A religiosidade na literatura de cordel 1
The religiosity in cordel literature
Elthon Ferreira RIBEIRO2
Orlando Ângelo da SILVA3
Resumo
A literatura de cordel é um instrumento da poesia popular impresso, com influência de
espanhóis, franceses e portugueses. Os folhetos presos em barbantes chamados de
cordéis são apresentados em lugares populares como feiras, praças, mercados de grande
movimentação e bancas de revista. Devido a sua importância enquanto documento
histórico, social e como instrumento de comunicação, poetas e estudiosos da cultura
dedicaram-se a classificar e catalogar a literatura de cordel, tendo em vista a variedade
de informações contidas em seus folhetos. O presente artigo tem como objetivo analisar
os conteúdos religiosos na Literatura de Cordel, especificamente, os que abordam o
tema “santidade” nos cordéis da Biblioteca Átila Almeida, situada no Campus I da
Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).
Palavras-chave: Comunicação e religiosidade. Literatura de cordel e santidade.
Biblioteca Átila Almeida.
Abstract
The Cordel Literature is an instrument of popular poetry printed, influenced by spanish,
french and portuguese. The booklets are stuck in string called strings are presented in
popular places like fairs, squares, markets of great movement and magazine stands.
Because of their importance as a historical document, poets and scholars of the culture
have been dedicated to classifying and cataloging the cordel literature, taking into
consideration the variety of information contained in its booklets. This article has the
objective of analyzing the religious contents in the Cordel Literature, specifically those
that approach the theme "sanctity" in the cords of the Atila Almeida Library, located in
Campus I of the State University of Paraíba (UEPB).
Keywords: Communication and religion. Cordel literature and holiness. Átila de
Almeida Library.
Artigo resultante de parte da investigação intitulada: “A religiosidade no cordel: comunicação de
escritos populares” (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC/UEPB - Cota 20152016), apoiada nos estudos do Grupo de Pesquisa “Comunicação, Memória e Cultura Popular”.
1
2
Aluno especial do Programa de Pós-graduação em Literatura e Interculturalidade pela Universidade
Estadual da Paraíba. E-mail:
[email protected]
Mestre em Ciências da Sociedade. Professor do Departamento de Jornalismo da UEPB.
E-mail:
[email protected].
3
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Introdução
Ao tratar da literatura de cordel, é necessário entender inicialmente a noção de
cultura. Segundo ALBUQUERQUE (2011), a cultura não é mais relacionada com a
natureza e se torna a representação da sociedade e da civilização, principalmente num
mundo mais racional e sem encantamentos. Com isso, a cultura pode ser classificada em
três tipos: cultura popular, erudita e cultura de massa. No caso da cultura popular, ela
estaria ligada a ideia de sobrevivência, tradição, em que a memória, as ações são
preservadas.
A literatura de cordel é um instrumento da poesia popular impresso, com
influência de espanhóis, franceses e portugueses. Os folhetos são presos em barbantes
chamados de cordéis e apresentados em lugares populares como feiras, praças,
mercados de grande movimentação e bancas de revista.
O cordel em terras brasileiras teve seu auge entre as décadas de 30 e 50 do
século XX, com inovações de João Martins de Athayde no que diz respeito ao seu
formato impresso (entre 15 e 17 cm x 11 cm; com 6 ou 8 páginas) que permanecem até
os dias atuais.
Desde o seu surgimento, a literatura de cordel esteve atrelada as manifestações
artísticas, históricas e sociais das classes populares. No Brasil, essa função foi ressaltada
pelo pouco acesso aos meios de comunicação de massa, fazendo com que os cordéis
fossem as principais fontes de informação da população carente. Desta forma, devido a
sua importância enquanto documento histórico, poetas e estudiosos da cultura
dedicaram-se a classificar e catalogar a literatura de cordel, tendo em vista a variedade
de informações contidas em seus folhetos.
As diversas transformações ocorridas na humanidade ao longo dos anos fizeram
com que o conteúdo de informações se tornasse documentos com níveis hierárquicos,
assuntos e tipos obedecendo a códigos de classificação bibliográficos. Albuquerque
(2011) explica que as classificações bibliográficas são instrumentos na organização de
acervos em que os documentos são armazenados segundo a área de assuntos.
E, entre esses documentos, estariam os cordéis que por possuírem diversos temas
como romances, religião, humor, heroísmo, vilania e outros, também teriam uma
classificação bibliográfica.
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Júlio Caro Baroja citado por Albuquerque (2011) propõe a seguinte classificação
para os cordéis com base nos folhetins da Espanha: antigos; cavalheirescos; novelescos:
de amores e aventuras; biográficos e de aventura propícia; de cativos e renegados; de
mulheres valentes; homens bravos e aventureiros; contrabandistas e guapos;
bandoleiros; históricos; religiosos: hagiográficos; castigos de Deus, milagres e
intervenções da Virgem Maria, expositivos, didáticos, ascéticos; casos raros e prodígios;
crimes; controvérsias; satíricos: sobre mulheres, sobre pessoas de distinta condição;
narrações fantásticas: contos conhecidos no folclore europeu; contos localizados; para
representar diálogos e monólogos e por fim, desilusões.
Vários autores brasileiros também fizeram diversas classificações sobre os temas
encontrados nos cordéis. “Roberto Câmara Benjamin, sugere uma classificação para os
temas de religião: fatos de época ou de acontecido, romances e opinião. No entanto,
para a primeira classificação alguns estudiosos consideram ciclo; a segunda é gênero e a
última é um julgamento de valor.” (ALBUQUERQUE, 2011, p.72).
Sendo assim o presente artigo buscou ampliar os horizontes entre a Literatura de
Cordel e a religiosidade, compreendendo a sua importância como instrumento de
informação, de senso crítico e lúdico. Verificou-se aqui, a possibilidade de avançar com
as teorias e práticas sobre o cordel, entendendo-o como um instrumento de comunicação
e, que, assim sendo, pode-se contribuir com o campo da comunicação, pelo seu caráter
interdisciplinar, dialogando com a cultura, religião e a literatura.
Além disso, o estudo também se torna relevante pelo fato da UEPB ter uma das
maiores bibliotecas de Literatura de Cordel do mundo, adquirida dos herdeiros do
pesquisador Átila Almeida, onde a pesquisa de campo foi desenvolvida.
Na pesquisa constatou-se que os cordelistas trataram nos cordéis analisados,
temas que giram em torno da religiosidade, especificamente “santidade”. Fato
provocado pela influência do catolicismo na região do Nordeste, fazendo com que os
folhetos discursem e se dirigem diretamente aos fiéis.
1 Religiosidade e santidade: classificação das temáticas
As classes elaboradas ou recriadas no tocante à “Literatura Popular”, nas
classificações bibliográficas, são ao todo vinte e sete, segundo a autora Maria
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Albuquerque (2011), quais sejam: Agricultura trata de técnicas utilizadas para cultivo de
plantas; Biografias e Personalidades correspondem aos cordéis sobre pessoas atuais e de
destaque; Bravura e Valentia contam as bravuras dos cangaceiros e aqueles mesmo
“fracos” são capazes de lutar com homens fortes; Cidade e Vida Urbana descrevem
cidades e Estados; Ciência fala sobre conhecimentos adquiridos com a teoria ou prática
de estudos científicos; Contos trata sobre os folhetos que falam de estórias; Crime trata
sobre a violação das condutas morais e éticas; Cultura sobre tradições e costumes do
povo, tem ainda as classificações: Educação; Esporte; Erotismo; Feitiçaria; Fenômeno
Sobrenatural; História; Homossexualismo; Humor; Intempéries (folhetos que tratam de
assuntos relacionados às secas, tempestades, inundações); Justiça; Meio Ambiente;
Moralidade; Morte; Peleja (homenagens a antigos amigos poetas); Poder; Político e
Social; Religião; Romance; Saúde/ Doença.
No que diz respeito à classe temática religião ou religiosidade, os temas
envolvem fé, evangelização, santidade, maternidade, santificação, perdão, bondade,
transgressão, divindade, salvação, regeneração, libertação, humildade, aconselhamento,
profecia, imaginação, criação, crucificação, pregação, cristianismo, transformação,
sermão, devoção, ensinamentos e natividade. Por exemplo, dentro do tema fé existem
as figuras: crente, milagre, milagres e fiéis; do tema natividade, os vocábulos: natal e
Jesus; o vocábulo profetizou figurativa ao tema profeta; Deus figurativiza o tema
divindade e assim por diante.
Tendo como base essa classificação de Maria Albuquerque (2011), fez-se um
levantamento dos cordéis da Biblioteca Átila Almeida que possuem em seus títulos,
versos, palavras associadas com o tema “santidade”, dentro de uma temática maior,
“religiosidade”.
Entretanto, a autora ressalta que a classificação tem como ponto fundamental a
organização dos acervos dos folhetos de cordéis, facilitando, portanto, no momento da
procura de acordo com o tema desejado pelo usuário, entretanto, as classificações
temáticas tratadas são inesgotáveis, podendo ter novas classificações.
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2 Estudo dos cordéis
Para realizar a pesquisa, utilizamos o aporte teórico-conceitual das teorias e
estudos
referentes
às
seguintes
questões:
Literatura
de
Cordel/cordel
(ALBUQUERQUE, 2011); religiosidade (FILHO, 2011) e análise de conteúdo
(FONSECA JÚNIOR, 2011; BARDIN, 2010).
Os procedimentos metodológicos seguiu os seguintes passos: catalogação dos
cordéis referentes ao tema, disponibilizados na Biblioteca Átila de Almeida, situada no
Campus I da UEPB; análise de conteúdo dos cordéis selecionados, análise documental e
revisão da bibliografia específica.
A análise de conteúdo foi utilizada nesta pesquisa com o intuito de identificar
por meio dos textos expressos nos cordéis disponíveis na Biblioteca Átila Almeida, os
que discursem acerca da “Santidade”. O método utilizado viabilizou não só a
catalogação dos folhetos de acordo com a classificação das temáticas propostas por
Albuquerque (2011), como também facilitou a compreensão dos enunciados escritos
pelos cordelistas pesquisados, dando margem ao entendimento de suas posições e
pensamentos referentes à temática “Santidade”.
A Biblioteca Átila Almeida, Campus I da Universidade Estadual da Paraíba
(UEPB) conta atualmente de um acervo com mais de nove mil títulos e exatos 15.2324
volumes de cordéis, no qual para esta pesquisa foram catalogados cerca de 1.500
folhetos (unidade de amostragem), dos quais 105 abordam, em seus títulos, termos
associados à religião. Após o levantamento dos títulos, foram analisados os conteúdos
informacionais de cada cordel. Nesta segunda etapa foi realizada a leitura integral dos
cordéis selecionados, com o objetivo de obter as informações necessárias para uma
posterior classificação.
Optou-se pela escolha dos folhetos com o tema “Santidade”, constando de
quinze folhetos, quais sejam: 1-A briga dos três santos (Marco Di Aurélio), 2-A
chegada do Santo Papa (José Soares), 3- Conheça a vida dos santos juninos (Isonel
Nascimento Araújo), 4-Assim era São Francisco (Gonzaga Vieira), 5- O encontro de
Frei Damião com o Padre Cícero no céu (Natanael de Lima), 6-Encontro de São
4
Dados informados pela Biblioteca Átila de Almeida em 25/04/2016 e 06/12/2016.
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Francisco com Padim Ciço do Juazeiro (Manoel Monteiro), 7- Festa dos Santos (João
Pedro do Juazeiro), 8-História do senhor João de Deus: João Paulo II (José Camelo de
Melo), 9-João Paulo II: Nascimento, vida e morte (Antonio klévisson Viana e Arievaldo
Viana), 10-Os mais violentos dias do Piancó: Vida e morte do Padre Aristides (Josealdo
Rodrigues Leite), 11-Meu São José dos Cordeiros (João Pedro do Juazeiro), 12- São
Frantônio, o santo do milênio (Jota Batista), 13-São Jorge, o santo guerreiro:
nascimento, vida e morte (Gonçalo Ferreira da Silva), 14-No sesquicentenário do Padre
Cícero (F. Silva Nobre), 15-Visita do Santo Papa ao Brasil e sua palestra com o
presidente João Figueiredo em 30 de julho de 1980 (Apolônio Alves dos Santos).
Nos cordéis a foram analisados desde os seus títulos, as capas, expressões
religiosas, imagens, em que se observou a utilização de palavras nos versos dos cordéis
como: “santos”, “São”, “santo”, “santidade”, a presença de acontecimentos envolvendo
a fé, os santos e personalidades da Igreja Católica. Realizou a leitura dos mesmos na
íntegra e utilizadas as técnicas de pesquisa: análise de conteúdo e análise documental,
sendo esses elementos importantes, pois os caracterizam como pertencentes ao tema
“Santidade”. Segundo a definição5, santidade é a qualidade ou característica de quem
pode ser considerado santo, dotado de virtudes, inocência, piedade e pureza. O conceito
de santidade está intrinsecamente relacionado com a religiosidade e a fé.
De acordo com a doutrina cristã, a santificação é o processo de tornar algo ou
alguém santo, ou seja, que possui santidade. Trata-se da separação e renúncia daquilo
que é impuro, mau e profano, dedicando-se a uma vida de devoção e consagração total a
Deus, no qual o tema “Santidade” está dentro de uma temática mais ampla, a
Religiosidade.
5
Definição encontrada no site http://www.significados.com.br/santidade/.
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Figura 1- Gráfico sobre os folhetos com a temática “Religiosidade” e “Santidade”
encontrados na Biblioteca Átila Almeida 6
3 Análise dos cordéis da temática “santidade”
3.1 Folheto: A briga dos três santos, de Marco Di Aurélio (2004)
Entre os cordéis da temática Santidade, foram selecionados cinco para análise de
conteúdo mais detalhada, entre eles: “A briga dos três santos”, autoria de Marco di
Aurélio (2004).
Ao ser analisado, o seu conteúdo foi classificado como cordel com tema ligado a
“Santidade” dentro da temática Religião, por ter elementos que comprovam isso, a
começar pelo título que tem a palavra “santos”. O cordel cita “São José, São Francisco e
São Pedro”, repetindo a expressão “santo” várias vezes, além de tratar de seus feitos.
O autor através da história da briga entre os três santos São José, São Pedro e
São Francisco, trata das suas ações quanto à água, incluindo o tema Rio São Francisco,
6
Dados coletados na Biblioteca Átila Almeida na Universidade Estadual da Paraíba em maio de 2017.
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em que são importantes para que a população por meio de sua fé consiga ter água num
Nordeste tão seco.
Abaixo, trechos do cordel destacado em negrito as palavras e expressões que
evidenciam a ligação com a temática Santidade.
O que agora vou contar
Que parece não se crer
É uma briga de santo
Não sou eu nem é você
Não cabe açúcar nem sal
Não bote colher de pau
Pois quem botar vai morrer (AURÉLIO, 2004, p.1).
São Pedro é o chaveiro
Abre a porta que quer
São José intercessor
São Francisco homem de fé
O povo pede pros três
Mesmo pedido se fez como carta de melé (AURÉLIO, 2004, p.2).
O autor trata também sobre o São Francisco como santo e ao mesmo tempo
como o rio, em que São José e São Pedro brigam e fazem com que o rio diminuía a cada
dia.
O São Francisco que foi
Um rio muito sereno
Hoje é tão cobiçado
Todo dia é mais pequeno
Pois São José e São Pedro
Brigando não sentem medo
Vai São Francisco morrendo (AURÉLIO, 2004, p.3).
No final do cordel, Marco Di Aurélio faz o leitor refletir sobre de quem é a culpa
pela falta de água? O homem também é culpado por sua incompetência, porém o ser
humano acusa apenas o céu (divino), as autoridades, e nunca a si próprio.
Em nossos grandes jornais
Culpamos agora o céu
Culpamos os governantes
De civil a coronel
Mas não se ouviu a ciência
Nem mesmo a competência escrita em voz de cordel
O homem apenas vai
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Seguir com a incompetência
Com passado e futuro
Só pela conveniência
Do poder que o satisfaz
Que todo minuto a mais
Lhe enche de onipotência (AURÉLIO, 2004, p.6).
3.2 Folheto João Paulo II: Nascimento, vida e morte, de Antonio Klévisson Viana e
Arievaldo Viana
O cordel “João Paulo II: Nascimento, vida e morte”, de Antonio Klévisson
Viana e Arievaldo Viana (s/d), o mais longo dos cordéis selecionados, trata desde o
nascimento de João Paulo II em 1920, conforme a estrofe:
Foi em mil e novecentos
E vinte, se não me engano
No dia 18 de maio
A mando do Soberano
Nasce o menino
Para pastor do destino
De parte do gênero humano (VIANA & VIANA, s.d., p.2).
No cordel são contados diversos acontecimentos, entre eles, o que envolve a
família de João Paulo II, como as mortes do seu pai, mãe e irmã.
Sobre a vida religiosa, o cordelista trata sobre o seu ingresso num grupo de
teatro que se apresenta em missas, e já é o primeiro indício de sua vocação ao
sacerdócio.
Wojtyla ingressa num grupo
E passa a representar
Faz teatro para as massas
Buscando assim, resgatar
A fé que havia no povo
Trazendo um alento novo
Para a vida retomar (VIANA & VIANA, s.d., p.7).
Depois disso, ele entra para estudar na Igreja, tem aulas no seminário e,
finalmente, depois de ser padre, bispo, cardeal João Paulo II assume o papado, após a
morte do Papa João Paulo I.
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Karol adotou o nome
De João Paulo II
Em homenagem ao primeiro
A fim de mostrar ao mundo
Que os planos de
Deus não falham
E jamais se atrapalham
Pois o seu poder é profundo (VIANA & VIANA, s.d., p.14).
Durante o tempo em que ficou como Papa, João Paulo II foi muito importante
para a Igreja Católica e para o mundo.
Porém, seu Pontificado
Mudou o perfil do mundo
Foi um divisor de águas
Rio perene e profundo
Qualquer teólogo garante
A igreja mudou bastante
Com João Paulo II
Só o tempo mostrará
Sua real dimensão
Mas o povo, para sempre
O trará no coração
Merece o pesar e pranto
Pois foi ele um Homem Santo
Que, humilde, beijou o chão (VIANA & VIANA, s.d., p.24).
O “Santo Padre” como é denominado João Paulo II pelos cordelistas Antonio
Klévisson Viana e Arievaldo Viana, morreu aos 84 anos, em 2005, vítima de uma
parada cardiorrespiratória, último fato tratado no cordel.
3.3 Folheto: Os mais violentos dias do Piancó: Vida e morte do Padre Aristides, de
Josealdo Rodrigues Leite (2006)
No cordel “Os mais violentos dias do Piancó: Vida e morte do Padre Aristides.”
de Josealdo Rodrigues Leite (2006) trata sobre os 80 anos da passagem da Coluna
Prestes, resgatando a história da vida e a violenta morte do Padre Aristides, por ocasião
da passagem da Coluna Prestes por Piancó, em que o padre e os seus companheiros
lutaram defendendo aquela cidade sertaneja.
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Padre Aristides foi uma figura marcante da história política do Vale do Piancó e
da Paraíba. Sua marca registrada na história é fruto não só de sua carreira política, mas,
também, de sua trágica morte, sendo ele trucidado por integrantes da Coluna Prestes, em
um barreiro. Podemos observar a importância da figura do padre nos seguintes trechos:
Vou falar de um cabra macho
Daqueles cabras da peste
Que enfrentou com coragem
A fúria da Coluna Prestes
Foi Padre Aristides um louco
Mas como ele, eram poucos
Que enfrentava o que viesse (LEITE, 2006, p.7).
É relatado que ele não gostava do curso que fazia. Então, seu pai o colocou no
seminário onde se ordenou padre. Depois, se tornou líder político na cidade de Piancó.
O nome ficou conhecido
Padre Aristides Ferreira da Cruz
Pelos feitos realizados
Do Padre com a sua luz
O povo dele se agradou
E para política levou
O seguidor de Jesus (LEITE, 2006, p.12).
Nos últimos versos tratam dos momentos tensos da passagem da Coluna Prestes
no Vale do Piancó, momentos antes do Padre Aristides morrer.
Padre Aristides viu logo
Que ali iria morrer
E pediu uma última coisa
Que queria fazer
Pedir perdão a Deus
Piedade para os seus
Mas nem isso pôde ter (LEITE, 2006, p.37).
3.4 Folheto: Festa dos Santos, de João Pedro do Juazeiro (2005)
O cordel “Festa dos Santos”, autoria de João Pedro do Juazeiro, trata de uma
“festa no céu” repleta de santos (mais de trinta mencionados), entre eles: São Pedro, São
Matheus, São Miguel, São Judas Tadeu, Imaculada Conceição, São Benedito, São
Bento, Virgem Maria, São José, anjos e outros seres celestiais que cantam, tocam
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instrumentos, dançam, alegram o céu, realizam milagres e presenciam acontecimentos
como: a beatificação de Padre Cícero, conforme podemos observar nos trechos:
Para quebrar a rotina
Chegou São Miguel
Com a guitarra na mão
Com maracá Manoel
São Pedro sem besteira
Grita é roque pauleira
Vão chamar Gabriel (JUAZEIRO, 2005, p.6).
Ainda hoje no céu
Tem festa noite e dia
Aqui neste cordel
Descrevo que a alegria
É pela beatificação
Do “Padim Ciço Romão”
Paz, amor que irradia (JUAZEIRO, 2005, p.8).
O cordelista no final convida o leitor a comprar o cordel porque assim os anjos
farão festa no céu e ficarão felizes.
Caro leitor findo
Quando um bandolim
Os anjos celestiais
Entram um canto assim
Comprem este cordel
E receberão no céu
Um galardão sem fim (JUAZEIRO, 2005, p.8).
3.5 Folheto: São Frantônio, o santo do milênio, de Jota Batista (1994)
O “São Frantônio, o santo do milênio” autoria de Jota batista (1994) trata de um
curioso caso ocorrido nas cidades de Caridade e Canindé, no Ceará, em que dois exprefeitos planejavam se construir duas estátuas gigantescas dos seus padroeiros: Santo
Antônio e São Francisco das Chagas. Entretanto, um ex-prefeito de Caridade,
‘Raulzim’, construiu apenas a estátua de Santo Antônio e, em Canindé, outro exprefeito ‘Zé Hugo’, fez a estátua do padroeiro local, São Francisco. O poeta decidiu,
então. juntar os dois santos e construir o São Frantônio.
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Eu digo e não me envergonho
Que o povo desta comarca
Quis afastar o demônio
Pra não ver cair à barca
Sem espera e sem demora
Chamaram Franze D’Aurora
Para dar início à obra
E disseram pro Franze
Deixe Santo Antônio em pé
Que tem dinheiro de sobra (BATISTA, 1994, p.1).
Tenho outra idéia melhor
A pagode não me tome
Pra coisa fica menor
A gente junta os dois nomes
Sacoleja na cumbrica
Balança o corpo e a cuca
Eu tô com um medo medonho
A seca tá nos matando
E o povo está apelando
-Valei-nos, ó São Frantônio (BATISTA, 1994, p.4).
O autor Jota Batista avisa ao concluir os versos que não está faltando com
respeito com os santos Santo Antônio e São Francisco, não leve a sério.
Minha mente eu não alugo
Peço aqui perdão a Deus
Aos dois santos não expurgo
Isso é apenas versos meus
Não levem a sério o artista
Inda mais Jota Batista
Por causa deste rabisco
De toda fé que disponho
Dou vivas a Santo Antônio
E palmas para São Francisco (BATISTA, 1994, p.7).
O cordel São Frantônio, o santo do milênio foi inclusive destaque em várias
reportagens, incluindo o Jornal Nacional da Rede Globo de Televisão.
A cidade de Canindé, retratada no cordel, retomou o projeto e deu início à
construção de um gigantesco monumento dedicado a São Francisco das Chagas, que
mede 43 metros.
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Considerações finais
Diante dos argumentos propostos pode- se considerar que ao estudar a
religiosidade e santidade nos cordéis da Biblioteca Átila Almeida, pode-se constatar sua
importância enquanto meio de comunicação, que aborda de maneira contestadora e
descontraída conteúdos críticos e ao mesmo tempo lúdicos relacionados ao imaginário
religioso.
Desta forma, puderam-se identificar, por meio de suas obras, as influências e
posicionamentos dos poetas e cordelistas a respeito de temas que circundam a moral e a
religiosidade, especialmente, a santidade. Tendo em vista, contudo, que suas condutas
estão atreladas ao contexto histórico e social em que estão inseridos, sendo seus
folhetos, reflexo das suas realidades.
Após o estudo, constatou-se que a temática “Santidade” dentro do tema
“Religiosidade”, encontrada nos folhetos de cordéis analisados é caracterizada pela forte
presença do catolicismo na região do Nordeste e que suas narrativas, em sua maioria,
prezam pela consolidação das tradições religiosas, relatando os mais diversos
acontecimentos envolvendo santos como São Pedro, São Francisco, Santo Antônio,
seres celestiais, anjos, além de personalidades da Igreja Católica, a exemplo do Padre
Cícero, Padre Aristides Ferreira da Cruz e Papa João Paulo II, cujos discursos se
dirigem diretamente aos seus fiéis.
Apesar do avanço dos meios de comunicação, o folheto de cordel com a sua
diversidade temática continua tendo uma grande importância cultural para sociedade,
sendo utilizado como instrumento de informação, comunicação e de análise por
estudantes e pesquisadores de diversas áreas do conhecimento.
Mas, fundamentando-se nas metodologias: análise de conteúdo, documental e
revisão bibliográfica específica, conforme discutido acima, se torna necessária uma
reflexão mais abrangente sobre a religiosidade encontrada nos cordéis, no que diz
respeito ao âmbito da escrita dos mesmos, na tentativa de observar, também, eventuais
aspectos adversos ou não de tal processo discutido na presente pesquisa e seus impactos
para os leitores, o que representaria um tema interessante para futuras pesquisas em
outros cordéis.
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Referências
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Ano XV, n. 1. Janeiro/2019. NAMID/UFPB - http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/tematica
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