FOGO !
«Há muito que cheirava a fogo. Como se algo escondido ardesse lentamente. Mas fomo-nos habituando ao cheiro sem procurar a causa. Depois, as nuvens negras cobriram-nos o céu e, sentados na esplanada, acreditámos que as cinzas vinham das casas dos vizinhos americanos ou gregos, que, esses sim, tinham a respectiva casa a arder.
Alguns de dentro começaram a gritar que o fogo chegara a casa. Mas acreditámos que só queriam perturbar a paz da aldeia, onde a vida continuava a correr habitualmente.
Perante o crescendo de calor, sentámo-nos, finalmente, a discutir: no caso de fogo, de quem seria a culpa? Dos que tinham deixado o ferro ligado ou dos
que tinham esquecido a fritadeira? Desconfiados sobre a quem devia liderar o combater ao fogo...
De súbito, todos os vizinhos correm a avisar-nos, com medo de que o incêndio se espalhe às suas casas. Os peritos reformados do FMI descrevem a dimensão do fogo e sugerem as medidas que ainda podemos adoptar para evitar a catástrofe.
Todos os sinos tocam a rebate. Finalmente, o plano de combate ao fogo prevê que se peçam sacrifícios aos habituais bombeiros de serviço. Não estão mobilizadas todas as corporações. Na esplanada, há quem ainda assista (sem um gesto) ao esforço dos que já foram chamados a combater as chamas.
Ainda temos tempo. Mas, muito pouco tempo, para atacar o incêndio. Temos de ser todos, já!
Somos um país demasiado pobre para deixar arder, de braços cruzados, o pouco que nos resta. Isso é um luxo dos ricos. Os pobres não têm seguro.
E nenhum seguro se chama Euro.»