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O DESIGN TÊXTIL E A CONSCIÊNCIA PROJETUAL

Mestre em Ciências da Comunicação (ECA-USP) e Doutoranda em Arquitetura e Urbanismo (FAU-USP). Docente do curso de Bacharelado em Design de Moda do Centro Universitário Senac-SP. <[email protected]> RESUMO A história do design de têxteis está relacionada à história da industrialização, pois a atividade, de certa maneira, consolida as práticas projetuais de cada espaço-tempo em observação. No Brasil, ao tomar como tempo de reflexão um longo período -da "descoberta" do país às primeiras décadas do século XX -, verifica-se uma mudança contínua na lógica projetual provocada, sobretudo, por pressões econômicas que marcam as diferentes fases observadas. Até o século XVIII, a consciência da necessidade de sobrevivência com certa dignidade material impulsiona o projeto; durante o século XIX, a consciência sobre a necessidade de desenvolvimento industrial impulsiona o aprimoramento de produtos e, finalmente; no início de 1900, a consciência sobre o projeto surge, e ele passa a ser visto como etapa que antecede o produto, podendo ser o diferencial para o sucesso econômico do empreendimento. Palavras-chave: história do design têxtil; industrialização; projeto.

O D ESI GN TÊXTI L E A CON SCI ÊN CI A PROJETUAL Luz García Neira Mest re em Ciências da Com unicação ( ECA- USP) e Dout oranda em Arquit et ura e Urbanism o ( FAU- USP) . Docent e do curso de Bacharelado em Design de Moda do Cent ro Universit ário Senac- SP. < [email protected]> RESUM O A hist ória do design de t êxt eis est á relacionada à hist ória da indust rialização, pois a at ividade, de cert a m aneira, consolida as prát icas proj et uais de cada espaço- t em po em observação. No Brasil, ao t om ar com o t em po de reflexão um longo período – da “ descobert a” do país às prim eiras décadas do século XX –, verifica- se um a m udança cont ínua na lógica proj et ual provocada, sobret udo, por pressões econôm icas que m arcam as diferent es fases observadas. At é o século XVI I I , a consciência da necessidade de sobrevivência com cert a dignidade m at erial im pulsiona o proj et o; durant e o século XI X, a consciência sobre aprim oram ent o de a necessidade de desenvolvim ent o indust rial im pulsiona o produt os e, finalm ent e; no início de 1900, a consciência sobre o proj et o surge, e ele passa a ser vist o com o et apa que ant ecede o produt o, podendo ser o diferencial para o sucesso econôm ico do em preendim ent o. Pa la vr a s- ch a ve : hist ória do design t êxt il; indust rialização; proj et o. IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual Con side r a çõe s in icia is Se faz t odo o sent ido acredit ar que, ent re as décadas de 1950 e 1960, aproxim adam ent e, é que passam os a t er consciência a respeit o da at ividade do design no Brasil, m as que, m uit o ant es dessa dat a, a at ividade proj et ual j á era evident e ( Cardoso, 2005) , pret endo reflet ir, nest e m om ent o, sobre o design de t êxt eis nesse período. Não se poderia concluir, at é 1960, pela m anifest ação da “ inconsciência” na prát ica do design, m as sugerir que a consciência se aproxim ava da prát ica, sem ser ela m esm a proj et ual por excelência. É cert o que as condições que fizeram nascer o Design I ndust rial são prát icas de concepção e de produção m uit o diferent es das que exist ent es hoj e em dia ( Dubuisson e Hennion, 1996) , porém os part idos adot ados para o desenvolvim ent o de produt os t razem , desde o século XVI , ingredient es das variáveis dos proj et os. Tant o com o processo quant o com o produt o, acredit a- se que t om a part e do design a m at erialização/ concret ização de um a lógica inst aurada que cost um a at ender a aspect os obj et ivos ( t ecnicoeconôm icos) e relat ivos, ist o é, cult urais ( Munari, 1973) em um det erm inado cont ext o de circulação de m ercadorias, e, t ant o hoj e quant o em t em pos m ais dist ant es, essa lógica sem pre est eve present e, m esm o em processos art esanais. Trat a- se, assim , nest e m om ent o, de discut ir alguns dos principais desafios que suscit aram o desenvolvim ent o de produt os t êxt eis no Brasil ant es da rupt ura ( Cardoso, 2005) . Desenvolvendo produt os de acordo com as m at erialidades e os sím bolos que perm earam o am bient e social, do início do século XVI à prim eira m et ade do século XX, é possível verificar a lut a incessant e dos indivíduos em preendedores que, prim eiram ent e, t ent aram resolver seus problem as de subsist ência com a produção de t ecidos rúst icos ( consciência da necessidade) est rangeira ( consciência do para, post eriorm ent e, progresso) e, para com pet irem t al, com aprim oraram a produção processos de desenvolvim ent o de produt os ( consciência do produt o) . IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 2 At é agora, só foi possível t er acesso a esse cont ext o e, com isso, elaborar hipót eses prováveis, por m eio de font es secundárias. Aliás, a exist ência no Brasil de raras am ost ras de t ecidos, ant eriores ao século XI X, evidencia- se com o um problem a que vem sendo cont inuam ent e apont ado ( Paula, 2004; Andrade, 2006) por nossos pesquisadores. Com base em narrações que versam , sobret udo a respeit o do desenvolvim ent o da indust rialização e das t rocas sociais do período, a versão aqui apresent ada const it ui apenas um a int erpret ação possível ( Le Goff, 1994) . É necessário, desse m odo, que o leit or perceba que, em cam adas abaixo dest e t ext o, exist em out ras, const ruídas por hist oriadores, sociólogos e escrit ores que aplicaram visões m ais rom ânt icas ou m ais crít icas ao período em quest ão, de acordo, obviam ent e, com suas próprias “ consciências” de indúst ria e sociedade. E porque não dizer, t am bém , de sua consciência de design? Tal aspect o m erece um a ressalva, pois, raros aut ores com pesquisas abrangent es discut em o design de t êxt eis ao falarem de indust rialização no Brasil. Com o est e t rabalho versa a respeit o da fase em que o produt o é definido na ausência de consciência proj et ual, m as t angencial a ela, o t ópico que t rat a da segunda m et ade do século XX apenas procura dem onst rar que os esforços em preendidos em séculos ant eriores surt iram efeit os posit ivos sobre o desenvolvim ent o do design de t êxt eis. Esse período, port ant o, não est á t rat ado com a profundidade necessária. Cabe, apresent ada enfim , e m encionar publicada que est e nos Anais do art igo 8º part e de Congresso um a Brasileiro versão de ant erior, Pesquisa e Desenvolvim ent o em Design ( P&D) , ocorrido em São Paulo, em out ubro de 2008. D o sé cu lo XVI a o XI X: con sciê n cia sobr e a n e ce ssida de Em Origens e evolução da indúst ria t êxt il 1850- 1950 1 , publicação que pode est ar ent re as precursoras acerca das origens e do desenvolvim ent o da indúst ria t êxt il brasileira, deparam o- nos com t erm inologias curiosas que qualificam os t ecidos IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 3 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual produzidos ou im port ados pelo Brasil durant e o período. Tais designações evidenciam que, m uit o em bora não exist isse o m esm o grau de consciência que at ualm ent e t em os sobre a prát ica proj et ual, as diferenças ou qualidades foram not adas e, port ant o, verbalizadas. Tem os acesso às ideias de produt os t êxt eis por descrições que nos chegaram pelos est udos hist óricos e, t am bém , pelos relat os de viagens e out ras lit erat uras. Est im ase a presença de um a variedade de t ecidos considerável além daquelas ‘desqualificações’ m encionadas por St ein ( 1979) , com o “ panos para negros” , “ panos para pessoas m enos favorecidas pela sort e” , et c., ut ilizados para t ecidos grosseiros em geral. Out ras, quando definidoras de algum nível de “ design” ( no sent ido m at erial, porque apresent avam algum desenvolvim ent o de m at éria- prim a e processo produt ivo e, no sent ido sim bólico, porque pret endiam dest inar- se a um out ro t ipo de consum o) , ou referiam - se ao local de origem – bret anha, para espécies de t ecidos vindos da I nglat erra ou que im it avam as t ram as inglesas, por exem plo –, ou aparência/ uso, ou sej a, “ est avam classificados de acordo com a sua qualidade. Havia os superiores e os inferiores ou ordinários” ( Januário, 2006, p. 178) . Essas nom eações foram usadas para a sua t ransform ação em m ercadorias. Diferent em ent e dos produt os considerados art esanais, que no caso do Brasil relacionam - se com a produção de art efat os indígenas, bem ant es do ano de 1500, e que englobaria basicam ent e t écnicas de fiação, de cruzam ent o e de t ingim ent o de fibras para a confecção de t angas, t únicas, calças, redes e cest as, ent re out ros, o design de t êxt il, t om ado em sua perspect iva indust rial, é int erpret ado com o fat or de diferenciação, progresso e concorrência. Desconsiderando I sso se inicia, no m ínim o, após dois séculos de colonização. qualquer análise das form as significat ivas quase sem pre present es nos m odos de produção art esanais ( Shoeser, 2003) , pode- se afirm ar que, at é o século XVI I , a produção de t ecidos2 local era de subsist ência, dedicada apenas à m anufat ura de t ecidos grossos dest inados às classes m ais pobres, à sem elhança do que t am bém ocorria em Port ugal ( Delson, 2004) . Esse sist em a, que cont ava com a IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 4 m ãodeobra escrava, t ant o para fiar quant o para t ecer, m anifest ou- se nas áreas m ais povoadas de quase t odo o t errit ório e supria a necessidade int erna de produção de t ecidos dest inada ao vest uário, com o t am bém às sacarias para o açúcar e o t abaco produzidos nas fazendas, não se exigindo, port ant o, qualquer aprim oram ent o dos t êxt eis “ da t erra” . Para Delson ( 2004) , apesar de o Brasil possuir condições m uit o favoráveis ao desenvolvim ent o desse t ipo de indúst ria, dispondo de m at éria- prim a abundant e, grande quant idade de m ãodeobra, am plo m ercado int erno e, event ualm ent e, algum apoio dos governos locais, sua posição com o colônia port uguesa const rangeu seu aprim oram ent o durant e um longo período, um a vez que Port ugal est ava at ado aos t ecidos ingleses, pelo Trat ado de Met huen, firm ado em 1703. Esse acordo com ercial, t am bém conhecido com o Trat ados de Panos e Vinhos, liberava o envio de t ecidos ingleses para Port ugal sem o pagam ent o de im post os alfandegários e, ainda, concedia os m esm os benefícios aos vinhos port ugueses na I nglat erra. Um a nova polít ica econôm ica im plant ada por Marquês de Pom bal ( 1600- 1782) , prim eiro- m inist ro port uguês no período 1750- 1777, t eria sido a responsável por est im ular o surgim ent o de pequenos em preendim ent os t êxt eis3 em t odo o t errit ório nacional à alt ura, conform e relat os de usuários com m ais posses e exigências, um a vez que é apont ada a produção de linhos, veludos, rendas e t ecidos com fios de ouro e prat a. Sem dúvida, a m aior part e da produção era de “ panos brancos” e um a cot a bem m enor ut ilizava o t ingim ent o com o fat or de diferenciação, produzindo os prim eiros riscados com a ut ilização de fios crus e t int os, que exigiam conhecim ent o sobre recursos nat urais ( os corant es) e t écnicas quím icas. Além desses, conform e Delson ( 2004) , t ecidos m ais grossos e acessíveis com ent relaçam ent o de seus fios previam ent e t ingidos, que form avam padrões geom ét ricos sem elhant es aos dos art efat os indígenas, indicam a influência cult ural da m ãodeobra sobre os produt os, o que t ornava t al produção capaz de at ender aos valores sim bólicos desses que t am bém eram seus consum idores. IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 5 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual Re pr odu çã o r e t ir a da da obr a de D e lson ( 2 0 0 4 ) . Le ge n da : “ Prospect o do Tear , com que fazem as suas r edes m ais delicadas as Í ndias da villa de Mont e- Alegre” Ao longo do século XVI I , a vida social na Colônia j á dava evidências de que os t ecidos t inham um valor sim bólico que ia além de sua funcionalidade. Em decret o de 1696, por exem plo, aos escravos e negros foi proibido o uso de det erm inados t ipos de t ecidos, cores e aviam ent os, rest ringindo a classe de t ecidos, t ida com o m ais nobre, aos indivíduos de m aior posse e, ainda, dist inção. Econom icam ent e, a im port ância da indúst ria t êxt il para o desenvolvim ent o dos países era fat o que com eçava a ser observado ou, no m ínim o, a desaceleração dos processos indust riais vivenciada na Europa abalava as finanças dos governos. Nesse cont ext o, ao verificar que o t rânsit o de t ecidos cont rabandeados no Brasil ou, ainda, o suprim ent o de algum as espécies pelas incipient es indúst rias que se desenvolviam na Colônia, o governo port uguês foi alert ado quant o à im port ância do IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 6 segm ent o. Assim , o Alvará de 5 de j aneiro de 1785, assinado pela Rainha Dona Maria I ( 1734- 1816) , proibiu a fabricação de m anufat uras de linho, algodão e seda na Colônia. Le ge n da : Dona Maria I e Pedro I I I , 1760- 1785. Óleo sobre t ela, Museu Nacional dos Coches, Lisboa. A m ot ivação polít ica do alvará era o im pedim ent o de const rução de um cam inho em direção à independência: “ t endo os m oradores da colônia, por m eio da lavoura e da cult ura, t udo quant o lhes era necessário, se aj unt assem a isso as vant agens da indúst ria e das art es para vest uário, ‘ficarão os dit os habit ant es t ot alm ent e independent es de sua capit al dom inant e’” ( Holanda, 2004, p. 107) . Desse m odo, coibiu- se o desenvolvim ent o t êxt il no Brasil por m ais alguns anos. Conform e indicam os docum ent os hist óricos exam inados por Libby ( 1997) , o at o significou um a ação desm edida, um a vez que, na verdade, 94,8% da produção se t rat ava de pano liso de algodão, em sua m aioria grosseira, e apenas um a pequena parcela de designações do período indicaria a possível exist ência de variedades cuj a produção era de fat o proibida: IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 7 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual A segunda cat egoria m ais frequent e, im port ando em m ais 3% dos t ipos de pano regist rados, era um a m ist ura de algodão liso com algodão desenhado. O significado de desenhado não é claro; pode t er envolvido o uso de fios coloridos ou sim plesm ent e panos brancos com relevos. ( p. 111) Mesm o que a am pla at ividade t êxt il, no âm bit o fam iliar, sej a significat iva para apont ar que o país se m ost rava propício ao desenvolvim ent o indust rial, som ent e com a chegada de Dom João VI , em 1808, e a revogação de dit o Alvará, é que se passou a est im ular indist int am ent e a produção de t ecidos. Passam os, ent ão, a receber do Reino, após 1813, invest im ent os em m aquinário e em m ãodeobra especializada, por sua vez, dest inados a t ransform ar a t ecelagem local num a indúst ria prom issora, assim com o ocorrera na I nglat erra 4 . A hist ória dessas prim eiras em presas não foi m uit o prom issora, pois além das quest ões t arifárias im pedindo que se fizesse o invest im ent o necessário para o desenvolvim ent o dos produt os e das m anufat uras, a falt a de um a m ãodeobra qualificada, capaz de operar as prim eiras m áquinas que exigiam delicadeza no t rat o, puseram fim aos invest im ent os j á realizados. Observa- se, assim , que, at é m eados da década de 1870, a variedade e a qualidade do produt o est avam lim it adas pelo seu processo produt ivo carent e de qualquer inovação: Em 1882, um a com issão parlam ent ar const at ou: a produção de um fabricant e em nada diferia da produção de out ro; não havia nenhum a novidade, variação ou m elhoria que aut orizasse recom endar o t ecido de um a fábrica qualquer ou dist ingui- lo dos t ecidos produzidos há anos ( St ein, 1979, p. 77) . IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 8 Mesm o que os produt os t êxt eis nacionais t enham sido ut ilizados, quase que em sua t ot alidade, para abast ecer as classes m enos favorecidas e, por essa razão, at ingiam seu grau m áxim o de qualidade quando const at ada sua resist ência, não se deve negar que o cam inho para a associação das caract eríst icas dos produt os ao sucesso em preendedor havia sido t raçado. O m aior exem plo é o início da part icipação brasileira nas Exposições Universais: um nom e para cada coisa, um lugar para cada nom e e para cada coisa, um t em po- espaço para exibir os result ados. O Brasil, desde 1861, candidat ou- se a t om ar part e at iva nessa represent ação. Cat alogou t udo que podia; decorou seus com part im ent os; ent rou na cena do desfile m undial das m ercadorias; com plet ava- se, assim , o rit ual de passagem que o fazia at uar por int eiro no concert o das nações. A im agem do país m oderno dessa form a se const ruía. Já era possível se m ost rar in t ot um e nos det alhes. At é as frat uras est avam expost as ( Hardm an apud Rezende, 2003, p. 125) . A qualidade dos t ecidos brasileiros passou a ser reconhecida inclusive int ernacionalm ent e e inúm eras são as m enções honrosas recebidas por fabricant es brasileiros em diferent es exposições. Esse fat o foi ut ilizado por nossas indúst rias com o argum ent o de vendas e de prom oção do t ecido nacional: fabricant es brasileiros obt iveram m enção honrosa na exposição de Viena, em 1873 ( STEI N, 1979) ; prem iação 5 obt ida pela fábrica de t ecidos Carioba na Exposição Universal de Paris, em 1891, em virt ude de “ art efat os de algodão” , enviados para subm issão; e de out ros enviados pela Com panhia Am érica Fabril do Rio de Janeiro para a Exposição Universal de 1895, t am bém prem iados ( WEI D, 1995) . IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 9 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual A pr im e ir a m e t a de do sé cu lo XX : con sciê n cia sobr e o pr ogr e sso Não é porque se verifica grande expansão das m anufat uras t êxt eis, ao longo do século XX, que se deixa de observar a perm anência das at ividades art esanais de fiação e t ecelagem . Aliás, esses t ecidos cum prem o m esm o papel daqueles produzidos pelas prim eiras indúst rias, caract erizando- se com o grosseiros, apesar de exibirem , conform e olhos at ent os, um design int eressant e. Pearse afirm a: “ alguns dos designs produzidos pelos t eares m anuais são com plet am ent e art íst icos, sobret udo, considerando a com binação de cores. Geralm ent e, t int as veget ais são usadas pelo t ecelão, que t inge ele m esm o seu próprio fio” ( 1922, p. 26) . Le ge n da : Reprodução ret irada da obra de Pearse ( 1922) . I m agem de m ulher fiando no int erior do Brasil, na prim eira década do século XX. Mas, na perspect iva indust rial, durant e t odo o século XI X, os t ecidos aqui fabricados foram qualificados apenas por seu possível uso ou por sua funcionalidade, sendo dest inados àqueles que realizavam at ividades subalt ernas: “ t ecidos para roupas para os t rabalhadores, escravos e livres, da cidade e do cam po” ; “ panos para ensacar açúcar e café” ; “ t ecidos de segunda usados som ent e para vest ir negros e para enfardam ent o” ; “ t ecidos de algodão de segunda, adequados para roupas de escravos e IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 10 colonos e para ensacam ent o” e “ pesados adequados para as classes da sociedade m enos favorecidas pela sort e” e, t am bém , ao enfardam ent o de m ilit ares. Ent ende- se, port ant o, que, durant e um longo período, t odos os t ecidos diferenciados pelo seu design e que davam origem às vest im ent as da burguesia e t am bém agradavam as m ulheres m ais pobres, em sua m aioria, de origem im port ada: Naqueles t em pos [ referindo- se à década de 1870] , um vest ido com um de algodão est am pado de m anufat ura inglesa ou port uguesa cust ava ent re oit o e doze m il- réis, ist o é, de duas a t rês libras est erlinas, devido ao m onopólio do com ércio, at ravés do qual os m ercadores de Recife cobravam os preços que bem ent endiam por suas m ercadorias. Porém , desde a abert ura dos port os ao com ércio est rangeiro, as m ercadorias inglesas vêm penet rando por t odo o país, e os vendedores am bulant es são m uit o num erosos ( Kost er apud Libby, 1997, p. 101) . Nesse cont ext o, m uit o em bora a indúst ria t êxt il brasileira est ivesse conscient e de que oferecia t ecidos grossos que “ apresent avam m aior durabilidade” e que “ podiam ser lavados m uit as vezes sem perder a resist ência e a t ext ura” ( St ein, 1979, p. 71) , a concorrência com os produt os est rangeiros evidenciou a necessidade de m udanças. Le ge n da : Reprodução ret irada da obra de Pearse ( 1922) . I m agem de m ulher fiando no int erior do Brasil, na prim eira década do século XX. IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 11 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual O prim eiro passo deu- se em direção ao aprim oram ent o das m anufat uras6 ( Mello, 2003) que, com o foi observado, operavam em t odas as et apas de t ransform ação da m at éria- prim a – da lim peza do algodão ao t ingim ent o do t ecido –, não perm it indo especializar- se em nenhum a delas. Por m eio de reform as nos t eares, aquisição de novas m áquinas e especialização da m ãodeobra, perseguia- se o aum ent o da produção de t ecidos e a obt enção de um padrão de qualidade que insist ent em ent e relacionava- se à sua durabilidade e resist ência. Os consum idores brasileiros, no ent ant o, cont inuavam a deixar- se “ seduzir pela im pressão de boa aparência” ( St ein, 1979, p. 71) e, por isso, é possível que a indúst ria t enha se sent ido est im ulada para o aperfeiçoam ent o e para a diversificação da produção de t ecidos, a part ir de 1885, quando se localizam descrições de produt os nacionais indicando a produção de novas variedades com o riscados7 , cassinet as8 e panos9 para cam isas. Todos esses produt os, obt idos pelo ent relaçam ent o de diferent es fios e de alt erações na est rut ura de t ecim ent o, caract eríst icas específicas de acabam ent o quím ico e/ ou físico, assim com o aqueles produzidos com fios de ouro e prat a ( Novais apud Libby, 1997) indicam o dom ínio das t écnicas de padronagem t êxt il. Essa at uação vem dem onst rar que os prim eiros responsáveis por novas criações t eriam sido os próprios operários, m est res e dem ais profissionais que pudessem est ar envolvidos com o processo produt ivo, à sem elhança do que ocorrera com o processo de produção de t êxt eis na I nglat erra em 1830 com o dest acou Boydell ( 1995) , ao afirm ar que “ woven design is produced ent irely by m em bers of t he product ion st aff [ ...] ” ( p. 31) . Adem ais, o que Boydell ( 1995) denom ina t ext ile design ( desenho de est am paria 10 ) , e que t eve início em m anufat uras européias no final século XVI I , apresent a raras font es hist óricas no Brasil. É possível, por hora, reconst it uir apenas o cenário onde se pret endia im plem ent ar est am parias ou onde as prim eiras acabaram por se est abelecer, não t endo sido especuladas ainda as t écnicas e t radições de desenho, a at ividade profissional e at é m esm o afirm ar com precisão sobre as t ecnologias de IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 12 im pressão disponíveis e as m ais com um ent e ut ilizadas. Out ra hipót ese, ainda, é de que alguns dos processos de est am paria, apoiados na ideia de beneficiam ent o e m elhoria dos t êxt eis, t enham ocorrido em oficina de t int uraria no Rio de Janeiro, em 1866, por um em preendedor francês que se j ulgava o pioneiro na art e de im pressão de t ecidos no Brasil. Há cont rovérsias. Mello ( 2003) , por exem plo, indica, com o prim eira int enção para a produção de t ecidos est am pados no Brasil 11 , a do Coronel Ant onio Barbosa da Silva, considerado o pioneiro no cam po das indúst rias de t ecidos de Minas Gerais, quando, em Sabará, “ fez plant ar o linho, m andou vir art ist as da Europa, e fez t ecer lãs, linhos, algodões lisos e laureados” ( p. 30, grifos m eus) por volt a de 1768, ou sej a, com cem anos de defasagem em relação ao uso m anufat ureiro da t écnica de block- print ers12 na I nglat erra. Em Minas Gerais, desde m eados do século XI X, est am pavam - se, t am bém a part ir de cunhos, as chit as ( Mellão et al., 2005) . Com a int enção de concorrer com os chint z ingleses, esses t ecidos m ant iveram a t radição da est am pa floral, m as foram barat eados em sua const rução t êxt il que, sendo caract erizadas por t ram as m ais abert as, deram origem a t êxt eis de m enor qualidade. At ualm ent e, a chit a que encont ram os no com ércio pode t er a m ist ura de fibras art ificiais. No Sudest e, a pret ensão de est am par t ecidos apenas m anifest ou- se quando os ingleses j á est am pavam t ecidos em m aquinário de alt a produt ividade, ou sej a, nas m áquinas roller- print er 13 , pat ent eadas, em 1785, na I nglat erra e rapidam ent e dissem inadas pela Europa. No Rio de Janeiro, em 1820, foi m at riculada na Real Junt a de Com ércio no Rio de Janeiro um a est am paria e, na Província de São Paulo, a prim eira ideia de inst alar m áquinas de est am paria, de procedência francesa, som ent e ocorreu em 1825, quando o francês Nicolau Dreys solicit ou ao governo doação de t erras em local onde poderia obt er ácido pirolenhoso pela dest ilação da m adeira, necessário ao processo quím ico de est am paria ( MELLO, 2003) . IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 13 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual Sobre nossa aparent e dificuldade em produzir t ecidos est am pados, é possível que isso t enha um a relação diret a com o desconhecim ent o t écnico que Port ugal t am bém t inha, nesse sent ido. Segundo Mello ( 2003) , nas prim eiras décadas do século XI X, Port ugal est ava at rasado em conhecim ent os quím icos e esse fat o causou a quebra desse segm ent o indust rial, enquant o que out ros est udos ( Sloat , 1975) dem onst ram que, no m esm o período, a t ransferência de t ecnologia da I nglat erra para os Est ados Unidos prom oveu significat ivos avanços na Colônia: em 1826, j á se est am pavam indust rialm ent e t ecidos pelo sist em a de blocks e, no ano seguint e, em m áquinas de est am paria com rolos, verificando- se t am bém pesquisas e invest im ent os na área da quím ica t êxt il para garant ir a qualidade do produt o final. I niciat ivas em preendedoras à part e se devem considerar, ainda que exist am diferenças subst anciais ent re a possibilidade de se produzir t ecidos est am pados e a sua criação por designers no Brasil, área na qual as descobert as hist óricas e t écnicas t endem a ser m ais inovadoras. Já é possível ant ecipar, no ent ant o, que, ant es da virada do século, algum as fábricas de t ecidos j á t inham escolas de art ífices funcionando em seu int erior e lá o desenho para a est am paria e t am bém a padronagem dos t ecidos eram ensinados. St ein ( 1979) afirm ou que, em 1894, a única indúst ria capaz de produzir t ecidos est am pados no Rio de Janeiro era a Com panhia Progresso I ndust rial do Brazil. Supõe- se, no ent ant o, de que a possibilidade de produzir padrões criados no Brasil só t enha ocorrido a part ir de 1903, quando foi inaugurada a oficina de gravura dessa fábrica, “ que passou a cont ar com um a prensa lit ográfica, um a t ipográfica e um m ot or elét rico” ( Silva, 1989, p. 30) . Na opinião dest e, a part ir de ent ão “ foi possível a seção recom por e abrir novos cilindros de cobre, at é ent ão im port ados da I nglat erra” ( p. 30) e, sabe- se, j á t rabalhava na fábrica o port uguês José Villas Boas, chefe da sessão de gravura, considerado “ est ilist a” , ao m enos em relat os at uais14 . A Com panhia Am érica Fabril, localizada no Rio de Janeiro, t am bém decidiu a part ir de 1903 invest ir na sofist icação e diversificação de sua produção, inst alando um a seção IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 14 de est am paria e beneficiam ent os com plem ent ares ( Weid, 1995) que, a part ir de 1911, foram pot encializadas pelas inst alações anexas de apoio, “ com o um a oficina de gravura e um laborat ório quím ico indust rial” ( p. 14) . Para a realização desses beneficiam ent os, a em presa passou a cont ar “ com pessoal t écnico especializado” ( Weid, 1986, p. 139) , dando a ent ender que, de início, as indúst rias prepararam - se para a produção para, em seguida, poderem realizar t am bém o proj et o dos t ecidos, que foi expandido com a inauguração, na década de 1920, de um a seção de bordados com dez m áquinas para bordar t ecidos que em pregou “ um m est re, ou um t écnico de bordados, ou pant ografist a, responsável pela elaboração dos desenhos e o m anej o do pant ógrafo” ( p. 211) . Os novos invest im ent os em t ecnologia t êxt il dest inada ao proj et o parecem t er sido m ot ivados pela int enção de a indúst ria nacional capacit ar- se para a concorrência com os t ecidos ingleses que ainda dom inavam o m ercado int erno quando o padrão de referência era a nobreza e a variedade: Com o t am bém se t ornasse necessário m elhorar a apresent ação do t ecido, foram com pradas e assent adas na sala de m orim um a calandra de lust rar e um a m áquina de branquear [ ...] . A Com panhia [ Com panhia Progresso I ndust rial do Brazil - - Bangu] cont inuava [ refere- se ao ano de 1900] com sua polít ica de renovação e aperfeiçoam ent o, est im ulada pela diversificação dos t ecidos da fábrica e especialização do m ercado int erno, e t am bém por causa da concorrência que os sim ilares nacionais passaram a fazer aos produt os est rangeiros ( SI LVA, 1989) . Ainda que não sej a possível afirm ar com precisão em que m edida havia originalidade nos t ecidos produzidos no Brasil e, sem dúvida, isso quer dizer t am bém adequação funcional à realidade nacional ( especificam ent e, sobre o peso dos t ecidos) , o avanço da indúst ria nacional, pela via da aquisição de equipam ent os e t ecnologia, IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 15 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual reverberou, sem dúvida, no produt o que passou a ser oferecido para o consum idor. Algum as em presas, com o a Bangu, – q ue, no ent ender da pesquisadora Bonadio ( 2005) , era um a exceção naquele período – foram recom pensadas por seu em preendedorism o, sendo galardoada na exposição de 1908 com “ duas m edalhas de ouro, para gravura m ecânica e t ricom ia, e o Grande Prêm io dest inado aos m elhores t ecidos” ( Silva, 1989, p. 134) 15 , abrindo espaço para um a segm ent o indust rial que avançaria rapidam ent e nos anos seguint es. Em relat ório oficial ( Pearse, 1922) , elaborado de m arço a set em bro de 1921, apont ou- se para o crescim ent o vert iginoso do segm ent o t êxt il, not adam ent e fiações e t ecelagem de algodão. Os núm eros indicam : havia 9 indúst rias t êxt eis, em 1865; 49, em 1845; 110, em 1905; e, segundo o Cent ro I ndust rial de Fiação e Tecelagem do Rio de Janeiro, em 1921, j á cont ávam os com 242 unidades fabris. Tal avanço fez com que o próprio relat or verificassse que, naquela dat a, apenas os t ecidos im port ados de alt íssim a qualidade t inham condições e gozavam de diferenciais para com pet ir no m ercado brasileiro. A se gu nda m e t a de do sé cu lo XX : consciê ncia sobr e o pr odu t o As prim eiras décadas do século XX sediaram a grande expansão da indúst ria t êxt il brasileira. Dados levant ados por Loureiro ( 2006) indicam que, em 1920, o país j á cont ava com 1.211 est abelecim ent os t êxt eis de diversos t ipos e, em 1940, esse núm ero havia crescido para 2.210, o que result ou na ocupação de m ãodeobra de m ais de 94 m il t rabalhadores e, t am bém , na m udança de perfil desses operários. Se, inicialm ent e, as at ividades de fiar e t ecer podiam ser realizadas por m ulheres e crianças, “ funções m uit o especializadas, t ais com o a de engom ador, t int ureiro, est am pador e m ecânico rat ificam a predom inância do hom em - adult o, quando o saber t écnico t ornava- se essencial” ( Loureiro, 2006, p. 41, grifos m eus) . Origina- se, desse m odo, a ideia de que ao haver IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 16 grande núm ero de est am padores e operários relacionados com o acabam ent o quím ico dos t ecidos, havia t am bém um a at ividade proj et ual precedent e sobre a qual cabem novas invest igações. Avent a- se a hipót ese de que o período 1920- 1950 t enha sido, por diversas razões, o responsável pela “ nacionalização” da at ividade t êxt il, o que perm it e afirm ar que, ao longo dessas t rês décadas, conquist ou- se capacidade t écnica suficient e t ant o do pont o de vist a da m ãodeobra quant o do m aquinário 16 , para que fosse possível prom over esse set or no Brasil. Nesse m om ent o, a diversificação e a busca para a m aior qualidade de t ecidos, segundo Loureiro ( 2006) , foi vist a com o um a saída para um a crise que t ornava insust ent ável, especialm ent e no período 1930- 1940, quando não havia equilíbrio ent re a capacidade int erna de produção de t ecidos e a de seu consum o. Um a est rat égia relevant e para alinhar t al falt a de sint onia foi a produção de art igos de luxo “ para suprir a dem anda das classes ricas” ( Loureiro, 2006, p. 261) . A valorização da qualidade dos t ecidos nunca havia sido t ão grande. Em art igo de Cecília Meireles de 1939, a escrit ora revela diferent es preços de roupas, segundo os t ecidos que descreve com o “ t ecido regular com bordados” , “ t ecido m elhor” ou “ vest ido de brocado sem out ro enfeit e que é a própria t ela” , e considera ainda que “ o vest ido ou é sim ples, e a sua riqueza est á na qualidade do t ecido, ou é com plicado, e gast a- se m uit o em bordados e aviam ent os” ( Meireles apud Maleronka, 2007, p. 111) . Esse padrão de consum o, evident em ent e im post o pelo rit m o da indúst ria européia, gerou um sist em a de reprodução de t ecidos em seus aspect os est rut urais e est ét icos, que t am bém dom inou t ant o a confecção das roupas pelas m odist as quant o pelo prêt - à- port er ( Maleronka, 2007) , dando início a um período de “ busca de ident idade nacional” que m erece dest aque. A at ividade precursora desse processo pode ser at ribuída a Piet ro Maria Bardi ( 1900- 1999) ao organizar, em novem bro de 1952, a exposição Moda Brasileira no, ent ão, Museu de Art e ( at ual Masp) . A ideia, segundo Bardi ( 1952) , era a de “ apresent ar IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 17 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual m odelos e t ecidos criados por art ist as nacionais com o propósit o de increm ent ar o est udo e o desenvolvim ent o da m oda” , sendo os principais obj et ivos de o t rabalho revelar aspect os vivos de nossa cult ura e est im ular a aut onom ia da nossa m oda com o expressão das reais necessidades populares, o que foi ent endido pela im prensa no período com o a criação de um a m oda popular acessível a t odos. Recebendo apoio t écnico e de m at eriais da Casa Anglo Brasileira ( Mappin) , Bardi convidou Caribé ( 1911- 1997) , Burle Marx ( 1909- 1994) e Sam bonet ( 1924- 1995) para desenharem est am pas e criarem m odelos e, ainda, Klara Hart och, para professora das aulas de t ecelagem do m useu, para a elaboração dos t ecidos. Apesar do êxit o popular do event o, com provado com inúm eras crít icas favoráveis em j ornais, nas próprias palavras de Bardi, esse event o t rat ou de um em preendim ent o “ que não deu cert o” . Dez anos depois, no ent ant o, com o obj et ivo de int roduzir no m ercado int erno t ecidos produzidos com fios sint ét icos, a Com panhia Brasileira Rhodiacet a reproduziu o m esm o t ipo de event o e apoiou o desenvolvim ent o de est am pas por art ist as brasileiros e, de seus respect ivos m odelos, por est ilist as nacionais, com o est rat égia de divulgação dos fios sint ét icos ainda não incorporados à cult ura nacional. Essa ação com ercial parece t er sido bast ant e significat iva para o desenvolvim ent o criat ivo da indúst ria t êxt il brasileira, pois, segundo Bonadio ( 2005) , “ ent re o final da década de 1950 e início da década de 1960 [ ...] , as est am pas dos t ecidos [ brasileiros] são carregadas e pouco dialogam com os padrões adot ados pela m oda parisiense e pelas art es” e t eria sido a Rhodia a responsável pela alt eração do design dos t ecidos no Brasil, quando o “ excesso de flores m iúdas é subst it uído por padrões predom inant em ent e geom ét ricos, os quais dialogam diret am ent e com as novas produções da m oda parisiense e, em especial, com a art e abst rat a e concret ist a” ( p. 84) . Não por acaso, a ação com unicat iva da em presa foi a de indust rializar a produção art íst ica daqueles que eram expoent es de nossa ident idade m oderna no período. Tal m odelo – o est ím ulo à produção de est am pas por art ist as brasileiros – t am bém foi IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 18 reproduzido em out ras inst âncias, quando da realização de concursos e, t am bém , da ext ensão dessas referências a inúm eras t ecelagens e est am parias brasileiras. Con side r a çõe s fina is Sabem os que as prát icas proj et uais, assim com o se dirigem a at ender quest ões de ordens obj et iva e relat iva ( Munari, 1973) , t am bém respondem a elas, ist o é, um a cult ura de proj et o inst ala- se em decorrência de quest ões t écnicas, econôm icas e cult urais. Esse breve t rabalho procura dem onst rar que é possível, a part ir do est udo dest e cont ext o, indicar causas de um det erm inado st at us de desenvolvim ent o de produt os e, t am bém , analisar as suas consequências, t ant o com o obj et ivo de com preender o passado quant o para focar o olhar nos fat os do fut uro ( Bloch, 2002) . N OTAS 1. St anley J. St ein foi brasilianist a am ericano que chegou ao Brasil em 1948 e r ealizou pesquisas sobre a produção cafeeira, t am bém , sobre a indust rialização. Seu livro publicado nos Est ados Unidos, em 1957, foi post eriorm ent e t raduzido para o port uguês no Brasil. 2. É im port ant e dest acar que est e est udo dedica- se apenas a observar a indúst ria t êxt il em seu segm ent o de t ecelagem . Os hist oriadores pesquisados indicam , com bast ant e firm eza, a exist ência de plant ações de algodão e de sua fiação, sobret udo para a export ação, porém a indust rialização do algodão não será abor dada nest e t r abalho. 3. Diversos aut ores j á afirm aram que a at ividade t êxt il no âm bit o fam iliar sem pre foi m uit o com um no Brasil e exercida, especialm ent e, pelas m ulheres e crianças. Libby ( 1997) chegou a sugerir, inclusive, que esse t alvez t enha sido um dos m ot ivos pelos quais não houve int eresse por indust rializar a at ividade t êxt il, fadada, naquele m om ent o, ao preconceit o, por part e dos pat riarcas. IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.1 n. 2 set./dez. 2009 – Dossiê 1 19 Luz García Neira | O design têxtil e a consciência projetual 4. Segundo Rafael Cardoso ( 2005) , a indúst ria t êxt il inglesa foi responsável pelo prim eiro surt o indust rial verificado no final do século XVI I e que, devido à sua crescent e t ecnologização, viabilizou o aum ent o da dem anda em função da am pla ofert a de m ercadorias por um baixo cust o. 5. Cart a enviada a Paris, em 3 de j unho de 1895, solicit ando a ent rega da m edalha ao Sr. Benj am in Wilm ol, possivelm ent e em visit a à cidade. Arquivo do Est ado de São Paulo. 6. Nesse caso, m anufat ura refere- se ao m odo de pr odução e não aos produt os. I sso quer dizer que os invest im ent os realizados eram para m elhorar a produt ividade dos em preendim ent os e não diversificar produt os. 7. Adornado com riscos ( diz- se de t ecido) ; list rado, conform e Dicionário Houaiss. Do pont o de vist a da t ecnologia t êxt il, esses t ecidos, na ocasião, eram obt idos com fios de urdum e de cores diferent es ent re si, ist o é, um a criação dependent e do t ecim ent o. At ualm ent e esse t ecido é conhecido por fio t int o. 8. Tecido fino de lã, usado geralm ent e para forrar roupas, conform e Dicionário Houaiss. 9. Pelo que pôde ser observado pela revisão bibliográfica, pano refere- se a um a qualidade de t ecido específica, provavelm ent e alvej ada ou colorida, ou sej a, não cru. O t erm o t ecido ( com o subst ant ivo) aparece raram ent e com o descrição dos t ecidos at é o século XX. 10. A grande part e dos aut ores t écnicos denom ina o t ext ile design de Boydell com o print ed t ext ile design. 11. Sabe que esses recursos poderiam dar origem a t ecidos desenhados com base em t écnicas de ent relaçam ent o ( j acquard) , porém é pouco prov ável que t enha sido essa a int enção dada à necessidade de concorrer com os t ecidos ingleses predom inant em ent e est am pados. 12. Block- print er é um sist em a de im pressão a part ir da elaboração de desenhos em alt o relevo em placas de m adeira, t ant o por m eio da ret irada da m adeira com o por m eio de aplicação de desenhos em m et al. Em língua port uguesa, denom ina- se cunhos. 13. Roller print er é um sist em a de im pressão por m eio de cilindros de cobr e nos quais os desenhos a serem im pressos são encravados. Por m eio da im pressão indiret a – o cilindro é subm erso em um t anque e a t int a deposit ada nas est rias, por cont at o, passa a um cilindro recobert o de m at eriais adequados ( com caract eríst icas da borracha) –, o pigm ent o ent ra em cont at o com a superfície do t ecido. 14. ht t p: / / fut eboleum acaixinhadesurpr esas.blogspot .com / 2007/ 10/ o- escudo- e- as- cores- do- bangu.ht m l Acessado em 22/ 12/ 2007. IARA – Revista de Moda, Cultura e Arte – São Paulo v.2 n.1 set. / dez. 2009 – Dossiê 1 20 15. Apesar de at é o m om ent o não t er acesso a im agens ou docum ent os prim ários desse fat o, com parando esse relat o com o cat álogo dos produt os enviados por São Paulo que t em grande núm ero de fot ografias de t ecidos expost os, o depoim ent o j ust ifica- se. Ent re as inúm eras im agens, m ais de 95% t razem apenas t ecidos lisos, list rados e xadrezes. 16. Não cabem discussões a respeit o da origem do m aquinário, m as sobre a sua disponibilidade no Brasil para que fosse possível produzir bens concorr ent es com os est rangeiros. REFERÊN CI AS BARDI , Piet ro Maria ( 1952) . Cart a e convit e para a part icipação no desfile Moda Brasileira organizado no Museu de Art e, em 6 de novem bro de 1952. Acervo docum ent al do MASP- SP. BLOCH, M. ( 2002) . Apologia da hist ória ou O ofício do hist oriador ( 3 ed.) . Rio de Janeiro, Jorge Zahar Edit or. BONADI O, Maria Cláudia ( 2005) . O fio sint ét ico é um show! Moda, polít ica e publicidade; Rhodia S.A. 1960- 1970. Tese de Dout orado em Hist ória. Universidade Est adual de Cam pinas, Cam pinas. BOYDELL, Christ ine ( 1995) . Free- lance t ext ile design in t he 1930s: an im proving prospect ? Journal of Design Hist ory, v. 8, n. 1, pp. 27- 42. CARDOSO, Rafael ( 2004) . Um a int rodução à hist ória do design. São Paulo, Edgard Blücher. _____ ( or g.) .( 2005) . 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