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O PAPEL DO DIREITO NO CONTROLE DE FALHAS DE MERCADO NA HOTELARIA

2019, XIX ENCONTRO DE PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA

O presente trabalho busca, em meio a pesquisas bibliográfica e documental, analisar o mercado de turismo, em especial no que diz respeito às falhas de mercado mais recorrentes nesse âmbito da economia, buscando-se, ademais, demonstrar como mecanismos de intervenção estatal podem auxiliar no enfrentamento de aludidas falhas. Conclui-se que o Direito e o Estado têm função primordial na intervenção e regulação dos mercados, em especial o mercado de turismo que se relaciona com diversas atividades econômicas e tem forte potencial nacional e estrangeiro no Brasil, devendo ser uma prioridade de Estado o seu regular e adequado funcionamento. Palavras-chave: Turismo. Falhas de Mercado. Intervenção.

O PAPEL DO DIREITO NO CONTROLE DE FALHAS DE MERCADO NA HOTELARIA Leonardo José Peixoto Leal1* (PD), Myrela Carlos Sales Leal2 (PD), Mônica Mota Tassigny3 (PD), Pedro Valter Leal4 (PD), Catherine Santa Cruz Jereissati5 (PD) 1. Universidade de Fortaleza – Doutor em Direito. 2. Universidade Estadual do Ceará – Mestre em Turismo. 3. Universidade de Fortaleza – Doutora em Educação. 4. Centro Universitário da Grande Fortaleza – Mestre em Direito. 5. Universidade de Fortaleza – Mestre em Direito Resumo O presente trabalho busca, em meio a pesquisas bibliográfica e documental, analisar o mercado de turismo, em especial no que diz respeito às falhas de mercado mais recorrentes nesse âmbito da economia, buscando-se, ademais, demonstrar como mecanismos de intervenção estatal podem auxiliar no enfrentamento de aludidas falhas. Conclui-se que o Direito e o Estado têm função primordial na intervenção e regulação dos mercados, em especial o mercado de turismo que se relaciona com diversas atividades econômicas e tem forte potencial nacional e estrangeiro no Brasil, devendo ser uma prioridade de Estado o seu regular e adequado funcionamento. Palavras-chave: Turismo. Falhas de Mercado. Intervenção. de 250 palavras) Introdução O turismo é elemento fundamental para a economia de mercado na sociedade atual. Do ponto de vista econômico consideram-se as estruturas que se desenvolvem pelo turismo, na perspectiva do comércio, estabelecimentos de gêneros alimentícios, guias e agências de turismo, hotelaria e transportes. Para o desenvolvimento do turismo, em dada região, para além dos atrativos naturais como belas praias e paisagens, ou de grandes equipamentos de visitação como museus, centros culturais, aquários e outros elementos, são necessários cuidados com políticas públicas voltadas ao turismo, além do ambiente de estabilidade social e econômica que permita ao indivíduo viajar com segurança e sem comprometimento financeiro. A partir da década de 1990, o turismo passou a ser nova perspectiva no Nordeste e, em especial, no Ceará, tendo se desenvolvido o turismo de sol e praia massificado, com a intermediação de operadoras que garantem o barateamento dos custos. Tendo o Brasil passado pelo período de estabilidade econômica com o plano real e de desenvolvimento das instituições democráticas e sociais, com garantia de maiores direitos aos cidadãos, a exemplo da efetivação dos direitos dos consumidores, amplia-se o turismo em todo o país com fluxo para o Ceará. Nesse contexto, a atividade hoteleira que é um conjunto de serviços ofertados para proporcionar hospedagem de excelência e qualidade, que depende diretamente da capacidade de desempenho dos funcionários de todos os setores do hotel que, para atingirem os objetivos, precisam estar treinados e motivados. Treinamento e motivação são funções dos cargos de chefia e, de maneira abrangente, da gerência. Deve o gerente buscar, no trato com os funcionários, maior nível de capacitação e motivação possível para ensejo da qualidade da prestação de serviços. Ferramentas que auxiliem no alcance do bom treinamento e da motivação são essenciais na atuação dos gestores atentos às possibilidades de inovações e melhorias. A hotelaria vem, ao longo dos anos, tornando-se um dos elos principais da cadeia do turismo. O destino para ser considerado turístico precisa de meios de hospedagem, com serviços que atendam as expectativas dos clientes, na perspectiva da quantidade e da qualidade de produtos e serviços disponíveis. O presente trabalho volta-se para as possíveis e mais comund falhas de Mercado inerentes ao setor turistico e hoteleiro, abordando suas causas e consequencias, além de direcionando a abordagem para os possíveis mecanimsos de enfrentamento e solução existentes. Metodologia Para chegar-se ao desenvolvimento do presente estudo, utilizou-se a pesquisa bibliográfica e de campo, com análise obras especializadas e materiais direcionados ao tema. Buscou-se atender de forma satisfatória as respostas ao que o trabalho se propôs. Respaldaram-se os conceitos e análise dos casos em doutrinas jurídicas, artigos científicos e monografias. Resultados e Discussão A atividade turística é relevante, em perspectiva cultural e econômica. O deslocamento de pessoas que se propõem a conhecer e desfrutar de novos locais é uma perspectiva enriquecedora do ponto de vista emocional e cultural do indivíduo devendo esta ação ser estimulada pelo Poder Público com políticas de incentivo que visem o bem-estar da população. Além desses elementos de maior subjetividade, o turismo conta com relevância econômica na medida em que a movimentação de pessoas pelos lugares acarreta também a movimentação de recursos financeiros e da economia com compra de produtos e serviços variados. Há diversas localidades em que a base da economia local é voltada para o turismo que pode contar com características específicas como lazer e negócios, além de poder ter períodos e de alta e baixa estação. Na perspectiva econômica indicam-se os principais elementos de imperfeições mercadológicas atinentes ao setor hoteleiro. Relações econômicas se concretizam pelas trocas de bens e excedentes entre os participantes do “mercado”, que realizam operações em busca de benefícios ou necessidades pessoais. Os agentes econômicos vão ao mercado à procura de algo e, no sistema capitalista, há a necessidade de oferta de algo em troca do que se busca. (MANKIW, 2013) Nesse sentido, as necessidades individuais devem ser satisfeitas pelo esforço próprio, constituindo rede de trocas de interesses e de excedentes, não pela benevolência, como deixa claro Smith (1983, p.50). O autor defende a não interferência no mercado, ou seja, o próprio mercado, com sua “mão invisível” e leis próprias, levariam os indivíduos a buscar seu bem-estar e, por conta disso, gerar o bem-estar coletivo, tendo por consequência o desenvolvimento e a riqueza da nação. Um traço marcante da teoria é que as trocas decorreriam da natureza humana e a prova é o fato de tal ato ter origem desde as tribos mais primitivas. O homem busca satisfazer suas necessidades e o mercado seria o ambiente facilitador dessa ação, sendo assim, caberia ao Estado e ao Direito estimular e facilitar essas trocas sem, contudo, promover intervenção direta haja vista o ideário liberal. Kuttner (1998, p. 35) sustenta que os mercados são poderosos instrumentos de decisão direta da população, consumidor e destinatário finais dos bens e serviços oferecidos. Friedman (1984, p.23) defende que o mercado garante eficiência econômica, desde que assegurada a liberdade do indivíduo, ou seja, a função do governo é resguardar a liberdade dos componentes do mercado, no sentido de garantir a concorrência e a livre iniciativa, eliminando eventuais distorções, tal qual um árbitro: Enquanto a liberdade efetiva for mantida, a característica central da organização do mercado da atividade econômica é a de impedir que uma pessoa interfira com a outra no que diz respeito à maior parte de suas atividades. O consumidor é protegido da coerção do devedor devido à presença de outros vendedores com quem pode negociar. O vendedor é protegido da coerção do consumidor devido à existência de outros consumidores a quem pode vender. O empregado é protegido da coerção do empregador devido a outros empregadores para quem pode trabalhar, e assim por diante. E o mercado faz isto, impessoalmente, e sem nenhuma autoridade centralizada. [...] A existência de um mercado livre não elimina, evidentemente, a necessidade de um governo. Ao contrário, um governo é essencial para determinação das “regras do jogo” e um árbitro para interpretar e pôr em vigor as regras estabelecidas. No processo de troca, por vezes, um dos fatores de maior relevância será a quantidade de informação que o agente econômico detém acerca do produto ou serviço a ser contratado. Tais informações contribuem para se alcançar maior equilíbrio nas relações travadas e a existência de uma margem razoável de ganhos e perdas para todos os envolvidos sem que um deles obtenha uma vantagem exagerada ou desproporcional (KRAUSE, 2006, p. 47). Quanto maior a assimetria informacional, ou seja, a distância entre o que um agente e o outro sabem, maior a probabilidade de obtenção de vantagem exagerada pelo que detiver mais informação. Na atividade hoteleira, não é diferente podendo o consumidor, por exemplo, pagar uma tarifa mais cara que a de mercado, obter um serviço de menor qualidade, entre outros aspectos, sendo que isso pode ocorrer, em razão da falta de informação (MARQUES et. al., 2013). O reverso também é possível podendo o consumidor omitir informações relevantes para o estabelecimento como sua condição econômica ou ainda sobre o consumo de bens internos na unidade habitacional como toalha, louça, frigobar, alimento, entre outros (MAMEDE, 2004). A assimetria informacional é reflexo do modelo de concorrência imperfeita, comum em praticamente todos os mercados, o que não é diferente em relação ao mercado da hotelaria. Stiglitz e Walsh (2003, p. 82) afirmam: Uma hipótese importante do modelo básico de concorrência perfeita é que as famílias estão bem informadas. Elas têm boas informações sobre os produtos que compram. Conhecem o preço pelo qual podem adquirir o bem em cada loja. Têm boas informações sobre as empresas em que investem. De forma semelhante, as empresas têm boa informação sobre funcionários potenciais. As empresas conhecem a capacidade de cada trabalhador. Podem monitorar, sem custos, o que os trabalhadores fazem e asseguram que façam o que lhes pedem. É claro que essas pressuposições não são muito corretas; tanto famílias quanto empresas possuem informações limitadas ou, como dizem os economistas, informações imperfeitas. Esse fato tem implicações importantes para cada um dos mercados. Em razão do exposto, a exigência por informação clara e de qualidade, mediante boafé das partes envolvidas na relação de consumo deve ser trabalhada de maneira eficaz pelo Estado, no intuito de reduzir, ou até mesmo eliminar, a assimetria, garantido assim ganhos para ambos os contratantes e maior produção de bem-estar agregado. Em análise da necessidade da informação nas relações contratuais regidas pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor – CDC (Lei nº 8.078/90), que efetivamente exige informação mais ampla e adequada do fornecedor para com o consumidor, Marques, Benjamin e Miragem (2013, p. 283) afirmam que a exigência de informação é ponto central da defesa do consumidor pelo Estado. O direito à informação visa justamente, mitigar a falha da assimetria acima exposta. É decorrência do reconhecimento da assimetria e da prejudicialidade, na relação contratual, a exigência de ampla informação. É evidente que o contratante bem informado se apodera para exercer livremente a escolha, com avaliação equilibrada acerca dos riscos, problemas e vantagens decorrentes do negócio jurídico celebrado. Quem detiver mais informação estará menos suscetível a ser prejudicado ou enganado. A redução de falha de mercado, dessa forma, depende diretamente da intervenção estatal que deve estar presente para fazer valer o direito à informação de todos os consumidores da atividade hoteleira e também o dever de lealdade e boa-fé. A transparência mútua é necessária para mitigar os efeitos negativos, todavia, para se alcançar o objetivo, torna-se necessária a presença de incentivos e sistemas de punição para moldar o comportamento das pessoas. Sztajn (2005, p. 62) também destaca que a informação assimétrica, entre contratantes, pode ser altamente prejudicial à economia e aos envolvidos. Os mercados, quaisquer que sejam, estão sujeitos a falhas e, conforme adverte Sztajn (2005, p. 65), sempre apresentarão riscos. A própria existência de concorrência é um risco para os concorrentes, a habilidade dos indivíduos é que determinará quem alcançará na concorrência, o melhor resultado. A autora reconhece a importância da presença do Estado com efetiva regulação na medida em que o mercado sempre trará riscos. Outra falha do mercado são as chamadas externalidades. Krause (2006, p. 33) define externalidade como os efeitos suportados por terceiros a partir de uma dada relação econômica, efeitos esses que podem ser maléficos ou benéficos. Dessa forma, infere-se viés de inevitabilidade nas externalidades, ou seja, elas sempre poderão estar presentes e atingir até mesmo se nada for feito para que isso ocorra. É possível dizer que há externalidades quando se elevam os custos para determinado agente econômico ou grupo de agentes econômicos, em razão de fatores externos, bem como que há externalidades sempre que determinados agentes se beneficiam também, em decorrência de fatores externos, assim é que se diz haver externalidades positivas e negativas (VASCONCELLOS; GARCIA, 2009). Por exemplo, imagine o hotel A construído à Beira-Mar com bela piscina banhada pelo sol. A estrutura é eminentemente convidativa a um bom fluxo de hóspedes eventualmente interessados em descanso e lazer, todavia, dentro desse mesmo exemplo, imagina que no terreno vizinho alguém resolve construir um outro hotel B e que a altura do prédio construído retira o sol da piscina do hotel A anteriormente existente. É evidente no exemplo acima que o hotel A será atingido por externalidades, ou seja, embora não tenha participado das negociações que acarretaram a construção do outro hotel irá sofrer a concorrência direta de seu vizinho hotel B que poderá tomar tanto clientes quanto funcionários, e ainda perderá o importante atrativo que era a piscina ao sol agora inteiramente na sombra. Outro exemplo de externalidade pode decorrer de uma política estatal. Para um empreendimento hoteleiro pode ser encarada como uma externalidade negativa o interesse do Estado em desapropriar o imóvel onde se encontra sediado para interesse público como o alargamento de uma via. Também poderia ser visto como uma externalidade positiva a construção de um centro de convenções amplo e moderno nas proximidades de um estabelecimento hoteleiro. Conclusão O Direito e as regras jurídicas existentes interferem nos mercados no intuito de reduzir ou eliminar essas imperfeições de mercado. Como já visto a preocupação do CDC com a informação é voltada quase que exclusivamente em favor do consumidor, não trazendo qualquer dever para este de maneira objetiva. A compreensão do dever de transparência também do consumidor decorre de modo indireto, a partir da exigência de transparência e boa-fé constante no art. 4º do Código1. No que diz respeito às externalidades positivas ou negativas é preciso que o Estado garanta subsídios e formas de controle dos impactos causados por eventos capazes de produzirem impactos significativos, resguardando tanto o interesse de consumidores como de empresários e fornecedores de produtos ou serviços. Evidente que a presença estatal não é suficiente para atender a todas as relações comerciais travadas, sobretudo em um mercado altamente pulverizado como o da atividade hoteleira. Assim, nas relações econômicas, os agentes sempre atentos a encontrar meios de enfrentar e superar eventuais externalidades que se lhe apresentem, além disso, o Estado deve acompanhar as ocorrências a fim de impedir a prática de atos ilícitos ou que possam gerar prejuízo irrecuperável no mercado, agindo assim como regulador. 1 Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios. Referências BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 02 mar. 2019. BRASIL. Lei nº.: 8.078 de 11 de setembro de 1990. Código de Proteção e Defesa do Consumidor . Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 02 mar. 2019. FRIEDMAN, Milton. Capitalismo e liberdade. São Paulo: Abril Cultural, 1984. KRAUSE, Martin. Analisis econômico del derecho – aplicación a fallos judiciales. Buenos Aires: La Ley, 2006. MAMEDE, Gladston. Direito do consumidor no turismo. São Paulo: Atlas, 2004. MANKIW, Gregory. Introdução à economia. São Paulo: CENGAGE Learning, 2013. MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao código de defesa do consumidor. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigação sobre sua natureza e suas causas. 3. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983. SZTAJN, Rachel. Law & Economics. In: ZYLLBERSZTAJN, Décio; SZTAJN, Rachel (Org.). Direito & economia. Rio de janeiro: Elsevier, 2005. p. 11-32. . VASCONCELLOS, Marco Antônio Sandoval de e GARCIA, Manuel E. Fundamentos da economia. São Paulo: Saraiva, 2009.