Por que qualquer portador de doença crônica têm direito ao tratamento completo da doença e este mesmo direito é negado ao paciente obeso?
Obesidade é doença crônica. "Medicamentos e podem e devem ser agregados ao tratamento quando a intervenção de mudança de hábitos alimentares e prática de atividades físicas não gerarem resultado", destaca o presidente da ABESO, o endocrinologista Mario Carra. A cirurgia bariátrica é o último recurso
A proposta do PDS 52/2014 é justamente anular a decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de restringir a comercialização de inibidores de apetite (resolução 52/2011). O projeto já havia sido aprovado pela Câmara dos Deputados, e é de autoria do deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), em abril. E na última quarta-feira (16) foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
Em seu parecer favorável à matéria, a relatora do projeto, senadora Lúcia Vânia (PSDB/GO), expôs que a obesidade é um importante fator de risco para o diabetes e para graves afecções cardiovasculares, tais como o infarto do miocárdio e o acidente vascular cerebral. Segundo o Ministério da Saúde, essas doenças são as principais causadoras dos óbitos no Brasil. "Por isso, tratar a obesidade corresponde a reduzir a mortalidade do povo brasileiro", concluiu a relatora. Para ela, a aprovação do PDS 52/2014 é um importante passo para aprovação em plenário e para que o paciente volte a ter o seu direito ao tratamento garantido. O senador Alvaro Dias (PSDB/PR) também apoiou e ajudou a aprovar o PDS, que agora seguirá para o Plenário.
Em discussão anterior na CCJ, o senador Alvaro Dias apresentou argumentos da comunidade científica, que no Paraná e em outros estados do País, entende que a proibição da Anvisa aos inibidores de apetite não pode prejudicar o tratamento dos que têm obesidade mórbida. Na sua argumentação, o senador Alvaro Dias apresentou relatos da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), que defende que a Anvisa errou ao publicar uma resolução generalizando, com o intuito de evitar os abusos, mas sem ouvir os médicos. Ele destacou a opinião da Abeso de que os inibidores de apetite são as únicas opções de pessoas que não podem esperar, por exemplo, por uma cirurgia bariátrica. Alvaro Dias afirmou que, se não são ideais, os medicamentos são o que há de melhor em terapia farmacológica para tratamento da obesidade.
“É importante que o Plenário do Senado confirme a decisão tomada pela Comissão de Constituição e Justiça e aprove este projeto que derruba a resolução da Anvisa e garante que a prescrição dos inibidores seja feita com responsabilidade e vigilância, com acompanhamento do paciente durante todo o tratamento”, defendeu o senador Alvaro Dias ao final da votação na CCJ.
A Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso) lembra que, em 2011, a Anvisa tomou a decisão de suspender a produção e comercialização de medicamentos anti-obesidade no país de forma arbitrária. "Não ouviu os especialistas durante a discussão sobre os anorexígenos, tomando uma decisão baseada não na ciência, mas, sim, no preconceito", destaca a diretora da Abeso, a endocrinologista Cintia Cercato.
Riscos - Obesidade é reconhecida como doença crônica. Não é uma questão de falta de força de vontade. Ao não considerar a obesidade como doença, a Agência desvaloriza milhares de pesquisas que desvendam a fisiopatologia da doença, defendendo o não acesso ao tratamento.
A agência Estado destacou um levantamento realizado este ano pelo Estadão Dados, com base em informações do Datasus, segundo o qual o número de brasileiros mortos por complicações diretamente relacionadas à obesidade triplicou em um período de dez anos, no país. A reportagem diz que o aumento também foi significativo quando considerada a taxa de mortos por 1 milhão de habitantes. "No mesmo período de dez anos, a taxa dobrou. Foi de 5,4 para 11,9, segundo dados do Ministério da Saúde."
Os dados levam em consideração as mortes nas quais a obesidade aparece como uma das causas no atestado de óbito.
"As causas mais comuns de morte relacionadas à obesidade são as doenças cardiovasculares, como o enfarte e o acidente vascular cerebral (AVC). Sabemos, porém, que ela também está relacionada a muitos outros problemas, como apneia do sono, insuficiência renal e vários tipos de câncer", afirma o endocrinologista Mario Carra,presidente da Abeso.
Prevenção - A Abeso também lembra que remédios são para tratar o que já sofrem de obesidade e não para prevenir, e que a aprovação não exclui a necessidade de campanhas e ações de prevenção. "Prevenção da obesidade se faz com educação em massa, com informação, com educação continuada, ações que deveriam ser consideradas pelo governo como prioridade", completa o presidente da Abeso, Mário Carra.
Competências - Obesidade é uma doença crônica. Quem sofre de obesidade deve manter o tratamento durante a vida inteira, como quem tem diabetes, hipertensão arterial, ou qualquer outra doença crônica. Segundo Mario Carra, presidente da Abeso, medicamentos e outras terapias devem ser agregados ao tratamento quando a intervenção de mudança de hábitos alimentares e prática de atividades físicas não gerarem resultado. A cirurgia é o último recurso.
A Abeso defende o acesso ao tratamento, que, inclui, entre outras medidas (como atendimento multidisciplinar), o acesso a medicamentos, com prescrição médica, controle e acompanhamento profissional. "A prescrição deve ser feita com responsabilidade e vigilância, com acompanhamento do paciente ao longo do tratamento", enfatiza Carra.
O projeto de decreto legislativo, diferentemente dos outros projetos do Senado Federal e da Câmara, não necessita de sanção presidencial. Se aprovado nas duas Casas, o projeto é promulgado em sessão do Congresso Nacional.