    outubro de 1995

    3.

    Pagels,

    Elaine. The gnostic gospels. Nova York: Random House, 1979. [Em português: Os evangelhos gnósticos. Rio de Janeiro: Objetiva, 2006.]

    Prólogo — Dando ao corpo o que lhe é devido

    Corpo e mente

    Qualquer coisa que aumente, diminua, limite ou amplie o poder de ação do corpo, aumenta, diminui, limita ou amplia o poder de ação da mente. E qualquer coisa que aumente, diminua, limite ou amplie o poder de ação da mente, também aumenta, diminui, limita ou amplia o poder de ação do corpo.

    Espinoza (1632-1677)

    Se você está experienciando sintomas estranhos que ninguém parece ser capaz de explicar, eles podem estar surgindo de uma reação traumática a um acontecimento passado do qual nem você mesmo se lembra. Você não está sozinho. Não está louco. Existe uma explicação racional para o que está lhe acontecendo. Você não foi irreversivelmente danificado, e é possível reduzir ou até mesmo eliminar esses sintomas. No trauma, sabemos que a mente sofre profundas alterações. Por exemplo, uma pessoa que sofreu um acidente de automóvel, num primeiro momento, fica protegida da reação emocional e até da memória e da sensação do que realmente aconteceu. Esses mecanismos admiráveis (isto é, a dissociação e a negação) nos permitem passar por esses períodos críticos, esperando por um momento e um lugar seguros para que esses estados alterados desapareçam aos poucos.

    De modo semelhante, o corpo reage profundamente ao trauma. Ele se tensiona, pronto para agir, se retesa com medo, congela e colapsa cheio de terror. Quando a reação protetora da mente diante da sobrecarga volta ao normal, a resposta do corpo deveria se normalizar. Quando esse processo restaurador é bloqueado, os efeitos do trauma ficam fixados, e a pessoa se torna traumatizada.

    A psicologia tradicionalmente aborda o trauma por seus efeitos na mente. Na melhor das hipóteses, isso é apenas metade da história, e uma metade totalmente inadequada. Não seremos capazes de entender o trauma a fundo ou de curá-lo sem que o corpo e a mente sejam acessados conjuntamente como uma unidade.

    Encontrando um método

    Este livro aborda a resolução dos sintomas traumáticos usando uma abordagem naturalística que desenvolvi nos últimos 25 anos. Não vejo o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) como uma patologia que deva ser gerenciada, suprimida, ou à qual as pessoas devam se ajustar, mas como consequência de um processo natural que foi distorcido. A cura do trauma exige uma experiência direta do organismo que vive, sente e conhece. Os princípios que vou compartilhar com vocês são o resultado do trabalho com clientes e também do acompanhamento de pistas a respeito das origens do trauma. Este estudo me levou aos campos da fisiologia, da ciência neurológica, do comportamento animal, da matemática, da psicologia e da filosofia, entre outros. No início, meus sucessos resultavam de pura sorte e do acaso. À medida que continuei trabalhando com as pessoas, questionando o que havia aprendido, ampliando os limites e penetrando cada vez mais no mistério do trauma, fui capaz de obter sucesso previsivelmente e não apenas por sorte. Convenci-me de que o repertório instintivo do organismo humano inclui um conhecimento biológico profundo que pode e vai guiar o processo de cura do trauma, se tiver oportunidade.

    Uma ênfase crescente em dar atenção a essas respostas instintivas estava curando os clientes, e meu questionamento vinha dando retorno. As pessoas ficavam imensamente aliviadas quando, por fim, entendiam como os sintomas tinham sido criados e aprendiam a reconhecer e experienciar seus próprios instintos em ação.

    A SE é nova e não foi submetida a uma pesquisa científica rigorosa até este momento. O que tenho para dar sustentação à validade desta abordagem são várias centenas de casos individuais em que as pessoas relatam que os sintomas, os quais haviam reduzido sua capacidade de ter uma vida plena e satisfatória, desapareceram ou diminuíram muito.

    Costumo trabalhar num contexto terapêutico individual e, com frequência, também emprego outras modalidades. Obviamente, este livro não substitui o trabalho individual com um terapeuta treinado. Contudo, acredito que muitos dos princípios e da informação presentes aqui podem ser usados para facilitar a cura do trauma. Se você está em terapia, talvez seja interessante compartilhar este livro com seu terapeuta. Se não está, é possível usá-lo para ajudar a si mesmo. No entanto, existem limitações. Você pode precisar da orientação de um profissional qualificado.

    O corpo como curador

    O corpo é a praia no oceano do ser.

    — Sufi (anônimo)

    A Parte I deste livro apresenta o trauma e explica como os sintomas pós-traumáticos começam e se desenvolvem e por que são tão fortes e persistentes. Estabelece uma base de compreensão que afasta a intrincada teia de mitos a respeito do trauma e a substitui por uma descrição simples e coerente dos processos fisiológicos básicos que o produzem. Embora com frequência o nosso intelecto supere nossos instintos naturais, ele não comanda a reação traumática. Somos mais semelhantes a nossos amigos de quatro patas do que gostaríamos de pensar.

    Quando falo de nossos organismos, uso a definição do dicionário Webster: [...] uma estrutura complexa de elementos interdependentes e subordinados cujas relações e propriedades são, em grande parte, determinadas por sua função no todo. O organismo descreve a nossa totalidade, que não deriva da soma de partes individuais — isto é, ossos, substâncias químicas, músculos, órgãos etc. — mas emerge da inter-relação dinâmica complexa dessas partes. Corpo e mente, instintos primitivos, emoções, intelecto e espiritualidade, tudo isso precisa ser considerado conjuntamente ao estudarmos o organismo. O veículo pelo qual experimentamos a nós mesmos como organismo é a sensopercepção. A sensopercepção é um meio por intermédio do qual experienciamos a plenitude da sensação e do conhecimento a respeito de nós mesmos. Você obterá uma compreensão mais clara destes termos quando ler o material e realizar alguns dos exercícios.

    Parte I — O corpo como curador. Apresenta uma visão do trauma e do processo que o cura como fenômeno natural. Aborda a sabedoria inata para a cura que todos nós temos e a integra. Faremos uma jornada a algumas de nossas respostas biológicas mais primitivas. Você sairá da Parte I com uma compreensão maior do modo como o seu organismo opera e de como você pode trabalhar com ele para aumentar sua vitalidade e seu bem-estar, além de ampliar sua valorização geral da vida, quer você tenha sintomas de trauma ou não.

    Nesta parte, há exercícios que o ajudarão a começar a conhecer a sensopercepção por experiência própria. Tais exercícios são importantes. Na verdade, não existe outro modo de transmitir como esse fascinante aspecto do ser humano opera. Para muitas pessoas, entrar no reino da sensopercepção é como entrar numa nova terra estranha, uma terra que elas visitavam frequentemente e nem se incomodavam em observar a paisagem. Quando você ler e experienciar esta parte, descobrirá que já conhece um pouco do que se diz sobre o modo como o seu corpo funciona.

    Parte II — Sintomas do trauma. Descreve, de modo mais aprofundado, os elementos centrais de uma reação traumática, seus sintomas e a realidade em que vive uma pessoa traumatizada.

    Parte III — Transformação e renegociação. Descreve o processo pelo qual podemos transformar nossos traumas, sejam eles pessoais ou sociais.

    Parte IV — Primeiros socorros. Inclui informação prática para ajudar a impedir que o trauma se desenvolva depois de um acidente. Traz também uma breve discussão a respeito do trauma na infância. (Esse assunto será abordado exclusivamente num próximo livro.)

    Acredito que todos nós precisamos entender a informação essencial desta obra. Essa informação aprofunda nossa experiência e compreensão do processo de cura do trauma e nos ajuda a desenvolver um senso de confiança em nosso organismo. Além disso, penso que essa informação é pertinente tanto no nível pessoal quanto no social. A magnitude do trauma gerado pelos acontecimentos que estão afetando o nosso mundo tem um preço para famílias, comunidades e populações inteiras. O trauma pode ser autoperpetuador. O trauma gera trauma e continuará a fazê-lo, cruzando gerações em famílias, comunidades e países, até darmos os passos para conter sua propagação. No momento, o tratamento do trauma em grupos de pessoas ainda está engatinhando. A Parte III inclui a descrição de uma abordagem de cura para ser usada em grupos, que está sendo desenvolvida por mim e por alguns colegas na Noruega.

    Espero que este livro também seja útil para terapeutas treinados, pois com frequência recomendo aos indivíduos que estão trabalhando terapeuticamente consigo mesmos que procurem a ajuda de um profissional capacitado como aliado nesse processo. Poucos psicólogos têm background suficiente em fisiologia para reconhecer as aberrações que podem ser produzidas quando os processos fisiológicos não conseguem seguir um curso natural. No plano ideal, as informações aqui contidas introduzirão novas possibilidades para o tratamento do trauma. A experiência me ensinou que muitas das abordagens atualmente em uso para curar o trauma produzem, no melhor dos casos, apenas um alívio temporário. Alguns métodos catárticos que incentivam um reviver emocional intenso do trauma podem ser danosos. Acredito que, a longo prazo, as abordagens catárticas criam uma dependência da continuidade da catarse e incentivam a emergência das chamadas memórias falsas. Por causa da natureza do trauma, há uma boa chance de que o reviver catártico de uma experiência possa ser traumatizante em vez de curativo.

    A psicoterapia lida com um amplo aspecto de questões e problemas que vão muito além de um único tópico: trauma de choque, o foco deste livro. O choque traumático ocorre quando experienciamos acontecimentos potencialmente ameaçadores à vida que superam nossa capacidade de responder de modo eficaz. Em contraste, pessoas traumatizadas por abuso contínuo na infância, em especial se o abuso ocorreu no contexto familiar, podem sofrer de trauma de desenvolvimento. Este se refere sobretudo a questões com base psicológica, que normalmente são consequência de cuidado e orientação inadequados durante os períodos críticos de desenvolvimento na infância. Embora as dinâmicas que os produzem sejam diferentes, a crueldade e a negligência podem resultar em sintomas que são semelhantes e com frequência entrelaçados com os do choque traumático. Por essa razão, as pessoas que experienciaram trauma de desenvolvimento precisam obter o apoio de um terapeuta para ajudá-las a trabalhar as questões que se entrelaçaram com suas reações traumáticas.

    Acredito que as pessoas, em comunhão com a família e amigos, têm uma capacidade admirável para promover sua própria cura quando o trauma de choque é resultado de um acontecimento isolado ou de uma série de acontecimentos, desde que não haja um histórico consistente de traumas anteriores. Incentivo muito essa prática. Escrevi este livro numa linguagem relativamente não técnica. Ele se dirige também a pais, professores, profissionais que cuidam de crianças e a outros que servem como guias e modelos (de papéis) para elas, a fim de que possam lhes dar um presente de valor incalculável ao ajudá-las a resolver imediatamente suas reações a acontecimentos traumáticos. Além disso, médicos, enfermeiras, paramédicos, policiais, bombeiros, profissionais de resgate e outros que trabalham rotineiramente com vítimas de acidentes e de desastres naturais encontrarão aqui informações úteis, não só para o trabalho que fazem com essas pessoas traumatizadas, mas também para si mesmos. Testemunhar qualquer tipo de massacre humano, em especial quando isso acontece cotidianamente, cobra seu preço e, com frequência, é tão traumático quanto experienciar o acontecimento em primeira mão.

    Como usar este livro

    Dê a si mesmo tempo suficiente para absorver o material à medida que lê o livro. Faça os exercícios sugeridos. Faça-os de modo lento e suave. O trauma é resultado dos impulsos mais poderosos que o corpo humano pode produzir e exige respeito. Você não vai se machucar por passar rápido ou superficialmente pelo material, mas não obterá o mesmo benefício que conseguiria se desse a si mesmo tempo para digerir

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1