A grande história dos mundiais 1970, 1974, 1978, 1982
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Sobre este e-book
A proposta desta série de livros, que cobre todas as Copas, é trazer a história completa dos jogos, as fichas técnicas comentadas em detalhes, minibiografias das equipes vencedoras, os festejos dos campeões; e ainda nos levar por uma viagem deliciosa pelos pôsteres, mascotes e transmissões das partidas. A seção "Enquanto isso, no Brasil..." relata a preparação da seleção brasileira, lembrando desentendimentos, polêmicas e confusões. Fatos curiosos sobre o Brasil no ano de cada Copa situam o leitor no tempo. Nada é deixado de fora em A grande história dos mundiais.
Combinando rigor de pesquisa com o já conhecido estilo agradável e bem-humorado do autor, você vai conhecer novos fatos e relembrar outros tantos sobre o mais popular evento esportivo do planeta: a Copa do Mundo de futebol, essa competição em que um único erro individual põe tudo a perder por quatro anos.
Este e-book é para fanáticos por futebol, como o autor, mas também para curiosos, que poderão conhecer a história do século XX de uma perspectiva inesperada.
A grande história dos mundiais é um gol de placa de Max Gehringer.
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A grande história dos mundiais 1970, 1974, 1978, 1982 - Max Gehringer
Max Gehringer
A GRANDE HISTÓRIA DOS MUNDIAIS
1970, 1974, 1978, 1982
Sumário
9 | MÉXICO | 1970
10 | ALEMANHA | 1974
11 | ARGENTINA | 1978
12 | ESPANHA | 1982
ANTES QUE A BOLA COMECE A ROLAR…
Nenhuma outra competição esportiva se compara à Copa do Mundo. Nenhuma gera tantas histórias, lendas ou infindáveis discussões que vão continuar a ser repetidas e repisadas por décadas a fio. Tal fascínio pode ser explicado por dois motivos.
O primeiro é a periodicidade. Disputadas a cada quatro anos, as Copas possuem um reduzidíssimo número de vencedores. Se houvesse uma Copa por ano, como ocorre com os campeonatos nacionais e estaduais, teríamos quase uma centena de campeões mundiais desde 1930 e ninguém conseguiria mais se lembrar quem venceu quando. Assim como as Copas, os Jogos Olímpicos também são quatrienais, mas as conquistas que entram para a história são principalmente as individuais, e a atenção se concentra no número de medalhas, não importa de que esporte elas venham.
O segundo motivo é o sistema de disputa, por eliminação direta, ou mata-mata. Pode não ser o critério mais justo para se definir um campeão, mas é incomparavelmente o mais emocionante. Das oitavas de final em diante, cada partida é uma decisão, e em todas elas a glória e o drama convivem durante 90 minutos. E surpresas não são tão raras. No futebol, ao contrário do que acontece em qualquer outro esporte coletivo, uma equipe mais fraca pode vencer outra que lhe seja muito superior tecnicamente, o que acontece pelo menos uma vez em cada Copa. Além disso, há o fator humano – um simples erro de um jogador, que resulte na eliminação de seu país, nunca mais poderá ser consertado.
Foram esses dois motivos que me levaram a pesquisar a história das Copas. Mas, além deles, interessei-me também em tentar descobrir fatos pouco conhecidos e curiosos, como, por exemplo, a incrível aventura da delegação do México para chegar ao Uruguai em 1930. Comecei a garimpar dados ainda na era pré-Internet, sempre usando como referência jornais da época, que registraram os fatos no momento em que eles aconteceram.
Fui duas vezes à biblioteca pública de Montevidéu para levantar informações sobre 1930 e 1950, e na Suíça tive acesso ao arquivo do jornal Sport, preciso nos fatos e neutro nas opiniões. Tive apenas a decepção de descobrir, em Zurique, que a FIFA não mantinha em seus arquivos nem as súmulas dos jogos da Copa, nem os relatórios dos árbitros, documentos vitais que ficam em poder das federações dos países-sede dos torneios. O atual site da FIFA, portanto, é uma das fontes possíveis de serem consultadas, mas não é a palavra final, por ter sido construído a partir de outras fontes.
Já em tempos de Internet, muitas hemerotecas digitalizadas se tornaram públicas nos últimos anos, principalmente da Europa, o que me permitiu revisar meus textos e agregar a eles mais uma infinidade de fatos relatados no calor do momento. Tive também a preocupação de procurar em jornais antigos, dentro e fora do Brasil, referências a histórias repetidas através dos anos e aceitas como verdadeiras, como é o caso do gol descalço
de Leônidas em 1938. Com certa decepção, constatei que muitas dessas saborosas histórias foram, simplesmente, invenções de jornalistas brasileiros interessados em turbinar a venda de seus periódicos. Aprendi muito, também, nas reuniões do Memofut, um grupo cujo objetivo é preservar a memória do futebol e que se reúne mensalmente no auditório do Estádio do Pacaembu. Lá descobri que, por mais que um apresentador saiba sobre um assunto, tem sempre alguém na plateia que sabe alguma coisinha a mais.
Em 2006, publiquei pela primeira vez meus textos na revista Placar (A Epopeia da Jules Rimet, em nove fascículos que cobriam as Copas de 1930 a 1970). Fiquei orgulhoso por esse trabalho ter merecido uma coluna no prestigioso site da BBC de Londres, embora não pelo motivo que eu gostaria – o irado repórter me desancou por eu ter afirmado que a Inglaterra venceu a Copa de 1966 com um gol inexistente e outro irregular na prorrogação, além de outras benevolências da arbitragem no decorrer da competição.
Em 2010, publiquei o Almanaque dos Mundiais pela Editora Globo, mas com somente 20% do material de que dispunha. Meu camarada Celso Unzelte ficou encarregado de tesourar a obra para que ela coubesse em um livro impresso, um trabalho que declinei de fazer, já que autores se recusam até a suprimir uma vírgula dos textos que escrevem, quanto mais páginas inteiras deles.
Eu já havia me convencido de que meu material integral jamais viria a público, dada a impossibilidade de encaixá-lo em livros analógicos (no total, são perto de 7 mil páginas), quando surgiu o milagre do e-book – no qual, ao contrário do que ocorre em outros departamentos, tamanho não é documento. Assim, com o apoio da e-galáxia, pude finalmente trazer a público mais de vinte anos de pesquisas, com todos os pontos e vírgulas intactos.
Antes de passarmos ao que interessa, uma breve explicação quanto ao formato. Cada Copa está dividida em quatro blocos. No primeiro, é mostrado como o país-sede ganhou o direito de promover a fase final e alguns detalhes específicos relacionados a ela (o pôster, a música oficial, as mascotes, os estádios e suas capacidades, as transmissões por rádio e televisão, os investimentos etc.).
No segundo bloco, é contada em detalhes a história das Eliminatórias. Fui fundo nessa parte (normalmente citada somente de passagem), porque, a partir da década de 1960, quando a quantidade de países inscritos passou a ser muito maior que o número de vagas oferecidas, as Eliminatórias assumiram um papel de pequena Copa
para a maioria das nações do mundo, aquelas cujas chances de classificação são remotas ou nulas, e cuja glória muitas vezes consiste em conseguir uma única vitória nas partidas eliminatórias. Ou mesmo um único lance, como no caso do gol-relâmpago de San Marino contra a Inglaterra em 1993.
No terceiro bloco (Enquanto isso, no Brasil
), está o relato da preparação da seleção brasileira, não raramente cercada por desentendimentos, polêmicas e confusões. Esse bloco se inicia com uma lista de dados, fatos e curiosidades sobre o Brasil no ano da Copa, para que o leitor possa se situar melhor no tempo e, dependendo da idade, relembrar coisas de sua infância.
O quarto bloco é o que se convencionou chamar de a Copa
– a fase final do torneio. A separação é feita por grupos, com a sequência cronológica de jogos em cada um deles. Na abertura, há um quadro mostrando o retrospecto dos países que compõem cada grupo. No exemplo a seguir, referente ao Grupo 2 da Copa de 1974, a primeira coluna mostra que o Brasil já havia disputado nove Copas, a Iugoslávia cinco, a Escócia duas e o Zaire nenhuma. Nas colunas seguintes, vê-se que o Brasil disputara 38 jogos nos nove torneios anteriores, com 26 vitórias, cinco empates e sete derrotas, marcando 103 gols (GF) e sofrendo 49 (GC).
A seguir, são mostradas as fichas técnicas de todos os jogos, com comentários sobre cada um deles (mais longos nos casos dos jogos do Brasil). Na primeira faixa da ficha há três números, como se vê no exemplo abaixo. O do canto direito, indica a ordem cronológica da partida desde a primeira Copa, em 1930. Brasil e Zaire disputavam então a partida de número 250 da história. Os números menores, após os nomes dos países, mostram que aquela era a 41a partida do Brasil e a 3a do Zaire.
250
Na parte final do quarto bloco, são apresentadas minibiografias do artilheiro, do juiz da final e dos jogadores da equipe campeã, além das repercussões da Copa no Brasil, com as costumeiras lamentações e acusações nas derrotas e os grandes festejos nas vitórias.
Estes e-books encerram o assunto? Nem de longe. É provável que existam alguns enganos (sempre existem, para desespero dos autores) e há informações que poderão ser acrescentadas, mas que só irei descobrir quando novas hemerotecas internacionais forem disponibilizadas pela Internet. A história das Copas jamais terá fim, e este é só o começo.
Já que você foi condescendente e leu até aqui, aguente, por gentileza, este derradeiro parágrafo. Muita gente me pergunta por que resolvi escrever sobre futebol, posto que me tornei mais ou menos conhecido por discorrer na mídia sobre carreiras e empregos. A resposta é simples. Eu comecei a me interessar pelo futebol em geral – e pelas Copas em particular – pelo menos dez anos antes de pensar em ingressar no mercado de trabalho. E não creio estar cometendo nenhuma heresia ao confessar que discuto futebol com muito mais paixão do que discuto currículos. Espero que os fanáticos por Copas como eu possam apreciar a leitura com a mesma satisfação que me dediquei às pesquisas e à redação.
Boa leitura!
MÉXICO 1970
A mais perfeita campanha da história das Copas
O México
O território onde atualmente se localiza o México tem uma longa história. Há dez mil anos, seus primitivos habitantes começaram a cultivar o milho, ainda hoje o alimento nacional do país, especialmente na forma de tortillas. Várias civilizações surgiram através dos tempos, sendo olmec e maia as primeiras de que se tem conhecimento. Mais tarde, povos guerreiros vindos do deserto ao Norte dominaram a maior parte da região, e um deles tinha o nome mexica. No início do século
xix
, o naturalista alemão Alexander von Humboldt propôs, para simplificar as coisas, que os inúmeros povos que habitaram o vasto território fossem agrupados sob a denominação genérica de aztec (da região em Aztlán)
Após a descoberta da América, os conquistadores espanhóis pulverizaram as culturas nativas. De 1521 a 1810, a região – incluindo o Caribe – foi chamada de Nova Espanha. Mesmo após sua independência em 1821, o México continuou a ser depredado. Total ou parcialmente, pertenciam ao México até a década de 1840 as terras de seis dos atuais estados americanos (Texas, Califórnia, Arizona, Utah, Nevada e New México), que perfazem uma área conjunta de dois milhões de Km² – igual à do México atual. Somente em 1855 o território mexicano assumiu sua forma presente, com 1.958 mil km², um pouco maior que o Estado do Amazonas, que tem 1.570 mil. O nome oficial do México, desde 1823, é Estados Unidos Mexicanos.
Em 1970, a população do México era de 48 milhões, dos quais quase 6,9 milhões viviam na Capital, a Cidade do México, e outros dois milhões em seus subúrbios. A diferença de fuso horário em relação ao Brasil era de três horas a menos no México. A temperatura no horário dos jogos variou entre 17 e 20o C na Cidade do México, e entre 21 e 25o C em Guadalajara. O peso, moeda local, era cotado a 101 pesos por dólar, e a 22 pesos por cruzeiro.
Arriba Mejico!
Em 23 de junho de 1950, no 27o Congresso da
fifa
em Petrópolis–RJ, o México manifestou pela primeira vez a intenção de promover uma Copa. A vontade ficou por aí mesmo até junho de 1958, quando dirigentes mexicanos aproveitaram a Copa disputada na Suécia para iniciar sua determinada campanha visando sediar a Copa de 1970.
Em 1961, a Argentina entrou no páreo alegando que merecia ter a preferência da
fifa
, já que desde o final da década de 1930 vinha tentando emplacar a realização de uma Copa. Guillermo Cañedo, presidente da federação mexicana, não se abalou com essa possível concorrência, e em setembro de 1961 externou seu otimismo ao declarar que o México iria contar com todos os votos da
concacaf,
que seria formalmente constituída dali a alguns dias (e cuja formação havia sido uma iniciativa dos próprios mexicanos), e também com a maioria dos votos europeus, que já estariam compromissados.
Em maio de 1962, no Congresso Extraordinário da
fifa
realizado em Santiago, simultâneo à Copa do Chile, foram oficialmente protocoladas as candidaturas de Argentina e México para a promoção da Copa de 1970. Os dirigentes argentinos, que tinham o apoio da confederação sul-americana (desta vez, com o Brasil se engajando abertamente na causa portenha), haviam passado quase um ano fazendo contatos fora das Américas e se sentiram suficientemente amparados para formalizar sua candidatura. Ao mesmo tempo, um terceiro postulante, a Indonésia (então com 93 milhões de habitantes), lançou um balão-de-ensaio para testar a adesão que receberia no continente asiático, mas desistiu de concorrer ao perceber que não seria muita.
Em setembro de 1963, Raúl Colombo, presidente da associação de futebol da Argentina, obteve o aval de Arturo Illia, recém eleito presidente da república que tomaria posse no mês seguinte, para empreender todos os esforços possíveis no sentido de trazer o mundial para o país. Os argentinos, porém, tiveram uma primeira decepção em 18 de outubro de 1963, quando o Comitê Olímpico Internacional, reunido na cidade–spa de Baden-Baden na Alemanha, escolheu a Cidade do México para sede dos Jogos Olímpicos de 1968. Os outros postulantes eram Buenos Aires, Lyon e Chicago, e os argentinos contavam com o possível veto do Comitê Olímpico à altitude do México, que induziria a
fifa
a adotar o mesmo argumento para negar a Copa aos mexicanos.
Em 1963 e 1964, dirigentes da
fifa
visitaram a Argentina e o México para vistoriar as instalações existentes e ouvir as tradicionais promessas de construções e reformas de estádios. Como seria de se esperar, tanto a imprensa argentina quanto a mexicana publicaram que seus países haviam recebido plenas garantias de que a decisão, em favor de um e de outro, já estaria sacramentada. A se julgar pelas notícias neutras, porém, tudo indicava que o páreo somente iria ser decidido bem perto da linha de chegada.
A Hora da Verdade
Em 9 de outubro de 1964, o 34o Congresso da
fifa
se reuniu no Metropolitan Festival Hall, o centro cultural e musical de Tóquio, e a plateia lotou o auditório – dos 126 países filiados, 95 enviaram representantes para participar da eleição do país-sede da Copa de 1970. Ao início dos trabalhos, o mexicano Josué Sáenz e o argentino Miguel Pisano dispuseram de meia hora cada para discorrer sobre as vantagens oferecidas por seus países. Sáenz fez sua enxuta apresentação em 18 minutos, enquanto Pisano consumiu todo o tempo concedido e mais alguns acréscimos.
A favor do México, pesavam a presença do país em todas as fases finais de Copas, exceto a de 1938 (e da ‘meia participação’ em 1934), e as condições oferecidas para a realização do torneio – rede hoteleira suficiente, estádios disponíveis e infraestrutura já pronta. Além disso, um novo e moderno estádio, o Azteca, com capacidade para mais de 100 mil pessoas, estava em construção desde 1961 e seria inaugurado em maio de 1966. Contra o México, havia apenas o argumento da falta de oxigênio nos 2.238m de altitude da Cidade do México, que poderia provocar desmaios e outros males súbitos nos jogadores.
Embora esse fator já tivesse perdido parte do impacto com a escolha da Cidade do México para sede dos Jogos Olímpicos de 1968, Josué Sáenz fez questão de apresentar depoimentos de especialistas em medicina esportiva, atestando que a altitude funcionava a favor do futebol e não contra. Isso porque, com o ar mais rarefeito, os atletas corriam e saltavam mais. E a bola, devido ao menor atrito, ganhava mais velocidade.
Só havia um inconveniente: a exaustão vinha mais rapidamente, e por isso os atletas teriam que chegar ao México com, pelo menos, vinte dias de antecedência para a necessária adaptação orgânica. Como perto de 90% dos jogadores que estariam na Copa atuavam em seus próprios países em 1970 (no caso do Brasil, 100%), requisitá-los com a necessária antecipação não seria problema para as federações nacionais de futebol.
Pelo lado da Argentina, Miguel Pisano preferiu discorrer sobre a tradição futebolística de seu país, da existência de estádios em profusão, e enfatizou (por duas vezes) que qualquer investimento eventualmente necessário seria feito sem dificuldades, com total suporte do governo. Pisano somente provocou murmúrios irônicos da plateia quando mencionou ‘a estabilidade política e social’ da Argentina, algo que os presentes sabiam não ser verdade.
Ao encerrar sua apresentação, Pisano solicitou que a votação fosse aberta, e não secreta, e seu pedido foi aprovado. Os delegados foram convidados a declarar seus votos de viva voz, e dali a uma hora a Argentina se viu novamente preterida – com 56 votos a favor, 32 desfavoráveis e 7 abstenções, o México ganhou o direito de sediar a 9a Copa do Mundo.
Como Guillermo Cañedo havia antecipado, pesaram consideravelmente os votos da
concacaf
(só o Panamá roeu a corda), mas os mexicanos conseguiram arrebanhar também a maior parte dos votos africanos, um grupo que, de repente, havia se tornado uma força considerável nas eleições da
fifa
. No primeiro dia do Congresso, haviam sido oficialmente admitidos 16 países da região (até então, eram apenas seis), e todos os calouros receberam o direito de votar na escolha do país-sede no terceiro dia.
A Argentina foi apoiada pelos países da América do Sul, que tinham pouca representatividade numérica, e pelos asiáticos, mas não integralmente. As nações da Europa Ocidental, o maior contingente votante, garantiram a vitória do México, mesmo com cinco abstenções. Um dos três países europeus que votaram contra o México foi a Inglaterra (os outros dois foram Irlanda e Malta), e durante a Copa a torcida mexicana não iria perdoar essa desfeita dos ingleses, já que o México havia sido um dos primeiros países a apoiar a candidatura da Inglaterra para sediar a Copa de 1966.
Depois da eleição, Miguel Pisano declarou-se ‘sorprendido y amargado’ com o inesperado drible que levou dos países da Europa. Entrevistado em Buenos Aires apenas uma semana antes, Pisano tinha dado como ‘seguros’ 18 dos 29 votos europeus (sendo que 13 federações haviam se compromissado por escrito, e cinco verbalmente), mas na hora do vamos ver só obteve três.
Mantendo o compromisso assumido com o bloco sul-americano, o Brasil votou na Argentina, mas o delegado brasileiro Luís Murgel foi politicamente hábil para garantir de imediato ao mexicano Guillermo Cañedo qualquer tipo de apoio que o México necessitasse.
A votação por confederação foi: EUROPA (29 votos): 21 para o México, 3 para a Argentina e 5 abstenções (Suíça, Bélgica, Espanha, França e Chipre); ÁFRICA (22 votos): 16 para o México, 4 para a Argentina e duas abstenções (Egito e Costa do Marfim); ÁSIA (20 votos): 14 para a Argentina e 6 para o México;
concacaf
(13 votos): 12 para o México, 1 para a Argentina; AMÉRICA DO SUL (9 votos): todos para a Argentina; OCEANIA: (2 votos): um a um.
De qualquer forma, os argentinos não sairiam de Tóquio de mãos abanando. Assim que o México foi anunciado como vencedor da votação, a
fifa
informou que a Copa de 1978 deveria ser realizada na Argentina. Não era ainda uma decisão oficial, mas o aval explícito da entidade acabaria por espantar outros postulantes.
Sem Concorrência
De todos os países que tinham o futebol como paixão nacional, o México era um dos menos afortunados em termos de prestígio mundial. Um dos motivos era a falta de concorrência – nas Américas Central e do Norte, os mexicanos nunca tiveram adversários de respeito. Assim, a Copa de 1970 seria a grande oportunidade para o México mostrar ao mundo que, dentro de campo, poderia ser mais que um coadjuvante.
Já fora do campo, o México não tinha problemas. O Comitê Organizador da Copa seria presidido por Guillermo Cañedo e contaria com a participação do suíço Hans Bangerter, então secretário-geral da UEFA. A presença dominante, entretanto, seria a do milionário Emilio Azcárraga, 40 anos, dono de um clube (o América), cabeça do consórcio que havia construído o Estádio Azteca na Cidade do México e principal executivo do conglomerado de telecomunicações de sua família, o Telesistema, que em 1973 mudaria o nome para ‘Televisa’. Não por acaso, Guillermo Cañedo era um dos principais executivos do Telesistema, então a maior rede de rádio e televisão da América Latina.
Os Estádios
O público total da Copa foi de 1.603.975 pagantes (média de 50.924 por jogo). Cinco estádios foram utilizados e o Jalisco, em Guadalajara, foi o único a ser reformado e ampliado.
O Estádio Azteca custou 17,5 milhões de dólares para ser construído (equivalentes a 147 milhões de dólares de 2020), inteiramente bancados pela milionária família Azcárraga. Sua construção levou cinco anos, de 1961 a 1966, e foi o primeiro estádio do mundo a ter camarotes que pareciam apartamentos de hotel de luxo: 900 unidades, acomodando doze pessoas cada, com cozinha, chuveiro, banheira, terraço e estacionamento (rampas permitiam que três carros fossem estacionados à porta de cada camarote). Após as reformas feitas no Maracanã na década de 1990 com a eliminação das gerais em pé, o Azteca iria se tornar o maior estádio de futebol das Américas em capacidade de público.
No jogo inaugural do Azteca em 25 de maio de 1966, um amistoso entre América do México e Torino, os dois primeiros gols no estádio foram marcados por brasileiros (ambos baianos), que defendiam o América – Arlindo e Zague. Autor do gol de abertura aos 27’ do 1o tempo, Arlindo dos Santos tinha começado no Vitória, passou pelo Itabuna e em 1957, aos 17 anos, foi contratado pelo Botafogo e ficou no Rio até 1965, quando se transferiu para o futebol mexicano. Voltou ao Brasil em 1971, mas retornaria definitivamente à Cidade do México em 1985, tornando-se funcionário público da Procuradoria de Justiça.
O Estádio Jalisco, em Guadalajara, começou a ser levantado em 1956 e foi finalizado em 1960. Sua construção visava resolver o recorrente problema de superlotações que o clássico da cidade, entre o Atlas e o Chivas, provocavam no antigo estádio do Parque Oblatos, que comportava apenas 10 mil espectadores. O jogo inaugural foi disputado em 31 de janeiro de 1960 entre o Atlas e o San Lorenzo de Almagro, cabendo ao ponteiro esquerdo argentino Norberto Boggio balançar as redes pela primeira vez (Boggio tinha participado de um jogo da seleção argentina na Copa de 1958, contra a Irlanda do Norte). Para a Copa de 1970, foi adicionado um novo anel nas arquibancadas, que aumentou a capacidade em 20 mil espectadores, ao custo de 50 milhões de pesos (500 mil dólares).
O estádio de Puebla foi projetado pelo mesmo arquiteto que projetou o Estádio Azteca, Pedro Ramírez Vázquez (1919–2013). O nome do imperador Cuauhtémoc, que reinou no século XVI, significa ‘águia que pousa’ e relembra a história ancestral do México, embora tenha sido dado ao estádio por motivos bem mais contemporâneos: a Cervejaria Cuauhtémoc, sediada em Puebla, havia sido a maior doadora de recursos para que a prefeitura da cidade tocasse a obra. Em 1968, ano da inauguração do estádio, o FC Puebla, principal clube local, estava na segunda divisão mexicana, e iria subir para a primeira em 1970.
Apelidado ‘La Bombonera’, o estádio de Toluca era o menor e o mais antigo da Copa, já com 16 anos de funcionamento. Hospedou apenas quatro jogos, mas, por artes da tabela, acabou recebendo a fatídica partida em que a Itália eliminou o México. Durante sua história o estádio teve vários nomes, e em 1970 chamava Luís Gutiérrez Dosal, presidente do Deportivo Toluca que havia falecido em 1959.
O Estádio León no estado de Guanajuato, no centro do país, tinha o apelido de ‘Nou Camp’ em homenagem ao Barcelona, por razões nunca devidamente esclarecidas. Custou 12,5 milhões de dólares (equivalentes a 100 milhões de dólares de 2020) e foi inaugurado em fevereiro de 1967, com um jogo amistoso entre Santos e River Plate. O Santos venceu por 2 a 1, mas o primeiro gol do estádio foi marcado pelo argentino Daniel Onega aos 42’ do 1o tempo, num chute desviado que passou entre as pernas do goleiro Gilmar. A preferência da Alemanha por León para sua sede deveu-se ao fato de que a cidade tinha uma considerável colônia alemã cujo tamanho permitia até a circulação de um jornal diário inteiramente redigido em alemão, exceto por seu título, El Sol de León.
As cinco cidades que acolheram jogos ficavam na metade inferior do território mexicano e se situavam a convenientes distâncias da capital (a mais distante, Guadalajara, estava a 466 km da Cidade do México). Três cidades localizadas na metade superior do mapa, e com populações maiores que as sedes de Toluca e León, foram preteridas na seleção final – Ciudad Juárez, Tijuana e Monterrey. As duas primeiras não dispunham de estádios adequados, mas Monterrey tinha dois: o Estádio Universitário, inaugurado em 1967 e que comportava 50 mil espectadores, e o Estádio Tecnológico, inaugurado em 1950, com capacidade para 35 mil espectadores. O ‘problema’ de Monterrey era sua altitude – apenas 540 metros – que presumivelmente causaria transtornos fisiológicos às equipes classificadas nas Oitavas e depois teriam que enfrentar a mudança súbita de altitude.
A Bola Bicolor
A Adidas fabricou especialmente para a Copa as bolas Telstar, de 32 gomos pentagonais – metade pretos, metade brancos. As bolas utilizadas em todas as Copas, até 1966, tinham uma única cor (ou brancas, ou variando do marrom ao laranja). Mas bolas bicolores não eram novidade em 1970. Elas haviam sido usadas pela primeira vez no campeonato alemão da temporada 1962–63 a pedido das emissoras de televisão, para melhor contraste nas transmissões (num amistoso em maio de 1963 em Hamburgo, o Brasil tinha vencido a Alemanha por 2 a 1, com bolas de gomos pretos e brancos).
Em 1966, a International Board havia consultado as federações filiadas à
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sobre as eventuais vantagens da bola de duas cores, e as respostas não foram animadoras – muitos jogadores reclamaram que elas mais confundiam do que ajudavam. Em junho de 1969, a federação mexicana, que já vinha utilizando a bola preta e branca em seu campeonato, sugeriu ao Comitê Organizador sua adoção também na Copa, e a proposta foi aceita. A seleção brasileira travou seu primeiro contato com as novas bolas Telstar fornecidas pela Adidas num treino em março de 1970, com reprovação inicial da maioria dos jogadores de linha (‘são muito leves’) e dos goleiros Félix, Ado e Leão (‘mudam de direção’).
Visualmente, porém, a bola era tão chamativa que se tornou o próprio símbolo da Copa. A palavra Telstar ainda era na época sinônimo de ‘avanço científico’ – foi o nome do primeiro satélite de comunicações, lançado pelos Estados Unidos em julho de 1962, que permitiu a pioneira transmissão de televisão entre América do Norte e Europa.
O sucesso tecnológico foi popularizado numa música instrumental, Telstar, gravada pelo conjunto londrino The Tornadoes, que em dezembro de 1962 chegou ao primeiro lugar das paradas inglesas e americanas com seu som ‘cósmico’ extraído de um teclado eletrônico, precursor dos sintetizadores.
O Pôster e a Canção
O pôster da Copa – um clássico do design mundial – mostrava apenas a bola vazada em alto contraste e a inscrição ‘Mexico 70’ em letras formadas por três linhas concêntricas que haviam sido criadas pelo artista americano Lance Wyman para compor o nome ‘Mexico 68’ nos
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Jogos Olímpicos. Wyman, 33 anos, que residia no México desde 1966, seria também o responsável pela composição gráfica do pôster de 1970.
Numa época em que ainda não havia a música oficial da Copa, a canção não-oficial foi Fútbol Mexico 70 Motto-Contínuo, composta por Roberto Nascimento, 30 anos, violonista brasileiro que tinha dirigido e musicado shows de teatro no Rio de Janeiro na década de 1960, e que residia no México desde julho de 1967. A interpretação ficou a cargo do grupo Hermanos Zavala, prolífica irmandade de seis homens e seis mulheres, em que estas cantavam e aqueles tocavam. Fora do território mexicano, entretanto, a música praticamente não teve divulgação nem repercussão na época.
Após passar dez anos no México, Roberto Nascimento retornou ao Rio de Janeiro em 1977 para retomar sua carreira em shows de teatros cariocas e dar aulas particulares de violão. Em 1986, lançou uma nova composição para a Copa daquele ano na Espanha, O Mundo é Verde e Amarelo, cantada em coro pelos jogadores da seleção brasileira.
A Violência e o Juanito
As Copas do Chile e da Inglaterra haviam mostrado que o futebol estava perigosamente descambando para a força bruta, e a violência vinha aumentando a cada ano. Em outubro de 1969, o Milan da Itália e o Estudiantes da Argentina haviam disputado o título mundial interclubes e os dois jogos – e, principalmente, o de Buenos Aires – tinham degenerado em pura pancadaria. A crescente violência iria fazer com que o tricampeão europeu de 1971–72–73, o Ajax da Holanda, desistisse da disputa intercontinental em 1971 e 1973, exemplo que seria seguido pelo Bayern de Munique, campeão europeu de 1974.
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temia que, na Copa de 1970, os mais fortes e sanguinários fossem prevalecer sobre os mais técnicos e artísticos, e talvez por isso o Comitê Organizador optou por uma mascote ‘inocente’ para a Copa – o garotinho Juanito, de sombrero e uniforme da seleção do México. Apresentado à mídia em 20 de junho de 1969, Juanito surpreendeu os membros do Comitê – foi bem aceito em todo o mundo, mas teve forte rejeição doméstica. Gordinho, com jeito inofensivo, barriguinha saliente, umbigo à mostra e uma expressão de quem tinha acabado de acordar da siesta, Juanito representava exatamente o modo como o povo mexicano não queria ser visto.
O nome do autor do desenho não foi revelado pelo Comitê Organizador, e imediatamente artistas de renome do México, filiados ao Instituto Nacional de Belas Artes, saíram disparando críticas ferozes a Juanito, que iam de ‘caricatura idiota’ a insultos como ‘estúpido’, ‘de mau gosto’ e ‘vergonhoso’, o que fazia pressupor que nenhum artista famoso esteve envolvido na criação. Uma pista foi dada por Jorge Malo, um dos assistentes da comissão que escolheu o desenho. Segundo Malo, Juanito havia sido decalcado da ilustração de um prato decorativo de madeira que o presidente da comissão, Manuel Sánchez Lugo, e alguns de seus colegas, haviam visto e apreciado dias antes. Como o prato não era assinado, o criador original de Juanito nunca seria identificado.
Três meses antes da Copa, para amenizar as críticas a Juanito, outra mascote foi apresentada – a águia Pico, símbolo de garra e determinação. Também obra de Lance Wyman, a águia estilizada teve efeito inverso ao de Juanito – foi apreciada no México e ignorada fora dele.
As Datas
A Copa de 1966 havia sido disputada num período de vinte dias, de 11 a 30 de julho. Como houve reclamações de grandes clubes europeus devido ao curto tempo disponível para a pré-temporada antes do início dos campeonatos nacionais (que iniciavam em agosto), a Copa de 1970 foi programada para começar e terminar bem antes – de 24 de maio a 14 de junho (22 dias no total). Em março de 1967, o presidente da
uefa
, o suíço Gustav Wiederkehr, solicitou uma alteração de uma semana e foi atendido pela
fifa
, com a Copa sendo definitivamente marcada para o período de 31 de maio a 21 de junho.
ELIMINATÓRIAS
Em 15 de dezembro de 1967, 132 países estavam filiados à
fifa
. Desses, 69 se inscreveram dentro do prazo para disputar as Eliminatórias, que iriam de abril de 1968 a dezembro de 1969. Na reunião do Comitê Organizador em Casablanca no Marrocos em 31 de janeiro de 1968, os concorrentes foram separados em 14 grupos. Para efeito do sorteio posterior das chaves da fase final, a
fifa
considerou os dois pré-classificados – a Inglaterra, campeã em 1966, e o México, o país-sede – como sendo os grupos 9 e 14 das Eliminatórias. Mesmo não tendo que disputar as Eliminatórias, Inglaterra e México também tiveram que fazer suas inscrições até dezembro de 1967 para serem considerados ‘habilitados’, recolhendo à
fifa
a mesma taxa de todos os participantes – mil francos suíços (460 dólares da época).
Dos 16 finalistas da Copa, nove seriam europeus – a Inglaterra e mais oito vagas que seriam disputadas por 29 países (a Albânia seria o 30o, mas teve sua inscrição rejeitada pela
fifa
por tê-la enviado fora do prazo). A América do Sul teria direito a três vagas para dez países. As Américas Central e do Norte, a duas vagas – a do anfitrião México e mais uma a ser disputada por doze países. A África, a uma vaga para onze países. E a Ásia/Oceania (mais Israel), a uma vaga para sete países. Com uma única desistência – da Coreia do Norte, no grupo asiático – 68 países foram a campo.
Nas Eliminatórias para a Copa de 1966, haviam sido disputadas 127 partidas. Para as de 1970, estavam programadas 167 (que chegariam a 172, com os jogos extras), e 542 gols foram marcados, com boa média de 3,2 gols por jogo. No total, compareceram aos estádios 4.808.274 espectadores, média de 28 mil por jogo.
A Copa de 1970 iria apresentar uma grande mudança em relação às anteriores – a permissão para as substituições do goleiro e de mais dois jogadores, medida que foi colocada em prática já nas Eliminatórias. E seu nome – a Regra 3 – caiu na boca do povo. Em 1971, Vinícius & Toquinho compuseram e interpretaram uma canção falando da ‘substituta’: ‘Tantas você fez que ela cansou / Porque você, rapaz / Abusou da regra três...’
EUROPA – 29 países, 8 vagas
Para insatisfação da
uefa
, o futebol europeu ‘perdeu’ uma vaga em relação a 1966, quando teve dez participantes (a anfitriã Inglaterra e mais nove qualificados). Em 1970, teria nove (a campeão Inglaterra e mais oito países que sairiam das Eliminatórias). Já estava em discussão na
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o aumento de países na fase final, de 16 para 20 ou 24, mas essa necessária medida ainda levaria doze anos para ser adotada.
Foram formados oito grupos (cinco com quatro países, e três com três países), que teriam como cabeças as seleções europeias que haviam participado da Copa de 1966, exceto a que obteve a pior classificação – a Suíça, que entrou no bloco ‘intermediário’ de 16 países. Em seguida, os cinco países considerados ‘fracos’ – Grécia, Dinamarca, Finlândia, Chipre e Luxemburgo) foram sorteados em cinco grupos. O bloco seguinte, o dos ‘intermediários’, foi sorteado sem preocupações geográficas, dois países para cada grupo. Quem se saiu melhor foi a Itália, que teria a companhia de dois adversários que não assustavam em um dos grupos com apenas três países.
Grupo 1
PORTUGAL, SUÍÇA, ROMÊNIA, GRÉCIA
Inicialmente, a equipa de Portugal era a favorita, graças ao terceiro lugar obtido na Copa de 1966. A seleção continuava a ser comandada pela dupla de treinadores José Maria Antunes, o selecionador, e pelo brasileiro Oto Glória, o técnico de campo. Porém, já em 1967, o sinal de alerta disparou quando os portugueses não conseguiram uma das 16 vagas para o campeonato europeu de seleções. Pior ainda, tinham sido eliminados ainda na fase classificatória pela Bulgária, que Portugal havia facilmente batido na Copa de 1966. O inesperado fiasco gerou imediatas e acaloradas discussões sobre a necessidade de renovar a seleção, embora todos os heróis de 1966 continuassem em ação por seus clubes.
Nas Eliminatórias para 1970, os adversários de Portugal seriam a Suíça, que também havia conservado praticamente a mesma equipe mediana que disputou sem sucesso a Copa de 1966, a Grécia, sempre uma incógnita, e a jovem equipe da Romênia, que não participava de uma Copa desde 1938. Não pareciam ser adversários capazes de amofinar os lusitanos e o tom das críticas aos veteranos amainou em maio de 1968, cinco meses antes do início das Eliminatórias, quando o Benfica mostrou sua força ao chegar à Final da Copa dos Campeões da Europa (perdeu para o Manchester United por 4 a 1 na prorrogação, após empate por 1 a 1 no tempo normal).
No jogo de abertura do grupo, a Suíça venceu a Grécia em Basel por 1 a 0, gol do ponteiro esquerdo René Quentin com um balaço de dez metros no alto do canto direito aos 21’ do 1o tempo. Na segunda partida, com seis jogadores remanescentes de 1966 – Hilário, Jaime Graça, Coluna, José Augusto, Eusébio e Simões – os portugueses estrearam em Lisboa com uma vitória de 3 a 0 sobre a Romênia, mas dependeram da ajuda de sua retaguarda para construir o marcador. O zagueiro Jacinto Santos, 28 anos, do Benfica, marcou duas vezes, com dois disparos da entrada da área, e o terceiro gol foi feito pelo ponteiro esquerdo angolano Jacinto João, vulgo ‘JJ’, 25 anos, jogador do Vitória de Setúbal. Depois desse jogo, ninguém apostaria um tostão furado que a Romênia iria para a Copa e que Portugal terminaria o grupo num humilhante último lugar.
Em Bucareste, os romenos se recuperaram ao bater a Suíça por 2 a 0, com dois gols no 2o tempo – Florea Dumitrache aos 14’ e Flaviu Domide aos 28’. O jovem e talentoso Dumitrache, 20 anos, do Dínamo de Bucareste, era então considerado a maior promessa da história do futebol romeno, mas uma contusão o impediu de participar da estreia contra Portugal. Sem ele, o ataque romeno não tinha funcionado, gerando a falsa impressão de que a linha defensiva de Portugal era forte e confiável.
Em 11 de dezembro de 1968, a realidade veio à tona. Os portugueses foram a Atenas enfrentar a Grécia, no primeiro encontro da história entre os dois países. O ataque português era o mesmo da Copa de 1966, com os benfiquistas José Augusto, Eusébio, Torres, Coluna e Simões. Também continuavam na equipe os zagueiros Hilário e José Carlos, ambos do Sporting. No gol, porém, atuou Américo Lopes, do FC Porto, terceiro reserva em 1966, que disputou em Atenas sua 19ª e última partida pela seleção – num gramado pesado e encharcado, Portugal sofreu uma surpreendente goleada de 4 a 2.
No início, tudo pareceu normal quando José Augusto abriu o marcador aos 18’, mas os gregos viraram ainda no 1o tempo (Dimitris Papaioannou aos 33’ e Giorgios Dedes aos 38’). Na etapa final, o grande (de 1m94) centroavante lusitano José Torres marcou logo aos 3’, mas contra suas próprias redes, cabeceando no ângulo direito quando tentava auxiliar sua retaguarda. Aos 17’, Giorgios Sideris aumentou para 4 a 1 e Eusébio diminuiu o tamanho do vexame dois minutos depois. Dali em diante, o jogo ficou violento e dois zagueiros foram expulsos, um de cada lado – Jacinto Santos e Aristidis Kamaras.
Com os quatro países empatados (uma vitória e uma derrota cada), o grupo 1 entrou em um recesso de quatro meses e as preocupações portuguesas só iriam aumentar durante esse período. Dois importantes jogadores decidiram abdicar da seleção – o ponteiro José Augusto, 32 anos, e o armador Mario Coluna, 31. Aos 27 anos, Eusébio permanecia na equipe, mas sua fase não era das melhores. Na temporada 1968-69, pela primeira vez em seis anos, Eusébio não iria se sagrar artilheiro do campeonato português (fez apenas dez gols em 21 jogos, contra espantosos 42 gols em 24 jogos na temporada anterior).
O caldo entornou de vez em 16 de abril de 1969, quando Portugal recebeu a Suíça no Estádio José Alvalade, em Lisboa. Perante uma já meio desconfiada plateia de apenas 9.300 espectadores, menos de 20% da capacidade máxima, os suíços venceram por 2 a 0, com dois gols do ponteiro direito Georges Vuilleumier, aos 21’ e 35’ do 1o tempo – curiosamente, os dois únicos gols que Vuilleumier faria pela seleção suíça, em 19 jogos disputados.
No mesmo dia, a Romênia arrancou um sofrido empate de 2 a 2 contra a Grécia em Atenas. Num jogo amarrado e pegado, Sideris abriu o marcador para os gregos aos 5’ do 2o tempo e a área foi imediatamente invadida por uma leva de fotógrafos que estavam atrás da meta. Um deles achou de chutar a bola e acertou o zagueiro Dan Coe, recebendo em troca um valente um pontapé nos fundilhos. Três minutos depois, a Romênia empatou numa falha do goleiro grego Oikonomopoulos, que caçou borboleta num cruzamento da direita e deixou a bola solta para Florea Dumitrache concluir no gol aberto. Aos 15’, a Grécia fez 2 a 1, com Dedes cabeceando a um metro da linha uma bola que havia acertado o poste direito e ficou pingando na boca do gol. Nova invasão de fotógrafos para festejar e documentar, mas seis minutos depois Dumitrache voltou a empatar, com uma virada da marca penal para o cantinho esquerdo.
Com sete dos doze jogos já disputados, o grupo 1 continuava embolado. A Suíça liderava com quatro pontos, Romênia e Grécia tinham três, e Portugal, dois. Em 14 de maio de 1969, Portugal patinou de novo ao empatar em casa com a Grécia por 2 a 2, num jogo em que uma vitória portuguesa seria imperiosa. Pior ainda, a má exibição permitiu que a Grécia abrisse 2 a 0 no 2o tempo – Vassilis Botinos aos 23’ e Kostas Eleftherakis aos 29’ – e Portugal a muito custo chegou ao empate nos minutos finais – Eusébio aos 38’ e Fernando Peres aos 42’. No mesmo dia, a Romênia deu um passo enorme para ir à Copa ao bater a Suíça em Lausanne por 1 a 0, gol contra do zagueiro Bruno Michaud aos 31’ do 1o tempo.
Em 12 de outubro de 1969, Portugal disse adeus à Copa ao perder para a Romênia em Bucareste por 1 a 0 – gol de Nicolae Dobrin aos 30’ do 1o tempo, após Dumitrache limpar dois defensores pela meia direita e deixar a bola rolando para Dobrin concluir da marca penal. O goleiro Vitor Damas conseguiu espalmar, mas sem força suficiente para evitar que a bola acertasse o poste direito e terminasse nas redes. Três dias depois, a surpreendente Grécia venceu a Suíça em Tessalônica por 4 a 1, tirando os suíços da parada.
Com cada país tendo apenas mais um jogo para disputar, a Romênia liderava o grupo com sete pontos. A Grécia tinha seis, a Suíça quatro, e Portugal três. Num jogo que já não valia mais nada, Suíça e Portugal empataram em Berna por 1 a 1. Eusébio marcou o gol português aos 44’ do 1o tempo, e Fritz Künzli empatou aos 43’ do 2o. Na Copa de 1966, Portugal tinha feito 17 gols em seis jogos, sendo nove deles de Eusébio. Nas Eliminatórias para 1970, também em seis jogos, os portugueses fizeram apenas oito gols, e Eusébio só três. Com o ocaso de sua geração dourada e sem revelações de nível equivalente, Portugal ficaria fora das três Copas seguintes, retornando somente em 1986.
A decisão da vaga para o México aconteceu em Bucareste, em 16 de novembro de 1969. A Romênia precisava apenas de um empate, e a Grécia da vitória. Por isso, a federação grega suspendeu o campeonato nacional por trinta dias, para que sua seleção pudesse se preparar adequadamente. Num jogo nervoso, com ambas as equipes criando e perdendo chances, Emeric Dembrovschi marcou para os romenos aos 38’ do 1o tempo, saltando na pequena área para cabecear um escanteio e acertando a bola com o ombro esquerdo. Na etapa final, Dimitris Domazos empatou aos 5’, com um chute cruzado de 25 metros que entrou no canto direito do goleiro Raducanu, rente ao poste. E foi só. A Romênia, com um time jovem, cuja média de idade era de 23 anos, iria ao México – e cairia no grupo do Brasil nas Oitavas.
Em 1975–76, aos 32 anos, o ponteiro português Jacinto João, o ‘JJ’, disputou uma temporada extemporânea no futebol brasileiro pela Portuguesa de Desportos, então treinada por Oto Glória. Com problemas de documentação e de ambientação,
jj
fez poucos jogos como titular e retornou a Portugal em maio de 1976, em tempo de se tornar o artilheiro do Vitória de Setúbal no campeonato português.
Para dois países que compartilham o mesmo idioma e passaram por várias reformas ortográficas para eliminar diferenças de grafia, é interessante notar que a palavra Romênia leva acento circunflexo no Brasil e agudo em Portugal, Roménia. Em romeno, língua igualmente derivada do latim, a grafia é România.
Grupo 2
HUNGRIA, TCHECOSLOVÁQUIA, EIRE, DINAMARCA
Os prognósticos indicavam que Hungria e Tchecoslováquia disputariam a vaga entre si, já que Dinamarca e Eire tinham equipes bem inferiores. Mas o favoritismo era da Hungria, que havia conquistado o título olímpico nos Jogos do México em 1968, vencendo na Final a Bulgária por 4 a 1. A Tchecoslováquia também havia participado dos Jogos Olímpicos de 1968 (com sua seleção principal, como ocorria com todos os países socialistas), mas deu vexame – foi eliminada na fase de grupos ao ser derrotada pela Guatemala por 1 a 0, numa partida apitada pelo juiz brasileiro Romualdo Arppi Filho.
Por artes da tabela, os tchecos fizeram três jogos antes que os húngaros estreassem e conseguiram três vitórias. Começaram batendo duas vezes a Dinamarca, em Copenhague (3 a 0) e em casa (1 a 0). Em seguida, os tchecos venceram o Eire em Dublin por 2 a 1, numa batalha que deixou sete jogadores machucados, um deles com gravidade – o atacante irlandês Mick Leech, 21 anos, que foi direto do campo para o hospital ao final do 1o tempo.
Em seu quarto jogo, a Tchecoslováquia foi a Budapeste e perdeu da Hungria por 2 a 0, gols de Antal Dunai aos 12’ do 1o tempo e Florian Albert no último minuto da etapa final. Tudo indicava que a Hungria (ainda com seu belo trio atacante de 1966 – Bene, Albert e Farkas), também passaria por Eire e Dinamarca, e jogaria por um empate na partida de volta contra os tchecos. De fato, a Hungria venceu o Eire em Dublin por 2 a 1, com Ferenc Bene marcando o gol decisivo aos 35’ do 2o tempo, aproveitando uma saída errada do goleiro Allan Kelly e acertando um chute forte quase do bico da pequena área no alto do canto esquerdo.
Tudo parecia caminhar segundo as previsões dos entendidos, mas, inesperadamente, os húngaros foram a Copenhague e perderam para a Dinamarca. Insatisfeita com o desempenho de sua seleção nos jogos anteriores, a federação dinamarquesa havia decidido trocar o treinador Erik Hansen por John Hansen, sem parentesco (Hansen é o terceiro sobrenome mais comum na Dinamarca).
Num jogo de superação, já que a equipe era formada por veteranos, os dinamarqueses ficaram duas vezes à frente no marcador no 1o tempo, mas só brevemente. Ole Sorensen marcou aos 3’ e Bene empatou aos 7’, num frango espantoso do goleiro Knud Engedal. Aos 35’, Ulrik Le Fevre fez 2 a 1, mas Janos Farkas voltou a igualar quatro minutos depois. Na etapa final, um gol de Ole Madsen decidiu a partida aos 22’ – a retaguarda húngara falhou ao tentar fazer a linha de impedimento e permitiu que Madsen escapasse sozinho e tocasse no canto esquerdo do goleiro Antal Szentmihályi. Além de perder o jogo, a Hungria sofreu uma perda ainda maior – seu criador de jogadas, Florian Albert, fraturou a perna aos 37’ do 1o tempo num choque com o goleiro Engedal e iria passar quase um ano afastado dos gramados.
O jogo seguinte, entre tchecos e húngaros em Praga, poderia decidir a vaga para a Copa em caso de uma vitória da Tchecoslováquia. Mas, mesmo fora de casa, a Hungria terminou o 1o tempo vencendo por 2 a 1 e marcou o terceiro gol logo aos 3’ da etapa final, com o jovem László Fazekas, 22 anos, que iria ter uma longa carreira na seleção húngara. Mais na base da dedicação do que da técnica, os tchecos foram buscar o empate – o veterano Andrej Kvasnák, 33 anos, diminuiu aos 6’, e o jovem Ladislav Kuna, 22 anos, igualou aos 30’, quando oito jogadores tchecos foram à área húngara em um escanteio. O resultado deixou tchecos e húngaros igualados em pontos, e os jogos subsequentes não mudaram a situação. A Tchecoslováquia venceu o Eire (3 a 0) e a Hungria passou por Dinamarca (3 a 0) e Eire (4 a 0).
Se o saldo de gols fosse critério de desempate, os húngaros ficariam com a vaga com folga. Como não era, tchecos e húngaros tiveram que disputar um jogo extra em Marselha, na França. Em caso de empate nos 90 minutos e na prorrogação, aí sim a Hungria iria à Copa, por ter melhor saldo de gols. Em 3 de dezembro de 1969, a única decepção foi o público: o Estádio Vélodrome recebeu apenas 7.857 pagantes, cerca de 15% de sua capacidade na época.
Aos 5’, o juiz francês Roger Machin apitou um pênalti a favor da Hungria. O líbero Kálmán Mészöly, 28 anos, que na Copa de 1966 havia convertido um pênalti contra o Brasil cobrando com absoluta confiança, desta vez bateu como um principiante e o goleiro Ivo Viktor defendeu. Aos 15’, Viktor salvou novamente a Tchecoslováquia, ao espalmar um tiro à queima-roupa de Ferenc Bene. No final do 1o tempo, quando o gol húngaro já estava caindo de maduro, o juiz marcou outro pênalti, só que para os tchecos. Kvasnák acertou a cobrança no alto do canto esquerdo e fez 1 a 0 aos 43’.
No 2o tempo, já bem mais seguros de si, os tchecos controlaram as ações e aumentaram aos 13’, com Frantisek Veselý acertando um petardo da meia lua no ângulo esquerdo. Dois minutos depois, os alto-falantes do estádio anunciaram duas substituições na Hungria: saíam Göröcs e Farkas, e entravam Puskás e Kocsis. A plateia imaginou que estivesse voltando no tempo, mas os substitutos eram apenas homônimos dos grandes craques húngaros de 1954. Aos 20’, a Tchecoslováquia ampliou para 3 a 0, com Jozef Adamec cobrando diretamente para o gol uma falta da lateral da área e contando com a colaboração do goleiro Antal Szentmihályi, que deixou a bola passar entre seu corpo e o poste esquerdo.
Nos minutos finais, o jogo se deteriorou e descambou para a pancadaria. Aos 39’, o atacante tcheco Ladislav Petrás foi expulso por aplicar uma insensata gravata em seu marcador. Um minuto depois, Karol Jokl selou a classificação marcando o quarto gol tcheco em outra falha do goleiro Szentmihályi, que saltou fora de tempo no chute defensável de fora da área. No último segundo de jogo, o juiz apitou outro pênalti para a Hungria, num lance quase cômico – três zagueiros tchecos entraram ao mesmo tempo sobre o húngaro Sándor Zámbó, deixando o árbitro em dúvida quanto ao real autor da infração. Ainda abalado pela perda do pênalti no início do jogo (que poderia ter mudado a história se tivesse sido convertido), Mészöly não quis bater e Lajos Kocsis fez o gol de honra húngaro.
Em sua sétima participação em Eliminatórias (só havia ficado de fora em 1950), era a primeira vez que a Hungria não conseguia a vaga para a Copa. Seu treinador, Károly Sás, que havia conquistado o título olímpico em 1968, decidiu encerrar a carreira aos 60 anos após perder a vaga na Copa com uma inesperada goleada. A Tchecoslováquia é que iria ao México, e cairia no grupo do Brasil nas Oitavas.
Em 4 de dezembro de 1968, como mandava a tabela, a Dinamarca foi a Dublin enfrentar o Eire, mas o início da partida foi retardado em uma hora devido à forte neblina. Aos 6’ do 2o tempo, com o placar em 1 a 1, o fog piorou tanto que a torcida já não conseguia enxergar o que acontecia em campo. O juiz escocês William Syme suspendeu a partida, que foi remarcada para dali a dez meses (!). O jogo terminou em 1 a 1, dando ao Eire seu único pontinho no grupo.
Grupo 3
ITÁLIA, ALEMANHA ORIENTAL, GALES
Em 10 de junho de 1968, jogando em casa no Estádio Olímpico de Roma, a Itália tinha conquistado o campeonato europeu de seleções ao vencer a Iugoslávia por 2 a 0 (gols de Luigi Riva aos 11’ e Pietro Anastasi aos 32’ do 1o tempo), num jogo de desempate – a primeira partida, dois dias antes, havia terminado 1 a 1. Quatro meses depois, os italianos começaram a disputar as Eliminatórias e eram favoritos disparados num grupo que tinha dois concorrentes peso-médio, Alemanha Oriental e Gales. O benéfico sorteio talvez tenha sido uma compensação do destino pelos dissabores que a Itália havia passado na Copa de 1966, quando foi eliminada ainda nas Oitavas pela Coreia do Norte e seria recebida com uma chuvarada de tomates no aeroporto de Gênova.
O treinador italiano era Ferruccio Valcareggi, 49 anos, cuja nomeação logo após a Copa de 1966 causou surpresa. Em seus treze anos como técnico, Valcareggi havia conseguido apenas um resultado digno de nota, em 1957, quando conduziu a Associazione Calcio Prato, da cidade toscana do mesmo nome, da série C para a série B (cinco anos depois, com Valcareggi ainda no comando da equipe, a AC Prato seria rebaixada para a série C). Em seguida, Valcareggi dirigiu Atalanta e Fiorentina, sem nunca ter atingido uma classificação melhor que um sexto lugar no campeonato. Apesar desse currículo pouco animador, foi alçado à direção da seleção sob generalizada desconfiança da imprensa italiana. Valcareggi, porém, surpreendeu a seus críticos e iria passar oito anos no comando da Azzurra, disputando 58 partidas oficiais até 1974, e perdendo apenas seis (duas delas em Copas).
A grande novidade italiana desde 1968, porém, não estava na direção, mas no gramado – o atacante Luigi Riva, 25 anos. Seu time, o pequeno Cagliari da Ilha da Sardenha (no qual Riva estava desde 1963 e permaneceria até encerrar a carreira em 1976), havia terminado a temporada 1968–69 em segundo lugar, com Riva marcando 20 dos 41 gols da equipe e terminando como artilheiro do campeonato. Foi durante esse período que as Eliminatórias foram disputadas, e a ascensão de Riva iria colocar em segundo plano até a velha pendenga envolvendo os talentosos meias Gianni Rivera, do Milan, e Sandro Mazzola, da Inter, que arrebentavam em suas equipes, mas não conseguiam se entender na seleção.
A Itália estreou nas Eliminatórias contra Gales em Cardiff e venceu por 1 a 0 – gol de Riva aos 44’ do 1o tempo, com uma virada da meia lua no cantinho esquerdo. Em seguida, a Itália foi a Berlim enfrentar a Alemanha Oriental e ficou duas vezes atrás no marcador, mas conseguiu sair com um empate de 2 a 2 – e mais dois gols de Riva, o segundo aos 37’ do 2o tempo, com uma testada medida no canto esquerdo. Após os dois satisfatórios resultados fora de casa, os italianos já saíram providenciando os vistos para ir ao México.
No confronto direto entre os outros dois pretendentes, Gales tinha uma equipe tecnicamente melhor, porque os onze titulares atuavam em equipes da primeira divisão inglesa, mas perdia feio em conjunto, porque os clubes só liberavam os jogadores na antevéspera das partidas. Por isso, prevaleceu a melhor preparação dos alemães, que treinavam sistematicamente havia três anos. Em Dresden, a Alemanha venceu por 2 a 1, com um sofrido gol de Peter Rock aos 44’ do 2o tempo. No jogo de volta, mesmo atuando em casa, Gales perdeu novamente e ainda mais facilmente, por 3 a 1. Os alemães construíram o placar num curto espaço de nove minutos no 2o tempo – Eberhard Vogel aos 8’, Wolfram Löwe aos 14’ e Henning Frenzel aos 17’. Somente a oito minutos do final Dave Powell fez o gol de honra galês. Com as duas vitórias, os alemães se tornavam o único obstáculo no caminho da Itália.
Em 5 de novembro de 1969, jogando em Roma, os italianos bateram Gales por 4 a 1. Luigi Riva estava com a macaca e fez três gols. Sandro Mazzola fechou a conta e o zagueiro Mike England marcou o gol solitário de Gales, com uma impressionante cabeçada da meia lua em um escanteio. Com a vitória, a Itália chegava a cinco pontos e iria enfrentar em casa a Alemanha Oriental, que também tinha cinco pontos, no último jogo do grupo.
A federação italiana marcou a partida para o Estádio San Paolo em Nápoles, e 84.293 fervorosos napolitanos viram sua seleção resolver rapidamente a questão, marcando três gols ainda no 1o tempo – Sandro Mazzola aos 7’, Angelo Domenghini aos 25’ e o infalível Riva aos 36’, com um peixinho no alto do canto direito. O placar só não foi mais elástico porque, entre outras proezas, o goleiro alemão Jürgen Croy, 23 anos, defendeu um pênalti cobrado por Riva aos 31’ do 2o tempo. Apesar da penalidade perdida, Riva anotou sete dos dez gols italianos no Girone Eliminatorio e iria desembarcar no México como sério candidato a astro maior da Copa.
Riva chegou ao auge de suas atuações em campeonatos italianos na temporada 1969–70 (encerrada dois meses antes da Copa do México), quando conduziu o Cagliari ao título nacional marcando 21 gols em 29 partidas disputadas, e novamente liderando a artilharia do torneio.
Riva iria se tornar também o maior artilheiro da história da Azzurra, com 35 gols marcados em 42 jogos oficiais (e mais sete gols em partidas não-oficiais). Em 2005, o Cagliari, já novamente um time mediano, homenageou o maior ídolo de sua história aposentando a camisa que Riva usava, a número 11.
Grupo 4
UNIÃO SOVIÉTICA, IRLANDA DO NORTE, TURQUIA
A União Soviética apresentou uma velha novidade: o retorno do treinador Gavriil Kachalin, pela terceira vez em 16