Pintura de Chagall |
Foi comprovado que amor em demasia acarreta sérios riscos à saúde de quem ama. O amor libera uma substância ativa que age diretamente no cérebro, e faz com que os amantes tenham mais ânimo, mais força de vontade e mais alegria de viver. Até aí, tudo bem, o mundo é cor de rosa e a psicologia vai bem. Só que existe o lado negro da força. Em contra partida, essa química tem o mesmo efeito de uma droga alucinógena, viciando seus consumidores incautos. Isso explica os diversos amantes que são alcunhados de chicletinhos; que telefonam ininterruptamente, consomem-se em lágrimas e uma saudade imensa como de anos de espera os arrebata quando longe do outro. Se não correspondidos, entram em um clima de ultra-romantismo do século dezenove, proveniente da solidão aguda. Sofrem os efeitos da separação e tornam-se caixas vazias, o que é pior. Essas caixas não possuem nada a não ser recordações tristes.
E os problemas são intermináveis para quem utiliza o amor como vício de vida. Quando um amante percebe o peso do desenlace, sente o mesmo efeito da fome. A necessidade do parceiro para se recompor é inexorável e nada, nada mesmo, fará com que entenda que as coisas, às vezes, devem ser rompidas ou jamais iniciadas.
A lei do amor é universal e comum. Um macho à procura de amor é submisso à fêmea, muitas vezes maior que ele. Nesta regra, o pretendente deve mostrar superioridade fazendo com que a futura parceira se encante com suas particularidades, diferenças e qualidades. Ao final do luar de paixão, o macho é descartado perdendo a própria vida. Assim acontece no reino dos aracnídeos e em todos os outros, como assisti em um documentário no canal National Geographic. Acabamos vítimas de nossos próprios sentimentos e desejos. É o exagero do amor, da necessidade de se amar. É o que a química do amor faz em nosso corpo. Quanto mais viciados, mais admiradores do vício nos tornamos, afinal, um vício como esse é indubitavelmente atraente e muitas vezes necessário.
E engana-se quem pensa que esse consumo de amor é coisa atual. Nossos antepassados também cultuavam esse vício com alguma regularidade (não estava lá para evr). Os homens das cavernas, por exemplo, ficavam tão cheios de amor que atacavam suas pretendentes a porretadas, mantendo-as para sempre ao seu lado.
Se pesquisarmos bem, encontraremos referências até na ficção. Eu mesmo já estudei o caso. Descobri desde novelas até clássicos literários que utilizam o veneno do amor como válvula de enredo. O mais recente foi o caso da novela das seis (que já acabou, pois quando escrevi esta crônica estava no final) propõe – amor excessivo. Lembram-se da Como uma onda, onde J.J, por uma paixão enlouquecida, sequestrou e aprisionou a sua grande amada, Nina, esperando que ela lhe desse um filho, mesmo sabendo do ódio que ela nutria por sua pessoa? Não sou noveleiro, que fique claro, mas este é o clássico sintoma da rejeição e da overdose de amor.
Outros também experimentaram a química fatal. Dom Quixote foi um deles. Ficou tão louco por Dorotéia de Toboso que acabou confundindo moinhos de vento com gigantes. E Bentinho, que depois de lutar tanto para ter Capitu em seus braços, entrou em choque após descobrir sua traição. Todas vítimas fatais do amor, grande vício e, em muitos casos, remédio, que desgraça uns e vivifica muitos. Porém, nenhum efeito se compara ao trágico final do conto A Cartomante, de nosso mestre Machado, onde o amado é tragicamente assassinado por se entregar ao vício da paixão e da traição. Como já dizia Bukowski: o amor é um cão dos diabos.
Apesar de tudo, elas dizem que não estão nem aí, são independentes, donas de seus próprios narizes. Eles confessam não desejarem relacionamentos sérios, apenas diversão à custa de lágrimas. No fundo, todos querem acordar ao lado de alguém que lhes diga o quanto são importantes, o quanto fazem falta, o quanto são belos e necessários. Sempre foi assim, e sempre será assim. Não há o que fazer. Todos almejam traficar este vício que amansa e liberta leões. Por isso, reitero: o amor causa dependência e prejudica não só a saúde de quem ama, mas a de quem se ama.
Coloquem outdoors, anúncios televisivos, radiofônicos, informações nas latas de leite condensado, nos pacotes de macarrão, sal, açúcar, nas garrafas de coca-cola e, sobretudo, nas garrafas de cerveja e bebidas alcoólicas, pois estas abrem portas para novos amores. Informem a todos sobre os males que o amor pode trazer. Uma vez contaminados com a química, jamais apreciarão outra coisa a não ser o repouso do corpo frio nos braços quentes da pessoa amada. E isso eu digo por experiência.