Academia.eduAcademia.edu

A perquisa qualitativa em saude

A pesquisa qualitativa tem sido amplamente empregada na área da saúde, tornando-se extremamente popular nos últimos 30 anos. Desde o final dos anos 80, mais e mais profissionais e pesquisadores da saúde tem se envolvido em pesquisa qualitativa. Alguns autores argumentam que chamar esta metodologia de "qualitativa" é um equívoco, uma vez que todas as pesquisas seriam, pelo menos parte, qualitativas. Afinal, quando os epidemiologistas ou bioestatísticos contam alguma coisa, esta categoria é "algo" qualitativo.

Kerr LRFS, Kendall C Editorial A PESQUISA QUALITATIVA EM SAÚDE Ligia Regina Franco Sansigolo Kerr1, Carl Kendall2 A pesquisa qualitativa tem sido amplamente empregada na área da saúde, tornando-se extremamente popular nos últimos 30 anos. Desde o final dos anos 80, mais e mais profissionais e pesquisadores da saúde tem se envolvido em pesquisa qualitativa. Alguns autores argumentam que chamar esta metodologia de “qualitativa” é um equívoco, uma vez que todas as pesquisas seriam, pelo menos parte, qualitativas. Afinal, quando os epidemiologistas ou bioestatísticos contam alguma coisa, esta categoria é “algo” qualitativo. Giddens argumenta muito bem: Todos os chamados dados “quantitativo”, quando examinado de perto, vêm a ser composições “qualitativas” - isto é, contextualmente localizadas e indexadas – com interpretações produzidas por pesquisadores em seus específicos contextos de trabalho, por funcionários de governos, entre outros. Os problemas hermenêuticos colocados pela pesquisa etnográfica também existem no caso dos estudos quantitativos, embora estes possam estar em grande parte “escondidos”, na medida em que os dados envolvidos já foram “trabalhados”(1:333). O desejo de se envolver com essas categorias - questionar por que e o que fazer com os problemas capturados por esses números - é parte da atração da pesquisa qualitativa. Outra é a de representar vozes na comunidade mais diretamente. Finalmente, uma das razões para a crescente popularidade da pesquisa qualitativa é que parece fácil e acessível. Afinal de contas, todos nós podemos usar as palavras e pensar sistematicamente, certo? Devido a essa acessibilidade, muitas pessoas se envolvem em pesquisa qualitativa sem treinamento adequado. O resultado pode ser uma pesquisa que imita servilmente a pesquisa quantitativa, só que com maiores problemas, por trabalhar com pequenas amostras e dados textuais, ou ainda, pesquisas que demonstram a falta de familiaridade com os compromissos epistemológicos da pesquisa qualitativa(2-3). Além disso, muitas destas pesquisas não se aproveitam dos avanços metodológicos que tem ocorrido nos últimos 30 anos. Muitos desses avanços são coletados em diretrizes para redação de relatórios para a publicação, agora desenvolvidos. Várias são as técnicas e estratégias que vêm sendo empregadas na pesquisa qualitativa: 1) A observação direta, onde o pesquisador estuda as pessoas em seu ambiente, simplesmente observando as interações e comportamentos como se fosse um estranho, sem participar do processo; 2) As entrevistas abertas ou semiestruturadas e as entrevistas em profundidade. Em ambas, o entrevistador normalmente 1 Médica, Professora Titular, Departamento de Saúde Comunitária, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, CE, Brasil. E-mail: [email protected]; [email protected] 2 Antropólogo Médico, Departamento de Saúde Comunitária Global e Ciências Comportamentais, Tulane Escola de Saúde Pública e Medicina Tropical. Nova Orleans, Estados Unidos, E-mail: [email protected]; [email protected] Rev Rene. 2013; 14(6):1061-3. Kerr LRFS, Kendall C tem um roteiro geral de perguntas que não necessariamente são rígidas ou devam seguir uma ordem particular. As primeiras são, frequentemente utilizadas na abordagem denominada “Procedimentos Antropológicos Rápidos” (Rapid Anthropological Assesment) e, na segunda opção, se explora um tema em uma forma mais completa, através de múltiplas e longas entrevistas abrangendo dimensões emergentes do entrevistado; 3) A pesquisa participativa é uma estratégia onde o pesquisador explicitamente envolve os participantes no desenho e na condução do estudo; 4) A etnografia, onde o pesquisador mergulha no campo, vivendo durante meses ou anos entre os participantes; 5) Os grupos focais, onde o pesquisador inicia uma discussão entre os participantes e os escuta moderando a discussão. Uma vez que a pesquisa qualitativa se baseia em uma abordagem cuidadosamente construída de “cadeia de razão e evidência”, a aplicação rigorosa destas ou de outras técnicas ou estratégias não citadas aqui pode adicionar validade e confiança ao resultado. Uma das vantagens da pesquisa qualitativa está em ser especialmente eficaz no estudo de nuances sutis da vida humana e na análise dos processos sociais ao longo do tempo. A principal vantagem deste método encontra-se na oportunidade de explorar pressupostos que interferem na nossa compreensão do mundo social. A pesquisa qualitativa é particularmente adequada para áreas, temas ou problemas que não são bem conhecidos ou sem respostas apropriadas. Uma vez que a pesquisa qualitativa simultaneamente coleta, analisa e reformula perguntas, ela é particularmente apropriada para novos tópicos e temas. Muitas pesquisas requerem grandes orçamentos, grandes equipes e extensas populações de estudo. Muitas pesquisas qualitativas podem ser conduzidas a um baixo custo e mais, algumas pesquisas no campo qualitativo podem ser realizadas até mesmo com um simples caderno e uma caneta. Entretanto, a pesquisa qualitativa também tem desvantagens. Esta não é uma metodologia adequada para se obter descrições estatísticas de grandes populações. A pesquisa qualitativa também tem outro problema potencial em relação a sua reprodutibilidade. Por exemplo, não se pode assegurar que o mesmo resultado será obtido ao final de medidas ou observações repetidas. Dependendo da formação e das habilidades do pesquisador, os resultados do estudo podem ser estruturados de uma forma que falhem em explorar as explicações alternativas para o fenômeno estudado, sendo possível o pesquisador “pintar” este fenômeno a seu modo, que não representaria as vozes da comunidade. No núcleo do crescente interesse nas pesquisas qualitativas está o reconhecimento da importância do contexto. O conhecimento local situado em contextos locais relatados pelos participantes locais promete um novo tipo de investigação adequada para as sociedades que lutam por um avanço na democracia, resultando na melhoria da qualidade de vida e de saúde. Embora se tenha reconhecido há séculos a importância deste conhecimento local, esta diversidade e multiplicidade pareciam complexas demais para chamá-las de ciência. Onde estariam as leis universais? Onde estariam as novas invenções? As tecnologias atuais, as perguntas que estão sendo feitas e as estratégias de pesquisa elaboradas e explícitas a serem aplicadas estão, finalmente, prometendo o tipo de conhecimento local comparativo não disponível há 40 anos, e a globalização está agora criando condições suficientemente semelhantes para que as respostas locais tenham importância global. O presente número da Rev Rene apresenta uma série de artigos que abrangem uma ampla área de tópicos que discorrem sobre avaliação de programas da saúde, promoção da saúde, situação de saúde de determinados grupos (materno-infantil, profissional da enfermagem etc.), cuidados à saúde, entre outros, Rev Rene. 2013; 14(6):1061-3. Kerr LRFS, Kendall C mostrando diferentes empregos da metodologia qualitativa no estudo científico na área da saúde. A aplicação generalizada e adequada da metodologia qualitativa na coleta e interpretação de dados aponta um caminho a seguir na melhoria da vida e da saúde humana. REFERÊNCIAS 1. Giddens A. The constitution of society: outline of the theory of structuration. Cambridge Cambridgeshire: Polity Press; 1984. 2. Creswell JW. Qualitative inquiry and research design: Choosing among five approaches: Sage; 2012. 3. Crotty M. The foundations of social research: Meaning and perspective in the research process. Sage; 1998. Rev Rene. 2013; 14(6):1061-3. View publication stats