Revista Ibero- Americana de Humanidades, Ciências e Educação- REASE
doi.org/10.51891/rease.v9i6.10386
ADOLESCÊNCIA E A ESCUTA PSICANALÍTICA
Vânia Lúcia Rodrigues Rocha1
Orimar Batista dos Reis2
Arquimedes Martins Góis3
RESUMO: Este trabalho tem o objetivo de analisar o adolescente contemporâneo, bem
como seus desconfortos, questionamentos, buscas, encontros e desencontros. Neste sentido
o presente estudo pretende investigar, refletir e contribuir, a partir da escuta psicanalista,
sobre características e particularidades desse adolescente frente aos desafios e mudanças em
seu desenvolvimento físico, emocional, intelectual e social, que provocam alterações em seu
comportamento, muitas vezes não compreendido pela família e sociedade. Esse ser humano
adolescente está em processo de formação e amadurecimento psíquico e é constantemente
bombardeado pela mídia, com seus poderes apelativos, muitas vezes causando inversões de
valores, inseguranças e medos, principalmente pela ditadura da beleza, gerando angústia,
insatisfação e infelicidade, por não se considerar dentro deste padrão. É necessário que o
psicanalista tenha conhecimento dos fatores angustiantes desse adolescente que está em seu
divã trazendo sua demanda, apresentando sintomas físicos e emocionais para ajudá-lo a
enfrentar esta fase da melhor maneira possível. Sendo fundamental que o analista ouça o
adolescente com afetividade e atenção e conduza-o a uma vida menos estressante, com mais
saúde mental. A escuta ocupa um lugar importantíssimo na psicanálise por ela analisar
palavras ditas e silenciadas, palavras que causam inquietudes, desconfortos, medo,
insegurança, mas ao serem ditas abrem acesso a ressignificação.
Palavras-chave: Adolescência. Conflitos. Escuta. Diálogo. Psicanálise.
1Graduação
em Pedagogia pela Fundação Educacional de Oliveira (FEOL), Oliveira- MG; Pós-graduação Lato
Sensu em Psicopedagogia pela Universidade de São Paulo (UNICID); Pós-graduação Lato Sensu em Terapia
Familiar pelo Instituto FAMET de Educação e Estudos Superiores, Belo Horizonte- MG; Pós-graduação Lato
Sensu em Psicanálise pelo Instituto FAMET de Educação e Estudos Superiores, Belo Horizonte- MG.
2Doutor em Educação, pela Universidad Americana de Asunción, Paraguai. Doutorando em Engenharia de
Materiais pela Redemat- UFOP. Professor Titular do Instituto Federal de Minas Gerais- IFMG- Campus
Ouro Preto, atuando nos cursos de Tecnologia em Gestão da Qualidade e Técnico em Metalurgia Nível Médio
e Subsequente.
3Doutorando em Administração. Mestre em Administração pela Fundação Mineira de Educação e Cultura
(FUMEC). Pós-graduação em Engenharia de Segurança do Trabalho (FUMEC). Graduado em Engenharia de
Produção pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). É professor do Instituto Federal de Minas GeraisCampus Ouro Preto, atuando nos cursos de Tecnologia em Gestão da Qualidade e Técnico em Metalurgia
Nível Médio e Subsequente.
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ABSTRACT: This work aims to analyze the contemporary adolescent, as well as his
discomforts, questions, searches, meetings and disagreements. In this sense, the present
study intends to investigate, reflect and contribute, based on psychoanalytic listening, about
the characteristics and particularities of this adolescent in face of the challenges and changes
in his physical, emotional, intellectual and social development, that cause changes in his
behavior, understood by family and society. This adolescent human being is in the process
of formation and psychic maturity and is constantly bombarded by the media, with its
appealing powers, often causing inversions of values, insecurities and fears, mainly for the
dictatorship of beauty, generating anguish, dissatisfaction and unhappiness, for not if
considered within this standard. It is necessary for the psychoanalyst to know the
distressing factors of this adolescent who is on his couch bringing his demand, presenting
physical and emotional symptoms to help him face this phase in the best possible way. It is
fundamental that the analyst listen to the adolescent with affection and attention and lead
him to a life less stressful, with more mental health. Listening plays a very important place
in psychoanalysis because it analyzes spoken and silenced words, words that cause
restlessness, discomfort, fear, insecurity, but when they are said, they open access to
signification.
Keywords: Adolescence. Conflicts. Listening. Dialogue. Psychoanalysis.
1.INTRODUÇÃO
Ao se conviver com adolescentes nas famílias, nas escolas, nas igrejas, e nos estágios,
constata-se desconforto, questionamentos, buscas, encontros e desencontros. Neste sentido
o presente estudo pretende investigar, refletir e contribuir a partir da escuta psicanalista, as
características e particularidades, contribuindo para uma adolescência saudável e menos
dolorida.
A adolescência constitui-se um grande desafio devido às mudanças no
desenvolvimento social, físico e intelectual, provocando alterações no comportamento, o que
não se caracteriza como patologias, mas uma fase de agitação, crescimento físico e psíquico,
incertezas, conflitos, muita insegurança, medo do futuro que está chegando e o desconforto
de deixar de ser criança.
Na sociedade brasileira, com as constantes mudanças na política econômica dos
diversos governos que se sucedem, os quais geram incertezas e desemprego, a mídia
bombardeia constantemente estes adolescentes, utilizando instrumentos apelativos,
desenvolvendo uma contracultura, em que há inversão de valores, onde o certo é errado e o
errado é que é certo. Este adolescente se encontra num dilema e muita euforia, onde ficam
perdidos e inseguros.
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Os adolescentes passam por uma frequente angústia e muitos questionamentos: O
que eu vou fazer da minha vida? Qual será a profissão que vou seguir? Devo agradar a mim
ou devo superar as expectativas de meus familiares? Qual a profissão está em alta no
mercado e o que pode ser mais vantajoso em termos financeiros?
O corpo está pronto, os órgãos sexuais estão maduros, os hormônios agora passam a
ter um funcionamento normal e ativo para a reprodução, mas a cabeça ainda não está
preparada pra assumir as consequências do convívio em sociedade. A maturidade vai
acontecer quando este jovem for capaz de tolerar as frustrações em sua vida com dignidade
e assumir-se como homem ou mulher, construindo sua independência afetiva, emocional,
econômica de forma a seguir seu destino com responsabilidade. Partindo deste pressuposto,
como a escuta psicanalítica pode ajudar os adolescentes e pais a vencerem essa fase da
adolescência?
Este trabalho tem como objetivos: Descrever as transformações biológicas ocorridas
no adolescente; Explicar os perigos da mídia e do consumo para este adolescente em
desenvolvimento; Descrever a escuta psicanalítica e como ela pode ajudar o adolescente e
seus pais a vencerem esta etapa.
1.1 A adolescência e seu desenvolvimento histórico
A adolescência é um período que separa a infância da vida adulta, e tem como
particularidades as diversas circunstâncias de falta de equilíbrio e de interrupções.
Normalmente, compreende-se adolescência como uma etapa que se inicia aos doze ou treze
anos, finalizando por volta dos vinte anos aproximadamente. Fase transitória que ultrapassa
este sujeito em desenvolvimento que não é nem criança e nem adulto formado. Mas viverá
um tempo de espera até atingir a fase adulta que Erickson (1987) chamou de “moratória
social”
A palavra” adolescência” vem do latim ad (para) e olecer (crescer), significando a
condição ou processo de crescimento. Muitos jovens em nossa sociedade ainda possuem uma
dependência financeira e emocional dos pais, moram sob o mesmo teto com eles, no entanto
sentem necessidade de ajuntarem-se a tribos, em relação a gosto e estilo que combinam seu
perfil diferenciado. Unem-se aos iguais para ficarem mais fortes e poderosos, andando em
bandos e com comportamentos parecidos.
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A era da Revolução Industrial traz em seus estudos vários fatores sociais, econômicos
e culturais. Nesta época não existia a cultura da adolescência. As crianças se uniam aos pais
e começavam a trabalhar ainda muito cedo, até mesmo para complementar a renda familiar.
Raros eram os jovens que possuíam oportunidade de estudar. A adolescência não era
considerada uma fase de desenvolvimento.
Com o passar dos anos e o progresso da industrialização, os filhos de operários
ganharam o direito e a obrigatoriedade dos estudos. O trabalho se sofisticou do ponto de
vista tecnológico, e passou a exigir um tempo prolongado de formação adquirida na escola,
afastando-os do trabalho, gerando um atraso dos jovens para se inserirem no mercado de
trabalho.
Segundo Nádia Bossa (2009), a história da adolescência é marcada por um fenômeno
social da contemporaneidade e a adolescência tem sido objeto de estudo de pesquisadores e
clínicas. Essas pesquisas têm contribuído muito para discussões e reflexões, em assuntos
referentes à gravidez e paternidade na adolescência, drogas, violência, fracasso escolar, saúde
física e mental. A fase da adolescência hoje não é considerada mais uma transição entre a
infância e a fase adulta, mas considerada uma fase crítica da vida, e deve-se olhar com muita
atenção e estudo.
Atualmente um jovem torna-se adulto em nosso sistema político aos dezoito anos e
ao sistema econômico aos vinte e um anos. A sociedade cria um impasse para os jovens e
adolescentes. Aos dezesseis anos, obtêm o direito de votar e escolher o presidente do país,
mas muitas vezes não têm o direito de escolher em qual escola frequentar. O adolescente se
torna adulto biologicamente, mas continua dependente economicamente da família,
principalmente se ingressarem em cursos universitários em período integral. Os jovens
adquirem a concessão da maturidade social relacionada a comportamentos como consumo
de álcool, direito de dirigir, de votar, de casar, abrir conta bancária etc.
1.2 Desenvolvimento biológico do adolescente
A adolescência é um período de transformações físicas e de transição entre a infância
e a fase adulta, podendo gerar insegurança e conflitos em muitas situações por não saber ao
certo como se comportar, querendo ao mesmo tempo o acolhimento da infância e a
independência do adulto.
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Assim, o adolescente busca uma identificação com o mundo e percebe as diferenças
da fase anterior para a atual, no qual o seu corpo infantil vai cedendo lugar ao corpo adulto,
sendo normal que aconteçam conflitos internos e externos. É importante lembrar que não é
uma regra, pois cada ser humano tem sua peculiaridade, sua própria história de vida, seu
modo de ser, agir e interpretar os fatos que ele está vivenciando.
As mudanças corporais na adolescência são normais e estão relacionadas com a
puberdade. No entanto, dependem do histórico familiar e do tipo de alimentação que tem
ou teve na infância. Nas meninas notam-se o crescimento dos seios, dos pelos pubianos e
axilas, os quadris ficam mais largos, o crescimento fica mais acentuado, a cintura afina, o
útero aumenta de tamanho e acontece a menarca.
Nos meninos as mudanças incluem o aparecimento dos pelos pubianos, nas axilas,
pernas e rosto, mudanças na voz, aumento do tamanho do nariz e das orelhas, com braços
desproporcionais ao tamanho do tronco. Ocorre a primeira ejaculação, aumento do pênis e
aumento da laringe.
Nesta fase é comum o adolescente sofrer com problemas dermatológicos como
surgimento de espinhas e cravos, oleosidade excessiva da pele, aumento de suor com cheiro
diferenciado. As mudanças do corpo aparecem acompanhadas de surpresas gostosas e
assustadoras tudo ao mesmo tempo, o jovem se desconhece, passando grande parte do tempo
voltado para o espelho ou trancado no quarto, se olhando e se manuseando.
Lidar com essas transformações físicas que alteram o emocional não é algo simples
nem fácil, pois geram insegurança, incertezas, receios, medo do desconhecido. Acontece uma
dicotomia entre a satisfação de crescer e o medo da perda dos benefícios da infância. Ao
mesmo tempo em que precisa de afeto rejeita suas manifestações por parte dos pais.
Conflitos e agressividades com relação aos pais e irmão são frequentes.
Taquette (2006) em seu artigo “Doenças psicossomáticas na adolescência” diz que na
adolescência, os sintomas psicossomáticos frequentemente têm relação com o estágio de
desenvolvimento. Na fase precoce, dos 11 aos 14 anos, as mudanças do corpo, a masturbação,
a definição da identidade sexual são os principais fatores estressantes. Na adolescência
média, dos 14 aos 17 anos, os conflitos que aparecem são de tentativa de independência da
família e em relação ao início dos relacionamentos amorosos. Na fase tardia, dos 17 aos 20
anos, os principais problemas são relacionados ao início profissional, às preocupações com o
futuro, às questões espirituais e filosóficas.
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A autora destaca que os sintomas psicossomáticos mais comuns na adolescência são:
cefaleia, dor no peito, dor abdominal e fadiga persistente. Lembrando que sempre deve haver
uma investigação clínica para diagnosticar as causas, que não sendo orgânicas
provavelmente serão psicossomáticas.
A psicanálise auxilia na compreensão dos sintomas apresentados pelo adolescente,
uma vez que a doença não acontece por acaso nem é um fato isolado, devendo-se considerar
a história pessoal, a bagagem genética, a situação social, bem como as influências e agressões
dos meios interno e externo que perturbam a sua homeostase4, gerando então a doença.
1.3- O perigo da Mídia e o consumismo na adolescência
Nos dias atuais é muito normal encontrar pais procurando ajuda em consultórios
psicanalíticos, devido à preocupação com seus filhos adolescentes que apresentam
comportamentos inadequados em casa, passando grande parte do dia trancados em seus
quartos, envoltos na internet ou whatsapp, dormindo menos que o necessário, ocasionando
baixo rendimento escolar e sono durante o período de aula.
É normal os adolescentes sofrerem Cyberbullying, prática de comportamento cruel
e de intimidação nas mídias sociais, que gera dor, sofrimento e até mesmo depressão. Alguns
adolescentes acessam sítios de relacionamentos e marcam encontros com desconhecidos,
sem se preocuparem com o risco que correm.
A internet é uma poderosa ferramenta que aproxima as pessoas que estão distantes,
mas ao mesmo tempo também pode distanciar os membros do convívio familiar. É um
importante meio de trabalho para muitos, uma oportunidade de inovação, conhecimento,
criatividade, até mesmo divulgação de trabalhos, mas traz inquietude aos pais, que nem
sempre conseguem acompanhar o que o adolescente está fazendo, que sítios está acessando,
com quem está conversando.
Estudos mostram que o uso da internet, pelos adolescentes que ainda não têm um
senso crítico, pode causar doenças cibernéticas, como depressão, por interpretar que as outras
pessoas são mais felizes, realizadas e bem sucedidas que eles e, também gerar ansiedade,
4
Homeostasia é uma condição fisiológica dos seres vivos. O termo foi criado por Walter Bradford Cannon
(1871-1945) – fisiologista americano – em 1932 através dos termos de origem grega homeo– que significa “similar”
– e stasis– que significa “estático”, após ter sido observado e descrito anteriormente por Claude Bernard,
fisiologista francês. Termo pesquisado no site https://www.meusdicionarios.com.br/homeostasia, em
15/02/2018.
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chamada de nomophobia, que é a sensação de ansiedade, ao ficar sem celular. Outros fatores
observados nos adolescentes é o narcisismo exagerado, levando-os a postarem diariamente
fotos e, não obtendo muitas curtidas, ficam deprimidos ou com baixa autoestima. A
dependência da internet, vícios de jogos online e ainda a cibercondria ou hipocondria digital,
que é a crença de que possui as doenças sobre as quais leu na internet também se fazem
presente.
Frente a estes desafios, muitos pais não sabem como agir e o que fazer com os filhos,
uma vez que estão trabalhando fora de casa, dificultando assim o acompanhamento e o
diálogo familiar, tão necessário ao adolescente. Muitas vezes, esse adolescente busca
preencher sua carência afetiva em sítios de relacionamentos ou de amizades com pessoas
desconhecidas, onde os perfis de usuários podem ser falsos e fantasiosos. É necessário que
os pais e responsáveis observem seus adolescentes e por meio do diálogo mostrem-lhes o
perigo e riscos que estão expostos.
A mídia televisiva pode influenciar de forma positiva ou negativa sobre os
adolescentes, ditando normas de comportamento sobre o que devem comer, o que vestir,
assistir, ouvir, ditando padrões diferentes dos preconizados pela família. No entanto, todas
as influências e os efeitos negativos que o adolescente recebe em sua vivência midiática
podem ser amenizados pelos valores recebidos em casa, onde os pais devem demonstrar
autoridade sem autoritarismo, e estabelecerem regras bem definidas, para que esse
adolescente sinta-se seguro e amado.
Numa sociedade capitalista o jovem é seduzido ao ideal da moda e incentivado cada
vez mais a consumir sem necessidade. É a cultura do ter, do eu preciso, do eu quero porque
meus amigos têm. As propagandas apelam para meios convidativos, exuberantes e
convincentes, atingindo facilmente os adolescentes que são muito ligados às aparências, só
se sentindo afetivamente felizes se estiverem comprando, de forma desenfreada, na busca
de sentir prazer, o que pode gerar patologias.
O adolescente que vive neste contexto poderá ser um adulto sempre em busca de
novos prazeres. Se ele tem uma casa confortável logo irá querer outra melhor. Adquire uma
moto, um carro, usa roupas da última moda, de marcas famosas e nunca se satisfaz, pois
sempre deseja mais e mais. É uma eterna busca que nada preenche.
Para a psicanálise a melhor forma de tratar os adolescentes é por meio da escuta, do
diálogo e da conscientização da necessidade de gastar de forma consciente, adquirindo
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responsabilidades e evitando gastos com coisas necessárias e supérfluas, ensinando-lhes o
valor da própria conquista.
Nada substitui o amor, o diálogo, a compreensão, o abraço, o olho no olho. De nada
adianta presentear o adolescente e não dar a ele atenção ou demonstrar por meio de atitudes
o quanto ele é amado e aceito.
2. A escuta psicanalítica
Por volta de1912 Freud escreveu um artigo direcionado aos médicos que praticavam a
Psicanálise. Através deste texto fez determinadas recomendações acerca da técnica da
psicanálise que serve de reflexão e guia até nos dias de hoje. Ele ressalta que esta técnica é
muito simples: “Consiste em não dirigir o reparo para algo específico e em manter atenção
uniformemente suspensa (atenção flutuante) em fase de tudo o que escuta”. (Freud 1912).
Na associação livre, o paciente deve falar de forma espontânea o que vier a sua cabeça.
Faz-se necessário que o analista não tenha nenhuma seleção de determinado ponto de
discurso do paciente que será prejudicial à escuta do mesmo, mas de uma alguma forma ficar
atento a tudo que foi falado, e não colocar em destaque pontos isolados do discurso do
paciente, sem negligenciar outros pontos que podem ser tão ou mais importantes.
A escuta vai de encontro ao conceito do inconsciente, na medida em que a associação
livre é uma oportunidade para investigação das próprias formações do inconsciente. Os
sonhos são considerados também parte deste inconsciente, que em análise podem revelar
conteúdos importantes registrados no inconsciente. Sonhos não devem ser interpretados de
uma forma isolada, mas dentro de um contexto que o analisando se encontra. É na análise
que ele descobre e associa este enigma dos sonhos juntamente com seu analista.
Freud nos presenteia com o caso “clássico” da histeria de Dora, a respeito da
relevância da escuta, onde Dora se queixava do pai e de um casal de amigos do pai, que lhes
era íntimo. Freud a interroga sobre qual era a sua parte neste sofrimento que tanto queixava.
Então Dora refletiu e percebeu sua parcela de responsabilidade perante essa situação que
tanto lhe adoecia naquele momento, assumindo seu papel perante o quarteto, e descobre que
não dava mais para ficar só se queixando e pousando de vítima, culpando outras pessoas por
sua insatisfação, atribuindo ao outro a causa de seus fracassos e sofrimentos.
A associação livre leva a um patamar na qual o sujeito se depara com as palavras que
escapam do seu domínio, que ele mesmo diz, e não eram de seu conhecimento. Muitas vezes
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as grandes mudanças e saberes estão dentro de si, que só através da escuta analítica este saber
emerge. Esta construção de saberes faz parte da história pessoal de cada indivíduo. Isto só se
tornou possível porque Freud desenvolveu um olhar atento, particular de cada paciente, na
investigação dos processos do inconsciente.
2.1 Contribuição aos pais dos adolescentes
Segundo Chapman (2002), adolescentes e pais constantemente se chateiam, e estão
sempre em conflito. Ambos trazem em seus discursos palavras agressivas, que quando
pronunciadas no calor das emoções muitas vezes se arrependem e deixam marcas de grande
sofrimento. A ira e o amor são opostos, estando presentes no relacionamento familiar. Os
pais ficam irados com seus filhos, observando-os e avaliando-os em seus comportamentos
irresponsáveis.
É preciso uma maior reflexão e o controle dessa ira, pois esse filho está numa fase de
transformação biológica e disparo hormonal, com muitos questionamentos, e um estresse
extremo, que vai adentrando a independência e a nova identidade.
Os pais se acostumaram a corrigir os seus filhos desde quando eram crianças,
impondo ordens sem muito questionamento significativo. Com o desenvolvimento psíquico
os filhos passam a ter um pensamento crítico, levando-os a não concordar com tudo que lhes
é imposto, gerando dessa forma um conflito com os pais.
Os pais recebem este comportamento como sendo uma rebeldia, desrespeito, e
afronta. O dilema é como esses pais foram criados e como devem conduzir seu adolescente.
Necessário se faz que os pais compreendam seu jovem, que está num estado contínuo de
mudanças, assim como o mundo e os seus contextos sociais nos quais vive. O adolescente
vive um luto devido o final da infância e do corpo infantil e do colo aconchegante dos pais
da infância.
Chapman (2002) diz que: “Os modelos de ira mal orientada são frequentemente
passados de geração para geração”. Esses modelos precisam ser quebrados. Com ira,
violência e gritos, os adolescentes não assimilam o desejo dos pais e se sentem inseguros e
mal amados. Segundo o autor, os pais precisam aprender a controlar sua ira e ressignificar
esse comportamento, criando novas estratégias para lidar com o adolescente. Devem manter
um diálogo com toda a família, escolhendo o melhor momento para envolver este
adolescente com o assunto que lhe diz respeito. É preciso que os pais saibam ouvir este ser
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em evolução, reconhecendo seus erros e acertos. Evitar idas e vindas ao passado que não
chegam a lugar algum, ao contrário, traz angústia e baixa autoestima deste adolescente.
O diálogo deve ser honesto, respeitoso, sem interrupção, mas pautado no amor e
consideração de ambas as partes. Devem buscar juntos a melhor forma de solucionar os
problemas, promovendo paz, alegria a toda família, deixando assim um legado positivo para
estes adolescentes que futuramente serão esposos, pais e o ciclo da vida continuará.
Segundo Galligares (2000), a adolescência é complexa e difícil, sendo que os pais
devem estabelecer com clareza as regras de convivência social. Os jovens não devem ser
poupados quanto às suas responsabilidades escolares, afazeres domésticos e outras atividades
cotidianas que envolvem a família. Os pais precisam aliviar as tensões conflituosas com seus
filhos, ao invés de ficar sobrecarregando-os, tê-los como aliados nos projetos e necessidades
de toda família. Os adultos devem manter uma firmeza simultaneamente a uma
compreensão, pois esta é uma fase de preparação para a vida e o futuro destes jovens, que
serão inseridos em breve no mercado de trabalho.
Com o desenvolvimento das pesquisas na área da psicologia e psicanálise,
enfatizando a importância da influência do ambiente na formação de um indivíduo, a
questão da educação dos filhos tem merecido um maior cuidado por parte de educadores,
psicólogos e estudiosos de várias áreas. Para educar um filho não há um manual que possa
seguir, pois cada filho e cada pai e mãe são únicos em sua natureza. Todos precisam ser
respeitados, assim haverá famílias melhores e uma sociedade menos patológica e um
adolescente mais saudável.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A adolescência tem sido alvo de estudos, por ser uma fase conflituosa, de mudanças
físicas e emocionais, podendo ocasionar dificuldades de relacionamento entre pais e filhos,
muitas vezes causadas pela ausência dos pais em casa, pelo uso errôneo da autoridade, pela
falta de limites estabelecidos ao adolescente, frente ao uso desenfreado da tecnologia.
Cabe ao analista ouvir atentamente o que esse adolescente fala, observando sua
entonação, gestos, lapsos, esquecimentos, palavras contraditórias, duplo sentido em sua
frase, levando-o a perceber esses pontos em sua fala e a refletir de forma que lhe proporcione
crescimento e mudanças de comportamento. Para tal, é necessário que o analisando
internalize esse conhecimento e o pratique em seu fazer cotidiano e relacionamento familiar.
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Faz-se necessário que os pais quando sentirem que a educação de seu adolescente está
conflituosa além da normalidade, busque ajuda terapêutica para encontrar um suporte
emocional diante das dificuldades de ajustamento que enfrentam.
Muitas vezes só se alcança êxito no tratamento deste adolescente se os pais também
se sujeitarem à análise, e se verem como sujeitos que também necessitam de ajuda, pois
muitas vezes estão reproduzindo nos filhos suas dificuldades emocionais, sendo necessário
um trabalho de ressignificação e reorganização simbólica de suas subjetividades e de suas
histórias.
A relação com os adultos na adolescência pode ser conflituosa. Muitos pais se sentem
inseguros e perdidos quanto à educação deste adolescente. É comum pais terem o sentimento
de frustração e até mesmo culpa por não darem conta de amenizar os conflitos existenciais
deste adolescente que está sob seus cuidados e responsabilidade. É fundamental que os pais
tenham a capacidade de tolerância e compreensão e que saibam que mesmo dando o seu
melhor, algo pode sair diferente do que ensinou e planejou, mas o amor foi, é e sempre será
a melhor forma de educar. A adolescência um dia passará, assim como toda fase existencial,
mas ficará o aprendizado da obediência, dos limites recebidos, da segurança e afetividade
dos pais, bem como seus exemplos de vida.
REFERÊNCIAS
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Adolescência.
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