Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Não é bruxedo mas parece


- Ó viziiiiinha, venha cá ver.
- Ai credo, Virgem Santíssima, o que vossemecê foi descobrir.
- Eu assomei à janela a virar um balde e olhe só o que eu vi.
- Até me vou benzer que isto parece mesmo obra do demo.
- Benza-se, benza-se que eu também já me benzi logo que vi isto.
- Temos que avisar alguém, não acha?
- O meu Manel tá lá prós lados da chaneca, o que posso eu fazer?
- O meu home também não tá, foi na Zundapp à vila fazer um recado ao patrão…
- Venha, vamos a casa da Ti Maria preguntar-lhe o que ela acha.
- É bem alembrado, aqui é que não devemos ficar, que isto até dá medo.


quinta-feira, 30 de outubro de 2014

As várias cores


Onde era suposto que as cores estivessem compreendidas entre o amarelo e o vermelho, passando pelo laranja, lá ao fundo, mesmo muito ao fundo, um deslocado e inesperado azul aparece.
Talvez não fosse a hora certa para ali estar ou talvez não fosse a hora certa para fotografar.
O certo é que agora estas quatro cores vão ter de conviver pacificamente.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

terça-feira, 28 de outubro de 2014

A parábola da desobediência


E por fim, o principio. O principio do fim dos princípios que estão a levar a civilização à aniquilação.
O principio da obediência cega, surda e estúpida a deuses, reis, ditadores de toda a espécie terá o seu fim quando as pessoas começarem a desobedecer.
Quando as pessoas desobedecerem, deixará de haver religiões a levar as pessoas para a guerra, na ânsia de converterem os infiéis, os que no usufruto dos seus direitos pensam de maneira diferente.
Quando as pessoas desobedecerem deixará de haver reis a viverem… como reis, concentrando nas suas mãos toda a riqueza que deveria legitimamente estar dividida por quem a produz, por quem trabalha.
Quando as pessoas desobedecerem deixará de haver governos a legislarem em favor de interesses privados transformando o mundo num gigantesco local de escravatura disfarçado de democracia.
Por agora o maior perigo para a vida provém do homem.
Há-de chegar o tempo em que as pessoas apenas terão a temer os terramotos, tsunamis, furações, inundações, incêndios e demais cataclismos da natureza.
Demorará certamente milhares de anos, isto se o mundo não acabar entretanto, mas é possível.
Basta acreditar.
É este o poder da utopia.

(A foto é real, mas não retrata nenhum acto de desobediência. É usada no sentido figurado, para ilustrar a parábola da desobediência. Foi tirada em Março de 2013 durante uma visita guiada ao Presídio da Trafaria)


segunda-feira, 27 de outubro de 2014

A teia


Não há fios que prendam a liberdade.
Ao contrário da raposa que entrou no galinheiro por um buraco e depois de comer as galinhas todas engordou de tal maneira que não conseguiu voltar a sair, a Lua vai aumentar de tamanho e mesmo assim vai sair do emaranhado onde se encontra e iluminar a noite em todo o seu esplendor.

domingo, 26 de outubro de 2014

Nomeação


Bolas, mais uma nomeação. Não há maneira de eu me ver livre disto. Deve ser problema dos cortes na saúde, não há dinheiro para inventarem uma vacina para esta nova forma de voyerismo
Portantos vamos lá participar na brincadeira que alguém que eu não conheço de lado nenhum criou. Que lhe faça bom proveito e que tenha um orgasmo dos grandes quando (se) vier cá espreitar o que escrevo.

Além do aspecto psicossomático da coisa, isto até que vem em má altura. Não tenho fotos para mostrar. Posso mostrar outras coisas se quiserem, mas fotos não tenho. As poucas (e más) que tenho estão inacessíveis. Estou com problemas no computador, conforme podem aquilatar lendo o meu post de ontem.
Acresce a isto o medo que tenho aos monstros, e ser desafiado juntamente com dois monstros da fotografia mete-me medo.
Sim, Luis e Zé Barbosa, estou a falar de vocês.

Anyway, de vez em quando vou colocando umas fotos online na página do Picasa e tenho de me socorrer disso para arranjar então as tais três fotos.
A de hoje chama-se “É o Outono”. Foi tirada na Ribeira de Sintra em Setembro de 2012 usando uma câmara bridge Fuji Finepix S5800.

Contrariamente ao que é costume pensar-se eu acho que uma palavra vale mais que mil imagens, vai daí que não quis deixar a pobre fotografia aqui só e abandonada, e escrevi-lhe algo.

Desculpem lá qualquer coisinha, mas isto quando se chega ao Outono (o do calendário e o da vida) dá-nos um frio na cabeça que até se nos enregela o sentido do ridículo. E eu ralado com isso.


 É o Outono

É o Outono amor, quem te bate à porta,
Sou eu, aqui perdido entre as folhas já caídas,
Quem te chama por entre os lamentos do vento.
Sim, sou eu que na curva do caminho
Aguardo a tua chegada

És Primavera sim, e eu sei disso,
Radiosa como o Sol que desponta de manhã.
Trazes contigo pássaros e flores
Que me fazem percorrer as curvas do caminho
Em busca da tua chegada.

Há um Verão inteiro a separar-nos
Cheio de dias e momentos não vividos.
Eu sei que o tempo é importante,
Mas o que conta nas curvas do caminho
Não é a partida, é a chegada.

Vem, que o Inverno há-de vir,
E o Sol dos teus dias dará lugar a nuvens negras.
Usa os meus ramos secos no fogo da tua lareira.
Ampara-te no meu tronco, nas curvas do caminho
Que medeiam entre a partida e a chegada.

sábado, 25 de outubro de 2014

Lubuntu


Nem tudo o que parece é. Eu até diria mais: nada do que parece é.
Depois de ontem finalmente ter tido o computador pronto, chego a casa e depois de verificar com alívio que funcionava, reparo que a nova board não tem porta paralela. E eu preciso mesmo de uma porta paralela.

Uma porta paralela, ao contrário do que o nome possa sugerir, não serve para entrar num universo paralelo, serve para ligar o scanner, que já tem mais de doze anos mas ainda funciona. E eu preciso mesmo do scanner neste momento. Preciso de digitalizar todos os documentos que tenho da compra do novo carro velho para fazer uma exposição à Deco e uma reclamação directamente à administração da santogal.

Nova ida à loja e a informação de que não têm adaptador. Entretanto o computador vai funcionando.
Sábado perdi a manhã a ir a Queluz. É já ali dizem, mas para lá ir e voltar de comboio foram mais de duas horas, além dos 3,70€ nas "portagens". Num país de terceiro mundo e meio como é este aqui, os comboios suburbanos da capital passam de meia em meia hora. Consegui no entanto trazer uma placa PCI com porta parelela.

À tarde veio a desilusão. O computador até estava a funcionar bem mas depois de lhe ter mexido não se aguanta mais de dois ou três minutos ligado. Está constantemene a reiniciar.
E o que eu fiz foi muito simples e tenho quase a certeza que eztá bem feito: coloquei a placa numa ranhura PCI e liguei um segundo disco que tinha retidado antes de enviar o computador para reparação  e que é onde tenho as minhas fotos.
O disco nem sequer é reconhecido na BIOS, e quanto ao scanner não o consigo experimentar porque o computador está sempre a desligar.

Há ainda a gravidade de não ter feito a segurança de todos os dados que tinha guardados no disco C:

Felizmente que existe o Linux.
Com um disco da distro Lubuntu, em modo live CD, o computador está a funcionar aparentemente às mil maravilhas. Deduzo portanto que o problema não está no hardware mas no sistema operativo que está no disco C:
Com a vantagem de que com o Linux consigo aceder ao Windows e estou a fazer a salvaguarda dos dados que lá tinha.

O mundo (pelo menos o meu) acabava se perdesse os meus escritos na varanda.

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Regresso ao presente


Dez dias e quase duzentos euros depois, com muita falta de paciência à mistura, eis-me de volta. Depois do computador estar (mal) arranjado, já posso ainda assim ir escrevinhando o que me passar pela cabeça.
De resto, a inactividade traduziu-se em algumas ideias, vamos ver se se conseguem concretizar. 
É que, mesmo sem ter saido do lugar, assim uma espécie de ida para fora cá dentro, estive numa terra onde as pessoas dizem coisas. Talvez me recorde o suficiente para relatar a viagem.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

O abraço


Corria uma ligeira brisa, o que fazia com que a temperatura fosse um pouco mais suportável naquele quente dia de verão, embora estivessem sentados à sombra da velha árvore.
Sempre que podiam era ali, no cabeço que dominava toda a aldeia, que se encontravam para namorar, longe dos olhares indiscretos de quem fazia da soleira das portas e do peitoril das janelas o local habitual de observação do mundo que os rodeava.
Quer se gostasse ou não, a verdade é que a solidão era a única companhia para quem, tendo trabalhado até ao limite das forças físicas, nada mais tinha para fazer que assistir ao passar vagaroso das longas horas do dia.
Na base do carvalho havia uma rocha e era ai que costumavam sentar-se abraçados, vendo a aldeia a seus pés, e os campos a estenderem-se por montes e vales até à linha do horizonte, enquanto faziam planos para o futuro.
As conversas eram mais monólogos, porque ele pouco gostava de conversar. Raramente fazia perguntas, respondia ao que lhe perguntavam e fazia um ou outro comentário isolado e disperso. Ela, pelo contrário, falava pelos dois, e a maior parte das vezes nem lhe dava tempo para responder, tal a velocidade com que falava, o que normalmente acontecia quando se entusiasmava ao contar-lhe os seus planos. Outras vezes falava do mundo que a rodeava, e nessas ocasiões vinha-lhe ao de cima a nostalgia mas também o orgulho de ter nascido e crescido numa remota aldeia do interior.
- Sabes amor, faz-me confusão as pessoas da cidade. Vêm de férias para o campo, para as aldeias porquê? Se fossem de cá ou tivessem cá família eu compreendia, mas não são de cá nem conhecem cá ninguém. É só porque é moda ir para o campo? Eles nem sabem estar no campo. Mal chegam começam a reclamar com tudo: é porque tem aranhas, porque tem lagartixas, é o chão que é de terra, são as janelas que são de madeira e deixam passar o vento, as portas que fazem barulho a abrir, o colchão que é duro. Espero que tu não venhas a ser assim…
- Assim como? A levar-te de férias para o campo?
- Não tolinho, dizes que me queres junto a ti, mas quando me tiveres espero que não comeces a por defeitos em tudo!


segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Um rio de águas calmas banha uma cidade de patos bravos


Em vinte e dois de Setembro a cidade ficou inundada porque choveu. A treze de Outubro voltou a chover e a cidade voltou a ficar inundada.
É certo que os patos, todos em geral e nomeadamente os bravos, gostam de água, vivem na água. Daí que a fauna patícola que governa a cidade nada faça para evitar que ao cair das gotas de chuva as praças se transformem em lagos e as ruas em ribeiros.
Mas… não haverá por aí caçadores de patos?


domingo, 12 de outubro de 2014

O lápis


Pegou no lápis e rabiscou umas quantas palavras. Levantou a cabeça do papel e olhou para o relógio. Ainda não estava na hora, teria que esperar mais um bocado. Voltou a pegar ano lápis e continuou a escrever até ter bico. Um movimento mais brusco ao colocar um ponto final fez com que o bico se partisse. E estava fora de casa, não tinha como afiar o lápis.
Sim, estava irritado. Na verdade, o que estava mesmo era frustrado, desiludido, e isso é que lhe causava irritação. E a irritação reflectia-se na escrita.
Impossibilitado de escrever, resolveu reler a folha que tinha à frente. Nada daquilo fazia sentido, pensou quando acabou de ler. Mas também era verdade que não esperava que alguém lesse, escrevia apenas para passar o tempo, enquanto esperava pela madame.
Esperar era a sua especialidade. Esperava por alguém que não vinha, por algo que não acontecia. Esperava ter a coragem necessária para mudar.


sábado, 11 de outubro de 2014

A faina da fauna


É da pesca que vivem muitas pessoas. No mar sobretudo, mas também em rios e em lagos.
Porém, um país que alega ter a 11ª maior zona económica exclusiva do mundo e tantos entraves coloca a quem quer viver do mar não é um país normal.
O que é preciso é deixar os barcos navegarem e as pessoas trabalharem.
As águas estão ali, à espera.


quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Mestre Paiva


De um lado um vasto casario indiferente, cheio de gente que corria desenfreada em todas as direcções, como se dessa corrida dependesse toda a sua existência.
Do outro um fotografo que, ou porque tivesse todo o tempo do mundo ou porque o que tinha não o queria gastar, ali permanecia por longo tempo o mais imóvel possível agachado na areia da praia, com a objectiva apontada.
No meio, ou melhor, mais para o lado de cá do que para o lado de lá, Mestre Paiva, de pé à proa da sua embarcação, olhava cada uma das margens e do cruzamento dessa informação concluía que o mundo devia estar louco.


quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Asas


- Ó sua gaivota! Chamei-lhe eu. Não me ocorreu na altura outro nome mais apropriado.
Mas ela, depois de ter cagado em mim, continuou o voo, impávida e de asas bem abertas, sem sequer se dignar olhar para trás.
Desorientado, com a cabeça cheia de merda, ali fiquei parado na areia da praia a vê-la afastar-se planando até pousar numa embarcação fundeada ao largo.
À escala de uma gaivota, uma embarcação é quase como uma ilha.


Outra Trafaria


Uma outra Trafaria existe, que resiste ainda e sempre, conforme pode, ao passar dos tempos.

Vem isto a propósito do lançamento do livro OuTrafaria do amigo Carlos Barradas Leal. Contactem a Junta da União das Freguesias de Caparica e Trafaria ou a Câmara Municipal de Almada e adquiram-no.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

domingo, 5 de outubro de 2014

Punk anos 50


Com um começo destes o que se poderá esperar dos anos vindouros?

sábado, 4 de outubro de 2014

A escada de acesso


Ia a meio da escada, ofegante. A inclinação não era muita, o peso da mala que carregava e cujas rodas estavam partidas é que dificultava o seu avanço.
De repente a porta abriu-se e ela apareceu, puxando também por uma mala. Pareceu ficar surpreendida por o ver chegar ou talvez ficasse surpreendida por ele a ver a partir. Deu um jeito no casaco e no cabelo, deitou a mão à porta como se a fosse fechar, mas retirou-a ao fim de uns segundos de hesitação, virando-se então para a frente e aguardando que ele acabasse de subir o que faltava da escada.
A surpresa era mútua. Também ele estava surpreendido por a ver sair da casa de hóspedes com uma mala, como se fosse partir. Ia partir, de facto, embora tivesse acabado de chegar. À última hora mudou de opinião.
Chegado ao último degrau inclinou-se para a frente para a cumprimentar com um beijo mas ela recuou. Desculpou-se de olhos postos no chão, sem o encarar de frente, dizendo que não podia ficar, tinha sido um erro, tudo desde o início tinha sido um erro. Contornou a mala dele que atravancava o caminho e começou a descer a escada.
Ainda ergueu um braço, com a mão aberta e os dedos estendidos e trémulos como se a quisesse agarrar, ao mesmo tempo que da boca entreaberta começou a sair um nome, mas depressa baixou o braço e fechou a boca. Não valia a pena.
Ficou a vê-la afastar-se até desaparecer no fim do caminho, depois pegou na mala, entrou na hospedaria e após as formalidades foi para o quarto que tinha marcado.
Da janela não se via grande coisa, apenas os telhados das outras casas, uma parte da muralha da vila e o céu azul com algumas nuvens. O único movimento eram os pardais e os pombos que por ali esvoaçavam e ficou ali a vê-los.
Vendedor de cafés de profissão, fazia esta zona há vários anos. Tinha-a conhecido há alguns meses na vizinha cidade das Caldas, era empregada de um estabelecimento seu cliente. Tinham combinado passar o primeiro fim de semana juntos.

Afinal tudo não passara de um erro. Sim, ela tinha razão, como geralmente as mulheres têm, tudo desde o princípio tinha sido um erro. Ele é que ainda acreditava que as coisas eram o que pareciam ser.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Firmeza


Ouçam bem o que eu vos digo, vai ser assim, podem ter a certeza!

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

O céu azul à minha espera


Primeiro disse que queria ir, mas passados uns minutos mudou de opinião e disse que afinal já não lhe apetecia, que estavam muitas nuvens, que iria chover pela certa, que estava frio, que tinha que fazer, que queria ficar em casa.
A cada insistência uma nova desculpa, até não lhe ocorrer mais nada. Então, valendo-se da feminina superioridade de quem sabe sempre o quê e quando fazer, disse que não valia a pena insistir porque não queria ir e ponto final.
As nuvens são passageiras, o mau humor nem por isso. Que fazer senão aproveitar o céu azul à minha espera lá fora?