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Planejamento urbano: município de Maricá, RJ

No último século, o Brasil recebeu uma urbanização intensa e em grande parte desordenada. As cidades brasileiras atuais são o reflexo de uma sociedade antagônica. O desenvolvimento urbano demonstra esse antagonismo social e revela os conflitos vividos no meio intra-urbano. Durante muitas décadas, poucas foram as cidades que receberam um planejamento e uma infraestrutura adequada. Neste sentido, um possível caminho para a continuidade da expansão urbana e a remodelação de cidades já consolidadas pode ser pautado pelo planejamento urbano sustentável, onde prima-se pela qualidade de vida da população, através de políticas públicas bem formuladas, que cumpram determinados objetivos sociais, ambientais, econômicos, políticos e culturais. De modo a entender a dinâmica das cidades, apresenta-se o munícipio de Maricá para o estudo em questão. Localizado na região metropolitana do Rio de Janeiro, é um território que vem sofrendo transformações diversas nos últimos anos, desde sua espontânea expansão à chegada de grandes empreendimentos. Neste sentido, o estudo será uma análise sobre as estratégias que serão adotadas pelo município, de modo a apoiar o crescimento do mesmo, procurando entender se estão realmente incluídas dentro dos preceitos de desenvolvimento sustentável de longo prazo, sendo eficaz socialmente, ambientalmente e economicamente. Abstract In the last century, Brazil received an intense urbanization and, in large part, disordered. Current Brazilian cities are a reflection of an antagonistic society. Urban development demonstrates that social antagonism and reveals the conflicts experienced in intra-urban areas. For many decades, there were few cities that received a planning and an adequate infrastructure. In this regard, a possible way for continued urban expansion and remodeling of already established cities can be guided by sustainable urban planning, where material by the population's quality of life through well formulated policies that meet certain social objectives environmental, economic, political and cultural. In order to understand the dynamics of cities, it shows the municipality of Marica for the study. Located in the metropolitan area of Rio de Janeiro, it is a territory that has undergone several changes in recent years, since its spontaneous expansion to large projects. In this sense, the study will be an analysis of the strategies to be adopted by the municipality in order to support the growth of it, trying to understand whether they are actually included within the long-term sustainable development principles and effective socially, environmentally and economically. Keywords: Urban Planning, Sustainable Design, Maricá.

Planejamento urbano: município de Maricá, RJ Amanda Melo Nogueira Universidade Federal do Rio de Janeiro, Pós-graduação em Engenharia Urbana [email protected] Gisele Silva Barbosa Universidade Federal do Rio de Janeiro, Pós-graduação em Engenharia Urbana, Departamento de Expressão Gráfica [email protected] Angela Maria Gabriella Rossi Universidade Federal do Rio de Janeiro, Pós-graduação em Engenharia Urbana, Departamento de Expressão Gráfica [email protected] Resumo No último século, o Brasil recebeu uma urbanização intensa e em grande parte desordenada. As cidades brasileiras atuais são o reflexo de uma sociedade antagônica. O desenvolvimento urbano demonstra esse antagonismo social e revela os conflitos vividos no meio intra-urbano. Durante muitas décadas, poucas foram as cidades que receberam um planejamento e uma infraestrutura adequada. Neste sentido, um possível caminho para a continuidade da expansão urbana e a remodelação de cidades já consolidadas pode ser pautado pelo planejamento urbano sustentável, onde prima-se pela qualidade de vida da população, através de políticas públicas bem formuladas, que cumpram determinados objetivos sociais, ambientais, econômicos, políticos e culturais. De modo a entender a dinâmica das cidades, apresenta-se o munícipio de Maricá para o estudo em questão. Localizado na região metropolitana do Rio de Janeiro, é um território que vem sofrendo transformações diversas nos últimos anos, desde sua espontânea expansão à chegada de grandes empreendimentos. Neste sentido, o estudo será uma análise sobre as estratégias que serão adotadas pelo município, de modo a apoiar o crescimento do mesmo, procurando entender se estão realmente incluídas dentro dos preceitos de desenvolvimento sustentável de longo prazo, sendo eficaz socialmente, ambientalmente e economicamente. Palavras-chave: Planejamento urbano, Projeto sustentável, Maricá Abstract / resumen In the last century, Brazil received an intense urbanization and, in large part, disordered. Current Brazilian cities are a reflection of an antagonistic society. Urban development demonstrates that social antagonism and reveals the conflicts experienced in intra-urban areas. For many decades, IV Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / I Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente there were few cities that received a planning and an adequate infrastructure. In this regard, a possible way for continued urban expansion and remodeling of already established cities can be guided by sustainable urban planning, where material by the population's quality of life through well formulated policies that meet certain social objectives environmental, economic, political and cultural. In order to understand the dynamics of cities, it shows the municipality of Marica for the study. Located in the metropolitan area of Rio de Janeiro, it is a territory that has undergone several changes in recent years, since its spontaneous expansion to large projects. In this sense, the study will be an analysis of the strategies to be adopted by the municipality in order to support the growth of it, trying to understand whether they are actually included within the long-term sustainable development principles and effective socially, environmentally and economically. Keywords: Urban Planning, Sustainable Design, Maricá. 1 Introdução Nas últimas décadas, é crescente o número de habitantes que residem nas cidades. Segundo Richard Rogers (2000), as cidades são como organismos vivos, que consomem recursos e produzem resíduos. Tendo as cidades surgido como um paradigma da especialização das funções humanas, elas representam uma mais-valia para a vida humana, apesar de também representarem uma grande ameaça quando mal planejadas e geridas. Uma possível solução, no entanto, encontra-se no planejamento urbano sustentável, onde prima-se pela qualidade de vida da população, através de políticas públicas bem formuladas, que cumpram determinados objetivos sociais, ambientais, econômicos, políticos e culturais. Esse artigo tem como objetivo apresentar conceitos relevantes relacionados ao planejamento urbano sustentável e realizar uma análise do município de Maricá a partir da discussão destes conceitos. Esse estudo é fruto de uma monografia apresentada ao Curso de Especialização em Engenharia Urbana da Universidade Federal do Rio de Janeiro (NOGUEIRA, 2015). O município de Maricá está localizado na Região Metropolitana do Rio de Janeiro e é um território que vem sofrendo aceleradas transformações decorrentes do processo de urbanização nos últimos anos, desde sua espontânea expansão à chegada de grandes empreendimentos. Figura 1: Mapa de Localização de Maricá – Região Metropolitana do RJ Fonte: CEPERJ Dados II Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / V Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / .................... II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente Maricá tem vivenciado um momento de grande desenvolvimento econômico, fomentado pela exploração petrolífera na bacia de Campos e a descoberta dos depósitos do pré-sal na Bacia de Santos, a apenas 200 km da costa. A construção do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro (Comperj), no município vizinho de Itaboraí, ampliou também a participação estratégica e a visibilidade de Maricá. Estando o desenvolvimento diretamente relacionado à vida das cidades, é fundamental que um plano de ações seja tomado no sentido da sustentabilidade no ambiente urbano. Além de um Plano Diretor Urbano, implementado em 2006, Maricá possui também um ‘Master Plan’ com previsão de atuação de trinta anos, com grandes projetos de infraestrutura, incluindo a construção de um porto, a ampliação do aeroporto municipal e a instalação de um corredor de logística para a indústria do petróleo. Também é previsto para a cidade, grandes e luxuosos empreendimentos imobiliários, como condomínios residenciais e um resort. Algumas ações foram previstas também no sentido social, como políticas educacionais de qualificação profissional e inclusão social. Neste sentido, o estudo será uma análise sobre as estratégias que serão adotadas pelo município, de modo a apoiar o seu crescimento, procurando entender se estão realmente incluídas dentro dos preceitos de desenvolvimento sustentável de longo prazo, sendo eficaz socialmente, ambientalmente e economicamente. Sendo assim, a metodologia baseia-se na coleta e interpretação de informações contidas nos planos de ação propostos para o município, tendo como base o levantamento dos principais indicadores socioeconômicos, que evidenciam ao longo dos anos os investimentos em infraestrutura realizados. 2 Revisão bibliográfica No intuito de analisar as estratégias do município de Maricá, a partir do aporte do planejamento urbano e ambiental sustentável, pretende-se inicialmente apresentar conceitos relacionados à sustentabilidade ambiental, ao planejamento e aos instrumentos de planejamento e gestão capazes de direcionar o crescimento urbano. 2.1 Sustentabilidade Urbana De modo a embasar o conceito de sustentabilidade ambiental urbana, é necessária a compreensão dos conceitos de desenvolvimento sustentável e sustentabilidade e suas relações em meio às questões urbanas e ambientais na qual estão inseridos. Estes conceitos surgiram a partir dos questionamentos de movimentos ambientalistas, perante a percepção dos impactos negativos causados ao meio ambiente e à sociedade, pelo modelo de desenvolvimento adotado, fortalecendo uma crítica a este modelo e apontando a necessidade da busca por um novo modelo de desenvolvimento, o sustentável. Atualmente, estes conceitos são amplamente discutidos por diferentes teóricos e estudiosos, que buscam uma solução global necessária ao equilíbrio ambiental urbano. Por apresentarem inúmeros aspectos a serem analisados, estes conceitos ainda se encontram em construção. A concepção de um meio ambiente fragmentado e separado do homem, amplificado pelo modo de produção e consumo capitalista, refletiu uma série de alterações na paisagem natural, através da degradação do meio ambiente e a consequente diminuição em relação à qualidade de vida da sociedade. O modelo de produção implementado pelo homem moderno, baseia-se em um sistema linear, a partir da extração de recursos naturais e a disposição dos mesmos após sua utilização, sem qualquer preocupação com o reaproveitamento ou a limitação do meio ambiente natural. Após a ocorrência de inúmeros eventos destrutivos, relacionados com o atual modelo predatório de produção e consumo, a sociedade começou a perceber que este II Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / V Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / .................... II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente modelo não é sustentável. A partir disso, o conceito de “desenvolvimento sustentável” surge na segunda metade do século XX e vem ganhando cada vez mais destaque na sociedade, sendo visto como uma alternativa possível no sentido de minimizar os problemas ambientais atuais, incluindo também as questões sociais. Segundo Barbosa (2008), “este conceito surge como um termo que expressa os anseios coletivos muitas vezes colocados como uma utopia”, pois infelizmente, por ironia, o que dificulta a implementação deste modelo de desenvolvimento está justamente relacionado ao modo atual de produção capitalista, onde o aspecto econômico prevalece sobre os aspectos sociais e ambientais. O princípio de uma sociedade sustentável implica o desenvolvimento de valores sistêmicos fundamentais à manutenção da vida, através da compreensão da concepção de um mundo em que todos fazem parte, em uma rede de inter-relações, onde mutuamente, um depende do outro. A partir disso, devem ser cultivados valores sociais e ecológicos, como a colaboração, cooperação, participação democrática, o não desperdício e não consumismo, agregados aos valores de autonomia, solidariedade e responsabilidade, em um novo modelo de desenvolvimento (VITAL, 2012). Para além de um controle do crescimento urbano, as questões socioambientais devem ser revisadas, no que se refere ao uso da terra e à ocupação, incentivo a técnicas menos invasivas de utilização dos recursos naturais e o reaproveitamento dos mesmos. Os direitos básicos devem ser garantidos ao ser humano: o suprimento de água, a moradia e serviços sociais, alimentação, saúde, educação, saneamento, são alguns deles. Nas últimas décadas, tem se intensificado a discussão entre a relação das cidades e das sociedades com o meio ambiente natural, perante à degradação ambiental quase sempre atribuída à crescente urbanização. Pode-se dizer que as cidades tem se tornado cada vez mais o foco principal na definição de estratégias e políticas de desenvolvimento, a partir das perspectivas de crescimento urbano. No cerne do desenvolvimento, o conceito de sustentabilidade deve inserir-se como referência a todas as atividades humanas, porém estando ligado de forma intrínseca à concepção urbanística, novas alternativas sustentáveis de planejamento são fundamentais na garantia do equilibro da relação entre a cidade, as atividades humanas e o meio ambiente. Sendo assim, os mais diversos setores sociais procuram entender e buscam uma referência sobre o que seria a sustentabilidade ambiental urbana no processo de planejamento das cidades. No Brasil, sobretudo nas grandes metrópoles, são inúmeros os problemas causados pela crescente e espontânea expansão urbana sem o acompanhamento do poder público, que traduz-se em uma desorganização do território, com cortiços e favelas. Para Ermínia Maricato (2000), a imagem das cidades brasileiras, atualmente, está relacionada aos problemas atrelados a este crescimento intenso, sendo eles: a violência, poluição, tráfego caótico, enchentes e desigualdade social, dentre outros. Maricato (2000) observa que não é pela falta de planos diretores e nem pela qualidade técnica, que muitas cidades brasileiras apresentam estes graves problemas, mas pelo fato de os planos existirem desvinculados da gestão urbana, sendo carregados de um discurso de boas intenções, mas distantes da prática de implementação, onde as leis são aplicadas circunstancialmente. Sendo assim, é válido refletir sobre o que representa a sustentabilidade urbana para as cidades brasileiras, pois o país vivencia hoje problemas básicos inerentes às carências do processo de urbanização: problemas associados à habitação, saneamento básico, problemas sanitários, uso e ocupação do solo e mobilidade. O planejamento do espaço urbano deve trazer a responsabilidade de aperfeiçoar e dar alternativas que melhor se adequem às necessidades humanas. II Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / V Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / .................... II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente 2.2 Planejamento Urbano Ambiental e Instrumentos de Gestão Entendendo que as diretrizes de crescimento e desenvolvimento das cidades, devem ser expressas no planejamento, a escala local, parece a priori, como a mais adequada para tratar e compreender os problemas ambientais recorrentes, relacionados aos recursos hídricos, aos processos de degradação do solo e às áreas de proteção da vegetação, dentre outros. Além disso, tem-se visto hoje, a importância da criação e implementação de novas unidades de planejamento e gestão ambiental, onde os problemas ambientais possam ser tratados de forma mais integrada, sendo a gestão por bacias hidrográficas, um exemplo neste sentido. Uma possível definição para o conceito de planejamento urbano é a que o configura como sendo um conjunto de ações propostas pelo Estado, tendo em vista o interesse coletivo, envolvendo a organização e o controle do uso do solo aplicado ao território de um município individualmente (DÉAK; LEME, 1999, apud PERES, 2012, p.88). Considerando a cidade como um sistema complexo, no âmbito do planejamento, ela está sujeita a diversas influências e decisões por diferentes pontos de vistas: sociais, econômicos, políticos e administrativos. Vale ressaltar, que atualmente, no processo do planejamento, também são inseridas novas questões, como a sustentabilidade ambiental e a participação social. Slocombe (1993) refere-se ao planejamento como tradicional ou ambiental. O planejamento tradicional é o planejamento urbano ou regional, que se baseia no uso da terra, na economia e infraestrutura, através de um processo baseado em metas, planos e regulamentos. Já o planejamento ambiental também engloba o ambiente biofísico onde vivem as comunidades e analisa os efeitos de atividades de desenvolvimento e de outros planejamentos (SLOCOMBE, 1993)1. Neste sentido, é possível perceber que os aspectos ambientais e urbanos são indissociáveis e deveriam ser tratados de forma integrada no processo de planejamento, uma vez que é no meio ambiente natural que o homem atua, por meio de ações na mudança física do ambiente natural, transformando-o em um ambiente construído. Não considerar a unicidade dos aspectos urbanos e ambientais, agrava os problemas oriundos da ocupação do solo urbano. Esther Higueras (1998) salienta a necessidade de se considerar no planejamento urbano, os aspectos ambientais, através do adequado aproveitamento dos recursos naturais locais e também a adoção de critérios de economia de energia no planejamento, de modo a equilibrar o desenho urbano com as variáveis climáticas, topográficas e territoriais de cada município e assim, alcançar a otimização em todas as áreas urbanas (HIGUERAS, 1998). Esta autora acredita que somente um planejamento urbano e ambiental sustentável é capaz de promover a integração necessária entre os elementos do meio ambiente construído (edificações e infraestrutura) e os elementos do ambiente natural (clima, geomorfologia, flora e fauna), visando a minimização dos impactos negativos, decorrentes do processo de urbanização, como a contaminação do meio e a excessiva produção de resíduos (HIGUERAS, 2006). Atualmente, alguns progressos podem ser observados na prática do planejamento urbano, que se encontra cada vez mais integrado e ligado aos aspectos ambientais, evidenciando de uma vez por todas a importância da ampliação do termo de planejamento urbano ao planejamento ambiental-urbano, configurando-se assim, como um instrumento fundamental no equilíbrio desta relação. Os instrumentos normativos que tem como propósito traçar objetivos e metas de controle e gerenciamento do meio ambiente urbano e regulamentar este processo, no âmbito da administração pública brasileira. O planejamento urbano coloca-se como 1apud BARBOSA (2008) II Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / V Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / .................... II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente uma política pública urgente e vital, devendo ser estabelecido, entre outras ações, pela implantação de um Plano Diretor. Dentre os principais mecanismos legais relevantes ao processo de ordenamento das cidades, encontra-se o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001). Esta lei, aprovada em 2001, possui uma série de instrumentos que podem contribuir significativamente para a otimização dos investimentos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, privilegiando os investimentos geradores de bem-estar geral, onde todos os segmentos sociais possam usufruir das vantagens alcançadas por estes investimentos (Estatuto da Cidade, 2001). É necessário entender que a aplicação dos instrumentos previstos pelo Estatuto está condicionada à existência do Plano Diretor, sendo este um importante instrumento estabelecido neste Estatuto. Portanto, o Plano Diretor é visto como o instrumento capaz de estabelecer as normas que regulamentam o território, bem como as atividades socioeconômicas de um município. Outros dois instrumentos que podem ser utilizados pelos municípios como norteadores para um possível desenvolvimento sustentável são a Lei Orgânica e a Agenda 21. A Agenda 21 não é obrigatória, porém constitui-se como um instrumento importante, uma vez que estabelece princípios capazes de nortear o desenvolvimento em prol da sustentabilidade. Neste sentido, é proposto pela Agenda que os governos elaborem estratégias para um desenvolvimento sustentável por meio de Planos Diretores Estratégicos, tendo como princípio a Participação Social, neste processo. Vale ressaltar que a implementação das ações propostas, depende da vontade política dos governantes e gestores públicos e, além disso, também depende dos esforços da sociedade, como um todo, que necessariamente precisa rever seu padrão de vida, sendo capaz então de promover o desenvolvimento sustentável. 3 Estudo de Referência: Maricá O município de Maricá está passando por grandes transformações urbanas impulsionadas não somente por seu potencial turístico, mas sobretudo por novos empreendimentos que potencializam o desenvolvimento econômico da região a partir da exploração de petróleo e da implantação do complexo petroquímico, no município vizinho, em Itaboraí. Pode-se dizer que Maricá tem sido vista como um potencial local para a construção de residências que visem suprir a expansão demográfica crescente na região. Além disso, é prevista a construção de um porto a fim de possibilitar o escoamento da produção e insumos da nova ocupação econômica da região, relacionada à indústria do petróleo. O município possui um Plano Diretor que é considerado como um instrumento básico de atuação de desenvolvimento e expansão urbana. Apesar do plano citar como objetivo principal o desenvolvimento econômico sustentável e integrado ao meio ambiente, algumas atuações não condizem com tal objetivo. Com relação à ocupação do território e à utilização do solo, no município de Maricá, é possível observar que esta tem correspondido historicamente aos diferentes ciclos econômicos experimentados na região, com suas respectivas levas de ocupação e desocupação. Vale ressaltar, que Maricá apresenta ainda a característica de cidade de veraneio, com uma população volante em finais de semana e períodos de férias, representando um aumento das demandas urbanas. Neste sentido, pode-se dizer que o aumento da população ocasional, nos períodos do verão, férias e feriados, demanda uma quantidade de serviços, que representa uma dificuldade extra nas questões de planejamento e gestão do município, como por exemplo, serviços de coleta de lixo, abastecimento de água, esgotamento sanitário e o fornecimento de energia elétrica. Observa-se que nos últimos anos mais pessoas se fixaram na cidade a partir das novas possibilidades de emprego. De acordo com o IBGE o município conta como uma população residente aproximada de 140 mil habitantes como uma densidade de cerca de 350 habitantes II Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / V Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / .................... II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente por km² (IBGE, 2010). Segundo o IBGE, o município de Maricá, apresentou entre os anos de 2003 e 2013, o quarto maior crescimento populacional projetado do país. De acordo com o último Censo a taxa de urbanização do município atingiu 98,45% em 2010, contra 82,62% no ano 2000 (IBGE, 2010). 3.1 Aspectos ambientais e de Infraestrutura Urbana Como o intuito do artigo é discutir as questões relacionadas ao desenvolvimento urbano do município e suas transformações, esse texto se ateve a uma descrição mais específica do meio urbano de Maricá. Um diagnóstico ambiental e urbano é primordial como a base da proposição de estratégias para um planejamento sustentável. Neste sentido, é importante a realização de um estudo das especificidades do meio natural e do meio urbano de Maricá, como forma de relacionar as demandas por recursos em todas as áreas da vida urbana aos recursos naturais disponíveis. O levantamento dos dados, aqui expostos, nortearão as discussões quanto aos processos futuros de atuação no município. O município apresenta um grande complexo lagunar, composto por cinco lagoas e ainda uma grande extensão de praias com 46 km de costa. Além disso, é rodeado por maciços costeiros, a maioria bens tombados ao patrimônio natural, histórico, cultural e paisagístico do Estado. Essas características naturais impulsionam o turismo local e também a expansão imobiliária da região. Infelizmente, a área de restinga existente no município, tem sido vista como uma área potencial para a expansão da malha urbana, o que poderá acarretar em prejuízos ambientais com a perda de diversas espécies vegetais e animais. A Prefeitura Municipal tem a intenção de aumentar a visibilidade de Maricá, não somente como uma cidade de veraneio, mas busca a promoção para um status de cidade turística. Sendo assim, observa-se que o setor turístico em Maricá, atualmente, já contempla vários projetos, que configurarão um enorme atrativo. Entre os projetos previstos, um dos maiores é a construção do Aquário Niemeyer, em Barra de Maricá. Este é um dos últimos projetos assinados pelo renomado arquiteto Oscar Niemeyer, falecido em 2012. O complexo prevê um aquário marinho, uma torre de 70 metros de altura com mirante e restaurante panorâmico, um anfiteatro com capacidade para 800 pessoas e uma escola de capacitação para a pesca artesanal, uma atividade tradicional do município. Outro projeto previsto é a construção de um teleférico na praia de Ponta Negra, que levará os visitantes a um passeio até o farol, configurando mais um equipamento turístico para a cidade. O antigo Farol da Ponta da Galeta é um ponto de afluência turística, muito visitado, possui um mirante que permite avistar boa parte da região litorânea, principalmente, as praias de Ponta Negra e Jaconé e a Lagoa de Guarapina. A região está dentro de uma Área de Proteção Ambiental e vê-se que é necessária uma gestão mais efetiva para estas áreas, que inclua um processo mais rigoroso de fiscalizações, e planeje ações de conservação e recuperação mais eficazes para estas áreas. É possível observar, que em relação ao planejamento, gestão e controle dos serviços de saneamento básico prestados em Maricá, historicamente a administração municipal não teve um envolvimento efetivo no tratamento destas questões. Neste sentido, o município teve um papel de mero espectador, deixando a cargo da CEDAE (concessionária estadual) o processo. A CEDAE absorveu de forma limitada a incumbência dos serviços de abastecimento de água e tratamento de esgoto. Além disso, o manejo de resíduos sólidos urbanos também ficou a cargo de uma concessionária terceirizada pela Prefeitura, que coletava e dispunha os resíduos em um “lixão”. De acordo com o IBGE (2010), dentre os domicílios particulares permanentes urbanos, estes somam 42.188 unidades que possuem saneamento, sendo adequado 13,1%, inadequado 2,2% e semi-adequado 84,8% (IBGE, 2010). II Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / V Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / .................... II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente Nesta mesma pesquisa, o IBGE constatou que o município não possuía ainda diversos instrumentos legais reguladores de serviços, como planos diretores específicos de abastecimento de água, recursos hídricos, manejo de águas pluviais, esgotamento sanitário e mesmo, um plano diretor integrado de saneamento básico (IBGE, 2008). A atual administração pública do município, reconhece a importância da implementação do Plano de Saneamento Básico, como instrumento de proposição de mudanças e norteador de ações no sentido da implementação das infraestruturas básicas. Com relação às questões referentes ao sistema de coleta e tratamento de esgoto do município, segundo estatística estabelecida pela Fundação CIDE (Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro), realizada em 2010, o percentual total de população beneficiada com esgoto tratado é de somente 3% (CEPERJ, 2010). Isto significa que apesar dos esforços recentes realizados e discussões, ao longo dos anos, em torno da garantia à população de um saneamento básico, sobretudo com ênfase no esgotamento sanitário, vê-se que muito pouco foi realizado. Quanto à rede de abastecimento de água, segundo informações da Fundação CIDE, no ano de 2003, pouco mais de 8% dos estabelecimentos (residenciais, comerciais, industriais e públicos) de Maricá eram abastecidos por água canalizada, isto representava um total de 6.090 unidades abastecidas (CEPERJ, 2004). Apesar do IBGE constatar um aumento de cerca de mais 3 mil unidades abastecidas até 2008, esse índice ainda é muito pequeno. A solução para a ausência da rede de abastecimento de água resulta por ser individual, onde muitos moradores se utilizam de poços artesianos para o seu abastecimento. Esta é considerada uma medida provisória e foi adotada pela Prefeitura, como forma de atender parte da população do município, sobretudo a população de baixa renda. Com relação aos acessos e vias de Maricá, a cidade recebeu grandes investimentos de melhoria com a duplicação da Rodovia Amaral Peixoto, um dos principais acessos à cidade. Além disso, é previsto a ampliação do aeródromo municipal existente a fim de se tornar um aeroporto de maior porte e também é prevista a construção de um Porto, tudo no intuito de atender à nova demanda da indústria petroquímica na região. Observa-se que uma das principais ações da Prefeitura no âmbito urbano nas últimas décadas foi realizar o asfaltamento de vias urbanas. Com relação às vias de circulação internas do município, na região central de Maricá (sede) 1º distrito, todas as vias são pavimentadas. Até recentemente, diversas localidades ainda apresentavam vias não-pavimentadas, no entanto, em 2014, ampliou-se muito a quantidade de vias pavimentadas no município, sobretudo na região litorânea. No entanto, a implantação de caixas de esgoto e redes de abastecimento de água encanada e saneamento básico não foram contemplados nos projetos de asfaltamento. Além disso, as vias asfaltadas, em sua maioria, não apresentam meio fio nem houve nenhuma preocupação com o dimensionamento ideal das calçadas. A responsabilidade das mesmas ainda continua com os donos dos terrenos como na maioria das cidades brasileiras. Com relação à mobilidade urbana, o aspecto rodoviário ainda é estimulado pelo poder público, no entanto tem sido feito estudos para a reativação da antiga estrada de ferro. Além disso, foi implementado recentemente um serviço gratuito de transporte coletivo, por ônibus, no município. É possível observar que quanto ao aspecto morfológico, o município se caracteriza por seu plano de ocupação principal, que ocorreu de forma linear ao longo da rodovia Amaral Peixoto (RJ-106). Observa-se o predomínio da tipologia residencial, de caráter horizontal, uma vez que o gabarito máximo permitido é de até quatro pavimentos. O crescimento da cidade também foi direcionado pelo limite do oceano e as áreas de litoral foram ocupadas muitas vezes por loteamentos irregulares. No entanto, as II Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / V Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / .................... II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente edificações também possuem baixo gabarito, mas nem sempre estão de acordo com as legislações urbanas do local. 4 Discussão Seja pela falta de investimentos ou uma gestão mais eficaz, muitas insustentabilidades podem ser observadas hoje no município, ao se considerar que a população demanda, por exemplo, por abastecimento, ao mesmo passo que polui. Sendo assim, é urgente e necessário o provimento dos serviços e infraestruturas básicas, principalmente de saneamento. Vale destacar, que atualmente, em decorrência dos diversos problemas ambientais e urbanos observados no município, além do incentivo pela implementação do Complexo Petroquímico em Itaboraí e outros investimentos de grande porte, como a construção do Porto que atenderá a indústria do pré-sal, a Prefeitura Municipal está demonstrando interesse em implementar estratégias de ação que possam solucionar tais insustentabilidades. Neste sentindo, sabe-se que uma gestão eficaz que possa garantir o cumprimento das estratégias, a começar pela implementação das infraestruturas básicas do município, é fundamental. O município de Maricá é dotado de inúmeras riquezas naturais e através deste reconhecimento, é necessário que o planejamento a longo prazo, contemple as questões turísticas de maneira inteligente, consolidando-se como um município de interesse turístico e residencial de qualidade, através do provimento de todas as infraestruturas necessárias. Vê-se que a cidade já tem passado por uma transformação na busca de um planejamento mais focado no turismo de qualidade, onde é essencial oferecer uma infraestrutura adequada, que compreende os serviços de hospedagem, gastronomia e opções variadas de lazer, de forma a atender a demanda turística. Com relação às infraestruturas básicas, observa-se que o Município ainda está distante de obter uma qualidade nos serviços. A falta de perspectivas concretas quanto à solução do abastecimento de água do município, se configura na desmotivação de seus habitantes. Vê-se que não há possibilidades de alcançar a sustentabilidade do desenvolvimento local, expresso no discurso da gestão municipal, sem que a oferta de água canalizada, como um serviço básico de saneamento e demanda populacional, esteja solucionada. A falta de tratamento de esgoto ainda é mais grave no município e demonstra um grande desinteresse com os próprios moradores e, em uma escala maior, com as áreas ambientais que recebem esse esgoto não tratado. Além disso, a falta de fiscalização permite a construção desordenada em diversas áreas do município, principalmente nas regiões mais periféricas. 5 Considerações Finais O conceito de sustentabilidade urbana e desenvolvimento sustentável devem estar presentes no planejamento municipal. Tais ideais não devem ser apenas slogans políticos ou empresariais. Cabe ao poder público analisar as intenções de atuações urbanas particulares e gerenciar tais ações em acordo com os interesses do município e suas próprias intervenções. É notável a intenção do Município de Maricá em realizar o Plano Diretor e a Agenda 21 municipal com viés ambiental. Muitas ações da prefeitura demonstram uma melhoria da qualidade de vida da população como a melhora dos índices de educação, os novos incentivos econômicos e infraestruturas, entre outros. No entanto, a grande maioria dessas ações não estão considerando princípios de sustentabilidade urbana. Por exemplo, o asfaltamento de vias sem as devidas instalações de infraestrutura básica de saneamento. II Encontro Nacional de Tecnologia Urbana / V Simpósio de Pós-Graduação em Engenharia Urbana / .................... II Simpósio de Infraestrutura e Meio Ambiente Ainda, muitos projetos de expansão imobiliária estão em desacordo com indicações do próprio município de não ocupação de áreas de preservação e área limítrofe à mananciais. Apesar de conter no Plano Diretor o objetivo de realizar um desenvolvimento econômico sustentável e em harmonia com o meio ambiente, algumas atuações públicas ainda estão aquém dos ideais dos conceitos de sustentabilidade e planejamento ambiental. Referências BARBOSA, Gisele. Perspectivas Sustentáveis: Desafios para o Desenvolvimento UrbanoAmbiental. 2008. 176f. Dissertação (Mestrado em Urbanismo) – Programa de PósGraduação em Urbanismo (PROURB), UFRJ. Rio de Janeiro, 2008 MARICÁ: Céu, Sol e Mar. Cartilha de Apresentação Institucional. Maricá: Prefeitura Municipal de Maricá, 2013. CEPERJ Dados. Percentual de população beneficiada com esgoto tratado, 2010, município de Maricá. Fundação CIDE - Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro. CIDE, 2010. Disponível em: http://geo.ceperj.rj.gov.br/Base, Acessado 15 de ago. de 2014 DEÁK, Csaba; SCHIFFER, Suely Ramos. (orgs.) O processo de urbanização no Brasil. São Paulo: Ed USP, 1999. 346p. In: PERES, Renata. O planejamento regional e urbano e a questão ambiental: análise da relação entre o plano de bacia hidrográfica Tietê-Jacaré e os planos diretores municipais de Araraquara e São Carlos, SP. 2012. 370 f. 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