quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Por causa da Teresa

a vida não tem ética alguma. rege-se por um conjunto de circunstâncias que se juntam por acaso, sem qualquer razão e que ditam um destino. a ética vem socorrer-nos com a sua clarividência contra esta lei cega. cria-nos a ilusão que há uma ordem para as coisas ou uma justiça, mas de facto não há, no caso da morte a Ética é completamente impotente. morrer com a consciência leve ou pesada é sempre morrer. e morrer quando se está no meio da tarefa de viver, quando se quer viver, quando se quer fazer muito, completar. não faz sentido. é uma revolta. Acreditar num Deus misericordioso pode impedir a revolta, mas é uma dura prova para quem é dotado de sangue e pensamento. é uma prova que está para além de toda a compreensão. se há um Deus cuja vontade comanda a vida e a morte, porque havemos de lhe dar o amor que ele nos tirou? na vida vamos morrendo e renascendo e esse movimento não depende da nossa vontade, forças cegas, animais, mas também a força com que acreditamos na beleza das coisas, na sua justiça, na sua ordem, acreditamos que há um equilíbrio e que ele vai nascer do caos. será essa força a crença numa transcendência? talvez. mas não necessariamente, é a força dos valores em que acreditamos. mas depois há isto. este vazio. como que uma interrupção incompreensível onde todo o pensamento se aniquila.

domingo, 25 de outubro de 2009

filme

"O dia da Saia" é o título de um filme francês. Pergunta natural: Que quer isso dizer? Dia da saia? então será que vamos instituir um dia para todos garçons et filles mostrarem a pernoca? E porque não o dia do naperon? ou da bóina...deixemo-nos de parvoíces porque o assunto é sério. Tudo se passa num Liceu ou como hoje chamamos, uma Escola Pública, onde uma professora pretende dar a conhecer Moliére a uma turma de origem maioritariamente marroquina e argelina. O ódio e o desprezo pela Escola, colegas, professores e Moliére, sourtout lui é de ordem a ser impossível comunicar sem ser aos gritos e ameaças. o resultado é devastador, tão devastador quanto é próxima esta realidade. A propósito: reivindicação da professora exausta: institua-se "o dia da saia" um dia em que toda as mulheres desta escola possam usar saias sem serem consideradas putas...é isso mesmo...quando estiver menos cansada derivarei para o problema dos emigrantes e dos valores.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

dixotes

na sua crónica de hoje o Pulido Valente chama analfabeto ao Saramago, porque ousou dizer dixotes sobre a Bíblia e escreveu um livro sobre isso, ele que não passa de um trolha a quem faltou a educação básica.dá vontade de rir...a educação básica será o quê, neste caso, ter mestrado em teologia??
a questão é que este trolha analfabeto ganhou um prémio que nos enobrece a todos e no futuro ficará como motivo de orgulho, para além disso é um escritor lido e admirado em muitas partes desse vasto mundo, e o sr pulido valente? que autoridade tem? os doutores da igreja sabem do que estão a falar e o saramago não. é a ideia do Pulido, a dele, o seu dixote de trolha. acho sempre imensa graça quando se evoca a autoridade para ter esta ou aquela opinião. geralmente invoca-se o argumento da autoridade quando não há outros, é a chamada falácia da autoridade não qualificada.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Três cantos estreia dia 22 no Campo Pequeno, os três maiores compositores vivos da Música Popular Portuguesa, juntos e ao vivo. Cruzam-se emoções, expectativas imensas para ouvir aqueles que poetizaram a minha juventude e continuaram a fazê-lo na minha vida adulta.
Cada um de nós os que habitávamos Lisboa com sofreguidão e desvario tivemos a ventura de ver despontar esta febre criativa, os longos braços da poesia e da música livre, como um longo suspiro, todos nós ligámos estas músicas a uma parte incontornável do nosso imáginário. Ao som do Rosalinda o meu primeiro beijo na boca, apaixonado, o beijo que vinha lá do fundo da ânsia e se fazia luz nessa tarde num apartamento dos Olivais.
"Rosalinda se tu fores à praia, se tu fores ver o mar, cuidado não te descaia o teu pé de catraia em óleo sujo à beira mar" e depois corríamos a ver os concertos espontâneos em cantinas, na Festa do Avante, em bares.
"A noite passada acordei com o teu beijo
descias o Douro e eu fui esperar-te ao Tejo
vinhas numa barca que não vi passar
corri pela margem até à beira do mar
até que te vi num castelo de areia
cantavas "sou gaivota e fui sereia"
ri-me de ti "então porque não voas?"
e então tu olhaste
depois sorriste
abriste a janela e voaste
."

Há, houve, continuará a haver uma identidade que cresceu e se formou com estas palavras.

domingo, 18 de outubro de 2009

saramago

Então o Saramago escreve mais uma heresia, no seu novo livro "Caim". Caim o mau filho, Caim que mata o seu irmão por ciúmes. Saramago dixit: Um Deus cruel que permite tais actuações não é bom conselheiro. A Bíblia é um manual de maus costumes, os católicos nem se hão-de preocupar com o livro porque não lêem a Bíblia mas os judeus sim e para mim isso é indiferente. Continuo a admirar a sua coragem embora já ninguém se preocupe muito com heresias neste ocidente democrático. Curioso seria que os judeus se levantassem e em coro o condenassem às penas do Inferno, à excomunhão pelo fogo ou mais prosaicamente, a gosto dos fariseus e seus inimigos muçulmanos, passem das palavras aos actos e lhe movam uma perseguição! Filhos ambos de Caim, diríamos e parece-me igualmente herege mas Saramago? De quem é filho Saramago? Nem Caim nem Abel! Filho de sua mãe, só.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

sobrinhas

andei com elas ao colo, adoro-as, são como as filhas...etc, agora cresceram e temos zangas de adulto contra adolescente e vice versa, o habitual, adoro-as mais, mais, mas não sei como lhes dizer que as adoro quando mandam mensagens no telemóvel enquanto lhes falo. São lindas demais as miúdas e revejo-me naquela rebeldia. Herdou a mais velha de mim o gosto compulsivo da leitura e um certo orgulho meio enviesado, a mais nova o gosto pelo teatro e é fantástico sentir que os gostos delas, os subterrâneos, têm a ver comigo embora, felizmente, sejam muito diferentes de mim. A minha vida espelha-se um pouco nelas e isso faz todo o sentido.todo. Um abraço!

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

ranking

O ranking das "melhores" escolas (escolas com melhores resultados nos exames do 12ºAno) não foi consensual. SIC, Correio da Manhã e Diário Notícias apresentavam cada um o SEU RANKING. Talvez isto de rankings seja coisa criativa e pessoal e o melhor é cada um ter o seu e não se fala mais nisso!
(Um exemplo, só com as escolas com mais de 100 provas: O Colégio Lusofrancês para a SIC e para o DN o Colégio Nossa Senhora do Rosário estão em 1º lugar respectivamente. E outras divergências são visíveis mas não é preciso ser exaustivo porque o resultado final aponta em larga convergência para dois pontos:

1.As Escolas Públicas desceram face às privadas.
2. Os lugares de topo são maioritariamente de Escolas cujo ensino está ligado à religião: Opus Dei, Salesianos, Maristas, Jesuítas e por aí fora.

Que se passa com o Ensino Republicano e laico? Será que não esclareceu ainda as linhas orientadoras do bom ensino? Será que não se preocupa com os bons resultados dos seus alunos nas provas mas com outros factores sociais, culturais etc?

Três factores que me parecem importantes e condicionadores destes resultados:


1. O desequilíbrio e instabilidade da classe docente nos últimos três anos. As guerras e confusões que se instalaram na Escola Pública face a medidas desrazoáveis do governo. Estas medidas parecem ter afectado mais os professores das Escolas Públicas porque a classe tem uma representação mais heterógenia que na Privada, onde os professores são escolhidos também por factores políticos. Maior vulnerabilidade da Escola Pública face ao Poder político.


2. Maior poder económico dos alunos da Privada, mais acesso a bens culturais, menor pressão familiar em relação ao luxo de estudar e consequentemente uma maior concentração no valor do estudo.


3. Mais elitismo nas Escolas privadas que são menos pressionadas que as Públicas no sentido da Inclusão. Isto é, as Escolas Privadas não têm a missão de educar todos, apenas alguns, os que querem verdadeiramente estudar . Esse princípio permite o elitismo que nas Públicas só é possível em algumas excepções, quando as Escolas Públicas rejeitam alunos com passados escolares pouco promissores. É o caso da Escola da Quinta do Marquês - Oeiras que sendo uma das melhores escolas públicas, aceita alunos fora da sua área em detrimento de outros que vivem próximos. O critério é a excelência e nível económico do aluno. O meu vizinho de baixo é exemplo.


Posto isto, ilações: A batalha perdeu-se! Mas a luta continua! Escolas Públicas às Armas!! Teremos de provar que o Ensino Republicano e laico é melhor que o ensino norteado por princípios religiosos, acredito que sim!


domingo, 11 de outubro de 2009

divagações

Cartier-Bresson


qual a relação entre a nossa experiência e a expectativa que acalentamos de felicidade? porque será o que vivemos pouco mesmo que seja equiparável ao que sonhámos? ser feliz depende ou não da quantidade de experiências que julgamos felizes? será que a felicidade é a soma de experiências felizes? e o que é uma experiência feliz? poderá uma experiência ser em si feliz sem que aquele que a viva a sinta como tal?


olho a luz de Outono, este azul ácido que se espalha do céu para as árvores e para os contornos dos corpos, sinto-me progressivamente alheada, sem lugar definido na soma de acções que nos relacionam com o colectivo, vivo na proximidade das sensações, como um lobo a farejar, o restolho do calor dos corpos, o cheiro, o som. dias há que os filhos dos outros me dão uma nostalgia tremenda de não ter os meus, e dias há também que sorvo o ar absoluto de não ter amarras, de ser livre. libertar-se progressivamente desses padrões, dos padrões natura, contra/natura, socialmente aceite, genuinamente respeitável, obedecer ao impulso, não lamentar.possuir o que possuímos, a lembrança, a capacidade ilimitada de se auto-transcender. se ficar louca chamarão os cães, se não ficar, acorrentar-me-á a lucidez da morte. não acredito na maioria das pessoas, acredito na linguagem do corpo. fatalmente. se hoje é de noite não é por acaso, será noite da descrença e porque não?

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Chéri


Chéri é um filme belo (pensei que este atributo da beleza fosse negligenciável e demodée mas não é, não é). Há o décor (as palavras francesas surgem em catadupa não fora o original francês, por causa dele e da sua influência certamente), perfeito no tom, na simbologia, no timing, lacónico, indiferente e subterraneamente trágico. Os actores, a Pfeiffer está por lá, com as pérolas e aquele olhar meio condescendente meio triste, meio irónico, só dela e do meu fanatismo por "olho azul " ele mesmo, exultante. o outro, amado, com uma fragilidade entontecedora própria dos amados, dos amantes ou dos que nada sabem e sentem, sentem. A Colette sabia do amor porque a história continua hoje, debaixo da pele ou encrostada no sonho de amor que todos trazemos do berço. A vida ergue-se em bicos de pés surpresa e cai, amarrota-se, engana-se.


Ps: O Expresso tem uma crítica e uns críticos imbecis, lavavam para já os olhos e depois talvez fosse bom atirarem-se ao rio, para exercitar o fôlego.